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Mini-Histórias Uma Comunicação para Quem

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MINI-HISTÓRIAS:

UMA COMUNICAÇÃO
PARA QUEM?
Cristiele Borges dos Santos1
Rafaela Flores2

RESUMO

O propósito desse artigo é discutir a forma e o motivo pelo qual as mini-histórias são
compartilhadas com as crianças, famílias e comunidade escolar, a partir da experiência
de uma professora que foi qualificando essa prática em seu cotidiano. Mini-histórias são
breves relatos acompanhados de imagens que narram, de forma poética, o cotidiano
nas escolas de Educação Infantil. Essa forma de comunicação vem se disseminando
nos espaços educacionais e sendo o foco de pesquisa de uma das autoras. Assim, este
artigo pretende colocar em evidência as estratégias que esta educadora utilizou para dar
uma visibilidade maior às famílias, e principalmente às crianças, para que pudessem se
reconhecer verdadeiramente como protagonistas nesse processo. Discutimos sobre as
aprendizagens e experiências familiares que esse acesso mais democratizado às mini-
histórias vem proporcionando. É feito também uma reflexão de que forma o trabalho
realizado com as mini-histórias contempla os direitos de aprendizagem, os campos de
experiência e o desenvolvimento na educação infantil, buscando aproximações concretas
com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A pesquisa é fruto das reflexões e
mudanças graduais que ocorreram na faixa etária 1 ano da EMEI Joaninha ao longo dos
anos de 2018 e de 2019. É contado aqui, sistematicamente, essa mudança, e apontado
o retorno das famílias que foi muito positivo, a partir dessa preocupação que se teve em
oportunizar e convidá-las a contemplar e exercitar um olhar mais atencioso e singular
para as experiências vividas pelas crianças a partir das mini-histórias, compartilhadas de
forma impressa e pela rede social.

Palavras-chave: Mini-histórias; Famílias; Crianças; Comunicação.


1 Especialista em Educação Infantil. E-mail: cristieleborges@novohamburgo.rs.gov.br. Professora da Rede Municipal de Ensino de
Novo Hamburgo lotada na EMEI Joaninha. Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul, Brasil.
2 Especialista em Organização do trabalho pedagógico. E-mail: rafaelaflores@novohamburgo.rs.gov.br. Professora da Rede Municipal
de Ensino de Novo Hamburgo lotada na EMEI Joaninha. Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul, Brasil.

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Cristiele Borges dos Santos e Rafaela Flores

INTRODUÇÃO

As mini-histórias são relatos poéticos com imagens, oriundos da vida cotidiana


na escola. O conceito surgiu nos anos oitenta, em Reggio Emilia, quando o pedagogo
italiano Malaguzzi fez um convite às professoras para que narrassem através de relatos
visuais e textuais os percursos formativos de aprendizagem das crianças (FOCHI, 2019).
Além de Malaguzzi, David Altimir e Paulo Fochi também conceituam as mini-histórias,
sendo Fochi nossa principal referência:

A definição que Altimir (2010, p. 84) dá para a ideia de mini-histórias é [...] de pequenas
relatos, alguns com um denso passado, outros com muito futuro, e alguns, simples
instantes”. No OBECI, temos tratado as mini-histórias como as rapsódias da vida cotidiana
que, ao serem narradas textual e imageticamente, tornam-se especiais pelo olhar do adulto
que as acolhe, interpreta-as, e dá valor para a construção da memória pedagógica. (FOCHI,
2019, p. 49).

Não há uma regra para a escrita das mini-histórias, pois cada professor ao
escrevê-las coloca sua interpretação e sensações em relação à ação das crianças ali
narradas. É uma prática que gera encantamento, mas que também exige uma qualidade
estética e uma grande sensibilidade na valorização das ações dos meninos e das meninas
durante a jornada na escola. Essa forma de comunicação vem se disseminando, e vários
profissionais tem se aventurado na escrita de narrativas. E é assim mesmo que deve ser.
Só se aprende escrever, escrevendo. Então, os profissionais devem ser incentivados e
convidados a escrever sobre seu cotidiano, a fim de dar visibilidade ao que realmente
acontece nas escolas, deixando em evidência essa cultura da infância que aposta no
brincar e nas interações como ferramentas indispensáveis nessa jornada das crianças. O
professor de Educação Infantil pouco escreve sobre suas práticas, como bem nos lembra
Fochi (2015), quando cita Malaguzzi:

É mais fácil que um caracol deixe rastros do seu próprio caminho, de seu trabalho, que uma
escola ou uma professora deixe rastro escrito de seu caminho, do seu trabalho. [...] Em
alguns países ocidentais se considera uma interferência inoportuna ou lesiva aos direitos
de alguém. Nós fazemos [a documentação] porque nos dá um conhecimento mais próximo
e reflexivo de nosso próprio trabalho. (MALAGUZZI, 1989 apud HOYUELOS, 2006, p. 195).

Com a prática das mini-histórias, disseminada em outros espaços escolares, e


consolidada na Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI) Joaninha, os professores
junto à coordenação começaram a se questionar sobre a forma como essas mini-histórias
estão sendo compartilhadas. Chegou-se à conclusão que o grupo poderia ir além, pensar
em tornar esta prática ainda mais significativa, principalmente para as crianças que são
os principais sujeitos envolvidos em todo este processo. Dessa forma, este artigo conta
de forma resumida esse caminho que a professora começou a trilhar, em 2018, a partir
desses questionamentos, e que foi aos poucos se consolidando no ano de 2019.
Em consonância com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), buscou-se
contemplar os direitos de aprendizagem e desenvolvimento na educação infantil através
da experiência com as mini-histórias. Estas trazem momentos do cotidiano em que ficam
explícitos os seis direitos descritos na BNCC, de modo que um complementa o outro.

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Em relação aos campos de experiências, podem ser apontados, como orientadores da


prática, os campos “o eu, o outro e nós” e “escuta, fala, pensamento e imaginação”.
Objetivou-se, com esse trabalho, investigar a forma como as mini-histórias eram
compartilhadas e, a partir desta constatação, refletir e projetar quais estratégias poderiam
ser utilizadas para que essa prática se tornasse mais concreta e visível na jornada das
crianças, fazendo parte dos contextos exploratórios da sala referência. Convidar as
famílias a olhar para essas narrativas e conseguir enxergar nelas as sutilezas que
acontecem nesse cotidiano da infância (para assim compreender que isso é currículo da
educação infantil) também foi um dos objetivos.

AS MINI-HISTÓRIAS E A BNCC

Em 2015, a EMEI Joaninha começou a participar do OBECI (Observatório da


Cultura Infantil) coordenado pelo Dr. Paulo Fochi. Nessa comunidade de pessoas
interessadas em discutir o cotidiano, surgem inquietações que as levam a refletir e buscar
modificações constantes que venham a qualificar a prática na escola. Nesse contexto,
surgiram as primeiras conversas sobre as mini-histórias e, ao longo desses 4 anos, essa
prática vem sendo exercitada e aprimorada cada vez mais. A escola, então, tem como
marca a escrita de mini-histórias, como aponta Fochi (2019). As mini-histórias narram as
rapsódias da vida cotidiana e ajudam os professores a compreender os interesses das
crianças, o que possibilita um trabalho realizado de forma mais contextualizada.

Também virou uma marca da escola o trabalho com as mini-histórias, servindo como
estratégia de comunicação e diálogo com a comunidade educativa. Narrar imagética e
textualmente as rapsódias da vida cotidiana tem ajudado as professoras dessa EMEI a
compreender melhor as crianças e, com isso, construir pautas para o próprio trabalho. O
trabalho dessa escola com as mini-história e com as investigações sobre o Brincar Heurístico
é fortemente sustentado pelas condições de diálogo e partilha entre as professoras e a
coordenação pedagógica. (FOCHI, 2019, p. 159).

Estudar e compreender a BNCC em seu sentido amplo e não apenas como uma
lista de objetivos a serem alcançados tem sido um objetivo do grupo de professores.
Assim, pensar quais aproximações poderíamos fazer da prática das mini-histórias com a
Base foi um de nossos objetivos.
Começamos explanando sobre os direitos de aprendizagem e desenvolvimento
na educação infantil, que é o princípio quando falamos em conteúdo em termos de
educação infantil. As mini-histórias trazem momentos do cotidiano da jornada das
crianças, onde fica explícito o direito de conviver, brincar, explorar e expressar-se, o que
pode ser percebido no texto escrito pelos professores, mas, principalmente, na sequência
de fotos das ações das crianças que os relatos imagéticos trazem. O direito de participar
é contemplado uma vez que a participação é efetiva, pois a criança é protagonista nesse
processo, cabendo ao professor o registro e o olhar sensível sobre a situação. O direito
de conhecer-se fica expresso na visualização das mini-histórias pelas crianças, em que
podem narrar, pelas fotos, o que ocorreu, colocando também a sua impressão sobre si
e sobre o outro. Aqui também caberia o direito de participar e expressar. Na verdade,

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esses seis direitos são contemplados, de modo complementar, nas ações cotidianas
das crianças expressas nas mini-histórias produzidas pela professora e na interação das
crianças com as mini-histórias físicas já impressas.
Pensando sobre os campos de experiência, elencamos alguns temas que ficam
expressos na produção e compartilhamento das mini-histórias. No campo de experiência
“O eu, o outro e nós”: experiências sociais; percepções e questionamentos sobre si e
sobre os outros; autonomia; reciprocidade; interdependência com o meio; identidade e
respeito ao outro. No campo de experiência “Escuta, fala, pensamento e imaginação”:
situações comunicativas cotidianas; cultura oral; escuta de histórias; participação em
conversas; imersão na cultura escrita; contato com histórias (no caso das mini-histórias,
as suas histórias e dos colegas).
Tendo compreendido a forma como produzir mini-histórias, sua relevância e
importância, começamos a refletir para quem e como estava sendo utilizada essa
comunicação. As mini-histórias podem servir de comunicação para os professores, para
as famílias ou para as crianças. Contudo, deve-se observar a linguagem utilizada e a
forma de apresentação. A mini-história pode ser lida por todos, mas a intenção de quem
a produziu é de grande importância. (FOCHI, 2019).

UM PEQUENO GUIA NA ESCRITA DAS MINI-HISTÓRIAS

Na realização de oficinas e relatos da prática, para algumas escolas e grupos de


professores, uma das autoras deste artigo criou um roteiro baseado em sua experiência,
buscando uma forma de metodizar a produção das mini-histórias. Fochi (2019) apresenta
também um pequeno guia para escrever uma mini-história. Segue então, não um manual,
mas um guia de sugestões para saber de onde iniciar, baseado nas ideias de Fochi e nas
das autoras.
- Registre cenas do cotidiano das crianças, sequências de fotos que mostrem
ações, interação, narrativas, olhares...
- Observe atentamente os registros e escolha algo para contar.
- Observe o que escolheu e tente identificar um fio narrativo que ajude na
construção do texto.
- Organize as imagens em um slide de Powerpoint. Atente-se ao layout, ou seja,
para a disposição do texto e imagens.
- Comece a escrever. Pode ser inicialmente uma descrição, e depois volte e
escreva a partir dessa.
- Leia e pense sobre o que você escreveu, se essas palavras acolhem a
complexidade da ação das crianças.
- Ofereça para alguém ler, para observar se o texto está claro e se existe alguma
sugestão para modificação. Reescreva se for necessário.
- Salve em formato JPEG. Imprima e compartilhe num lugar visível para que os
colegas, familiares e crianças possam visualizar. Publique digitalmente na rede social da
escola para alcançar ainda mais pessoas.

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Além das dicas anteriores, acrescentamos que se faz necessário escrever


sempre, pois a prática só virá com a persistência na escrita. Não ter medo do erro, pois
é difícil definir certo e errado quando falamos de um tipo de comunicação que é muito
pessoal, que vai contar sobre as crianças envolvidas na cena mas também muito sobre
esse professor que escreve, seu olhar e sua concepção.

METODOLOGIA

A pesquisa é de caráter qualitativa, pois:

Tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal
instrumento; b) os dados coletados são predominantemente descritivos; c) a preocupação
com o processo é muito maior do que com o produto; d) o significado que as pessoas dão às
coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo pesquisador; e) a análise dos dados
tende a seguir um processo indutivo. (LUDKE, 2011, p. 43).

Os participantes são crianças (17) da faixa etária 1 (crianças com 1 ano completo
até 31 de março) da EMEI Joaninha, no ano de 2018, crianças (22) da faixa etária 1 no
ano de 2019 e suas respectivas famílias. A pesquisa também envolveu a coordenadora
e a diretora da escola, bem como os 3 professores titulares da turma, sendo um deles
a pesquisadora. A coleta e organização dos dados ocorreu pela observação contínua e
conversas periódicas sobre o assunto. Houve também registros escritos, fotográficos e
documentais dos professores e equipe.
A análise se deu principalmente em relação à interação das crianças com o
ambiente, no sentido de sinalizar que estavam interessados em ter acesso à visualização
das mini-histórias, também às falas trazidas pelas famílias e à análise de imagens das
crianças e suas reações ao se verem em alguma imagem impressa. Essas análises
foram feitas semanalmente no planejamento dos professores, com a coordenadora
pedagógica. Após as análises, eram pensadas estratégias para que as mini-histórias
pudessem fazer parte mais efetivamente da jornada das crianças.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir das discussões iniciais de como tornar a prática mais concreta no


cotidiano das crianças, os professores deram-se conta de que a disponibilização das
mini-histórias, nos ambientes, precisava estar em uma altura adequada para as crianças,
a fim de que elas pudessem observar e se reconhecer nos mais diversos momentos da
jornada. Assim, foram eleitas algumas mini-histórias, que dessem conta de contemplar
todas as crianças, e foram coladas na parede da sala referência. Esse processo ocorreu
de forma gradual, mas foi necessário refletir sobre ele e entender a razão porque estava
sendo feito.

Quando comunicamos endereçando às crianças, oferecemos a elas oportunidade de ver


outra vez seu percurso, abrimos um espaço para que possam compreender o modo como
apreendem, o modo como fazem e como constroem significado. Isso significa restituir às

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próprias crianças a sua aprendizagem. Quando fazemos isso, estamos, com as crianças,
colecionando exemplos particulares sobre nós mesmos, mergulhando fundo em um
processo de autoconhecimento e de aprendizagem. (FOCHI, 2019, p. 233)

Imagem 1 - sala referência com as mini-histórias coladas

Fonte: acervo autora 1.

Este foi um grande primeiro passo. É necessário acreditar na potência das crianças.
Mesmo não sendo alfabetizadas e não tendo domínio desse código letrado, as crianças
precisam ter acesso à escrita, sabendo que ali está sendo contado algo que fala de processos
que elas viveram. Elas fazem leitura de imagem, se reconhecem e reconhecem os colegas.
Expor as mini-histórias na sala referência, na altura das crianças, é devolver a elas todas as
vivências registradas, permitindo que se vejam e se encontrem ali. Dessa forma, as crianças
podem reviver momentos que aconteceram na jornada e perceber que as imagens estão
contando sobre algo. Essa valorização dos registros leva a criança a compartilhar com a
família, convidando-a para olhar junto. 
Imagem 2 - menina se reconhecendo Imagem 3 - meninas conversando sobre os
na foto da mini-história colegas na mini-história

Fonte: acervo autora 1.

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As mini-histórias são compartilhadas semanalmente em um mural ao lado


da sala referência da turma. Elas são produzidas na hora atividade dos professores,
momento este muito aproveitado, principalmente para troca de ideias, reflexão, registro
e planejamento das ações.

Imagem 4 - reflexões sobre Imagem 5 - família contemplando


as práticas e registros as mini-histórias expostas

Fonte: acervo de Ivana. Fonte: acervo de Liliane.

As tecnologias estão presentes na vida de todas as pessoas, e o acesso às


mídias durante o dia são frequentes. No trabalho, ou em casa as famílias têm um acesso
quase que instantâneo às redes sociais. Buscando aproveitar essa democratização
do acesso à internet e percebendo que algumas famílias não conseguiam conciliar
seus horários de trabalho e se fazer presente frequentemente na escola, optou-se por
começar a compartilhar também no Facebook da escola as mini-histórias. O retorno
foi muito positivo. As famílias se mostraram encantadas com a prática desenvolvida e
agradeceram muito por poder compreender através dos relatos como era a vida de seus
filhos na escola. A seguir, dois exemplos que retratam isso:

Figura 1 - comentário da mãe de criança na mini-história postada

Fonte: print da página do Facebook da EMEI Joaninha.

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Figura 2 - comentário da mãe de criança na mini-história postada

Fonte: print da página do Facebook da EMEI Joaninha.

Com esse compartilhamento das mini-histórias de forma mais acessível (pelo


Facebook), foi possível chamar a atenção das famílias para valorizar tudo o que acontece
dentro de uma escola de crianças bem pequenas, e que todos os momentos (sejam eles
de alimentação, de higiene ou de sono) estão carregados de aprendizado. Dessa forma,
os professores conseguiram mostrar, para as famílias, cenas que acontecem dentro de
uma escola de criança, deixando mais claro a proposta da escola, que não acredita que o
aprendizado possa emergir de folhas com desenhos prontos e atividades padronizadas.
Demonstrando, assim, a cultura da infância que tanto falamos e defendemos, uma
cultura que aposta no brincar e nas interações como ferramentas indispensáveis nessa
jornada das crianças.
Demorou um pouco para começar o processo de compartilhamento na rede
social, pois havia receio das famílias não entenderem que cada criança tem um processo
único, e que a cada semana seria postada apenas uma mini-história, mas que, ao
longo do ano, todas crianças seriam contempladas. Inicialmente, como em qualquer
prática, houve questionamentos, porém na escola costuma-se deixar claro a proposta
pedagógica e as famílias têm a compreensão do trabalho que está sendo desenvolvido.
Quanto à impressão das mini-histórias, era fundamental que o material fosse colorido,
pois a questão estética é importante. Nos primeiros semestres, foi necessário pedir
para as famílias um valor para realizar a impressão colorida desse material em uma
loja especializada, pois, na escola, só havia impressão preto e branco. Prezando pela
qualidade da documentação e dos registros entregues para as famílias, a direção optou
por organizar um serviço de impressão colorido pago pela escola, para que, assim,
as professoras pudessem imprimir as mini-histórias e outros registros das crianças,
enriquecendo ainda mais o trabalho pedagógico.
No ano de 2019, buscando qualificar e aproximar as crianças ainda mais dessa
prática em que elas são as protagonistas, além das mini-histórias coladas na parede,
foi elaborado um livro com algumas mini-histórias. Esse livro ficava disponível na sala
referência junto com os demais livros de histórias, para que as crianças pudessem
explorá-lo de forma autônoma, durante suas brincadeiras. Houve grande interesse por

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esse material, mas, com o tempo, devido a utilização e manuseio, precisava de reformas
constantes. Assim, posteriormente, foram eleitas e plastificadas algumas mini-histórias
que contemplassem todos os meninos e meninas, ficando disponíveis para manuseio e
exploração das crianças. As crianças mostraram-se satisfeitas com esse novo material
que, além de ter suas fotos, fazia barulho ao movimentar, possibilitando mais uma forma
de exploração sonora, e também podia ser compartilhado ao mesmo tempo com vários
colegas, pois diferente do livro, eram várias fichas.

Imagem 6 - menina olhando o Imagem 7 - meninas olhando fichas plastificadas


livro de mini-histórias e se reconhecendo na mini-história

Fonte: acervo autora 1.

Semestralmente é enviado para as famílias um envelope com as mini-histórias


impressas de cada criança. Este vai para casa junto com o portfólio e as avaliações,
retornando no segundo semestre para acrescentarmos novas mini-histórias:

Imagem 8 - envelopes com as mini-histórias

Fonte: acervo autora 1.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As mini-histórias, enquanto narrativas que comunicam a vida cotidiana na escola,


estão consolidadas no sentido de se entender que são uma forma potente de expressar as
aprendizagens e interações que ocorrem entre as crianças. Contudo, faz-se necessário
discutir os desdobramentos dessa prática. O intuito aqui foi pensar e refletir de que
forma essa prática poderia ser qualificada. Gradualmente, os professores foram criando
estratégias, adequando aos interesses da turma. Não pretendemos aqui concluir nada,
pelo contrário, queremos deixar em evidência a necessidade de se pensar a respeito
das práticas que são realizadas. Propomo-nos a pensar para quem estava sendo
essa comunicação das mini-histórias e, a partir desses questionamentos, foi possível
ir modificando a forma de comunicar, a fim de que as crianças pudessem também ter
a oportunidade de aprender com essa prática de forma contextualizada e significativa.
Acreditamos que qualquer prática que nos faça escutar e respeitar as crianças deve
ser compartilhada e difundida por todos os espaços, e as mini-histórias criam dentro
do cotidiano uma maneira de olhar respeitosamente para as ações dos meninos e das
meninas. Assim, cabe destacar que temos ido em alguns espaços pedagógicos falar sobre
nossa prática, a fim de inspirar também outras escolas e professores a aventurarem-se
na escrita de mini-histórias. Nesses encontros e na análise realizada sempre surgem
questionamentos: Como qualificar mais essa prática? Como ir adiante? Há outras formas
que ainda não se pensou? Como as crianças podem ser ainda mais participativas na
construção das mini-histórias?
Percebemos que houve uma grande evolução na comunicação oral das crianças
durante os diálogos sobre as mini-histórias. Enquanto professores, nos colocamos como
aprendentes o tempo todo. Aprender a olhar, a desenvolver uma escuta sensível com o
entorno, para a partir dessa, além de produzir belos textos, poder propiciar experiências
mais valorosas com as crianças e para as crianças. O olhar que se tem em relação à
infância e às crianças influi diretamente na construção dos registros. A forma como o
professor descreve determinada situação conta, por vezes, muito sobre sua prática e
no que acredita, suas concepções pedagógicas. As mini-histórias, enquanto registros
das histórias vivenciadas nas escolas da infância, refletem também o profissional, suas
escolhas e formas de narrar aquela criança que está em ação.
Essa experiência educativa demonstrou ser uma ferramenta potente, capaz de dar
visibilidade ao cotidiano na escola pública da prática desenvolvida. Uma escola pública
pode e deve oferecer qualidade pedagógica para as famílias e principalmente para as
crianças. A educação é direito das crianças, e não pode ocorrer de qualquer forma. A
comunidade em que a escola pesquisada está inserida é carente economicamente.
Assim, receber os registros dos filhos(as) de forma impressa se configurou como algo
importante para as famílias. O acesso à internet está muito disseminado, contudo,
registros impressos, fotos, já não fazem mais parte da vida da maioria das pessoas.
Essa foi, então, a oportunidade de as famílias receberem fotos com uma narrativa escrita
por um profissional da educação sobre seu filho(a).
O retorno das famílias foi muito positivo. Tanto na rede social, quanto
presencialmente as famílias agradecem todo o envolvimento da escola em oferecer

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oportunidades de desenvolvimento das crianças e por terem o privilégio de poder


acompanhar as vivências de seus filhos na creche. Ao visualizar as cenas transcritas
nas mini-histórias, as famílias enxergam seus filhos em vivências e descobertas que
talvez não seriam vistas sem esse olhar que dá importância e traduz, por meio de fotos
e narrativas, momentos do cotidiano.
Encerramos com uma imagem enviada por uma família, em que o menino e a mãe
olham, conversam e leem juntos as mini-histórias. O olhar de Antônio e sensibilidade de
sua mãe nesse momento são encantadores e nos fazem perceber o quanto esta prática
tem sido valorizada.
Imagem 9 - Antônio e sua mãe lendo as mini-histórias

Fonte: arquivo pessoal da família.

REFERÊNCIAS

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Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo,
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25072019-131945/pt-br.php>. 22 ago. 2019.

______. Afinal, o que os bebês fazem no berçário? Comunicação, autonomia e saber-


fazer de bebês em um contexto de vida coletiva. Porto Alegre: Penso Editora, 2015.

______. Mini-histórias: rapsódias da vida cotidiana nas escolas do Observatório da

Saberes em Foco  Revista da SMED NH  v.3 n.1  ago. 2020 103
Cristiele Borges dos Santos e Rafaela Flores

Cultura Infantil - OBECI. Porto Alegre: Paulo Fochi Estudos Pedagógicos, 2019.

LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli EDA. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. Em


Aberto, v. 5, n. 31, 2011.

VECCHI, Vea. Prólogo. In: HOYUELOS, Alfredo. La estética en el pensamiento y obra


pedagógica de loris Malaguzzi. Barcelona: Octaedro, 2006.

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