0410 - O CORPO SÍGNICO - Resumo Dirigido
0410 - O CORPO SÍGNICO - Resumo Dirigido
0410 - O CORPO SÍGNICO - Resumo Dirigido
01 – Quem é a autora?
Jaqueline Ferreira, formada em Medicina Geral Comunitária com a Antropologia Médica. A inserção no campo deu-se através do
consultório médico, espaço criado com o fim específico de desenvolver esta pesquisa, aliando, desta forma, minha formação em
Medicina Geral Comunitária com a Antropologia Médica.
A capacidade de pensar, exprimir e identificar estas mensagens corporais está ligada a uma leitura que procura determinada
significação. Esta leitura está na dependência direta da representação de corpo e de doença vigente em cada grupo. Neste sentido, o
corpo pode ser tomado como um suporte de signos, ou seja, suporte de qualquer fenômeno gerador de significação e sentido.
Um paciente entende o que é intestino preso, mas não constipação.
Desta maneira, pode-se pensar na ideia de corpo como signo se tomarmos aqui o conceito de signo utilizado por Barthes
(1971). Para este autor, a função do signo é comunicar ideias por intermédio de mensagens, ou seja, o signo tem o objetivo de
transmitir uma informação, fazendo parte assim de um processo de comunicação.
O signo só tem valor enquanto tal se compartilhado pelo grupo social.
06 – A noção de saúde e doença é também uma construção social. O que são sintomas e sinais?
"Sintoma é a sensação subjetiva referida pelo doente como dor, ansiedade, mal-estar, alucinações, sensação de vertigem,
etc. É um fenômeno só por ele sentido e que o médico, ordinariamente, não percebe nem lhe é fácil comprovar, sendo revelado
apenas pela anamnese ou interrogatório.
Sinal é a manifestação objetiva da doença, física ou química, diretamente observada pelo médico ou por ele provocada,
como tosse, alterações da cor da pele, ruídos anormais do coração, convulsões..."(Romeiro, 1980:3)
O estudo dos sintomas e sinais diz respeito à semiologia médica, uma disciplina no campo da medicina destinada ao estudo
dos métodos e procedimentos do exame clínico, de modo a buscar o corpo como gerador de signos, da mesma forma que a
semiologia geral preocupa-se com a linguagem enquanto geradora de signos. É na procura dos sintomas e sinais que o médico
coordena todos os elementos para construir o diagnóstico e deduzir o prognóstico.
07 – A história do sintoma e do sinal?
Segundo Foucault, o destaque ao sintoma como a única forma de acesso à doença no sentido hipocrático perdura até o século XVIII.
Para ele, com o advento da clínica anátomo-patológica há uma reformulação do saber, onde a semiologia médica passa a ser um
conjunto de técnicas que permite aliar a leitura dos sintomas com a pesquisa dos sinais onde entram em jogo a escuta e o olfato,
além do olhar já existente. Com o advento da patologia, como campo institucionalizado de conhecimento, o acesso à doença tornou-
se visível.
Com isto, não é mais uma determinada patologia que se insere no corpo, mas é o próprio corpo que se torna doente. Em
consequência disto, como foi dito, há uma reformulação do saber, onde a semiologia médica passa a ser um conjunto sistematizado
de técnicas e, legitimado como uma área específica do conhecimento científico, permite aliar a leitura dos sintomas com a pesquisa
dos sinais. Foucault refere que daí decorre que cada órgão dos sentidos do clínico recebe uma função instrumental, onde a visão, o
tato e a audição fazem com que um mal inacessível seja trazido à superfície, sendo deixado à mostra. Os sinais visíveis para o
médico englobam desde a expressão facial, a marcha, a postura corporal e tudo o que recobre o tecido da pele e membranas.
10 – O que é a dor?
A dor é uma experiência subjetiva, privada e qualquer informação sobre ela há de provir apenas daquele que a sente. Talvez o fato de
ser difícil descrevê-la faz com que recorramos constantemente a imagens e metáforas para representá-la, como por exemplo:
"facadas", "pontadas" e "agulhadas", o que abordarei mais adiante. Para Joana, de 45 anos e dona-de-casa, a dor é "sinal de que
alguma coisa está errada no organismo, dor é sofrimento".
Do ponto de vista clínico, a dor exerce um papel fundamental ao demonstrar que algo não vai bem no organismo. Se a
maioria dos males corporais são acompanhados de dor, ela é um importante fator diagnóstico para o médico, e o fato de indicar ao
indivíduo a ocorrência de alguma alteração em seu corpo a faz ser um mecanismo de proteção do organismo.
14 – O mascaramento da dor.
Já um tumor indolor, que para o médico é um indício de uma possível patologia, pode ser desprezado pelo paciente simplesmente
"porque não dói". Por outro lado, uma dor torácica é logo relacionada com a hipótese de uma patologia cardíaca, o que faz com que
muitas vezes o indivíduo recorra a vários serviços de saúde c exija uma série de exames subsidiários a fim de se tranquilizar. Em
outros casos a dor é considerada um fenômeno normal, não implicando o sentimento de estar doente. O caso mais típico é a
dismenorréia , onde esta sensação diz respeito à representação de corpo feminino, em que este fenômeno é encarado como fazendo
parte da vida da mulher. Do ponto de vista estatístico, as dores mais comuns que aparecem na consulta médica são a dor de cabeça
e a dor abdominal.
15 – As dores marcantes.
Sabe-se pela literatura médica e pela experiência clínica que as dores mais intensas que podem atingir o ser humano são as
provocadas pelo infarto do miocárdio e as cólicas renais. Entre as dores crônicas se destacam as dores reumáticas e o câncer.
Nestes casos, a dor como sensação crônica passa a ser uma moléstia em si mesma, uma entidade própria, como diz Emilia, minha
informante, ao comentar o caso de sua amiga que está com câncer e combatendo a dor à base de sedativos potentes: "Ela não se
queixa de dor por causa dos remédios fortes que eles dão, mas a dor tá aí."
16 – A violência e a dor.
As associações como "facadas", "agulhadas", "socos", são frequentes, representando a dor como forma de agressão, como algo
socialmente identificado como violento, uma vez que a violência está plenamente inserida neste contexo social. As pessoas vivem ou
viverão esta experiência, seja como vítima ou como autor, onde a violência não se restringe somente ao crime, mas também ao
desemprego, à falta de moradia, a condições de trabalho insalubres, só para citar algumas. Particularmente, para os moradores da
Lomba do Pinheiro a violência faz parte do seu cotidiano. Além das baixas condições socioeconômicas da maioria dos moradores, os
crimes são frequentes, o que faz o bairro ser identificado como violento pela população em geral. Há gangues que se reconhecem
pelas siglas: VIP (Violência Integrada do Pinheiro), D.P. (Demônios da Pinheiro), G.F. (Gangue da Firmina), cujos nomes são por si só
significativos.
18 – Tempo da dor
Assim, observamos como a dor tem o seu tempo de aparecimento e de término, que neste caso coincide com o fim da vida.
Entretanto, esta categoria de tempo da dor não se exprime somente em termos de início e de término, como também em termos de
sua duração, uma vez que tanto a dor como qualquer outra sensação desagradável é experienciada como um tempo longo. Um
exemplo claro disto é quando tivemos poucas horas de insônia à noite e temos a sensação de que estivemos despertos a noite
inteira.
19 – A dor e sua localização
Ainda sobre os relatos acima, podemos concordar com Boltanski (1984), que classifica as características da dor conforme a sua
localização. De acordo com este autor, as dores torácicas são referidas como puntiformes e as dores abdominais como esfenoidais,
por exemplo. Isto condiz com as falas de Luciana e Zilma, que se referem à sua dor no peito como "pontadas", e Miriam e Elza, que
sentem dor abdominal como se estivessem "torcendo" seus órgãos internos, o que corresponde ao que o autor chama de "dor
esfenoidal". A sensação de "bola na barriga" é muito comum para descrever as dores abdominais e dizem respeito à sensação
desagradável de um volume anormal no abdômem e com a ideia implícita de algo não digerido.
22 – A dor e a trajetória.
A dor também é percebida como seguindo uma trajetória própria pelo corpo:
"Tenho uma dor que começa no lado do umbigo, bem no ovário, e que vem morrer na perna." (Dione, 31 anos, dona-de-casa)
"A dor que eu tenho começa no ouvido esquerdo e caminha para o lado direito e vai até a perna. É uma eletricidade." (Francisco, 61
anos, dona-de-casa)
A possibilidade de um percurso da dor com início em determinado ponto, indo findar em outro, indica a autonomia desta. A própria
ideia da dor como eletricidade referida por Francisca nos mostra como a dor pode ser percebida como dotada de energia própria,
como um agente poderoso e interruptor do estado de harmonia e da ideia de uma suposta inércia do corpo, do silêncio orgânico
significativo de saúde.
25 – Conclusão
Muito mais pode ser dito sobre a dor. Nesta breve exposição tentei demonstrar como a percepção e o relato a respeito da dor são
influenciados por vários elementos. São eles a vivência cultural do doente, o seu repertório linguístico, o seu domínio (ou não) de
termos médicos, as suas crenças e representações sobre corpo e doença, as suas experiências individuais em geral, e suas
experiências c sua memória específica quanto à sensação de dor.