Justice">
Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

TCC 28 - 09

Fazer download em docx, pdf ou txt
Fazer download em docx, pdf ou txt
Você está na página 1de 62

1

AMANDA APARECIDA SANTOS CRISOSTOMO

A CRISE NA EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL

Presidente Prudente
2021
2

AMANDA APARECIDA SANTOS CRISOSTOMO

A CRISE DA EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL

Projeto de Pesquisa apresentado à


Faculdade de Presidente Prudente –
FAPEPE, Curso de Direito, como requisito
parcial para conclusão da Disciplina TCC I e
da Graduação em Direito.

Professora da disciplina: Dra. Marta


Aparecida Broietti Henrique
Orientador: Nivaldo Correia da Silva.

Presidente Prudente
2021
3

SUMÁRIO

LISTA DE ILUSTRAÇÕES...................................................................... 06

1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 10

2 A ORIGEM DA EXECUÇÃO PENAL...................................................... 12


2.1 AS CONSTITUIÇÕES FEDERATIVAS DO BRASIL............................... 14
2.2 A EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL....................................................... 15

3 A EVOLUÇÃO DAS PENAS NO BRASIL.............................................. 17


3.1 ORDENAÇÕES FILIPINAS..................................................................... 19
3.2 CASAS DE PRISÃO, TRABALHO E CORREÇÃO................................ 22
3.3 CARANDIRU: UMA PENITENCIÁRIO MODELO................................... 29
3.4 A INTERFERÊNCIA DITATORIAL NO CÁRCERE................................. 31

4 SISTEMA PROGRESSIVO.....................................................................
4.1 OS TRÊS REGIMES...............................................................................
4.2 O ATUAL SISTEMA CARCERÁRIO DO BRASIL ................................

5 A VISÃO SOCIOLÓGICA DO PODER PUNITIVO DO ESTADO .......... 45


5.1 PUNITIVISMO SELETIVO......................................................................
5.2 SUPERLOTAÇÃO……………………………………………………………

6 RESSOCIALIZAÇÃO..............................................................................
6.1 O PAPEL DOS DIREITOS HUMANOS NO CÁRCERE..........................
4
5
6

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1
Um detento, em sua cela, rezando diante da torre central de vigilância. 17
FIGURA 2
O Poder Punitivo no Brasil....................................................................... 23
FIGURA 3
A Última Pena de Morte no Brasil (parte 2) - Galés Perpétua.................
FIGURA 4
Vista interna da penitenciária de Stateville, Illinois, EUA………………..
FIGURA 5
Planta da casa de correção do Rio de Janeiro, 1834 (Arquivo Nacional,
Rio de Janeiro).........................................................................................
FIGURA 6 Acredite, esta é uma das imagens mais leves sobre o massacre...........
FIGURA 7 A reportagem é da revista Veja, na edição de 5 de abril:........................
FIGURA 8 A reportagem é da revista Veja, na edição de 5 de abril:........................
FIGURA 9 Presídio Ilha Grande - Colônia Dois Rios................................................
FIGURA 10 Presídio Ilha Grande - Colônia Dois Rios................................................
FIGURA 11 Placar das Diretas, 1984..........................................................................
FIGURA 12 Cesare Lombroso e sua Classificação dos Criminosos...........................
FIGURA 13 Cesare Lombroso e a Teoria do Criminoso Nato.....................................
FIGURA 14 Brasil é o terceiro país com maior número de pessoas presas, atrás
dos Estados Unidos e China....................................................................

FIGURA 15
7
8
9

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Título da tabela ......................................................................................00

Tabela 2 – Título da tabela ......................................................................................00

Tabela 3 – Título da tabela ......................................................................................00

Tabela 4 – Título da tabela ......................................................................................00

Tabela 5 – Título da tabela ......................................................................................00


10

I INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem como intenção estudar a crise relacionada com o


problema da execução penal no Brasil. Por consequência, pesquisar sobre a
questão do cárcere e temas relacionados a ele como o da ressocialização. Nota-se
que o sistema carcerário em seu processo de institucionalização não cumpre o papel
a que se propõe. O papel a ser cumprido por ele deve ser a efetiva aplicação da Lei
de Execução Penal, e sobretudo a Constituição federal de forma respeitosa para
com a Declaração Internacional de Direitos Humanos.

Entende-se que desde o início do cárcere foi-se indagado como seria


aplicada a pena, de qual forma e sua razão, sendo lógica ou não. Neste estudo
podemos observar diversas interpretações da ética e moral e sua implantação
legislativa ao redor do mundo. No entanto, apenas com o fim da Segunda Guerra
Mundial e o surgimento da Organização das Nações Unidas, a ONU, que a luta
pelos direitos humanos se expandiu e fez-se presente em diversos países como o
Brasil e portanto em 1992 o Comitê de Direitos Humanos garantiu o respeito à
dignidade humana àqueles que cumprem penas privativas de liberdade.

Desta forma, o presidiário perde apenas seu direito de ir e vir, conservando


seus direitos e garantias fundamentais inerentes à sua dignidade. É portanto de fato
e de direito o papel do Estado em assegurar a integridade física dos encarcerados
de forma a cumprirem seu período de detenção com dignidade como lhe é
assegurado na Constituição Federal.

Nosso argumento é essencialmente a inconstitucionalidade presente na


atual gestão carcerária, ou seja, analisaremos como o Estado é falho em cumprir
com a Constituição Federal, mais precisamente em relação ao artigo supracitado e
como por extensão sua falha em cumprir com a Declaração Internacional de Direitos
Humanos.

Atualmente o sistema carcerário encontra-se em disfuncional idade por


conta de sua saturação. Criada em 11 de julho de 1984, a Lei nº 7.210, Lei de
Execução Penal, conhecida por LEP foi instaurada em todo território nacional como
medida para organizar os regimes e seus respectivos estabelecimentos prisionais.
Após quase 40 anos de vigor não há um único estabelecimento que cumpra com
todos os requisitos da supracitada lei. (Micheli Immich, 2016)

Buscamos argumentar que a má infraestrutura, o descaso do poder político


e a inexistência de investimentos contribuem na falta de condições básicas de
higiene e por extensão de assistência médica, resultado de uma má infraestrutura
além de saturação do sistema.
11

Procura-se neste trabalho investigar sobre as adversidades das três fases


da execução penal no país. Fases compostas pelo julgamento, cumprimento e
ressocialização, onde o Estado possui compromisso e participação em todo o
processo. Desejamos compreender quais possíveis soluções para atenuar a
mencionada crise. Entende-se que a melhora no sistema prisional tem relação com
questões ligadas a essas fases da aplicação penal.

O trabalho justifica-se pela preocupação a respeito naquilo que acreditamos


ser a crise na execução penal no Brasil e ainda pela necessidade de um
levantamento bibliográfico sobre a literatura a respeito do tema.

O presente trabalho tem por objetivo mostrar as reais adversidades das três
fases da aplicação penal no país, de modo a mostrar possíveis soluções para uma
gradual melhora social como a reforma educacional para reestruturar a sociedade, o
trabalho conta como uma análise das primeiras leis conhecidas pela humanidade,
passando pelas primeiras casas de detenção do país até chegar nos dias atuais.

Portanto, ao decorrer deste trabalho iremos abordar soluções cabíveis para


atenuar tal discrepância e precariedade. O trabalho está separado em temas sendo
eles: a evolução histórica dos sistemas carcerários, os regimes e suas
particularidades, o atual sistema carcerário brasileiro, o papel dos direitos humanos
no cárcere

O problema e a hipótese desse trabalho deverá ser apresentado


oportunamente. Em relação ao método, buscaremos testar aquele mais adequado
ao nosso projeto, sem perder de vista a importância do método quantitativo e
qualitativo.

Em se tratando da metodologia, o trabalho é respaldado pela obra de Michel


Foucault, Vigiar e Punir; a trilogia escrita pelo médico voluntário Dráuzio Varella:
Estação Carandiru, Prisioneiras e Carcereiros; Repressão e Controle Prisional no
Brasil: Prisões Comparadas, por Elizabeth Cancelli; O Direito Surgiu Antes da
Escrita, por Luís F.S. Reis, assim como doutrinas e jurisprudências a serem citadas
no decorrer do trabalho e tem como intuito uma crítica documental para com o atual
sistema. Apresenta-se, a seguir, a discussão a respeito do tema abordado na
revisão da literatura estudada.
12

2 A ORIGEM DA EXECUÇÃO PENAL

Neste capítulo abordaremos a origem da punição na humanidade como


sociedade, seus conceitos e técnicas desde a pré-história até a pena como
conhecemos atualmente em âmbito mundial e nacional ao abordarmos as
Constituições Federativas do Brasil e suas visões e princípios em relação à
execução penal e sua aplicabilidade.

Através dos séculos, é possível observar as diversas formas de punição


decretadas ao redor do mundo, desde as medievais às modernas todas tem um
objetivo em comum: a punição. E portanto, segundo Luís Fernando Scherma Reis
(2018), professor de História no magistério estadual do Rio de Janeiro, é plausível a
conclusão de que o Direito surgiu antes da escrita.

Entende-se que em algum momento durante a pré-história os humanos


começaram a se organizar em pequenos grupos ou clãs, de costumes nômades e
poucos recursos onde surgiram as primeiras organizações sociais da nossa espécie.
Para garantir sua sobrevivência e a dos seus, o homem teve que aprender a
cooperar e coexistir.

Reis (2018, p.4) afirma que “a noção de justiça surgiu da necessidade de


instaurar normas capazes não apenas de fixar os limites do uso da força e do
exercício do poder, como também de restabelecer o equilíbrio nas relações entre as
pessoas."

Assim, os povos ágrafos, aqueles que não possuíam acesso à escrita, que
surgiu apenas 4.000 a.C, possuíam quatro fontes das quais criavam suas leis, sendo
elas: os procedentes, os provérbios, os costumes e pôr fim a decisão do chefe. Tais
leis eram passadas de forma abstrata, através da fala era transmitido de geração
para geração com poucas adaptações. Com núcleo religioso as leis visavam a
perpetuação dos bandos e a proteção da família, que é a primeira instituição a ser
criada pelo ser humano.

Desta forma, é importante pontuar as características gerais dessas leis e seu


impacto nas sociedades em que eram inseridas, mas primeiro é preciso entender a
perspectiva de que para eles, a lei, a religião e a família se fundiam em um bem
jurídico que mantinha a sociedade organizada forma tal que seus direitos eram
intangíveis, vastos, pouco diversos, religiosos e hereditários. (REIS, 2018).

Segundo Reis, em se tratando de diplomacia, o Código Estela dos Abutres


de 2.450 a.C. é o mais antigo de que se tem registro, refere-se ao tratado firmado
entre Lagash e Umma visando a paz entre as civilizações. O segundo a se ter
registro foi oficializado pelo Rei Urukagina de Lagash em 2350 a C. que executou
13

uma reforma política com ideias mais igualitárias e libertárias entre seus cidadãos
independente de sua classe social.

O terceiro código sumário, denominado Código de Ur-Nammu (cerca de


2.040 a.C.) é, na verdade, uma compilação das leis sumárias que transformava
tradições em legislação e portanto foi base para o Código de Hamurábi.

Datado do século XVIII a.C. o código sumério do rei Hamurabi, mais


conhecido como Código de Hamurábi, este foi o primeiro código legislativo no
modelo em que conhecemos hoje, do qual se tem registro na história da
humanidade, inspirada na Lei do Talião e visava dar ao criminoso uma punição
diretamente relacionada com o crime cometido, popularmente conhecido pela
inscrição “olho por olho, dente por dente”. (BORGES.).

Do mesmo modo, por vontade da plebe durante a República Romana em


451 a.C. foram instituída a Lei das Doze Tábuas, que visava regulamentar o papel
de poder do pai sobre a família assim como a execução das penas em se tratando
dos julgamentos, condenações e a própria execução da lei penal em vigor.

A pena como conhecemos hoje descende da penitência como forma de


castigo, imposta aos clérigos e monges durante a Idade Média, que se recolhiam em
suas celas para que de forma silenciosa meditassem de forma que refletindo sobre
seus erros, voltassem à comunhão com Cristo e assim, podemos afirmar que a
ressocialização era o objetivo final de tal atividade, de forma a prevenir futuras
infrações no mosteiro (NASCIMENTO).

Mesmo com o intuito ressocializador ainda destinado apenas aos mosteiros


Júlio Fabbrini Mirabete comenta em seu “Manual de Direito Penal”:

Essa ideia inspirou a construção da primeira prisão destinada ao


recolhimento de criminosos, a House of Correction, construída em Londres
entre 1550 e 1552, difundindo-se de modo marcante no século XVIII
(Mirabete, 2004, p. 2 49)

Mundialmente, é necessário entender que a aplicação da pena como


conhecemos é consideravelmente recente, com cerca de 200 anos de história,
instauradas em 1821 com a Penitenciária da Filadélfia, antes disso existiam apenas
as casas de correção com instalações de aparência domiciliar (MEMÓRIAS DA
DITADURA).
14

2.1 AS CONSTITUIÇÕES FEDERATIVAS DO BRASIL

Em âmbito nacional a lei como a conhecemos chegou ao país com a


chegada dos colonizadores com as Ordenações Afonsinas até 1512, seguida das
Ordenações Manuelinas até 1569, logo substituída pelo Código de Dom Sebastião
em vigência até 1603 e em seguida as Ordenações Filipinas (RODRIGUES et. al.)

A Constituição Imperial de 1824, apoiada pelo partido português e decretada


por Dom Pedro I, contava com 179 artigos e enfatizava o Poder Moderador, que era
o poder do imperador do Brasil sobre o legislativo, executivo e judiciário.

A segunda constituição brasileira data de 1891 onde as mulheres


começaram a ter uma pequena parcela de participação política com o movimento
sufragista, além da exclusão do Poder Moderador, bem como a separação da Igreja
e do Estado (SENADO, 2015)

Assim, a Constituição de 1934 presidida por Getúlio Vargas traz o voto


secreto e obrigatório a todos os cidadãos brasileiros (incluindo mulheres) acima de
18 anos, como também um maior poder ao governo federal. Da mesma forma a
Constituição de 1937 conhecida como Estado Novo reflete uma influência fascista
imposta no país de forma que foi implementado a pena de morte, bem como prisão e
exílio aos opositores ao governo, que será abordada posteriormente.

Contudo, com a Constituição de 1946 houve o restabelecimento dos direitos


individuais, fim da tortura e da pena de morte, bem como devolveu a autonomia dos
poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Já a Constituição de 1967 trouxe ao Brasil a ditadura militar, onde o


Congresso Nacional se mantinha, porém com total corrupção do Legislativo,
conhecido pelo ato complementar AI - 5/68, onde foi então instaurada a fase de
maior rigor da ditadura com o fechamento do Congresso Nacional, onde havia a
censura aos meios de comunicação, proibição de reuniões de cunho político, a
suspensão de habeas corpus para crimes políticos bem como a autorização de
intervenção governamental em estados e municípios, que será abordada
posteriormente.

Por fim, a Constituição de 1988, conhecida como a Constituição Cidadã, foi


fundada a partir da convocação da Assembleia Nacional Constituinte para a
composição da nossa atual constituição, contando com ampliação das liberdades
civis e os direitos e garantias individuais e desde então consta com reformas para
sua atualização.
15

2.2 EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL

Em se tratando da origem da execução penal no Brasil, podemos observar


que possui CINCO datas que marcam historicamente o processo que nos levou à
atual vigente Lei de Execução Penal, levando em consideração não apenas a
aplicação como também a ressocialização. (OLIVEIRA, 2018).

A primeira tentativa de criação de um código e execução penal brasileira


veio por meio do jurista Cândido Mendes de Almeida, em 1933, que presidiu uma
comissão, dando ênfase para os psicopatas e usuários de drogas. Porém, quatro
anos após a comissão, em decorrência da criação do Estado Novo a pauta foi posta
de lado em decorrência da ditadura executada por Getúlio Vargas. (Memorial da
Democracia, 2015-2017).

Tal período teve a duração de 8 anos, sendo de 1937 à 1945, implementada


com apenas três anos após a vigência da constituição de 1934, abalando o país, de
forma que Atos Institucionais foram aplicados mudando completamente os regimes
penitenciários da época.

O mesmo veio a ocorrer em 1951 através do deputado Carvalho Neto, outra


tentativa foi feita, na produção de um projeto específico para a execução
penitenciária, porém tal projeto não se tornou lei.

Apenas em 2 de outubro de 1957 foi sancionada a Lei nº 3.274, abordando


as Normas Gerais do Regime Penitenciário (Planalto) que ao se mostrarem
insuficientes, foram reformuladas pelo professor Oscar Stevenson em um novo
projeto a pedido do ministro da justiça.

Contudo, inspirado na Resolução das Nações Unidas de 1953, Benjamim


Moraes Filho em colaboração de juristas apresentou em 1970 apresentou o projeto
no qual especificava as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos onde a
penitência do encarcerado era fortalecida por quatro pilares, sendo eles a
assistência, educação, trabalho e na disciplina (OLIVEIRA, 2018).

Novamente instaurada a ditadura por 21 anos, de 1964-1985, os projetos e


proteções em vigor foram substituídas pelo Atos Institucionais que serão
propriamente abordados no decorrer do presente trabalho.

Por fim, em 1983 o projeto de lei que viria a ser a LEP foi aprovado,
sancionando a Lei de Execução Penal: Lei nº 7.210 de 11 de Julho de 1984, que em
seu artigo 1º traz o propósito do projeto, sendo: “A execução penal tem por objetivo
efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições
para a harmônica integração social do condenado e do internado” (BRASIL, 1984).
16

É importante salientar que tal projeto dispõe de um fim social com exigência
do bem comum, ou seja, foi criado com um propósito de recuperação do
encarcerado, visando o bem maior da sociedade como um todo de forma coletiva,
fazendo jus ao caráter ressocializador das penas de detenção em vigor.

Desta forma, se cumprida regularmente tal lei proporciona ao detento a


oportunidade de cumprir sua pena de forma digna, respeitando seus direitos
humanos, com respeito a sua integridade física e moral assegurados pela
constituição em seu artigo 5º, inciso XLIX (BRASIL, 1988).
17

3 A EVOLUÇÃO DAS PENAS NO BRASIL

Neste capítulo abordaremos a evolução das penas após a criação da


primeira penitenciária do Brasil, de modo a abordar os sistemas adotados em
território nacional para com a aplicabilidade da pena e os pensamentos, teses e
pareceres da época, evidenciando sua constante evolução como sociedade. Assim,
o presente trabalho visa analisar brevemente a evolução das penas ao redor do
mundo e como o Brasil influenciou e foi influenciado no avanço do sistema
carcerário.

Portanto, para analisarmos os sistemas carcerários é crucial levarmos em


consideração que a forma punitiva empregada atualmente foi moldada a partir do
século XVIII mundialmente, mas no Brasil, até meados do século XIX as casas de
detenção e penitenciárias eram usadas apenas como forma de exílio para
delinquentes, recolhendo-os das ruas, numa espécie de “limpeza” na sociedade e
para tanto a educação e o trabalho não eram impostos a fim de prevenir a
reincidência como se entende atualmente. (NASCIMENTO)

Segundo o filósofo Michel Foucault (2018, p. 32):

(...)Pensava- se que somente a detenção proporcionaria a transformação


aos indivíduos enclausurados. A ideia era que estes refizessem suas
existências dentro da prisão para depois serem levados de volta à
sociedade. Entretanto, percebeu- se o fracasso desse objetivo. Os índices
de criminalidade e reincidência dos crimes não diminuíram e os presos em
sua maioria não se transformaram. A prisão e a prisionização mostram-se
em sua realidade e em seus efeitos visíveis denunciados como um ‘grande
fracasso da justiça penal’.

Assim, entendeu-se que não é através da punição física e rude que se


alcança o bem maior da sociedade, de modo que se provou ineficaz é necessário
encontrar formas para integral recuperação do preso para que gere uma gradativa
melhoria da sociedade como um todo.

Veremos na imagem a seguir o método criado por Michel Foucault em seu


livro Vigiar e Punir, como vigiando sem ser visto e analisando os presos é possível
punir de forma a transformar o encarcerado, de modo a repelir a reincidência
promovendo uma mudança profunda no indivíduo.
18
19

Figura 1 - Um detento, em sua cela,

Rezando diante da torre central de vigilância.

N. Harou-Romain. Projeto de penitenciária, 1840. V. p. 222

Fonte: <arquitextos 059.11: Arquitetura penitenciária: a evolução do espaço inimigo>

3.1 ORDENAÇÕES FILIPINAS


20

Inicialmente o Brasil tinha como orientação para a execução penal o livro V


das Ordenações Filipinas, resultado da reforma do Código Manuelino feito durante o
período da União Ibérica por Felipe II da Espanha (Felipe I de Portugal), onde
continuou vigente em Portugal ao final da União e consequentemente vigorou no
Brasil até 1830. (SENADO FEDERAL).

Onde segundo Arnaldo Sampaio de Morais Godoy (2017), é necessário ao


analisar as Ordenações se atentar à sua violência contra as mulheres e relação as
penas aplicadas a elas na época, desde únicas culpadas de envolvimento com
membros do clero à existência de uma espécie de manual de normas rigorosas que
ditava como uma “mulher de bem” deveria se portar.

Vigorando desde 1603 até 1830, as Ordenações Filipinas impunham à


população brasileira e sobretudo aos escravos um extremo rigor em suas punições
para com os infratores e portanto, mantinham o poder estabelecido de forma clara e
direta (Mihowsk).

Figura 2 - O Poder Punitivo no Brasil

Fonte: <Das Ordenações Filipinas ao Código Criminal de 1830>


21

Figura 3 - A Última Pena de Morte no Brasil (parte 2) - Galés Perpétua

Fonte: <A ÚLTIMA PENA DE MORTE NO BRASIL (PARTE 2) - Galés perpétuas>

Assim, em seu livro V continham as seguintes penalidades:

(…) morte natural, morte natural com crueldade, morte pelo fogo até ser
feito o condenado em pó para que não tivesse sepultura ou memória,
açoites, com ou sem baraço, pregão pela cidade e vila, degredo para galés,
África, Índia, Brasil ou, ainda Costa do Marfim, para fora do reino ou para
vila do bispado, mutilações ou cortes das mãos, da língua, queimadura com
tenazes ardentes, confisco, multa, capela de chifres na cabeça (para os
maridos que condescendiam), polaina ou enxaravia na cabeça.

Portanto, é entendido que as prisões até então eram provisórias, instalações


onde o acusado aguardava julgamento em uma célula individual, afastada do
convívio humano tanto interno como externo de grande influência teológica para a
22

recuperação do preso, o que justificava seu isolamento, de forma que não


escapasse e cumprisse sua penitência supracitada. Desta forma é preciso entender
que o Rei e o Império necessitavam impor a ordem o sobretudo o respeito à Coroa,
e portanto, com o poder concentrado de tal forma que se exigia punições de máximo
rigor para exercerem assim o controle populacional, a escravidão e a soberania da
Igreja Católica (Mihowsk).

Desta forma, segundo Ricardo Figueiredo:

Havia pena de morte para os livres que cometiam homicídio, mas para eles
a legislação continuou como antes, com alternativas à forca. O
endurecimento afetou só os cativos. De 1835 em diante, escravo condenado
era escravo enforcado: “lance-se logo a corda e pendure-se o réu”.

Em se tratando do poder punitivo do Brasil é notável de forma que a


humanidade era negada a grande parcela da sociedade (os escravos), o que
segundo o filósofo Manuel Barros de Motta gerava grande tensão e, quando a
repressão já se mostrava ineficiente, assim em 1830 com o Império em crise, sob
ameaça de fragmentação e com as revoltas regenciais, foi necessário adotar um
conceito mais humanizado, visando assim a correção dos encarcerados ao invés da
pura punição física, muitas vezes custando a vida do infrator, para evitar uma revolta
dos escravos da época.

Por fim, Migowski (2018), historiador e filósofo, relata o real propósito da


criação das casas de prisão, trabalho e correção:

Em suma, a prisão era povoada por homens negros em quase sua


totalidade. O que nos leva a conclusão de que esse modelo servia para o
controle da escravidão e, principalmente, para disciplinar os negros libertos,
que não estavam mais sob a tutela de um senhor.
23

3.2 CASAS DE PRISÃO, TRABALHO E CORREÇÃO

Portanto, com o Código Penal Brasileiro de 1830 surgiu a primeira prisão do


país, onde foi-se entendido que as penalidades para os delitos cometidos em âmbito
nacional deveriam possuir núcleo racional, de forma unificada em todo território
brasileiro, proporcionando inclusive um propósito de recuperação.

Contudo, é preciso se atentar ao fato de que havia um propósito oculto no


discurso de que casas penitenciárias poderiam resolver problemas ou até mesmo
transformar o indivíduo, na época os valores da família e moral se encontravam
ameaçados e portanto a criação das prisões como conhecemos hoje é fruto de uma
tentativa elitizada de controle social “cujo comportamento ameaçava as formas
tradicionais de vida em sociedade.” como é descrito no artigo Memórias da Ditadura.

Da mesma forma, países como Estados Unidos e Irlanda inauguraram suas


casas penitenciárias em moldes similares, e assim o Brasil, após mandar
representantes para visitação, adotou tais estilos de execução penal e em 6 de julho
de 1850 inaugurou a Casa de Correção do Rio de Janeiro ou Casa de Correção da
Corte (CCRJ) pelo Decreto Nº 678, mantendo um nome antigo em um novo modelo
de execução mostra essa mistura de antigo com novo, que moldará o sistema
carcerário do país através dos séculos e sendo conceituada como uma das “obras
mais úteis e necessárias ao País pela influência do sistema penitenciário sobre os
hábitos e a moral dos presos” (BRASIL, 1836, p. 28).

De forma muito precária, a partir da Constituição do Império do Brasil de


1824 (art. 179 parágrafo 21), os açoites e punições físicas foram cessadas, era
necessário fornecer estabelecimentos limpos e arejados, com alas para tipificação
de seus crimes e em 1928 a Lei Imperial exigiu as vistorias nas prisões com seu
primeiro relatório publicado no ano seguinte, já relatava problemas que persistem
ainda nos dias atuais, tais como coexistência de condenados com aqueles em prisão
preventiva, bem como problemas de convivência e é claro, falta de espaço
adequado (PAULA, FERREIRA, SILVA E OLIVEIRA, 2019).

Desta forma, o estilo positivista da época era, pela primeira vez no país,
respaldado pela ciência, seguindo análise médica do século XIX que mostravam em
teses e pareceres como o trabalho braçal obrigatório se mostrava meio de
recuperação de detentos além de ocupação para ociosidade, prevenindo assim atos
ilícitos, de modo a criticar os estabelecimentos pré-existentes devido à suas
instalações insalubres onde Machado et al.,1978 definem:

(...)Mais uma vez a localização espalha as doenças cultivadas pelo ar úmido


e sem circulação e pela falta de sol por toda a cidade, que se está ao seu
redor. A prisão como lugar de recuperação é invenção da década de 30 do
século XIX. Aplicando-se na Casa de Correção da Corte o princípio do
Panopticon, de Bentham. O que nós vimos no texto do Foucault. Essa nova
24

visão do tratamento em lugar da punição está intimamente ligada com a


concepção de crime como doença moral. Um doente deve ser tratado, e não
punido.

(MACHADO et al., 1978, p. 318-9).

Figura 4 - Vista interna da penitenciária de Stateville, Illinois, EUA.

Fonte: <Panóptico e poder disciplinar>

Promulgado em 16 de dezembro de 1830, o Código Criminal do Império do


Brasil onde passou a impor o trabalho forçado como forma de penitência aos
detentos, onde Tinôco (2003) analisa as penitências da seguinte forma:

Entre as penas, encontra-se a de morte pela forca; a pena mais grave, entre
as que consistem na privação da liberdade, é a de galés, que consiste no
trabalho forçado, levando os condenados calcetas aos pés e corrente de
ferro, juntos ou separados (art. 44.)

Assim, através do Ato Adicional também conhecido como lei n. 16, de 12 de


agosto de 1834 criou-se as Casas de Prisão, Trabalho e Correção, regido e
organizado pelas Assembleias Legislativas Provinciais (art. 10) bem como no
Município Neutro da Corte pela Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça. Tal
decisão foi fortemente aprovada pela Sociedade Defensora da Independência e
25

Liberdade Nacional (1831-1835), com o intuito de ressocialização, onde detentos


“perdidos na ociosidade e no deboche em cidadãos industriosos, de bons costumes
e úteis à pátria” (O Homem e a América, 14 de janeiro de 1832), dando assim origem
a Casa de Correção do Rio de Janeiro (PESSOA).
Assim, após vistoria médica para avaliação da viabilidade do terreno, a
planta do edifício foi baseada na tese da Sociedade Inglesa para o Melhoramento
das Prisões (MORAES, 1923, p. 12) que disponibilizara o modelo Panóptico, circular
que permitia “ver tudo, saber tudo e cuidar de tudo” segundo o Relatório da
Comissão Inspetora da Casa de Correção da Corte (BRASIL, 1874, p. A-209)
Para Foucault (2018, p.242), "É preciso que o prisioneiro possa ser mantido
sob um olhar permanente; é preciso que sejam registradas e contabilizadas todas as
anotações que se possa tomar sobre eles.” Para maior compreensão, imagem
ilustrativa do modelo:

Figura 5 - Planta da casa de correção do Rio de Janeiro, 1834


(Arquivo Nacional, Rio de Janeiro)

Alberto Sousa e Antônio Francisco de Oliveira

Fonte: https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/16.187/5888

Desta forma, em 1849 com apenas uma ala concluída para habitação, o
primeiro raio contava com duzentas celas para isolamento noturno e oficinas, iniciou-
se o recolhimentos daqueles sentenciados à pena de trabalho forçado. No ano
seguinte, 1850, o regulamento foi publicado, regulamentando metade do primeiro
raio, que viria a ser concluído apenas em 1852, a Casa de Correção foi inaugurada
com cem celas, abrigando 60 presidiários que cumpriam suas penas como
26

sapateiros, alfaiates, marceneiros e carpinteiros. Assim, seis anos após sua


inauguração, em 1856 a Casa de Detenção foi inaugurada na primeira ala da Casa
de Prisão, Correção e Trabalho para aqueles que cumpriam prisão preventiva ou
detenções curtas.

Regido pelos artigos art. 32 e art. 88 do decreto n. 678, de 6 de julho de


1850, o sistema imposto adotou o modelo auburniano para a organização do
trabalho, de modo que o próprio preso arcasse com suas despesas mensais e as da
instituição e portanto, escolhendo oficinas mais rentáveis.

Definido pelo Código Penal de 1830, àqueles que pagavam por seus delitos
com o trabalho forçado eram classificadas em categorias, sendo elas a correcional e
a criminal, sendo a correcional subdividida em duas classes: uma com os menores
de 14 anos que cometeram pequenos delitos segundo o artigo 13, CP de 1830, e na
segunda os vadios e mendigos que chegava a cumprir pena de 8 à 24 horas ou
detidos para cumprimento de crimes simples segundo os artigo 295 e 296 do CP de
1830 e aqueles categorizados criminal cumpriam a pena em trabalho forçado.

Para impor a disciplina entre os encarcerados, foi necessário do


regulamento de 1850 estabelecer normas e padrões com horários a serem
cumpridos rigorosamente. Com turma de no máximo 20 detentos, o serviço era
interrompido para o almoço e jantar, cessando antes da ceia. O trabalho era
executado de modo silencioso, onde a permissão para falar só era dada para tirar
dúvidas sobre a execução do serviço ou a pedido de algum material para a
execução do mesmo, quem infringir a regra era punido com castigos disciplinares
estabelecidos no código sendo eles a restrição alimentar ou trabalho solitário e ainda
o jejum e a cela escura (PESSOA).

Por fim, a rentabilidade do projeto não se provou verdadeira, necessitando


assim de uma comissão de inquérito para averiguar o real estado financeiro da
instituição. Ocorre que a maior parte dos lucros vinham de outros serviços, sendo
eles o Instituto de Menores Artesãos (decreto n. 2.745 de 13 de fevereiro de 1861), o
depósito de africanos livres e para escravos, denominada prisão no Calabouço.

Assim, uma Comissão Inspetora foi formada, para analisar a instituição e


propor melhorias, respaldadas pelo art. 109, decreto n. 678, de 6 de julho de 1850,
que em 1874 afirmou através de um relatório sobre as dificuldades da manutenção
do modelo auburniano em detrimento da dificuldade de estabelecer aos penitentes o
trabalho silencioso bem como a disfuncionalidade arquitetônica do edifício.

Por fim, com o decreto n. 8.386, de 14 de janeiro de 1882, a Casa de


Correção recebeu o último regulamento imperial em que mantinha o modelo
auburniano, com a mudança da renda do trabalho forçado ser revertida para os
cofres públicos e o orçamento necessário para manutenção do edifício ficou por
conta do Poder Legislativo.
27
28
29

7
30

3.3 CARANDIRU: UMA PENITENCIÁRIA MODELO

Figura 6 - Acredite, esta é uma das imagens mais leves sobre o massacre

Fonte: <Massacre do Carandiru segue e seguirá impune>

Figura 7 - A reportagem é da revista Veja, na edição de 5 de abril:


31

Fonte: <http://tecnew-juli.blogspot.com/2013/04/massacre-do-carandiru-segue-e-seguira.html>

Figura 8 - A reportagem é da revista Veja, na edição de 5 de abril:


32

3.4 A INTERFERÊNCIA DITATORIAL NO CÁRCERE

Primeiramente é necessário compreender que a democracia brasileira


apresenta fragilidade se nos atentarmos ao fato de ter sofrido 29 anos de ditadura
sendo o primeiro golpe com duração de 8 anos (1937-1945) e o segundo de 21 anos
(1961-1985) em apenas 130 anos de República.

Por ser considerado um país novo em comparação aos demais, o Brasil foi o
país que mais escravizou, com estimativa de 4,86 milhões de escravos traficados
entre 1501 a 1900, como foi levantado pelo Banco de Dados do Comércio
Transatlântico de Escravos (FIGUEIREDO).

E assim sendo, tal histórico escravista deixa marcas, que inevitavelmente


refletem no âmbito social, político e econômico da nação, de forma que a
combinação do racismo estrutural e o poder da burguesia criassem o Coronelismo
para que mesmo com a mudança de Império para República, os interesses da elite
brasileira fossem a prioridade do governo.

Portanto, com o início da democracia, instaurou-se o “voto de cabresto” ou


“voto em aberto”, comumente conhecido como Coronelismo, contava com a força
bruta dos coronéis que forçavam a população local a elegerem seus apadrinhados,
que nada mais é do que a compra de votos dos eleitores humildes feitas através de
violência física, psicológica, coerção, além da compra de votos, uso de “votos
fantasma” fraudando o sistema para que analfabetos (maioria da população na
época) e menores pudessem votar e sob até mesmo, pena de morte para aqueles
que se opusessem e ainda o sequestro das urnas para alterar o resultado a mando
dos coronéis.

Desta forma, é possível compreender que se trata do Segundo Período da


República Velha (1824-1930) comumente conhecido como “Política do Café com
Leite” ou “República das Oligarquias” onde se estabeleceu uma forte aliança entre
os cafeicultores de São Paulo e os fazendeiros de Minas Gerais que se revezaram
na presidência do país por 106 anos. (TODA MATÉRIA)

O sistema eleitoral da época era falho e funcionava de modo que o eleitor


deveria colocar um pedaço de papel com o nome de seu candidato escolhido escrito
a punho em um saco de pano, contudo, é necessário compreender que a maioria da
população era analfabeta e fortemente influenciada. Tal regime era possibilitado pelo
fato do voto ser aberto e portanto só acabou por conta da Revolução de 1930 com
Getúlio Dornelles Vargas como Presidente da República em seu Governo Provisório
(1930-1934), ao implementar o voto secreto em todo território nacional. (TODA
MATÉRIA).
33

Logo após o término do Governo Provisório e inspirado nos regimes fascista


e nazista, o Estado Novo se instaurou em todo o território brasileiro em 10 de
novembro de 1937, através de um comunicado radialistico pelo programa de rádio
Hora do Brasil através de um discurso de Vargas. (FERNANDES)

Desta forma, juntamente com Plínio Salgado, foi instaurado em 1937 o


movimento político Ação Integralista Brasileira (AIB) que inspirado no fascismo
italiano tinha o lema” Deus, pátria e família” que visava não só a aniquilação do
comunismo no país como também o fim de políticas liberalistas. Em resposta, o
movimento comunista no país fundou a Aliança Nacional Libertadora (ANL) que
visava o poder do proletariado de forma a combater o regime.

Aqui podemos observar o uso de propagação de notícia falsa (fake News),


como meio de controle governamental onde o Estado, se utilizando de um suposto
plano de golpe comunista, Plano Cohen, Vargas dissolve o Poder Legislativo e
consequentemente a Constituição de 1934, instaurando assim a terceira fase de sua
era no poder, intitulado de Estado Novo.

Criando a quarta Constituição Federal, em 1937 Vargas buscou inspiração


Polonesa e portanto conhecida como “Polaca”, a censura foi implementada na
criação do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP).

Cancelli (2005, p.142) define o regime penal da Era Vargas como:

(...)Pelo Código Penal em vigência no país naquela época, embora a orientação do sistema
prisional tenha sido a da “regeneração”, tanto o Carandiru quanto as demais
prisões brasileiras perfaziam um quadro bastante controverso sob o ponto
de vista do tratamento dispensado aos presos.

Portanto, é possível observar que o Estado Novo trouxe consigo o poder da


polícia soberana em relação ao poder judiciário de forma que não só os presos
comuns eram colocados nessas instalações como também os presos políticos, crime
inafiançável, que ameaçava a democracia do país.

Desta forma apresentava contraste entre instalações fundada com os


princípios da Faculdade Positiva de Direito, com sistema celular, limpeza,
organização, condições melhores de habitação com relação a violência policial e sua
brutalidade na aplicação de tortura e até mesmo assassinato de não só presos
políticos mas esses em ênfase, como exemplo do que acontecia com aqueles que
se rebelassem contra o governo vigente.

Em se tratando dos presos com condenação formal na Justiça, em 1934 se


contabilizava em todo território nacional 6.212 de 46.228.607 habitantes, tal número
34

subiu drasticamente com o início das prisões políticas, onde apenas levando em
consideração a cidade de São Paulo, por exemplo, já em 1939 48.742 pessoas
foram encarceradas para averiguação sobre as alegações de: alcoolismo em 33%,
desordem 21%, além de ócio, desobediência, escândalo, agressão, insultos, jogo e
a ordem de autoridades concentrados em 1% cada, todos sob a justificativa de
atentados contra o regime vigente (CALCELLI).

Em se tratando da capital da República, Rio de Janeiro, podemos afirmar


que a situação se agrava nas dependências penitenciárias, sendo elas a Casa de
Correção, a Casa de Detenção e a Colônia Correcional de Dois Rios, sob jurisdição
da Polícia do Distrito Federal. Se antes da instauração do Estado Novo as condições
dos estabelecimentos carcerários do país já eram alarmantes, em 1933 a repressão
política atenuou a superlotação com a facilidade com que prendiam e sob quais
acusações.

Figura 9 - Presidio Ilha Grande - Colônia Dois Rios


35

Figura 10 - Presidio Ilha Grande - Colônia Dois Rios

Fonte: <História da antiga Colônia Penal Cândido Mendes na Ilha Grande, RJ -Fotos, Vídeo>

Segundo o diretor da Casa de Detenção, Floriano Reis, em 1933 o


estabelecimento penal contava com 917 detentos, com capacidade para apenas
450, de forma que destes apenas 560 respondiam processo transitado em julgado,
162 em disposição da Casa de Correção, 95 em disposição do chefe de polícia, para
ordem e segurança pública e 40 como comunistas declarados (CANCELLI). De
acordo com as pesquisas do Conselho Penitenciário em janeiro de 1934 o
estabelecimento contava com 932 detentos, em fevereiro do mesmo ano o número
havia subido para 968.

Em março, o relatório por sua vez mostrava as reais condições de habitação


dos presos das celas da segunda galeria, contando com em média 27 homens em
celas pequenas (5mx5m) com um único sanitário, com a possibilidade de tomar
banho apenas uma vez na semana, seminus, sem camas, os detentos cumpriam
suas penas se forma ociosa numa instalação de quarenta anos, que desde sua
instalação não recebia reparos ou reformas.
36

Tal situação se agravou com o ataque comunista de 1935, gerando um pico


de encarceramento em massa de modo que em novembro de 1935 a Casa de
Detenção já contava com 911 detentos e no mês seguinte a população carcerária
subiu para 1.480, com acomodações de 50 a 60 detentos por cela, com
revezamento para o sono (Conselho Penitenciário).

Assim, o mesmo nível de tratamento era submetido aos detentos que


habitavam as celas da Colônia Correcional Dois Rios que passou de 150 detentos
em 1934 para 1.220 detentos em 1937, contagem feita pelo chefe de polícia
Graciliano Ramos, segundo o próprio “haveria em torno de novecentos homens
presos e semivestidos, amontoados em locais cujas condições eram mais próximas
a um campo de extermínio lento do que a uma colônia agrícola.”, tal ambiente
inóspito e insalubre, onde segundo Graciliano a área onde se submetiam os doentes
era:
A direita, perto da entrada, alojavam-se as criaturas mais doentes. Em cima de uma tábua
um preto novo gemia e arquejava, pedindo uma injeção de morfina. Perto da
grade que dava para o curral um homem pálido e magro se consumia
despejando hemoptises em duas bandas de lençol presas entre as coxas.
Esses pedaços de pano agitavam-se como asas feridas; a criatura enxágue
suava, fechava e abria a boca, sem fôlego; a esteira da cama estava
coberta com manchas vermelhas (...) Neves, pelos modos, era dessas
criaturas ressentidas. No pavilhão vivia à parte. E agora se desfazia nos
dois pedaços de lençol, na esteira amarrada com barbante Nenhuma
queixa. O suor ocorria nos sulcos da pele cor de enxofre, os bugalhos
sumiam-se nas órbitas profundas e carreira estava tão visível como se
expusesse um ossuário. Dentre em pouco Neves iria ser enterrado ao pé do
morro, a família o procuraria em vão – ninguém se lembraria de existência
dele. (RAMOS, op. cit., v. 2, p. 83-84.)

Desta forma, com a abordagem policial sendo o encarceramento em massa,


de acordo com o Conselho Penitenciário, na cidade de São Paulo em 1939 as
vítimas encarceradas em razão de detenção policial e correcional resultou no
montante de 46.336 detentos em 1938, 48.742 detentos em 1939, 48.361 detentos
em 1940, 45.786 detentos em 1941 e 47.789 detentos em 1942, segundo a
Estatística Criminal do Estado de São Paulo (ESTADO DE SÃO PAULO).

Por fim, mesmo com a ditadura abolida do em 31 de março de 1821 em todo


território nacional com o fim da Inquisição, estima-se que nos 15 anos de Era Vargas
tenha sido usada em 10 mil presos políticos, o número exato é desconhecido visto
que Filinto Muller e seus colaboradores endossaram a queima de documentos ao
deixarem seus cargos no governo em 1942.

Mostrando assim o encarceramento em massa que ocorreu entre 1937 e


1945, que cessou apenas com a união do Brasil com os Aliados para derrotar o
fascismo na Europa, que mostrou uma contrariedade e inconstância no governo
37

Vargas, que portanto foi deposto oito anos após o golpe pelos militares que o
ajudaram a fazê-lo através de mais um golpe organizado pela União Democrática
Nacional (UDN) em 1945. (POLITIZE)

Ditadura 1964-1985

Portanto, o presente trabalho necessita especial análise para o período


ditatorial imposto pelo Regime Militar, que assim como o Estado Novo supracitado,
veio como meio de controle social e governamental vigente por 21 anos no Brasil, de
1964 a 1985.

Em retrospectiva João Belchior Marques Goulart foi herdeiro político de


Getúlio Vargas, em 1947 foi deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores do
Brasil (PDT), em 1953 se tornou Ministro do Trabalho, ambos sob a presidência de
Vargas, em 1955 elegeu-se Vice Presidente da República sob o mandato de
Juscelino Kubitschek, em 1961 foi Vice Presidente da República sob o mandato de
Jânio Quadros, que alegou perseguição política e renunciou em 25 de agosto 1961,
e militares tentaram impedir a posse do Vice Presidente, mas em 29 de agosto do
mesmo ano o Congresso Nacional vetou o pedido de impedimento de sua posse,
que foi feito sob a alegação de instabilidade das instituições do país, fazendo assim
com que Goulart assumisse a Presidência da República em 7 de setembro de 1961
(RODRIGUES).

Com um mandato parlamentarista pela primeira vez em vigor no Brasil


República, feito para diminuir os encargos do Presidente onde o gabinete ministerial
tinha mais atribuições que Goulart, presidido por Tancredo Neves e posteriormente
por Brochado da Rocha que se encerrou em 6 de janeiro de 1963, fazendo com que
o Regime Presidencialista fosse retomado.

Neste momento, é possível analisar a tensão entre o governo de Getúlio que


possuída influências comunistas e a extrema direita do país, por conta disso o
Presidente em questão buscou apoio da esquerda, convocando um novo ministério
para elaborar um plano econômico visando a diminuição da inflação, criando-se
assim o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico, comandado por San Tiago
Dantas e Celso Furtado, que fracassou devido a atritos de Getúlio e o Poder
Executivo.
38

Contudo, Goulart seguiu em diante com os planos do governo de Vargas,


com propostas de reforma de base nas áreas: agrária, bancária, fiscal, universitária,
urbana e a administrativa em busca de uma maior equidade entre a população e
portanto, no mês de março de 1964 foi articulado um plano pelo General Arthur da
Costa e Silva junto, General Castelo Branco e General Cordeiro Farias para tirar
Goulart do poder visto que a direita interpreta tais propostas como ameaça à
segurança nacional e a ordem, de modo que em 1º de abril de 1964 foi dado o golpe
que implantou o regime militar.(RODRIGUES).

Contando com 17 Atos Institucionais, a Ditadura Militar implementou tais


atos como forma de controle que tinham como objetivo proteger o país da invasão
comunista que se acreditava infiltrada no governo.

Desta forma, um exemplo claro do intuito dos atos se encontra no Ato


Institucional 5 (AI-5), aprovado em 1968, que paralisou o poder legislativo com o
fechamento do Congresso Nacional, bem como das assembleias legislativas dos
estado, “permitiu a cassação de mais 170 mantados legislativos, instituiu a censura
prévia da imprensa e de produções artísticas e deu ao presidente a possibilidade de
intervenção nos estados e municípios.” (SUNDRÉ, 2019).

Assim, é de suma importância salientar que o AI-5 tornou ilegal as reuniões


políticas não fossem autorizadas pela política e portanto, toda e qualquer
manifestação que infringisse o Ato Institucional era interpretado como atividade de
viés comunista e como tal era combatida pelas forças policiais, por meio de prisões,
torturas, assassinatos em uma completa violação dos Direitos Humanos.

Para maior compreensão de tal período sombrio de nossa nação, Anivaldo


Padilha, militante da Ação Popular (AP), detido em 1970 na Operação Bandeirantes
(OBAN) que visava caçar e combater organizações que se opunham ao regime
militar em São Paulo. Padilha passou os três primeiros meses no DOI-CODI dos dez
que cumpriu em cárcere. E como sobrevivente depõe:

Eu comecei a ser torturado no momento em que cheguei lá. O capitão Albernaz, que já era
conhecido como um dos piores carrascos do DOI-CODI, me disse: 'Começa
a falar porque a guerra acabou pra você. Se não falar o que sabe, vai virar
presunto.’ Esse era o termo que usavam no esquadrão da morte para os
cadáveres que ‘surgiam’, que eram encontrados nos terrenos baldios de
São Paulo, assassinados pela polícia. (SANDRÉ)

Portanto, é necessário compreender que antes da ditadura militar se


instaurar no Brasil, o país contava com poucas unidades de penitenciárias e casas
de detenção, e que tinham como princípio a privação da liberdade do indivíduo
infrator.
39

Logo após a implementação do Estado Novo, tais ambientes se tornaram


sede de organizações de interrogatório de presos políticos, considerados
comunistas, com uso de tortura e assassinato, para eliminação de opositores e
“subversivos” que representavam uma ameaça, de forma sistemática, cotidiana,
como um procedimento de praxe para aqueles que passavam pelo sistema
carcerário, sobretudo supervisionado e endossado pelo Estado, funcionando como
uma espécie de assinatura do regime vigente (MEMÓRIAS DA DITADURA).

O propósito era claro, controlar a população através do medo e repressão,


de modo a eliminar da sociedade os indivíduos que discordassem do regime ou
representassem uma ameaça de forma direta ou indireta. Um claro exemplo se
encontra na cidade de São Paulo nos anos de 1970, onde liderado pelo delegado
Fleury, o “Esquadrão da Morte” era responsável por torturar e matar presos políticos
que desafiavam o regime, bem como outros detentos que era executados belo “bem
dos negócios” (MEMÓRIAS DA DITADURA).

Pois “uma ditadura é o ápice de um caráter autoritário de um governo”


(MILARÉ) tal ambiente hostil foi chegando ao fim em 1974 com uma volta “lenta,
gradual e segura” à democracia, endossada pelo movimento “Diretas Já”, onde civis
faziam protestos demandando eleições diretas para eleger o Presidente da
República de forma democrática contando com a participação de mentes influentes
da época, bem como partidos políticos, representantes da sociedade civil, artistas e
intelectuais. (BEZERRA).

Portanto, em 1983 o deputado Dante de Oliveira apresentou uma emenda


constitucional que propunha o fim do Colégio Eleitoral, onde os membros do Poder
Legislativo federal, e facultativamente estadual, votam e elegem o Presidente da
República bem como governadores, perpetuando assim a ditadura.

Tal proposta foi o estopim para as manifestações em todo território nacional,


chegando a contabilizar 200 mil pessoas em 25 de janeiro na Praça da Sé-SP, com
a presença das principais lideranças em favor do movimento, como Leonel Brizola,
governador do Estado do Rio de Janeiro (PDT-RJ), Ulisses Guimarães, Luiz Inácio
Lula da Silva, bem como atores e músicos, dentre eles Chico Buarque, Milton
Nascimento e Fernanda Montenegro. (NUZZI)

A partir deste evento as manifestações se expandiram de forma que em


fevereiro de 1984 foi instaurado na Praça da Sé o "Placar das Diretas" que
contabilizava os congressistas que estava a favor da mudança de regime, bem como
foi montada uma caravana para o Congresso, a “Marcha para Brasília” a fim de ver
de perto os resultados e assim em 25 de maio do mesmo ano, a emenda do
deputado Oliveira foi à votação, mas acabou vetada e com sua derrota foi-se
negociado o fim da ditadura com a nomeação de Tancredo Neves para concorrer à
eleição indireta concorrendo contra Paulo Maluf, que ocorreu em 1985 marcando o
fim da ditadura militar com a posse de Neves .(BEZERRA)
40

Figura 11 - Placar das Diretas, 1984

Miguel Chikaoka

Fonte: <Placar das Diretas>


41
42

4 O ATUAL SISTEMA CARCERÁRIO DO BRASIL


43

4.1 SISTEMA PROGRESSIVO

Neste capítulo abordaremos os impactos do sistema progressivo

https://www.politize.com.br/regimes-prisionais-os-3-tipos/

No Brasil, o Sistema Penitenciário utilizado assume a progressividade


da execução da pena. Essa progressividade foi sancionada pelo Código Penal
de 1940, juntamente com suas consideráveis modificações, sendo essa
maneira verificada através de critérios subjetivos e objetivos. (machado P. 05)
file:///C:/Users/amand/Downloads/1835-6831-1-PB.pdf
44

4.2 OS TRÊS REGIMES


45
46

5 A VISÃO SOCIOLÓGICA DO PODER PUNITIVO DO ESTADO

Neste capítulo abordaremos a visão sociológica do poder punitivo do Estado


de forma a salientar a seletividade penal.

Socialmente temos a ideologia de que as pessoas que se encontram presas


são loucas, extremamente perigosas e incuráveis, impossíveis de evitar a
reincidência. Esta visão foi criada e solidificando através dos séculos, dentre eles a
teoria das característica de um criminoso segundo Cesare Lombroso (1876), que
nada mais é do que presumir que um indivíduo comete um crime simplesmente por
suas características físicas e trejeitos, como está elaborado em seu livro “O Homem
Delinquente”.

Figura 12 - Cesare Lombroso e sua Classificação dos Criminosos

Fonte: <Cesare Lombroso e sua classificação dos criminosos>


47

Figura 13 - Cesare Lombroso e a Teoria do Criminoso Nato

Por Bianca da Silva Fernandes

Fonte: <Cesare Lombroso e a teoria do criminoso nato>

Tal teoria está extremamente ligada ao racismo entre outros preconceitos e


não possui embasamento científico, um exemplo do extremo racismo que esta teoria
dispõe é de que quando tentamos imaginar como fisicamente um criminoso seria,
dificilmente imaginamos um homem branco de terno, diretor executivo de alguma
empresa que sonega impostos, ou em um colega de faculdade que vende drogas,
geralmente imaginamos um homem alto, forte, negro, com roupas largas, portando
uma faca ou arma, sempre à espreita em busca de roubar ou furtar. Esse
pensamento ou algo similar é extremamente comum entre os brasileiros.

Esta é uma forma de seletividade penal que abordaremos oportunamente,


um exemplo claro é que uma parcela significativa da população carcerária se
encontra presa por intermédio de prisão preventiva onde muitos deles nem ao
menos obtém seguimento no julgamento e quando finalmente sai o veredicto, o
detento já cumpriu mais tempo no cárcere em prisão preventiva do que a sua própria
pena. Isso mostra como independente do fato, pelas características físicas, trejeitos
ou bairro onde a pessoa reside ela pode ser considerada extremamente nociva para
a sociedade, sem levar em conta o delito cometido.

O presente trabalho visa pontuar que como brasileiros temos a ilusória


convicção de que a sociedade nada mais é do que um ambiente perfeito com alguns
48

indivíduos que destoam, que infringem as leis e por isso são presos, porém, é fato
que a sociedade não se aproxima gradualmente da harmonia na mesma medida em
que esses indivíduos são presos como traz o filósofo Eduardo Migowski “Há uma
visão estereotipada do brasileiro como um povo pacífico, alegre e tolerante. Tal
interpretação da nossa cultura, contudo, não se confirma em nossa história.” E isso
nos mostra a ineficácia do sistema carcerário em relação ao seu impacto social para
os indivíduos que permanecem na sociedade.

Em sua participação no vídeo informativo "Tá se sentindo mais seguro?”


disponibilizado no site YouTube, no canal da jornalista Júlia Tolezano (2018), a
YouTuber Jout Jout, Suzane Jardim, autora do ensaio "A reconstrução do mínimo:
falsa ordem democrática e extermínio" bacharela e licenciada em História pela
Universidade de São Paulo e pesquisadora em dinâmicas raciais com ênfase em
criminologia (Tem Saída?, 2018), Suzane revela dados que nos esclarecem sobre o
estigma que todos os presidiários cumprem pena por crimes hediondos.

Revelando que mais de 40% da população carcerária feminina se encontra


nesta condição por intermédio de prisão preventiva, a historiadora exemplifica que
tal fato é um completo paradigma visto que em tese a prisão preventiva é um recurso
de última ordem em casos de grande perigo social em razão da liberdade do agente
ou risco de fuga como dita o artigo 312 do Código Penal, obviamente que esses
40% não se encaixam no perfil, visto que os detidos em geral possuem baixa renda
e, por tanto, não possuem condições financeiras de fugir. Sobretudo, crimes
cometidos não se encaixam como periculosidade extrema para a sociedade. Para
compreensão da dimensão do fato, se em São Paulo liberassem essas detentas,
esvaziaria duas penitenciárias, porém existe uma crença de que a liberação dessas
detentas seria um erro extremamente nocivo para a sociedade.

O Brasil é um dos países com maior índice de homicídios, de acordo com o


site Agência Brasil o país possui uma média de 60 mil homicídios por ano, chegando
ao montante de 62.517 em 2016, ultrapassando as médias de morte nas guerras da
Síria no mesmo ano. Porém, apesar de possuir índices elevados, Suzane afirma que
o Brasil não possui políticas efetivas contra a violência.

A historiadora também revela que os homens presos por violência


doméstica, por exemplo, compõem apenas 1% da população carcerária e os
detentos condenados por crimes sexuais em geral nem ao menos são
representados nos gráficos, fazem parte da classificação “outros”.

Em relação às mulheres, mais de 60% se encontram presas por tráfico de


drogas e 50% dos homens presos por tráfico, furto ou roubo, sendo esses dois
últimos danos ao patrimônio. Além disso, os projetos ressocializadores são precários
o que justifica a reincidência visto que esses indivíduos já eram marginalizados e
excluídos da sociedade de forma tal que se mostra extremamente mais difícil
quando se soma todos esses fatores à ficha criminal. Um exemplo disso é que 70%
49

dos indivíduos que residem na Cracolândia são reincidentes por crimes como tráfico,
roubo e furto.

Isso nos mostra o verdadeiro futuro da maioria dos indivíduos que passam
pelo sistema carcerário, o intuito deste trabalho não é desacreditar no sistema
carcerário e sugerir a impunidade, mas sim encontrar meios de com melhorias no
sistema possamos verdadeiramente fazer com que esses indivíduos retribuam à
sociedade o dano que causaram de modo eficaz, pois na situação atual o indivíduo
sai pior do que entrou.

De acordo com Raissa Belintani (2018), advogada e pesquisadora do ITTC -


Instituto Terra, Trabalho e Cidadania e também participante do vídeo informativo, a
população carcerária é em sua grande maioria composta por negros, periféricos, de
baixa escolaridade, baixa renda e entre outros, podemos ver a predominância do
racismo e dominância das classes. Temos por exemplo que 100% da população
carcerária do Acre é negra e 92% na Bahia. A maioria não possui ensino
fundamental completo, uma minoria possui ensino médio completo e uma parcela
pequena possui ensino superior completo.

Pensando nisso, é necessário novos meios de aplicar a punição adequada


para aqueles que infringem as leis de forma tal que se alcance a verdadeira justiça.

Uma dessas medidas seria aplicação de penas alternativas como padrão e


não uma exceção, propondo uma melhor ressocialização tanto do indivíduo que
desrespeitou as normas como do âmbito social que sofreu danos pela conduta do
mesmo.

Apesar das alternativas supracitadas, de acordo com o INFOPEN (2014),


das pessoas privadas de liberdade 41% se encontra sem condenação (250.213) e
41% em regime fechado (250.094) e apenas 15% (89.639) em regime aberto, com
161,00% de taxa de ocupação carcerária.

. O sistema de cumprimento de pena brasileiro é denominado progressivo,


isso significa que o detento inicia o cumprimento da pena no regime mais grave
cabível à ele de forma a cumprir os requisitos objetivos que é o tempo de pena e
subjetivos que é seu comportamento, conforme o cumprimento da pena é efetuado,
gradualmente o regime se torna brando.

No Brasil, adotou-se a multa como uma forma de em valores financeiros


evitar a reincidência, porém, é comprovado a necessidade de outros meios de maior
impacto social para que gradualmente diminua a reincidência. Em grande escala é
possível restaurar a sociedade melhorando os indivíduos que a destroem ao invés
de pressioná-los sem planejamento para ressocialização.
50

Atualmente não existem pesquisas sérias e de validade internacional que


afirmem alguma ligação entre o aumento de prisões e a diminuição de violência.
Segundo o Sistema de Informações Estatísticas do Sistema Penitenciário Brasileiro,
o INFOPEN relata que entre 1990 a 2016 houve aumento de mais de 700% de
pessoas encarceradas por ano, totalizando um montante de 722.120 de
encarcerados. Em contrapartida, ainda há uma sensação de impunidade que na
realidade é ilusória pois essas prisões não possuem retorno social e o resultado é a
superlotação em todo o território nacional como traz a imagem:

Figura 14 - Brasil é o terceiro país com maior número de pessoas presas,


atrás dos Estados Unidos e China.

Wilson Dias/Agência Brasil

Fonte: <Com 726 mil presos, Brasil tem terceira maior população carcerária do
mundo>

Ocupando a 26ª posição no ranking dos países que mais prendem, estima-
se que no Brasil a cada 100 mil habitantes 322 estão encarcerados. Tal
levantamento feito pelo G1 leva em consideração o número atual de presos (680 mil)
e o número atual de brasileiros (213 milhões). Porém considerando o montante de
presos, o Brasil ocupa a 3ª posição, ficando apenas atrás da China e Estados
Unidos.

Desta forma, para melhor exemplificar a superlotação dos estabelecimentos


carcerários, na qual o Brasil ocupa a 47ª posição, dados mostram que o país tem
capacidade para abrigar 440.530 presos e atualmente abriga 680 mil, expondo um
déficit de 241.652 vagas. Segundo o ex-diretor do Departamento Penitenciário
Nacional - Depen, defensor público Renato De Vitto, a taxa de encarceramento se
51

expande de forma abrangente, sem retorno social em se tratando da diminuição da


criminalidade.
52

5.1 PUNITIVISMO SELETIVO

http://memoriasdaditadura.org.br/dignificacao-do-sistema-prisional/

https://ladih.wordpress.com/tag/seletividade-penal/

https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-06/brasil-
ultrapassa-marca-de-62-mil-homicidios-por-ano
53

5.2 SUPERLOTAÇÃO
54

6 RESSOCIALIZAÇÃO
55

6.1 O PAPEL DOS DIREITOS HUMANOS NO CÁRCERE

"tentar estudar a metamorfose das metodologias punitivas a partir de uma tecnologia


política do corpo onde seria possível ler uma história comum das relações de poder e das
relações de objeto" (Foucault, 1975: 28).

Partindo dessa premissa, entende-se que o sistema prisional como o


conhecemos cumpre seu propósito oculto de excluir em massa uma parcela
especifica da sociedade em habitações sub-humanas, com violência, tortura dentre
outras formas claras de violação dos direitos humanos, na mesma proporção que
não cumpre com seu propósito inicial de ressocialização.

http://memoriasdaditadura.org.br/dignificacao-do-sistema-prisional/
56
57

REFERÊNCIAS

Disponível em: Acessado em:

AGÊNCIA BRASIL, Brasil ultrapassa a marca de 62 mil homicídios por ano,


2018.
Disponível em: <https://url.gratis/vGIb2> Acessado em: 15 de jul. de 2021.

BRASIL. Constituição do Império do Brasil


Disponível em: <https://url.gratis/FcJA7h> Acessado em: 22/09/2021.

BRASIL. Constituição Federal, p. 7, de Saraiva, 2018.

BRASIL. Constituição Federal de 1988.

BRASIL. Decreto n. 678, de 6 de julho de 1850. Dá Regulamento para a Casa de


Correção do Rio de Janeiro.
Disponível em:<https://url.gratis/0H4b0k> Acesso em: 18/09/2021.

BEZERRA, Juliana. Diretas Já, 2020.


Disponível em:<https://url.gratis/NUjfnK> Acessado em:18/09/2021.

BORGES, Cláudia. Conheça a Origem da Expressão 'Olho por Olho, Dente por
Dente', 2019.
Disponível em:<https://url.gratis/NmnPIp> Acesso em: 23/09/2021.

CANCELLI, Elizabeth. Repressão e Controle Prisional no Brasil: Prisões


Comparadas, 2005
Disponível em:<https://url.gratis/dHSqLn> Acessado em:18/09/2021.

Documentário Justiça (2004). De Maria Augusta Ramos.


Disponível em: <https://url.gratis/8T7PWb> Acessado: 26/06/2021.
58

ESTADO DE SÃO PAULO. Estatística Criminal do Estado de São Paulo. São


Paulo: Empresa Editora Universal, 1943.
Disponível em: <https://url.gratis/GAcXAl> Acessado em:23 de set. de 2021.

FERNANDES, Cláudio. O que foi o Estado novo, 2021.


Disponível em: <https://url.gratis/MJ5vAQ> Acessado em:17 de set. de 2021

FIGUEIREDO, Patrícia. Brasil foi o local que mais recebeu escravos nas
Américas, 2018.
Disponível em:<https://url.gratis/8Doj29> Acessado em: 16 de set. de 2021.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. p. 242. Petrópolis: Vozes, Vozes, 1987.

G1, Com 322 encarcerados a cada 100 mil habitantes, Brasil se mantém na 26ª
posição em ranking dos países que mais prendem no mundo, 2021.
Disponível em: <https://url.gratis/ZFZpo2> Acessado em: 26 de jun. de 2021.

GODOY, Arnaldo Sampaio de Morais. As Ordenações Filipinas e mais um


exemplo de violência contra as mulheres, 2017.
Disponível em: <https://url.gratis/4LhS2x> Acessado em: 15 de set. de 2021

INFOPEN, Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias INFOPEN


junho - 2014, 2014.
Disponível em: < https://url.gratis/UxuMJK> Acessado em: 26 de jun. de 2021.

IMMICH, Michele. O Sistema Prisional Brasileiro e a Criação da Lei da Execução


Penal, 2016.
Disponível em: <https://url.gratis/cHX4L6> Acessado em: 26 de jun. de 2021.

LOMBROSO, Cesar. O Homem Delinquente, 1876.


59

MACHADO, Roberto; LOUREIRO, Ângela; LUZ, Rogério; MURICY, Kátia. Danação


da norma: a medicina social e constituição da psiquiatria no Brasil, p. 10
Disponível em: <MACHADO, Roberto; LOUREIRO, Ângela; LUZ, Rogério; MURICY,
Kátia. Danação da norma: a medicina social e constituição da ps > Acessado em:
22 de set. de 2021.

MEMORIAL DA DEMOCRACIA, A Revolução Entre Dois Fogos, Ditadura do


Estado Novo, 2015-2017.
Disponível em: <https://url.gratis/4gp2Po> Acessado em: 15 de jul. de 2021

MEMÓRIAS DA DITADURA, Dignificação do Sistema Prisional. Prisões: origens,


ditadura e transição democrática.
Disponível em: <https://url.gratis/d9btQ8> Acessado em: 21 de set. de 2021.

MIHOWSK, Eduardo. Das Ordenações Filipinas ao Código Criminal de 1830,


2018.
Disponível em: <https://url.gratis/t6b6bJ> Acessado em:15 de set. de /2021.

MILARÉ, Gabriel. Comparando ditaduras: Estado Novo e Regime Militar, 2018.


Disponível em: <https://url.gratis/mAYVOl> Acessado em:16 de set. de 21.

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, 2004.

MORAES, Evaristo de. Prisões e instituições penitenciárias no Brasil. Rio de


Janeiro: Livraria Editora Conselheiro Cândido de Oliveira, 1923

NASCIMENTO, Diego do Espírito Santo Menezes do. Evolução Dos Sistemas


Penitenciários, 2011.
Disponível em: <https://url.gratis/p6ROYA> Acessado em: 23 de set. de 2021.

NUZZI, Vitor. Comício da Sé em 1984 foi a largada da campanha das diretas,


que não viriam, 2014.
Disponível em:<https://url.gratis/wQqAKu> Acessado em:18 de set. de 2021.
60

OLIVEIRA, Cláudia Rafaela. Execução Penal, 2018.


Disponível em: <https://url.gratis/jESSKU> Acessado em: 15 de set. de 2021.

PAULA, FERREIRA, SILVA & OLIVEIRA, Mariana Chiarello de, Gessica Roberta,
Aline Ferreira, Tamires Caroline de, A História do Sistema Carcerário e as
Possíveis Causas da Crise Atual No Brasil, 2019.
Disponível em: <https://url.gratis/yEFzXH> Acessado em: 15 de set. de 2021.

PESSOA, Gláucia Tomaz de Aquino. Cassa de Correção do Rio de Janeiro, 2016


e atualizado em 2019
Disponível em: <https://url.gratis/a7lu16> Acessado em:23 de set. de 2021.

Pirola, Ricardo Figueiredo, Senzala insurgente (Editora Unicamp), citado no artigo:


Há 140 anos, a última pena de morte do Brasil, Agência Senado, 2017.
Disponível em:<https://bityli.com/GzLYQ5> Acessado em:27/09/2021.

PLANALTO. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos


Jurídicos, 1957.
Disponível em: <https://url.gratis/oLSqCi> Acessado em: 15 de jul. de 2021.

POLITIZE. Era Vargas (1930-1945), 2019


Disponível em: <https://url.gratis/DHvpaY> Acessado em:18 de set. de 2021.
RAMOS, Graciliano. Memórias do Cárcere. Rio de Janeiro: Record, 1985

REIS, Luís Fernando Scherma, O Direito Surgiu Antes da Escrita Law Came
Before off Writing, 2018.
Disponível em: <https://url.gratis/SPUb3T> Acessado em: 15 de jul. de 2021.

Relatório apresentado à Assembleia Geral Legislativa na 3ª sessão da 15ª


legislatura. Rio de Janeiro: Tipografia Americana, 1874.
Disponível em: <https://url.gratis/02sUoi> Acesso em:23 de set. de 2021.
61

RODRIGUES, Nathalia. Governo de João Goulart, 2017.


Disponível em: <https://url.gratis/wFXUCd> Acessado em:18 de set. de 2021.

RODRIGUES, Francisca; SILVEIRA,Lucileuda; MELO, Mayara;


RODRIGUES, SILVEIRA & MELO, Francisca Andreza Paiva, Lucileuda, Mayara de
Oliveira, A evolução das penas no Brasil, com enfoque nos regimes
carcerários, 2019.Disponível em: <A evolução das penas no Brasil, com enfoque
nos regimes carcerários> Acessado em:23 de set. de 2021.

SENADO FEDERAL. Código Philippino, ou, Ordenações e leis do Reino de


Portugal: recopiladas por mandado d'El-Rey D. Philippe I. Biblioteca Virtual,
Disponível em:<https://url.gratis/81PKFb> Acessado em: 15 de set. de /2021.

SUNDRÉ, Lu, Entenda o que foi o AI-5, ato ditatorial defendido por Eduardo
Bolsonaro, 2019.
Disponível em:<https://url.gratis/19QZRV> Acessado em:16 de set. de 2021.

SUNDRÉ, Lu, Fantasma da ditadura sobre a democracia, AI-5 completa 51


anos, 2019.
Disponível em:<https://url.gratis/BRgVcn> Acessado em:16 de set. de 2021.

Tem Saída? 2018.


Disponível em: <https://url.gratis/8ihFqK> Acessado em: 13 de set. de 2021.

TINÔCO, Antonio Luiz Ferreira, Código criminal do Império do Brazil anotado /


Antônio Luiz Tinôco ; prefácio de Hamilton Carvalhido. ~ Ed. fac-sim. - Brasília :
Senado Federal, Conselho Editorial, 2003. xxviii, 574 p. - (Coleção história do direito
brasileiro. Direito penal) p. 19.
Disponível em:<https://url.gratis/tv5M7j> Acessado em:22 de set. de 2021.

TODA MATÉRIA, Voto de Cabresto ,2020.


Disponível em: <https://url.gratis/3IpWLx> Acessado em:17 de set. de 2021.
62

TODA MATÉRIA, Política do Café com Leite ,2017.


Disponível em: <https://url.gratis/LbqSeL> Acessado em:17 de set. de 2021.

TOLEZANO, Júlia. Vídeo “Tá se sentindo mais seguro?”, 2018.


Disponível em: <https://url.gratis/pg81JI> Acessado em: 26 de jun. de 2021.

Você também pode gostar