Aula 18 Poesia Pós-Pessoa (Presença, Neorrealismo, Sophia, Ruy Belo e Jorge de Sena)
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Aula 18 Poesia Pós-Pessoa (Presença, Neorrealismo, Sophia, Ruy Belo e Jorge de Sena)
Ida Alves
Paulo Braz
Aula 18 • Em torno de mim, o mundo
Meta
Objetivos
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LIteratura Portuguesa II
Introdução:
repensar o modernismo
Mas por que começamos esta aula com esse regresso no tempo? Muito
simples: desejamos que você relembre a importância de Orpheu para
relacioná-la agora a uma outra revista moderna que foi muito forte na
primeira metade do século XX, em Portugal. Trata-se da revista presença
(assim mesmo, em minúsculas), que começou a ser publicada em 1927.
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Aula 18 • Em torno de mim, o mundo
A poesia não é o que diz, mas o que é, segundo uma fórmula cé-
lebre. “Cântico Negro” fala de loucura, invoca audácias extremas,
sugere complexidades, anuncia desumanidade. Mas a audácia
poética real está nas imagens fulgurantes de “Saudação”, nas va-
gas luminosas da “Ode Marítima”, espelho de uma complexidade
e de uma desumanidade tão irrefutáveis que perto delas a mea-
da psicológica de Régio parece um brinquedo de criança. A sua
simples existência mostra uma “loucura” vertiginosa, em estado
puro, tão diferente da aludida por Régio como uma bomba ex-
plodindo, de um discurso de anarquista. Tal é, aliás, em termos
metafóricos, o abismo que separa, em geral, Orpheu de presença
(LOURENÇO, 1987, p. 152).
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Literatura viva
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(...)
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Aula 18 • Em torno de mim, o mundo
Atividade 1
Atende ao Objetivo 1
A partir do que foi apresentado até agora, dos sites visitados, explique:
1. Por que o ensaísta Eduardo Lourenço considerou presença uma con-
trarrevolução do modernismo instaurado por Orpheu?
2. A importância de presença para a compreensão do modernismo
português.
Resposta Comentada
Resuma a crítica que Eduardo Lourenço faz à presença sobre seus escri-
tores não apresentarem a mesma linguagem revolucionária que caracte-
rizou Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros. Pen-
se na poética do fingimento pessoano e compare com o sujeito expresso
na poesia de José Régio. Em seguida, levando em conta que os poetas de
presença foram os primeiros leitores de Orpheu, indique a importância
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Atividade 2
Resposta Comentada:
O que caracteriza, fundamentalmente, as divergências entre neorrealis-
tas e presencistas diz respeito a um posicionamento ideológico quanto
à função do artista e sua obra. Enquanto para os poetas de presença a
investigação psicologista e um olhar íntimo sobre o sujeito determina-
va seu modo de estar no mundo, para os neorrealistas, a crítica política
e um posicionamento mais engajado eram condições necessárias de sua
criação. A respectiva contraposição de uma arte de investida individual e
uma arte coletiva, num âmbito muito mais temático do que propriamente
formal, assinala uma diferença radical entre presencistas e neorrealistas.
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Aula 18 • Em torno de mim, o mundo
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LIteratura Portuguesa II
A acusação sofrida pelo eu lírico deste soneto pode ser lida como tes-
temunho do que o próprio Carlos de Oliveira sentiu na pele. Uma poe-
sia carregada de “mágoa e desalento” não servia aos propósitos políticos
do Neorrealismo, quanto mais uma escrita que se empenhasse no labor
estético de construções formais mais complexas e efeitos imagéticos que
desviassem a atenção do leitor. Todavia, o grande contributo desse escri-
tor foi, justamente, o reconhecimento de que a legítima resistência que
poderia exercer contra um tempo de opressão e de carências extremas
se dava exatamente no trabalho da linguagem. A noção de trabalho poé-
tico (aliás, título com que batizou a sua antologia poética) torna-se cara
a Carlos de Oliveira, na medida em que começa a apurar seu exercício
oficinal de composição, submetendo, ainda, seus próprios textos iniciais
a uma vertiginosa metamorfose na década de 1960, ou seja, realizou um
processo de reescrita das obras produzidas de 1940 a 1960, depurando-
-as dos excessos da linguagem neorrealista mais ortodoxa.
O interesse do poeta em cantar a beleza associava-se a um intrínse-
co desejo criativo que reconhecia o quanto a verdadeira revolução em
poesia havia de se dar, antes de tudo, na forma. O marco desta trans-
formação pode ser situado na altura da publicação da sua obra Canta-
ta (1960). Já no título desse livro, o foco de atenção dirige-se a outros
propósitos, porventura mais líricos, embora de maneira alguma tenha
abandonado a postura de resistência que caracterizou seu trabalho des-
de o princípio. Leia a seguir o poema intitulado “Soneto”, de Cantata,
no qual a atenção à linguagem é indiciadora de um veemente desejo de
unir palavra e mundo.
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Atividade 3
Atende ao Objetivo 3
Os versos
que te digam
a pobreza que somos
o bolor
nas paredes
deste quarto deserto
os rostos a apagar-se
no frémito
do espelho
e o leito desmanchado
o peito aberto
a que chamaste
amor
(OLIVEIRA, 2003, p. 158)
Resposta Comentada
Partindo do próprio título do poema, podemos relacionar um cam-
po semântico associado à decomposição, como a apontar para uma
realidade sob o signo da morte: bolor, pobreza, deserto, apagamento,
“leito desmanchado”. A noção de falta está intimamente relacionada à
linguagem, também parca, tendo em vista a contenção vocabular do
texto. Deste modo, a consciência histórica inscreve-se num discurso
que diz a própria precariedade da vida e do mundo, reduzindo-se a
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Aula 18 • Em torno de mim, o mundo
O título desta seção faz uma dupla referência, isto porque a sentença
– retirada de um texto de Sophia – é já uma paráfrase ao verso pessoano:
“O poeta é um fingidor”. Tal fragmento é sintomático, não apenas do
importante aspecto musical presente em sua obra, mas também da re-
lação expectante que a autora de Navegações (1983) impõe ao seu fazer
poético. Sophia empreende em sua escrita uma atenção sobre o mundo
de modo a adivinhar-lhe a transparência, como se estivesse a conhecê-
-lo pela primeira vez, descobrindo-o. “As ondas quebravam uma a uma
/ Eu estava só com a areia e com a espuma / Do mar que cantava só para
mim” (ANDRESEN, 2011, p. 77). Os versos do poema de abertura do
livro Dia do mar (1947) oferecem-nos esta claridade imagética.
Nas palavras do poeta e ensaísta crítico Gastão Cruz, em texto sobre
outro livro da poeta, Dual (1972), lemos o seguinte: “O exercício da lin-
guagem é, por excelência, a forma de estar atento ao mundo, onde cada
coisa nomeada se recorta com clareza e nitidez” (CRUZ, 2008, p. 154).
Este “estar atento ao mundo” indicia a profunda consciência histórica
que a poesia andreseniana acusa.
Ouça em http://www.youtube.com/watch?v=WYT8OzEukZ0
um discurso de Sophia de M. B. Andresen.
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Conclusão
Atividade Final
Atende ao Objetivo 4
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Resposta Comentada
No texto de Sophia, a poeta constrói seu discurso elencando o que de
sua própria vida a poesia exige, assinalando uma intersecção importante
(entre literatura e real) para compreendermos este processo. A própria
ideia de responsabilidade indicada naquilo que a poesia “pede”, neces-
sita, é um índice relevante neste quesito. Ora, tanto Sophia quanto Sena
e Ruy Belo são poetas que, a sua maneira, investiram numa confluência
entre ética e estética de modo a fazer de suas obras uma abertura pos-
sível relativamente ao mundo e ao outro. O enfrentamento do real ope-
rado por estas distintas poéticas determina-se, seja na noção de justiça
e equilíbrio em Sophia, seja na poética do testemunho em Sena, seja na
afirmação do cotidiano de Ruy Belo, como modo privilegiado de enten-
dimento e transformação do mundo.
Resumo
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