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Teoria Gerativa e Aquisição Da Linguagem

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TEORIA GERATIVA E A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM

Maria Vanessa Soares de Oliveira 1


Jocimario Alves Pereira 2

RESUMO

No presente trabalho, abordaremos a questão da aquisição da linguagem e como está nos é inata,
segundo a perspectiva gerativista, desenvolvida pelo linguista Noam Chomsky. Com base nessa teoria,
buscaremos mostrar como o fator social presente no gerativismo age sobre o instinto da linguagem e
resulta no desenvolvimento da língua, e como este se diferencia das concepções estruturalista e
behaviorista; também será ressaltado o papel da gramática gerativa e normativa na contribuição do
processo de ensino/aprendizagem da língua portuguesa. A técnica utilizada para viabilizar esse estudo
é a de documentação indireta, que consiste numa pesquisa bibliográfica a respeito do processo de
aquisição da linguagem pelo ser humano e como se dá esse fenômeno, segundo a teoria gerativa.
Vimos neste trabalho que o fator social usado no gerativismo como responsável pelo amadurecimento
da língua contrapõe-se as concepções estruturalistas e behavioristas, já que, nestas duas, a língua
provém das relações sociais. Além disso, como possuímos uma gramática interna, procuramos
entender como está se aplica em sala de aula, contribuindo, junto com a gramática normativa, para o
ensino de língua portuguesa.

Palavras-chave: Língua; Inatismo; Gramática Gerativa.

INTRODUÇÃO

No presente trabalho, abordaremos a questão da aquisição da linguagem e como está


nos é inata, segundo a perspectiva gerativista, desenvolvida pelo linguista Noam Chomsky.
Com base nessa teoria, buscaremos mostrar como o fator social presente no gerativismo age
sobre o instinto da linguagem e resulta no desenvolvimento da língua, e como este se
diferencia das concepções estruturalista e behaviorista; também será ressaltado o papel da
gramática gerativa e normativa na contribuição do processo de ensino/aprendizagem da língua
portuguesa (NÓBREGA; LEITÃO, 2008; SILVA; GARCIA, 2015).
A técnica utilizada para viabilizar esse estudo é a de documentação indireta, que
consiste numa pesquisa bibliográfica a respeito do processo de aquisição da linguagem pelo
ser humano e como se dá esse fenômeno, segundo a teoria gerativa.
Este artigo encontra-se dividido em três partes. Na primeira parte, apresentaremos os
pressupostos teóricos que fundamentam a proposta em estudo, indo desde o processo de
aquisição da linguagem e os argumentos utilizados por Noam Chomsky para comprovar o

1
Graduando do Curso de Letras Portugues da Universidade Federal da Paraíba - UFPB,
mvanessasoliveira@hotmail.com;
2
Mestrando do Curso de Química da Universidade Federal Rural de Pernabunco - UFRPE,
mario.alves_@hotmail.com;
instinto da língua; até o surgimento da gramática gerativa, que descreve as propriedades
linguísticas que possuímos internamente e nos faz aprender uma língua. Em um segundo
momento, discutiremos como o fator social se apresenta na teoria gerativa e como este se
diferencia, na aquisição da linguagem, das perspectivas estruturalista e behaviorista; também
como a gramática normativa, até então utilizada em sala de aula, e a gerativa contribuem para
o ensino/aprendizagem de língua portuguesa. E em terceiro, seguem as considerações acerca
do que concluímos com este trabalho.

A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM

A linguagem consiste em um fator determinante para a comunicação entre povos,


agindo como um elo, unindo comunidade e nações, chegando a ser considerada a maior
capacidade evolutiva da espécie humana, que ao usar símbolos para descrever um sentimento,
uma ideia, etc., transforma o mental em expressão material, o que a diferencia de todas as
demais espécies de animais. Em relação à aquisição desta, muitos linguistas apontam a
linguagem como sendo produto inato ao ser, uma adaptação biológica exclusiva ao ser
humano. Um dos maiores defensores da linguagem como instinto humano foi o linguista
Noam Chomsky (2015), que em meados da década de 50 criou a Teoria Gerativa, a qual
afirma que a aquisição da língua é provinda de um órgão mental, como se fosse uma
faculdade psicológica presente em cada indivíduo:

A faculdade de linguagem pode razoavelmente ser considerada como "um órgão


linguístico" no mesmo sentido em que na ciência se fala, como órgãos do corpo, em
sistema visual ou sistema imunológico ou sistema circulatório. Compreendido deste
modo, um órgão não é alguma coisa que possa ser removida do corpo deixando
intacto todo o resto. Um órgão é um subsistema que é parte de uma estrutura mais
complexa (CHOMSKY, 2015, p. 1).

Steven Pinker, baseando em Chomsky, fala que a "linguagem é um instinto humano


instalado em nosso cérebro, ou seja, existe um dispositivo que é ativado na mente quando a
criança alcança certa idade, por isso lembramos apenas de certo momento de nossa infância"
(PINKER, 2002, pg. 5). Com isso, ele quis dizer que não aprendemos a língua com nossas
experiências provindas das relações sociais, como muitos pensavam antes do gerativismo,
mas já nascemos com essa capacidade e que até um determinado período da nossa vida (até a
puberdade) conseguimos aprender qualquer língua sem maior dificuldade. Em seu livro, O
instinto da linguagem: como a mente cria a linguagem, Pinker (2002) aponta o fator da
linguagem como um instinto humano e que a mente, desde o nascer, já possui características
próprias que darão origem a capacidade da fala:

A linguagem não é um artefato cultural [...]. A linguagem é uma habilidade


complexa e especializada, que se desenvolve espontaneamente na criança, sem
qualquer esforço consciente ou instrução formal, que se manifesta sem que perceba
sua lógica subjacente, que é qualitativamente a mesma em todo indivíduo, e que
difere de capacidades mais gerais de processamento de informações ou de
comportamento inteligente (PINKER, 2002, p. 9).

Segundo Chomsky (2015), a capacidade de compreender e produzir a linguagem


advém de princípios universais que constituem o órgão da linguagem, princípios estes
também chamados de gramática universal (GU). Quando há estímulos externos na aquisição
de determinada língua, esse órgão age sobre esse estímulo e produz a aquisição de uma língua
específica.
Outras noções usadas pelo gerativismo e que fazem parte da aquisição da linguagem
são as dicotomias de competência e desempenho. Está primeira consiste no saber linguístico
que temos em nossa mente, assemelha-se com a aquisição da língua segundo a teoria gerativa;
já o desempenho tem a ver com o saber adquirido em meio as nossas relações sociais. Essa
última noção se difere da aquisição da língua de Chomsky, pois enquanto outros movimentos,
como o estruturalismo e o behaviorismo, por exemplo, limitavam seus estudos da língua a
dados linguísticos produzidos pelos indivíduos como: palavras, frases, textos etc. o
gerativismo atribui seu estudo da língua a fatores inatos ao indivíduo. O estruturalismo, cujo
principal representante foi o linguista Ferdinand Saussure, defende que a língua é um sistema
de signos e exterior aos indivíduos, portanto esta deve ser estudada separada da fala a língua
não é um conglomerado de elementos heterogêneos; é um sistema articulado (LIMA;
FELIPETO, 2013; MARTINS, 2015).
Para essa teoria, a língua é um objeto basicamente social. Já Chomsky considera que
assim como outros órgãos do corpo humano, a linguagem sofre influência do meio externo ao
qual está submetida, mas está se desenvolve a partir de características presentes em cada
indivíduo, independentes da sociedade e da cultura em que eles estão situados, ou seja, o fator
social serve apenas de contribuinte para o amadurecimento da capacidade linguística.
A aquisição da linguagem na perspectiva behaviorista, segundo Skinner (2015),
acontece num processo de imitação passiva, a criança fala o que ouve dos adultos que a
rodeiam. Para essa teoria, o fator social desempenha um papel fundamental no processo de
aquisição, já que a criança, por ela mesma, não é considerada capaz de desenvolver a
linguagem, dependendo de fatores externos para que esse desenvolvimento aconteça.
Chomsky contrapõe, afirmando que se a linguagem fosse aprendida como em um jogo
de repetição, só seríamos capazes de falar o que ouvimos, mas na verdade não é isso que
acontece, pois quando uma criança fala uma língua ela demonstra saber muito mais do que
aquilo que ouviu, ou seja, ela mostra ser capaz de produzir um número infinito de expressões
gramaticais a partir de um conjunto finito de elementos e princípios linguísticos. O linguista
ainda diz que cada sentença que enunciamos é uma nova combinação de palavras, que aparece
uma única vez, e não tem como um indivíduo conter um repertório de respostas (PINKER,
2002). Isso só se explica pelo fato do cérebro conter algum dispositivo capaz de criar um
número ilimitado de sentenças com um conjunto finito de palavras. Chomsky fala que:

Mesmo conhecendo-se muito pouco sobre os universais linguísticos, poderemos ter


certeza de que a possível variação da língua é bem limitada... A língua que cada
pessoa adquire é uma construção rica e complexa que não se justifica pelos parcos e
fragmentos dados disponíveis [para a criança]. No entanto, os membros de uma
comunidade linguística desenvolvem essencialmente a mesma língua. Esse fato só
encontra explicação na hipótese de que esses indivíduos empreguem princípios
altamente restritivos, que dirigem a construção da gramática (PINKER, 2002, p. 15).

Assim, mesmo sem estímulos suficientes do meio externo, conseguimos adquirir uma
língua porque nascemos com essa capacidade, com princípios gerais que contribuem para
organizar os estímulos verbais em estruturas complexas.

A GRAMÁTICA GERATIVA

A gramática gerativa contraria todo e qualquer pensamento de que a mente humana


seja como uma caixa vazia, defendendo que a mesma apresenta abundantes estruturas,
composta por diferentes órgãos com funções específicas. Isso se pode notar na observação do
comportamento das línguas, em que se percebe que há regras que fazem parte do
conhecimento gramatical interno do falante.
Chomsky atribui aspectos linguísticos pertencentes a uma criança, como a
criatividade do falante que é a sua capacidade de emitir e de compreender frases inéditas, a
fatores dessa gramática interna, pois, segundo ele, para a construção de frases é preciso seguir
regras que definem a sequência de palavras, o que comprova que a linguagem está interligada
às características inerentes a espécie humana, reafirmando assim seu caráter universal, cuja
linguagem é provinda de uma predisposição biológica cognitiva e contém parâmetros que
serão definidos pela influência do ambiente externo. Os argumentos utilizados por Chomsky
para validar a teoria da gramática universal são os seguintes:

(...) a criança, que é exposta normalmente a uma fala precária, fragmentada, cheia de
frases truncadas ou incompletas, é capaz de dominar um conjunto complexo de
regras ou princípios básicos que constituem a gramática internalizada do falante.
(...). Um mecanismo ou dispositivo inato de aquisição da linguagem (...), que
elabore hipóteses linguísticas sobre dados linguísticos primários (isto é, a língua a
que a criança está exposta), gera uma gramática especifica, que é a gramática da
língua nativa da criança, de maneira relativamente fácil e com um certo grau de
instantaneidade. Isto é, esse mecanismo inato faz “desabrochar” o que “já está lá”,
através da projeção, nos dados do ambiente, de um conhecimento linguístico prévio,
sintático por natureza (SCARPA, 2001. p. 4).

Como a gramática universal é uma faculdade mental formada por um conjunto de


regras que nos permite produzir e compreender frases gramaticais, após o domínio de duas
palavras, as crianças começam a desenvolver seu vocabulário e o conhecimento dessas regras
de construção da língua presentes na GU, adquirindo, assim, seu sistema fonológico e
morfológico, melhorando a pronúncia das palavras, e rapidamente, mesmo sem estruturas
complexas para isso, começa a se aproximar da gramática adulta. Um pouco mais tarde a
criança começa a desenvolver a sintaxe, na qual ela consegue combinar as palavras na
construção de frases (KENEDY; MARTELLOTA, 2008).
Portanto, o processo de aquisição da linguagem engloba os sistemas: fonológico,
semântico, sintático, morfológico e pragmático. Sendo a linguagem, então, uma capacidade
inata, os falantes de determinada língua constituem um léxico mental, formado pelo conjunto
de palavras de sua língua. E ao adquirirmos uma língua, a nossa capacidade inata nos permite
fazer o reconhecimento fonológico dos sons específicos de nossa língua e reproduzi-lo. Da
mesma forma acontece com a sintaxe, que reúne as palavras para formar frases. E como as
palavras possuem uma estrutura interna, ela é especificada pela morfologia. Já o significado e
a caracterização do contexto social e cultural das palavras nos são permitidos devido ao nosso
conhecimento inato da semântica e da pragmática.
Diante disso a gramática gerativa se mostra uma grande aliada no ensino de língua
portuguesa, apesar da gramática normativa, que foca em normas, exercer um papel de quase
predomínio em sala de aula. No entanto, isso está mudando e o gerativismo está ganhando
espaço entre os Parâmetros Curriculares Nacionais, que, mesmo sem esclarecer o tipo de
metodologia a ser usada, frisa que no ensino de língua portuguesa existem várias
competências e habilidades que devem ser focadas, partindo, portanto, do ensino de gêneros
textuais, com texto e contexto.
TEORIA GERATIVA E A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM

Com o intuito de estudar cientificamente a linguagem, e na busca de explicar o


fenômeno de sua aquisição, várias correntes se formaram, entre elas destacam-se: o
gerativismo, o estruturalismo e o behaviorismo. Nas quais o fator social tem um papel
importante para que o indivíduo consiga desenvolver a linguagem.
Na concepção chomskyana, a língua é um fenômeno interno ao falante, uma
capacidade genética. Para comprovar sua teoria, o linguista aponta para o fato de que mesmo
que submetêssemos um animal a certa língua e por determinado tempo, por mais evoluído que
seja este, ele jamais aprenderá essa língua, ao contrário do que ocorreria com uma criança,
pois esta facilmente consegue absorver os dados linguísticos em sua complexidade.
(SCARPA, 2001).
Há quem diga que se fosse assim não explicaria um papagaio conseguir falar, mas o
que acontece é que ele apenas repete um número limitado de sons que ouve e uma criança
tanto reproduz os sons que ouve quanto consegue criar novas sentenças com eles, sem que
precise de nenhum aprendizado para isso (MAIA, 2006). Por exemplo, uma criança que fala
“cabeu” ao invés de “coube”, tenta conjugar o verbo caber no passado, e isso ninguém lhe
ensinou e nem ela ouviu palavra do tipo. Isso só acontece devido à gramática que nos é
internalizada.
Um ponto curioso é que se nascemos com uma língua inata, uma pessoa que nunca
teve um contato social, ou que seja surda, por exemplo, e, portanto, não conhece nenhuma
língua, deveria desenvolver essa capacidade sozinha, mas na realidade não é o que acontece.
Esse fato também é explicado por Chomsky, o qual reforça que o fator social exerce um papel
importante para o amadurecimento da nossa capacidade linguística (PINKER, 2002). Da
mesma forma que não nascemos falando devido ao período de tempo que levamos para
aperfeiçoar nossa capacidade, assim como precisamos desse mesmo período para aprender a
andar.
As hipóteses levantadas por Chomsky entram em contradição com os estudos
linguísticos realizados até então, os quais consideram a língua como um fator externo. O
estruturalismo (século XX) cujo principal representante foi o linguista Ferdinand de Saussure,
foi uma das correntes mais importantes no estudo da aquisição da linguagem. Saussure busca
distinguir o conceito de língua e de fala, sendo esta primeira um fenômeno externo, uma parte
social da linguagem, e a segunda corresponde a um fator biológico, particular a cada
indivíduo. Assim, criou-se em seus estudos a noção de signo linguístico, o qual consiste na
união entre significante (trata-se da imagem acústica, mas não está relacionado ao som
material, e sim à impressão psíquica), e significado (conceito), ou seja, quando falo a palavra
cadeira, a mente logo reproduz uma imagem que nos remete ao conceito de cadeira, objeto.
Ele ainda estabelece as relações sintagmáticas e associativas do signo linguístico (MAIA,
2006). As quais consistem nas associações que fazemos ao ouvir uma palavra. Por exemplo,
quando escutamos a palavra Nordeste, logo estabelecemos uma relação de associação com
tudo que está relacionado com o Nordeste: seca, clima quente, sertanejo matuto, panela de
barro etc.
O gerativismo frisa que a língua não é um produto externo e sim uma capacidade
biológica, para isso aponta o fato de toda criança, independente do lugar no mundo em que
viva, começar a desenvolver sua capacidade de falar mais ou menos na mesma idade, por
volta de um a dois anos de idade, bastando para isso que haja algum contato social com a
criança, o qual vai definir o idioma que está vai adquirir. Os behavioristas acreditavam que
esse comportamento correspondia a um processo de imitação externo, mas os gerativistas
enfatizam que esse fenômeno faz parte de uma gramática interna que todo falante possui
dentro de si, mentalmente, e que se desenvolve e toma forma com o tempo. Por isso que a
sintaxe é tida como centro de estudo do gerativismo.
A teoria gerativa surgiu em oposição ao behaviorismo radical de Skinner (2015), o
qual afirma que um indivíduo que fala determinada língua não possui nenhum tipo de
conhecimento desta; este indivíduo aprendeu um conjunto de comportamentos (interação do
organismo com o ambiente) que permitem a ele responder apropriadamente em situações de
interação realizadas em determinada língua.
Para o Behaviorismo, a mente de uma criança é como um papel em branco, o qual
deve ser moldado com a interferência dos adultos que a rodeiam. E isso ocorreria através do
processo de estímulo e reação. Quando esse estímulo é verbal, escrito ou oral, e a resposta
dada não corresponde ao estímulo proposto, a relação entre eles é puramente arbitrária. Esse
comportamento “intraverbal” ocorre quando, por exemplo, dizemos a palavra “sapato”
quando o que lemos é “butina”, essas informações nos vêm, geralmente, por meio de
decoração/memorização, a mesma que nos faz aprender um número de celular ou o alfabeto
do nosso idioma em uma sequência etc. Portanto, todo conhecimento, inclusive o linguístico,
provém unicamente da experiência, limitando-se ao que pode ser captado do mundo externo,
pelos sentidos, ou do mundo subjetivo, pela introspecção, sendo deixadas de lado as verdades
inatas do racionalismo.
Chomsky contrapõe-se a essa afirmação acrescentando em seus argumentos a teoria da
pobreza de estímulo, afirmando que as informações linguísticas as quais as crianças são
impostas dão poucas informações sobre a propriedade da linguagem para desenvolver o
sistema complexo da linguagem e ainda a criatividade linguística (PINKER, 2002). Ou seja,
se esse sistema não lhe fosse inato, não teria como a criança saber tanto sobre o sistema
linguístico com tão poucas informações vindas do meio externo. O que comprova que temos
propriedades inatas que nos leva a produzir e compreender a linguagem.

COMPREENDER O PAPEL DA GRAMÁTICA NORMATIVA E DA GERATIVA NO


ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

Diante dessas concepções de língua, são propostos diferentes modelos teóricos que
buscam descrever o sistema linguístico. Uma dessas gramáticas é denominada de normativa,
que é a priorizada nas escolas e nas aulas de línguas, a qual prescreve regras, segundo as
construções consideradas aceitas pela norma culta. Essa perspectiva, também conhecida como
prescritiva, impõem regras com o intuito de controle social (POSSENTI, 1997).
Um exemplo de gramática normativa em sala de aula é quando estudamos ortografia.
Na frase seguinte, por exemplo: “Gostou da carne?” “Comi duzentas gramas”. Pelas regras
de ortografia da norma culta do nosso português “a grama” equivale à relva, a capim; a
palavra “o grama” no masculino é que equivale à unidade de medida, de peso, então, nesse
caso o correto seria: “Comi duzentos gramas”.
Palavras como estas costumam causar muitas vezes ambiguidade e até incompreensão,
caso estas sentenças venham isoladas. Essas normas facilitam o entendimento das palavras,
ajudando na comunicação, já que é padrão para todos os falantes de uma mesma língua.
Também numa ocasião em que se exige formalidade, sempre se empregam as regras do falar
culto da gramática normativa. Portanto, esse tipo de gramática contribui de forma
significativa para nossa competência linguística.
No entanto, uma criança pode adquirir uma língua sem que saiba a gramática
normativa dessa língua, e mesmo assim, esta não deixa de se comunicar. Portanto, seria mais
adequado que em sala de aula houvesse uma maior contribuição para o desenvolvimento do
saber linguístico da criança, assim como sua criatividade verbal que lhe é inata, sem se deter
em regras que estabeleçam uma forma mais “certa” ou “bonita” de se escrever ou falar
(MAIA, 2006, pg. 36).
Os gerativistas procuram compreender como a intuição, sobre as estruturas sintáticas
de uma língua, ocorre na mente dos falantes. E buscam constituir um modelo teórico capaz de
descrever e explicar a natureza e o funcionamento dessa faculdade. A partir daí, foram
construindo-se os modelos teóricos chomskyanos do gerativismo: a gramática
transformacional e a gramática universal.
Como já possuímos uma gramática interna, a GU, conseguimos distinguir frases
gramaticais e agramaticais da língua específica a qual adquirimos, mesmo sem utilizar os
conhecimentos da gramática normativa. Por exemplo, na nossa língua portuguesa
conseguimos entender frases do tipo: “Nossa Senhora do Rosário está me guiando nessa
caminhada”, mas se esta frase estiver escrita dessa forma: “Está caminhada nessa Nossa
Senhora do Rosário me guiando”, todo falante da língua portuguesa, independente de
conhecer regras gramaticais ou não, entende que há aqui uma inadequação. Esse
conhecimento inconsciente que o falante possui e que é comum a todas as línguas, portanto,
não varia, é chamado por Chomsky de competência linguística.
Ao adquirirmos uma língua específica, os dados da língua particular a que somos
expostos é acionado e o resultado é um complexo de parâmetros, isto é, especificações
particulares dos princípios gerais. Dessa forma, a gramática universal é formada por regras
(princípios) invariáveis que são aplicáveis do mesmo modo para todas as línguas, e também
possui parâmetros de variação, responsáveis por especificar propriedades variáveis de línguas
particulares (MAIA, 2006). Esses princípios invariáveis da GU nos permitem criar novas
combinações para uma oração, a partir do Princípio de Encaixe ou de Recuo. Por exemplo:
1 - Vanessa quer comer pipoca
2 - Suêdia falou que Vanessa quer comer pipoca
3 - Uelda disse a Isabel para perguntar se Vanessa quer comer pipoca
4 - Isabel confirmou a Suêdia e Uelda que realmente Vanessa quer comer pipoca
Usando esse encaixamento de orações em outras e com nossa competência linguística,
podemos criar ilimitadas sentenças gramaticais, no entanto, o desempenho, que é o
responsável pela realização efetiva da linguagem, consegue formar um número limitado de
sentenças, numa base de meia dúzia (MAIA, 2006, pg. 34).
Em sua teoria, Chomsky defende que todo ser humano possui uma gramática
internalizada. Com isso, ele quis dizer que em nossa mente possuímos mecanismos que
comportam estruturas de todas as línguas e os fonemas também, cabendo ao indivíduo, ao
adquirir a linguagem, selecionar o que será usado e excluir o que não lhe servirá. Ou seja,
para uma criança falar, ninguém precisa lhe ensinar; como ela já possui todas as estruturas
essenciais para a aquisição da linguagem, ela consegue adquirir uma língua apenas
observando algum falante dessa língua. Portanto, quando uma criança observa a fala de um
adulto, ela está observando as regras que este utiliza na sua comunicação, logo, então, ela
assimila e internaliza esses dados e cria as próprias regras ao falar em repetição ao que foi
observado. Mas essa internalização simultânea só lhe é possível durante o seu período crítico,
ou seja, antes da puberdade, período em que nosso cérebro está propício para aprender
(MAIA, 2006; VASCONCELLO, 2015).
Na aquisição de cada língua, é necessária a identificação de seu sistema fonológico,
sua morfologia, seu léxico, sua sintaxe e o conhecimento de suas relações semânticas. A
sintaxe vai estar no centro de estudo do gerativismo, pois como o ser humano carrega uma
gramática internalizada, quando as crianças passam a formar frases de duas palavras, ela está
pondo em prática as regras da sintaxe: a capacidade de combinar palavras para formar frases.
A sintaxe gerativa busca explicar a estrutura da linguagem, estabelecendo de que
forma os elementos se juntam para formar os constituintes (unidades significativas). Esta se
constitui de duas partes: uma que define as estruturas fundamentais – a base, e a que permite
passar das estruturas profundas, geradas por essa base, para as estruturas de superfície das
frases – as transformações. Ou seja, a sintaxe é um mecanismo gerativo no qual se situa as
informações pertencentes aos princípios e aos parâmetros, estas que irão reger o processo de
construção das estruturas linguísticas. Portanto a gramática transformacional nos permite
conhecer a base que rege uma sequência linguística. Por exemplo, na frase:

A estrutura dessa sentença é constituída por um sintagma nominal (SN), um sintagma


verbal (SV) e um sintagma adjetival (SA): numa relação sujeito e predicado. Assim como
está, essa sentença é abstrata, ela só será convertida numa frase efetiva quando passar pelas
regras de comportamento fonológico e morfológico, este último responsável pelos morfemas -
unidades mínimas significativas das palavras. Feito isso, o papel do léxico, tipo de dicionário
mental responsável pela armazenagem das palavras de uma língua, é definir esse morfema, no
exemplo citado, ele vai classificar o morfema “Vanessa” como substantivo feminino, portanto
se a base for S+V+C, o léxico substitui cada um desses símbolos por palavras, ou seja, vai
acontecer as regras de transformação em que transforma uma estrutura profunda (sintagmas)
em uma estrutura superficial (morfemas). Através das relações semânticas compreendemos se
essa frase possui um significado aceito dentro de uma língua ou não (BALIEIRO JR;
MUSSALIM; BENTES, 2001; CHOMSKY, 2015).
A gramática normativa, à medida que dita regras que obrigatoriamente devem ser
seguidas, se distância do saber inato dos indivíduos, por não reconhecer a competência natural
do falante, deixando de ampliar a sua capacidade de compreender e expressar a sua
experiência do mundo, em seus múltiplos aspectos. A gramática gerativa em sala de aula
defende a ampliação da competência do falante, deixando que este faça uso de sua
criatividade. Em relação às regras o gerativismo funciona de forma que, além de ditar regras,
deve-se dizer o motivo destas serem criadas e estarem sendo usadas, para que o aluno
compreenda que caso não seja assim, ocorrerá uma inadequação na linguagem, prejudicando a
compreensão comunicativa desta frase. Portanto, esta última gramática não adota os termos
frase correta ou incorreta, como na da Gramática Tradicional, mas sim frase bem-formada ou
malformada.
Por mais diferente que sejam essas duas gramáticas, sendo que uma é contrária a outra,
pensar nas duas trabalhando juntas, em comunhão com o aperfeiçoamento da nossa
comunicação, é como pensar num liquidificador, com suas muitas potências; o liquidificador
com um apoio externo consegue triturar uma pequena quantidade de alimento que seja de
fácil trituração, mas em se tratando de uma quantidade maior desses alimentos, para que este
fique bem homogêneo, chegando a sua totalidade, é necessário uma potência maior (SOUZA
et al., 2015). Da mesma forma é a gramática interativa, por si só ela já possui sua
competência, mas se potencializada com o conhecimento das regras que compõem os códigos
linguísticos, presente na gramática normativa, conseguimos falantes competentes de língua
portuguesa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho, objetivamos analisar como se dá a aquisição da linguagem


segundo a teoria gerativa do linguista Noam Chomsky e os argumentos usados por ele para
viabilizar sua teoria. Este defende que o ser humano é capaz de compreender e produzir a
linguagem verbal sem precisar de aprendizado para isso, portanto possuímos uma gramática
universal que agindo em conjuntos com estímulos externos resultam na aquisição de uma
língua. Vimos neste trabalho que o fator social usado no gerativismo como responsável pelo
amadurecimento da língua contrapõe-se as concepções estruturalistas e behavioristas, já que,
nestas duas, a língua provém das relações sociais. Além disso, como possuímos uma
gramática interna, procuramos entender como está se aplica em sala de aula, contribuindo,
junto com a gramática normativa, para o ensino de língua portuguesa.
O gerativismo foi uma corrente importantíssima para os estudos linguísticos, através
dela o estudo da aquisição da língua mudou de foco. A gramática gerativa está cada vez mais
ganhando espaço junto aos Parâmetros Curriculares Nacionais, que, mesmo de forma
implícita, adotaram pressupostos básicos gerativistas, que incluem: “faculdade de linguagem”,
“competência”, “criatividade” e conhecimento prévio do aprendiz.
Assim, pudemos conhecer mais a fundo a teoria de aquisição da linguagem numa
abordagem gerativista, na qual a língua nos é inata devido possuirmos uma faculdade da
linguagem e o fator social é de fundamental importância para o desenvolvimento de nossa
capacidade de falar. Também conhecemos como a gramática gerativa e a normativa se
apresentam em sala de aula e como as duas contribuem para o ensino/aprendizado da língua
portuguesa.
Enfim, desenvolver esse artigo voltado para tal temática foi imprescindível, já que
compreender e saber como funciona o processo de aquisição da linguagem nos indivíduos
contribui para o ensino/aprendizado de uma língua.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BALIEIRO JR, Ari Pedro. Psicolinguística. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna
Christina. (Orgs.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras, v.2. São Paulo: Cortez,
2001. p.171-201.

CHOMSKY, Noam; Entrevista. Disponível no site: - Acessado em: 10 set. 2015.

KENEDY, Eduardo. Gerativismo. In: MARTELLOTA, Mario et al. (Org.). Manual de


Linguística. São Paulo: Contexto, 2008, pag. 23 a 35.

LIMA, Danielle Belarmino de; FELIPETO, Sonia Cristina Simões. A contribuição de


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MAIA, Marcus. Manual de Linguística: subsídios para a formação de professores indígenas


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Martins Fontes, 2002.
SILVA, Maria De Lurdes da; GARCIA, Suelen Campos. Recanto das Letras. Estruturalismo
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SCARPA, Ester Mirian. Aquisição da linguagem. Introdução à lingüística: domínios e


fronteiras, v. 2, p. 203-232, 2001.

SKINNER, Burrhus Frederic. O comportamento verbal: www.ufscar.br/~bdsepsi/254a


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Rosana Silva do Espírito; CAVALCANTE, Sandra Maria Silva; ASSUMPÇÃO Solange
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