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ADVAITA
ADVAITA
ADVAITA
"Os problemas apenas significam que o mundo não está a correr à sua
maneira. Mas na verdade não existem problemas. Tudo corre como deve
correr. Tudo está certo. Você tem que se esquecer de si próprio e expandir a
sua consciência até que você se torne todo o universo. O substrato, a
Realidade existente em todo o universo é Pura Consciência. E a pura
Consciência não tem nenhum problema. E você é Isso." - Robert Adams
(Discípulo de Ramana Maharshi)
AUTOCONHECIMENTO
(Estas são as instruções dadas por escrito por Bhagavan Sri Ramana Maharshi
nos seus dias de silêncio, Nos anos de 1901 e 1902 a seu devoto
Sivaprakasam Pillai:)
“Nos corações daqueles que buscam assim, com percuciante visão interior,
permanecendo em Atmanistha (firme e tranquila permanência no Ser), refulgirá
Arunachala-Siva como “Eu-sou-Aquilo”, Consciência, autoefulgente e perfeita.” -
Ramana Maharshi
Todo ser vivente deseja sempre ser feliz e intocável pelo sofrimento; e cada um
tem o maior amor por si mesmo; tal se deve a que a felicidade é a sua real
natureza. Daí que, a fim de realizar essa felicidade inerente e imaculada, cuja
experiência ele diariamente tem quando a mente está submersa em sono
profundo, é-lhe essencial que conheça a sim mesmo. Para obter tal
conhecimento, a indagação “Quem sou eu?”, buscando o Ser, é o meio por
excelência.
“Quem sou eu?” Eu não sou este corpo físico; nem sou os cinco órgãos da
perceção sensorial(a vista, o ouvido, o nariz, a língua e a pele, com suas
correspondentes funções de ver, ouvir, cheirar, degustar e tocar); eu não sou os
cinco órgãos de atividade externa (os órgão vocais que articulam a palavra e
produzem o som, mãos e pés que governam os movimentos do corpo físico,
ânus que excreta as fezes, os genitais que dão lugar ao prazer); não sou as
cinco forças vitais (as quais controlam a respiração, digestão e assimilação,
circulação sanguínea, transpiração e excreção); e nem mesmo a mente
pensante.
Aquilo que se levanta no corpo físico como “eu” é a mente. Caso se investigue
de onde surge o pensamento-eu no corpo, achar-se-á, em primeiro lugar, que é
no Hrdayam (a palavra “Hrdayam” é composta de duas sílabas: “Hrt” e “Ayam”
que significa “Eu sou o Coração”) ou Coração. Este é a fonte e o apoio da
mente. Chegaremos à mesma fonte pelo processo de repetir EU-EU,
continuamente e fixando a mente no coração com firmeza.
Mesmo quando pensamentos vadios surgem durante tal investigação, não tente
completá-los, ao contrário, mergulhe em si mesmo, perguntando: “A quem
ocorreu tal pensamento?”. Não importa quantos pensamentos possam surgir, se
você permanece alerta para, na mesma hora, identificá-los e apontar a quem
eles ocorrem (a “mim”). Se então, você indaga “Quem sou eu?” – a mente
torna-se introvertida e os pensamentos sossegam. Deste modo, se
perseveramos decididamente na prática da auto-investigação, a mente adquire
força crescente e poder para habitar em sua Fonte.
Somente o Atman existe e é real. O mundo, a alma individual e Deus são como
a ilusória aparência de prata na madrepérola, criações imaginárias no Atman.
Eles aparecem e desaparecem simultaneamente. Verdadeiramente, somente o
Ser – é o mundo, o eu e Deus.
Deus e Guru (Mestre) não são verdadeiramente diferentes: eles são idênticos.
Aquele que faz jus à Graça do Guru, será salvo indubitavelmente, e jamais será
esquecido – tal como a presa abocanhada pelo tigre jamais poderá escapar.
Mas o discípulo, de sua parte, deve seguir sem desvios o caminho indicado pelo
Mestre.
É por pura ignorância que nós imaginamos obter felicidade com essas coisas.
Pelo contrário, quando a mente se exterioriza, sofre dor e angústia. De fato,
cada vez que os nossos desejos são satisfeitos, a mente, voltando à sua fonte,
experimenta apenas a felicidade que é natural ao Ser. Do mesmo modo, no
sono profundo no transe espiritual (Samadhi), no desmaio, etc., quando o objeto
desejado é obtido, ou quando o mal recai sobre aquilo que consideramos
indesejável, a mente volta-se para dentro e usufrui aquela felicidade do Atman.
Desta maneira, perambular à toa, esquecendo o Ser, e voltar novamente ao
interior, eis o interminável e enfadonho papel da mente.
Quem age desta maneira – não é sábio. O sábio, porém, jamais abandona a
sombra: do mesmo modo a mente do Sábio Iluminado (Jnani), nunca está fora
do Brahman (o Absoluto).
A mente do ignorante, por outro lado, entrando no mundo fenomenal, sofre dor
e angústia; e, então, votando por instantes a Brahman, experimenta felicidade.
Tal é a mente do ignorante.
O sol nascente não faz qualquer esforço, nem emite desejo ou decisão, mas,
meramente devido a seus raios, as lentes emitem calor, os lotos desabrocham,
a água se evapora e as pessoas entregam-se às suas tarefas na sociedade. Na
proximidade dum magneto, a agulha se move. Mesmo assim, a alma (ou jiva),
sujeita à tríplice atividade de criação, preservação e dissolução, que se
sucedem simplesmente ante a Presença única do Supremo Senhor, realiza os
atos relativos a seu Karma (fruto das ações passadas que brotam na presente
vida) e entra em repouso após tal atividade. Mas o próprio Senhor nada decide;
nenhum ato ou acontecimento toca sequer a fímbria do seu Ser. Este estado de
imaculada distância é semelhante ao do sol que não é tocado pelas atividades
da vida, ou a do todo-penetrante éter, que não é afetado pela interação das
complexas qualidades dos outros quatro elementos.
Todas as escrituras, sem qualquer exceção, proclamam que, para atingir a
Salvação, a mente deve ser subjugada; e, sabendo-se que o controle da mente
é a conclusão final das escrituras, é fútil entregar-se a um interminável estudo
das mesmas. O que se requer para tal controle é que se use imediatamente a
auto-interrogação: “Quem sou eu?”. Como então poderia esta investigação
visando ao Ser, ser feita tão somente através do estudo das escrituras?
Não há duas mentes (uma boa e outra má). Somente as vasanas (tendências
da mente) é que são de duas espécies: boas e favoráveis, más e desfavoráveis.
Quando a mente está associada às favoráveis, é chamada boa; quando ligada
às desfavoráveis, é chamada má.
Ainda que outras pessoas possam parecer malignas, não é conveniente odiá-
las ou desprezá-las. Gosto e desgosto, amor e ódio, devem ser alijados
igualmente.
Não é bom, também, deixar a mente pousar amiúde sobre objetos ou negócios
da vida mundana. Tanto quanto possível deve-se evitar interferir na vida dos
outros.
Se o ego surge, tudo o mais se levanta, se ele desaparece, tudo o mais cessa.
Quanto mais profunda a humildade com que nos conduzirmos, tanto melhor
será para nós. Se mantivermos a mente sob controle, que importância terá o
lugar em que estivermos?
Certa vez um devoto escreveu que “a autorrealização é muito fácil” e deu como
razão que o “Eu é o Ser, nada sendo mais real do que isto”.
AUTOCONHECIMENTO
É usada aqui para indicar e significar o Ser Interno que está além do alcance do
pensamento e da palavra), a Transcendental,
ANNAMALAI SWAMI: o "pequeno eu" é algo que apenas aparenta ser real. Se
você perceber que ele não tem existência verdadeira ele desaparecerá,
permanecendo apenas a experiência do Único e verdadeiro Eu ou Ser.
Compreenda que ele não tem existência verdadeira e ele nunca mais o
incomodará.
A consciência é universal. Não existe limitação ou "pequeno eu" nela.
É apenas quando nos identificamos com ele, com esse "pequeno eu", e
limitamos-nos ao corpo e mente é que esse "pequeno eu" nasce. Se através da
inquirição você for à fonte dele, descobrirá a inexistência dele.[..]
PERGUNTA: Eu não acredito que repetindo "eu não sou a mente, eu sou a
Consciência" irá me convencer que eu não sou a mente. Será outro
pensamento na mente. Se eu pudesse experimentar, nem que fosse por um só
momento, o que estar sem mente, a convicção por certo viria.
Eu penso que experimentar o que é a consciência nem seja por um segundo tal
como ela é seria mais convincente do que anos de repetições mentais.
ANNAMALAI SWAMI: Cada vez que você vai dormir tem a experiência do Ser
sem a mente. Você não pode negar que você existe enquanto dorme, e você
não pode negar que a sua mente não funciona em sono profundo.
Esta experiência diária deve convencer você que é possível continuar a sua
existência sem a mente. É claro que não tem a experiência total da consciência
enquanto dorme, mas se pensar sobre aquilo que se passa durante este estado
deve entender que a sua existência, a continuidade do seu Ser, não é
dependente da sua mente ou da sua identificação com ela.
Quando a mente reaparece de manhã, você instantaneamente salta para a
conclusão, "este é o meu verdadeiro eu". Se refletir nesta preposição durante
algum tempo verá o absurdo que ela é.
Se o que você realmente é apenas existe quando a mente está presente, você
tem que aceitar que você não existe enquanto esteve a dormir. Ninguém
aceitará tal absurda conclusão.
Se analisar os seus estados alternativos irá descobrir que é a sua experiência
direta que você existe quer esteja acordado, a sonhar e em sono profundo.
Também perceberá que a sua mente só está ativa enquanto você está
acordado ou a sonhar. Destas simples experiências diárias será fácil entender
que a mente é algo que aparece e desaparece.
A sua existência jamais é eliminada cada vez que a mente deixa de funcionar.
Eu não estou a falar de nenhuma teoria filosófica; eu estou a falar de algo que
pode validar pela experiência direta a cada vinte e quatro horas da sua vida.
Interiorize estes fatos que pode comprovar pela experiência direta e investigue-
os um pouco mais.
Quando a mente surge a cada manhã, não pule para a usual conclusão, "este
sou eu, e estes são os meus pensamentos." Em vez disso, observe estes
pensamentos que lhe aparecem e depois desaparecem sem se identificar com
eles de maneira nenhuma. Se você resistir ao impulso de reclamar estes
pensamentos como seus, irá chegar a uma surpreendente
conclusão. Descobrirá que você é a consciência na qual os pensamentos
aparecem e desaparecem. Sendo assim você pode se libertar dessa mente.
Como a cobra que se sobrepõe à corda, você irá descobrir que a mente é só
uma ilusão que aparece devido à ignorância ou má perceção.
Você quer uma experiência que o irá convencer que o que eu estou a dizer é
verdade. Pode ter essa experiência se desistir desse hábito do seu longo hábito
de inventar um "eu" que proclama todos os pensamentos como "meus".
Fique consciente de si como somente consciência; observe os pensamentos a
chegarem e a partirem, e chegue à conclusão por experiência direta que você é
a própria consciência, e não seus efémeros conteúdos.
As nuvens aparecem e desaparecem no céu, mas o aparecimento e o
desaparecimento das nuvens não afetam o céu. A sua real natureza é como o
céu, como a vastidão de todo o espaço. Apenas permaneça como a
testemunha, como o céu e deixe as nuvens-pensamentos chegarem e partirem.
Se você cultivar essa atitude de verdadeira indiferença acerca da mente,
gradualmente você cessará de se identificar com ela.
1. A Criação
2. A Preservação
3. A Destruição
4. A Velação (maya)
5. A Graça
Quando maya está totalmente inativa, isto é, quando a identidade com a mente
e com o corpo caiu. Permanece somente a Consciência Pura de Ser.
Quando alguém está estabelecido neste estado, não há corpo, mente ou
mundo.
Estas três coisas são somente ideias que são trazidas para a aparente
existência, quando maya está presente e ativa.
Quando maya está ativa, a única maneira efetiva de dissolver a sua atividade é
o caminho mostrado por Bhagavan. Devemos fazer a Auto-inquirição e
discriminar entre o que é real (permanente) e irreal (transitório). É o poder de
maya que nos faz acreditar na realidade das coisas que não têm absolutamente
realidade nenhuma, a não ser na nossa imaginação.
Se você perguntar, "quais são estas coisas imaginárias?" A resposta
será, "tudo aquilo que não seja o nosso Ser sem forma."
Somente o Ser é real. Tudo o resto é um fingimento da nossa imaginação.
Não ajuda inquirir o porquê da existência de maya e como ela opera. Se você
estiver num barco que se está a fundar, você não vai tentar saber a
nacionalidade de quem fez o buraco no barco, se é inglesa, francesa ou
japonesa. Você só vai tentar tapar a fuga ou sair do barco. Não se preocupe de
onde, como e porquê veio maya à existência. Coloque toda a sua energia em
escapar deste efeito ilusório.
Se tentar investigar a origem de maya com a sua mente, estará condenado a
fracassar, porque qualquer resposta que conseguir obter, será sempre uma
resposta vinda da ilusão (maya).
Se quiser saber como maya opera e se origina você próprio deve se
estabelecer no Ser. O único lugar onde pode se libertar dela. Depois observe
quanto tempo consegue fixar a sua atenção no Ser, até falhar.
PERGUNTA: Você diz que maya é um dos shaktis, o que é que quer dizer com
shakti?
PERGUNTA: Então, seja o que quer que seja que nos aconteça na vida apenas
acontece devido aos nossos anteriores apegos e aversões.
ANNAMALAI SWAMI: Sim.
"Aquele que está pedindo pela paz não é Você. Os pensamentos que vêm e
que vão não são Você. Aquilo que vem e aquilo que vai não é Você. A sua
realidade é a paz. Se não se esquecer disto, será suficiente." - Annamalai
Swami
Annamalai Swami: Sim.
Pergunta: Eu estou perguntando isto, porque eu ouço o som o tempo todo, mas
eu não sei se sinto o "Eu-Eu" no Coração. Existe um sentimento em mim que eu
devia estar me aprofundando mais, então, eu questiono-me: "Qual é o
sentimento do som?" É uma boa prática?
Nesse lugar último, não existe qualquer som, existe somente paz, um pouco
como o estado pacífico e e silencioso que é experimentado durante o sono
profundo. No entanto, a consciência permanece lá. Não é um estado
inconsciente.
A maioria das pessoas não pode ouvir ou não consegue estar ciente desta
subtil vibração interior, porque é abafada pelo ruído físico do mundo exterior e
pelo próprio persistente ruído mental. As únicas pessoas que conseguem ouvir
este som são aquelas em quem os pensamentos desapareceram na sua quase
totalidade. É preciso estar num nível profundo de paz mental, a fim de estar
ciente deste som.
Feche os seus ouvidos mentais e os seus ouvidos físicos, e você vai ouvir essa
vibração sonora durante todo o tempo todo.
Desista dessa identificação e você verá que o Ser está em toda parte. Você vai
vê-Lo, conhecê-Lo e sê-Lo onde quer que vá ou esteja. Tudo é o Ser, incluindo
você mesmo.
Annamalai Swami: Medite: "Eu sou o Ser". Se você fizer isso, a ideia de que
você é o corpo desaparece. "Eu sou o Ser" ainda é uma idéia, e como tal,
pertence a Maya, juntamente com todas as outras idéias. Mas você pode
começar a conquistar Maya, desistindo das idéias totalmente erradas que o
prendem e lhe causam problemas. Como fazer isso? Substitua-as por ideias
que sejam um melhor reflexo da verdade, e que lhe são úteis para conduzi-lo-lo
a essa mesma verdade. Se você quiser cortar ferro, você usa outro pedaço de
ferro.
Numa batalha, se alguém atirar uma flecha em você, você atira uma de volta.
Em Maya, se a flecha de uma má ideia vem a alta velocidade em direção a
você, esquive-se. Não deixe que ela lhe acerte, ou você vai acabar por sofrer.
Esta luta ocorre dentro de Maya, porque na realidade, você é paz e somente
paz. Mas, enquanto você está sofrendo em Maya você pode usar esses
pensamentos como um meio de você mesmo vencer.
Então, eu digo às pessoas: "Este corpo físico não é você; a mente não é você.
Vá além deles para você ver o que realmente está por trás deles.
Isto é feito para fazer as pessoas desistirem das suas ideias incorretas e
limitantes, para que elas possam ter uma experiência direta do que é
verdadeiramente real.
Pergunta: Então, você está dizendo que acreditar que eu sou um corpo e uma
pessoa em particular é puramente imaginação. Ou, melhor ainda, um mau
hábito que eu devia tentar me livrar?
Uma vez, alguém disse-lhe: "Se eu deixar cair este leque, será este um ato que
sempre esteve destinado a acontecer neste preciso momento?"
Presumo que esses atos predestinados são todos ordenados por Deus, e que,
como consequência, nada acontece que não seja pela vontade de Deus, porque
nós, como indivíduos, não temos poder para nos desviarmos do roteiro escrito
por Deus.
Uma pergunta surge a partir disto. Se eu me lembrar do Ser, é a vontade de
Deus? E se eu esquecer-me de lembrar-me em um determinado momento, isso
também é a vontade de Deus?
Ou, tomando o meu próprio caso, se eu fizer um esforço para ouvir a vibração
"Eu-Eu", é a vontade de Deus, ou é o esforço individual?
Isso foi o que Bhagavan disse. Ele disse que você tem a liberdade de se
identificar com o corpo e com as suas atividades, e ao fazê-lo esquecer-se do
Ser, ou você pode se identificar com o Ser, e ter a compreensão de que o corpo
está realizando as suas atividades predestinadas, animado e sustentado pelo
poder do Ser.
Se você tiver uma lâmpada de óleo e se esquece de pôr o óleo nela, a luz
finalmente apagar-se~á. Foi o seu esquecimento e a sua falta de vigilância que
causou o apagar da luz. Os seus pensamentos estavam em outro lugar.
Em cada momento você só tem uma escolha real: estar ciente do Ser ou
identificar-se com o corpo e com a mente. Se você escolher a última, não culpe
Deus ou a vontade de Deus, ou a predestinação. Deus não fez você esquecer-
se do Ser. Você mesmo está fazendo essa escolha a cada segundo da sua
vida.
Você respondeu-lhe dizendo que isso estava correto, mas agora você está
dizendo que o facto de fazermos ou não fazermos a autoinvestigação ou
autoinquirição, não tem nada que ver com o destino.
Remova essa ideia e você irá brilhar como o Ser. Essa é a única coisa que você
precisa fazer nesta vida. Os vários eventos de sua vida - todas as coisas que
vão acontecer com você -, todos eles estão destinados. Mesmo que você não
queira que esses eventos ocorram, eles ainda assim, vão ocorrer, mesmo que
você tente evitá-los. E se você quiser que certas coisas aconteçam e que não
estão escritas no seu destino, elas jamais virão até você.
Não há muita coisa acontecendo neste mundo que nos ajude a lembrar quem
realmente somos.
Annamalai Swami: Sim, você pode dizer que este estado de coisas também é
a graça de Bhagavan, a compaixão de Bhagavan. Você pode dizer que ele
mantém o mundo tal como está, como um incentivo para ir-se para dentro.
Este estado de coisas estabelece uma escolha real da nossa parte: se formos
para o exterior, existem problemas, e se formos para o interior, existe paz.
Às vezes, é mais intensa, mais profunda. A paz e a felicidade são sentidas mais
intensamente em certos momentos. A mente quer mais paz, mais felicidade.
Não se contenta com meramente ouvir ou sentir o Aham sphurana (a emanação
Eu-Eu). Isso está criando um problema para mim? O meu desejo de continuar
com o meu Sadhana está correcto?
Em cada momento eu estou tendo alguma experiência de algo que não muda:
Eu sou o ouvir ou o sentir o Aham sphurana. Mas, existe sempre esse desejo
de ir mais fundo, de sentir mais paz, mais felicidade. Eu não estou satisfeito
com a experiência que estou tendo. Este desejo de fazer mais Sadhana é um
bom desejo, ou é interferir com a Autoconsciência?
Se você estiver no seu estado real, não haverá desejos, nenhum desejo de
empurrá-lo para algum outro estado. Na realidade, não haverá desejo por
qualquer outra coisa, nem nenhuma dúvida persistirá sobre se é necessário
mais alguma coisa. Esse estado último é apenas paz. Não existem quaisquer
desejos e dúvidas nele.
Pergunta: Eu não estou experimentando a paz que o Swami está falando.
Portanto, eu devo ter a necessidade de fazer algo mais.
Pergunta: O problema parece ser eu estar pedindo por essa mesma paz,
desejando-a.
"Faltam-te pés para viajar? Viaja dentro de ti mesmo, e reflete, como a mina de
rubis, os raios de sol para fora de ti" - Rumi
Annamalai Swami foi um discípulo direto de Sri Ramana Maharshi que realizou
o Ser após praticar a autoinvestigação durante décadas. Essa realização última
deu-lhe o Conhecimento em primeira mão de como praticar e realizar a
autoinvestigação com sucesso, tornando assim, os seus conselhos
especialmente valiosos para todos aqueles que buscam a sua verdadeira
natureza.
Annamalai Swami lembrou mais tarde: "Nunca ninguém tinha falado comigo
sobre assuntos religiosos, mas de alguma forma eu sempre soube que havia
um poder maior chamado Deus, e que o propósito da vida era alcançar esse
mesmo Deus. Sem ser ensinado, senti instintivamente que tudo o que eu via na
vida era de alguma forma ilusório e irreal. Estes pensamentos, juntamente com
a ideia de que eu não deveria me apegar a qualquer coisa deste mundo, faziam
parte da minha consciência desde muito novo."
Após dez anos de serviço, Sri Ramana disse-lhe para deixar o ashram e
dedicar-se somente à Autoinvestigação. Ele se mudou para uma casa perto do
ashram, onde praticou a autoinvestigação por décadas e, finalmente, realizou o
Eu (o Ser). Ele morreu em 1995.
PERSISTÊNCIA
Isto não é um caminho diferente. É somente mais uma descrição daquilo que
acontece quando você pratica a autoinvestigação ou quando você encontra a
fonte da respiração através da observação intensa. "Mergulhar no interior"
significa colocar toda a sua mente no Ser (Eu-Consciência). Isto é, quando a
intensidade unidirecional da nossa atenção para descobrir o Ser estiver bem
presente, o mergulho naturalmente acontece e a mente regressa à sua origem e
se funde lá.
Se você quiser ir para a América, e se você tiver alguém que lhe diga onde é e
como chegar lá, essa pessoa não vai transportá-lo magicamente até esse
lugar. Você tem que ir até ao aeroporto e pegar o avião.
Você tem que seguir as instruções que o Guru lhe deu até você perceber e
realizar a verdade por si mesmo. A Graça leva-nos até ao Guru. A Graça
mostra-nos o Caminho para casa, guiando-nos na direção correta, mas somos
nós que temos que fazer o trabalho por nós mesmos.
Pergunta: A minha pergunta não é tanto sobre a Graça em si. É sobre esta
Corrente-Eu sobre a qual eu tenho lido. É fruto da Graça de Ramana? É fruto
da graça do Ser? Eu não conheço a resposta a esta pergunta, mas eu sinto
esta corrente muito fortemente dentro mim.
Annamalai Swami: Ele não queria que a energia mental escapasse pela boca.
Os cinco sentidos estão sempre se movendo para fora numa tentativa de
envolverem o mundo. A boca é um dos canais através do qual os cinco sentidos
se movem para fora na direção do mundo. Quando a mente e a respiração
estão contidas, quando energia mental não está movendo-se para fora para se
envolver com o mundo e com os seus objetos, a mente começa a voltar à sua
fonte ou origem (o Ser). Aos dezasseis anos de idade, Bhagavan pode não ter
sabido disso, mas foi isso efetivamente o que aconteceu.
Essa experiência de morte foi algo que aconteceu com ele. Isso não ocorreu
como resultado de algo que ele conscientemente tenha feito.
Annamalai Swami: Você diz que não está obtendo a resposta correta. Quem é
esse "você?" Quem não está recebendo a resposta correta?
"Tudo aquilo que vemos nesta sala, por exemplo, aquela fotografia ali de
Bhagavan Ramana Maharshi, é irreal. Não tem mais realidade do que os
objetos que percebemos em nossos sonhos. Nós pensamos que vivemos num
mundo real, materialmente substancial, e que as nossas mentes e os nossos
corpos são entidades reais que se movem nele. Quando o Ser é reconhecido,
todas essas ideias se desvanecem e somos deixados com o conhecimento: Só
o Ser existe" - Annamalai Swami
A MATURIDADE ESPIRITUAL | ANNAMALAI SWAMI
"Arunachala é como fogo. Se você aproximar-se dela você vai sentir o seu
calor, acredite nisso ou não" - Bhagavan Ramana Maharshi
A MATURIDADE ESPIRITUAL
Annamalai Swami: Sim.
Pergunta: O que acontece no seu estado de sono profundo? Ele é igual para
você quando está neste estado de vigília?
Annamalai Swami: Sim
Todos aqueles que realizaram o Eu estão no mesmo estado de paz, que está
além da mente. Embora a experiência do Eu seja a mesma para todos, também
é verdade que alguns Jnanis acabam ajudando muita gente, enquanto outros,
que são igualmente iluminados, acabam ajudando um número muito mais
reduzido de pessoas.
Alguns Jnanis nem sequer ensinam. Esses vivem vidas comuns e, raramente,
ou mesmo nunca, são reconhecidos pelo que verdadeiramente são. A água
pode estar num poço ou num rio. A água é a mesma, mas uma fonte de água
pode saciar a sede de mais pessoas do que uma outra. Uma pequena lâmpada
pode iluminar um quarto, enquanto outra maior pode iluminar uma rua inteira.
Bhagavan, era uma dessas grandes e encandeantes luzes, que podem iluminar
uma grande área. Ele guiou e trouxe luz a muita gente.
Pergunta: O Swamiji está dizendo que alguns Jnanis são grandes lâmpadas e
que outros são pequenas lâmpadas. As pequenas lâmpadas podem tornar-se
maiores, ou por outro lado, mantêm-se sempre na mesma?
Annamalai Swami: A qualquer lâmpada que você se dirija, a sua luz é sempre
a mesma. Esta história das lâmpadas é apenas um exemplo. O que eu estou a
tentar dizer é que, apenas poucos seres têm a capacidade de guiar um grande
número de pessoas em direção à verdade. Realizar a verdade é uma coisa,
mas guiar outras pessoas em direção a ela é outra coisa. Os Jnanis não são
todos igualmente capazes no que diz respeito a guiarem outros.
Debaixo da terra existe água por todo o lado, mas existem alguns lugares que é
muito fácil chegar até ela. Da mesma maneira, o Eu está presente em todos os
lugares. Não existe nenhum lugar em que o Eu não esteja, mas também é
verdade que existem certos lugares e certas pessoas em que é muito mais fácil
sentir o Eu. Nas proximidades de Arunachala, a presença do Eu é mais
poderosa e mais autoevidente do que em outros lugares. Contudo, a
grandiosidade desta montanha não pode ser explicada por palavras.
Nós costumamos dizer: "Eu dormi que nem um bebé." Mas, se alguém pedir-lhe
para explicar por palavras a felicidade sentida nesse estado, o que você poderá
dizer? Você pode experienciar esse estado, mas você não poderá explicá-lo
satisfatoriamente. Assim também acontece com o Eu. Você pode experienciá-
Lo, você pode "tornar-se" o Eu, mas você não pode explicar esse Estado por
palavras. O Mesmo pode-se dizer acerca de Arunachala. Você pode
experienciá-la, mas você não pode explicar de forma satisfatória esse
fenómeno.
Na mitologia indiana nós temos uma árvore dos desejos. Se você encontrar
esta mesma árvore e contar-lhe o que você deseja, o seu desejo será
concedido.
Arunachala também tem essa reputação. É por isso que tanta gente vem para
cá durante a noite de lua cheia e caminha ao redor da montanha. Mas, muito
poucas pessoas vêm cá e pedem por iluminação ou por paz imperturbável do
Eu. Todos os seres estão, num último sentido, procurando por essa mesma paz
imperturbável do Eu, mas quem pede por essa paz aqui? Muito poucas
pessoas. Se você estiver preparado para recebê-la, Arunachala vai conceder-
lhe essa paz imperturbável.
Essa paz já está dentro de nós, mas as pessoas não sabem apreciá-la, então
elas partem para procurá-la em muitos lugares distantes, em locais exteriores.
Ele uma vez disse: "Arunachala é como um fogo. Se você aproximar-se dela,
você vai sentir o calor dela, acredite nisso ou não." Eu também ouvi-o dizer uma
vez: "Se você caminhar ao redor desta montanha, ela vai dar-lhe a sua graça,
mesmo que você não
queira."
Pergunta: Eu li algures que Bhagavan disse que os Jnanis têm o poder de ligar
a mente individual ao Eu supremo.
Annamalai Swami: Esses Jnanis que não têm discípulos, podem parecer que
não estão a ajudar ninguém, mas o seu poder, o poder da sua realização, tem
um efeito extremamente benéfico sobre todos os seres. É verdade que alguns
Jnanis partem sem terem ensinado ninguém diretamente. A vaca Lakshmi e a
mãe de Bhagavan são exemplo disso.
"Pergunta: (...) Porque não consigo ver claramente o Ser? Porque está ele
escondido de mim?
Annamalai Swami: Porque você está olhando na direção errada. Você tem a
ideia de que o Ser é algo que você vê ou experiencia. Isto não é assim. O Ser é
a consciência na qual a visão e a experiência ocorrem. Se as pessoas
estivessem conscientes da consciência, em vez de nas formas que aparecem
nela, elas iriam perceber que todas as formas são apenas aparências que se
manifestam dentro da única consciência indivisível. Essa consciência é o Ser
que você está procurando. Você pode ser essa consciência, mas você nunca
poderá vê-la, porque ela não é algo que esteja separado de você"
O ANSEIO
Pergunta: Então, não é algo que aconteça subitamente, tal como um big bang?
Pergunta: As minhas dúvidas não são o meu único problema. Eu penso que o
meu desejo pelo Eu não é muito forte. Isso é que preocupa-me muito.
Se você tirar o leite da vaca, ele nunca mais vai voltar para a vaca novamente.
Da mesma forma, se você estabelecer-se firmemente no Eu, você nunca mais
voltará à ignorância novamente.
Annamalai Swami: O que quer que esteja a acontecer, inquira: "A quem tudo
isto está a acontecer?" faça isto e regresse ao seu Eu, que é paz.
Pergunta: Eu pensei que este anseio era um ponto positivo a meu favor. Não é
uma ajuda importante ter este anseio?
Pergunta: A quem surge esta intensidade de realizar o Eu? Tem que surgir ao
"eu" que no final tem que desaparecer.
Tudo é o Eu. Você não está separado do Eu. Tudo é você. O seu verdadeiro
estado é o Eu, e nesse Eu, não existe nenhum corpo ou nenhuma mente. Esta
é a verdade, e você somente conhecerá essa verdade ao sê-la. Esta ideia: "Eu
sou o corpo" é falsa. Esta falsa ideia deve desaparecer e a convicção: "Eu sou o
Eu", deve surgir em você e tornar-se constante.
Neste momento, a ideia: "Eu sou o corpo", parece muito natural para você.
Você deve trabalhar ou praticar até ao ponto onde "Eu sou o Eu", torne-se
natural para você. Isso acontece quando a ideia errada de você ser um corpo
desaparece. E quando você pára de acreditar que essa ideia seja verdadeira,
ela desvanece-se tal como a escuridão desaparece quando a luz do sol
aparece.
Quando esta vida onírica termina e uma nova vida onírica começa, não existe
nenhum conhecimento da nossa parte que ambos os sonhos estão
acontecendo dentro do sonho subjacente do Samsara.
Annamalai Swami: Quem que teve a depressão não foi você. A sua verdadeira
natureza é paz. Não se identifique com a mente nem com estados depressivos
que ela produz. Você não é nada disso.
Eu posso dar-lhe outro exemplo, quando você corta certos frutos com as suas
próprias mãos, existe neles um líquido leitoso e pegajoso que se agarra aos
seus dedos e que torna-se muito difícil de retirar. Você demorará horas a
esfregar os seus dedos até conseguir retirar deles essa espécie de cola. Mas,
se você colocar um pouco de óleo nos seus dedos antes de abrir esses frutos,
esse líquido leitoso já não o incomodará, porque já não conseguirá colar-se aos
seus dedos oleosos.
Sri Bhagavan frequentemente dizia: "Ao fazer o seu trabalho, não tenha a ideia,
'Eu estou fazendo este trabalho'. Se você puder manter essa atitude, o trabalho
não será um fardo, e nenhum problema irá tocá-lo.
Há uma história sobre uma cobra que vivia sob um arbusto paralelo a uma rua.
Sempre que as pessoas passavam perto do arbusto, a cobra fazia muito
barulho e tentava mordê-las. Ela trouxe muitos problemas para quem quer que
se aproximasse dela.
Em poucos dias, as pessoas locais perceberam que a cobra já não era mais
uma ameaça para elas, mas em vez de sentirem-se aliviadas, elas começaram
a atirar pedras sobre a cobra e depois começavam a persegui-la.
As pessoas costumam ter esta resposta instintiva às cobras. Sempre que veem
uma, sentem-se compelidas a cometer algum ato de violência contra ela. A
cobra ignorou as provocações por algum tempo, mas logo percebeu que este
novo estado de coisas na sua vida não constituiu nenhuma melhoria na sua
vida.
Alguns dias depois, o Sadhu voltou e perguntou à cobra como é que o seu novo
estilo de vida estava correndo. "Não tão bem", respondeu-lhe a cobra. "Eu estou
a sofrer muito devido ao seu conselho. Eu tenho andado muito calma e eu não
estou causando nenhum problema para ninguém, mas por causa deste meu
novo comportamento, as pessoas estão aproveitando-se de mim, atiram-me
pedras e atormentam-me continuamente. Elas não faziam isso antes, porque
elas sabiam que eu poderia retaliar e mordê-las. O Sadhu pensou sobre tudo
isso durante algum tempo e depois falou: "Eu aconselhei-te a seres calma e a
não incomodares ninguém, mas isso não significa que tenhas que enrolar-te
aqui passivamente enquanto as pessoas aproximam-se de ti e machucam-te.
Quando perceberes que as pessoas vêm para causar-te problemas, apenas
finge que estás pronta para atacá-las e para mordê-las.
Você pode mostrar-se zangado no exterior, mas no seu interior você pode
permanecer calmo. A partir desse momento, a cobra adotou a nova tática de
sibilar para todos que passassem pelo seu arbusto, somente para que eles
percebessem que ela ainda era uma potencial ameaça. Isto foi o suficiente para
fazer com que as pessoas a continuassem a respeitá-la.
NOTA:
Sattva
Ser, existência ou entidade, tem sido traduzido por equilíbrio, ordem e pureza.
Este guna implica que uma pessoa com tendências sáttvicas tenha um estado
mental positivo e coerente. Psicologicamente é afetuosa, calma, desperta,
altruísta e lúcida. Tem grande amor pela meditação, filosofia e atividades
espirituais.
Rajas
Tamas
"Maya pode parecer real, ter uma existência verdadeira, mas ela é uma falsa
aparência. A verdade sobre Maya é: Ela não é real. Maya não tem existência
absolutamente nenhuma" - Annamalai Swami
"A aparente realidade do mundo é uma ilusão. É apenas uma perceção errada.
Quando a mente percebe uma cobra onde na realidade há apenas uma corda,
isto é claramente um exemplo dos sentidos projetando uma imagem imaginária
(A cobra) sobre um substrato real (A corda). Isto, em grande escala, é como a
aparência irreal do mundo é projetada pela mente e pelos os sentidos sobre a
realidade subjacente do Eu" - Annamalai Swami
"O que quer que nós vejamos nesta sala, por exemplo, aquela foto do
Bhagavan, é irreal. Não tem mais realidade do que os objetos que percebemos
em nossos sonhos. Nós pensamos que vivemos em um mundo real,
materialmente substancial, e que as nossas mentes e os nossos corpos são
entidades reais que se movem em torno dele. Quando o Eu é percebido e
conhecido, todas estas ideias desvanecem-se afastado e apenas uma
permanece com o conhecimento: Apenas o Eu realmente existe" - Annamalai
Swami
"Quando eu digo, "Medite no Ser" eu estou lhe pedindo que você seja o Ser,
não que pense nele. Esteja consciente do que permanece quando os
pensamentos param. Esteja consciente da consciência, que é a origem de
todos os seus pensamentos. Seja essa consciência. Sinta que isto é o que você
realmente é. Se você fizer isto você está meditando no Ser" - Annamalai Swami
FIQUE QUIETO | PAPAJI
Fique quieto.
Fique quieto.
Fique quieto.
Eu peguei esta manhã este tópico, porque recebi algumas cartas do ocidente,
de quem viu áudios e vídeos cassetes. Então, isto trouxe-me à falar nisso que
eu frequentemente falo.
Este homem da Alemanha disse: `Apesar de nós não termos nos encontrado
fisicamente, suas palavras no vídeo que eu vi, as palavras eram “Fique quieto,
fique quieto, fique quieto”. Eu não posso nem falar do efeito dessas palavras, e
o que aconteceu após eu tê-las ouvido. Então, esta quietude da qual eu nunca
havia lido em nenhum dos livros, que eu tenho visto por toda minha vida.” E ele
disse: “ Os professores também não se utilizam dessa palavra, e isto é de tal
força, que teve um tremendo efeito sobre mim, e eu fiquei quieto”. Então nós
falaremos nisto, o que é esta quietude, como tê-la ou pratica-la. [...]
Todo mundo, qualquer um, quer desfrutar dos objetos dos sentidos. Isso
envolve todos, todos os seres estão envolvidos em gozar dos sentidos. Talvez
vendo, ouvindo, cheirando, tocando, saboreando, isto é tudo. Então como
desapegar nossa mente destas coisas? E como isto pode trazer quietude?
Quando você souber, que todos estes objetos, não lhe trazem
nenhum descanso ou paz. Então mais e mais, pense nisto, isto que eu tanto
gosto, não me dá real satisfação. Mais e mais, eu quero repeti-la; novamente,
eu quero repeti-la, mas ainda eu não consegui paz. Você está criando uma
espécie de desgosto com isso, com esses objetos.
Agora você quer desapegar-se dessa coisas, porque elas não lhe deram paz
ou relaxamento. Um santo Telegu, um santo-poeta muito famoso de 500 anos
atrás. Seu nome era Tyagaraja. O pessoal que se interessa por música
conhecem muito bem esse nome, Tyagaraja, o rei dos músicos cantores, o rei
dos músicos. Ele também disse “sianta malaika sowkya malaidu”, isto é em
Telegu. “Quando não há quietude, nem o reinado pode dar-lhe felicidade”. Isso
é o que ele diz, quando nós sabemos que os objetos sensoriais não vão trazer-
nos permanente felicidade, nós vamos lentamente retirando nossa mente
desses objetos. Continuamente, até nos Vedas isto é declarado, “yatra yatra
manayadhi,tatra tatra samadhyd”—Sempre que a mente entra em contato com
objetos sensoriais, traga-a de volta, traga-a de volta para a paz, traga-a de
volta para a quietude. Acalme-a, onde quer que ela for, sempre que ela for, seja
muito cuidadoso e traga-a de volta, porque você tem visto que estes objetos
sensoriais não trazem paz para você.
Então isto deve correr junto, ambos. Desejo por liberdade, desapego dos
sentidos. E seu foco nisso, em Brahman, desejo por realização da iluminação,
aqui e então refletindo sempre daqui para aqui;
Há o desejo, então deseje uma vez, e uma vez que esse desejo tenha vindo a
sua mente. Você deve ter despendido milhões de anos para que esse desejo
por liberdade tenha surgido em sua mente. Então, ouça isto, e então reflita
sempre sobre isto, medite nisto. Este processo deve continuar. Sempre. Porque
algumas pessoas dizem :”O que acontecerá quando nós retornarmos para
casa? Aqui nós estamos bem, porque nós ouvimos todo dia”
A reflexão deve continuar, sempre, você vê. E então, quando você senta onde
quer que seja, medite no Self, em Brahman, na Verdade, na Paz, em Shanti.
Então sempre você estará envolvido com isto.
Entre os amigos você fala sobre isto. Esta é a forma que você deve expender
seu tempo neste Universo. E aqueles que não podem fazer isto, eles terão que
esperar.
Aqueles que instantaneamente captam este instante, eles tem uma tremenda
montanha tão larga quanto as montanhas do Himalaia; estes são os méritos de
vir ao Satsang. E aqueles que estão aqui, eles querem escapar e eles querem ir
a algum outro lugar. Isto significa, que em suas prévias vidas, algo não foi muito
bom. São necessidades do Karma, que os levarão a um próximo nascimento.
Eu não sinto falta deles. Este é o peso do karma. Eles devem trabalhar mais,
outras encarnações, isto não importa. Você pode ficar um pouco mais. Mais
tarde você deve chegar aqui no Satsang, não é a primeira vez que eles vêem
para Lucknow. Eles já tem méritos, já tiveram milhares de encarnações seja lá
onde estiveram. Isso é que os trazem para sentar aqui em Satsang. Então,
muito poucos, não tem importância. Outros terão que esperar. Por essa razão,
isto não funciona. Todos os santos tem declarado, que voce precisa de karma,
bons karmas, realizado Satsangs em varias encarnações, por essa razão agora
você chegou aqui para Satsang, para aquietar. Até Buddha teve, ele disse, ele
teve milhares de encarnações. Ele fala sobre suas muitas encarnações para
Ananda. Então, neste tempo, última vida finalmente quando ele nasceu
Gautama, como Siddharta, ele decidiu, ele decidiu intantaneamente ficar quieto.
Uma visita fora do templo, doenças, velhice, morte, foi suficiente.
Isto é o que eu falo de desapego dos prazeres sensoriais. Uma volta por aí,
e imediatamente a decisão: “ Não, eu não quero este tipo de vida”. Retorna para
casa.
Agora, outra espécie de desapego, isto é o que os santos tem falado, que é o
melhor apego para os homens: casa, esposa, filho, isto é tudo, o santo Tukaram
disse: “ Observe o apego: casa, esposa, filho”. Todo tipo de apego, ele chama
esposa, não há maior apego para um homem. E para a mulher: o marido, a
mesma coisa; ou prosperidade. Como você chama isso: casa, desejo pelo
Mundo, Samsara. Filho, o maior desejo do homem, para continuar
sua linhagem. Então essas três palavras mencionadas por Tukaram
compreende toda a coisa. Assim como Buddha acordou, retorne. Ele viu a
natureza da vida, afastou-se dos apegos: esposa, filho, palácio e saiu fora.
Fique quieto agora, embaixo da Arvore Bodhi, fique quieto. Isso foi o que
Buddha experienciou nesta vida e ele estava livre. Isto é ficar quieto. Kabir,
outro santo poeta também disse: “Acalme sua mente, sua fala, seu intelecto e
depois...” Que tópico! (risada)
PRESENÇA | RAMANA MAHARSHI
"Se um homem conhece a si mesmo, então conhece os outros seres e a Deus.
O que é o meu ego? É a minha mão, ou o meu pé, a minha carne ou o meu
sangue, os meus músculos ou os meus tendões? Reflita profundamente e se
dará conta que não há tal coisa como “eu”. Se você descascar uma cebola,
notará que ela é formada de várias camadas e não contém nenhuma semente.
Do mesmo modo, analisando o ego, verá que não existe nenhuma entidade que
você possa chamar “eu”. Essa análise lhe convencerá de que a substância
última é Deus. Quando o egoísmo desaparece, a Divindade se manifesta." -Sri
Ramakrishna
PRESENÇA
RAMANA MAHARSHI: O Ser é o livro real. Você pode olhar para qualquer
lugar Nesse livro; Ninguém pode tirar isso de você. Sempre que você estiver
disponível, volte-se para o Ser. Posteriormente, você pode ler o que quiser.
O próprio corpo é uma doença. Desejar uma longa permanência nessa doença
não é o objetivo do Jnani [aquele que realizou o Ser]. De qualquer forma, é
preciso desistir da identificação com o corpo. Assim, como a consciência "eu
sou o corpo" impede que se obtenha o autoconhecimento, da mesma forma,
alguém que tenha a convicção de que não é o corpo se libertará, mesmo que
não o deseje.
OS ENSINAMENTOS DE SRI RAMAKRISHNA | OS
HOMENS DE MENTE MUNDANA
1. Os homens são de duas classes: aqueles que o são só de nome (manush) e
aqueles que estão despertos (man-hush). Somente os que têm sede de Deus
pertencem à segunda classe; aqueles que estão enlouquecidos pela “luxúria e
ouro” são homens comuns, homens só de nome.
2. Como uma mesma máscara pode ser levada por várias pessoas, assim há
várias espécies de criaturas que são humanas só de aparência. Embora todas
elas tenham forma humana, algumas são como tigres famintos, outras como
ursos ferozes e há também os que são como astutas raposas ou venenosos
répteis.
4. Há pessoas que não têm nada no mundo que possa prendê-las, no entanto,
elas mesmas acreditam em apegos e ligações, pois não querem e nem
apreciam a liberdade. Por exemplo, um homem que não tem família ou parentes
para sustentar, geralmente cuida de um gato, um macaco ou um cachorro e
assim “satisfaz sua sede de leite, bebendo só o soro”. Tal é a armadilha que o
feitiço de maya estende aos homens.
5. O terneiro é alegre e cheio de vida. Corre e salta o dia todo e só fica quieto
nos momentos em que vai mamar. Mas quando se amarra uma corda no seu
pescoço, se acalma pouco a pouco e seu olhar se torna triste e abatido. Do
mesmo modo, um rapaz que ainda não tenha se interessado por assuntos do
mundo é alegre e despreocupado. Quando, por outro lado, é amarrado com o
forte nó do matrimónio e começa a sentir a responsabilidade da família, toda
sua alegria desaparece. Seu olhar reflete abatimento e ansiedade, seu rosto se
torna pálido e profundas rugas sulcam sua fronte. Feliz daquele que pode ficar
como uma criança durante toda a sua vida, livre como o ar da manhã, fresco
como uma flor recém-aberta e puro como uma gota de orvalho.
8. Um homem mundano se conhece facilmente por sua aversão a tudo o que
tenha sabor de religião. Não só lhe desgosta a música ou hinos sagrados, como
também trata de dissuadir aos demais para que não os escutem. Um homem
assim ri das orações e ridiculariza a sociedade religiosa e os homens piedosos.
11. O coração de um homem mundano é como o cabelo eriçado. Por mais que
seja tratado, não consegue ficar liso. Do mesmo modo o coração de um
malvado não se purifica facilmente.
13. O oleiro faz as vasilhas com argila sem cozer, mas nada pode fazer com a
argila que tenha sido cozida. Do mesmo modo, o coração que foi queimado no
fogo dos desejos mundanos, não se influencia com sentimentos elevados, nem
se pode dar-lhe uma bela forma.
15. Como um cravo não penetra em uma pedra mas entra facilmente na terra,
assim os conselhos dos santos não produzem nenhum efeito na mente das
pessoas mundanas, mas penetram profundamente no coração dos crentes.
16. A argila branda pode ser modelada facilmente, mas não ocorre o mesmo
com a pedra dura. Do mesmo modo, a sabedoria Divina se imprime no coração
de um devoto, mas não penetra na alma ligada.
17. Como a água debaixo de uma ponte entra por um lado e sai pelo outro,
assim os conselhos religiosos recebidos pelas pessoas mundanas lhes entram
por um ouvido e saem pelo outro, sem deixar nenhuma impressão.
22. Um homem não pode renunciar, embora o deseje, se for impedido pelos
karmas (impulsos da vida passada) que estão frutificando na vida presente, ou
as impressões que foram deixadas em sua mente pelas ações passadas. Certa
vez um yogui disse a um rei que se sentasse para meditar a seu lado. O rei
respondeu: “Não, isso não pode ser. Eu posso sentar-me perto de você, mas a
sede de prazeres mundanos ficará tão viva como sempre, em minha mente.
Como estou destinado a gozar, se ficar perto deste bosque, talvez um reino se
levantará aqui”.
25. O ferro tem cor vermelha viva, quando está em brasa, mas ao tirá-lo do
fogo, volta a ter a cor escura de antes. Do mesmo modo, os homens mundanos
se sentem cheios de sentimentos religiosos quando se encontram em um
templo, ou em companhia de pessoas espirituais, mas se perdem tal companhia
ou se afastam o templo, toda sua devoção de desvanece.
26. As moscas pousam ora sobre as oferendas dedicadas à Deidade, ora sobre
úlceras ou imundícies. De igual modo, a mente do homem mundano se ocupa,
em momentos, de tópicos religiosos, mas em seguida, tornam a mergulhar nos
prazeres da luxúria e da riqueza.
32. Um fósforo molhado não acende por mais que se esfregue. Pode somente
fazer fumaça. Por outro lado, um fósforo seco se acende com a menor fricção.
O coração de um verdadeiro devoto é como um fósforo seco: somente a
menção do nome do Senhor acende nele o fogo do Divino amor. Pelo contrário,
a mente mundana, molhada como está de luxúria e apego pelas riquezas,
resiste a toda fricção, como o fósforo húmido. O fogo do Divino amor não
acende nele, embora se fale muitas vezes de Deus.
34. Como um espelho sujo não reflete os raios de sol, assim o coração impuro,
enredado pela maya, nunca percebe a glória do Senhor. Mas o coração puro vê
a Deus, como o espelho limpo reflete o sol.
36. Pergunta: Por que os homens mundanos não abandonam tudo para buscar
Deus? Resposta: Pode um ator, quando está em cena, tirar sua máscara? Os
homens mundanos estão representando, agora, seus respetivos papéis, mas a
seu devido tempo se despojarão de sua falsa aparência.
37. A alma de uma pessoa totalmente mundana é como o verme que vive e
morre no esterco, sem ter nem sequer uma ideia de algo melhor. A alma com
menor mundanidade, é como a mosca, que uma vez pousa sobre as sujeiras e
outra sobre o açúcar. Por outro lado, uma alma liberta é como a abelha, que só
suga o mel e não gosta de nenhuma outra coisa.
38. O jacaré tem a pele invulnerável e não pode ser morto, a menos que seu
ventre seja ferido. Do mesmo modo, o homem mundano é impermeável aos
bons conselhos e não compreende sua verdadeira situação, a menos que se
afaste dos objetos que o mantém ligado.
(d). Os kripa-siddhas; são os que obtêm a perfeição pela graça de Deus. Como
um homem, ao penetrar em um bosque, descobre um tanque ou uma antiga
casa e não necessita se incomodar em construí-los. Assim, algumas pessoas
afortunadas obtêm a perfeição com muito pouco esforço de sua parte.
6. Há algumas pessoas que já estão despertos. Eles têm certas características.
Não lhes interessa ouvir ou falar de coisa alguma que não se relacione com
Deus. São como o pássaro chataka que só anseia pela água da chuva, mesmo
que os sete mares, o Gangá, o Yamina e todos os demais rios estejam cheios
de água. Embora sua garganta esteja abrasada pela sede, o chataka não bebe
outra água que não seja a da chuva.
11. Qual é o estado que um siddha (homem perfeito) alcança? Assim como uma
batata ou uma berinjela amolece depois de siddha 1 (cozida) assim, quando se
chega ao estado de siddha, se torna terno e humilde. 1. Há aqui um jogo de
palavras, pois siddha, em bengali, tem dois significados: “homem perfeito” e
“bem cozido”.
Algumas características da perfeição espiritual
13. Uma vez Sri Ramakrishna disse a Keshab Chandra Sem: “Se avançar um
pouco mais e pregar doutrinas cada vez mais elevadas, sua ‘seita’ se fará em
pedaços. No estado de gñana, a formação de seitas não tem sentido e é algo
tão enganoso como o sonho”.
17. É certo que quando o devoto realiza Deus deseja contemplar Seu “jogo”
(lila). Quando Ramachandra entrou na cidade dos rakshasas (demônios),
depois da destruição de Rávana, a anciã Nikasha (mãe de Rávana) quis fugir.
Lakshmana disse: “Que é isto, Rama? Nikasha é tão velha e sofreu tanto pela
morte de seus filhos, no entanto teme perder a vida e foge!”. Rama tratou de
tranquilizar Nikasha e lhe perguntou o porquê de sua fuga. Ela respondeu: “Oh!
Rama! Porque eu vivi muitos anos, pude ver muitos de Seu ‘jogo’. Portanto,
quero viver mais tempo e, assim, poder mais de Seu ‘jogo’”.
18. Pode haver maya em uma alma emancipada? As jóias não podem ser feitas
com ouro puro. É necessário ligá-lo com outro metal. Enquanto o homem tiver
corpo deve ter também algo de maya, pelo menos o suficiente para permitir que
o corpo continue desempenhando suas funções. Um homem completamente
desprovido de maya não pode sobreviver mais do que vinte e um dias.
19. Quando uma cabra é decapitada seu corpo se move por certo tempo, dando
sinal de vida. De modo semelhante, quando o homem perfeito perde o
ahamkara (egotismo), decai o suficiente para poder cumprir com as funções da
vida física. Mas não é suficiente para atá-lo novamente ao mundo.
20. O corpo nasce e deve morrer. Mas não há morte para a alma. Quando a noz
de betel está madura, o caroço se separa da casca, mas é muito difícil separá-
la quando está verde. Quando se realiza Deus, alvorece a consciência de que a
alma está separada do corpo.
21. Quando Jesus foi crucificado pelos judeus como pode pedir, apesar de Seu
sofrimento, que eles fossem perdoados? Se uma casca de coco comum é
perfurada por um cravo, este penetra na polpa da fruta. Mas no caso de uma
noz ou amêndoa seca, o caroço se separa da casca e esta pode ser perfurada,
sem tocar o caroço. Jesus era como uma noz seca. Sua alma estava separada
de sua casca física. Em consequência, os sofrimentos do corpo não O
afetavam. Embora Sua carne estivesse atravessada pelos cravos, Ele pode orar
com serena tranquilidade para o bem de Seus inimigos.
26. O vento leva tanto a fragrância do sândalo como o mau odor da carniça,
mas não se mistura com nenhum deles. Do mesmo modo a alma emancipada
vive no mundo sem misturar-se com ele.
27. O ferro, depois de ter sido convertido em ouro pelo toque da pedra filosofal,
pode ser guardado debaixo da terra ou atirado em um monte de lixo. Continuará
sempre sendo ouro e não voltará a sua condição anterior. Muito semelhante é o
estado do homem cuja alma tenha tocado, mesmo que somente uma vez, os
pés do Senhor Todo Poderoso. Ainda que viva no burburinho do mundo ou na
solidão do bosque, nada poderá contaminá-lo.
28. O leite se mistura rapidamente com a água ao estar em contato com ela.
Mas ao convertê-lo em manteiga, já não se misturará com a água, mas flutuará
sobre ela. Do mesmo modo a alma, uma vez que alcance o estado de Deus,
pode viver constantemente em companhia de inumeráveis indivíduos não
regenerados sem ser afetada o mínimo por seu contato.
29. O bem e o mal não podem ligar aquele que realizou a unidade da natureza
e de seu próprio ser com Brahman.
33. Uma vez uma sannyasini (monja) foi à Corte do rei Janaka. O rei se inclinou
ante ela sem levantar os olhos. Notando isto a sannyasini disse: “É muito
estranho, oh Janaka, que o senhor tenha tanto temor à mulher!”. Quando
alguém alcança o pleno Conhecimento (gñana), sua natureza se torna como a
de uma criança e não vê nenhuma diferença entre homem e mulher.
34. Mas estes leves defeitos não têm muita importância no caso de um gñani. A
lua tem manchas, mas estas não a impedem de dar a luz.
35. Uma espada de aço, quando toca a pedra filosofal, se torna ouro e embora
conserve a forma anterior, não pode causar dano como antes. Do mesmo
modo, a forma externa do homem que alcança tocar os pés de Deus não muda,
mas ele já não pode causar nenhum mal.
40. Uma jovem recém-casada, enquanto não for mãe fica muito absorvida pelos
deveres domésticos. Mas logo ao ter um filho começa a se descuidar dos
afazeres menores, não encontrando prazer neles. Em troca mima o recém-
nascido durante o dia todo e o beija com intenso júbilo. Do mesmo modo o
homem, em seu estado de ignorância, se ocupa incessantemente de toda
espécie de trabalho, mas quando vê Deus em seu coração não encontra mais
prazer naquele. Pelo contrário, sua felicidade, então, consiste somente em
servir a Deus e fazer Sua vontade. Já não sente satisfação em nenhuma
espécie de trabalho e não pode subtrair-se do êxtase da divina comunhão.
41. Quando se realiza Deus, o mundo nunca parece vazio. Aquele que alcançou
Deus vê que o Senhor mesmo é quem se converteu no Universo e todas as
criaturas. Um homem assim, quando alimenta seus filhos sente como se desse
de comer a Gopala (nome de Krishna criança) em pessoa; vê Deus em seus
pais e os serve com o mesmo espírito. Acontece que um homem vive no mundo
e vive uma vida doméstica, mas depois de realizar Deus, seguramente não
poderá mais ter nenhum contato físico com sua esposa. Ambos se tornam
amantes de Deus e passam suas vidas em oração e devoção. Servem a todas
as criaturas e como Deus está em todos os seres, eles O adoram em tudo.
OS ENSINAMENTOS DE SRI RAMAKRISHNA ૐ | O QUE
É ESSENCIAL NA VIDA ESPIRITUAL
1. Se uma pessoa que está possuída por um mau espírito dá-se conta disse, o
mau espírito a abandona de imediato. Do mesmo modo, quando o jiva que está
possuído pelo mau espírito de maya se dá conta de seu estado de cativeiro,
nesse mesmo momento se liberta de maya.
2. Somente entra no reino dos Céus aquele que não é um ladrão de seus
próprios pensamentos. Em outros termos, a inocência e a fé singela são os
caminhos que conduzem a esse Reino.
4. A mente é tudo. Se sua mente perde sua liberdade, você também deixa de
ser livre. Se sua mente é livre, você também é. A mente pode ser tingida com
qualquer cor, como um tecido branco recém lavado. Estude inglês e em suas
conversas misturará palavras inglesas, mesmo que não queira. Um pandit que
estuda sânscrito, citará versos nesse idioma. Se a mente está em má
companhia, as más influências colorirão seus pensamentos. Mas se está em
companhia dos devotos, seguramente a mente meditará em Deus, somente em
Deus. A mente muda sua natureza, de acordo com o ambiente em que se vive e
atua.
5. A mente é tudo. Uma coisa é a atração que se sente para com a esposa e
outra bem diferente é o afeto que se sente por um filho. Um homem tem de um
lado a esposa e de outro, o filho. Acaricia a ambos, mas movido por diferentes
impulsos...
6. A mente é a que está ligada e é a mente a que se liberta. Se você diz: “Sou
uma alma livre, sou filho de Deus! Quem pode escravizar?”, livre você será. Se,
ao ser mordido por uma víbora, alguém puder dizer com toda a sua força de
vontade e fé: “Não há veneno, não há veneno”, seguramente se livrará do efeito
do veneno.
7. Há sinais fisiológicos que indicam quem será dotado de fé e quem não. Os
tipos de homens ossudos, os que têm olheiras, os estrábicos, não podem ter fé
facilmente.
Fé
11. Existem várias seitas e crenças entre os hindus. Qual delas devemos
adotar? Parvati perguntou a Mahadeva: “Oh Senhor, qual é a raiz da eterna e
infinita felicidade?”. Mahadeva respondeu: “A raiz é a fé”. As peculiaridades de
cada crença e seita pouco importam. Que cada um pratique os exercícios
devocionais com fé e cumpra os deveres relativos a sua crença.
12. Para matar outra pessoa é necessário ter uma espada e um escudo,
enquanto que para se suicidar, basta um alfinete. Assim, para ensinar os
demais, deve-se estudar muitas escrituras e ciências. Por outro lado, para
alguém adquirir a iluminação espiritual, a firme fé e uma simples frase (sagrada)
são suficientes.
13. O Conhecimento com respeito a Deus é medido pela fé que alguém tem. É
estéril buscar muito Conhecimento onde há pouca fé. Uma vaca que seja muito
delicada em questão de comida, não dá muito leite. Mas a vaca que come de
tudo, pasto, folhas, cascas, palha, etc., e os come com grande apetite, dá leite
em abundância, de seu úbere sai leite em profusão.
14. Aquele que tem fé, tem tudo e aquele que carece dela, carece de tudo.
15. Se você deseja realizar Deus, repita Seu nome com firme fé e trate de
discernir entre o Real e o irreal.
18. Se você colocar o açúcar para derreter em um bom fogo verá que, enquanto
contiver alguma impureza, a calda chiará e produzirá fumaça. Mas quando toda
a impureza e espuma for eliminada, cessará o ruído e não haverá mais fumaça.
A pura e cristalina calda que ficar, será uma delícia para os homens e os
deuses. Assim também é o caráter de um homem de fé.
19. Sri Ramachandra, que era Deus encarnado, teve que construir uma ponte
sobre o oceano para chegar à ilha de Lanka (Ceilão). Mas Hanuman, Seu fiel
devoto e servidor, atravessou o oceano de um só salto, pelo poder de sua
enorme fé em Rama. Neste caso, o servidor pode mais que seu amo, pelo
simples poder da fé.
20. Um homem desejava cruzar o rio. Um sábio lhe deu um amuleto e lhe
disse: “Isto o levará facilmente à margem oposta”. Pegando o amuleto em sua
mão, o homem começou a caminhar sobre as águas. Mas antes de chegar à
metade do rio, ficou curioso e abriu o amuleto para ver o que continha. Dentro
havia um pedaço de papel, onde estava escrito o sagrado nome de Rama, o
Senhor. Vendo isso, o homem disse, com desprezo: “É esse todo o segredo?”.
Quando o ceticismo entrou em sua mente, afundou na água. É a fé no nome do
Senhor que faz milagres, porque a fé é vida e a falta de fé é morte.
21. Um discípulo, que tinha firme fé no infinito poder do guru, caminhou sobre
as águas de um rio somente em pronunciar o nome de seu mestre. Vendo-o, o
guru pensou: “Se há tanta força em meu nome, então devo ser maior e mais
poderoso!”. No dia seguinte foi ao rio e começou a caminhar sobre as águas,
dizendo: “eu”, “eu”, “eu”, mas quando se afastou alguns passos da margem
afundou e afogou-se, pois o pobre homem nem sequer sabia nadar. A fé faz
milagres, enquanto que a vaidade e o egotismo causam a própria destruição do
homem.
22. A pederneira pode ficar submerso na água por milhares de anos sem perder
o inerente fogo e emite chispas, quando é friccionado com um pedaço de ferro.
Assim, um verdadeiro devoto, mesmo estando rodeado de todas as impurezas
do mundo, nunca perde a fé e devoção e fica arrebatado quando ouve o nome
do Senhor.
23. Um rei, que tinha cometido o atroz pecado de matar um brahmin, foi à casa
de um rishi (sábio espiritual), para saber que espécie de penitência deveria
fazer para expiar seu pecado. Como o rishi estava ausente, seu filho, que se
encontrava na casa, atendeu o rei e depois de ouvir seu caso, lhe disse: “Repita
o nome de Deus (Rama) três vezes e ficará purificado”. Quando o rishi voltou e
soube da penitência que seu filho tinha prescrito ao rei, exclamou, indignado:
“Os pecados cometidos durante milhares de vida se purgam de imediato, ao ser
pronunciado o nome do Todo Poderoso uma só vez. Oh tolo, quão frágil deve
ser sua fé, uma vez que ordenou a repetição do santo nome três vezes! Por
esta sua fragilidade você será um sem casta”. Foi assim que seu filho (em outra
encarnação) se converteu em Guhaka (rei dos aborígenes) do Ramayana.
24. Uma pedra pode ficar na água por inumeráveis anos, sem que a água
penetre nela. Por outro lado, se a argila estiver em contato com a água, logo em
seguida ficará empapada e se transformará em barro. De igual modo, o coração
de um homem de fé, mesmo em meio a provas e perseguições, não se
desespera. Por outro lado, o homem de pouca fé fica abatido mesmo pelas
causas mais insignificantes.
25. As pessoas chegam a ser o que pensam. Se diz que a barata, pensando
constantemente em certo inseto (brahmarakita), se transforma nesse inseto. Do
mesmo modo, aquele que pensa na Felicidade Absoluta sente-se pleno de
felicidade.
26. Por que você fala do pecado e do fogo do inferno todos os dias de sua vida?
Cante o nome de Deus e diga de uma vez: “Oh Senhor! Fiz coisas que não
deveria ter feito e não fiz outras que devia fazer. Perdoe-me, Senhor!”. Dizendo
isto, tenha fé nEle e você ficará purgado de todos os seus pecados.
29. Aquele que se acredita jiva (ser individual), se torna jiva e aquele que se
considera Deus, se converte em Deus. Somos o que pensamos.
Entrega a Deus
30. Aquele que pode se entregar à vontade do Todo Poderoso com simples fé e
sincero amor, realiza o Senhor muito rapidamente.
32. Um charco de água em um campo aberto logo se seca, mesmo que a água
não seja diminuída de volume por sua utilização. Então você chegará à
conclusão de que tudo se faz por Sua vontade.
34. Não há caminho mais seguro e pleno que o de bakalma (conceder poder
geral). Bakalma, aqui, significa entregar-se à vontade do Todo-poderoso e ter
consciência de que nada é “meu”.
36. No jogo chamado “ashta-kashta”, as peças devem ser passadas por várias
casas do tabuleiro, antes de chegar à casa central de “descanso e não retorno”.
Mas até uma peça não chegar à casa central, está sujeita a voltar uma e outra
vez ao ponto inicial e começar novamente a difícil viagem. Certamente, se duas
peças partem juntas e se movem unidas de uma a outra casa, não podem ser
forçadas a voltar atrás por nenhum vencedor. Do mesmo modo, aqueles que
começam suas práticas de devoção, unindo-se primeiro a um guru e um Ishta,
não devem temer os reveses e dificuldades do caminho. Seu progresso será
sem impedimentos, suave e sem retrocesso.
37. Quando a bendita Radha foi colocada à prova para demonstrar sua
castidade, exigindo que ela levasse água em uma jarra com mil orifícios e ela
obteve êxito, levando a jarra cheia sem que caísse uma só gota, todos a
aclamaram entusiasticamente, declarando que nunca houve e nem haverá uma
mulher casta como ela. Ao ouvir isto, Radha exclamou: “Por que me culminam
de louvores? Melhor que digam: ‘Glória a Krishna! Glória a Ele, somente!’. Eu
sou somente Sua servidora”.
39. Viva aqui (neste mundo) como uma dessas folhas que se joga fora depois
de ter sido usada como prato. Ela fica a mercê dos ventos. Às vezes é levada a
um lugar limpo, outras vezes a um lugar sujo. Bem, já que você foi colocado
aqui, fique no lugar onde está. E quando Deus o levar a um lugar melhor, então
também você deverá dizer: “Amém” e resignar-se à Sua vontade com completo
desapego. Deixe que as coisas aconteçam por si só.
40. Em uma família, a jovem esposa respeita seus sogros, provê suas
necessidades e não os deprecia ou desobedece. Mas ao mesmo tempo, ama
seu esposo mais do que a eles. Do mesmo modo, seja firme na devoção a seu
Ishta (aspecto Divino escolhido), mas não deprecie outras Deidades. Honre,
também a Elas, pois todas representam uma só Força e Amor.
41. O homem deve ser muito escrupuloso com respeito à verdade. Por meio da
verdade, podemos realizar Deus.
44. Como uma casta mulher dedicada completamente a seu marido se une a
ele para sempre, depois da morte, assim o homem que tem inteira devoção a
seu Ideal escolhido, certamente obtém a união com Deus.
A verdade
45. Tenha bhakti (amor a Deus) em seu interior e abandone todo o artifício e
engano. Aqueles que se dedicam ao comércio ou outros negócios, ou que
trabalham em escritórios, também devem se aderir à verdade. A veracidade é a
tapasya (austeridade) que corresponde a esta idade de Koli (idade atual).
46. A menos que se diga sempre a verdade, é impossível encontrar Deus, que á
a alma da verdade.
48. Tudo o que é falso é mau. Mesmo o uso de uma vestimenta que não nos
corresponda, é mau. Se sua mente não está em harmonia com sua vestimenta,
seguramente você terá a visita de uma calamidade. Desse modo, se tornará
hipócrita e perderá todo temor de falar e atuar com falsidade.
49. Uma pessoa, que estava cheia de dúvidas, fingiu estar louca para escapar
de consequências legais. Os médicos não conseguiram curar sua enfermidade,
pois quanto mais medicamentos lhe davam, mais aumentava sua loucura. No
final, um sábio médico descobriu a verdade e, se afastando com o fingido louco,
o repreendeu dizendo: “Que é que você está fazendo? Tenha cuidado de que
fingindo, se tornará realmente louco. Já não vejo em você nenhum sintoma de
loucura”. Esta advertência despertou aquele homem da sua insensatez e, desde
então, deixou de se fingir de louco. Alguém pode se tornar, realmente, aquilo
que finge ser.
Brahmacharya ou continência
50. Como podemos ver nosso rosto refletido em um espelho, a gloriosa imagem
de Deus Todo-poderoso pode ser visto refletido no coração de uma pessoa que
preservou seu poder e pureza, pela perfeita continência.
Viveka ou discernimento
55. Suponha que haja arroz fervendo em uma panela. Para ver se o arroz já
está cozido, você pega um grão e o aperta entre os dedos. Num instante, sabe
se todo o arroz que está na panela está cozido ou não. Com toda segurança,
você não apertará cada grão. Assim como provamos um ou dois grãos para
saber da condição de arroz que há na panela, assim também, examinando dois
ou três objetos, você pode saber se o mundo é real ou irreal, se é eterno ou
efémero. O homem nasce, vive por algum tempo e morre. A mesma coisa
acontece com os animais e plantas. Discernindo deste modo, você sabe que
esse é o mesmo destino de todas as coisas que têm nome e forma, sem excluir
a terra, o sol e a lua. Desta forma, não compreenderá a natureza de todas as
coisas que existem no universo? Quando reconhecer que o mundo é irreal e
efémero, não terá mais amor por ele. Renunciará a ele em sua mente e ficará
livre de todo o desejo. Quando for capaz desse ato de renúncia, saberá que
Deus é a causa do universo. Quem alcança Deus deste modo, se não é um
todo-conhecedor, que outra coisa poderia ser?
57. Pergunta: Este mundo é irreal? Resposta: É irreal enquanto você não
conhecer Deus. Ao não vê-Lo em todas as coisas e seres, você se aprisiona ao
mundo com os laços de “eu” e “meu”. Iludido assim pela ignorância, você se
apega aos objetos sensórios e afunda mais e mais no abismo de maya. Maya
cega os homens a tal ponto, que não podem escapar de suas redes, mesmo
que haja uma abertura diante deles. Vocês mesmos sabem o quão irreal é a
vida mundana. Pensem um pouco na casa onde estamos agora. Quantos
homens nasceram e quantos morreram nela! As coisas do mundo aparecem
diante de nós por um momento e em seguida tornam a desaparecer. Aqueles
que você considera “seu”, deixarão de existir para você quando fecharem os
seus olhos, ao morrer. Quão forte é o apego que aprisiona o homem mundano!
Talvez não haja ninguém na família que requeira sua atenção, contudo, por
amor a um neto não vai a Banaras praticar devoção. “Que será de minha Hari” é
o pensamento que o mantém atado ao mundo. Em um ghuni (armadilha para
pescar) a saída está sempre aberta, contudo os peixes não podem escapar. O
bicho da seda se encerra em seu próprio casulo e ali perece. Sendo dessa
natureza, não é irreal e esvaecente a vida no mundo (samsara)?
59. Até mesmo quando estamos cercados por toda espécie de desejos
mundanos, pode surgir em nós a pergunta: “Quem sou eu, que goza de tudo
isto?”. Esse pode ser o momento em que comece a revelação do segredo.
61. É muito agradável coçar um lugar atingido pela sarna, mas a sensação
seguinte é muito penosa e intolerável. Assim também os prazeres deste mundo
são muito atraentes, no início, mas são terríveis, depois de suportar e
contemplar suas consequências.
62. Um milhafre, que tinha um peixe em seu bico, estava sendo perseguido por
vários corvos e outros milhafres que o perseguiam e bicavam, para que soltasse
a presa. Em qualquer direção que ia, o bando de corvos e milhafres o seguia.
Cansado de tanta perseguição, deixou cair o peixe, que foi agarrado por outro
milhafre que, por sua vez, foi perseguido pelas demais aves. O primeiro milhafre
ficou livre e pousou tranquilo sobre o ramo de uma árvore. Vendo o pássaro
quieto e tranquilo, o Avadhuta (grande sábio espiritual) o saudou, dizendo:
“Você é meu Guru, oh milhafre! Você me ensinou que o homem não pode livrar-
se das perturbações e estar em paz, até se livrar do fardo de seus desejos
mundanos”.
63. Um cavalo arisco não caminha direito, se não tiver os olhos protegidos por
viseiras. Da mesma forma, quando a mente de um homem mundano o impede
de olhar ao seu redor por causa das viseiras do discernimento e do desapego,
não tropeçará, nem irá por maus caminhos.
65. Há uma aranha, cujo veneno não pode ser combatido com nenhum
medicamento, se a ferida não for antes magnetizada com compressas de raízes
de cúrcuma. Só depois que a ferida tiver sido assim magnetizada, há remédios
que surtem efeito. Do mesmo modo, quando um homem foi infectado pela
aranha da luxúria e da riqueza, antes de fazer qualquer progresso espiritual,
deve saturar-se com o mágico magnetismo da renúncia.
67. O bicho da seda fica aprisionado no casulo que ele mesmo fez. Assim
também a alma mundana fica enredada nas malhas da rede, tecida com seus
próprios desejos. Mas quando o bicho, ao transformar-se em uma bela
mariposa, rompe o casulo, sai voando livremente e goza da luz e do ar. Assim o
homem mundano pode desenvencilhar-se das redes de maya, com a ajuda das
asas do discernimento e do desapego.
68. Uma mudança total é a chave que abre a porta de acesso à câmara onde
Deus mora. Para chegar a Ele, você tem que renunciar ao mundo e a tudo.
70. Como Deus pode ser alcançado? Sacrificando o corpo, mente e riquezas.
71. Qual deve ser a condição mental de um homem ligado, antes de poder
aspirar a sua libertação? Se pela graça de Deus adquirir um intenso espírito de
renúncia, só então poderá livrar-se da atração de “mulher e ouro”. E em que
consiste o intenso desapego e a veemente renúncia? “Com o tempo realizarei
Deus”, esta é a atitude de quem possui um frágil desapego. Mas aquele, cuja
renúncia é aguda e forte, deseja Deus com a mesma ansiedade abnegada do
coração de uma mãe que quer ver seu filho. Nunca busca outra coisa que não
seja Deus. O mundo é para ele como um poço, onde ele teme cair e se afogar.
Seus parentes lhe parecem serpentes venenosas, das quais trata de fugir. E tal
é a força de seu impulso e determinação, que nunca pensa em resolver primeiro
suas questões domésticas, para então dedicar-se à busca do Senhor.
72. Por que um amante de Deus renuncia a tudo por amor a Ele? A traça,
depois de ver a luz, não pensa em tornar à obscuridade. A formiga que se
encontra em um monte de açúcar, morre ali, sem voltar. Assim, o amante de
Deus sacrifica alegremente sua vida pelo alcance da Divina bem-aventurança,
sem se importar com nenhuma outra coisa.
75. O Conhecimento (gñana) não pode ser comunicado de uma só vez. Seu
alcance é uma questão de tempo. Suponha o caso de uma febre muito alta. O
médico na dará quinina em tais circunstâncias, porque sabe que não surtiria
efeito. Primeiro a febre deve ceder, o que depende do tempo e logo depois, a
quinina pode ser administrada ou outro medicamento. Precisamente, o mesmo
ocorre com o homem que busca o conhecimento. Os preceitos religiosos são,
frequentemente, inúteis, enquanto se esteja submerso na mundanidade. Deixe
um homem desfrutar, por certo tempo, das coisas deste mundo. Quando seu
apego ao mundo tiver diminuído, terá chegado o momento em que as
instruções religiosas serão frutíferas para ele. Antes disto, qualquer preceito
será estéril.
76. As crianças brincam com seus bonecos todo o tempo que querem, em uma
casa, longe da mãe, e quando a mãe entra, deixam de lado suas brincadeiras e
correm para ela, gritando: “Mamãe, mamãe”. Você também está brincando
neste mundo, absorto com seus bonecos, que são a riqueza, as honras e a
fama, sem pensar em outra coisa. Mas se alguma vez chegarem a ver a Divina
Mãe dentro de si mesmos, então não encontrará mais prazer em todas essas
coisas, como riquezas ou fama. Deixando-as de lado, correrá para Ela.
Perseverança
81. Sabe como as pessoas do campo compram novilhos? Ah! Eles são espertos
nesses assuntos e sabem distinguir os bons dos maus. Sabem escolher o
animal mais cheio de vida. Simplesmente tocam a cauda e o efeito é milagroso.
Os novilhos sem brio oferecem resistência e caem no chão sem se mover,
como adormecidos. Mas os que têm muita vitalidade, saltam de um lado a
outro, como se protestassem contra a liberdade que tiveram com eles. Os
campesinos escolhem estes últimos. Se quiserem ter êxito na vida deve-se ter,
no íntimo, o valor do verdadeiro homem. Mas há muitos que carecem deste
valor. São como copos de arroz empapados no leite, brandos e pusilânimes!
Sem força interior! Sem força de vontade! Incapazes de um esforço contínuo!
São os fracassados da vida.
82. O pescador que deseja pescar um grande peixe, espera com calma horas
inteiras, depois de lançar o anzol na água. Do mesmo modo, o devoto que
pacientemente segue suas práticas devocionais, está seguro de encontrar
Deus, no final.
83. Aquele que vem de família de lavradores, não deixa de cultivar a terra,
mesmo que não chova por doze anos. Por outro lado, o comerciante que se
dedica à agricultura há pouco tempo, se desencoraja na primeira seca. O
verdadeiro crente não se desanima, mesmo que não consiga ver Deus, não
obstante ter levado toda uma vida de devoção.
84. Aquele que deseja aprender a nadar, deve praticar por alguns dias.
Ninguém, depois de um só dia de treinamento, pode aventurar-se a nadar no
mar. Do mesmo modo, se você deseja nadar no oceano de Brahman, deve
fazer muitas e infrutíferas tentativas, antes de ter êxito.
86. Conta-se que duas pessoas começaram a invocar, juntas, a Deusa Kali,
como terrível rito chamado shavasadhana (rito Tântrico que se faz em um
crematório, na obscuridade da noite. O sádhaka [praticante] se senta sobre um
cadáver). Um deles enlouqueceu de espanto, ante as terríveis cenas que
apareceram ao anoitecer. O outro, ao terminar a noite, foi favorecido com uma
visão da Divina Mãe. Este último disse à Deusa: “Mãe, por que meu
companheiro se tornou louco?”. A Deusa respondeu: “Você também, filho meu,
enlouqueceu muitas vezes em suas vidas anteriores, até que, no final Me viu”.
87. Pergunta: Raras vezes a paz vem ao nosso coração e quando vem, não
dura muito. Por que isso acontece? Resposta: O fogo feito com as canas de
bambu logo se extingue, a menos que seja avivado, soprando continuamente.
Para manter vivo o fogo da espiritualidade é necessária a devoção ininterrupta.
88. Ao se encher com água uma vasilha de barro e se for deixada sobre uma
estante, em poucos dias toda a água se evaporará. Mas se for mergulhada na
água, ficará cheia todo o tempo que permanecer ali. O mesmo acontece com o
amor a Deus. Se você cultivar o amor a Deus por um tempo e logo se ocupar de
outros assuntos esquecendo de Deus, logo achará que seu coração foi
esvaziado daquele precioso amor. Mas se mantiver seu bendito coração
sempre submerso no santo amor e fé, seguramente ficará sempre cheio e
transbordante de fervor Divino e sagrado amor.
89. Enquanto há fogo sob a panela, o leite levantará fervura, mas tire o fogo e o
leite ficará parado. Assim também o coração do neófito borbulha de entusiasmo
só quando prossegue seus exercícios espirituais.
93. Se você deseja beber água de um tanque pouco profundo, deve tirá-la
suavemente da superfície, pois do contrário corre-se o risco de remover o
sedimento e assim, turvar toda a água. Se deseja ser puro, tenha firme fé e siga
suas práticas devocionais, sem gastar mal sua energia em inúteis discussões e
argumentos sobre as escrituras. De outro modo, seu pequeno cérebro pode
turvar-se.
95. Adote os meios adequados para o fim a que se propõe alcançar. Não
conseguirá manteiga, embora grite até ficar rouco, dizendo: “Há manteiga no
leite”. Se você deseja manteiga, separe o creme do leite e bata bem, até que se
converta em manteiga. Do mesmo modo, se deseja ver Deus, dedique-se às
práticas espirituais (sádhanas). Que bem há no simples dizer: “Oh Deus! Oh,
Deus!”.
96. Se um homem deseja ver o rei em seu trono, deve ir ao palácio real e
atravessar todas as portas que existem. Mas se, ao atravessar somente a
primeira porta, perguntar: “Onde está o rei?”, seguramente não o encontrará.
Deve atravessar as sete portas e então poderá ver o rei.
100. Aquele que é amante da pesca e deseja que seja indicado um bom lugar
para pescar, se dirige às pessoas que tenham pescado em algum lugar e
pergunta com interesse: “É verdade que aqui há grandes peixes? E qual é a
melhor isca para atraí-los?”. Uma vez obtida a informação necessária, vai até a
margem com sua vara de pescar, joga o anzol e espera pacientemente. Ao
final, consegue pescar um formoso e grande peixe. Da mesma forma, confiando
nas palavras dos santos, deve-se apegar a Deus e instalá-lo no próprio coração
com a isca da devoção e a vara e o anzol da mente (concentrada). Com
incessante paciência, deve-se esperar o momento propício. Somente então se
poderá pescar o peixe divino.
103. Se uma pessoa chega a ter fé no poder de Seu santo “nome” e se sente
inclinada a repeti-Lo constantemente, para ela já não são mais necessários o
discernimento e as práticas devocionais. Todas as dúvidas cessam, a mente se
purifica e o Senhor Mesmo é realizado, mediante a força de Seu santo nome.
104. Os Vedas e os Puranas devem ser lidos e ouvidos, mas é bom agir
segundo os preceitos dos Tantras. O “nome” de Hari (o Senhor) deve ser
pronunciado e também ouvido. Na verdade, há certas enfermidades nas quais
não só é necessário aplicar o medicamento exteriormente, mas que também
deve ser administrado interiormente.
Concentração e meditação
109. Medite em Deus, nem que seja em um lugar escuro ou na solidão dos
bosques, ou no santuário silencioso de seu coração.
112. O modo mais fácil de concentrar a mente é fixá-la na chama de uma vela.
A parte central da chama, que tem a cor azulada, corresponde ao corpo causal
ou karana-sarira. Fixando a mente nela, logo se obterá o poder da
concentração. A parte luminosa que envolve a chama azul representa o
sukshma-sarira, ou corpo sutil e a parte externa da chama representa o corpo
denso, ou sthula-sarira.
114. Durante a meditação, você deve imaginar que prende sua mente aos “pés
de loto” da Deidade com um fio de seda, para que não se distancie dali. Mas
por que o fio deve ser de seda? Por que Seus pés de loto são tão delicados,
que qualquer outro fio poderia lhe causar dano.
117. Sabe como medita um homem que tem natureza sátvica (pura)? Medita na
quietude da noite, sentado em sua cama, dentro do mosteiro, para ninguém vê-
lo.
118. Dilua-se no Senhor, como as drogas se diluem no álcool.
119. Quando todo o clamor da mente se apazigua, então tem lugar o estado de
kumbhaka, ou suspensão do alento. O kumbhaka é obtido também por meio do
bhakti yoga (caminho da devoção). O intenso amor a Deus faz com que o alento
fique suspensão.
121. O Avadhuta (um grande yogui) viu, uma vez, o cortejo de uma boda que
passava por uma pradaria, com grande pompa e com acompanhamento de
tambores e trombetas. A pouca distância dali havia um caçador tão absorto em
apontar para o pássaro, que nem sequer se seu conta do cortejo. Ao vê-lo, o
Avadhuta o saudou, dizendo: “Senhor, é o meu guru. Que ao meditar eu possa
concentrar minha mente no objeto da meditação, assim como a sua estava
concentrada no pássaro”.
123. Uma garça avançava lentamente para a margem de uma lagoa para pegar
um peixe. Atrás dela estava um caçador apontando, mas a ave estava
completamente alheia ao que acontecia. O Avadhuta saudou a garça, dizendo:
“Quando eu me sentar para meditar, que possa seguir seu exemplo e nunca me
virar para ver quem está atrás e mim”.~
124. “Para aquele que é perfeito na meditação, a salvação está muito perto”, diz
um velho adágio. Sabe quando um homem é perfeito na meditação? Quando,
ao sentar-se para meditar, se sente imediatamente rodeado de uma divina
atmosfera e sua alma comunga com Deus.
125. Na meditação profunda a concentração pode chegar a tal ponto, que nada
se vê nem se ouve. Até as percepções e sensações desaparecem. Uma
serpente pode deslizar pelo seu corpo sem que seja percebida por aquele que
medita. Nem quem medita e nem a serpente sentem nada!
128. O segredo consiste em que a união com Deus (yoga) nunca tem lugar, a
menos que a mente esteja absolutamente calma, qualquer que seja o caminho
que seja seguido para a realização de Deus. A mente está sempre sob o
controle do yogui e não o yogui sob o controle da mente.
A REALIZAÇÃO DO DIVINO | BHAGAVAN SRI
RAMAKRISHNA
ૐ
A REALIZAÇÃO DO DIVINO
1. Este corpo, que se compõe dos “cinco elementos” é chamado corpo denso. O
corpo sutil consiste de manas, buddhi, chitta e ahamkara (mente, intelecto,
impressões e ego). O corpo no qual se realiza a felicidade e a visão de Deus e
continua desfrutando de Sua união, é o corpo causal. Nos Tantras é chamado
de Bhagavati-tanu (corpo divino). Mais além de tudo está o Mahakarana – a
Causa Primária.
1. O estado consciente, no qual Sua mente morava nos corpos denso e sutil.
2. O estado semiconsciente, no qual Sua mente se remontava ao corpo causal
e desfrutava da “felicidade causal”.
3. O estado supraconsciente, no qual Sua mente mergulhava completamente no
Mahakárana, a grande Causa Primária.
4. A menos que a Kundalini 1 (Energia Divina) seja despertada, não acontecerá
o despertar espiritual. A kundalini dorme no muladhara. Quando é despertada,
Ela entra no sushumna, passa através do svadhishthana, manipura e outros
centros até que, finalmente, chega ao centro cerebral. Então acontece o
samadhi. Eu vi claramente todos estes centros. 1. Às vezes a kundalini é
traduzida como “poder serpentino”. É a potencialidade espiritual adormecida,
que está localizada nos centros nervosos, como o svadhishthana e manipura,
até que alcança, no cérebro, o sahasrara. Esse poder é a Divina Shakti (Energia
Divina) existente no homem. O progresso espiritual é descrito, algumas vezes,
como o despertar desta energia latente e sua ascensão ao longo da corrente
nervosa da espinha dorsal (sushumna), através de seus seis diferentes centros
como o svadhishthana e o manipura, etc., até chegar ao centro supremo situado
no cérebro. À medida que a energia espiritual ascende, o homem tem
experiências espirituais mais e mais elevadas.
Falso êxtase
11. Filhos meus, realmente Deus pode ser visto. Assim como estamos sentados
juntos e conversamos, de igual modo podemos ver Deus e conversar com Ele,
eu lhes juro!.
20. Ao perguntar ao Mestre se Buda era ateu, Ele respondeu: “Não era ateu. O
que aconteceu é que não podia expressar suas realizações (porque eram de
natureza subjetiva). Vocês sabem que significa Buda? Chega a ser uma só
coisa com ‘Bodha’, a Suprema Inteligência. Significa converter-se, por meio da
profunda meditação, na Inteligência Mesma. O estado que se experimenta na
realização do Ser é algo entre asti e nasti, ‘existir’ e ‘não existir’. O ‘existir’ e o
‘não existir’ são modificações de prakriti (natureza). A Realidade está além de
ambos os estados.”
A psicologia do samadhi
23. O humano deve morrer antes que a Divindade se manifeste. Mas por sua
vez, o divino (estado de nobres qualidades) deve morrer, antes que tenha lugar
a suprema manifestação da Bendita Mãe (Brahmamaji). É sobre o peito da
divindade (que aparece como) morta (Shiva), onde a Bem-aventurada Mãe
dança Sua dança celestial.
26. Ao sustentar um devoto que Deus está além do alcance das palavras, dos
pensamentos e dos sentidos e que a mente não pode alcançá-Lo, observou o
Mestre: “Isso não é exatamente assim. É certo que a mente limitada não pode
realizar Deus. Mas Ele pode ser realizado pela mente pura (suddha manas), a
qual é a mesma coisa que o espírito puro e incondicionado. Na verdade, Deus
não pode ser realizado pela razão finita, ou pela mente relativa e condicionada,
que tem a natureza sensória, devido ao seu apego à ‘luxúria e o ouro’. Se a
mente se educa pode, entretanto, desfazer-se de sua adesão ao sensório e
purificar-se. Uma vez libertado de todos os apegos, desejos e tendências
mundanas, se unifica com o espírito incondicionado. Não foi assim como os
antigos sábios viram Deus? Eles viram Deus, o Espírito incondicionado, por
meio da mente purificada, descobrindo que esta é uma só e mesma coisa com
o Atman, o espírito incondicionado que mora no íntimo de cada um”.
27. Deus está mais além da mente e do intelecto, enquanto estes se encontram
limitados pelo relativo, mas quando se purificam, Deus se manifesta. A luxúria e
a cobiça tornam a mente impura. Enquanto a avidya (ignorância) reinar no
coração, a mente e o intelecto não poderão purificar-se. Ordinariamente, a
mente e o intelecto são conhecidos como diferentes um do outro, mas no
estado puro, se tornam um e resultam em Chaitanya (Consciência Pura). Então
Deus, Chaitanya, se manifesta a Chaitanya.
Aquela criança, disse Sri Ramakrishna, era eu. O rishi, é aquele que veio agora
como Narendra (futuro Vivekananda).
– Sim. Só que de uma maneira muito mais intensa de como eu estou lhe vendo
agora. E posso ensinar-lhe a vê-Lo se você quiser.
Narendra foi carinhosa e pacientemente moldado por Thakur para ser o líder
dos rapazes que seriam os monásticos da futura Ordem Ramakrishna, seus
dezasseis apóstolos.
1) Existe algo por trás deste mundo dos sentidos, este mundo de eterno comer
e beber, de conversa fiada a falar bobagens, este mundo de aparências
ilusórias, egoísta. Existe algo que transcende todos os livros, que está acima de
todos os credos, além de todas as vaidades do mundo. Este algo é a realização
de Deus, dentro de você.
3) Ninguém deve ser julgado pelos seus defeitos. As virtudes que uma pessoa
possui são especialmente suas; seus erros são as fraquezas comuns à
humanidade e não devem ser levados em consideração na avaliação de seu
caráter.
5) Ouça e repita para si mesmo, dia e noite, que você é a suprema Realidade,
até que esta ideia penetre em suas veias, em cada gota de seu sangue, em sua
carne e em seus ossos. Permita que seu corpo se torne pleno deste ideal: ‘Eu
não nasci, sou imortal, bem-aventurado, omnisciente, omnipotente; eu sou o
sempre glorioso Espírito (Supremo Ser).’ Pense n’Ele dia e noite; pense sobre
Ele até que se torne parte integrante de sua vida.
6) Seja otimista. Não critique os outros. Dê sua mensagem, ensine o que tiver
que ensinar e pare por aí. O resto é por conta de Deus.
8) Melancolia não é religião, seja lá o que possa ser. Estar sempre alegre e
sorridente leva-o mais próximo a Deus do que qualquer oração.
10) É possível que eu ache por bem abandonar meu corpo, descartar-me dele
como uma roupa usada. Mas não cessarei de trabalhar! Inspirarei pessoas em
todos os lugares, até que o mundo saiba que é uno com Deus.
12) Assuma sempre neste mundo a posição daquele que dá. Dê tudo e não
busque retorno. Dê amor, dê ajuda, dê serviço, dê qualquer coisinha que puder,
mas nada de permuta, nada de troca. Não imponha condições, e nada lhe será
imposto. Devemos dar por pura generosidade, exatamente como Deus nos dá.
15) Este mundo é Seu folguedo e entretenimento; nada nele faz Deus ficar
zangado.
17) No momento que você tem medo, você não é ninguém. Medo é a causa da
grande miséria no mundo, a maior de todas as superstições. O medo é o motivo
de nossos problemas e infortúnios; e é a intrepidez que nos traz o céu num
momento. Portanto, “Levante-se, desperte e não pare até que a meta seja
alcançada. “
20) O mais elevado ideal é a eterna e total autoabnegação, onde não existe eu,
mas tudo é “Tu”.
21) Você tem que crescer de dentro para fora. Ninguém pode ensiná-lo,
ninguém pode torná-lo espiritual. Não existe outro mestre além da sua própria
alma.
25) Cada obra verdadeira tem que passar por estes estágios: ridicularização,
oposição e aceitação. Aqueles que pensam à frente do seu tempo certamente
que serão sempre mal interpretados.
26) Nunca pense que existe algo que seja impossível de realizar para a Alma.
"Yoga significa união, unir, isto é, unir a alma do homem à Alma Suprema ou
Deus. Este nosso "eu" menor, cobre apenas uma pequena consciência e uma
vasta quantidade de inconsciência, enquanto sobre esse eu, e quase
completamente desconhecida dele, está o plano superconsciente" - Swami
Vivekananda
JNANA
"Que meios devemos adotar para nos livrar das garras de maya? Aquele que
deseja realmente livrar-se de maya, o próprio Deus mostra o caminho. A única
coisa necessária é ter incessante desejo." - Sri Ramakrishna
Primeira parte
Assim, o homem, depois de suas buscas vãs de vários deuses, completa o ciclo
e descobre que ,o Deus imaginado por ele como sentado no céu, governando o
mundo, é seu próprio Eu. Nenhum outro, a não ser o Eu, era Deus, e o
Pequeno "eu" jamais existiu.
Desde os tempos mais recuados houve várias seitas espalha das pela índia, e,
como nunca existiu uma igreja formulada ou reconhecida, ou corporação de
homens para designar em cada escola doutrinas sobre o que se deveria
acreditar, as pessoas tinham liberdade de escolher suas próprias fórmulas,
fazer sua própria filosofia e estabelecer suas próprias seitas.
Vemos, nesta vida, que podemos modelar e formar nosso futuro. Cada um de
nós, todos os dias, está tentando modelar o amanhã. Hoje, fixamos o destino do
amanhã; amanhã fixaremos o destino do dia seguinte, e assim por diante. É
bastante lógico que esse raciocínio seja empregado também para o tempo
regresso. Se pelas nossas ações modelamos nosso destino no futuro, por que
não aplicar a mesma regra ao passado? Se, numa corrente infinita, um certo
número de elos são alternadamente repetidos, e se um desses grupos de elos
pode ser explicado, poderemos explicar toda a cadeia.
Outra doutrina dos dualistas diz que todas as almas devem, finalmente,
alcançar a salvação. Nenhuma delas ficará do lado de fora. Através de várias
vicissitudes, através de vários sofrimentos e prazeres, cada uma delas sairá,
por fim. Sairá de quê? A ideia comum é a de que todas as almas têm de sair
deste universo. Nem o universo que vemos e sentimos, nem mesmo um
universo imaginário, podem ser o certo, o verdadeiro, porque ambos estão
mesclados com o bem e o mal. Segundo os dualistas, há, para além deste
universo, um lugar cheio de felicidade e de bem, apenas, e quando esse lugar
for alcançado, não haverá mais necessidade de nascer e renascer, de viver e
morrer, e essa ideia lhes é muito cara. Ali não há mais doenças, não há morte.
Existirá uma felicidade eterna, e eles estarão na presença de Deus todo o
tempo, e gozarão essa presença para sempre. Acreditam que todos os seres,
do verme mais baixo até os mais altos anjos e deuses, atingirão, mais cedo ou
mais tarde, o mundo onde não mais haverá sofrimento. Mas nosso mundo
jamais terminará. Continuará a existir infinitamente, embora movendo-se em
ondas. Embora movendo-se em ciclos, jamais terminará. O número de almas
que devem ser salvas, que devem ser aperfeiçoadas, é infinito.
A verdadeira filosofia Vedanta começa com os que são conhecidos como não-
dualistas qualificados. Declaram eles que o efeito jamais difere da causa; que o
efeito é a causa reproduzida sob outra forma. Se o universo é o efeito e Deus é
a causa, o universo deve ser o próprio Deus; não pode ser senão isso.
Começam eles com a afirmativa de que Deus é, ao mesmo tempo, a causa
eficiente do universo e seu Criador, e, ainda, o material do qual se projetou toda
a natureza. A palavra "criação" de vossa língua, não tem equivalente em
sânscrito, porque não há seita, na índia, que acredite na criação, tal como ela é
vista no Ocidente, isto é, algo que veio do nada. O que entendemos por criação
é a projeção do que já existia. Bem: o universo inteiro, de acordo com esta
seita, é o próprio Deus. Ele é o material do universo. Lemos nos Vedas1:
"Assim como a aranha tece a linha tirada de seu próprio corpo, todo o universo,
da mesma maneira, vem daquele Ser". Se o efeito é a causa reproduzida, a
questão é a seguinte: como podemos achar que este universo ininteligente,
bronco, material, foi produzido por um Deus que não é material, mas é
inteligência eterna? Como, se a causa é pura e perfeita, o efeito pode ser tão
diferente?
Ainda assim há algumas almas corajosas neste mundo, que ousam conceber a
verdade, que ousam recebê-la, e que ousam segui-Ia até o fim. Que declaram
os advaitistas? O seguinte: Se há um Deus, esse Deus deve ser ao mesmo
tempo a causa material e eficiente do universo. Não só é o Criador, mas é
também o criado. Ele próprio é este universo. Como pode ser isso? Deus, o
puro, o espírito, tornou-se universo? Sim, aparentemente é assim. Aquilo que
todas as pessoas ignorantes veem como universo, não existe, realmente. Que
somos, vós e eu, e todas as coisas que vemos? Simples autohipnotismo. Não
há senão uma Existência, a infinita, a sempre abençoada. Nessa Existência
sonhamos todos esses vários sonhos. É o Atman2 para além de tudo, o infinito,
para além do conhecido, para além do conhecível, e através disso vemos o
universo. Essa é a única realidade. Ela é esta mesa, é a parede, é tudo, menos
o nome e a forma. Retirai a forma da mesa, retirai-lhe o nome, e o que
permanecer será a mesa. O vedantista não diz "ele" ou "ela", pois essas são
ilusões, ficções do cérebro humano. Não há sexo na alma. As pessoas que
estão sob a ilusão, que se tornaram como que animais, veem a mulher ou o
homem. Deuses vivos não veem homens nem mulheres. Como podem vê-los,
eles que estão para além de tudo que tenha ideia de sexo? Tudo e todos são
Atman, o Eu - assexuado, puro, sempre abençoado. O nome, a forma, o corpo,
é que são materiais, e fazem toda essa diferença. Se retirardes essas duas
diferenças de nome e forma, todo o universo é um. Não há dois, mas um, por
toda a parte. Vós e eu somos um. Não há natureza, nem Deus, nem universo -
apenas uma Existência infinita, da qual, através de nome e de forma, todas
essas coisas são manufaturadas.
Como conhecer o Conhecedor? Ele não pode ser conhecido. Como podeis ver
vosso próprio Eu? Só podeis refletir vós mesmos. Assim, todo este universo é o
reflexo desse ser eterno, o Atman, e como o reflexo tomba sobre bons ou maus
refletores, também imagens boas ou más são adicionadas.
Assim, no assassino o refletor é mau, e não o Eu. No santo o refletor é puro. O
Eu, o Atman, é, por sua própria natureza, puro. É a mesma, a única Existência
do universo, que se reflete desde o mais baixo verme até o mais alto e mais
perfeito dos seres. O todo deste universo é uma unidade, uma Existência,
fisicamente, mentalmente, moralmente, e espiritualmente. Estamos
considerando essa Existência única em diferentes formas e criando todas essas
imagens sobre Ela. Para o ser que se limitou às condições de homem, Ela
aparece como o mundo do homem. Para o ser que está em plano mais alto de
existência, Ela pode parecer como o céu. Há apenas uma alma no universo,
não duas.
Não vem, nem vai. Não nasce, não morre, não se reencarna. Como pode
morrer? Para onde pode ir? Todos esses céus, todas essas terras, são vãs
imaginações da mente. Não existem, jamais existiram no passado, e jamais
existirão no futuro.
Eu sou omnipresente, eterno. Para onde posso ir? Onde ainda não estou desde
já? Estou lendo este livro da natureza. Página por página estou terminando-o, e
voltando-as, e um por um os sonhos da vida se vão. Outra página da vida foi
voltada, outro sonho da vida chega, e vai, rolando, rolando. E quando eu tiver
terminado minha leitura, abandono-a e ponho-me de lado. Atiro fora o livro, e
tudo estará terminado. Que pregam os advaitistas? Destronam todos os deuses
que já existiram ou existirão no universo, e colocam naquele trono o Eu do
homem, o Atman, maior do que o Sol e a Lua, mais alto do que os céus, maior
do que este próprio grande universo. Nenhum livro, nem escrituras, nem
ciência, podem jamais imaginar a glória do Eu que aparece como homem - o
Deus mais glorioso que já existiu, o único Deus que já existiu, existe, ou jamais
existirá.
Devo adorar, portanto, apenas o meu Eu. "Eu cultuo o meu Eu" - diz o
advaitista. "Diante de quem devo-me curvar? Eu saúdo o meu Eu. A quem devo
pedir auxílio? Quem pode me ajudar, a mim, o Ser Infinito do universo?" Esses
são sonhos aloucados, alucinações. Quem jamais ajudou alguém?
A ilusão surge apenas da ilusão. Não haverá ilusão desde que a verdade seja
vista. A ilusão sempre repousa na ilusão, jamais repousa em Deus, na Verdade,
no Atman. jamais estais em ilusão, é a ilusão que está em vós, diante de vós.
Uma nuvem aqui está. Outra vem, expulsa a primeira e toma o seu lugar. Vem
uma terceira, que por sua vez expulsa essa. Assim como diante do céu
eternamente azul nuvens de várias tonalidades e colorações surgem,
permanecem por um. pequeno espaço de tempo, e desaparecem, deixando o
mesmo e eterno azul, vós sois, eternamente, puros, perfeitos.
Onde procurarei a liberdade, se sou livre por minha natureza? Quem pode
constranger-me, a mim, o Deus do universo? As escrituras do mundo não
passam de pequenos mapas, desejando delinear a minha glória, pois sou a
única existência do universo. Então, que representam esses livros para mim?
Não há ninguém no universo a não ser eu. Esse é o único caminho, dizem os
vedantistas, para o conhecimento. Matai as diferenciações, matai essa
superstição de que existem muitos. "O que está neste mundo de muitos, vê
aquele Único. O que está nesta massa de inconsciência, vê aquele único Ser
consciente. Quem está neste mundo de sombras, aprende aquela Realidade - e
nela está a paz eterna e em ninguém mais, "em ninguém mais."
São esses os pontos principais dos três passos que o pensamento religioso
hindu tomou em relação a Deus. Vimos que ele começou com um Deus
pessoal, extracósmico. Foi do Deus externo para o Deus imanente no universo.
E terminou identificando a própria alma com aquele Deus, e fazendo uma Alma,
uma unidade, de todas essas várias manifestações do universo. Esta é a última
palavra dos Vedas. O pensamento religioso hindu começa com o dualismo,
passa através do não-dualismo qualificado, e termina em perfeito não-dualismo.
Sabemos que poucos neste mundo podem chegar a este último ponto, ou
mesmo podem ter a ousadia de acreditar nele. Menor é o número dos que
ousam agir de acordo com ele. Entretanto, sabemos que nele está a explicação
para toda a ética, para toda a moralidade, para toda a espiritualidade do
universo. Por que dizem todos: "Fazei bem aos outros?" Onde está a explicação
? Por que todos os grandes homens pregaram a fraternidade da humanidade, e
outros maiores pregaram a fraternidade de todas as vidas?
Porque, fossem ou não fossem conscientes disso, para além de tudo, através
de todas as suas irracionais superstições pessoais, estavam fitando diante de si
a eterna luz do Eu, negando todas as multiplicidades, e afirmando que todo o
universo não passa de Um.
Assim, a última palavra nos deu um universo, que vemos, através dos sentidos,
como matéria, através do intelecto como alma, e através do espírito como Deus.
Para o homem que se envolve em véus, os véus que o mundo chama
perversidade e mal, esse mesmo universo mudará e se transformará num lugar
hediondo.
Para outro homem, que deseja prazeres, esse mesmo universo se modificará e
se tornará um céu. E para o homem perfeito tudo desaparecerá, e se tornará
seu próprio Eu. Bem: tal como a sociedade existe no tempo presente, todos
esses três estágios são necessários. Uma absolutamente não nega o outro,
antes é, simplesmente, a complementação do outro. O advaitista, ou
o advaitista qualificado, não diz que esse dualismo é errado: é uma visão certa,
mas inferior. Está a caminho da verdade. Portanto, que cada qual tenha sua
própria visão deste universo, de acordo com suas próprias ideias.
Segunda parte
Essa é a única forma de alcançar a meta. dizer a nós próprios e dizer a todos os
demais, que somos divinos. E, conforme repetirmos isso, a força virá. Embora
todos os sistemas concordem em que tivemos o império e o perdemos, dão-nos
conselhos vários quanto à forma de o reavermos. Um diz que devemos realizar
certas cerimónias, pagar certas somas em dinheiro a certos ídolos, comer certa
qualidade de comida, viver de maneira especial, e assim reaveremos o império.
Outro diz que devemos chorar e nos prostrar e pedir perdão a certo Ser que
está para além da natureza, e assim reaveremos o império. E ainda outro diz
que se amarmos aquele Ser como todo o nosso coração, reaveremos o império.
Mas o último e o maior conselho diz que não deveis absolutamente chorar. Não
precisais realizar todas essas cerimónias nem tomar conhecimento de como
reaver O vosso império) porque jamais o perdestes. Por que deveríeis procurar
o que jamais perdestes ? Sois puros desde já, desde já sois livres. Se pensais
que sois livres, livres sereis neste momento, e se pensais que estais
aprisionados, aprisionados estareis.
Essa é uma declaração muito atrevida. Pode assustar-vos agora, mas quando
pensardes nela e a compreenderdes em vossa própria vida, então sabereis que
o que eu digo é verdade. Porque, supondo que a liberdade não é a vossa
natureza, não há forma alguma de vos tornardes livres. Supondo que sois livres
e que de certa forma perdestes essa liberdade, isso mostra que não éreis livres
no começo. Se tivésseis sido livres, o que poderia levar-vos a perder essa
liberdade? O independente jamais se pode tornar dependente. Se é realmente
dependente, sua independência era uma alucinação. Dos dois lados, qual
escolhereis, então? Se dizeis que a alma era por sua natureza pura e livre,
segue-se, naturalmente, que nada no universo poderia torná-la aprisionada ou
limitada. Mas se havia algo na natureza que podia aprisionar a alma, segue-se,
naturalmente, que ela não era livre, e vossa declaração de que ela era livre não
passava de uma ilusão. Assim, se nos é possível alcançar a liberdade, a
conclusão é inevitável: a alma é livre por sua natureza. Não pode ser de outra
maneira.
Portanto, também aqui, sob forma mais intrincada, sob forma mais filosófica,
encontramos a mesma questão referente à prisão e à liberdade. Um lado diz
que a primeira é uma ilusão, e a outra, que a segunda é uma ilusão. E,
naturalmente, ficamos com a segunda, ao acreditarmos que nossa prisão é uma
ilusão.
A solução da Vedanta é que não estamos aprisionados, que já somos livres.
Não apenas isso, mas dizer ou pensar que somos prisioneiros é perigoso: é um
erro, um auto-hipnotismo. Assim que dizeis: "Estou aprisionado, "Sou fraco",
"Sou. desamparado", desgraça sobre vós! Prendei-vos a mais uma cadeia. Não
digais tais coisas, não pensais tais coisas. Eu soube de um homem que vivia
numa floresta e costumava repetir, dia e noite: "Shivoham", "Eu sou o
Abençoado". Um dia um tigre caiu sobre ele e o arrastou para matá-lo. As
pessoas que estavam do outro lado do rio viram aquilo e ouviram a voz,
enquanto a voz nele permaneceu, dizendo: "Shivoham", mesmo entre as
próprias faces do tigre. Tem havido homens assim.
Tem havido homens que, mesmo no momento em que estão sendo cortados
em pedaços, abençoaram seus inimigos. "Eu sou Ele, Eu sou Ele, e assim és
tu. Sou puro e perfeito, e assim são todos os meus inimigos. Vós sois Ele, e
assim o sou eu." Essa é a posição de força. Há coisas grandes e maravilhosas
nas religiões dos dualistas. Maravilhosa é a ideia do Deus Pessoal, separado da
natureza, que adoramos e amamos. Às vezes essa ideia é bem consoladora.
Mas, diz o vedantista, esse consolo é algo como o efeito que vem de um opiato,
efeito não natural. Ao fim traz fraqueza, e o que este mundo deseja hoje mais
do que nunca, é força. A Vedanta diz que a fraqueza é a causa de toda a
angústia do mundo. A fraqueza é a causa única do sofrimento. Tornamo-nos
sofredores porque somos fracos. Mentimos, roubamos, matamos, e cometemos
outros crimes porque somos fracos.
Onde nada existe para nos enfraquecer, não há morte nem desgosto. Somos
infelizes através da ilusão. Abandonemos a ilusão e tudo se desvanecerá. É
coisa clara e simples, realmente. Através de todas essas discussões filosóficas
e de tremendas ginásticas mentais, chegamos a esta única ideia religiosa, a
mais simples em todo o mundo.
Há uma ideia que com frequência milita contra ela, É a seguinte: está muito
bem dizer: "Eu sou Puro, eu sou Abençoado"; mas não posso mostrar sempre
isso em minha vida. É verdade. O ideal é sempre muito duro. Toda a criança, ao
nascer, vê o céu sobre a sua cabeça, muito longe, mas por isso deveríamos
deixar de olhar para o céu? Se não pudermos obter o néctar, resolveríamos a
questão bebendo veneno? Será de algum auxílio para nós o fato de, não
podendo compreender imediatamente a verdade, entrarmos nas trevas e nos
rendermos à fraqueza e à superstição?
Eu vos desafio, um a um. Como vos comportaríeis se eu vos pusesse nas mãos
um bebezinho? Toda a vossa vida se modificaria no momento, e fosseis o que
fosseis, deveríeis tornar-vos destituídos de egoísmo naquele momento.
Abandonaríeis todas as ideias criminosas assim que a responsabilidade fosse
atirada sobre vós e vosso caráter se modificaria por inteiro. Assim, se toda a
responsabilidade fosse atirada sobre nossos ombros, estaríamos a agir em
nosso ponto melhor e mais alto. Quando nada temos para procurar às
apalpadelas, nem demónio sobre o qual lançar as culpas, nem Deus Pessoal
para carregar nossas cargas, quando só nós somos responsáveis, então nos
erguemos até o melhor e o mais alto. "Sou responsável pelo meu destino, sou
quem traz o . bem para mim próprio, sou quem traz o mal para mim próprio. Sou
o Puro e o Abençoado."
Esta, diz a Vedanta, é a única prece que deveríamos ter. Este é o único
caminho para alcançar a meta, dizer a nós mesmos e dizer a todos os demais,
que somos divinos. E conforme formos repetindo isso, a força virá. O que de
início vacila irá se tornando cada vez mais forte, nossa voz aumentará de
volume, até que a verdade tome posse de nossos corações e corra através de
nossas veias, e impregne nossos corpos.
Terceira parte
Agora, descobrireis por que o homem instintivamente cultua tudo, e por que o
homem perfeito é instintivamente cultuado como Deus em cada país. Podeis
dizer o que quiserdes, mas são eles que se destinam a ser cultuados. Por isso
os homens cultuam Encarnações, tais como o Cristo ou Buda. Elas são as mais
perfeitas manifestações do Eu eterno. Estão muito acima de todas as
conceções de Deus que vós e eu podemos fazer. Um homem perfeito é muito
maior do que essas conceções. Nele, o círculo se completa, e a substância e o
objeto fazem-se um. Nele, as ilusões se desvanecem, e em lugar delas vem a
compreensão de que sempre foi aquele Ser perfeito.
Certa vez eu viajava pelo deserto, na Índia. Viajei por mais de um mês, sempre
encontrando as mais belas paisagens diante de mim, bonitos lagos, e tudo o
mais. Um dia, tendo muita sede, desejei beber a água de um daqueles lagos,
mas quando me aproximei, o lago desapareceu. Imediatamente, como uma
pancada, veio-me ao cérebro a ideia de que aquilo era a miragem, sobre a qual
eu tinha lido toda a minha vida. Então, recordei-me, e sorri da minha loucura:
durante o mês que se escoara, todas as belas paisagens e lagos que eu
estivera vendo tinham sido miragens, mas eu não sabia distingui-Ias. No manhã
seguinte eu estava novamente a caminho. Lá estavam o lago e a paisagem,
mas com eles me veio imediatamente a ideia: "Isto é miragem". Uma vez
conhecida, ela perdera seu poder de me iludir.
Quando um homem alcança esse estado, chamam-no jivan-mukta, "o que vive
livre", livre mesmo enquanto vive. A meta e o fim nesta vida, para os jnana-
yogues, é tornar-se um jivan-mukta, "o que vive livre". É jivan-mukta o que vive
neste mundo sem estar a ele apegado. 9 como as folhas do lótus sobre a água,
que jamais se chegam a molhar. É a forma mais alta dos seres humanos, o
mais alto de todos os seres, pois compreendeu sua identificação com o
Absoluto, compreendeu que é um com Deus.
Vós vos contradizeis. Primeiro admitis que isso está para além da causalidade e
depois indagais o que causa isso. Essa pergunta só pode ser respondida dentro
dos limites da causalidade. É pergunta que pode ser feita até onde o tempo, o
espaço e a causalidade se estendam. Mas, para além disso, seria tolice
formulá-la, porque a pergunta seria ilógica.
Há outra resposta que não fica assim em plano filosófico tão alto. Pode
qualquer realidade produzir ilusão? Certamente não. Vemos que uma ilusão
produz outra, e assim por diante. É sempre a ilusão que produz ilusão. É a
doença que produz doença e não a saúde que produz doença. A onda é a
mesma coisa que a água; o efeito é a causa sob outra forma. O efeito é ilusão,
portanto, a causa deve ser ilusão. Que produziu essa ilusão? Outra ilusão. E
assim vai, sem princípio. A única pergunta que vos resta fazer, é: "Não
rompe nosso monismo o fato de termos duas existências no universo - uma o
Eu, e a outra a ilusão?" A resposta é:
"A ilusão não- pode ser chamada uma existência. Milhares de sonhos entram
em vossa vida, mas não formam qualquer parte de vossa vida. Os sonhos vêm
e vão: não têm existência. Chamar existência à ilusão seria sofisma. Há,
portanto, apenas uma Existência indivisível no universo, sempre livre e
sempre abençoada, e é isso que sois". É essa a última conclusão a que
chegaram os advaitistas.
Acabamos de ver que o Eu não pode ver a si próprio. Nosso conhecimento está
dentro de uma teia de maya, de irrealidade, e além disso fica a libertação.
Dentro da teia há escravidão e tudo está sob a lei. Para além não há lei. No que
se refere ao universo, a existência é governada pela lei, e para além dele fica a
liberdade. Enquanto estiverdes na teia do tempo, do espaço, da causalidade,
dizer que sois livres é tolice, porque essa teia está sob lei rigorosa. Todos os
pensamentos que tendes são causados, todos os sentimentos são causados, e
dizer que a vontade é livre não passa de mera tolice. Só quando a Existência
infinita vem, por assim dizer, para essa teia de maya, é que ela toma a forma de
vontade. Vontade é uma porção daquele Ser, apanhada nas teias da maya;
portanto, a vontade é um nome falso, uma denominação imprópria. Nada
significa - simples tolice. Assim é todo esse falatório com respeito a liberdade.
Não há liberdade em maya. Não há liberdade enquanto não fordes além de
maya. Essa é a verdadeira liberdade do Atma.
Os homens, por muito agudos e intelectuais que sejam, por mais claramente
que vejam a força - da lógica que diz nada poder ser livre aqui, sentem-se todos
compelidos a pensar que são livres. Não o podem evitar. Não há trabalho que
se possa realizar enquanto não começarmos a ver que somos livres. Isso
significa que a liberdade de que falamos é um relance do céu azul para além
das nuvens, e que a verdadeira liberdade - o próprio céu azul - está acolá. A
verdadeira liberdade não pode existir em meio desta ilusão, desta alucinação,
desta tolice do mundo, deste universo dos sentidos, do corpo e da mente.
Todos esses sonhos sem princípio nem fim, descontrolados e incontroláveis,
desajustados, rompidos, dissonantes, formam nossa ideia deste universo. Num
sonho, quando vedes um gigante com vinte cabeças vos perseguindo, e estais
fugindo dele, não achais que aquilo seja dissonante, achais que é apropriado e
direito. Assim é esta lei. Tudo quanto chamais lei é uma simples oportunidade
sem significação. Neste sonho em que estais, chamais a isso lei. Dentro de
maya, enquanto existir essa lei de tempo, espaço e causalidade, não
haverá liberdade, e todas essas várias formas de culto estão dentro dessa
maya. A ideia de Deus e as ideias do bruto e do homem estão dentro dessa
maya, e, como tais, são igualmente alucinações. Todas elas são sonhos.
Mas deveis ter o cuidado de não argumentar tal qual alguns homens
extraordinários de que ouvimos falar no tempo presente. Dizem que a ideia de
Deus é ilusão porém que a ideia deste mundo é verdadeira. Ambas as ideias
resistem ou tombam pela mesma lógica. Só ele tem o direito de ser um ateu
que nega este mundo, tanto quanto o outro. O mesmo argumento aplica-se a
ambos. A mesma massa de ilusão estende-se de Deus até o animal mais
insignificante, de um fio de capim ao Criador. Resistem ou caem pela mesma
lógica. A mesma pessoa que vê falsidade na ideia de Deus deve vê-la também
na ideia de seu próprio corpo e sua própria mente. Quando Deus se desvanece,
então se desvanecem também o corpo e a mente, e quando ambos se
desvanecem, o que é a Existência real permanece para sempre. "Ali os olhos
não podem ir, nem a fala, nem a mente. Não podemos vê-la, nem conhecê-la."
E compreendemos agora que até onde podem ir a fala, o pensamento, o
conhecimento e o intelecto, tudo fica dentro de maya, dentro da prisão. Para
além dela está. a Realidade. Ali não chegam a mente, e a fala.
Até aqui isso está certo, intelectualmente, mas é preciso que venha a prática. É
necessária alguma prática para compreender essa Unidade? Positivamente,
sim. Não quer dizer que ireis tornar-vos aquele Brahman: já o sois. Não quer
dizer que ides tornar-vos Deus ou ser perfeito: já sois perfeitos, e sempre que
Pensais não o ser será uma ilusão. Essa ilusão que diz serdes vós o Sr. ou a
Sra. Fulano de Tal pode desaparecer através de outra ilusão. O fogo engolirá o
fogo, e podeis usar uma ilusão para dominar outra ilusão. Uma nuvem virá e
afastará para longe outra nuvem, e depois ambas irão embora.
Que são essas práticas, então? Devemos sempre ter em mente que não iremos
ser livres, mas já somos livres. Toda a ideia de que somos prisioneiros é ilusão.
Toda a ideia de que somos felizes ou infelizes é uma tremenda ilusão, e outra
ilusão virá, a que temos de trabalhar e cultuar e lutar, para sermos livres.
Esta expulsará a primeira ilusão, depois ambas terão terminado.
Depois vem o controle da mente, acalmando-a de tal maneira que ela não se
desfaça em ondas e tenha toda a sorte de desejos. Manter a mente firme, sem
permitir que ela vacile através de causas externas ou internas, controlar a
mente perfeitamente, apenas pelo poder da vontade. O jnane-yogue não
recebe qualquer auxílio interno ou externo. Os instrumentos em que acredita
são o raciocínio filosófico, o conhecimento, e sua própria vontade.
Assim como vosso povo é corajoso bastante para saltar à boca de um canhão
no meio de um campo de batalha, nosso povo é corajoso bastante para pensar
e agir de acordo com a sua filosofia. Dá sua vida por isso "Sou Existência-
Conhecimento-Bem-aventurança Absoluta. Eu sou Ele. Eu sou Ele." Assim
como o ideal ocidental é manter o luxo na vida prática, assim o nosso é manter
a mais alta forma de espiritualidade, a fim de demonstrar que a religião não é
apenas palavras inconsistentes, mas pode ser levada avante, em todos os
pontos, nesta vida. Isso é titiksha, suportar tudo, não se queixar de nada. Eu
mesmo tenho visto homens que dizem: "Eu sou a Alma. Que vem a ser o uni.
verso para mim? Nem prazer nem dor, nem virtude nem vício, nem calor nem
frio. Nada é para mim". Isso é titiksha - não correr atrás dos prazeres do corpo.
Que é religião? Rezar: "Dá-me isto e aquilo!" Ideias loucas sobre religião! Os
que acreditam nelas não têm uma verdadeira ideia sobre Deus e a alma. Meu
Mestre6 costumava dizer que o abutre voa alto, cada vez mais alto, até se
tornar um simples ponto, mas seus olhos estão sempre no pedaço de carniça
que ficou na terra. Afinal, qual é o resultado de vossas ideias sobre religião?
Limpar as ruas e ter mais pão e roupas?
Quem se importa com pão e roupas? Milhões chegam e vão a cada minuto.
Quem se importa? Por que fazer questão das alegrias e vicissitudes deste
pequeno mundo? Ide para além dele, se ousais. Ide para além da lei, deixai
todo o universo desvanecer-se, e ficai sozinhos. "Eu sou Existência-Absoluta,
Conhecimento -Absoluto, Bem-aventurança-Absoluta. Eu sou Ele, Eu sou Ele."
Quarta parte
Não há senão um Atman: não pode haver dois. Vimos como em todo o universo
há apenas uma Existência, e essa única Existência, quando vista através dos
sentidos, é chamada mundo, o mundo da matéria. Quando é vista através da
mente, é chamada mundo dos pensamentos e ideias. E quando é vista como é,
então é o único Ser infinito. Deveis manter em vossas mentes o seguinte: não é
que exista uma alma no homem, embora eu tivesse de aceitar isso, de início,
como fora de dúvida, a fim de poder explicar. Mas há apenas uma Existência, e
essa Existência é o Atman, o Eu. Quando isso é percebido através dos
sentidos, através de imagens dos sentidos, é chamado corpo. Quando é
percebido através do pensamento, é chamado mente. Quando é percebido
através de sua própria natureza, é chamado o Atman, a única Existência.
Portanto, não existem três coisas numa só - o corpo, a mente, e o Eu, embora
esse fosse um caminho conveniente para o curso da explicação. Mas tudo isso
é Atman, e esse Ser único é às vezes chamado corpo, às vezes mente, e às
vezes Eu, segundo os diferentes pontos de vista. Não há senão um único Ser,
que os ignorantes chamam mundo.
Suponhamos que o vosso amigo seja o Sr. A, mas quando vislumbrais o Sr. A
como Sr. 13, não vedes absolutamente o Sr. A. Em cada um dos casos vedes
apenas um. Quando vos vedes como um corpo, sois corpo e nada mais, e esta
é a perceção da vasta maioria da humanidade. Podem falar de alma, da mente,
e de todas essas coisas, mas o que percebem é a forma física - tato, paladar,
visão, e assim por diante.
Por alguns momentos ele se manteve como uma estátua. Depois disse aos
alunos que enquanto se sentiu naquele estado, percebera, realmente, que todo
o mundo é feito de ideias. O gás, por algum tempo, levou-o a olvidar a
consciência do corpo, e mesmo aquilo que ele estava vendo como corpo,
começou a vislumbrar como ideias.
Tudo isso não passa de alucinações. Falando com realismo, ninguém nasce
nem morre. Não há céu, nem inferno, nem este mundo: todos os três realmente
jamais existiram. Contai a uma criança uma porção de histórias de fantasmas, e
fazei-a sair à rua, pela noite. Existe ali um pequeno toco de árvore. Que vê a
criança? Um fantasma, com as mãos estendidas, pronto para agarrá-la.
Suponhamos que um homem vire a esquina, desejando encontrar sua
namorada: vê naquele toco de árvore uma jovem. Um policial que venha da
mesma esquina vê o toco transformado em ladrão. O ladrão o vê como um
policial. Trata-se do mesmo toco de árvore, que foi visto de várias maneiras. O
toco é a realidade, e as visões do toco são as projeções das várias mentes.
Há um Ser, um Eu, que nunca vem nem vai. Quando um homem é ignorante,
deseja ir para o céu, ou para um lugar parecido. Durante toda a sua vida
pensou e tornou a pensar nisso, e quando esse sonho terreno se desvanece, vê
este mundo como um céu com anjos voando sobre ele. Se um homem deseja
toda a sua vida encontrar-se com os seus antepassados, consegue encontrá-
los, a partir de Adão, polis cria todos eles.
Estais onde estais. Esses sonhos, essas várias nuvens, movem--se. Um sonho
segue-se ao outro, sem conexão. Não há lei de conexão neste mundo, mas
pensamos que há uma grande quantidade de conexão. Todos vós lestes,
provavelmente, Alice no País das Maravilhas7. É o mais maravilhoso livro
infantil que foi escrito neste século. Quando eu o li, fiquei encantado, pois
sempre tive a intenção de escrever um livro assim para as crianças.
O que mais me agradou nele foi o que julgais ser o mais incongruente, pois ali
não há conexão. Uma ideia vem e salta sobre a outra, sem qualquer conexão.
Quando fostes crianças, julgastes ser aquela a mais maravilhosa conexão.
Assim, aquele homem tornou a apossar-se dos pensamentos de sua infância,
que eram perfeitamente conexos, então, para ele, e compôs aquele livro infantil.
E todos esses livros que os homens escrevem, tentando fazer as crianças
engolirem suas próprias ideias de adultos, são tolices. Todos nós somos
crianças crescidas, eis tudo. O mundo é a mesma coisa desconexa - Alice no
País das Maravilhas - sem qualquer conexão.
Nunca digais: "õ Senhor, sou um miserável pecador!" Quem vos ajudará? Sois
o auxílio do universo. Que, neste universo, pode ser de auxílio para vós? Onde
está o homem, o deus, ou o demónio que vos ajude? Que pode prevalecer
sobre vós? Sois o Deus do universo. Onde podereis encontrar auxílio? jamais o
auxílio veio de parte alguma a não ser de vós mesmos. Em vossa ignorância,
cada prece foi respondida por algum Ser, mas vós mesmos, sem o saber,
respondestes à prece. O auxílio veio de vós mesmos, e vós tivestes satisfação
em imaginar que certo Alguém vos estava mandando auxílio. Não há auxílio
para vós fora de vós mesmos: sois o Criador do universo. Como o bicho-da-
seda, tecestes um casulo em torno de vós. Quem vos salvará? Rompei vosso
casulo e sal dele como a bela borboleta, como alma liberta. Então, só então,
vereis a Verdade. Dizei sempre convosco mesmos: Eu sou Ele". Essas são
palavras que queimarão as escórias da mente, palavras que farão surgir as
tremendas energias que já estão dentro de vós, o poder infinito que dorme em
vossos corações. Tais coisas devem surgir através da verdade constantemente
ouvida, e de nada mais. Donde houver pensamentos de fraqueza, não vos
aproximeis. Evitai toda a fraqueza, se quiserdes ser um jnani.
Portanto, que vem a ser a meditação para o que Ele deseja erguer-se acima de
qualquer ideia de corpo ou mente, expulsar a ideia de que ele é o corpo. Por
exemplo, quando eu digo: "Eu, Swami", vem, imediatamente a ideia de corpo.
Que devo fazer, então? Devo dar uma forte pancada à minha mente, e dizer:
"Não, não sou o corpo, sou o Eu. Que importa venham a doença ou a morte
numa forma das mais horríveis? Eu não sou o corpo. Por que fazer bonito o
corpo? Para gozar a ilusão uma vez mais? Para continuar a escravização? Que
ela se vá. Não sou o corpo. Esse é o caminho do jnani.
O jnani sente que não pode esperar, que deve alcançar a meta agora mesmo. E
diz: "Sou livre através da eternidade, jamais estou preso. Sou o Deus do
universo através de toda a eternidade. Quem poderá fazer-me perfeito? Eu já
sou perfeito... Quando um homem é perfeito, vê perfeição nos outros.
Quando vê imperfeições, é a sua própria mente que se projeta Como pode ver
imperfeições se não as tem em si mesmo? Assim, o inane não faz caso da
perfeição, Não existe qualquer perfeição para ele. Assim que se liberta, não vê
o bem nem o mal. Quem vê o mal ou o bem? Quem os tem em si próprio. Quem
vê o corpo? Quem pensa que é o corpo. No momento em que vos libertais da
ideia de que sois o corpo, não vedes absolutamente o mundo. Ele se
desvanece para sempre. O jnani procura arrancar--se dessa prisão de matéria
pela força da convicção intelectual. Essa é a forma negativa - o neti, neti - "isto
não, isto não".
SWAMI VIVEKANANDA
JNANA-YOGA
AUTORREALIZAÇÃO ATRAVÉS DO CONHECIMENTO OU
DISCERNIMENTO
PRIMEIRA PARTE
Meditai: Acima está cheio de mim, abaixo está cheio de mim, no meio está
cheio de mim.
Eu estou em todos os seres, todos os seres estão em mim Om Tat Sat, Eu sou
Isso. Eu sou a existência, acima da mente Sou uno com o Espírito do Universo.
Não sou prazer nem dor.
O corpo bebe, come, e tudo o mais, Eu não sou o corpo. Não sou a mente. Sou
Ele.
Assim, o homem, depois de suas buscas vãs de vários deuses, completa o ciclo
e descobre que,o Deus imaginado por ele como sentado no céu, governando o
mundo, é seu próprio Eu. Nenhum outro, a não ser o Eu, era Deus, e o
Pequeno "eu" jamais existiu.
Desde os tempos mais recuados houve várias seitas espalhadas pela índia, e,
como nunca existiu uma igreja formulada ou reconhecida, ou corporação de
homens para designar em cada escola doutrinas sobre o que se deveria
acreditar, as pessoas tinham liberdade de escolher suas próprias fórmulas,
fazer sua própria filosofia e estabelecer suas próprias seitas.
Outra doutrina dos dualistas diz que todas as almas devem, finalmente,
alcançar a salvação. Nenhuma delas ficará do lado de fora. Através de várias
vicissitudes, através de vários sofrimentos e prazeres, cada uma delas sairá,
por fim. Sairá de quê? A ideia comum é a de que todas as almas têm de sair
deste universo. Nem o universo que vemos e sentimos, nem mesmo um
universo imaginário, podem ser o certo, o verdadeiro, porque ambos estão
mesclados com o bem e o mal.
Segundo os dualistas, há, para além deste universo, um lugar cheio de
felicidade e de bem, apenas, e quando esse lugar for alcançado, não haverá
mais necessidade de nascer e renascer, de viver e morrer, e essa ideia lhes é
muito cara. Ali não há mais doenças, não há morte. Existirá uma felicidade
eterna, e eles estarão na presença de Deus todo o tempo, e gozarão essa
presença para sempre. Acreditam que todos os seres, do verme mais baixo até
os mais altos anjos e deuses, atingirão, mais cedo ou mais tarde, o mundo onde
não mais haverá sofrimento. Mas nosso mundo jamais terminará. Continuará a
existir infinitamente, embora movendo-se em ondas. Embora movendo-se em
ciclos, jamais terminará. O número de almas que devem ser salvas, que devem
ser aperfeiçoadas, é infinito.
A verdadeira filosofia Vedanta começa com os que são conhecidos como não-
dualistas qualificados. Declaram eles que o efeito jamais difere da causa; que o
efeito é a causa reproduzida sob outra forma. Se o universo é o efeito e Deus é
a causa, o universo deve ser o próprio Deus; não pode ser senão isso.
Começam eles com a afirmativa de que Deus é, ao mesmo tempo, a causa
eficiente do universo e seu Criador, e, ainda, o material do qual se projetou toda
a natureza. A palavra "criação" de vossa língua, não tem equivalente em
sânscrito, porque não há seita, na índia, que acredite na criação, tal como ela é
vista no Ocidente, isto é, algo que veio do nada.
"Assim como a aranha tece a linha tirada de seu próprio corpo, todo o universo,
da mesma maneira, vem daquele Ser".
Deus é, por assim dizer, a alma, e a natureza, e as almas são o corpo de Deus.
Tal como eu tenho um corpo e uma alma, todo o universo e todas as almas são
o corpo de Deus, e Deus é a Alma das almas. Assim, Deus é a causa material
do universo. O corpo pode ser modificado - pode ser jovem ou velho, forte ou
fraco - mas isso em nada afeta a alma. É a mesma existência eterna,
manifestando-se através do corpo. Corpos vêm e vão, mas a alma não muda.
Mesmo assim o universo inteiro é o corpo de Deus, e nesse sentido é Deus.
Mas a mudança do universo não afeta Deus. Desse material Ele cria o universo,
e ao fim de um ciclo Seu corpo se torna mais fino, contrai-se, e no início de
outro ciclo torna-se novamente expandido, e dele emanam todos esses mundos
diferentes.
Como pode ser isso? Deus, o puro, o espírito, tornou-se universo? Sim,
aparentemente é assim. Aquilo que todas as pessoas ignorantes veem como
universo, não existe, realmente. Que somos, vós e eu, e todas as coisas que
vemos? Simples auto-hipnotismo. Não há senão uma Existência, a infinita, a
sempre abençoada. Nessa Existência sonhamos todos esses vários sonhos. É
o Atman (Palavra da terminologia sânscrita ,Alma Universal, Energia divina, que
anima o ser do homem como o Sol anima a Terra. O Logos, no qual todas as
coisas estão, e todos os seres do universo procedem. Deus omnisciente,
omnipresente e omnipotente) para além de tudo, o infinito, para além do
conhecido, para além do conhecível, e através disso vemos o universo. Essa é
a única realidade. Ela é esta mesa, é a parede, é tudo, menos o nome e a
forma. Retirai a forma da mesa, retirai-lhe o nome, e o que permanecer será a
mesa. O vedantista não diz "ele" ou "ela", pois essas são ilusões, ficções do
cérebro humano. Não há sexo na alma. As pessoas que estão sob a ilusão, que
se tornaram como que animais, veem a mulher ou o homem. Deuses vivos não
veem homens nem mulheres. Como podem vê-los, eles que estão para além de
tudo que tenha ideia de sexo? Tudo e todos são Atman, o Eu - assexuado,
puro, sempre abençoado. O nome, a forma, o corpo, é que são materiais, e
fazem toda essa diferença. Se retirardes essas duas diferenças de nome e
forma, todo o universo é um. Não há dois, mas um, por toda a parte. Vós e eu
somos um. Não há natureza, nem Deus, nem universo - apenas uma Existência
infinita, da qual, através de nome e de forma, todas essas coisas são
manufaturadas.
Como conhecer o Conhecedor? Ele não pode ser conhecido. Como podeis ver
vosso próprio Eu? Só podeis refletir vós mesmos. Assim, todo este universo é o
reflexo desse ser eterno, o Atman, e como o reflexo tomba sobre bons ou maus
refletores, também imagens boas ou más são adicionadas.
Como pode morrer? Para onde pode ir? Todos esses céus, todas essas terras,
são vãs imaginações da mente. Não existem, jamais existiram no passado, e
jamais existirão no futuro. Eu sou omnipresente, eterno. Para onde posso ir?
Onde ainda não estou desde já? Estou lendo este livro da natureza.
Outra página da vida foi voltada, outro sonho da vida chega, e vai, rolando,
rolando. E quando eu tiver terminado minha leitura, abandono-a e ponho-me de
lado. Atiro fora o livro, e tudo estará terminado.
Devo adorar, portanto, apenas o meu Eu. "Eu cultuo o meu Eu" - diz o
advaitista. "Diante de quem devo-me curvar? Eu saúdo o meu Eu. A quem devo
pedir auxílio? Quem pode me ajudar, a mim, o Ser Infinito do universo?" Esses
são sonhos aloucados, alucinações. Quem jamais ajudou alguém? Ninguém
Onde virdes um homem fraco, um dualista, chorando e gemendo por auxílio
vindo de algures, de cima dos céus, é porque ele não sabe que os céus
também estão nele. Deseja auxílio dos céus, e o auxílio vem.
Vemos que vem, mas vem de dentro dele próprio, e ele se engana supondo que
vem de fora. Às vezes, um doente jaz no leito e pode ouvir que batem à porta.
Levanta-se, abre, e vê que ali não há ninguém. Volta ao leito e de novo ouve
que batem. Levanta-se e abre a porta. Ninguém ali está. Por fim descobre que
eram as pancadas de seu próprio coração que lhe pareciam pancadas na porta.
Entretanto, como pode iludir-se esse perfeito Deus? Nunca o foi. Como poderia
um deus perfeito estar sonhando? Nunca sonhou. A verdade jamais sonha. A
própria indagação de onde surgiu essa ilusão é absurda. A ilusão surge apenas
da ilusão. Não haverá ilusão desde que a verdade seja vista. A ilusão sempre
repousa na ilusão, jamais repousa em Deus, na Verdade, no Atman. jamais
estais em ilusão, é a ilusão que está em vós, diante de vós. Uma nuvem aqui
está. Outra vem, expulsa a primeira e toma o seu lugar. Vem uma terceira, que
por sua vez expulsa essa. Assim como diante do céu eternamente azul nuvens
de várias tonalidades e colorações surgem, permanecem por um. pequeno
espaço de tempo, e desaparecem, deixando o mesmo e eterno azul, vós sois,
eternamente, puros, perfeitos.
"O que está neste mundo de muitos, vê aquele Único. O que está nesta massa
de inconsciência, vê aquele único Ser consciente. Quem está neste mundo de
sombras, aprende aquela Realidade - e nela está a paz eterna e em ninguém
mais, "em ninguém mais."
São esses os pontos principais dos três passos que o pensamento religioso
hindu tomou em relação a Deus. Vimos que ele começou com um Deus
pessoal, extra-cósmico. Foi do Deus externo para o Deus imanente no universo.
E terminou identificando a própria alma com aquele Deus, e fazendo uma Alma,
uma unidade, de todas essas várias manifestações do universo. Esta é a última
palavra dos Vedas. O pensamento religioso hindu começa com o dualismo,
passa através do não-dualismo qualificado, e termina em perfeito não dualismo.
Sabemos que poucos neste mundo podem chegar a este último ponto, ou
mesmo podem ter a ousadia de acreditar nele. Menor é o número dos que
ousam agir de acordo com ele. Entretanto, sabemos que nele está a explicação
para toda a ética, para toda a moralidade, para toda a espiritualidade do
universo. Por que dizem todos: "Fazei bem aos outros?" Onde está a explicação
? Por que todos os grandes homens pregaram a fraternidade da humanidade, e
outros maiores pregaram a fraternidade de todas as vidas?
Porque, fossem ou não fossem conscientes disso, para além de tudo, através
de todas as suas irracionais superstições pessoais, estavam fitando diante de si
a eterna luz do Eu, negando todas as multiplicidades, e afirmando que todo o
universo não passa de Um.
Assim, a última palavra nos deu um universo, que vemos, através dos sentidos,
como matéria, através do intelecto como alma, e através do espírito como Deus.
Para o homem que se envolve em véus, os véus que o mundo chama
perversidade e mal, esse mesmo universo mudará e se transformará num lugar
hediondo.
Para outro homem, que deseja prazeres, esse mesmo universo se modificará e
se tornará um céu. E para o homem perfeito tudo desaparecerá, e se tornará
seu próprio Eu.
Bem: tal como a sociedade existe no tempo presente, todos esses três estágios
são necessários. Uma absolutamente não nega o outro, antes é, simplesmente,
a complementação do outro. O advaitista, ou o advaitista qualificado, não diz
que esse dualismo é errado: é uma visão certa, mas inferior. Está a caminho da
verdade.
Portanto, que cada qual tenha sua própria visão deste universo, de acordo com
suas próprias ideias. Não injurieis ninguém, não negueis a posição de ninguém.
Tomai o homem como ele é, e, se puderdes, dai-lhe mão de auxílio e colocai-o
em plataforma mais alta. Mas não o injurieis nem destruais. Todos chegarão à
verdade, com o correr do tempo.
Mas o último e o maior conselho diz que não deveis absolutamente chorar. Não
precisais realizar todas essas cerimónias nem tomar conhecimento de como
reaver O vosso império porque jamais o perdestes.
Por que deveríeis procurar o que jamais perdestes ? Sois puros desde já, desde
já sois livres. Se pensais que sois livres, livres sereis neste momento, e se
pensais que estais aprisionados, aprisionados estareis.
Essa é uma declaração muito atrevida. Pode assustar-vos agora, mas quando
pensardes nela e a compreenderdes em vossa própria vida, então sabereis que
o que eu digo é verdade. Porque, supondo que a liberdade não é a vossa
natureza, não há forma alguma de vos tornardes livres. Supondo que sois livres
e que de certa forma perdestes essa liberdade, isso mostra que não éreis livres
no começo. Se tivésseis sido livres, o que poderia levar-vos a perder essa
liberdade? O independente jamais se pode tornar dependente.
Dos dois lados, qual escolhereis, então? Se dizeis que a alma era por sua
natureza pura e livre, segue-se, naturalmente, que nada no universo poderia
torná-la aprisionada ou limitada. Mas se havia algo na natureza que podia
aprisionar a alma, segue-se, naturalmente, que ela não era livre, e vossa
declaração de que ela era livre não passava de uma ilusão. Assim, se nos é
possível alcançar a liberdade, a conclusão é inevitável: a alma é livre por sua
natureza. Não pode ser de outra maneira.
Portanto, também aqui, sob forma mais intrincada, sob forma mais filosófica,
encontramos a mesma questão referente à prisão e à liberdade. Um lado diz
que a primeira é uma ilusão, e a outra, que a segunda é uma ilusão. E,
naturalmente, ficamos com a segunda, ao acreditarmos que nossa prisão é uma
ilusão.
Há uma ideia que com frequência milita contra ela, É a seguinte: está muito
bem dizer: "Eu sou Puro, eu sou Abençoado"; mas não posso mostrar sempre
isso em minha vida. É verdade. O ideal é sempre muito duro. Toda a criança, ao
nascer, vê o céu sobre a sua cabeça, muito longe, mas por isso deveríamos
deixar de olhar para o céu? Se não pudermos obter o néctar, resolveríamos a
questão bebendo veneno? Será de algum auxílio para nós o fato de, não
podendo compreender imediatamente a verdade, entrarmos nas trevas e nos
rendermos à fraqueza e à superstição?
Não faço objeções ao dualismo em muitas de suas formas. Gosto da maioria
delas, mas faço objeções a todas as formas de ensinamento que inculquem
fraqueza. Essa é a única pergunta que faço a cada homem, mulher ou criança
que esteja em treinamento físico, mental ou espiritual: "Sois forte? Sentis
força?" Porque sei que é só a Verdade que dá a força, sei que só a Verdade dá
vida. Nada mais a não ser o caminho para a Realidade nos fará fortes, e
ninguém alcançará a Verdade enquanto não for forte.
Eu vos desafio, um a um. Como vos comportaríeis se eu vos pusesse nas mãos
um bebezinho? Toda a vossa vida se modificaria no momento, e fosseis o que
fosseis, deveríeis tornar-vos destituídos de egoísmo naquele momento.
Abandonaríeis todas as ideias criminosas assim que a responsabilidade fosse
atirada sobre vós e vosso caráter se modificaria por inteiro. Assim, se toda a
responsabilidade fosse atirada sobre nossos ombros, estaríamos a agir em
nosso ponto melhor e mais alto. Quando nada temos para procurar às
apalpadelas, nem demónio sobre o qual lançar as culpas, nem Deus Pessoal
para carregar nossas cargas, quando só nós somos responsáveis, então nos
erguemos até o melhor e o mais alto. "Sou responsável pelo meu destino, sou
quem traz o bem para mim próprio, sou quem traz o mal para mim próprio. Sou
o Puro e o Abençoado."
Esta, diz a Vedanta, é a única prece que deveríamos ter. Este é o único
caminho para alcançar a meta, dizer a nós mesmos e dizer a todos os demais,
que somos divinos. E conforme formos repetindo isso, a força virá. O que de
início vacila irá se tornando cada vez mais forte, nossa voz aumentará de
volume, até que a verdade tome posse de nossos corações e corra através de
nossas veias, e impregne nossos corpos.
JNANA-YOGA
AUTORREALIZAÇÃO ATRAVÉS DO CONHECIMENTO OU
DISCERNIMENTO
SEGUNDA PARTE
Vós não podeis ver vossa própria face a não ser num espelho, e assim o Eu
não pode ver Sua própria natureza enquanto ela não for refletida, e todo este
universo, é, portanto, o Eu tentando compreender-se. Esse reflexo é
reproduzido primeiro do protoplasma depois de plantas e animais, e assim por
diante, cada vez de melhores refletores, até que o melhor refletor - o homem
perfeito - é alcançado. Tal como um homem que, desejando ver seu próprio
rosto, olha primeiro para uma pequena poça de água lodosa, e apenas vê um
contorno, depois vai para a água limpa e vê melhor imagem, e a seguir, diante
de um pedaço de metal brilhante vê imagem ainda melhor, para, finalmente,
colocando-se diante de um espelho, ver-se tal qual é. Portanto, o homem
perfeito é o mais alto reflexo desse Ser, que, ao mesmo tempo, é substância e
objeto.
Agora, descobrireis por que o homem instintivamente cultua tudo, e por que o
homem perfeito é instintivamente cultuado como Deus em cada país. Podeis
dizer o que quiserdes, mas são eles que se destinam a ser cultuados. Por isso
os homens cultuam Encarnações, tais como o Cristo ou Buda. Elas são as mais
perfeitas manifestações do Eu eterno. Estão muito acima de todas as
conceções de Deus que vós e eu podemos fazer. Um homem perfeito é muito
maior do que essas conceções. Nele, o círculo se completa, e a substância e o
objeto fazem-se um. Nele, as ilusões se desvanecem, e em lugar delas vem a
compreensão de que sempre foi aquele Ser perfeito.
Certa vez eu viajava pelo deserto, na Índia. Viajei por mais de um mês, sempre
encontrando as mais belas paisagens diante de mim, bonitos lagos, e tudo o
mais. Um dia, tendo muita sede, desejei beber a água de um daqueles lagos,
mas quando me aproximei, o lago desapareceu. Imediatamente, como uma
pancada, veio-me ao cérebro a ideia de que aquilo era a miragem, sobre a qual
eu tinha lido toda a minha vida. Então, recordei-me, e sorri da minha loucura:
durante o mês que se escoara, todas as belas paisagens e lagos que eu
estivera vendo tinham sido miragens, mas eu não sabia distingui-las. No manhã
seguinte eu estava novamente a caminho. Lá estavam o lago e a paisagem,
mas com eles me veio imediatamente a ideia: "Isto é miragem". Uma vez
conhecida, ela perdera seu poder de me iludir.
Quando um homem alcança esse estado, chamam-no jivanka, "o que vive livre",
livre mesmo enquanto vive.
Mas a pergunta assumiu uma alta forma filosófica: "Como surgiu essa ilusão?"
E a resposta é igualmente alta. A resposta é que não podemos esperar
resposta alguma a uma pergunta impossível. A própria pergunta é
autocontraditória. Não tendes o direito de fazer essa pergunta. Por que? Que é
a perfeição? O que está para além do tempo, do espaço, da causação. Isso é
perfeito. Então perguntais como o perfeito se tornou imperfeito. Na linguagem
lógica, a pergunta pode ser colocada nos seguintes termos: "Como aconteceu
que o que está para além da causalidade se tornou causado?" Vós vos
contradizeis. Primeiro admitis que isso está para além da causalidade e depois
indagais o que causa isso. Essa pergunta só pode ser respondida dentro dos
limites da causalidade. É pergunta que pode ser feita até onde o tempo, o
espaço e a causalidade se estendam. Mas, para além disso, seria tolice
formulá-la, porque a pergunta seria ilógica.
Há outra resposta que não fica assim em plano filosófico tão alto. Pode
qualquer realidade produzir ilusão? Certamente não. Vemos que uma ilusão
produz outra, e assim por diante. É sempre a ilusão que produz ilusão. É a
doença que produz doença e não a saúde que produz doença. A onda é a
mesma coisa que a água; o efeito é a causa sob outra forma. O efeito é ilusão,
portanto, a causa deve ser ilusão. Que produziu essa ilusão? Outra ilusão. E
assim vai, sem princípio. A única pergunta que vos resta fazer, é: "Não rompe
nosso monismo o fato de termos duas existências no universo - uma o Eu, e a
outra a ilusão?" A resposta é:
"A ilusão não pode ser chamada uma existência. Milhares de sonhos entram em
vossa vida, mas não formam qualquer parte de vossa vida. Os sonhos vêm e
vão: não têm existência. Chamar existência à ilusão seria sofisma. Há, portanto,
apenas uma Existência indivisível no universo, sempre livre e sempre
abençoada, e é isso que sois".
Acabamos de ver que o Eu não pode ver a si próprio. Nosso conhecimento está
dentro de uma teia de maya, de irrealidade, e além disso fica a libertação.
Dentro da teia há escravidão e tudo está sob a lei.
Os homens, por muito agudos e intelectuais que sejam, por mais claramente
que vejam a força da lógica que diz nada poder ser livre aqui, sentem-se todos
compelidos a pensar que são livres. Não o podem evitar. Não há trabalho que
se possa realizar enquanto não começarmos a ver que somos livres. Isso
significa que a liberdade de que falamos é um relance do céu azul para além
das nuvens, e que a verdadeira liberdade - o próprio céu azul - está acolá. A
verdadeira liberdade não pode existir em meio desta ilusão, desta alucinação,
desta tolice do mundo, deste universo dos sentidos, do corpo e da mente.
Todos esses sonhos sem princípio nem fim, descontrolados e incontroláveis,
desajustados, rompidos, dissonantes, formam nossa ideia deste universo. Num
sonho, quando vedes um gigante com vinte cabeças vos perseguindo, e estais
fugindo dele, não achais que aquilo seja dissonante, achais que é apropriado e
direito. Assim é esta lei.Tudo quanto chamais lei é uma simples oportunidade
sem significação. Neste sonho em que estais, chamais a isso lei. Dentro de
maya, enquanto existir essa lei de tempo, espaço e causalidade, não haverá
liberdade, e todas essas várias formas de culto estão dentro dessa maya. A
ideia de Deus e as ideias do bruto e do homem estão dentro dessa maya, e,
como tais, são igualmente alucinações. Todas elas são sonhos.
Mas, deveis ter o cuidado de não argumentar tal qual alguns homens
extraordinários de que ouvimos falar no tempo presente. Dizem que a ideia de
Deus é ilusão porém que a ideia deste mundo é verdadeira.
Ambas as ideias resistem ou tombam pela mesma lógica. Só ele tem o direito
de ser um ateu que nega este mundo, tanto quanto o outro. O mesmo
argumento aplica-se a ambos. A mesma massa de ilusão estendesse de Deus
até o animal mais insignificante, de um fio de capim ao Criador. Resistem ou
caem pela mesma lógica. A mesma pessoa que vê falsidade na ideia de Deus
deve vê-la também na ideia de seu próprio corpo e sua própria mente. Quando
Deus se desvanece, então se desvanecem também o corpo e a mente, e
quando ambos se desvanecem, o que é a Existência real permanece para
sempre. "Ali os olhos não podem ir, nem a fala, nem a mente. Não podemos vê-
la, nem conhecê-la." E compreendemos agora que até onde podem ir a fala, o
pensamento, o conhecimento e o intelecto, tudo fica dentro de maya, dentro da
prisão. Para além dela está. a Realidade. Ali não chegam a mente, e a fala.
Até aqui isso está certo, intelectualmente, mas é preciso que venha a prática. É
necessária alguma prática para compreender essa Unidade? Positivamente,
sim. Não quer dizer que ireis tornar-vos aquele brâmane. já o sois. Não quer
dizer que ides tornar-vos Deus ou ser perfeito: já sois perfeitos, e sempre que
Pensais não o ser será uma ilusão. Essa ilusão que diz serdes vós o Sr. ou a
Sra. Fulano de Tal pode desaparecer através de outra ilusão. O fogo engolirá o
fogo, e podeis usar uma ilusão para dominar outra ilusão. Uma nuvem virá e
afastará para longe outra nuvem, e depois ambas irão embora.
Que são essas práticas, então? Devemos sempre ter em mente que não iremos
ser livres, mas já somos livres. Toda a ideia de que somos prisioneiros é ilusão.
Toda a ideia de que somos felizes ou infelizes é uma tremenda ilusão, e outra
ilusão virá, a que temos de trabalhar e cultuar e lutar, para sermos livres. Esta
expulsará a primeira ilusão, depois ambas terão terminado.
O mullah pensou por um minuto e então encontrou a única solução, dizendo: "A
única maneira é arranjares um cão e fazê-lo comer um bocado do mesmo prato,
porque cães e raposas estão sempre em disputa. A comida que foi deixada pela
raposa irá ter ao teu estômago, e também a que for deixada pelo cão, pois cada
impureza anulará ,a outra".
Depois vem o controle da mente, acalmando-a de tal maneira que ela não se
desfaça em ondas e tenha toda a sorte de desejos. Manter a mente firme, sem
permitir que ela vacile através de causas externas ou internas, controlar a
mente perfeitamente, apenas pelo poder da vontade. O jnana-yogue não recebe
qualquer auxílio interno ou externo. Os instrumentos em que acredita são o
raciocínio filosófico, o conhecimento, e sua própria vontade.
Eu sou Ele. Eu sou Ele." Assim como o ideal ocidental é manter o luxo na vida
prática, assim o nosso é manter a mais alta forma de espiritualidade, a fim de
demonstrar que a religião não é apenas palavras inconsistentes, mas pode ser
levada avante, em todos os pontos, nesta vida. Isso é titiksha, suportar tudo,
não se queixar de nada. Eu mesmo tenho visto homens que dizem: "Eu sou a
Alma. Que vem a ser o universo para mim? Nem prazer nem dor, nem virtude
nem vício, nem calor nem frio. Nada é para mim". Isso é titiksha - não correr
atrás dos prazeres do corpo.
Que é religião? Rezar: "Dá-me isto e aquilo!" Idéias loucas sobre religião! Os
que acreditam nelas não têm uma verdadeira ideia sobre Deus e a alma. Meu
Mestre costumava dizer que o abutre voa alto, cada vez mais alto, até se tornar
um simples ponto, mas seus olhos estão sempre no pedaço de carniça que
ficou na terra. Afinal, qual é o resultado de vossas ideias sobre religião? Limpar
as ruas e ter mais pão e roupas?
Quem se importa com pão e roupas? Milhões chegam e vão a cada minuto.
Quem se importa? Por que fazer questão das alegrias e vicissitudes deste
pequeno mundo? Ide para além dele, se ousais. Ide para além da lei, deixai
todo o universo desvanecer-se, e ficai sozinhos. "Eu sou Existência-Absoluta,
Conhecimento-Absoluto, Bem-aventurança-Absoluta. Eu sou Ele, Eu sou Ele."
O jnani diz: A mente não existe, nem o corpo. Sua meditação, portanto, é a
mais difícil, a negativa.
Ele nega tudo, e o que fica é o Eu. O jnani deseja arrancar o universo do Eu
pela mera força da análise. O jnani procura arrancar--se ao seu aprisionamento
da matéria pela força da convicção intelectual. Este é o caminho negativo - o
neti, neti - "isto não, isto não".
Não há senão um Atman: não pode haver dois. Vimos como em todo o universo
há apenas uma Existência, e essa única Existência, quando vista através dos
sentidos, é chamada mundo, o mundo da matéria.
Portanto, não existem três coisas numa só - o corpo, a mente, e o Eu, embora
esse fosse um caminho conveniente para o curso da explicação. Mas tudo isso
é Atman, e esse Ser único é às vezes chamado corpo, às vezes mente, e às
vezes Eu, segundo os diferentes pontos de vista. Não há senão um único Ser,
que os ignorantes chamam mundo.
Há um Ser, um Eu, que nunca vem nem vai. Quando um homem é ignorante,
deseja ir para o céu, ou para um lugar parecido. Durante toda a sua vida
pensou e tornou a pensar nisso, e quando esse sonho terreno se desvanece, vê
este mundo como um céu com anjos voando sobre ele. Se um homem deseja
toda a sua vida encontrar-se com os seus antepassados, consegue encontrá-
los, a partir de Adão, polis cria todos eles.
Estais onde estais. Esses sonhos, essas várias nuvens, movem--se. Um sonho
segue-se ao outro, sem conexão. Não há lei de conexão neste mundo, mas
pensamos que há uma grande quantidade de conexão.
Rompei vosso casulo e saí dele como a bela borboleta, como alma liberta.
Então, só então, vereis a Verdade. Dizei sempre convosco mesmos: Eu sou
Ele". Essas são palavras que queimarão as escórias da mente, palavras que
farão surgir as tremendas energias que já estão dentro de vós, o poder infinito
que dorme em vossos corações. Tais coisas devem surgir através da verdade
constantemente ouvida, e de nada mais. Donde houver pensamentos de
fraqueza, não vos aproximeis. Evitai toda a fraqueza, se quiserdes ser um jnani.
O jnani diz: a mente não existe, o corpo não existe. Essa ideia de corpo e mente
deve ir embora, deve ser expulsa, portanto é loucura pensar neles. Seria como
tentar curar um mal pela aplicação de outro. Sua meditação é portanto a mais
difícil, porque é a negativa: ele nega tudo, e o que fica é o Eu. Essa é a maneira
mais analítica. O jnani deseja arrancar o universo do Eu pela pura força da
análise. É muito fácil dizer: "Eu sou um jnani". Mas é muito difícil ser, realmente,
um jnani. O caminho é longo; é, por assim dizer, como caminhar sobre o fio de
uma navalha, e ainda assim não se desesperar.
"Acordai levantai-vos, e não pareis até que tenhais atingido à meta." Assim
dizem os Vedas. Portanto, que vem a ser a meditação para o que Ele deseja
erguer-se acima de qualquer ideia de corpo ou mente, expulsar a ideia de que
ele é o corpo. Por exemplo, quando eu digo: "Eu, Swami", vem, imediatamente
a ideia de corpo. Que devo fazer, então? Devo dar uma forte pancada à minha
mente, e dizer: "Não, não sou o corpo, sou o Eu. Que importa venham a doença
ou a morte numa forma das mais horríveis? Eu não sou o corpo. Por que fazer
bonito o corpo? Para gozar a ilusão uma vez mais? Para continuar a
escravização? Que ela se vá. Não sou o corpo. Esse é o caminho do jnani.
O jnani sente que não pode esperar, que deve alcançar a meta agora mesmo. E
diz: "Sou livre através da eternidade, jamais estou preso. Sou o Deus do
universo através de toda a eternidade. Quem poderá fazer-me perfeito? Eu já
sou perfeito...
SWAMI VIVEKANANDA
Autorrealização Através do Amor a Deus
(Bhakti-Yoga)
"Que o amor que os faltos de discernimento nutrem pelos fugazes objetos dos
sentidos, jamais abandone este meu coração, que é o de quem Te busca!"
Esse amor, quando dado a Deus, é chamado Bhakti. Bhakti não é destrutivo.
Ensina que nenhuma das faculdades que temos nos foi dada em vão, e que é
através delas que encontramos o caminho natural para a libertação. Bhakti não
mata nossas tendências, não vai contra a natureza, mas só lhes dá uma direção
mais nobre e mais poderosa. Quando o mesmo amor dedicado aos objetos dos
sentidos é dedicado a Deus, esse amor se chama Bhakti. O principal é desejar
Deus. Só quando nos saciamos de tudo que aqui existe é que olhamos para o
além, em busca de suprimento. Parai com os brinquedos infantis do mundo
assim que puderdes, e então notareis a necessidade de algo para além do
mundo, e virá o primeiro passo na religião.
Há uma forma de religião que segue a moda. Minha amiga tem tal mobília em
sua sala; é moda ter um vaso japonês; portanto, ela precisa também ter um
ainda que custe mil dólares. Da mesma maneira teremos uma pequena religião,
e frequentaremos uma igreja. Bhakti não é para essas pessoas. Isso não é
desejar.
Desejar é querer algo sem o qual não se pode viver., Desejamos respirar,
desejamos alimento, desejamos roupas. Sem isso não podemos viver. Quando
um homem ama uma mulher neste mundo, há momentos em que ele imagina
não poder viver sem ela, embora isso seja um engano. Quando um marido
morre, a esposa pensa que não poderá viver sem ele, mas vive, apesar de tudo.
Esse é o segredo da necessidade. Algo sem o qual não se pode viver.
Devemos ter esse algo, senão morreremos. Quando chegar a ocasião de assim
nos sentirmos em relação a Deus, ou, em outras palavras, desejarmos algo
para além deste mundo algo acima de todas as forças materiais, então
poderemos tornar-nos bhaktas.
Primeira Parte
Não há, realmente, muita diferença entre conhecimento (jnana) e amor (bhakti),
como às vezes se imagina.
Sempre se deve compreender que o Deus Pessoal cultuado pelo Máta não é
separado ou diferente de Brama. Tudo é Brama, o Único sem segundo.
Contudo, como Unidade, ou Absoluto, Brama é uma abstração excessiva para
ser amado e cultuado. Assim, o bhakta escolhe um aspecto relativo de Brama,
isto é, Ishvara, o Governante Supremo. Para usar um símile: Brama é a argila
ou a substância da qual uma infinita variedade de artigos é moldada. Como
argila, tais artigos são apenas um, mas formam diferentes manifestações dela.
Antes que cada um deles fosse feito, todos existiam potencialmente na argila, e,
como é natural, eram idênticos no que se refere à substância. Mas, uma vez
formados, e enquanto a forma permanece, são separados e diferentes. O rato
de argila jamais pode tornar-se um elefante de argila, porque, na qualidade de
manifestações, somente a forma faz deles o que são, embora como argila
informe sejam apenas um. Ishvara é a mais alta manifestação da Realidade
Absoluta, ou, em outras palavras, a leitura mais alta do Absoluto que a mente
humana pode fazer. A Criação é eterna, como eterno é Ishvara.
Segunda Parte
Esse impulso para a frente não pode ser haurido nos livros. A alma só pode
receber impulsos de outra alma, e de nada mais. Podemos estudar os livros
toda a nossa vida, podemos tornar-nos muito intelectuais, mas ao fim
verificaremos que não nos desenvolvemos absolutamente no sentido espiritual *
Não é verdade que uma ordem mais alta de desenvolvimento intelectual
acompanhe sempre o desenvolvimento espiritual proporcionado ao homem.-
Estudando livros somos às vezes levados à ilusão de pensar que por eles
estamos sendo espiritualmente auxiliados. Mas, se analisarmos o efeito desses
livros sobre nós, veremos que, no máximo, é apenas o nosso intelecto o que tira
proveito de tais estudos, e não o nosso espírito interior. Essa inaptidão dos
livros para acelerarem o crescimento espiritual é a razão pela qual, embora
cada um de nós possa falar maravilhosamente sobre assuntos espirituais,
quando chega o momento da ação e de viver a verdadeira vida espiritual,
verificamos quão tremendas são nossas deficiências. Para ativar-nos o espírito,
o impulso deve vir-nos de uma outra alma.
Há, entretanto, certos perigos no caminho. Há, por exemplo, o perigo para a
alma recipiendária, de confundir suas emoções momentâneas com o autêntico
desejo de religião. Podemos estudar isso em nós mesmos. Muitas vezes, em
nossas vidas morre alguém que amávamos. Recebemos um golpe, sentimos
que o mundo está-nos fugindo entre os dedos, que desejamos algo mais seguro
e mais alto, e que devemos nos tornar religiosos. Em poucos dias aquela onda
de sentimentos passa, e ficamos encalhados no mesmo ponto em que
estávamos antes. Todos nós confundimos, com frequência, tais impulsos com a
verdadeira sede de religião, mas, enquanto essas emoções momentâneas
forem assim confundidas, o anseio autêntico e contínuo de religião não nos virá
e não encontraremos o transmissor de espiritualidade. Assim, sempre que
estejamos tentados a nos queixar de que nossa pesquisa em relação à verdade
que tanto desejamos está-se revelando vã, nosso primeiro dever, em lugar de
nos queixarmos, deve ser olhar dentro de nossas almas e verificar se o anseio
do coração é autêntico. Então, na imensa maioria dos casos, descobriremos
que não estamos preparados para receber a verdade, que não existe aquela
sede genuína de espiritualidade.
O mundo está cheio dessas pessoas. Todos querem ser mestres. Todo o
mendigo quer fazer doações de um milhão de dólares! Assim como esses
mendigos são ridículos, ridículos são esses mestres.
Como podemos conhecer um mestre, então? O Sol não precisa de tocha que o
torne visível. Não precisamos acender uma vela para contemplá-lo. Quando o
Sol se levanta, tornamo-nos instintivamente conscientes do fato, e quando um
mestre de homens vem-nos ajudar, a alma saberá instintivamente que a
verdade já começou a brilhar sobre ela. A verdade apoia-se em seu próprio
testemunho, e não requer qualquer outro para provar que é verdade. É auto-
refulgente. Penetra nos mais recônditos escaninhos de nossa natureza, e à sua
presença todo o universo se ergue e diz: "Esta é a verdade". Os mestres cuja
sabedoria e verdade brilham como a luz do Sol, são os maiores que o mundo
conheceu, e veem-se cultuados como Deus pela maioria da humanidade. Mas
também poderemos obter auxílio de outros relativamente menores. Apenas, não
possuímos bastante intuição para julgar com propriedade o homem do qual
recebemos ensinamento e orientação. Assim, precisa haver determinados
testes, certas condições que o instrutor deve satisfazer, o mesmo se dando com
o aprendiz.
A terceira condição relaciona-se com o motivo. O instrutor não deve ensinar por
qualquer motivo ulterior, egoístico - por dinheiro, nome, ou fama. Seu trabalho
deve ser simplesmente oriundo do amor puro pela humanidade em conjunto. O
único meio através do qual a força espiritual pode ser transmitida é o amor.
Quando virdes que em. vosso instrutor tais condições são integralmente
preenchidas, estais seguros. Se não o são, não é seguro permitirdes ser
ensinados por ele, pois há o grande perigo de, não podendo comunicar
bondade ao vosso coração, ele comunique perversidade. Esse perigo deve ser
evitado, por todos os meios.
"Quem é culto nas escrituras, sem pecado, não poluído pela luxúria, esse é o
maior conhecedor de Brama, é o verdadeiro instrutor."
A religião, que é o mais alto conhecimento e a mais alta sabedoria, não pode
ser comprada, nem adquirida através dos livros. Podeis meter vossas cabeças
em todos os cantos do mundo, podeis explorar os Himalaias, os Cáucasos, os
Alpes; podeis sondar o fundo do mar e esquadrinhar cada nesga do Tibete e do
deserto de Gobi, mas não a encontrareis em parte alguma, enquanto vosso
coração não estiver preparado para recebê-la e o vosso instrutor não tenha
chegado. E quando o instrutor divinamente nomeado chegar, servi-o com a
confiança e a simplicidade de uma criança, abri à sua influência, amplamente, o
vosso coração, e vede nele Deus manifestado. Aos que procuram a verdade
com tal espírito de amor e veneração, o Senhor da verdade revela as coisas
mais maravilhosas com relação à verdade, à bondade e à beleza.
Onde quer que Seu nome seja pronunciado, esse lugar se santifica. Quanto
mais santificado ficará o homem que pronuncia Seu nome, e com que
veneração devemos nos aproximar do homem do qual vem ter a nós a verdade
espiritual! Tais grandes instrutores da verdade espiritual são, realmente, muito
poucos em número, neste mundo, mas o mundo jamais está inteiramente
destituído deles. São sempre as mais belas flores da vida humana um oceano
de misericórdia, sem qualquer motivação".
Mais nobre e mais alto do que todos os demais é outro grupo de instrutores, os
avatares (Palavra sânscrita, que significa literalmente "descida" e fala da
encarnação de Deus sob forma humana. Krishna, seria assim, o avatar do
Vishnu, a segunda pessoa da Trindade Hinduista, tal como Cristo foi um avatar
da segunda pessoa da Trindade Cristã no corpo de Jesus.) Podem transmitir
espiritualidade, com um toque, e mesmo com o simples desejo. Os mais baixos
e degradados dos caracteres se tornam santos num segundo, sob a ordem
deles. São os instrutores de todos os instrutores, as mais elevadas
manifestações de Deus através do homem. Não poderemos ver a Deus, senão
por intermédio deles. Não podemos deixar de cultuá-los. E, realmente, são eles
os únicos que nos cabe cultuar.
"Os tolos escarnecem-Me por ter assumido forma humana, sem conhecer
Minha real natureza como Senhor do Universo." Essa é a declaração de Sri
Krishna no Bhagavad-Gitâ sobre a Encarnação.
"Quando flui uma grande maré" - diz Bhagavam Sri Ramakrishna - "enchem-se
todos os pequenos riachos e fossos, sem qualquer esforço ou consciência de
sua parte. Assim, quando a Encarnação vem, uma maré espiritual inunda o
mundo, e as pessoas sentem a espiritualidade na própria atmosfera."
Quem aspira a ser um bhakta, deve saber que "quantas as opiniões tantos os
caminhos". Deve saber que todas as várias seitas das diferentes religiões são
as várias manifestações da glória do mesmo Senhor.
"Chamam-Vos por muitos nomes. Dividem-Vos, por assim dizer, por diferentes
nomes, e mesmo assim, em cada um destes se encontra a Vossa
omnipotência... Alcançais o devoto através de todos estes, e não há qualquer
tempo especial, desde que a alma sinta intenso amor por Vós. É tão fácil
aproximarmo-nos de Vós, e para mim seria um infortúnio não poder amar-Vos."
Não apenas isso. O bhakta deve ter o cuidado de não odiar, sequer de criticar,
esses radiantes filhos da luz que são os fundadores das várias seitas. Nem
sequer deve ouvir dizer mal deles.
Ainda assim, sabemos que é possível educar um grande nu. mero de seres
humanos no ideal de uma fusão maravilhosa da amplitude com a intensidade do
amor. E a maneira de o conseguir é através do caminho do "ideal escolhido".
Cada seita de cada religião apresenta à humanidade apenas um ideal que lhe é
próprio.
Então, se o aspirante devocional for sincero, dessa pequena semente virá uma
árvore gigantesca, como a banyan da Índia, lançando galho após galho, raiz
após raiz, para todos os lados, até cobrir todo o campo da religião. Assim, o
verdadeiro devoto compreende que Aquele que era seu próprio ideal na vida, é
cultuado em todos os Ideais, por todas as seitas, sob todos os nomes, e através
de todas as formas.
A questão de alimentos sempre foi das mais vitais no que se refere aos
bhaktas. Excluída a extravagância a que atingiram algumas das seitas de
Bhakti, há urna grande verdade subjacente nesta questão de alimentos. Os
materiais que recebemos através da nossa alimentação, para a estrutura do
nosso corpo, determinam, em grande parte, a nossa constituição mental.
Portanto, o alimento que ingerimos deve ser visto de maneira muito particular.
O meio seguinte para a obtenção de Bhakti é energia. "Esse Atman não será
obtido pelos fracos." Tanto a força física como a mental estão aqui englobadas.
"Os fortes, os resistentes" são os únicos estudantes adequados. Que podem
fazer as coisinhas débeis, decrépitas? Irão quebrar-se em pedaços sempre que
as misteriosas forças do corpo e da mente forem acordadas, mesmo levemente,
pela prática de qualquer das Yogas. "Os jovens, os sadios, os fortes- são os
que podem lograr sucesso. Força física, portanto, é absolutamente necessária.
Só um corpo forte pode suportar o choque da reação que resulta das tentativas
para controlar os órgãos. O que deseja tornar-se um bhakta, deve ser forte,
deve ser sadio. Quando os miseravelmente fracos tentam qualquer das Yogas,
possivelmente irão adquirir moléstia incurável, ou enfraquecer a mente.
Enfraquecer voluntariamente o corpo não é, realmente, uma receita para o
esclarecimento espiritual.
Terceira Parte
O maior purificador, entre essas coisas, um purificador sem o qual não se pode
entrar nas regiões da devoção superior, é a renúncia. Isso assusta muitos, mas,
sem ela não pode haver crescimento espiritual.
Quando um homem ascende cada vez mais alto no plano do intelecto, muito
além do simples pensamento, quando galga o plano da espiritualidade e da
divina inspiração, acha-se num estado de beatitude, comparado com o qual
nada são todos os prazeres dos sentidos, ou mesmo do intelecto, nada são.
Quando a Lua brilha intensamente, todas as estrelas se turvam, e quando o Sol
brilha, é'a Lua que se turva. A renúncia necessária para a obtenção de Bhaki
não se obtém por matar seja o que for, mas chega naturalmente, tal como em
presença de uma luz crescentemente mais forte as luzes menos intensas se
obscurecem cada vez mais até desaparecerem por completo. Assim, o amor
aos prazeres dos sentidos e do intelecto se obscurece, e é posto de lado,
atirado à sombra criada pelo próprio amor de Deus.
Esse amor a Deus cresce até assumir a forma do que se pode chamar devoção
suprema. As formas desaparecem, os rituais fogem, os livros são
ultrapassados; as imagens, templos, igrejas, religiões e seitas, países e
nacionalidades - todas essas pequenas limitações e entraves se desprendem,
por sua própria natureza, daquele que conhece esse amor de Deus. Nada resta
para entravá-mo-nos, ou para algemar a sua liberdade. Assim, na renúncia que
auxilia a devoção não há aspereza, nem escura, nem luta, nem repressão, nem
supressão. O bhakta não precisa suprimir uma só de suas emoções. Esforça-
se, apenas, por intensificá-las e dirigi-Ias para Deus.
Na natureza vemos amor por toda a parte. O que quer que na sociedade seja
bom, grande, sublime, é trabalho do amor. O que quer que em sociedade seja
mau, negativo, diabólico, é também o trabalho mal dirigido da mesma emoção
de amor e essa mesma emoção que nos dá o puro e santo amor conjugal entre
marido e mulher, bem como a espécie de amor que satisfaz as formas mais
baixas de paixão animal. A emoção é a mesma, mas sua manifestação é
diferente, nos diferentes casos.
"Nada posso falar a Teu respeito, a não ser que és o meu amor. És belo! És a
própria beleza!" O que realmente se nos exige nessa Yoga é que nossa sede
de beleza seja dirigida para Deus. Que é a beleza num rosto humano, no céu,
nas estrelas, e na Lua? É apenas uma apreensão particular da real, envolvente
beleza divina. "Ele brilha, e tudo brilha. É através de Sua luz que todas as
coisas brilham."
Tomai esta alta posição de Bhakti, que vos faz esquecer imediatamente vossas
pequenas personalidades. Afastai-vos de todos os pequenos e egoísticos
apegos mundanos. Não contempleis a humanidade como sendo o centro de
todos os vossos interesses humanos e superiores. Conservai-vos como uma
testemunha, como um estudante, e observai os fenómenos da natureza.
Mantende o sentimento de desapego pessoal no que se refere ao homem, e
observai como esse poderoso sentimento de amor se manifesta no mundo. As
vezes se produz uma pequena fricção mas é apenas no curso da luta para obter
o superior, o verdadeiro amor. As vezes há uma pequena luta, ou uma pequena
queda, mas isso é apenas passageiro. Ficai de lado e deixai que essas fricções
venham, livremente. Sentis a fricção apenas quando estais na corrente do
mundo, mas quando estais fora dela, simplesmente como testemunha ou
estudante, podereis ver que há milhões e milhões de canais através dos quais
Deus se está manifestando como amor.
"Onde quer que haja qualquer beatitude, mesmo na mais sensual das coisas,
há uma faísca da beatitude eterna, que é o próprio Senhor." Mesmo na mais
baixa forma de atração, há um germe do amor divino. Um dos nomes do Senhor
em sânscrito é Hari, que significa que Ele atrai todas as coisas para si. E Sua
atração é, realmente, a única digna dos corações humanos. Quem pode atrair
realmente uma alma? Somente Ele!
Pensais que matéria morta possa realmente atrair uma alma? jamais o fez e
jamais o fará. Quando vedes um homem seguindo um belo rosto, pensais que é
um punhado de moléculas materiais organizadas o que realmente atrai esse
homem? Absolutamente. Atrás daquelas partículas materiais deve haver, e há,
o jogo da divina influência e do amor divino. O homem ignorante não o sabe,
mas, não obstante, consciente ou inconscientemente, é atraído por esse amor,
e apenas por ele. Assim, mesmo as mais baixas formas de atração, derivam
seu poder do próprio Deus. O Senhor é o grande ímã, e nós somos todos como
que limalhas de ferro; estamos sendo sempre atraídos por Ele, e todos lutamos
por alcançá-Lo. Toda essa nossa luta neste mundo não tem, seguramente, fins
egoísticos. Os tolos não sabem o que estão fazendo; a obra de sua vida, afinal,
é aproximarem-se do grande ímã. Todas as tremendas lutas e combates da
vida visam fazer-nos caminhar para Ele, fundamentalmente, e com Ele nos
unificarmos.
Esse poderoso e infinito amor de Deus, que lhe entra no coração, não deixa
lugar para que outro amor qualquer ali viva. Como poderia ser de outra
maneira? Bkakti enche seu coração com as águas divinas do oceano do amor,
que é o próprio Deus. Não há lugar ali para pequenos amores. Isso quer dizer
que a renúncia do bhakta é esse desapego por todas as coisas que não sejam
Deus, o qual resulta do grande apego a Deus.
Essa é a preparação ideal para atingir o supremo Bhakti. Quando advém essa
renúncia, as portas se abrem para a alma passar e alcançar as elevadas
regiões da devoção suprema. Só o bhakta atingiu aquele supremo estado de
amor comumente chamado fraternidade do homem. Os demais indivíduos
apenas falam. Ele não vê distinções. O poderoso oceano do amor entrou nele,
que não vê o homem no homem, mas vê seu Bem-Amado em toda a parte.
Através de todos os rostos, para ele, brilha Hari. A luz do Sol ou da Lua são a
Sua manifestação. Onde quer que haja beleza e sublimidade, para ele provêm
de Hari. Tais bhaktas ainda vivem; o mundo nunca está sem eles. Embora
mordidos por uma serpente, dizem apenas que um mensageiro do seu Bem-
Amado veio até eles. Só esses homens têm o direito de falar em fraternidade
universal. ignoram ressentimentos; suas mentes jamais reagem sob a forma de
ódio ou ciúme.
O exterior, o sensual, desvaneceu deles para sempre. Como podem ter cólera,
quando, através de seu amor, estão sempre capacitados a ver a Realidade
atrás dos cenários?
"Tudo é Ele e Ele é o meu Amante; eu O amo" - diz o bhakta. Desta maneira
tudo se torna sagrado para o bhakta, porque todas as coisas são d'Ele. Todos
são Seus filhos, Seu corpo, Sua manifestação. Como podemos, pois prejudicar
alguém? Como podemos, pois, não amar alguém? Como o amor de Deus virá,
como segura consequência, o amor de tudo no universo. Quanto mais próximos
de Deus chegamos, mais começamos a ver que todas as coisas estão n'Ele.
Quando a alma consegue apropriar se da beatitude desse amor supremo,
começa, também, a vê-Lo em tudo. Nosso coração se torna, assim, uma fonte
eterna de amor. E quando alcançamos estados ainda mais elevados neste
amor, todas as pequenas diferenças entre as coisas do mundo se perdem
completamente. O homem já não é visto como homem, mas só como Deus.
Não mais se vê o animal como simples animal, mas como Deus. Mesmo o tigre
já não é um tigre, mas a manifestação de Deus. Assim, nesse intenso estado de
Bhakti, o culto é ofereci-* do a tudo: a toda a vida e a todos os seres.
É a horrível ideia do corpo o que nutre todo o egoísmo do mundo - apenas essa
ilusão de que somos inteiramente o corpo que possuímos, e que devemos fazer
o possível por preservá-lo e satisfaze-lo. Se souberdes que sois positivamente
outra coisa que não o vosso corpo, nada tereis contra o que lutar, nada tereis
para combater. Estareis mortos para toda a ideia de egoísmo. Assim o bhakta
declara que nos devemos manter como se já estivéssemos mortos para todas
as coisas do mundo, e que isso é realmente, a auto-abnegação. Que as coisas
venham como puderem. Este é o significado da expressão: "Faça-se a Tua
vontade". Neste estado de sublime resignação tudo quanto tenha a forma de
apego desaparece completamente, exceto esse omniabsorvente amor por
Aquele no qual todas as coisas vivem e se movem, e tem o seu ser. Esse
apego do amor de Deus, é, com efeito, um apego alma; antes rompe,
efetivamente, todos os que não encadeia a grilhões.
Quarta Parte
Enquanto houver em nós qualquer ideia de obter tal ou qual favor de Deus em
retribuição de nosso respeito e fidelidade a Ele, não haverá verdadeiro amor
florescendo em nosso coração. Os que adoram Deus porque desejam que Ele
lhes prodigalize favores, com certeza não O adorarão se tais favores não forem
outorgados. O bhakta ama o Senhor porque Ele é adorável. Não há outro
motivo originando ou dirigindo a divina emoção do verdadeiro devoto.
Ouvimos dizer que um grande rei foi certa vez a uma floresta e ali encontrou um
sábio. Conversou um pouco com ele e ficou muito satisfeito com a sua pureza e
sabedoria. Desejou então que o sábio aceitasse dele um presente, o que o
outro recusou, dizendo: "Os frutos da floresta são alimento bastante para mim.
O rei falou: "Apenas para me ser agradável, senhor, recebei, por favor, algo de
minhas mãos, e por favor, vinde comigo à cidade, ao meu palácio".
Depois de muita insistência, o sábio consentiu, por fim, em fazer o que o rei
desejava, e acampanhou -o até o palácio.
Antes de oferecer o presente ao sábio, o rei fez suas orações nestes termos:
"Senhor, dai-me mais filhos.
Senhor, dai-me mais riqueza. Senhor, dai-me mais território. Senhor, mantende
meu corpo em melhor saúde. . . " E assim por diante.
Antes que o rei terminasse de fazer sua oração, o sábio se havia levantado e
saído caladamente do aposento. Vendo aquilo, o rei ficou perplexo e começou a
segui-lo, exclamando: "Senhor, estais indo
embora! Não recebestes ainda os meus presentes!"
O sábio voltou-se para ele e disse: "Não mendigo de mendigos. Nada mais sois
do que um mendigo.
Assim, como podeis me dar alguma coisa? Não sou tolo para pensar em tomar
seja o que for de um mendigo como vós. Ide daqui, Não me sigais".
Cultuam Deus porque têm medo de castigos; para eles Deus é um grande ser,
com um chicote numa das mãos e um cetro na outra. Se não O obedecerem,
receiam ser chicoteados. É uma degradação cultuar Deus através do medo do
castigo. Tal culto, se culto se pode chamar, é a mais rude forma de culto
através do amor. Enquanto houver qualquer medo em vosso coração, como
pode haver ali amor, também? O amor vence o medo, naturalmente. Pensai
numa jovem mãe que vai pela rua, e um cão lhe late. Tem medo e corre para a
casa mais próxima. Suponde, porém, que no dia seguinte ela está na rua com
seu filho, e um leão salta sobre ele. Qual será agora a atitude daquela mãe?
Por certo na própria boca do leão, protegendo seu filho.
Amor e medo são incompatíveis. Deus nunca é temido por aqueles que O
amam. O mandamento: "Não tomes o nome do Senhor em vão", faz rir o
verdadeiro amante de Deus. Como pode haver qualquer blasfémia na religião
do amor? Quanto mais tomardes o nome do Senhor, tanto melhor para vós,
qualquer que seja o modo como o façais. Apenas repetis Seu nome porque O
mais.
O terceiro ângulo do triângulo do amor é que o amor não tem rival, pois sempre
corporifica o mais alto ideal do amante. O verdadeiro amor jamais nos chega
enquanto o objeto do nosso amor não se tornar o nosso mais alto ideal. Pode
ser que em muitos casos o amor humano seja mal dirigido e mal colocado, mas
para a pessoa que ama, a coisa que ama é sempre seu mais alto ideal. É
possível que uns vejam esse ideal no mais vil dos seres, e outros no mais
elevado dos setes. Contudo, em cada caso é o ideal, apenas, que pode ser
verdadeira e intensamente amado. O supremo ideal de cada homem se chama
Deus. Ignorante ou sábio, santo ou pecador, homem ou mulher, educado ou
não, culto ou ignorante - para cada ser humano o ideal supremo é Deus. A
síntese de todos os mais elevados ideais de beleza, de sublimidade, e de poder
nos dá a mais completa concepção do amoroso e amorável Deus.
Realmente, nada há que eu possa chamar meu". Quanto um homem adquire tal
convicção, seu ideal se torna um ideal de perfeito amor, de perfeita intrepidez,
nascida do amor. O ideal mais elevado de uma pessoa assim não está envolto
em nenhuma estreiteza da particularidade; é amor universal, amor sem limites
ou entraves, o próprio amor, o amor absoluto. Esse grande ideal da religião do
amor é cultuado e amado absolutamente como tal, sem ajuda de quaisquer
símbolos ou sugestões. Esta é a forma mais elevada da suprema Bhaki, a que
cultua como ideal o ideal oniabancante; todas as demais formas de Bkakti são
apenas etapas intermediárias para atingi-Ia.
Quando o devoto atingiu tal ponto, não mais se vê impelido a indagar se Deus
pode ou não se demonstrado, se é omnipotente e omnisciente ou não. Para ele,
trata-se apenas do Deus do amor. Ele é o mais alto ideal de amor, e isso é
suficiente para todos os seus propósitos. Ele, como amor, é autoevidente, não
requer provas para demonstrar ao amoroso a existência do amado. Os Deuses-
magistrados das outras formas de religião podem exigir muitas provas para
evidenciá-los, mas o bhakta não pensa e não pode jamais pensar em tais
Deuses. Para ele, Deus existe inteiramente como amor.
Há quem diga que o egoísmo é a única força motriz por trás das atividades
humanas. Isso também é amor, inferiorizado por ser particularizado. Quando
penso em mim mesmo como compreendendo o Universal, não pode haver,
seguramente, egoísmo em mim, mas quando, erroneamente, penso que sou
algo pequeno, meu amor se torna particularizado e estreito. O erro consiste em
estreitar e restringir a esfera do amor.
Este todo é o Deus dos bhaktas, e todos os outros Deuses, Pais do Céu,
Governantes, ou Criadores, e todas as teorias e doutrinas e livros, não têm para
eles nenhum propósito nem significação, já que, através do seu amor e devoção
supremos, eles se ergueram inteiramente acima dessas coisas. Quando o
coração é purificado, limpo, e cheio até as bordas com o néctar divino do amor,
todas as idéias de Deus se tornam simplesmente pueris e são rejeitadas como
inadequadas e sem Valor. Tal é, com efeito, o poder do amor supremo. O
perfeito bhakta não mais vai ver Deus nos templos e igrejas; sabe que não há
lugar onde não O encontre. Encontra-O tanto fora como dentro do templo.
Encontra-o tanto na perversidade dos perversos como na santidade dos santos,
porque já O instalou em glória em seu próprio coração, como a única, poderosa,
inextinguível luz do amor que está sempre refulgindo e eternamente presente.
Ainda mais: o próprio amor humano, em todas as suas variadas formas, foi feito
para simbolizar esse amor divino inexprimível. Os homens só podem pensar
nas coisas divinas à sua maneira humana: para nós, o Absoluto pode ser
expresso apenas em nossa linguagem relativa. Todo o universo é, para nós,
uma composição do Infinito escrita na linguagem do finito. Portanto,, na relação
de Deus e Seu culto através do amor, os bhaktas usam todos os termos
comuns associados com o amor comum da humanidade.
Alguns dos grandes escritores da Bhaki suprema tentaram compreender e
experimentar esse divino amor de muitas maneiras. A forma mais baixa na qual
esse amor é apreendido, está no que chamam o pacífico - o shanta. Quando
um homem cultua Deus sem o fogo do amor dentro de si, sem sua loucura em
seu cérebro; quando o amor é apenas calmo, banal, um pouco mais alto do que
as meras formas, cerimónias e símbolos, mas de forma alguma caracterizado
pela loucura do amor intensamente ativo, é chamado shanta.
O tipo seguinte de amor é sakhya, amizade. "És nosso amigo querido." Tal
como um homem abre seu coração ao seu amigo e sabe que o amigo jamais o
irá censurar por sua faltas, mas sempre procurará ajudá-lo, tal como existe a
idéia de igualdade entre ele e seu amigo - amor igual flui e reflui entre o
adorador e seu amistoso Deus. Assim, Deus se torna nosso amigo, o amigo que
está próximo, o amigo ao qual podemos contar francamente todas as histórias
de nossa vida. Os mais recônditos segredos de nossos corações lhe podem ser
expostos, com a grande certeza de segurança e apoio. Ele é o amigo que o
devoto aceita como igual. Deus é aqui visto como que nosso companheiro de
folguedos.
Podemos bem dizer que estamos todos brincando neste universo. Tal como as
crianças fazem seus jogos, tal como os mais gloriosos reis e imperados fazem
seus próprios jogos, assim o próprio bem amado Senhor se recreia com este
universo. Ele é perfeito. Nada deseja. Por que criaria? A atividade, para nós,
está sempre em função da realização de certo desejo, e o desejo sempre
pressupõe imperfeição. Deus é perfeito. Não tem desejos. Por que continuaria
Ele com este trabalho de uma criação sempre ativa? Que propósito tem em
vista? As histórias que falam de Deus criando o mundo, com uma ou outra
finalidade que imaginamos, são boas apenas como histórias, e nada mais. Tudo
são realmente folguedos; o universo é o jogo continuo de Deus. O universo todo
deve ser, afinal, um grande e agradável motivo de divertimento para Ele. Se
sois pobres, gozai essa pobreza como divertimento. Se sois ricos, gozai o
divertimento de serdes ricos. Se vem o perigo, também é divertimento, e se vem
a felicidade, há nela mais e melhor divertimento. O mundo não passa de um
parque de diversões, e estamos tendo bom divertimento, estamos gozando de
um jogo. E Deus está jogando conosco, todo o tempo. E estamos jogando com
Ele. Deus é o nosso eterno companheiro de folguedos. Como Ele é belo
jogando! O jogo termina quando um ciclo chega ao fim. Há repouso por um
período de tempo menor ou maior, e de novo tudo se manifesta e torna a jogar.
Só quando vos esqueceis de que tudo não passa de jogo e de que também
estais auxiliando o jogo, é que a angústia surge, com os desgostos. Então o
coração se torna pesado, então o mundo faz carga sobre vós com tremendo
poder. Mas, assim que abandonais vossa crença séria na realidade dos
incidentes mutáveis dos três minutos da vida, e sabeis que ela não passa de um
estágio no qual estamo-nos divertindo, ajudando-O a divertir-se, imediatamente
toda a angústia cessa para vós. Ele se diverte em cada átomo.
Está-se divertindo quando constrói terras, e sóis, e luas. Está-se divertindo com
o coração humano, com os animais, com as plantas. Somos Suas peças de
xadrez, que Ele coloca sobre o tabuleiro, sacudindo-as.
A seguir vem o que é conhecido como vatsalya, amar a Deus não como nosso
pai mas como nosso filho.
Isto pode parecer estranho, mas é uma disciplina que nos capacita a afastar
toda ideia de poder em relação ao conceito de Deus. A ideia de poder traz
consigo respeitoso temor. Não deve haver receio no amor. As ideias de
obediência e reverência são necessárias para a formação do caráter, mas
quando o caráter está formado, quando o amoroso deu provas do amor calmo e
pacífico, e deu provas também de um pouco da intensa loucura do amor, já não
há necessidade de lhe falar mais sobre ética e disciplina. Conceber Deus como
poderoso, majestoso e glorioso, como Senhor do universo, ou como Deus dos
Deuses - é coisa que não preocupa o amoroso.
Para evitar a associação com Deus da sensação de poder que gera o medo, é
que ele O adora como seu próprio filho. A mãe e o pai não sentem receoso
temor em relação ao filho. Não podem ter reverência alguma pela criança. Não
podemos pensar em pedir-lhe qualquer favor. A posição da criança é sempre a
de quem recebe, e por amor ao filho os pais dariam centenas de vezes seu
próprio corpo. Milhares de vidas sacrificariam por esse seu filho. Portanto, Deus
é amado como um filho.
A ideia de amar a Deus como filho surge e cresce naturalmente entre as seitas
religiosas que acreditam na encarnação de Deus. Para os maometanos é
impossível nutrir a ideia de Deus como filho; recuariam de horror diante dela.
Mas os cristãos e os hindus podem compreendê-la facilmente, porque têm o
Menino Jesus e o Menino Krishna. As mulheres da índia se veem com
frequência na qualidade de mães de Krishna.
As mães cristãs também podem adotar a ideia de que são mães de Cristo, e
essa ideia levará ao Ocidente o conhecimento da divina maternidade de Deus,
de que o ocidental tanto necessita. Superstições, respeitoso temor, reverência
em relação a Deus, são sentimentos profundamente arraigados no âmago de
nosso coração, e por isso levamos longos anos para mergulhar inteiramente em
amor nossas ideias de reverência e veneração, de respeitoso temor, majestade
e glória, com referência ao Senhor.
Nessa doce representação do amor divino, Deus é nosso esposo. Todos somos
mulheres, não há homens neste mundo. Há apenas um Homem, e é Ele, nosso
Bem-amado. Todo o amor que um homem dá à mulher, ou a mulher ao homem,
aqui está, para ser dado ao Senhor.
Todas as diferentes espécies de amor que vemos neste mundo, e com as quais
estamos mais ou menos meramente brincando, têm Deus como finalidade
única. Mas, infelizmente, o homem não conhece o oceano infinito para o qual
esse poderoso rio de amor está constantemente fluindo, e assim, loucamente,
muitas vezes procura dirigi-lo para bonequinhos de seres humanos. O tremendo
amor pelo filho, que está na natureza humana, não é pelo bonequinho que é o
filho. Se o aplicardes exclusiva e cegamente no filho, sofrereis as
consequências. Mas através desse sofrimento virá o despertar mediante o qual
descobrireis seguramente que se o amor que está em vós é dado a qualquer
ser humano, mais cedo ou mais tarde trará dor e desgosto como resultado.
Portanto, vosso amor deve ser dado ao Supremo, que nunca morre nem se
altera, e é o oceano em cujo amor não há fluxo nem refluxo. O amor deve ir
para seu destino certo, deve ir para Ele, que é, realmente, o infinito oceano de
amor. Todos os rios fluem para o oceano. Mesmo a gota de água que desce do
flanco da montanha não pode cessar sua caminhada quando alcança um regato
ou um rio, por muito grande que seja.
Por fim, mesmo essa gota encontrará de alguma forma seu caminho para o
oceano.
A quem mais este coração pode amar? Ele é o mais belo, o mais sublime. Ele é
a própria beleza, a própria sublimidade. Quem, neste universo, é mais belo que
Ele? Quem neste universo é mais adequado que Ele para ser o esposo? Quem
no universo é mais adequado que Ele para ser querido? Portanto, seja Ele o
esposo, seja Ele o Bem-amado.
Sim, o verdadeiro amante espiritual não descansa mesmo ali; mesmo o amor de
esposo e esposa não é bastante alucinante para ele. Aos bhaktas não repugna
também a idéia do amor ilegítimo, por ser tão forte.
A sua impiedade é coisa de que não cogitam. A natureza do amor é tal que
quanto mais obstruções houver ao seu livre jogo, mais apaixonante se torna. O
amor entre marido e mulher é suave, sem obstruções.
Assim, os bhaktas tipificam a moça que ama seu próprio bem-amado, e sua
mãe e pai, ou esposo, fazem objeções a tal amor, e quanto mais alguém obste
o curso de seu amor, tanto mais ele tende a intensificar-se.
Só esta bendita loucura de amor divino pode curar para sempre a doença do
mundo que está em nós.
Ao bhakta nada interessa, exceto amar e ser amado. Seu amor extraterreno é
como a maré subindo o rio.
Todos temos de começar como dualistas na religião do amor. Deus é, para nós,
um ser separado, e nos sentimos também como seres separados. Então o amor
intervém, e o homem começa a aproximar-se de Deus. Deus também começa a
estar mais perto do homem. O homem experimenta todas as relações da vida -
como pai, como mãe, como filho, como amigo, como senhor, como amante - e
projeta-as em seu ideal de amor, em seu Deus. Para ele Deus existe sob
aquelas manifestações. E o ápice do progresso é atingido quando ele sente que
se tornou absolutamente imerso no objeto do seu culto.
A Yoga ensina-nos tornar a matéria nossa escrava, como o deveria ser. Yoga
significa "jugo" - "jungir", isto é, juntar a alma do homem à Alma suprema ou
Deus. Este nosso "eu" cobre apenas uma pequena consciência e urna vasta
quantidade de inconsciência, enquanto sobre ele, e quase completamente
desconhecida dele, está o plano superconsciente.
Através de prática fiel, camada após camada da mente se abre diante de nós, e
cada uma dessas camadas nos revela um fato novo. Vemos como que mundos
novos criados diante de nós, novos poderes são postos em nossas mãos, mas
não devemos parar no caminho, nem permitir que fiquemos deslumbrados por
essas contas de vidro, quando a mina de diamantes está à nossa frente.
Só Deus é a meta.
Três coisas são necessárias ao estudante que deseja ter sucesso.
Terceira: Refreai a mente para que não se externe, refreai os sentidos, voltai a
mente para o interior, sofrei tudo sem murmurar, fixai a mente numa ideia,
pensai constantemente em vossa natureza real. Libertai-vos da superstição.
Não vos hipnotizeis para acreditar em vossa própria inferioridade. Dia e noite
dizei a vós mesmos o que realmente sois, até que compreendais, realmente
compreendais, vossa unidade com Deus.
Primeira Parte
Terei de responder tanto pela negativa como pela afirmativa. Religião, tal como
é geralmente ensinada no mundo todo, dizem estar baseada na fé e na crença,
e na maioria dos casos consiste apenas em diferentes séries de teorias. Essa é
a razão pela qual encontramos as religiões discutindo umas com as outras.
Essas teorias, além disso, são baseadas na crença. Um homem me diz que há
um grande Ser sentado sobre as nuvens, governando todo o universo, e me
pede que acredite apenas na autoridade de sua afirmativa. Da mesma maneira
eu posso ter minhas próprias ideias, e pedir aos outros que acreditem nelas. Se
me perguntarem a razão, eu não lhes poderei dar razão alguma.
Por isso é que hoje em dia a religião e a filosofia metafísica têm mau nome.
Todo o homem instruído parece dizer: "Oh! essas religiões não passam de um
feixe de teorias sem qualquer padrão pelo qual possamos julgá-las, cada
homem pregando suas próprias ideias de estimação". Contudo, há uma base de
crença universal na religião, governando todas as diferentes teorias e todas as
ideias variáveis das diferentes seitas em diferentes países. Indo até suas raízes,
verificamos que também elas estão baseadas em experiências; universais.
Assim, é claro que todas as religiões do mundo foram construídas sobre esse
fundamento universal e adamantino de todo o nosso conhecimento - a
experiência direta. Os Mestres todos viram Deus, todos eles viram suas
próprias almas, viram seu futuro, viram sua eternidade, e pregaram o que
viram.
A ideia moderna, por outro lado, exposta pelos "eruditos", diz que a religião, a
metafísica, e toda a busca de um Ser Supremo, são fúteis. Por outro lado, os
semi-instruidos parecem considerar que essas coisas realmente não têm base,
e seu único valor consiste no fato de fornecerem fortes poderes de motivação
para fazer bem ao mundo. Se os homens acreditam num Deus, podem tornar-
se bons e morais, e assim se fazem bons cidadãos. Não podemos censurá-los
por manterem tais ideias, vendo ' que todo o ensinamento que tais homens
obtêm resume-se, simplesmente, em acreditarem numa mixórdia de palavras,
sem qualquer substância a ampará-las. Pedem-lhes que vivam sobre tais
palavras. Podem fazer isso? Se o pudessem, eu não teria qualquer
consideração pela natureza humana.
Mas, antes de termos feito isso, não será racional que neguemos a verdade de
suas afirmativas. Portanto, devemos trabalhar fielmente, usando os métodos
prescritos, e a luz virá. Adquirindo conhecimento, fazemos uso da
generalização, e a generalização está baseada na observação.
Todos o estão usando, tanto no mundo interno como no externo, mas, para o
psicólogo, a mesma minuciosa observação que o homem de ciência dirige ao
mundo exterior deve ser usada para o mundo interior. E isso requer muitíssima
prática. Da nossa infância para diante nos ensinaram a dar atenção apenas ao
que é exterior, e nunca ao que é interior. Daí a maioria dentre nós ter quase
perdido a faculdade de observar o mecanismo interior. Virar a mente ao avesso,
por assim dizer, impedi-Ia de ir para fora, e então concentrar todos os seus
poderes e atirá-los sobre a própria mente de forma que ela possa conhecer sua
própria natureza, analisar-se, é trabalho duro. Ainda assim, é a única forma
para chegar ao que quer que represente aproximação científica do assunto.
Como foi obtido todo o conhecimento do mundo senão pela concentração dos
poderes da mente? O mundo está pronto a entregar seus segredos, se
soubéssemos ao menos como bater-lhe à porta, como dar o golpe necessário.
O vigor e a força do golpe vêm através da concentração. Não há limites para o
poder da mente humana. Quanto mais concentrada é, mais poder atrai para
reforçar determinado ponto: esse é o segredo.
Uma parte dessa prática é física, mas na maioria é mental. Com a continuação,
descobriremos quanto a mente está intimamente ligada ao corpo. Se
acreditarmos que a mente é, simplesmente, uma parte mais subtil do corpo, e
que a mente age sobre o corpo, então a mão nos dirá que o corpo deve reagir
sobre a mente. Se o corpo está doente, a mente também se torna doente. Se o
corpo está sadio, a mente permanece sadia e forte. Quando estamos zangados
a mente se perturba. A maioria da humanidade traz a mente sob grande
controle do corpo, pois sua mente é pouco desenvolvida. A vasta massa da
humanidade está bem pouco distante dos animais. Não só isso, mas em muitos
casos o poder de controle, nessa maioria, é pouco mais alto do que o dos
animais considerados como os inferiores de sua espécie. Temos bem pouca
ascendência sobre nossas mentes.
Portanto, para obter essa ascendência, para conseguir controle sobre o corpo e
a mente, precisaremos de alguns auxílios físicos. Quando o corpo estiver
suficientemente controlado, podemos tentar a manipulação da mente.
Manipulando a mente, poderemos trazê-la sob nosso controle, e compeli-Ia a
concentrar-se nos poderes que desejamos.
Segunda Parte
1. yama - não matar, não mentir, não roubar, não ser incontinente, e não
cobiçar.
2. niyama - pureza, contentamento, austeridade, estudo e entrega de si próprio
a Deus.
3. asana, ou postura;
4. pranayama, ou controle do prana;
5. pratyahara, ou retração dos sentidos;
6. dhârana, ou concentração da mente num ponto;
7. dhyana, ou meditação;
8. samadhi, ou contemplação.
Yama e niyama são treinamentos morais. Sem eles como base, não há prática
de Yoga bem sucedida, e uma vez estabelecidos, o yogue começa a
compreender os frutos de sua prática.
Um yogue não deve pensar em magoar seja quem for, por pensamentos,
palavras ou atos. A misericórdia não deve limitar-se apenas ao homem, mas ir
além e abarcar todo o mundo.
Mas devemo-nos lembrar, sempre, de que esses são apenas os meios. A meta,
o fim, o objetivo de todo esse treinamento, é a libertação da alma, Controle
absoluto da natureza, e nada menos do que isso, deve ser o objetivo. Podemos
ser os senhores, e não os escravos da natureza. Nem o corpo nem a mente
devem ser nossos senhores, nem devemos nos esquecer de que o corpo é
nosso e não somos do corpo.
A natureza do demónio era ignorante, enevoada, por isso jamais indagou para
além daquilo, mas ficou perfeitamente satisfeito com a ideia de que era Deus,
de que "Eu" queria dizer, corpo". O deus tinha natureza mais pura. De início,
cometeu o erro de pensar: "Eu, este corpo, sou Brama. Por isso, mantenho-o
forte e saudável, bem vestido, e ofereço-lhe toda a sorte de prazeres". Dentro
de poucos dias, porém, descobriu que não fora aquilo que o sábio, seu mestre,
quisera dizer. Deveria haver algo mais alto. Assim, voltou, e disse: "Senhor,
ensinaste-me que este corpo era o Eu? Se é assim, vejo todos os corpos
morrerem, e o Eu não pode morrer".
O deus mais uma vez voltou para a sua casa, pensando que talvez a mente
fosse o Eu. Logo depois, entretanto, viu que os pensamentos eram tão vários,
ora bons, ora maus. A mente era mutável. demais para ser o Eu. Voltou ao
sábio, e disse: "Senhor, acho que a mente não é o Eu. Foi isso que quisestes
dizer?" E o sábio replicou: "Não. Tu és Aquele! Descobre por ti mesmo".
O deus voltou ao lar e finalmente descobriu que ele era o Eu, para além de
qualquer pensamento, um, sem nascimento e sem morte, que o ar não podia
secar ou a água dissolver; o sem começo e sem fim, o inabalável, o intangível,
o omnisciente, o Ser omnipotente, que não era o corpo ou a mente, mas estava
além de ambos. Assim, ficou satisfeito, mas o pobre demónio não obteve a
verdade, porque amava demais seu próprio corpo.
Houve, certa vez, um ministro de um grande rei, que veio a cair em desgraça. O
rei, como castigo, ordenou que o encerrassem numa torre muito alta. Isso foi
feito, e ali o ministro foi deixado, para morrer. Tinha ele, entretanto, uma esposa
fiel, que veio ter à torre, pela noite, e chamou o marido lá no alto para saber o
que poderia fazer por ele. Disse-lhe o homem que voltasse na noite seguinte e
trouxesse uma corda comprida, um pouco de cordão bem forte, barbante, fio de
seda, um besouro, e um pouco de mel. Embora muito espantada, a boa esposa
obedeceu e levou-lhe os artigos pedidos. O marido disse-lhe que amarrasse
bem o fio de seda no besouro, depois untasse as antenas dele com uma gota
de mel e o libertasse na parede da torre, com a cabeça voltada para cima. A
mulher cumpriu aquelas instruções e o besouro iniciou sua longa jornada.
Sentindo diante de si o cheiro do mel, foi-se arrastando para a frente, subindo,
na esperança de alcançá-lo, até que chegou ao alto da torre, onde o ministro o
agarrou e se apoderou do fio de seda. Disse, então, à esposa, que amarrasse
na outra ponta o barbante, e depois de o ter içado, repetiu o processo com o
cordão forte, e, finalmente, com a corda. O resto foi fácil. O ministro desceu da
torre por meio da corda, e fugiu.
Aqueles dentre vós que o puderem conseguir, devem ter um aposento exclusivo
para essa prática. Não durmais nesse aposento, que deve permanecer sagrado.
Não deveis entrar nele enquanto não vos tiverdes banhado e não estiverdes
perfeitamente limpo de corpo e mente. Colocai sempre flores nesse quarto - são
a melhor vizinhança para um yogue - e quadros agradáveis. Queimai incenso,
pela manhã e à noite. Não deveis manter pensamentos profanos, coléricos, ou
polémicos naquele aposento. Nele só devereis permitir a entrada de pessoas
que pensam como vós. Então, paulatinamente, uma atmosfera de santidade se
estabelecerá no aposento, de forma que quando vos sentirdes angustiado,
desgostoso, hesitante, ou quando vossa mente estiver perturbada, o simples
fato de entrardes ali vos trará calma. Essa foi a ideia do templo e da igreja, e em
alguns deles ainda hoje encontrais isso, embora na maioria a ideia se tenha
perdido. O fato é que, criando vibrações sagradas num lugar, ele se tornará
sagrado, e assim permanecerá.
Os que não puderem ter um aposento separado, praticarão onde lhes pareça
melhor. Sentai-vos em postura direita. A primeira coisa a fazer é enviar uma
corrente de pensamentos puros a toda criação. Repeti, mentalmente: "Que
todas as - criaturas sejam felizes, que todas estejam em paz, que todas estejam
na bem-aventurança." Fazei isso, para leste, para o sul, para o norte, e para o
oeste. Quanto mais fizerdes isso, melhor vos sentireis. Descobrireis, finalmente,
que a forma mais fácil de nos fazermos sadios é ver que os outros sejam
sadios, e a maneira mais fácil de nos fazermos felizes é ver que os outros são
felizes. Isso feito, os que acreditam em Deus devem rezar - não pedindo
dinheiro, nem saúde, nem o céu. Rezai pedindo conhecimento e luz. Toda a
prece que não seja essa, é egoísta.
A seguir, pensai em vosso próprio corpo, e vede-o forte e saudável: é o melhor
instrumento que tendes. Pensai nele como sendo forte como o diamante, e que
com o auxílio desse corpo atravessareis o oceano da vida. A liberdade jamais é
conseguida pelos fracos. Expulsai toda a fraqueza. Dizei ao vosso corpo que
ele é forte, dizei à vossa mente que ela é forte, e mantende ilimitada fé e
esperança em vós mesmos.
Sentai-vos direito: o corpo deve ser mantido direito. A medula espinhal, embora
não ligada à coluna vertebral, ainda assim está dentro dela. Se vos sentais
curvado, perturbais essa medula espinhal.
Portanto, deixai-a livre. De todas as vezes que vos sentais curvado e tentais
meditar, estais-vos prejudicando. As três partes do corpo - peito, pescoço e
cabeça - devem ser mantidas sempre direitas, numa só linha. Vereis que com
um pouco de prática isso vos virá tão facilmente quanto a respiração.
A primeira lição é apenas respirar, em medida, para dentro e para fora. Isso
harmonizará o sistema.
Quando tiverdes praticado isso por algum tempo, fareis bem em juntar a
repetição de alguma palavra, como Om, ou qualquer outra palavra sagrada. Na
Índia usamos certas palavras simbólicas, em lugar de contar um dois, três,
quatro. Por isso é que vos aconselho a juntar a repetição mental de Om ou de
qualquer outra palavra sagrada ao pranayama. Que a palavra vá e venha com a
respiração, ritmada, harmoniosamente, e vereis que todo o corpo se vai
tornando rítmico. Depois aprendereis o que é o repouso. Comparado com ele, o
sono não é repouso. Desde que tal repouso venha, acalmam-se os nervos mais
cansados e verificareis que jamais tínheis repousado antes.
O passo seguinte é chamado pratyahara. Que vem a ser isso? Sabeis como
vem a perceção. Antes de mais nada há os instrumentos externos, depois os
órgãos internos, agindo através dos centros do cérebro, e por fim há a mente.
Que todos eles se reúnem e se ligam a algum objeto externo, nós percebemos
esse objeto. Ao mesmo tempo, é muito difícil concentrar a mente e ligá-la
apenas a um órgão. A mente é escrava.
Ouvimos: "Sê bom!", "Sê bom!", e "Sê bom!", ensinado por todo o vasto mundo.
Dificilmente uma criança, nascida seja em que pais for, deixará de ter ouvido:
"Não roubes!", "Não mintas!". Mas ninguém diz à criança como pode evitar tais
coisas. Falar, apenas, não a auxilia. Por que não se tornaria ela um ladrão?
Não lhe ensinamos como não roubar, mas dizemo-lhe, simplesmente: "Não
roubes!" Só quando lhe ensinarmos a controlar sua mente, estaremos
realmente auxiliando-a.
Qual seria o resultado do controle da mente? Ela não se reuniria aos centros de
perceção, e, naturalmente, sentimentos e vontade estariam sob controle.
Até aqui está claro. Mas é isso possível? É perfeitamente possível. Vós o vedes
nos tempos modernos. Os que curam pela fé, ensinam as pessoas a negarem a
angústia, a dor, o mal. Sua filosofia é um pouco em todas as direções, mas é
uma parte da Yoga, sobre a qual de certa forma tropeçam.
Bem: o controle dos centros, que é estabelecido pelo operador durante algum
tempo, num paciente hipnotizado, ou num paciente que se cura pela fé, é
censurável, porque o conduz à ruína definitiva. Não se trata, realmente, do
controle dos centros do cérebro pelo poder da vontade da própria pessoa, mas
é, por assim dizer, o entorpecimento da mente do paciente durante algum tem
súbitos golpes que a vontade alheia lhe desfere, refreamento por meio de
rédeas e força muscular a carreira de uma Parelha violenta, mas através do
corpo, através de Não é com o que se contém pedido a outrem para que de
golpes pesados na cabeça dos cavalos, a fim de aturdi-los por algum tempo, e
torná-los dóceis. Através de cada um desses processos o homem sobre o qual
se opera, perde parte de suas energias mentais, até que, por fim, a mente, em
lugar de ganhar o poder de controle perfeito, torna-se massa informe e
destituída de poder. O único destino do paciente será o sanatório de lunáticos.
Toda a tentativa de controle que não seja voluntária, que não seja feita pela
própria mente do indivíduo, não só é desastrosa, mas frustra sua própria
finalidade. A finalidade de cada alma é a liberdade, o domínio - liberdade em
relação à escravização da matéria e do pensamento, domínio da natureza
interna e externa.
Portanto, tende o cuidado de não permitir que outros atuem sobre vós. Tende
cuidado de não levardes outros à ruína, por ignorância. É verdade que alguns
conseguem fazer bem a muitos, durante algum tempo, dando trilha nova para
as suas propensões, mas ao mesmo tempo levam a ruína a milhões, pelas
sugestões inconscientes que atiram em torno de si, levando homens e mulheres
a essa condição mórbida, passiva, hipnótica, que os faz quase destituídos de
alma, finalmente.
Quem quer que peça a alguém que acredite cegamente, ou arraste atrás de si
as pessoas pelo poder controlador de sua vontade superior, faz mal à
humanidade, embora não seja essa a sua intenção. Portanto, usai vossas
próprias mentes, controlai vós mesmos o corpo e a mente, lembrai-vos de que a
não ser que sejais uma pessoa doente, nenhuma vontade alheia pode agir
sobre vós. Evitai todos que, por grandes e bons que sejam, vos peçam que
acrediteis cegamente.
Como é difícil controlar a mente! Bem foi ela comparada ao macaco louco.
Havia um macaco, irrequieto pela sua própria natureza, como são todos os
macacos. Como se isso não bastasse, alguém fez com que ele tomasse
bastante vinho, de forma que se tornou ainda mais irrequieto. Então, um
escorpião lhe deu uma ferroada. Quando um homem recebe a ferroada de um
escorpião, fica saltando durante um dia inteiro, e, assim, o pobre macaco viu
sua condição tornar-se pior do que nunca. Para completar sua angústia, um
demónio entrou nele. Que linguagem pode descrever a incontrolável
inquietação daquele macaco? A mente humana é, como ele, incessantemente
ativa por sua própria natureza. Então, embriaga-se com o vinho do desejo,
crescendo assim a sua turbulência. Depois que o desejo se instalou, vem a
ferroada do escorpião do ciúme pelo sucesso dos outros, e por fim o demónio
do orgulho entra na mente, levando-a a imaginar-se importante. Como é difícil
controlar a mente!
Enquanto não souberdes o que a mente está fazendo, não podereis controlá-la.
Dai-lhe rédeas. Muitos pensamentos hediondos podem vir, e ficareis
estupefacto ao verificar que podeis pensar tais coisas.
Mas verificareis que dia a dia os caprichos da mente se tornam cada vez menos
violentos; que cada dia ela vai ficando mais calma. Nos primeiros meses
verificareis que a mente terá muitíssimos pensamentos, e mais tarde
descobrireis que eles de certa forma diminuíram, e alguns meses depois serão
cada vez menos, até que, por fim, a mente ficará sob perfeito controle. Mas
deveis praticar pacientemente, todos os dias. Assim que o vapor for aberto, a
máquina deve funcionar: assim que as coisas estão diante de nós, devemos
percebê-las.
Dessa maneira, um homem, para mostrar que não é máquina, deve demonstrar
que não está sob controle de coisa alguma. Esse controle da mente, pelo qual
não se permite que ela se rebelde aos centros, é pratyahara, Como se pratica?
É trabalho tremendo, que não se faz num dia. Só depois de luta paciente, que
durará anos, conseguiremos ter Sucesso.
Depois de terdes praticado o pratyahara por algum tempo, dai o passo seguinte,
o dhârana, conservando a mente sobre certos pontos. Que significa manter a
mente sobre certos pontos? Significa forçar a mente e sentir certas partes do
corpo, com exclusão de outras. Por exemplo, tentai sentir apenas a mão, com
exclusão de todas as outras partes do corpo. Quando chitta, ou material-da-
mente, se confina e se limita a um certo lugar, isso é dhârana. Esse dhârana
existe de várias maneiras, e com ele é bom ter um pouco de jogo de
imaginação. Por exemplo, leva-se a mente a pensar em um ponto do coração.
Isso é muito difícil e a maneira mais fácil é imaginar que ali existe um lótus.
Esse lótus está cheio de luz, de luz resplandecente.
Colocai a mente ali. Ou pensai sobre o lótus do cérebro como cheio de luz.
Falar não leva a isso. Portanto, abandonai toda a conversa fútil. Lede apenas os
livros escritos por pessoas que tiveram a compreensão.
Os que realmente desejam ser yogues, devem abandonar, de uma vez para
sempre, esses mordiscos a todas as coisas. Tomai convosco uma ideia. Fazei
dessa ideia a vossa vida. Pensai nela. Sonhai com ela. Vivei-a. Deixai o
cérebro, os músculos, os nervos, todas as partes do vosso corpo, encherem-se
dessa ideia, e ponde de lado qualquer outra. Esse é o caminho para o sucesso,
e esse é o caminho que produz os grandes gigantes espirituais.
Terceira Parte
Ao mesmo tempo, há uma parte muito grande da minha existência, da qual não
estou consciente, como dos diferentes órgãos dentro do corpo, das diferentes
partes do cérebro, etc.
Quando como, faço-o conscientemente. Quando assimilo, faço-o
inconscientemente, Quando o alimento é transformado em sangue, isso é feito
inconscientemente. Quando as diferentes partes do meu corpo são fortalecidas
por esse sangue, isso é feito inconscientemente. Entretanto, sou eu quem está
fazendo isso.
Não pode haver vinte pessoas neste corpo único. Como sei que faço isso, e não
outra pessoa qualquer? É possível dizer que a minha parte está apenas no
comer e assimilar o alimento, ou que o fortalecimento do corpo pelo alimento é
feito para mim por alguma outra pessoa? Isso não procede, porque pode ser
demonstrado que quase todas as ações das quais somos agora inconscientes,
podem ser trazidas para o plano da consciência. O coração bate,
aparentemente sem controle. Nenhum de nós pode controlar o coração, que faz
seu próprio caminho. Mas, pela prática, os homens podem controlar até mesmo
o coração, fazendo com que ele palpite conforme desejemos, vagarosa ou
rapidamente, ou chegue quase a parar.
Quase todas as partes do corpo podem ser trazidas sob controle. Que mostra
tal coisa? Que as funções existentes abaixo da consciência também são
realizadas por nós, acontecendo, apenas, que as realizamos
inconscientemente.
Temos, então, dois planos nos quais trabalha a mente humana. O primeiro é o
plano consciente, no qual todo o trabalho é acompanhado pela sensação do
ego. Depois vem o plano inconsciente, onde o trabalho não é acompanhado
pela sensação do ego. Essa parte do trabalho da mente, que não é
acompanhada pela sensação do ego, é trabalho inconsciente, e a parte
acompanhada pela sensação do ego é trabalho consciente.
Mas isto não termina aqui. Há ainda um plano mais alto, no qual a mente pode
trabalhar. Ela pode ir além da consciência. Tal como o trabalho inconsciente
está abaixo da consciência, há outro trabalho que está acima da consciência e
que também não é acompanhado pela sensação do ego. A sensação do ego
está apenas no plano do meio. Quando a mente está acima ou abaixo dessa
linha, não há sensação de "eu", e ainda assim a mente trabalha. Quando a
mente vai para além dessa linha de auto-consciência, é o chamado samadhi, ou
superconsciência.
Como, por exemplo, sabemos que um homem em samadhi não foi para baixo
da consciência, não degenerou, em lugar de subir? Em ambos os casos os
trabalhos não são acompanhados pelo ego. A resposta é a seguinte: pelos
efeitos, pelos resultados do trabalho, sabemos o que está abaixo e o que está
acima. Quando um homem adormece profundamente, entra num plano abaixo
da consciência. Trabalha o corpo durante todo o tempo, respira, move-se talvez
em seu sono, sem qualquer acompanhamento da sensação do eu. Está
inconsciente, e quando acorda é o mesmo homem que era antes de adormecer.
A soma total de conhecimento que possuía antes de adormecer permanece a
mesma, não aumenta absolutamente. Não há esclarecimento. Mas quando um
homem entra em samadhi, se para ele vai como tolo, dele vem como sábio.
Todas as nossas teorias éticas, todas as nossas atitudes morais, tudo quanto é
bom e grande na natureza humana, têm sido moldado sobre respostas que
vieram de acolá desse círculo. É muito importante, por conseguinte, que
tenhamos respostas para essas perguntas. Se a vida é apenas um jogo rápido,
se o universo é apenas uma "fortuita combinação de átomos", por que devo
fazer bem a outrem? Por que haveria misericórdia, justiça, ou sentimento de
solidariedade?
Toda ética, toda ação humana, e todo pensamento humano, se baseiam nessa
ideia de desinteresse.
Toda a ideia da vida humana pode ser posta nesta palavra, desinteresse. Por
que seríamos desinteressados?
Onde está a necessidade, a força, o poder, que me compele a ser
desinteressado? Podeis chamar a vós mesmos homens racionais, utilitários,
mas se não me mostrais as razões para o utilitarismo, eu digo que sois
irracionais. Mostrai-me as razões por que eu não deveria ser egoísta. A
resposta está no fato de este mundo não passar de uma gota num oceano
infinito, um elo de uma cadeia infinita.
Onde colheram essa ideia os que pregaram o desinteresse, e o ensinaram à
raça humana? Sabemos que ela não é instintiva: os animais, que têm instinto,
não a conhecem. Também não é razão: a razão nada sabe sobre tal ideia.
Então, donde veio ela?
Pensai no bem que Maomé fez ao mundo, e pensai no grande mal que foi feito
através do seu fanatismo! Pensai nos milhões de pessoas que foram
massacradas através de seus ensinamentos - mães despojadas de seus filhos,
crianças tornadas órfãos, regiões inteiras destruídas, milhões e milhões de
pessoas mortas! Vemos esse perigo quando estudamos as vidas dos grandes
mestres, como Maomé e outros. Ainda assim, vemos, ao mesmo tempo, que
eles eram todos inspirados.
Quando a mente foi treinada para se conservar fixa em certo ponto externo ou
interno, adquire o poder de fluir em corrente ininterrupta, por assim dizer, em
direção a um ponto. Esse estado é chamado dhyana, Quando se tem tão
intensificado o poder de dhyana, a ponto de poder eliminar a perceção exterior
e permanecer meditando apenas na parte interior, e seu significado, tal estado é
chamado samadhi. Isto é, se a mente pode primeiro concentrar-se sobre um
objeto, e depois tem capacidade para continuar nessa concentração por um
certo período de tempo, para, pela concentração continuada, tratar apenas da
parte interior da qual o objeto era o efeito, tudo vem a ficar sob o controle dessa
mente.