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Cosmos, Caos e o Mundo Que Virá by Norman Cohn
Cosmos, Caos e o Mundo Que Virá by Norman Cohn
Cosmos, Caos e o Mundo Que Virá by Norman Cohn
AGRADECIMENTOS
PREFÁCIO
1 - O EGITO
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
2 – MESOPOTÂMIA
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
3 - ÍNDIA VÉDICA
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
4 - ZOROASTRISMO
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
II - CRISOL SÍRIO-PALESTINO
6 - UGARIT
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
8 - O EXÍLIO E O PÓS-EXÍLIO
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
11 - A SEITA DE JESUS
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
12 - O LIVRO DO APOCALIPSE
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
POSFÁCIO
NOTAS
AGRADECIMENTOS
Por muitos anos depois de iniciada a elaboração deste livro, fui professor na
cátedra Astor-Wolfson da Universidade de Sussex, posição que me permitiu
muito mais tempo para pesquisas do que o normalmente desfrutado pelos
acadêmicos britânicos. Por isso sou muito grato a David Astor e à Wolfson
Foundation. Também recordo com grande apreço o ano que passei como fellow
desta admirável academia que é o Netherlands Institute for Advanced Studies,
em Wassenaar.
O que devo à minha esposa e ao meu filho Nik é incalculável. Se não fosse
pelo estímulo deles, o livro nunca teria sido terminado, e, sem suas críticas, ele
teria deficiências ainda maiores. São de minha inteira responsabilidade,
evidentemente, os erros, os descuidos e quaisquer outras falhas.
PREFÁCIO
Wood End
Hertfordshire, Inglaterra
I - O ANTIGO ORIENTE PRÓXIMO
1 - O EGITO
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
A forma pela qual o demiurgo se manifestou pela primeira vez foi objeto de
uma elaboração imaginativa. Segundo textos do templo de Edfu, ele saiu voando
da escuridão primordial sob a forma de um falcão e pousou em um caniço à
margem da água. Os sacerdotes hermopolitanos conseguiram ser ainda mais
imaginativos. Segundo eles, logo após a “primeira ocasião” oito divindades
primitivas, algumas semelhantes a sapos, outras a serpentes — todas elas,
portanto, intimamente relacionadas com o caos aquático —, criaram uma flor de
lótus no lago do templo em Hermópolis, e deste lago Ra emergiu como uma
criança. Os hermopolitanos também falavam de um ovo cósmico que fora
chocado no outeiro primordial. Mas a iconografia favorece ainda outra versão,
esta de origem heliopolitana. Cansado de flutuar no Nun, o demiurgo subiu para
o outeiro, dotado já de uma forma humana, com olhos, boca, língua, mãos,
coração, braços, pernas, pênis.
Mas não elimina o abismo que havia entre eles. Os deuses viviam além dos
limites da terra — nos céus ou nos mundos inferiores — e os seres humanos não
tinham contato direto com eles. No entanto, atuavam na terra, e de maneira
muito poderosa. Um campo de força circundava cada divindade e de todas
irradiava-se um poder mágico, afetando tudo o que merecesse a atenção dele ou
dela. Além do mais, embora fossem diversos, os deuses e as deusas formavam
uma comunidade, quase uma família: seus relacionamentos parentais, filiais,
matrimoniais e de outros tipos, associados às suas várias personalidades e
funções, constituíam a dinâmica oculta do universo. Era uma concepção que
inspirava temor, e os egípcios de fato expressavam um temor respeitoso pelo
poderio e majestade de suas divindades — mesmo hoje pode-se ver a intensidade
disso na câmara de colunas em Kamak, com suas 134 colunas gigantes dispostas
em dezesseis fileiras.
O temor, porém, estava mesclado ao amor. Como diz um dos hinos: “Eu me
prostro com temor de ti, eu ergo os olhos para ti com amor”.7 Segundo a
concepção dos egípcios, os homens e as mulheres foram criados para existir,
como os próprios deuses, e não para servir de escravos a estes. Na verdade, eles
estavam con vencidos de que, ao organizar o mundo, o demiurgo sentiu prazer
em adaptá-lo, com a luz do sol, as plantas, os animais — e também com os
deuses — às necessidades humanas. E seu exemplo estabeleceu o tom para os
outros deuses: quase todos eram benevolentes. Depender de tais seres não era
nenhuma dificuldade.
Além disso, os egípcios sabiam que, tal como eles próprios, os deuses
estavam subordinados e eram sustentados pelo princípio de ordem que abrangia
tudo e era chamado de ma’at.
Capítulo 4
Logo ma’at adquiriu um significado muito mais amplo: a palavra foi usada
para indicar um princípio de ordem tão abrangente que governava todos os
aspectos da existência. O equilíbrio do universo e a coesão de seus elementos, a
seqüência das estações, o movimento dos corpos celestes, o curso diurno do sol
e, entre os seres humanos, o cumprimento adequado dos rituais e obrigações
religiosas pelos sacerdotes; a correção, a honestidade e a sinceridade nas
relações pessoais — tudo isso estava incluído em ma’at. Para o pensamento
egípcio, a natureza e a sociedade eram dois lados de uma realidade única: tudo o
que fosse harmonioso e regular em qualquer um dos lados era uma expressão de
ma’at.
Capítulo 5
Isto era um ataque à monarquia legítima, pois entre os deuses Osíris era rei,
abaixo apenas de Ra. Ao matá-lo antes que pudesse gerar um herdeiro, Seth
criou a possibilidade de usurpação da realeza. Porém ísis, esposa e irmã de
Osíris, juntou os membros dispersos, inclusive o falo. Desse modo, foi capaz de
dar ao esposo um herdeiro póstumo, Hórus — prova viva de que a linhagem e a
transmissão legítima da monarquia podem triunfar até mesmo sobre a violência
mais extrema.
Em uma luta individual, Horas — em parte graças aos dotes mágicos de sua
mãe, em parte devido à própria astúcia — conseguiu subjugar o assassino de seu
pai.
O faraó não só descendia dos deuses, como ele próprio era semidivino. A
partir do Antigo Império, acreditava-se que cada rei, ao morrer, tomava seu lugar
entre os deuses. E, mais importante, enquanto ainda vivo o rei era visto não
apenas como filho de uma coletividade de deuses e deusas, mas especificamente
como o “filho de Ra”. No Novo Império, a implicação deste epíteto foi
explicitada: manteve-se a ficção de que o deus-sol, sob a forma do rei no poder,
sempre se acasalava com a principal esposa do rei, a fim de gerar um ser único
que ficava a meio caminho entre os deuses e a humanidade. O acasalamento é
retratado nas paredes de vários templos e a inscrição que acompanha a imagem
no templo de Amenhotep III (1391-53), em Luxor, mostra até que ponto se
supunha físico o acasalamento:
Palavras proferidas por Amon-Ra, Senhor de Karnak, preeminente em seu harém, quando
tomou a forma desse esposo dela, rei Menkheperura [Tuthmosis IV], dando-lhe vida. Ele a
encontrou adormecida na parte mais recôndita de seu palácio. Ela despertou ao sentir a divina
fragrância e voltou-se para Sua Majestade. Ele foi direto a ela, excitado por ela. Ele permitiu
que ela contemplasse sua forma divina, depois de ter se colocado diante dela, de modo que ela
se rejubilasse com sua perfeição. O amor dele penetrou-lhe o corpo. O palácio foi tomado pela
fragrância divina e todos os seus odores eram os da terra de Punt.19
Capítulo 6
O que se esperava do rei não foi e não podia ser mudado, e isto determinava
o que se atribuía a ele. Ramsés III (1198-66) não hesitou em reivindicar para si a
assombrosa vitória que Ramsés II supostamente havia infligido aos hititas —
mesmo que em sua época os hititas já tivessem deixado de existir como potência
política. O rei Sahure (2455-43) derrotou os líbios no campo de batalha — e seu
sucessor, Pepi II, apropriou-se dos relatos dessa mesma vitória, embora
provavelmente nunca tenha lutado contra os líbios. Tutankhamon (1361-52), que
morreu aos treze anos de idade, foi retratado como vitorioso sobre povos ao sul e
a leste do Egito, embora nunca tenha realizado campanhas contra eles.
Considerar tais relatos como meras falsificações históricas é um equívoco. A
precisão, ou imprecisão, factual deles era irrelevante: sua intenção era mostrar
que o faraó em questão havia de fato cumprido o papel que lhe cabia,
reafirmando e fortalecendo o cosmos.
Uma das cerimônias de culto realizadas nos templos egípcios era um ritual
de “aniquilação dos inimigos”. Este normalmente assumia a forma de um
sacrifício sangrento, não de seres humanos mas de animais selvagens — animais
que, por uma ou outra razão, eram tradicionalmente rotulados como inimigos
dos deuses. Essas vítimas eram identificadas de maneira explícita com os povos
“rebeldes”. Isto explica por que, em muitos templos, imagens dos triunfos do
faraó no campo de batalha são mescladas a imagens dele caçando e abatendo
animais selvagens. Em Edfu, por exemplo, é representada uma enorme rede na
qual foram capturados não apenas pássaros, mas também animais e homens — e
estes são prisioneiros de guerra, ajoelhados e com os braços firmemente
amarrados. O rei e dois ou três deuses estão fechando e arrastando a rede. Os
textos que as acompanham deixam claro que tais imagens eram reforçadas por
cerimônias e fórmulas encantatórias, destinadas a submeter e destruir os
inimigos do rei.37
Tão importante era essa percepção do faraó e de seu papel que não sofria
abalos nem mesmo quando o Egito era conquistado por uma potência
estrangeira. Pelo contrário, qualquer monarca estrangeiro que viesse a governar
o Egito era visto como um faraó legítimo, se se dispusesse a aceitar os títulos
faraônicos e a cultuar os deuses egípcios. Tanto o conquistador persa Cambises
como Alexandre, o Grande, tiveram o bom senso de agir assim. Aqueles
governantes estrangeiros que deixaram de satisfazer essas expectativas foram
eles próprios rotulados de agentes do caos: seus reinados significavam uma
ausência temporária do faraó e de ma’at, uma vitória temporária do caos.38
Capítulo 7
As Profecias de Neferti terminam saudando o rei Amenemhet I como o governante que irá restituir
ma’at e expulsar da terra o caos.
Na visão dos egípcios, ma’at estava sob permanente ameaça dos seres
monstruosos que habitavam os abismos do mundo inferior, e o líder dessas
personificações de isfet era a gigantesca serpente Apófis, ou Apep, que se
assemelhava a um dragão.44 Apófis era um deus, mas um deus maligno —
“aquele do semblante maligno”, “aquele do caráter maléfico” são alguns de seus
epítetos. Embora sua origem tenha se perdido nas névoas do tempo, foi durante o
turbulento Primeiro Período Intermediário, quando a estabilidade característica
do Antigo Império parecia perdida para sempre, que ele primeiro se distinguiu
como uma força de imenso poder destrutivo. E assim permaneceu até o Novo
Império e mesmo depois dele.
A despeito de tudo, Apófis nunca foi destruído, pois era imortal. Além do
mais, havia existido desde sempre. O mundo e os deuses tinham uma origem,
mas o caos e seus monstros não haviam sido criados. Isso valia não apenas para
Apófis, mas para todo um exército de seres estranhos e ameaçadores — criaturas
híbridas, bestas monstruosas, homens sem cabeça — mostrados nos muros das
sepulturas no Vale dos Reis, alinhados às margens do rio subterrâneo,
ameaçando a barca solar enquanto ela segue seu curso. Todos eles viviam fora
do mundo ordenado; não faziam parte da criação e existiam por toda a
eternidade.47 Tudo o que se podia fazer era mantê-los à distância.
Capítulo 9
Esses ritos são descritos em cenas pintadas nas paredes dos templos, ao lado
das respectivas instruções. Toda manhã, os sacerdotes oficiantes retiravam a
estátua do deus ou deusa do santuário em que havia passado a noite, removiam-
lhe as vestes e a maquiagem do dia anterior e, depois, purificavam-na e tomavam
a vesti-la. Mas o que acima de tudo proporcionava à divindade força para
sustentar o mundo ordenado eram as oferendas dos fiéis: todos os dias ele ou ela
eram mais do que satisfatoriamente alimentados. Não fazia diferença se depois
os alimentos, intocados, eram removidos do edifício do templo e distribuídos
entre os sacerdotes, como pagamento por seus serviços: mesmo assim a
divindade era revigorada.
O culto nos templos era inconcebível sem o faraó. Era ele quem mandava
construir os templos e cuidava para que se restaurassem os dilapidados. Era ele
quem assegurava que oferendas regulares e abundantes fossem feitas. E ele os
dotava com terras — e de maneira tão generosa que, no Novo Império, os
templos possuíam cerca de um terço de todas as terras cultiváveis, nas quais
vivia quase um quinto de todos os habitantes do país.
Acima de tudo, o faraó era, em cada templo, o sumo sacerdote. Se
aceitássemos as pinturas murais como historicamente exatas, seria forçoso
concluir què ele oficiava todos os ritos em todos os templos do Egito, sem
nenhuma ajuda dos sacerdotes. Na realidade, ele provavelmente estava presente
na cerimônia de fundação de cada templo e, na capital, talvez realizasse o rito
diário do principal deus do Estado. Todos os outros ritos eram oficiados por
sacerdotes. Porém, embora as pinturas murais não sejam literalmente
verdadeiras, elas o são em um nível simbólico: considerava-se que o rei estava
presente no sacerdote. Era a presença dele no culto que garantia a continuidade
da ordem estabelecida pelos deuses. Em determinado rito sempre retratado na
parede dos fundos do santo dos santos, o faraó na verdade oferece ma’at, sob a
forma de comida ou de uma estatueta da deusa Ma’at, à divindade residente.51
Não se pode imaginar simbolização mais eloqüente da importância da ordem
para os egípcios.
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Por volta do Médio Império, todo egípcio, homem ou mulher, tinha acesso a
essas bênçãos. Embora aqueles que tivessem recursos para tanto pudessem, além
disso, erguer sepulturas monumentais, isto já não era necessário. Mais
importantes eram as fórmulas mágicas.
A magia, porém, não era tudo. Estavam habilitados para a vida futura
somente os que haviam adorado Osíris e conduzido suas vidas de acordo com
ma’at. Acreditava-se que, ao morrer, a pessoa apresentava-se perante um tribunal,
com juízes (normalmente o próprio Osíris, auxiliado por cerca de 42 juízes
assistentes), advogados de acusação e defesa, testemunhas e até um escrivão (em
geral o deus Thoth). Em um aposento muitas vezes chamado de câmara da ma’at
dupla, isto é, a ma’at da vida e da morte, o coração do falecido era colocado no
prato de uma balança, enquanto no outro uma pena representava ma’at, a Fim de
se determinar o quanto sua conduta havia sido conforme à ordem estabelecida
pelos deuses.
É possível ter uma idéia do que isso significava pelas chamadas “confissões
negativas” — notas justificativas que os egípcios mandavam colocar nas
próprias sepulturas. Essas notas não apenas insistiam em que o falecido havia
sido assíduo em suas oferendas aos deuses, sobretudo a Osíris, mas também que
não havia explorado nem prejudicado o próximo. Nem matado ou roubado. Nem
havia causado escassez desviando o suprimento de água ou destruindo as safras.
Nem despojado ninguém de sua herança. Em resumo, que havia sido uma pessoa
de ma’at.
É de notar que o falecido nada diz do bem que praticou, mas apenas do mal
que se absteve de fazer. Uma vida beatífica após a morte era acima de tudo uma
recompensa por não se ter aumentado o mal no mundo.63 Aqueles que haviam
vivido de acordo com isfet e não segundo ma’at, esses eram excluídos. Os
transgressores eram designados pela mesma palavra atribuída aos inimigos
políticos e uns e outros podiam ser associados ao eterno monstro do caos, a
serpente Apófis. Uma série de obras sobre o mundo inferior, datadas de 1500
a.C., conta-nos o destino deles.64
Era, sob todos os aspectos, o oposto do que estava reservado aos devotos.
Nus, esfomeados, surdos e cegos, isolados de todo contato com o deus-sol ou
com Osíris, eles eram lançados no caos que circundava o mundo ordenado. Para
todos os seres humanos, a morte significava sair do mundo ordenado e cair no
caos que sempre havia estado ali; porém, enquanto os mortos devotos
experimentavam apenas a força rejuvenescedora do oceano primordial e
retomavam renovados e imortais ao mundo ordenado, os transgressores de ma’at
passavam por uma “segunda morte”. Imaginado às vezes como uma terrível
escuridão, como um oceano de fogo ou ainda como um demoníaco crocodilo
devorador, o caos os consumia. E se em algumas versões isso significava
aniquilação, em outras tratava-se do tormento etemo: um antegozo daquele
inferno que iria assombrar tantas mentes cristãs em épocas posteriores.
2 – MESOPOTÂMIA
Capítulo 1
Mesmo assim não havia garantia de êxito. O Tigre e o Eufrates eram muito
menos confiáveis do que o Nilo. Bastava que o nível das águas se mantivesse
baixo por alguns poucos anos para que a terra se tornasse um deserto; e, por
outro lado, uma única cheia excessiva podia transformá-la em um gigantesco
pântano. Não importava o que o homem conseguisse em termos de irrigação e
agricultura, ele sempre corria o risco de ver desfeito seu trabalho. O futuro
sempre era imprevisível e ameaçador. Às vezes, chuvas torrenciais e ventos
abrasadores carregados de poeira tornavam a vida quase intolerável. E mesmo
nas melhores épocas a Mesopotâmia era uma terra difícil de ser cultivada. Não
era, de forma alguma, rica em recursos naturais: metais, pedras, madeiras tinham
de ser trazidos de outras regiões. A vida era uma luta sem trégua contra a
natureza recalcitrante.
Para os mesopotâmicos, o cosmos era algo muito real, tão real quanto as
forças que o ameaçavam.
Capítulo 2
Por volta do terceiro milênio, o mundo todo era visto como um Estado.
Sobre a superfície da terra, este mundo não se estendia além da Mesopotâmia e
das nações com quem mantinha relações. A Mesopotâmia, e sobretudo sua
capital — Babilônia, para os babilônios, e provavelmente Nipur, para os
sumérios —, era o eixo do mundo, o qual era governado por deuses e deusas
mesopotâmicos.
Capítulo 3
Não havia maior glória para um rei do que receber de um deus um pedido
para que reconstruísse seu templo arruinado, pois ao fazer isso ele estava
reafirmando a ordem estabelecida no céu.6 Todavia, o templo precisava ser
erguido exatamente no mesmo local, seguindo exatamente o mesmo projeto,
exatamente com os mesmos materiais e a mesma ornamentação do templo
anterior. Quando o último de todos os reis mesopotâmicos, Nabu-na’id da
Babilônia (555-39), estava reconstruindo um templo do deus-sol, este mesmo
indicou-lhe os alicerces que haviam sido colocados por um dos primeiros reis
sumérios e que ninguém havia visto desde então. Este templo primitivo, por sua
vez, era uma cópia exata de outro templo ainda mais antigo, erigido pelos
próprios deuses na época da criação do mundo, quando ainda não havia nenhum
ser humano. O protótipo deste templo primordial estava preservado no céu;
assim, ao reconstruir o templo, o rei seguia um modelo supraterreno que havia
existido, imutável, desde o começo de tudo.
Era dessa maneira que cada rei via sua própria obra — desde o grande
governante do primeiro império babilónico, Hamurabi (1792-50), até o assírio
Senaqueribe (704-681), o qual, ao reconstruir um templo, alegou que
desenterrara “fundações cuja estrutura havia sido traçada ali para toda a
eternidade na escrita do céu”. E isso não era tudo: durante a reconstrução, os
deuses não apenas prescreviam as medidas do templo, como determinavam os
próprios gestos do rei, de modo que reproduzissem os gestos que eles mesmos
haviam feito quando, no início, haviam erguido o primeiro exemplar do
protótipo celeste.
Capítulo 4
Eu fiz com que as pessoas descansassem em moradas agradáveis; Eu não permiti que ninguém
as aterrorizasse. Os grandes deuses me convocaram, para que me tomasse o benevolente
pastor cujo cetro é honrado; Minha sombra benigna estende-se sobre a cidade. Em meu peito
eu trago o povo da terra da Suméria e da Acádia; Ele prosperou sob minha proteção; Eu os
governei em paz; Eu os abriguei sob minha força.12
Capítulo 5
A Ishtar acádia era a mesma deusa que os sumérios conheciam por Inana.
Era a irmã de Utu/Shamash — o que é bastante compreensível, pois a justiça no
reino e a vitória sobre os inimigos estrangeiros eram ambas manifestações
importantes da ordem do mundo. Ishtar controlava os temporais e a chuva — e
podia reter a chuva a fim de obrigar uma cidade a se submeter a outra favorecida
por ela. Também era capaz de descer até a terra em forma de tempestade, com
trovões que faziam tremer a terra e raios que incendiavam as plantações. Era
normal que se imaginasse um deus da tempestade participando da batalha nas
nuvens: este era o caso do deus da tempestade Ninurta, assim como o de Ishtar.
A batalha era chamada de “dança de Ishtar” e a própria deusa se vangloriava:
Quando me ergo no meio da batalha, Eu sou o coração da batalha, o braço dos
guerreiros. Meu pai [An] deu-me os céus, deu-me a terra, Eu sou Inana! A soberania ele me
deu, a realeza ele me deu, o fragor da batalha ele me deu, o ataque ele me deu, a tempestade
ele me deu, o furacão ele me deu! 15
Ao longo de toda a história da Mesopotâmia, os reis esperaram e
comprovaram o apoio divino na guerra, e da maneira mais imediata e concreta:
não era só Inana/Ishtar que participava da batalha, mas também os deuses
tutelares. Uma esteia erigida para comemorar a vitória de um rei da cidade
suméria de Lagash contra a cidade vizinha de Umma mostra o deus tutelar de
Lagash, Ningirsu, lançando sua rede sobre os inimigos da cidade e rompendo-
lhes o crânio com sua maça. Esta batalha teve lugar logo após 2500 a.C. Um
baixo-relevo feito quase dois mil anos depois mostra o deus nacional da Assíria,
Ashur, pairando no ar sobre o rei enquanto este entra na batalha, empunhando
seu arco exatamente na mesma posição em que o rei o faz. E, depois da vitória, o
rei atribuiria o êxito aos deuses e não ao comando dele mesmo:
O temor dos grandes deuses, meus senhores, tomou conta deles, eles viram minhas poderosas
tropas de assalto e ficaram enlouquecidos [de terror]. Ishtar, rainha do ataque e do combate
corpo a corpo, que ama meus sacerdotes, postou-se ao meu lado, quebrou os arcos deles e
dispersou sua formação de batalha, de modo que todos disseram “Este é o nosso rei!”. Ao seu
sublime comando, eles se aproximaram de mim, um após o outro, e se regozijaram como
ovelhas, e me trataram como senhor deles.16
Outros mitos nos contam de que modo a ordem do mundo foi ameaçada por
monstros saídos do abzu subterrâneo, eles próprios dotados de toda a força
destrutiva das águas do caos. Labu era um gigantesco dragão marinho, com 480
quilômetros de comprimento e 48 de altura. De tempos em tempos, saía do mar
para devastar a terra, dizimando pessoas e animais, aterrorizando até mesmo os
deuses. Aqui também o primeiro deus escolhido para enfrentar o monstro
recusou-se a lutar. No final, o deus da tempestade, cavalgando as nuvens,
conseguiu destruir o dragão; e parece que foi recompensado com a soberania
sobre os deuses.
Esses mitos sumérios de uma luta entre deuses e monstros do caos são os
primeiros exemplos —já eram conhecidos antes de 2000 a.C. — de uma tradição
que iria perdurar por milênios. Tratava-se também de uma tradição muito
difundida: como veremos nos capítulos posteriores, era conhecida dos hindus
védicos e, quase certamente, também dos iranianos. Na Mesopotâmia. receberia
sua expressão mais famosa na Babilônia, quando já possuía uma história de mais
de mil anos.
Capítulo 7
Nascido em Eridu, Marduk era filho de Ea. Uma esplêndida criatura desde o
nascimento, com força e sabedoria sobrenaturais, ele é o verdadeiro herói do
mito. Suas aventuras começaram quando seu avô Anu criou os ventos
tempestuosos para que brincasse. Mas, com isso, agora outros deuses é que não
conseguiam dormir. Esses deuses, espíritos afins ao de Apsu, foram bem-
sucedidos ali onde Apsu fracassara: convenceram a própria Tiamat a tomar
alguma medida contra o principal grupo de deuses, aliados de Anu, Ea e Marduk
— os quais afinal eram coletivamente responsáveis por ela ter perdido seu
consorte Apsu.
A fim de que pudesse preservar o mundo, Marduk foi nomeado rei perpétuo
“dos deuses do céu e da terra”. E ao jovem deus foi atribuída uma nova função:
com Tiamat fora do caminho e o universo criado, ele ficou encarregado da tarefa
de administrá-lo em benefício dos deuses, os quais em troca lhe prestariam
obediência. O primeiro pedido de Marduk foi que os deuses lhe construíssem um
palácio que servisse de quartel-general administrativo real — e que também
poderia servir, quando necessário, como residência de todos os deuses. Esse
“palácio” era, evidentemente, o templo de Marduk na Babilônia: Esagila,
imponente símbolo da ordem e da permanência, conhecido pelos babilónicos
como “o palácio do céu e da terra”, a sede da realeza.
No nono dos doze dias do festival, as estátuas dos deuses eram carregadas
em procissão até um templo especial, chamado de “casa de akitu” erguido fora
dos limites urbanos. Na Assíria, onde também se celebrava o akitu, o rei
Senaqueribe mandou retratar a cena nas portas de cobre do templo e gravar ali
sua interpretação: “uma figura de Ashur, empunhando o arco sobre sua
carruagem, prestes a lutar contra Tiamat [...] [além dos] deuses que marcham
adiante e os deuses que marcham atrás dele [...] [e] Tiamat e as criaturas [que
estavam] nela”.23 Presume-se que, na casa de akitu, Tiamat era representada por
uma plataforma; quando a procissão ali chegava com a estátua de Marduk, esta
era colocada sobre a plataforma, de modo a simbolizar sua vitória sobre Tiamat,
enquanto as estátuas dos outros deuses ofereciam congratulações e presentes.24
No decorrer do festival, a destruição de Tiamat também era simbolizada por atos
como o da quebra de um cântaro ou a bissecção de uma pomba. O significado de
tudo isso era explicitado quando um sacerdote, recluso na casa de akitu, recitava
o Emana elish perante a estátua do deus-herói: sob os auspícios de Marduk,
reafirmava-se a ordem no universo.
Capítulo 8
Essas pessoas sabiam muito bem que os grandes deuses não eram apenas
todo-poderosos, mas também inescrutáveis:
Uma nuvem de tempestade pairando no horizonte seu coração inescrutável, Sua palavra, uma
nuvem de tempestade pairando no horizonte, seu coração inescrutável; a palavra do grande
An, uma nuvem de tempestade pairando no horizonte, a palavra de Enlil, urna nuvem de
tempestade pairando no horizonte, seu coração inescrutável[...]26
E ainda:
Quem conhece a vontade dos deuses celestes? Quem penetra os desígnios dos deuses
subterrâneos? Onde os mortais aprenderam o caminho de um deus? Aquele que ontem estava
vivo hoje está morto. Estou perplexo com tudo isso; não entendo seu significado.21
O mero enfado por parte dos seres humanos poderia acarretar-lhes uma
punição impiedosa. Um mito incorporado em um poema acádico de meados do
segundo milênio mostra os deuses agindo em relação à humanidade da mesma
maneira que Apsu agira em relação aos deuses.28 Depois que os seres humanos
foram criados para aliviar os deuses de suas tarefas, os primeiros se
multiplicaram com tanta rapidez que, doze séculos depois, o burburinho de tanta
gente havia se tornado intolerável, “a terra mugia como um touro”.
Impossibilitado de dormir, Enlil convenceu os deuses a enviarem a peste — o
que de fato reduziu a população e também o barulho. No entanto, depois de
outros doze séculos, a população e o ruído haviam retomado aos mesmos e
elevados níveis anteriores. Desta vez, as chuvas foram interrompidas, medida
que teve algum êxito. Mas o problema continuou, assim como a impossibilidade
de Enlil dormir. Afrontados, os deuses se reuniram a fim de interromper durante
seis anos tanto as chuvas como as cheias anuais, e os resultados foram
horripilantes: vizinhos passaram a atacar uns aos outros, pais matavam e
devoravam os próprios filhos. Só a intervenção do benévolo Ea salvou a
humanidade: fazendo com que parecesse um acidente, permitiu que grandes
quantidades de peixe alcançassem os esfomeados.
Ishum concorda que Erra é capaz de tudo isso e de muito mais. Ignorando a
autoridade legítima de Marduk, Erra havia “desfeito o nó que mantém unido o
mundo”. Na Babilônia, provocou conflitos civis e massacres indiscriminados.
Agora a desordem social está desencadeando a desordem na natureza: o rio
secou e, no mar, grandes tormentas destroem os barcos pesqueiros. E Erra
planeja uma destruição ainda maior: não apenas de pessoas, mas de árvores,
edifícios, barcos, canais e mesmo do mundo subterrâneo. Os céus irão tremer, as
estrelas e os planetas irão se desviar de seu curso, o rei dos deuses abdicará, o
universo não mais será governado. Trata-se, na verdade, de um tributo a Erra
enquanto monstro do caos imensamente poderoso.
Não que a guerra em si mesma fosse condenada. Pelo contrário, como todos
os povos do antigo Oriente Próximo, os mesopotâmicos não tinham a menor
dúvida de que a guerra vitoriosa, travada sob os auspícios da deusa da vitória
Inana/Ishtar, era uma afirmação do cosmos. A guerra de Erra era a guerra do
ponto de vista do derrotado. Os estudiosos não estão de acordo sobre a data em
que foi composto o Poema de Erra, mas é evidente que deve ter sido inspirado
por algum desastre militar imposto à Babilônia. O objetivo do autor parece ter
sido o de explicar como tal coisa pôde acontecer a uma cidade que Marduk havia
fundado para ser sua residência e o centro do universo. Ele buscou uma resposta
na doutrina religiosa a que tinha acesso: os acontecimentos terrenos refletiam o
que ocorria entre os deuses; portanto, os infortúnios da Babilônia deviam ser um
reflexo da substituição de Marduk por Erra.
Capítulo 9
Capítulo 10
Mesmo para os mais afortunados dentre os mortos a vida após a morte não
oferecia nenhuma consolação pelos sofrimentos passados na terra. Sem dúvida,
havia deuses no mundo subterrâneo — não apenas Nergal e sua consorte
Ereshkigal, mas todo um grupo de deuses subalternos. Mas eles constituíam uma
companhia severa e morosa, morando em seu próprio palácio protegido, e não
demonstravam favorecimento a nenhum morto. A perspectiva de uma vida bem-
aventurada após a morte, tão presente para os egípcios, não existia para os
mesopotâmicos.
3 - ÍNDIA VÉDICA
Capítulo 1
Por volta de 2000 a.C., e talvez até mesmo antes, essas tribos haviam se
dividido em dois povos, os indo-arianos e os iranianos. No decorrer do segundo
milênio, a maior parte de ambos os povos abandonou as estepes. Seja qual for o
motivo — talvez a perda das terras de pastagem devido à seca ou a geadas
prolongadas, talvez a pressão do crescimento populacional —, tribos inteiras
migraram, levando consigo seus rebanhos. O principal grupo de indo-arianos
moveu-se pela Ásia Central e o Afeganistão, atravessou os perigosos
desfiladeiros do Hindu Kush e desceu até o vale do Indo — onde chegou em
ondas sucessivas, provavelmente ao longo de vários séculos a partir de 1500 a.C.
Capítulo 2
Capítulo 3
O Rig Veda nada traz das concepções que em épocas posteriores iriam
florescer com tanto vigor na índia: vastos ciclos de tempo girando lentamente,
cada época que declinava sendo seguida por um novo começo e um novo
declínio, incessantemente repetidos, almas individuais passando por milhares e
milhares de encarnações. Os hindus védicos viam as coisas de maneira muito
diversa. Para eles, o mundo ordenado, o cosmos, não passaria por modificações:
sempre imperfeito, ameaçado por forças destrutivas, mesmo assim continuaria a
existir indefinidamente da maneira que era.
Por outro lado, o cosmos não havia existido desde sempre, tendo sido
estabelecido em determinado momento do passado. O Rig Veda contém várias
passagens de como isso veio a ocorrer.6
Em algumas das mais famosas, é o deus Indra que domina o caos primordial
e cria o mundo ordenado.7
Indra é o deus mais importante no Rig Veda: nada menos do que um quarto
de todos os hinos é dedicado a ele — cerca de 250, ao passo que nenhum outro
deus recebe mais do que dez. A etimologia de seu nome é desconhecida, mas
alguns de seus epítetos sugerem que originalmente ele personificou a força bruta
da natureza, sobretudo da atmosfera: é um deus da tempestade, que brande o raio
e o trovão e controla a chuva. Mas é também um guerreiro divino, descrito em
termos antropomórficos como um gigante com braços e mãos poderosos, boca e
garganta vorazes e prodigioso apetite. Eternamente jovem e forte, tormentoso e
violento, mas também ardiloso, Indra é um lutador formidável. Move-se em uma
carruagem dourada puxada por dois cavalos baios vigorosos. Ao lançar seu raio
dotado de mil dentes, nunca erra o alvo.
Esse guerreiro divino era um deus de guerreiros. Não que seu culto fosse
praticado apenas, ou mesmo principalmente, por guerreiros profissionais: uma
tribo inteira o adorava como seu guardião — mas um guardião cujas habilidades
eram necessárias sobretudo em épocas de guerra. Pois — talvez já na estepe,
mas com certeza na época em que chegaram ao vale do Indo — as tribos indo-
arianas haviam desenvolvido um ethos guerreiro. Embora houvesse uma classe
guerreira, esperava-se que todo homem adulto pegasse em armas. E todos,
indistintamente, pediam ajuda a Indra — nenhum de forma mais devota do que o
rei, acima de tudo um senhor da guerra. Na verdade, argumentou-se de maneira
plausível que a exaltação de Indra foi uma maneira de legitimar a substituição
dos tradicionais chefes tribais por esses novos senhores.8
Nesse mito, Indra aparece como rei-sacerdote. Guiado por sua cadela divina
e auxiliado por um corpo de sacerdotes celestes chefiados pelo deus Brhaspati,
“senhor do canto cultual”, Indra vai até a caverna e força a entrada. Não
consegue isto pela força bruta, mas por meio de um sacrifício e de cantos
sagrados em tomo do fogo sacrificial. Essas canções são dotadas da força mágica
de rita — a ordem do mundo estabelecida pelos deuses — e o feito de Indra é
em si mesmo afirmação dessa ordem. E o seu canto liberta as vacas.
Capítulo 4
O Asat sempre existira, pois era o caos primordial. Agora havia sido
confinado sob a terra e separado dela por um grande abismo. Enquanto mundo
subterrâneo, tornou-se a morada de Vritra e de outros demônios. O Sat,
organizado em três partes — céu, atmosfera e terra —, tomou-se o domínio no
qual se moviam e existiam os deuses e os seres humanos. Sob a superfície de
pedra do céu, um caminho foi entalhado para permitir a trajetória do sol. Posto
afinal no lugar que lhe era de direito, o sol brilhou sobre toda a terra e tiveram
início suas revoluções. Quanto às águas cósmicas, elas escorreram da caverna
onde Vritra as mantivera presas — ou, segundo alguns relatos, do ventre
rompido do próprio Vritra —, formando os rios e correndo para o mar, como
pássaros voltando ao ninho ou carruagens em competição. Essas águas também
eram deusas — e, nesta condição, designadas pelo termo elogioso de praxe:
“vacas”. E Indra tornou-se o esposo delas. Graças a ele, os úberes dessas vacas
divinas estavam repletos: as águas, mudadas no mais maternal dos seres,
tornaram-se o oceano celeste que proporciona a chuva necessária à vida.
Era ocasião para uma grande festa, na qual todos os deuses entoaram
louvações a Indra. Também era uma oportunidade para os deuses assumirem as
funções que lhes cabiam. A lei cósmica, rita, fora estabelecida; e, de acordo com
ela e com a natureza de cada um deles, os deuses começaram a cumprir suas
tarefas.
Capítulo 5
Capítulo 6
Desse modo, não surpreende que Varuna também seja o deus dos
juramentos. O que é, na verdade, duplamente apropriado, pois, entre todos os
elementos naturais que controlava, Varuna estava relacionado de maneira mais
íntima com a água, ela própria associada aos juramentos.15 Quando era acusada
de algum delito e protestava inocência, uma pessoa podia ser mantida debaixo
d’água enquanto uma flecha era lançada e recuperada; se ainda estivesse viva
quando a flecha fosse recuperada, estava comprovado que falara a verdade e,
portanto, que era inocente.
Capítulo 7
Os benefícios do soma eram tão ilimitados que ele não poderia ser
simplesmente uma planta: devia ser um deus. E, de fato, Soma é descrito como o
amigo e protetor dos outros deuses, que podiam recorrer a ele para afastar os
inimigos e assegurar o próprio bem-estar. Soma era louvado em termos tão
ardorosos quanto os dedicados aos deuses supremos. Era o Rei Soma — rei das
plantas e das ervas, mas também rei dos deuses e dos seres humanos, senhor de
todos os povos, rei do mundo. Chegava mesmo a ser chamado de criador e
senhor do céu, conservador de tudo o que existe. O próprio sacrifício do soma
assumiu importância cósmica: o ruído da maceração era o trovão, o filtro de lã
representava as nuvens, as gotas de sumo eram a chuva, que por sua vez
estimulava o crescimento das plantas. Sob a forma de umidade, Soma estava em
todas as plantas e em todas as criaturas, humanas ou animais, que se
alimentavam de plantas. Soma também estava presente no sêmen. Na verdade,
Soma era o poder que assegurava a continuação do processo cíclico do qual
dependia toda a vida. A vida estuante era o seu domínio, assim como era o de
Varuna — só que no seu caso tratava-se da vida percebida como incessante
processo de reprodução.
O Rig Veda refere-se inúmeras vezes às águas como sendo o lar de Agni.
Quando, por exemplo, um sacerdote consagrava um rei despejando água no
soberano, ele invocava todos os Agnis que habitavam a água. Essa associação
entre fogo e água, tão paradoxal à primeira vista, faz sentido quando lembramos
que a água podia significar as águas cósmicas. Agni é chamado de “filho das
águas” e também de “touro das águas”, no sentido de que ele as engravida. É
como se o fogo fosse a força masculina primordial que penetrasse na força
feminina primordial a fim de renascer desta.23
Embora sendo uma força cósmica e primordial, Agni podia ser observado
atuando no mundo. Suas chamas eram como cabelos, seus olhos faiscavam, sua
língua lambia as árvores, seus dentes afiados as devoravam. Ele podia ser
aterrorizante quando incendiava a floresta e a estepe, manifestando então uma
força conquistadora e violenta. Mas estava presente por toda parte, o que lhe
dava uma extraordinária percepção: sabia de tudo o que acontecia, não podia ser
enganado, era um deus sábio e astuto. E também estava presente no sol,
difundindo sua radiância pelo céu e sobre a terra, trazendo consolação, liberando
energia.
Agni podia ser muito útil para os seres humanos. Também podia ser amigo
íntimo de uma pessoa, mais do que qualquer outro deus. A vontade no fogo
doméstico e nunca ausente dele, era o benevolente patrono e protetor da família,
tomando conta do gado e dos cavalos, afastando os inimigos humanos e sobre-
humanos, protegendo contra as dificuldades e doenças. Ele era hostil aos
demônios que assombravam o mundo, seus olhos atentos logo os detectavam,
seus dentes afiados logo os destruíam.
Capítulo 9
Todo sacrifício fortalecia rita, mesmo aqueles oferecidos pelo chefe de uma
casa na intimidade do lar; porém, o sacrifício oferecido por um rei tinha eficácia
especial. Embora o rei védico não passasse de um chefe guerreiro com poder de
mando sobre um pequeno principado, era o membro mais rico da comunidade, o
que lhe permitia promover oferendas suntuosas, em benefício tanto dos súditos
como do reino. Além de alimentar os deuses, cabia-lhe sustentar também os
brâmanes: todo sacrifício real era acompanhado por farta distribuição de
presentes para estes. Em geral, tais presentes incluíam vacas e terras de pasto,
pois o leite, a manteiga clarificada e as coalhadas eram os alimentos favoritos
dos deuses e faziam parte de todo sacrifício. O brâmane, por sua vez, dedicava-
se inteiramente ao fortalecimento de rita — e o fazia celebrando os sacrifícios.
Esses brâmanes atuavam ainda como conselheiros dos reis, o que também era
visto como afirmação de rita, pois o exercício de governo era um dos aspectos
da ordem cósmica.
Capítulo 10
Um deus se destacava dos outros: Rudra, o deus das terras incultas, das
regiões desabitadas e, portanto, dos aspectos perigosos e atemorizantes da
natureza.28 Imaginava-se que residia nas altas cordilheiras ao norte — enquanto
os outros deuses moravam no leste — e que freqüentava locais solitários e
insólitos. Mais proeminente nas crenças folclóricas do que no Rig Veda, Rudra
vivia à vontade com os animais selvagens e as serpentes. Figurava como
padroeiro dos caçadores, assim como dos ladrões e assaltantes. Trazia
enfermidade e morte para os seres humanos e para o gado. Mesmo assim, há no
Rig Veda hinos dedicados a esse deus e se faziam oferendas a ele, na esperança
de torná-lo menos hostil, pois era possível despertar sua compaixão e,
eventualmente, até mesmo fazê-lo atuar como prestativo curandeiro de homens e
animais.
Pois esse mundo, abrangendo a terra, o céu e tudo o que está acima deste,
funciona de acordo com rita. E o domínio do sol, da luz e das águas benéficas, é
o regaço da deusa Aditi, mãe dos Adityas, o lar seguro dos deuses e dos seres
humanos. O mundo subterrâneo, ao contrário, é o regaço de Nirrti, “destruição”.
Ali nunca chega o sol, não há luz, calor ou água fertilizante. No mundo
subterrâneo, não há rita, apenas anrita. Ele está fora do mundo ordenado, é o
domínio do caos.32
Capítulo 11
O Rig Veda nada tem a dizer sobre as pessoas comuns — o que é bastante
compreensível, pois foi composto, em benefício próprio, por membros dos
estratos privilegiados da sociedade. Para os privilegiados, ele oferece uma
perspectiva das mais agradáveis. Contanto que tivessem honrado os deuses e
feito as apropriadas oferendas rituais, sido generosas com os sacerdotes e
cumprido suas respectivas funções no mundo, tais pessoas não tinham motivo
para se preocupar com o mundo subterrâneo. Ao contrário, podiam esperar por
uma vida após a morte tão feliz como a que aguardava os membros mais
afortunados da sociedade egípcia.
4 - ZOROASTRISMO
Capítulo 1
Quando tudo isto ocorreu? Existem duas opiniões, que não podem ser
conciliadas. Segundo a tradição zoroastriana, o profeta viveu 258 anos antes de
Alexandre, o que o situaria em meados do século VI a.C. Esta data foi aceita por
importantes estudiosos. No entanto, demonstrou-se que tal tradição derivava de
um cálculo tardio baseado em uma ficção grega.2 Por mais de um século, indícios
arqueológicos e lingüísticos vêm se acumulando em favor da concepção
alternativa — isto é, de que Zoroastro viveu em um período muito anterior, em
alguma época entre 1500 e 1200 a.C., quando os iranianos já eram pastores
assentados mas não agricultores.3 Os hinos litúrgicos do próprio Zoroastro, os
Gathas, fazem inúmeras alusões às instituições, costumes, tecnologia e maneiras
de pensar da sociedade pastoril tradicional, ao passo que não trazem um único
símile derivado da agricultura. Em certo trecho, o profeta chega a pedir ao deus
supremo que lhe conceda um camelo, um garanhão e dez éguas. Além disso, o
nome Zaratustra provavelmente significa “aquele que domina os camelos” ou
“aquele que possui camelos ágeis”.4
Capítulo 2
Capítulo 3
Embora no início Ahura Mazda fosse o único ser divino, não era o único
ser. Os iranianos sempre haviam reconhecido a existência de um princípio que
era a própria negação de asha — um princípio de falsidade ou distorção, uma
força de desordem atuando incessantemente no mundo. Eles o denominavam
druj, que significava “falsidade”, “a Mentira”, e o conceito parece ter significado
mais para eles do que o termo correspondente, druh, significava para os hindus
védicos. Zoroastro elaborou ainda mais tal conceito: Ahura Mazda tinha um
poderoso antagonista em Angra Mainyu, o espírito da destruição, do mal ativo.
Nos Gathas, o profeta deixou um resumo disto, sua principal revelação: “Na
verdade existem dois espíritos primordiais, gêmeos conhecidos por estarem em
conflito. Em pensamento e palavra, em ato eles são dois: o melhor e o pior
[...]”.’° Também nos Gathas, as palavras usadas por Ahura Mazda para repudiar
seu grande adversário tocam no ponto crucial: “Nem os nossos pensamentos,
ensinamentos ou vontades, nem as nossas escolhas, palavras ou atos, nem o
nosso eu interior ou a nossa alma estão de acordo”.11
Capítulo 4
Portanto, cada uma das sete “criações” ficou sob os cuidados de um Santo
Imortal. “Cuidado”, porém, é um termo vago. Na prática, cada um dos grandes
Santos Imortais era identificado com sua “criação”, sendo imanente a ela e
responsável por sua proteção. Por exemplo, a Devoção e a terra humilde eram os
aspectos espiritual e material de uma única coisa; imaginava-se que o Espírito
Santo, procedente do deus supremo, penetrava e habitava em toda pessoa devota;
e o princípio da ordem, da justiça e da verdade estava presente em todo fogo. Na
verdade, os grandes Santos Imortais tinham um duplo significado: eram, ao
mesmo tempo, personificações dos mais elevados valores espirituais e guardiões
do mundo físico; habitavam as alturas juntamente com Ahura Mazda, mas
permeavam toda a existência no mundo terreno. Ao concebê-los, Zoroastro
entrelaçou o espiritual e o material, de modo que o próprio mundo físico — ou,
antes, tudo o que havia de bom e íntegro no mundo físico — foi visto como
impregnado de próposito moral e dirigido pela busca espiritual.
Capítulo 5
Assim como no caso dos hindus védicos, o local onde se fazia o sacrifício
não era um templo, mas um pequeno trecho de solo plano ao ar livre, consagrado
por preces e delimitado por um sulco, de modo a excluir dali as forças do caos.
Cada sacrifício era realizado para uma divindade específica invocada pelo nome,
com fórmulas rituais adequadas e as abundantes louvações apropriadas a um
convidado de honra. Depois do serviço, a carne do animal sacrificado — que, em
ocasiões especiais, podia ser um cavalo, um touro ou uma vaca — era partilhada
pelo sacerdote e os devotos. O próprio deus era fortalecido pelo odor da carne
assada. Também se oferecia a ele uma refrescante bebida de leite, romã e haoma
— pois essa maravilhosa planta-sacerdote-deus era tão crucial no culto iraniano
quanto no védico. Como diz uma passagem do Avesta: “Até a mais leve
compressão de haoma, até o menor desfrute de haoma basta para destruir um
milhar de demônios”.16
Os meios para tanto são ao mesmo tempo espirituais e materiais, pois, como
sempre no zoroastrismo, ambos estão de tal forma entrelaçados que chegam a ser
indistintos. Espera-se de um ser humano que faça tudo ao seu alcance para
promover o bem-estar e a prosperidade do mundo, mas também seu próprio
bem-estar e prosperidade. Aqueles que assim agem reafirmam os valores mais
elevados, cumprem o supremo dever religioso. Uma passagem no tratado em
pálavi conhecido como Preceitos selecionados dos antigos sábios ou,
alternativamente, como O livro do conselho de Zartusht, que de fato é um
catecismo zoroastriano, resumindo aquilo que todos os meninos e meninas de
quinze anos devem saber antes de serem confirmados na religião, ilustra muito
bem este ponto:
O primeiro [dever] do homem é professar a religião e praticar e adorar segundo ela. Segundo,
deve tomar uma esposa e gerar uma prole terrena. Deve ser diligente nisto e não negligenciá-
lo de forma alguma. Terceiro, deve transformar o solo em terra arável e cultivá-la. Quarto,
deve tratar bem os animais domésticos. Quinto, deve reservar um terço de seus dias e noites
para freqüentar a escola sacerdotal e indagar sobre a sabedoria dos homens justos; um terço
de seus dias e noites deve dedicar ao trabalho e à geração de prosperidade; e um terço de seus
dias deve reservar para alimentar-se, divertir-se e descansar.18
A esta passagem podemos acrescentar outra, de um texto litúrgico conhecido como Vendidad, ou
Contra os seres maléficos:
Aquele que semeia o grão semeia asha e promove e estimula a [...] religião com uma centena
de novos domicílios [...] Quando o grão está preparado, os demônios começam a suar; quando
é feita a moagem [ou joeiramento], os demônios berram; quando a massa está pronta, os
demônios perdem o fôlego.19
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
A própria aparência do mundo irá mudar. A terra será achatada por uma
inundação abrasadora, de modo que sua superfície se tornará uma única planície
nivelada: as montanhas cobertas de neve do Irã — erguidas originalmente em
conseqüência dos ataques de Angra Mainyu — deixarão de existir. Nesse
ambiente perfeito, os seres humanos remanescentes viverão na mais perfeita
harmonia. Maridos, esposas e filhos, incluindo, é claro, os mortos ressurrectos,
serão reunidos e viverão juntos como o fazem neste mundo — com a diferença
de que não haverá mais a geração de crianças. Toda a humanidade formará uma
única comunidade de devotos zoroastrianos, todos unidos na adoração de Ahura
Mazda e dos Santos Imortais, todos unidos em pensamento, palavra e ato.
Capítulo 9
Quanto ao futuro redentor, os próprios Gathas dào uma indicação útil, pois
o profeta, quando abatido pelo pensamento de que poderia não estar vivo para
presenciar o “tornar maravilhoso”, havia encontrado consolo imaginando
“aquele acima do bem” que viria depois dele.54 Com base nessa indicação, foi
elaborada a prodigiosa figura do Saoshyant, cujo nome significa literalmente
“futuro benfeitor”.55
Todavia, nem tudo na religião dos Gathas era apropriado a uma religião de
Estado. Uma instituição dotada não apenas de grande autoridade espiritual, mas
também de grande poder temporal, dispondo de templos, santuários, enormes
propriedades rurais e grande número de sacerdotes, dificilmente poderia ansiar
por uma completa transformação do mundo. Pelo contrário, se o zoroastrismo
pretendia funcionar de maneira eficiente como religião dominante de um império
triunfante e firmemente estabelecido, era imprescindível que modificasse sua
escatologia. O “tornar maravilhoso” precisava ser transferido, de maneira oficial
e definitiva, para um futuro remoto.
Tal revisão foi efetuada, antes da primeira metade do século IV a.C., por
sacerdotes estudiosos que haviam abandonado o zoroastrismo ortodoxo em favor
de uma heresia conhecida como zurvanismo.58 Essa variante da religião, adotada
pelos últimos monarcas aquemênidas e também pelos sassânidas, acomodava
facilmente um esquema de sucessivas épocas do mundo. Segundo tal esquema,
influenciado pelas especulações dos astrônomos babilónicos sobre o “grande
ano”, o “tempo limitado” era dividido em vários períodos idênticos. Em uma das
versões que chegaram até nós, o “tempo limitado” estende-se por nove mil anos,
dividindo-se em três períodos de três mil anos; em outra, estende-se por doze mil
anos, divididos em quatro períodos iguais. Na revisão original, porém, o “tempo
limitado” foi fixado em seis mil anos; e, mesmo nas versões de nove mil e doze
mil anos, os seis últimos milênios incluem tudo o que acontece nesta terra.
De acordo com o Bundahishn, que apresenta o esquema dos doze mil anos,
os três primeiros milênios são dedicados aos preparativos para a luta cósmica. O
deus supremo (agora chamado de Ormazd) torna-se consciente do Espírito do
Mal (agora denominado Ahriman) e de suas intenções destrutivas, e cria seu
mundo bom em estado puramente espiritual. Ahriman reage atacando o mundo
bom; quando fracassa, mergulha de volta na escuridão de onde saíra e ali cria
seus aliados, os daevas. Ao longo dos três mil anos seguintes, Ormazd torna
material sua criação espiritual; e, no final do período, Ahriman volta a atacá-la,
desta vez com mais êxito, pois consegue introduzir nela a morte, a doença e a
destrutividade. Ormazd, porém, já havia tomado precauções, criando a alma de
Zoroastro; e, depois de existir durante seis mil anos em estado espiritual, essa
alma une-se a um corpo. No ano 9000, Zoroastro recebe a revelação da única
religião verdadeira.
5 - DO MITO DO COMBATE A FÉ
APOCALÍPTICA
Capítulo 1
Encontram-se ecos dos combates védicos também no relato feito por Snorri
da luta entre Thor e o enorme monstro marinho, a serpente Midgard. que ficava
enrolada em torno da terra e seria capaz de destruí-la. Entrando no mar, Thor
lançou sua linha e pescou o monstro. Nada jamais infundiu tanto terror, ficamos
sabendo, quanto o olhar que Thor lançou à serpente e o modo como esta
devolveu-lhe a mirada enquanto lançava veneno. Thor teria então esmagado o
crânio da serpente com o machado, se seu companheiro não tivesse, de tanto
medo, cortado a linha.
Por causa disso, a serpente Midgard, assim como Vritra, continua sendo
uma ameaça constante ao mundo ordenado. Pois a ameaça do caos está sempre
presente: isso era claro tanto para os deuses como para os seres humanos. Certa
vez, quando os gigantes conseguiram roubar o martelo de Thor, o pânico se
espalhou entre os deuses — pois quem iria agora defender o mundo dos deuses e
o dos homens contra as forças sempre ameaçadoras do caos?
Capítulo 2
A mesma impressão, até mais intensa, nos vem de outra lenda incluída no
Avesta.6 O iraniano Thraetaona, filho de Athwya, é um herói puramente humano;
no entanto, tem muito em comum com o antigo deus Trita Aptya, que aparece no
Rig Veda repetindo algumas das façanhas mais prodigiosas de Indra. No Irã,
Thraetaona derrota Azi Dahaka, um estridente dragão de três cabeças e seis
olhos; na índia, por outro lado, também Trita Aptya mata um estridente dragão
de três cabeças e seis olhos. E existem vínculos entre Thraetaona e o próprio
Indra: as águas que este liberta ao matar Vritra também são deusas — e, ao
matar Azi Dahaka, Thraetaona liberta duas donzelas: mudança comum quando
um mito se transforma em lenda. Já se sugeriu até mesmo que o nome Azi
Dahaka significa “dragão dos dasas” — isto é, daqueles povos nativos que
foram conquistados pelas tribos invasoras —, correspondendo no Irã aos hindus
com os quais Vritra estava associado e que foram combatidos por Indra.7
Capítulo 3
Capítulo 4
O parentesco entre os dois deuses ainda vai mais longe. O mesmo yasht
mostra que Verethraghna é muito mais do que um deus da vitória na guerra. Ele
proporciona a vitória não apenas no combate, mas também na eloqüência, nas
discussões, em todos os tipos de ação. Os inimigos que submete não se
restringem a exércitos hostis, mas incluem os demônios e seus aliados humanos,
as bruxas e os feiticeiros. Aos homens ele concede força nos braços, saúde em
todos os membros, corpos bem protegidos, testículos inesgotáveis. Na verdade, é
um deus guardião que ajuda seu povo de todas as formas. Quando adorado de
maneira apropriada, não só as carruagens inimigas como também a fome e a
doença são mantidas à distância, ao passo que a adoração insuficiente ou
inapropriada ocasiona desastres na terra. Tudo isso lembra Indra. E se o camelo
no cio, um dos avatares de Verethraghna, tem de fato a paixão mais forte e a
mais potente ejaculação dentre todas as criaturas masculinas, há aqui um
paralelo evidente com um dos epítetos de Indra: “aquele com mil testículos”.
Muita coisa não está clara nesta história. Embora seja dito que esses grandes
acontecimentos deverão ocorrer na grande consumação, eles são narrados como
se já tivessem ocorrido, em uma ocasião remota do passado. Além do mais,
embora Gannak Menok seja claramente Angra Mainyu, o modo como o combate
é descrito faz com que ele pareça mais um dragão do que um ser puramente
espiritual. Essas ambigüidades são importantes. A história toda não seria apenas
uma elaboração do antigo mito do deus-guerreiro que luta e destrói o monstro do
caos? Sem dúvida, a recompensa concedida a Bahram sugere tal coisa, já que
depois da vitória ele foi promovido à posição de sétimo Santo Imortal, e o maior
de todos. Isto nos lembra que Indra, após a vitória sobre Vritra, foi promovido a
rei de todos os deuses. Sem dúvida, Verethraghna foi honrado do mesmo modo,
e o que o texto parse registra é uma versão zoroastrianizada deste acontecimento
singular.
Capítulo 5
Capítulo 6
Os feitos de Ahura Mazda vão muito além de tudo o que se conhece do mito
tradicional. A guerra que trava é uma guerra espiritual, cujo objetivo não se
limita a assegurar a fertilidade das terras e as vitórias militares de seu povo. Não
se trata nem mesmo da mera manutenção do mundo ordenado. O que ele faz é
remover do mundo toda forma de desordem, de maneira exaustiva e para
sempre, tomando possível um estado em que o cosmos deixará de ser ameaçado
pelo caos. Desse modo, no final. Angra Mainyu/Ahriman é aniquilado de uma
vez por todas, juntamente com todas as hostes demoníacas e seus aliados
humanos. Em vez de vitórias repetidas mas incompletas, há a promessa de uma
vitória definitiva e total.
II - CRISOL SÍRIO-PALESTINO
6 - UGARIT
Capítulo 1
Em teoria, o rei era responsável pela justiça e pela correção nos negócios
comunitários. A exemplo de monarcas mais poderosos, supunha-se que
dedicasse especial atenção às necessidades de viúvas e órfãos.3 Ao manter a boa
ordem na sociedade, acreditava-se também que exercia uma influência benigna
sobre a natureza. A li onde prevaleciam a justiça e a correção, a seca e a fome
eram mantidas a distância e a terra permanecia fértil — o epíteto mais comum do
rei Daniel é “provedor de fertilidade”. E, originalmente, o rei também era o líder
na guerra e suas vitórias fortaleciam ainda mais o mundo ordenado. É verdade
que, na segunda metade do segundo milênio, as funções que antes pertenciam ao
rei haviam sido transferidas para profissionais — sacerdotes, juízes, soldados. A
despeito disso, o rei ainda era a suprema autoridade no Estado e continuava a ser
visto como responsável pela sustentação da ordem estabelecida pelos deuses.4
Capítulo 2
Aparentemente, foi um certo Elimeleque quem deu aos mitos ugaríticos sua
atual forma literária, entre 1380 e 1360 a.C., embora eles provavelmente
estivessem em circulação, como literatura oral ou escrita, desde cerca de um
século antes.6 Os mitos revelam um grande e variado panteão dominado por três
divindades principais: os deuses El e Hadad (este em geral conhecido como
Ba’al, significando “senhor”), e a deusa Anat. El, cujo nome significava “deus”,
era o deus criador. Criador e procriador, pois supervisionava a concepção e o
parto entre os seres humanos. El parece ter gerado os deuses no sentido mais
literal — esta, sem dúvida, é a razão de ser chamado por vezes de “Touro El”.
Também era conhecido como “Criador das Coisas Criadas”, e há bons motivos
para se pensar que — tal como An e Marduk — ele era considerado criador do
céu e da terra. El tinha uma consorte, a deusa Athirat ou Asera, que havia
participado da obra de criação. Figura um tanto vaga em Ugarit, sabe-se que
Athirat foi reverenciada como divindade importante em outras partes da região.
Tanto El como Athirat eram seres primordiais que sempre haviam existido.
Capítulo 3
O deus que mais sobressai nos mitos ugaríticos é Ba’al,1 () que parece ter
entrado tardiamente no panteão. Talvez fosse um deus de origem estrangeira,
introduzido por imigrantes. Com certeza não era filho da consorte de El, Athirat,
pois era temido e odiado por ela e pelos inúmeros deuses que formavam sua
descendência.
Uma vez alojado de maneira adequada, Ba’al se torna de fato “Senhor”. Faz
valer seu domínio sobre “oito e oitenta cidades, sim, nove e noventa”, e
proclama:
[Pois] só eu sou aquele que será rei sobre os deuses, [que] de fato engorda deuses e homens,
que satisfaz as multidões da terra.14
Tal como El, Ba’al é agora rei dos deuses, mas sua realeza é diferente da
exercida por El. Este sempre foi rei, seu domínio é eterno, imutável. Ba’al, ao
contrário, precisa não só conquistar a realeza, mas também defendê-la; seu
domínio é instável, precário. E nem sempre ele é o governante supremo. Como
vice-regente de El, tem domínio sobre a terra e seus habitantes. Nunca substitui
El como senhor de todo o universo, tal como o fez Marduk em relação a Anu e
Enlil na Babilônia. E, embora seja possível e até provável que o mito de Marduk
e Tiamat deva algo ao mito de Ba’al e Yam, o mito cananeu, mais antigo, é o
menos grandioso dos dois: não há nenhum indício de que Ba’al crie o céu e a
terra a partir do corpo de Yam.
A morada de Mot é o mundo inferior, onde ele governa como rei; sua
“voracidade” refere-se também à descida dos mortos ao mundo inferior. Esse
domínio tenebroso, mencionado alternadamente como “a terra”, “o Poço”, “o
Abismo”, é descrito como uma “cidade” pertencente a Mot. Não é uma cidade
na qual se entra de boa vontade. Para os cananeus, assim como para os
mesopotâmicos, a morte é uma forma de existência miserável. Ainda que filhos e
netos fizessem oferendas regulares de alimento e bebida a fim de amenizar a
fome e a sede de alguns, nem todos contavam com descendentes solícitos ou
mesmo com qualquer tipo de descendência. Esfomeados, os espíritos dos
desesperados constituíam um perigo constante para os vivos.20
Quando Mot desafia Ba’al, este não tem outra escolha senão enfrentá-lo. O
combate ocorre na fronteira do mundo inferior, e ali Ba’al cai morto. O risco de
que essa morte desencadeie uma catástrofe total é tão grande que o próprio El
desce do trono, ajoelha-se no chão e realiza todos os ritos do luto. “O que
acontecerá ao povo?”, indaga ele, considerando até a possibilidade de descer ao
mundo inferior para resgatar Ba’al. No fim, é Anat, a irmã e consorte de Ba’al,
quem encontra seu corpo e lhe proporciona sepultamento condigno. Ba’al
renasce e a terra volta a se tornar fértil. Em um sonho, El vê t4os céus [lançando]
uma chuva de azeite e o mel escorrendo pelos uádis”; deliciado, ele exclama:
Mesmo eu poderei sentar e ficar à vontade, e a alma dentro de mim poderá descansar; pois
Ba‘al, o mais poderoso, está vivo, o senhor príncipe da terra existe.11
Porém, a segurança completa não é para este mundo. Mot também renasce e
os dois rivais voltam a se enfrentar em grandioso combate:
Eles se olharam como brasas ardentes; Mot era forte, Ba’al era forte. Eles mordiam como
serpentes; Mot era forte, Ba ‘al era forte. Eles puxavam um ao outro como galgos; Mot caiu,
Ba ‘al caiu sobre ele.22
Os mitos de Ba’al podem ser vistos de mais de uma maneira.23 Ba’al, Yam e
Mot são todos eles deuses, cada um reinando em seu próprio domínio. Em certo
nível, seus conflitos simbolizam as vicissitudes meteorológicas da terra de
Canaã. Isto não significa — embora esta seja uma posição sustentada por
muitos24 — que tais conflitos devam ser interpretados em termos do ciclo das
estações; muito menos que Ba’al seja um deus que morre e renasce segundo as
estações. Não há referência no texto a ciclos sazonais e, quando se ausenta, Ba’al
não o faz por uma única estação, mas por sete ou oito (significando “muitos”)
anos. O que o mito diz é que Ba’al, o portador da fertilidade, consegue manter
seu predomínio apenas quando subjuga Yam, o gênio das águas sempre prontas
a submergir a terra, ou Mot, o gênio da seca sempre prestes a levar a fome à
terra. Já se afirmou que os mitos sobre as vitórias de Ba’al eram recitados em
festivais de outono para a celebração do ano-novo, a fim de garantir que as
vitórias se repetissem e que outra vez fosse concedida a chuva que possibilita a
vida — e isto pode muito bem ser verdade.
Entretanto, tais mitos não se referem apenas à fertilidade. Mot não é apenas
a seca, mas também a morte. A luta entre Mot e Ba’al simboliza a luta entre as
forças da vida e as forças da morte. Está em risco a própria sobrevivência do
mundo dos vivos. E o mesmo pode ser dito do combate que Ba’al trava com as
águas, pois estas simbolizam as forças destrutivas que constantemente ameaçam
o mundo ordenado e cujo triunfo reduziria este mundo ao caos primordial de
onde ele surgiu. Além do mais, também é verdade que, se nenhuma dessas duas
forças poderosas é capaz de derrotar Ba’al definitivamente, nenhuma delas pode
ser derrotada para sempre. O caos é uma possibilidade perene, a morte a mais
certa das certezas — e ambos parte inelutável da realidade.25
Capítulo 4
Anat é de fato uma lutadora valente. Em uma passagem ela lembra Ba’al de
que estava presente em todos os combates dele, participando ativamente de todos
eles, desde a luta original com o “Mar e a Corrente Oceânica”. Isto significa que,
tal como seu irmão, Anat é uma defensora da assembléia divina contra um deus
rebelde e arrogante — na verdade, uma defensora do cosmos contra o caos. Esta,
sem dúvida, é a chave para se entender um trecho que deixou perplexo mais de
um comentador.28
7 - YAHWEH EA MONARQUIA DE JERUSALÉM
Capítulo 1
É possível imaginar que a história dos israelitas seja fácil de resumir, assim
como sua visão de mundo, pois ambas estão documentadas na Bíblia hebraica,
também conhecida como Velho Testamento. Infelizmente isto não é, de maneira
nenhuma, o que acontece, pois as partes relevantes da Bíblia foram coligidas e
editadas num período bem tardio, entre 600 a.C. e 100 a.C. — e editadas, além
do mais, para que se adequassem às crenças e experiências dos redatores. Com
freqüência é difícil, e às vezes impossível, distinguir o que pode ter sido
vivenciado e expresso em épocas anteriores aos acréscimos e interpretações. E
tampouco é fácil escolher entre os argumentos e as conclusões dos estudiosos
bíblicos, que vêm divergindo por mais de um século. Porém, com este caveat
lector, é preciso tentar fazê-lo.
Capítulo 2
Embora o reino setentrional, durante o tempo que durou, tenha sido maior e
mais poderoso, coube ao reino sulino herdar e preservar a ideologia do império
davídico e salomônico. A maior parte do que sabemos a respeito da religião
israelita — sobre o que os estudiosos bíblicos acostumaram-se a chamar de
“iaveísmo” — vem do reino de Judá.
Torna-se cada vez mais difícil afirmar com alguma segurança quando, onde
e como os israelitas conheceram o deus Yahweh. É possível, como diz o Êxodo,
que ele tenha sido originalmente um deus midianita, introduzido na terra de
Canaã por imigrantes oriundos do Egito; ou então pode ter surgido como um
deus menor do panteão cananeu. O certo é que os israelitas, ao se tomarem
conscientes de si mesmos como povo, já haviam adotado Yahweh como deus
tutelar. Com o estabelecimento da monarquia, Yahweh tornou-se o deus
padroeiro do reino, e quando este foi dividido em duas partes, continuou a ser o
deus de ambas — assim como Chemosh era o deus tutelar dos moabitas;
Milkom, dos amonitas; Hadad, dos arameus; Melkart, dos tírios.
Isto não significa que Yahweh tenha sido considerado desde o início como o
maior de todos os deuses. Originalmente, El era o deus supremo dos israelitas,
tal como sempre havia sido para os cananeus. Mesmo se desconsiderarmos o
pronunciamento de El no ciclo de Ba’al — “o nome de meu filho é Yaw” —,
cuja importância ainda é objeto de discussão,5 não podemos ignorar a passagem
bíblica que mostra Yahweh como subordinado a El. Deuteronômio 32:8 conta
como El Elyon — isto é, El, o Mais Exaltado — dividiu as nações entre os
filhos, Yahweh recebendo Israel como sua parte. A sugestão, apresentada
algumas vezes, de que isto significa simplesmente que El, “Deus”, sob o nome
de Yahweh, escolhera os israelitas para si, não é convincente. Além disso, El
sempre preservou traços de sua dignidade original: todas as referências a ele na
Bíblia são profundamente respeitosas.
Ba’al conseguiu estabelecer pela primeira vez seu domínio sobre o mundo
ao subjugar as rebeldes águas cósmicas, simbolizadas por uma serpente ou um
dragão. Existem salmos que mostram Yahweh subjugando ao mesmo tempo as
águas e os dragões Leviatã e Raab — e estes mesmos salmos proclamam o
reinado de Yahweh:
A voz de Yahweh está sobre as águas; troveja o Deus da glória, Yahweh, sobre muitas
águas. Yahweh em seu trono sobre o dilúvio; Yahweh em seu trono como rei para sempre.7
Capítulo 3
Enquanto o divino guerreiro Ba’al deixou para sua irmã Anat a tarefa de
combater os inimigos humanos, Yahweh tomou para si tal encargo, pois era um
temível deus da guerra.12 Embora não se considere mais que tenha havido uma
conquista israelita de Canaã tal como a descrita em Josué 1-12, não há nenhum
bom motivo para duvidar que algumas das tribos envolveram-se de tempos em
tempos em ações militares contra as forças cananéias. O Cântico de Débora
descreve uma batalha em que seis tribos derrotam uma coalizão de cidades-
Estado cananéias na planície de Jezreel. Aqui já se atribui uma dimensão
cósmica à luta contra os inimigos políticos: Yahweh aparece intervindo
diretamente na batalha e conta com o auxílio das estrelas, consideradas seres
divinos subalternos. Não há dúvida quanto à origem desta concepção: a
mitologia cananéia menciona uma assembléia celestial de “filhos de El” que
incluía uma assembléia de estrelas. Estes seres foram herdados por Yahweh: são
as miríades de santos, “todos em tua mão”,13 e o ajudam a travar as guerras de
Israel.
Acima de tudo, era por meio de vitórias sobre inimigos sempre novos que se
esperava que Yahweh, agora e no futuro, fizesse o que havia feito no início:
vencer o caos, restabelecer o cosmos.
Capítulo 4
Yahweh residia entre seu povo em Jerusalém. Foi ali que revelou sua
vontade e foi ali que abençoou seu povo.23 E ele o fazia como rei: vitorioso sobre
as águas do caos, “sentado sobre o dilúvio”, dominava desde o monte Sião, tal
como Marduk o fazia a partir do monte Zafon.24 E continuou a proporcionar
segurança e refúgio, agora como o defensor de Israel contra aquelas outras
forças do caos, as nações inimigas. Por ser o local de sua residência, Sião passou
a ser visto como a “rocha sagrada”. Era o centro e a fundação do mundo
ordenado, a expressão suprema de uma ordem estabelecida no céu, precisando
portanto ser incessantemente defendida contra os agentes do caos. Se fosse
capturada, todo o cosmos seria reduzido ao caos.25
8 - O EXÍLIO E O PÓS-EXÍLIO
Capítulo 1
Se não houvesse nada na visão de mundo israelita além do que foi colocado
no capítulo anterior, ela estaria hoje tão morta quanto as visões de mundo dos
outros pequenos povos da Síria-Palestina — ou, no final das contas, como as
visões de mundo egípcia e mesopotâmica. Porém, havia algo mais: uma tradição
conhecida pelos historiadores como “Yahweh sozinho”.1
Para o leitor atual, estas palavras parecem um eco do primeiro dos Dez
Mandamentos, mas na verdade é o mandamento que ecoa Oséias, pois o
Decálogo é de um período muito posterior. Foi Oséias, também, o primeiro a
conferir ao relacionamento de Yahweh com Israel toda a intensidade emocional
e toda a ambivalência de um casamento em sua forma mais apaixonada. Para ele,
assim como para Jeremias e Ezequiel, o Israel politeísta era semelhante a uma
esposa infiel ou mesmo a uma prostituta.4 Ao recorrer a tal linguagem, esses
homens estavam falando em nome de Yahweh: “Yahweh disse [...] Não adorarás
outro deus. Pois Yahweh tem por nome Zeloso: é um Deus zeloso”.5
Quando Josias foi morto em combate em 609 a.C., sua reforma ainda não
havia produzido nenhuma conversão em massa: estava por vir o triunfo final do
movimento “Yahweh sozinho”. Mas já se iniciara um processo que, no final, iria
alterar radicalmente a visão de mundo israelita.
Capítulo 2
Capítulo 3
Todas essas leis foram atribuídas a Moisés, ou antes a Deus falando por
intermédio de Moisés. Na realidade, elas tinham origens as mais diversas.
Aquelas formuladas como casos judiciais são provavelmente muito antigas —
muitas têm paralelo nas coleções de leis da Mesopotâmia. Isto vale para as leis
que tratam de questões como as penalidades para assassinato, estupro, roubo e
outros crimes; os prejuízos causados à pessoa ou propriedade; regras para a
agricultura e o comércio; e arranjos financeiros envolvidos no casamento. Mas
também existem muitas leis que refletem a ideologia do movimento
deuteronomista.
Embora tudo isso pouco tenha afetado o reino de Judá até sua destruição, os
efeitos foram enormes entre os exilados na Babilônia. Lá, o mandamento de se
aprender e ensinar a Lei tornou-se essencial para a preservação tanto da religião
como da comunidade. Quando se instituiu a observância do Shabat e o culto na
sinagoga, a Lei adquiriu importância fundamental. Ela constituía o núcleo de
uma tradição que toda geração precisava dominar e transmitir à geração
seguinte. Aderindo a esta tradição, os judeus demonstravam sua devoção
exclusiva a Yahweh.
Depois do Exílio, este novo tipo de religião também se estabeleceu em Judá,
graças aos esforços de dois homens, Neemias e Ezra, ambos pertencentes à
comunidade da Babilônia. Neemias, um judeu que ocupava um alto posto na
corte persa, foi nomeado governador de Judá, que havia sido incorporado ao
império persa. Ezra, o “escriba”, recebeu autorização do soberano persa para
ensinar a Lei a todos aqueles que na Síria-Palestina se consideravam judeus, bem
como a incumbência de estabelecer um sistema administrativo capaz de
assegurar que a Lei fosse obedecida em Judá. Ambos deviam essa autoridade ao
fato de que Judá, a despeito do tamanho diminuto, tinha importância estratégica
para os persas, sendo conveniente que por razões militares ali houvesse
estabilidade. E ambos usaram essa autoridade para fortalecer o sentimento de
identidade e de dignidade dos judeus de Judá.
Teve início uma completa reforma religiosa. A “Lei de Ezra” foi compilada
— uma legislação que, por suas estipulações e proibições, garantia que os judeus
permaneceriam efetivamente separados de outros povos. Imposto com a sanção
do governo persa, este corpo de leis também conferiu aos judeus um status legal
no interior do império: não sendo mais uma nação, tomaram-se pelo menos uma
comunidade que tinha o direito de decidir questões internas de acordo com a lei
de seu deus. Algum tempo depois, o Pentateuco recebeu sua forma definitiva e,
tal como a Torá, tomou-se um dos fundamentos da religião judaica.
Não que Yahweh tenha sido o único deus da Antigüidade a ser considerado
como “atuando na história”. Como vimos, muitos outros deuses — egípcios,
sumérios, assírios, babilônios e mesmo cananeus — foram imaginados
desempenhando papéis muito ativos na política internacional, sobretudo nas
guerras.11 Tampouco era inusitado interpretar a vitória ou a derrota na guerra, a
prosperidade ou a ruína de uma dinastia, como manifestações da aprovação ou
desaprovação divinas: as cartas cananéias de Amarna no século XIV a.C. e a
inscrição moabita de Mesha no século IX a.C. mostram como tal concepção era
difundida. Esses paralelos são reais e não deveriam ser negligenciados como
normalmente vêm sendo. No entanto, mesmo levando-os em conta, é verdade
que, tal como apresentada pelos escritores deuteronomistas, a atuação de
Yahweh no campo da história é mais constante, mais intencional e mais coerente
do que qualquer coisa atribuída a outros deuses.12
Era esta concepção de seu deus como “senhor da história” que, por volta de
600 a.C., levou certos defensores do movimento “Yahweh sozinho” a romper
com uma visão de mundo antiquíssima, na qual a ordem e a desordem eram
aceitas como realidades permanentes, e também a esperar com impaciência por
uma gloriosa consumação em que todas as coisas seriam endireitadas.13
Capítulo 5
Yahweh faria mais do que isso. No momento mesmo em que a sorte dos
israelitas encontrava-se em seu ponto mais baixo, a profecia começou a
proclamar que uma nova ordem de coisas, perfeitamente gloriosa, estava prestes
a se instalar. A ordem que Yahweh sempre havia desejado seria restabelecida,
mas transfigurada e num plano superior. E seria restabelecida em benefício
exclusivo daqueles que, como os próprios profetas, dedicavam-se inteiramente
apenas a Yahweh.16
Em tudo isto a maioria da população, que nunca havia saído de Judá, terá
uma participação pequena ou mesmo nula. Os exilados aos quais Ezequiel e seus
discípulos se dirigiam constituíam uma elite tanto social quanto intelectual, e não
é difícil perceber, em suas profecias e naquelas que lhes são atribuídas, a
consciência que possuíam desta situação privilegiada, bem como o desprezo que
votavam aos camponeses de sua terra natal. Daqueles que ainda continuavam em
Judá, Yahweh diz: “Certamente uns cairão à espada no meio das ruínas,
enquanto outros em pleno campo serão dados a comer às feras, enquanto outros
ainda, refugiados nas montanhas e nas cavernas, morrerão de peste [...] Desse
modo saberão que eu sou Yahweh, quando eu reduzir a terra a uma desolação e a
um deserto, por causa de todas as abominações que praticaram”.23 Nada menos
do que o extermínio deve ser o destino de todos aqueles que se recusam a adorar
somente a Yahweh e permanecem obstinadamente politeístas.
Capítulo 6
O profeta Isaías viveu no século VII a.C., mas em geral se considera que
pelo menos metade do livro que leva seu nome na Bíblia hebraica foi escrito
num período muito posterior. Como, quando e onde esse livro foi composto e
redigido ainda é uma questão aberta para os estudiosos bíblicos, e é improvável
que cheguem logo a um acordo. O relato apresentado em seguida representa o
que ainda é a posição da maioria.24
Para o Segundo Isaías, assim como para Ezequiel antes dele, os fiéis
seguidores de Yahweh deveriam ser encontrados entre os exilados. O
relacionamento que agora Yahweh mantinha com estes era muito diferente do
relacionamento que tivera antes com os israelitas. No que se refere aos exilados,
é coisa do passado a punição que com tanta fúria ameaçavam os profetas
anteriores, pois o próprio exílio a concretizara. E o Segundo Isaías também sabe
exatamente de que maneira Yahweh irá provar ao seu povo que este havia de
fato recebido o perdão e recuperado o favor de seu deus: a Babilônia está prestes
a ser subjugada pelos persas.
Nada disso era aceitável para o Segundo Isaías. Repetidas vezes, por
intermédio dele Yahweh nega qualquer realidade aos deuses das nações pagãs —
desafiando-os a mostrar seus poderes, zombando deles porque nada têm a
mostrar. Sem dúvida, isto se dirigia sobretudo aos israelitas que haviam
começado a adorar os deuses babilónicos, mas por trás da intenção polêmica
nota-se a preocupação com um problema mais profundo. Os israelitas
encontravam-se dispersos por toda parte, não lhes restara nenhum poder político
— de que modo, então, o deus deles poderia salvá-los, se não fosse onipotente e,
na verdade, o único deus? “Eu sou Yahweh, e não há nenhum outro, fora de mim
não há Deus”, “Eu digo: o meu propósito será realizado, hei de cumprir aquilo
que me apraz”.29
Mas, se fosse assim, com certeza Yahweh poderia fazer mais do que apenas
restituir a Israel sua posição anterior. O Segundo Isaías não tinha a menor dúvida
quanto a isso: o amor de Yahweh por seu povo eleito estava prestes a se
manifestar da forma mais esplêndida possível. Por meio de um ato tão
extraordinário quanto a criação original, o mundo estava prestes a ser
transformado — e o povo de Israel prestes a receber a posição mais gloriosa
deste mundo transformado.
A volta dos que haviam sido exilados na Babilônia será apenas a primeira
etapa da grande reunião de israelitas dispersos por todas as terras, ao norte, ao
sul, a leste e a oeste. Serão tão numerosos que os limites de Jerusalém precisarão
ser ampliados: a cidade será reconstruída, com um esplendor maior do que
nunca. Todas as outras cidades de Judá também serão reconstruídas e
repovoadas. A população se multiplicará e a terra desfrutará de bênçãos que
ultrapassarão tudo o que ela conheceu antes do exílio.
Yahweh firmará uma nova aliança com seu povo. O amor e a fidelidade que
antes devotou a Davi e à monarquia davídica agora será dirigido a todo o seu
povo. Shalom — bem-estar, harmonia, prosperidade e paz — estará com este
povo como nunca antes. E o novo decreto irá durar para sempre:
Os montes podem mudar de lugar e as colinas podem abalar-se, mas o meu amor não mudará,
a minha aliança de paz não será abalada [...].38
E também:
Yahweh consolou Sião, consolou todas as suas ruínas; ele transformará o seu deserto em um
Éden e as suas estepes em um jardim de Yahweh [...] a minha salvação será eterna e a minha
justiça não terá fim.39
Outras nações serão autorizadas a ajudar os israelitas, de modo que estes
possam retomar à terra natal:
Eis que levantarei a minha mão para as nações; darei um sinal aos povos e eles trarão os teus
filhos nos seus braços, as tuas filhas serão carregadas nos seus ombros. Reis serão os teus
tutores, as suas princesas serão as tuas amas-de-leite. Prostrar-se-ão diante de ti com o rosto
em terra e lamberão o pó dos teus pés.42
Sabe-se menos sobre o Segundo Isaías do que sobre qualquer outro profeta
hebraico. Em alguns aspectos, ele se assemelha aos seus predecessores pré-
exflicos: como eles, alega que recebeu de Yahweh uma missão e que fala em seu
nome. Porém, recorre com mais freqüência à língua e à liturgia hebraicas — na
verdade, sua mensagem pode muito bem ter sido transmitida a grupos de
exilados reunidos em cultos públicos, antes de ser incorporada à obra literária
que conhecemos. O Segundo Isaías tinha seguidores, mas não há motivos para
supor que fossem numerosos. E, como é de todo provável, se é a ele que se
refere o quarto “canto do servo”, então o preço que pagou pelo papel de profeta
foi a morte por açoitamento — seja pelas autoridades babilónicas, alarmadas
com as implicações políticas de sua mensagem, seja pelos próprios exilados,
desiludidos quando Ciro não realizou a profetizada destruição da Babilônia.
Capítulo 7
Por um momento deve ter parecido que a profecia do Segundo Isaías estava
prestes a se cumprir — mas apenas por um momento. Não só as nações não
afluíram a Jerusalém, como não seguiram para lá nem mesmo os descendentes
dos israelitas deportados pelos assírios. A maioria dos exilados na Babilônia
decidiu permanecer ali mesmo. A diáspora chegara para ficar — e sem dúvida é
por isso que se costuma nesta altura abandonar o termo “israelitas”, com suas
associações territoriais, e substituí-lo pelo termo “judeus”.
Por outro lado, não há dúvida quanto ao sentido geral dessas profecias.
Temas prefigurados pela primeira vez por um dos profetas do exílio, Ezequiel e
o Segundo Isaías, retornam inúmeras vezes, cada vez mais elaborados.47 Nos
acréscimos e inserções ao Livro de Isaías, o passado e o presente são vistos
como um tempo de pecado — mas uma nova era se aproxima. Não há nenhuma
indicação de que os primeiros talvez pudessem fundir-se nesta última por um
aprimoramento gradual: a mudança só pode ocorrer pela intervenção direta de
Yahweh, e será total. O próprio Yahweh fala de uma nova criação: “Com efeito,
vou criar novos céus e nova terra; as coisas de outrora não serão lembradas, nem
tornarão a vir ao coração. Alegrai-vos, pois, e regozijai-vos para sempre com
aquilo que estou para criar [,..]”.48 É uma profecia, portanto, não da destruição do
universo, mas da transformação radical do mundo: a ordem atual do mundo,
imperfeita e precária, será substituída de um momento para o outro por uma
ordem perfeita e indestrutível.
Capítulo 8
Castigá-lo-ei com a peste e o sangue; farei chover uma chuva torrencial, saraiva, fogo e
enxofre sobre ele e as suas tropas e os muitos povos que vierem com ele. [...] Durante sete
meses a casa de Israel os sepultará, com o fim de purificar a terra. [...] Manifestarei minha
glória às nações. Todas as nações verão o castigo que hei de executar, e a minha mão, que
farei cair sobre elas. E a casa de Israel saberá que eu sou Yahweh, o seu Deus, desde aquele
dia e daí em diante.61
Porém, nem todo judeu que estiver vivo na época da grande consumação irá
partilhar de suas bênçãos. É perfeitamente possível pertencer por nascimento ao
povo de Yahweh e mesmo assim perder essa condição privilegiada: sem dúvida
os profetas pensavam naqueles que haviam se apegado ao politeísmo.63 No
amanhecer da nova era, tais judeus — “os perversos”, “os sem-lei”, “os ímpios”
— serão destruídos. Na verdade, antes de descrever as delícias da era vindoura,
Yahweh dá sua sentença sobre esses perversos — como se a eliminação deles,
não menos do que a das nações pagãs, fosse um primeiro passo obrigatório para
a grande renovação: “Eu vos destinarei à espada; todos vós dobrareis as costas
para a matança [...] Com efeito, vou criar novos céus e nova terra”.64
9 - APOCALIPSES JUDAICOS (I)
Capítulo 1
Os autores de apocalipses sem dúvida fizeram tudo o que puderam para que
suas obras parecessem genuínas — por exemplo, tomaram o cuidado de nunca
mencionar o nome de qualquer indivíduo que tivesse vivido depois da época dos
supostos autores. Não há como negar os indícios de um plano consciente, de
uma simulação deliberada. Apesar disso, quando lemos tais obras ficamos com a
impressão de que seus autores as consideravam de alguma forma genuínas.3
Mais ainda: estes homens parecem ter achado que seus escritos não apenas
complementavam, mas iam além da profecia bíblica, e viam-se não só como
sucessores dos profetas, mas também como superiores a eles. Por trás dos
pronunciamentos dos profetas, sugerem eles, há um sentido oculto que fora
compreendido de maneira imperfeita pelos próprios profetas. Apenas a uns
poucos sábios Deus havia revelado plenamente este sentido — e somente agora,
com o desvelamento dos escritos daqueles sábios, a verdadeira significação da
profecia seria esclarecida.
Somente eu, Daniel, vi esta aparição. Os homens que estavam comigo não viam a visão [...]
Ouvi, então, o som de suas palavras. Ao ouvir o som de suas palavras, desfaleci sobre o meu
rosto, meu rosto contra a terra. [...] Ao dizer-me ele estas palavras, levantei-me, todo trêmulo.
E prosseguiu: “Não temas, Daniel. [...] vim para fazer-te compreender o que sucederá a teu
povo, no fim dos dias, porque há ainda uma visão para esses dias.4
Capítulo 2
A mais antiga dessas obras surgiu como reação a uma crise repentina na
década de 160 a.C. Em geral, os governos no mundo helenístico não interferiam
com as religiões ancestrais, mas nessa década, por motivos ainda discutidos
pelos historiadores, o monarca selêucida Antíoco iv Epifânio abriu exceção para
o judaísmo. É bem verdade que o poder da dinastia estava periclitante: Antíoco
havia conduzido uma guerra bem-sucedida contra o Egito e a vitória lhe fora
roubada devido a uma intervenção romana. E possível, também, que Antíoco
tivesse uma personalidade desequilibrada. Seja qual for o motivo, ele estava
mais do que pronto para se voltar contra os judeus de Jerusalém. Quando um
sumo sacerdote tentou afastar seu sucessor, o qual pagara generosamente para
cair nas graças do rei, este encontrou uma desculpa para intervir.
Porém, o que era Israel senão uma comunidade unida pelo “zelo pela Lei”,
como esta fora definida na Torá? Muitos judeus estavam dispostos a lutar, e até
mesmo a morrer, para não transgredir este princípio. A família sacerdotal dos
asmoneus — um pai e cinco filhos — proporcionou os líderes; e um dos filhos,
Judas, apelidado Macabeu (talvez com o significado de “cabeça de martelo”),
revelou-se um comandante tão eficiente que a guerra ficou conhecida na história
como o levante macabeu. A liderança de Judas e a disposição de seus seguidores
para arriscar a vida pela causa, ao lado das dificuldades internas e externas que
assolavam o Estado selêucida, asseguraram a vitória aos judeus. Em 164 a.C., o
Templo foi reconquistado, restaurou-se o culto legítimo e dois anos depois a
comunidade judaica recuperou seus direitos tradicionais.
Capítulo 3
Capítulo 4
Sabe-se que os mitos antigos sobre os monstros do caos ainda eram muito
difundidos no século II e sem dúvida proporcionaram os símbolos utilizados
pelo autor do sétimo capítulo do Livro de Daniel.13 Com os animais que
emergem do mar turbulento, aqueles monstros retornam à vida dotados de um
novo sentido. A exemplo daqueles seres primordiais, os impérios pagãos
combatem a ordem estabelecida nos céus, lutando para substituir o cosmos pelo
caos. Isto vale sobretudo para o quarto e último império e, acima de tudo, para o
próprio Antíoco. O capítulo 7 prevê de que modo o tirano irá impedir os judeus
piedosos, “os santos do Altíssimo”, de observar a Lei e como tentará modificar
as datas das festas religiosas — ambos essenciais para a manutenção da ordem
estabelecida por Deus. Nos capítulos 8 e 10, que devem ter sido escritos depois,
Antíoco aparece como um monstro do caos com forma humana. Ele estabelecerá
a “abominação da desolação” (siqus shomen — deformação proposital do nome
divino Baal Shamen) no próprio Templo. Ele exaltará a si mesmo acima de todos
os deuses, inclusive do único e verdadeiro Deus, e irá desafiar o Altíssimo.
Todas essas coisas foram reveladas a Daniel em visões e comunicações
angélicas — assim como a vingança divina: no prazo de três anos e meio, o reino
do tirano será destruído e ele próprio perecerá.
Por vezes os anjos padroeiros das nações lutam entre si no céu — do mesmo
modo como os deuses, nos mitos da Mesopotâmia, costumavam lutar entre si em
batalhas que decidiam o resultado de batalhas travadas na terra. Em Daniel, tal
concepção é pressuposta: ficamos sabendo de lutas futuras de Gabriel e Daniel
contra o anjo protetor da Pérsia e, depois — quando o império aquemênida
chega o fim e surgem os reinos ptolomaico e selêucida —, contra o anjo protetor
da Grécia.15 É o resultado no céu desta última batalha que determina o resultado
da guerra dos macabeus. Na libertação e redenção final dos judeus, há
participação direta de Miguel: “E chegará [Antíoco] a seu termo, sem que
ninguém lhe venha em auxílio. Nesse tempo levantar-se-á Miguel, o grande
Príncipe, que se conserva junto dos filhos do teu povo. Será um tempo de tal
angústia qual jamais terá havido até aquele tempo, desde que as nações existem.
Mas nesse tempo o teu povo escapará 16
Pois a libertação seria obra de Deus: as forças dos macabeus não passavam
de instrumentos em sua mão, e a vitória delas, quando chegasse, seria na verdade
a vitória de Deus. Na grande visão do “Antigo de Dias”, é o próprio Deus quem
julga o reino selêucida, simbolizado pelo quarto animal, e o condena à
destruição. E é o próprio Deus quem entrega a soberania eterna sobre todo o
mundo a “um como Filho de Homem”.
Capítulo 5
Capítulo 6
Quem são esses mortos? Também nesta questão os estudiosos ainda não
chegaram a um acordo. De modo geral, parece provável que o autor do
apocalipse não tinha em mente o conjunto da humanidade e nem mesmo os
judeus enquanto tais, mas apenas duas categorias de judeus. Por um lado, os
mártires que, sob a perseguição de Antíoco, haviam escolhido a morte a fim de
não trair seu deus; por outro lado, aqueles que haviam capitulado e agora
desfrutavam do favor do tirano. Por que os piedosos deveriam perecer, não a
despeito de sua piedade, mas por causa dela? E por que a apostasia deveria ser
recompensada com a vida, e muitas vezes até mesmo com uma vida próspera?
Em Daniel 12, a profecia afirmava que não iria perdurar um estado de coisas que
era um ultraje tão monstruoso aos padrões de justiça judeus e israelitas. Daniel
12 foi composto quando a perseguição ainda estava ocorrendo — não é de
surpreender, portanto, que oferecesse solução para um tormento muito real de
seus leitores.
10 - APOCALIPSES JUDAICOS (II)
Capítulo 1
Embora o I Enoque não faça parte da Bíblia, nem mesmo dos Apócrifos,
nos séculos imediatamente anteriores e posteriores a Jesus esse texto era
amplamente conhecido e desfrutava de imenso prestígio. Nos séculos II e I a.C.,
nada menos que onze manuscritos dele foram produzidos somente pela
comunidade de Qumran, e com certeza era conhecido em círculos muito mais
amplos: os autores de apocalipses posteriores, do final do século I d.C, ainda
estavam familiarizados com o texto. E se os rabinos, quando terminaram de
estabelecer o cânone hebraico — também no final do século I d.C. —, excluíram
o I Enoque, os cristãos primitivos o viam de maneira muito mais favorável. O
Novo Testamento e os Apócrifos contêm referências à obra: no século I, Judas o
cita, e, no seguinte, Barnabé alude a ele como tendo pertencido às Escrituras. Na
verdade, ao longo dos três primeiros séculos, esse texto continuou a ter toda a
autoridade de um livro canônico para os autores cristãos, inclusive para Padres
tão importantes quanto Clemente de Alexandria, Irineu e Tertuliano. Foi apenas
no século IV, sob a influência de são Jerônimo e santo Agostinho, que ele caiu
em descrédito, e mesmo assim só no Ocidente. Na Igreja oriental, continuou a
ser tratado com respeito até o século IX.
Devido ao veto dos rabinos, não chegou até nós nenhuma versão completa
da obra, em sua linguagem (ou linguagens) original. Os fragmentos de Qumran
sugerem que quase todo o I Enoque foi composto em aramaico, embora parte
dele possa ter sido escrita em hebraico. Nossa principal fonte, contudo, é uma
tradução etíope feita entre os séculos IV e VI para a Igreja cristã da Etiópia.1 Esta
versão baseia-se sobretudo em uma tradução grega, da qual sobreviveram
fragmentos. Independentemente do idioma, a obra é conhecida como I Enoque,
para distingui-la de um texto muito diverso conhecido pelos títulos de II Enoque,
Os segredos de Enoque ou Enoque eslavônico.
O Livro dos Jubileus parece ter sido composto por um único autor no período entre 175 e
140 a.C. Esse autor tinha conhecimento dos trechos mais antigos do I Enoque e
explicita muita coisa que é apenas aludida naqueles escritos. O destino do livro
também foi semelhante ao do I Enoque. Escrito em hebraico, foi traduzido para
o grego, e do grego para o etíope — língua na qual nos chegou a única versão
completa da obra (que continua a ser incluída em algumas versões da Bíblia
etíope). E, tal como o I Enoque, o Livro dos Jubileus foi levado muito a sério
pela seita de Qumran. Um dos escritos da seita, conhecido como Documento de
Damasco, cita-o como fonte autorizada/ e doze manuscritos fragmentários da
obra foram encontrados em Qumran — um a mais do que os manuscritos do I
Enoque.
Capítulo 2
Sem dúvida alguma, tanto o I Enoque como o Livro dos Jubileus são
produtos da civilização helenística. Uma concepção de mundo tão enciclopédica
a ponto de abranger a geografia do céu e da terra, a astronomia, a meteorologia e
a medicina não fazia parte da tradição judaica — mas era muito familiar aos
gregos letrados. Aos olhos destes, o entendimento racional do funcionamento do
universo e a especulação racional sobre a força por trás desse funcionamento
eram os privilégios e as realizações mais elevados ao alcance dos homens. O I
Enoque e o Livro dos Jubileus revelam que os “sábios” judeus estavam bem
informados sobre a sabedoria grega — mas também os mostram empenhados
implicitamente em uma controvérsia com essa sabedoria.
São os anjos os responsáveis por fazer com que de fato obedeçam. Tudo o
que existe no mundo está sob a guarda de um anjo e todos os anjos estão sob o
comando de Deus, o “Senhor dos Espíritos”, como é chamado no I Enoque. O
Livro dos Jubileus mostra Deus, já no primeiro dia da criação, assegurando a
estabilidade de sua obra por meio da criação de anjos que cuidem dos ventos e
das nuvens, do granizo e da geada, do raio e do trovão, do frio e do calor, do
inverno, da primavera, do verão, do tempo da colheita, da luz da aurora e da
manhã, do lusco-fusco do anoitecer — na verdade, de todas as coisas no céu e na
terra.7 E o I Enoque conta de que modo o anjo Uriel “tem um poder celestial
sobre a noite e o dia de modo a fazer com que a luz brilhe sobre os homens: o
sol, a lua, e as estrelas, todos os poderes do céu que seguem em suas órbitas”, ao
passo que os anjos menores cuidam das estrelas individuais para assegurar que
apareçam nos momentos e locais apropriados.8
Uriel prediz que isto irá de fato ocorrer. Devido aos defensores do
calendário lunar, os dias santos serão confundidos com os dias “impuros”. A
implicação é clara: aos olhos do autor do Livro dos Jubileus, e daqueles que o
levavam a sério, os seguidores do calendário lunar estavam perturbando a ordem
cósmica estabelecida divinamente. E isso tinha importância para o Juízo Final e
seu resultado. Na época seguinte ao Juízo, apenas o calendário solar será
observado — e apenas aqueles que o observam agora podem ter a esperança de
partilhar deste futuro abençoado.
Capítulo 3
Tal concepção não tinha lugar na visão de mundo israelita. O satan que
aparece de tempos em tempos na Bíblia hebraica — de modo mais notável no
prólogo a Jó — é sem dúvida um anjo bem posicionado na corte celestial.
Conselheiro e emissário de Yahweh, deve o epíteto de satan (“adversário” ou
“acusador”) apenas ao fato de por vezes desempenhar o papel de advogado de
acusação contra este ou aquele ser humano. Embora tenham sido feitas várias
tentativas de associá-lo ao Satã de épocas posteriores, hoje está demonstrado que
tal associação é um equívoco.19
Pior ainda, o intercurso ilícito entre anjos e mulheres deu origem a uma raça
de gigantes, uma espécie extremamente destrutiva que passou a devorar tudo
sobre a terra, inclusive os seres humanos e eles próprios.
Capítulo 4
Abraão reconhece isto quando ora: “Salve-me das mãos dos espíritos
maléficos que dominam os pensamentos dos corações humanos, e faça com que
não me desencaminhem de Ti, meu Deus”.30 E quando abençoa seu filho Jacó
com estas palavras: “Os espíritos de Mastema não prevalecerão sobre ti [...] para
te desviar do Senhor”.31
Esse estado de coisas não irá perdurar para sempre. Para o autor do Livro
dos Jubileus, é iminente o “grande julgamento”. Depois de relatar, sob o disfarce
da profecia, os males que haviam tomado conta da Palestina no passado recente
— a opressão e perseguição dos judeus piedosos pelos selêucidas, os conflitos
entre os próprios judeus, a miséria assombrosa que fazia com que crianças
ficassem de cabelo branco e parecessem pequenos velhos32 —, ele prediz uma
grande mudança. Primeiro virá um renascimento religioso: “E nesses dias as
crianças começarão a estudar as leis, e a cumprir os mandamentos, e a voltar
para as sendas da retidão”.33 Em seguida, os opressores serão derrubados.
Os anjos decaídos também aparecem ali, assim como outros anjos maléficos
— os anjos da guarda das nações pagãs e hostis. No Juízo Final, iminente para o
autor, estes últimos serão lançados no abismo flamejante, juntamente com todos
os povos que alguma vez oprimiram Israel. E o resto da humanidade será
submetido a um processo de regeneração. As nações pagãs ficarão tão
assombradas com a revelação do poder do único Deus verdadeiro que acabarão
por se converter. Em seguida. Deus substituirá a Jerusalém existente pela nova
Jerusalém. O Templo existente também será substituído por um novo Templo,
maior, mais alto, decorado de maneira mais esplêndida — e todas as nações
acorrerão a ele. E Deus aceitará a todas com alegria.
Uma profunda transformação tem início. As primeiras gerações da
humanidade eram apropriadamente representadas por touros e vacas. Foi
somente após a intervenção dos anjos decaídos que os vários povos puderam ser
representados, tal como convinha, por criaturas como leões, tigres, lobos, cães,
hienas, ursos selvagens, raposas, texugos, porcos, falcões, abutres, milhafres,
águias, corvos — muitos deles ferozes e perigosos para o homem, todos impuros
pelos padrões judaicos e, certamente, todos inferiores aos touros e vacas
originais. Também as ovelhas são inferiores: na narrativa alegórica, em geral são
mostradas como meras vítimas dos animais selvagens, sempre se lamentando,
incapazes de se proteger. Até mesmo o carneiro — Judas Macabeu —, que se
sobressai no meio delas e usa os chifres com tanta eficácia, é obviamente uma
criatura inferior a um touro. Porém, tudo isso irá mudar quando Deus tiver
estabelecido seu reino na terra.
Primeiro irá nascer um único touro branco, com chifres tão grandes que
todos os animais o temerão. Mas em seguida os próprios animais sofrerão
mudanças: “E enquanto eu observava todas as espécies eram transformadas, e
todas se tornaram touros brancos; e o primeiro dentre eles era um touro bravo, e
esse touro era um animal enorme e tinha chifres negros em sua cabeça”.39 Deus
se rejubila por essas novas criaturas — e com razão. A degeneração ocorrida
desde a queda dos anjos é revertida, restaura-se a grandeza das primeiras
gerações após a criação. Na verdade, essa grandeza é ampliada. Pois, se Adão
era representado simplesmente por um touro branco, o touro bravo com chifres
excepcionalmente grandes representa sem dúvida um novo Adão, mais glorioso
que o primeiro — talvez um personagem messiânico. E, de novo, no início havia
apenas poucos seres humanos no mundo, mas nessa época futura e derradeira
haverá multidões, e cada indivíduo será tão louvável quanto aqueles poucos
seres humanos originais.
Mas essas pessoas felizes não serão imortais, nem se contarão entre elas os
mortos virtuosos. Nas poucas vezes em que estes são mencionados no I Enoque
e no Livro dos Jubileus, parecem destinados a uma existência bem-aventurada
como almas incorpóreas — uma noção tão pouco judaica que os estudiosos
costumam atribuí-la a influências gregas. O que estas obras sem dúvida
prometem com mais ênfase é que uma geração após outra, sucedendo-se
interminavelmente, irá desfrutar de uma vida pacífica, sadia e longa, vivida em
perfeita comunhão com Deus, em um mundo do qual todo agente do caos,
humano ou sobrenatural, terá sido eliminado.
Capítulo 5
Igualmente importante era a doutrina dos “dois espíritos”, cujo relato mais
claro se encontra na Regra da Comunidade:
[O Deus da Sabedoria] criou o homem para governar o mundo, e conferiu-lhe dois espíritos,
pelos quais ele deveria viver até o momento de Sua visitação: os espíritos da verdade e da
falsidade.
Aqueles nascidos da verdade emergem de uma fonte de luz, mas os nascidos da falsidade
emergem de uma fonte de trevas. Todos os filhos da retidão são governados pelo Príncipe da
Luz e andam pelos caminhos da luz, mas todos os filhos da falsidade são governados pelo Anjo
das Trevas e andam pelos caminhos da escuridão.
O Anjo das Trevas leva todos os filhos da retidão a se desencaminharem, e até o seu final,
todos os pecados, iniqüidades, perversidades e atos ilegítimos destes são ocasionados por seu
domínio de acordo com os mistérios de Deus [...]
Mas o Deus de Israel e Seu Anjo da Verdade irão socorrer todos os filhos da luz. Pois é Ele o
criador dos espíritos da Luz e das Trevas e fundamentou toda ação neles e estabeleceu todos
os atos [sobre] os caminhos deles.
E ele ama um deles para todo o sempre e se rejubila em suas obras para todo o sempre; mas o
conselho do outro ele abomina e odeia seus caminhos para todo o sempre.45
O que proporcionava força tão extraordinária a esses homens era a interpretação que faziam da
profecia bíblica. Assim como os autores dos apocalipses, estavam convencidos de que somente eles haviam
entendido o que fora proclamado pelos profetas, algo cujo efetivo significado escapara até mesmo a estes.
Graças à inspiração divina, o Mestre da Retidão fora capaz de apreender e expor a verdadeira importância
dos ensinamentos de Isaías, de Oséias e dos outros. Deus lhe informara “quando os tempos chegariam ao
fim” e o que aconteceria então aos piedosos e aos ímpios. Como costuma ocorrer em tais grupos, o valor
que a comunidade de Qumran atribuía à humildade e à paciência não a impediu de entreter fantasias de
natureza bem diversa. Todos os que se haviam rebelado contra Deus estavam prestes a ser aniquilados, a
“Casa de Judá” (isto é, a própria seita) estava na iminência de triunfar de uma vez por todas, os mortos
piedosos seriam ressuscitados a fim de partilhar desta glória — tudo isso encontrava-se nos conhecimentos
secretos que o Mestre havia decodificado da profecia bíblica e transmitido a seus discípulos, os sábios da
comunidade. E foi este conhecimento que, nas horas de provação, permitiu aos membros da seita não
apenas aceitar o martírio, mas também rejubilar-se com ele.
O Mestre da Retidão e os sábios que o seguiam sempre haviam aguardado uma conflagração final,
quando um papel decisivo estaria reservado à seita. Sob o comando do “Príncipe da Congregação”, os
“filhos da luz” atacariam o “exército de Satã” — primeiro os judeus incrédulos e seus aliados entre as
nações vizinhas, em seguida os romanos que ocupavam a terra. Depois, seguiriam até Jerusalém e
restaurariam o culto correto no Templo. A partir dessa base, travariam uma guerra contra vários povos do
Oriente Próximo. À vitória sobre eles se seguiria a vitória sobre os romanos. Com todos os exércitos de
Beliar completamente derrotados, os “filhos da luz” iriam celebrar seu “herói”, o próprio Deus. O hino com
que fariam isto lembra a profecia subseqüente ao exílio:
Eleve-se, ó Herói! [...] Castigue as nações, Tuas adversárias, e devore a carne com Tua
espada! Cubra Tua terra de glória, e Tua herança de bênçãos! Que haja multidão de gado em
Teus campos, e, em Teus palácios, prata e ouro e pedras preciosas! Ó Sião, rejubile-se à
larga! Rejubilem-se, cidades de Judá! Mantenham sempre abertos seus portões para que sejam
trazidas as hostes das nações! Os reis delas O servirão e todos os seus opressores se
prostrarão perante Ti; eles irão beijar o pó de Teus pés. Gritem de alegria, ó filhas do meu
povo! Enfeitem-se com jóias gloriosas e predominem sobre os reinos das nações! A soberania
estará com o Senhor e o domínio eterno com Israel.47
Essa guerra na terra não duraria menos de quarenta anos, com interlúdios sabáticos a cada sete anos
— e, como em Daniel, ela teria uma dimensão cósmica, uma contrapartida celeste. Os exércitos angélicos
sob o comando do padroeiro de Israel, o anjo Miguel — ali chamado também Príncipe da Luz e
Melquisedeque (“meu rei é retidão”) —, enfrentariam as forças demoníacas lideradas por Beliar, também
chamado Melquiresha (“meu rei é impiedade”). Os dois exércitos estariam tão equilibrados que as hostes
angélicas alcançariam a vitória três vezes, o mesmo ocorrendo com as hostes demoníacas. No final, o
próprio Deus iria intervir de modo a aniquilar todo o mal.48 Ou, segundo outra versão, haveria um Juízo
Final, quando Miguel/Melquisedeque recompensaria os “santos de Deus” e executaria a vingança contra
Satã e seus asseclas.49
A seita esperava que sua vitória final fosse seguida de imediato pela era messiânica. Em alguns
manuscritos, o “Príncipe da Congregação” é identificado como o messias davídico: ele governará Israel
como rei, sob a orientação de um messias-sacerdote, “intérprete da Lei”, “que irá ensinar a retidão no final
dos dias”.50 Isto era um pouco mais que uma projeção no futuro das instituições já existentes na seita. De
qualquer modo, a era messiânica não é a derradeira: há alusões a uma transformação mais fundamental, por
vezes chamada de “Renovação”.’1 Quando esta ocorrer, os pecadores serão lançados em “tormento eterno e
incessante desgraça [...] no fogo das regiões sombrias”.52 Os justos, por outro lado, serão recompensados
com “bálsamos, muita paz em uma vida longa, e fecundidade, juntamente com eterna bem-aventurança e
eterna alegria na vida sem fim, uma coroa de glória e uma vestimenta de majestade em luz incessante”.53
Não há aqui nenhuma sugestão — não mais do que no Livro de Daniel — de que os justos irão viver
como almas imateriais em um domínio imaterial: as coroas de alegria e as vestimentas de majestade serão
conferidas a corpos, os quais em seguida se tomarão (como em Daniel) radiantes e parecidos com os dos
anjos. E em trechos confirma-se — o que, de qualquer modo, deveríamos ter suposto — que os mortos
piedosos serão ressuscitados a fim de participar de um estado de glória eterno e derradeiro: “Ice uma
bandeira, ó tu que jaz no pó! Ó corpos roídos pelos vermes, ergam um estandarte [...]!”54 A vida em
companhia dos anjos, já desfrutada na vida presente,55 será o destino eterno de todos os justos.
Tal era a visão de mundo da comunidade de Qumran. Muito dela lembra aquelas obras tão apreciadas
pela comunidade: o Livro de Daniel, o I Enoque, o Livro dos Jubileus. Em seu dualismo radical, por outro
lado, lembra um outro corpo de ensinamentos. Os dois espíritos em guerra, atuando tanto no mundo como
no coração de cada ser humano; a batalha escatológica entre o príncipe da luz e o das trevas, com a vitória
alternando-se entre ambos; a intervenção final de Deus a fim de aniquilar as forças do mal; a “Renovação”
que inaugura, para os eleitos, uma eternidade de bem-aventurança numa terra purificada — tudo isso é
estranhamente familiar, mais do que tudo o que se encontra nos apocalipses, às expectativas propostas e
difundidas pelo zoroastrismo, sobretudo em sua versão zurvanita.56
11 - A SEITA DE JESUS
Capítulo 1
Embora ao longo dos séculos os judeus se mantivessem unidos em torno da devoção a Yahweh e da
aceitação das obrigações inscritas na Torá, sua união limitava-se a isto. Até a queda de Jerusalém em 70
d.C. e o subseqíiente conselho em Yavneh, não havia ortodoxia judaica: o judaísmo incluía inúmeros
grupos e seitas. Os cristãos formavam uma delas, assim como os saduceus, os fariseus, os essênios, os
“zelotes” (combatentes da resistência) e outros menos conhecidos. Os cristãos, incluindo os gentios
convertidos, consideravam-se judeus, e, até uma data bem avançada no século II d.C., outros judeus também
consideravam os cristãos como judeus, embora com estranhas crenças a respeito do profeta Jesus de
Nazaré.1
Quase tudo o que sabemos a respeito de Jesus e de seus primeiros seguidores vem das obras em grego
de autores desconhecidos que adotaram os nomes de Mateus, Marcos e Lucas, e que conhecemos como
evangelhos sinóticos. O evangelho mais antigo, o de Marcos, provavelmente foi composto por volta de 70
d.C., mas textos mais antigos encontram-se incrustrados em Mateus e Lucas. Esse material, desconhecido
para Marcos e em geral atribuído a uma fonte perdida conhecida como Q, foi composto provavelmente por
volta de 50 d.C.
Mas, para Jesus, o que significavam o reino e sua vinda? Achava ele que se tratava de um processo
gradual de aperfeiçoamento ético, estendendo-se até um futuro remoto? Ou seria algo presente aqui e agora,
algo a que os indivíduos teriam acesso se o quisessem? Seria um sentimento de companheirismo do
indivíduo para com Deus? Todas essas concepções já foram defendidas, com muita erudição e convicção,
por estudiosos respeitáveis. No entanto, outros estudiosos propuseram interpretações que, por mais
divergentes em pontos específicos, têm em comum o pleno reconhecimento do contexto histórico em que
Jesus viveu, pensou e ensinou.4 Eles sustentam que Jesus esperava uma completa transformação do mundo
no futuro muito próximo. Essa interpretação — que encontra firme apoio tanto em Marcos como em Q —
será adotada aqui.
Capítulo 2
Por que motivo o reino de Deus estaria no futuro? Por que não esteve sempre presente? A resposta de
Marcos é bastante clara, embora muitos cristãos atuais a considerem difícil de aceitar. Vários sectários
judeus, tais como a comunidade de Qumran e o autor do Livro dos Jubileus, pregavam que um ser
sobrenatural de força aterrorizante atuava no mundo, lutando sem cessar para frustrar as intenções de Deus
— e continuaria a agir assim até que no fim dos tempos fosse derrubado e destruído.5 Marcos apresenta
Jesus e seus discípulos como profundamente imbuídos da mesma convicção: no centro da visão de mundo
deles também havia um dualismo escatológico.
No início mesmo de seu ministério, após ser batizado por João, Jesus recebe a visita do Espírito, que
de imediato o leva ao deserto, onde por quarenta dias seria tentado por Belial (ou Satã). Na tradição judaica,
a tentação não era considerada sedução, mas uma prova de força: Jesus trava um combate com Satã — um
Satã tão poderoso que domina todos os reinos do mundo. E o cenário da luta, ou combate, é significativo: “e
[Jesus] vivia entre as feras, e os anjos o serviam’’. São imagens muito familiares da Bíblia: uma vez que,
segundo o Gênesis, Adão vivera em paz entre os animais selvagens no Jardim do Éden, do mesmo modo,
segundo Isaías, na era vindoura todas as espécies animais viverão em paz umas com as outras e com os
seres humanos. Agora que Satã está sendo derrotado, o paraíso está sendo reconquistado — e, se os anjos
estão a serviço de um ser humano, isto significa que está sendo restaurada a comunhão entre Deus e a
humanidade.6
Nas versões anteriores do mito do combate, as forças do caos que o herói — Marduk ou Ba’al —
enfrentava e derrotava eram simbolizadas pelo mar tempestuoso. Haveria talvez algum eco disso nas
histórias de como Jesus repreendeu e acalmou as águas inquietas do lago de Genesaré, caminhando então
sobre elas? De modo mais certo, Jesus luta com Belial por meio de exorcismos.7 Nos territórios
setentrionais, os “homens de Deus’’ sempre haviam sido creditados com poderes curativos: já no século IX
a.C, Elias e Eliseu eram curandeiros famosos. Mas os poderes atribuídos a Jesus (também oriundo do norte)
tinham um significado novo e mais profundo. Acreditava-se em geral que tanto as doenças físicas quanto as
mentais eram manifestações do poder de Satã. A enfermidade física era o modo como Deus punia o pecado
— era Satã, porém, quem levava os seres humanos a pecar. Quanto às desordens mentais, estas deviam-se à
possessão demoníaca — e, claro, os demônios eram auxiliares de Satã.
Deus havia dado a Jesus poder sobre os demônios, como eles próprios reconheceram ao exclamar:
“Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste para arruinar-nos?”.8 E como os demônios pertenciam às
hostes satânicas, cada exorcismo de um deles era visto como um ataque bem-sucedido aos domínios de
Satã. É desta maneira que, nos evangelhos, Jesus justifica seus exorcismos perante aqueles que os criticam:
nos debates com os oponentes, deixa claro que considerava esses atos como parte de uma enorme luta,
travada por ele e seus seguidores em nome de Deus, com a ajuda de Deus, contra os inimigos de Deus.9
Chega mesmo a se comparar com um ladrão que entra na casa de um homem forte, amarra-o e rouba seus
pertences — o homem forte sendo, evidentemente, Satã.10
O mesmo significado é atribuído à atividade de Jesus e seus discípulos enquanto pregadores. Quando
Jesus ordena a seus seguidores que preguem a vinda do reino, também os encarrega, ao mesmo tempo e
como parte da mesma missão, de expulsar demônios, curar os enfermos e oferecer o perdão para seus
pecados — três formas de dizer a mesma coisa, pois as palavras que significam “curar”, “expulsar
demônios” e “perdoar os pecados” eram sinônimos intercambiáveis.” O exorcismo, a cura e o anúncio da
chegada do reino eram maneiras de libertar as pessoas do domínio de Satã.
Afastar as pessoas para longe de Satã por meio da pregação, do exorcismo dos demônios e da cura
das enfermidades — tudo isto fazia parte do drama escatológico. Embora os milagres de Jesus tenham sido
por vezes comparados aos feitos dos mágicos helenísticos ou rabínicos, seu significado original era bem
diverso: todos os seus milagres tinham o objetivo de preparar o caminho para a chegada do reino — na
verdade, eram sinais da iminência do reino. Quando os discípulos retomam da missão, exultando com o
êxito, seu relato faz com que Jesus evoque uma visão: ele vê Satã cair tal como o raio cai do céu.12 O
sentido é bastante claro: Satã, antes senhor de todos os reinos da terra, está perdendo o poder, seu domínio
chega ao fim, sua mina é certa.
Não que o reino de Satã vá terminar de modo pacífico, cedendo pouco a pouco ao reino de Deus.
Antes que o cosmos possa se tornar perfeito, as forças do caos se enfurecerão como nunca antes. Os escritos
apocalípticos haviam previsto exaustivamente um período de terríveis tribulações que precederia a era final
de redenção: a guerra do quarto animal contra o povo de Deus, em Daniel, é um exemplo. O chamado
“apocalipse de Marcos” conta como as guerras e os rumores de guerras, terremotos e fomes, perseguições e
fugas, escurecimentos do sol e da lua e perturbações das estrelas irão inaugurar a grande consumação13 —
e, mesmo se esta profecia específica foi elaborada pela Igreja primitiva, o temor que exprime pode muito
bem ter sido partilhado por Jesus. O texto do pai-nosso indica a mesma coisa, pois originalmente a frase
“não nos deixe cair em tentação” ou “não nos imponha tal provação” referia-se às adversidades planejadas
por Satã como último e desesperado estratagema para subverter os fiéis e preservar seu poder no mundo.14
É por isso que, na versão de Mateus, tal apelo é reforçado por outro: “Livra-nos do Maligno”, isto é, de
Satã. Como iremos ver, o Livro do Apocalipse tem muito a dizer sobre isto.
O reino viria quando Deus o desejasse, seu advento seria a irrupção na história de uma força divina
destruidora e transformadora. Mas os seres humanos poderiam preparar o caminho, o número dos que
seriam eleitos para participar do reino poderia ser ampliado. Jesus e seus discípulos são apresentados como
homens que buscam tal objetivo.
Capítulo 3
No reino vindouro, a intenção original de Deus, não mais frustrada por Beliar-Satã, seria plenamente
realizada.
Jesus partilhava a visão do mundo corrente na época. Havia a terra com seus habitantes humanos,
havia o céu com suas hostes angélicas — e os dois não apenas estavam relacionados, como deviam se
corresponder com exatidão. É isto o que estava para ocorrer: Deus, em manifestação suprema de sua
autoridade soberana, estava prestes a restaurar a ordem que havia originalmente determinado para o céu e a
terra, mas que até então vigorara apenas no céu. “Venha o teu Reino, seja feita a tua Vontade na terra como
no céu” — vistas em tal contexto, as palavras adquirem novo sentido. Elas se referem a uma restauração na
terra do que havia estado ali no início. O Jardim do Éden havia sido efetivamente o céu na terra. Agora esta
perfeição primordial estava prestes a ser recriada — em escala gigantesca, envolvendo multidões e não
apenas Adão e Eva, e desta vez de maneira irreversível.
Entre os seres humanos e Deus seria estabelecido um novo relacionamento, no qual a confiança e a
submissão filial teriam como resposta um ilimitado amor paterno. E esse amor se manifestaria como
transformação da condição humana. Todas as bênçãos antecipadas pelos profetas seriam concedidas. Em
Isaías, está dito que “Então se abrirão os olhos dos cegos, e os ouvidos dos surdos se desobstruirão”.15 Para
Jesus, isto só podia significar que o poder exercido por Satã e seus demônios sobre os seres humanos seria
rompido — e isto já estava acontecendo. Nas palavras de Mateus: “De sorte que as multidões ficaram
espantadas ao ver os mudos falando, os aleijados sãos, os coxos andando e os cegos a ver. E renderam
glória ao Deus de Israel”.16
Também não haveria mais fome. Aqui o Livro de Isaías novamente apontava o caminho: “Yahweh
dos Exércitos prepara para todos os povos, sobre esta montanha, um banquete de carnes gordas, um
banquete de vinhos finos, de carnes suculentas, de vinhos depurados”.17
As vezes, Jesus também compara o reino a um banquete, e parece que não se tratava de mera
comparação, pois na Ultima Ceia relata-se que ele disse: “Em verdade vos digo, já não beberei do fruto da
videira até aquele dia em que beberei o vinho novo no Reino de Deus”.18 Isto não implica necessariamente
que Jesus esperava retomar do reino dos mortos — de acordo com estas palavras, poderia muito bem estar
esperando que os dias seguintes trouxessem não a sua morte, mas o próprio reino. E há ainda a história da
figueira que Jesus supostamente teria amaldiçoado por não dar figos quando ele os queria, embora não fosse
a estação adequada: já se argumentou de maneira plausível que na verdade Jesus clamava pelo advento do
reino, quando a maldição primordial sobre a terra seria anulada e a natureza produziria seus frutos com
incessante abundância.19
Seja como for que interpretemos essas passagens, não há dúvida de que alguns dos primeiros cristãos
esperavam de fato por uma era de fertilidade e fartura ilimitadas. Um eco dessas expectativas encontra-se
preservado nos escritos do “Padre Apostólico” Papias, compostos por volta de 110 d.C.20 Erudito e bispo de
Hierópolis, na Frigia, Papias era um judeu cristão que partilhava a perspectiva dos judeus cristãos que
haviam fugido da Palestina para a Ásia Menor após a catástrofe de 70 d.C. Dedicou-se a preservar os relatos
dos ensinamentos de Jesus que estavam em circulação — e eis o que acredita que Jesus vaticinara a respeito
do milênio que se seguiria ao seu retomo à terra:
Virão os dias nos quais as videiras florescerão, tendo cada uma dez mil brotos, e em cada
broto dez mil galhos, e em cada galho verdadeiro dez mil ramos, e em cada ramo dez mil
cachos, e em cada cacho dez mil uvas, e cada uva produzirá vinte e cinco medidas de vinho. E
quando qualquer um dos Santos tocar em um cacho, outro cacho irá exclamar: “Eu sou um
cacho melhor, colha a mim; peça a bênção do Senhor por meu intermédio”. Do mesmo modo,
[o Senhor] disse que um grão de trigo produziria dez mil espigas, e cada espiga teria dez mil
grãos, e cada grão daria dez libras da mais fina farinha, alva e pura; e as maçãs, as sementes,
a relva produziriam com a mesma abundância; e todos os animais, alimentando-se apenas do
que receberam da terra, se tomariam pacíficos e amistosos uns com os outros, e
completamente submissos ao homem. Ora, essas coisas são aceitas pelos crentes. E Judas,
sendo um traidor incrédulo, perguntou: “Como todo esse crescimento será criado pelo
Senhor?”. Mas o Senhor respondeu-lhe: “Aqueles que estiverem vivos nesse tempo, esses
verão”.21
Tais expectativas eram tradicionais. Sancionadas por grande parte das profecias posteriores ao exílio,
encontraram um lugar também nos apocalipses judaicos: aquele conhecido como II Baruc, composto por
volta de 100 d.C, contém uma profecia muito semelhante à encontrada em Papias.22 Ainda no final do
século II, Irineu, bispo de Lyon e respeitado teólogo, costumava citar Papias ao lado de trechos das
Escrituras, insistindo até que a ortodoxia impunha acreditar que tais coisas iriam ocorrer.2 Que o próprio
Jesus tivesse partilhado essas mesmas expectativas deve ter parecido evidente.
Como é dito nos evangelhos, Jesus esperava que os habitantes do reino fossem muito diferentes dos
mortais comuns. Seu comentário sobre João Batista aponta nessa direção: ninguém maior do que João havia
nascido de mulher e, no entanto, o menor dos habitantes do reino seria maior do que ele.24 Em outro
momento, Jesus deixa claro que considera João Batista a reencarnação de Elias — aquele profeta máximo
cujo retomo à terra era aguardado, conforme a tradição, como anúncio do advento do reino. Assim, se João
é inferior aos habitantes do futuro reino, estes terão se tornado algo mais do que aqueles “nascidos de
mulher”.
A sugestão pode ser explorada. De novo lembramos a frase do pai-nosso, “na terra como no céu”.
Com o advento do reino, o estado desse mundo irá refletir o que sempre existiu no céu. Talvez, então, o céu
e a terra se fundam e todos os habitantes desse domínio único se tornem gloriosos? Por vezes Jesus parece
sugerir exatamente isto: no reino, diz ele, homens e mulheres serão “como os anjos nos céus” e não se
casarão. Em outra parte relata-se que, segundo suas palavras, no reino os justos brilharão “como o sol”.25
Paulo sem dúvida esperava um reino puramente espiritual, “no ar”. Mas o próprio Jesus parece, em
vez disso, ter esperado por uma terra transformada. Se for assim, estava sendo fiel a uma tradição que
remontava a apocalipses como o I Enoque e o Segundo Isaías. Tampouco — ao contrário de opinião muito
difundida — foi esta tradição rejeitada de imediato pelo cristianismo: nem todo mundo concordou com
Paulo. O mais eminente dos Padres, santo Agostinho, diz o seguinte na Cidade de Deus, escrita entre 413 e
427 d.C:
[...] este céu e esta terra cessarão de existir e um novo mundo terá início. Mas o antigo não
será consumido por completo; apenas passará por uma mudança universal [...] Então (como
disse) as qualidades corruptíveis do mundo serão calcinadas e todas aquelas que têm
correspondência com nossa corrupção serão tornadas adequadas para a imortalidade, de
modo que o mundo, sendo assim substancialmente renovado, possa se adaptar adequadamente
aos homens cuja substância também foi renovada.26
Um decreto divino pelo qual os seres humanos eram resgatados da tirania dos demônios, aliviados do
fardo do pecado, aliviados também daquelas desordens físicas e mentais que eram o sinal externo do pecado
e da possessão demoníaca, e passavam a habitar uma terra infinitamente fértil e incorruptível, dotados de
corpos imortais, etemamente jovens e gloriosos, acima de tudo reconciliados com um deus-pai amoroso e
clemente — isto, aparentemente, é o que muitos cristãos primitivos consideraram que Jesus havia
prometido.
Capítulo 4
A Galiléia em que Jesus pregou era uma terra fértil, cultivada por lavradores prósperos. Porém,
mesmo na Galiléia havia desprivilegiados e excluídos — e foi com eles que Jesus se preocupou. Eles não
precisavam ter nenhum mérito, nem ser piedosos: bastava, em geral, o fato de serem marginalizados. Os
fisicamente enfermos e os mentalmente perturbados; aqueles que exerciam ofícios desprezados, tais como
coleta de impostos e prostituição; os pobres e os ignorantes; as mulheres e as crianças, que em geral não
contavam para nada — todos esses tinham prioridade nos relacionamentos pessoais de Jesus.
Havia também as pessoas a quem de preferência Jesus dirigia sua proclamação. Quando resume as
curas miraculosas que realizara como preparativo para o advento do reino, ele o faz em palavras que
associam três passagens de Isaías — e duas delas referem-se especificamente à redenção vindoura dos
pequenos, humildes, miseráveis, cativos, prisioneiros. Em seguida, como indício adicional da consumação
iminente, acrescenta: “Aos pobres é anunciado o Evangelho [a Boa Nova]”.27 E, de fato, para eles tratava-se
de uma boa notícia, pois eram os mais qualificados para entrar no reino: “Muitos dos primeiros serão
últimos, e muitos dos últimos, primeiros”.28 As Bem-Aventuranças apontam na mesma direção: “Bem-
aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus. Bem-aventurados vós, que agora tendes fome,
porque sereis saciados”.29
O reino também estará aberto a todos que cuidarem dos pobres — alimentando os famintos, saciando
os sedentos, vestindo os desnudos, ajudando os enfermos e os prisioneiros.30 “Vai, vende o que tens, dá aos
pobres e terás um tesouro no céu”,31 “Quando queres uma festa, chama pobres, estropiados, coxos, cegos
[...] Serás, porém, recompensado na ressurreição dos justos”.32 Jesus não era nenhum reformador social,
muito menos um revolucionário, nem considerava uma pessoa automaticamente excluída do reino apenas
por sua posição social no mundo, mas sem dúvida o reino que ele esperava não era para aqueles que se
agarravam ao próprio poder, prestígio ou riqueza.
Havia outra limitação. Jesus era judeu da cabeça aos pés e, se seus seguidores eram todos judeus, isto
correspondia às convicções que alimentava sobre sua missão: como qualquer profeta antes dele, Jesus
achava que havia sido enviado apenas para Israel.33 Dentre os evangelistas, apenas Lucas mostra Jesus
pregando às vezes tanto para os gentios como para os judeus — e Lucas, que também foi o autor dos Atos
dos Apóstolos, tinha todos os motivos para sugerir que a conversão dos gentios correspondia às intenções
originais de Jesus. Os outros dois evangelhos sinóticos revelam um quadro diferente: segundo eles,
enquanto Jesus viveu, seu ministério e o de seus discípulos restringiu-se ao povo judeu. Na verdade, a julgar
por Marcos, poderíamos pensar que nunca se esperou que a missão dos “doze” se ampliasse para além da
própria região de Jesus, a Galiléia, antes do advento do reino.
Os gentios não eram uma preocupação de Jesus. Se às vezes ele usava seu poder como exorcista em
benefício de algum gentio, tratava-se de um ato de grande condescendência. A história da mulher sírio-
fenícia sem dúvida exemplifica bem esta atitude. A mulher implorou-lhe que expulsasse o demônio que
possuíra sua filha:
Ele dizia: “Deixa que primeiro os filhos se saciem porque não é bom tirar o pão dos filhos e
atirá-lo aos cachorrinhos”. Ela, porém, lhe respondeu: “É verdade. Senhor, mas também os
cachorrinhos comem, debaixo da mesa, as migalhas das crianças!”. E ele disse-lhe: “Pelo que
disseste, vai: o demônio saiu da tua filha”.34
E os gentios que ele imagina afluindo ao novo Templo fazem-no — como no I Enoque — porque
haviam se convertido ao judaísmo. Para as nações, o caminho da redenção implicava necessariamente a
assimilação a um Israel salvo.
Como arauto do reino, Jesus pensava apenas nos judeus. Além disso, ele próprio era um estrito
observante da Lei. A noção muito difundida de que ele substituiu a Lei por uma nova revelação da graça
está baseada nos ditos de são Paulo, o helenista da diáspora. O próprio Jesus disse outra coisa: “É mais fácil
passar céu e terra do que uma só vírgula cair da lei”.35 Se, como parece provável, ele predisse que o Templo
existente seria destruído e substituído por um novo Templo, isto sem dúvida terá atraído a hostilidade da
camada sacerdotal, mas em nenhum sentido significava um cancelamento da Lei: o I Enoque e o Livro dos
Jubileus também predizem essas coisas, e ali elas assinalam o fim dos tempos.36 Os habitantes do reino de
Deus deveriam ser todos judeus estritamente observantes.
Capítulo 5
Por que os discípulos de Jesus imaginavam que ele talvez fosse o Messias? E o próprio Jesus? Será
que se considerava o Messias? Nenhum aspecto de sua vida e de seus ensinamentos foi discutido mais
acaloradamente do que este e nenhuma resposta encontrará aceitação geral.
Por um lado, nada nos evangelhos sugere que em algum momento Jesus tenha alegado ser o Messias
davídico, isto é, um líder militar que iria derrotar os inimigos de Israel, restabelecer a nação como potência
política e empossar a si mesmo como rei. Por outro lado, ele de fato parece ter esperado que, com o advento
do reino, Deus reuniria as tribos dispersas de Israel em um Sião purificado, em torno de um novo Templo.37
Além do mais, a decisão de escolher doze discípulos parece ter se originado de sua expectativa de governar
todas as doze tribos. Sua promessa aos “doze” sem dúvida sugere isto: “Também eu disponho para vós o
Reino, como o meu Pai o dispôs para mim, a fim de que comais e bebais à minha mesa em meu Reino, e
vos senteis em tronos para julgar as doze tribos de Israel”.38 Na verdade, alguns de seus seguidores até
fazem reivindicações para si mesmos no futuro reino — por exemplo, quando perguntam quem será o maior
no reino39 ou quando a mãe dos filhos de Zebedeu pede: “Dize que estes meus dois filhos se assentem um à
tua direita e o outro à tua esquerda, no teu Reino”.40
Talvez a contradição seja mais aparente do que real. “Messias”, afinal de contas, significa apenas “o
Ungido”, não se referindo necessariamente a um monarca davídico.41 Quando Jesus leu a lição na sinagoga
em Nazaré, escolheu o seguinte trecho de Isaías:
O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-
me para proclamar a remissão aos presos e aos cegos a recuperação da vista, para restituir a
liberdade aos oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor.42
E acrescentou: “Hoje se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura” — tanto ele como
seus ouvintes devem ter se lembrado da ameaça com que prossegue o texto de Isaías: “um dia de vingança
do nosso Deus”.
É provável, portanto, que Jesus se considerasse o Messias dos pobres. E provavelmente esperava que
o domínio romano na Palestina fosse derrubado em um futuro muito próximo, não por um levante armado
mas por intervenção direta de Deus, sendo substituído em seguida por um regime no qual ele próprio
governaria como vice-regente de Deus. Assim, a inscrição zombeteira que os romanos colocaram na cruz
parece ter sido mais apropriada do que em geral se pensa.
No entanto, há algo paradoxal na situação. Não ocorreu nenhuma das mudanças que supostamente
acompanhariam o surgimento do Messias: o reino não veio e Jesus foi executado. Se a seita não
desapareceu, mas, pelo contrário, começou a prosperar, isto se deveu ao desfecho que aparece nos
evangelhos como a ressurreição. Como notou um autor cristão em erudito estudo, a ressurreição não pode
ser verificada pelos métodos da investigação histórica:43 os relatos do aparecimento do Jesus ressurrecto na
Galiléia, em Jerusalém e nas proximidades desta divergem demais para que sejam usados como indícios
históricos de um acontecimento físico. Não há dúvida, porém, de que as histórias de um Jesus ressuscitado
logo começaram a circular e a receber crédito. Foi isto que mudou tudo.
A crença na ressurreição era o próprio núcleo da fé da Igreja primitiva: sem ela, essa Igreja
provavelmente nunca teria chegado a existir e com certeza não teria prosperado tanto. Sobre isso, temos as
evidências de são Paulo, que sem dúvida ouvira mais sobre as aparições do que está registrado nos
evangelhos ou nos atos:
[...] ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. Apareceu a Cefas, e depois aos Doze.
Em seguida, apareceu a mais de quinhentos irmãos de uma vez, a maioria dos quais ainda
vive, enquanto alguns já adormeceram. Posteriormente, apareceu a Tiago, e, depois, a todos
os apóstolos. Em último lugar, apareceu também a mim [...] Por conseguinte, tanto eu como
eles, eis o que pregamos. Eis também o que acreditastes. Ora, se se prega que Cristo
ressuscitou dos mortos, como podem alguns dentre vós dizer que não há ressurreição dos
mortos? Se não há ressurreição dos mortos, também Cristo não ressuscitou. E, se Cristo não
ressuscitou, vazia é a nossa pregação, vazia também é a vossa fé. Acontece mesmo que somos
falsas testemunhas de Deus [...].44
No início, o Jesus ressurrecto ainda era considerado o Messias que iria redimir o povo judeu. Na
verdade, a ressurreição parecia dar sentido a um destino que, de outro modo, certamente não teria ocorrido
ao Messias. Se Jesus fracassara em realizar durante sua vida a tarefa messiânica, isto queria dizer que seu
messianismo se tomaria efetivo apenas após a morte. Graças a essa interpretação, as expectativas originais
não só sobreviveram à crucificação como foram reforçadas. Lucas não vê nada de incongruente em fazer os
apóstolos dirigirem a Jesus uma derradeira pergunta antes que subisse aos céus: “Senhor, é agora o tempo
em que irás restaurar a realeza em Israel?”.4’ Na realidade, era porque Jesus continuava a ser identificado
com o esperado Messias do judaísmo que, poucos anos após sua morte, o termo “cristão” foi cunhado na
comunidade judeu-cristã de Antióquia, onde se falava grego. Pois Christos é simplesmente o equivalente
grego do semítico “Messias”, com o significado de “o Ungido”.
Capítulo 6
Tradicionalmente, o Messias fora imaginado como sendo humano. Por volta do século I d.C, contudo,
determinados grupos estavam elaborando o conceito de Messias como um ser sobrenatural e transcendente
— de aparência humana, mas sendo na verdade uma segunda figura divina.
Um relato clássico dessa figura encontra-se na parte do I Enoque em geral conhecida como
“Parábolas ou similitudes”, mas intitulada pelo autor, de forma mais apropriada, como “Segunda visão”.46
As “Similitudes” constituem uma porção substancial da obra completa, estendendo-se do capítulo 37 ao 71,
de um total de 104 capítulos; mas sua relação com o restante do texto foi e continua a ser objeto de
acaloradas discussões. As “Similitudes” não se encontram nos fragmentos aramaicos do I Enoque
descobertos em Qumran, nem na fragmentária tradução grega, o que levou alguns estudiosos a considerá-las
uma obra tardia, provavelmente do século II ou mesmo do III d.C., com grande influência dos evangelhos.
No entanto, hoje a opinião prevalecente é que se trata de obra judaica, originalmente escrita em hebraico ou
aramaico durante o período romano; e, a partir de indícios internos, argumentou-se de maneira plausível que
sua composição ocorreu durante o ministério de Jesus ou logo após.47
Nas “Similitudes”, o Messias, isto é, o Ungido, também é chamado de “Filho do Homem” — talvez
uma reminiscência de Daniel 7 — e de “o Eleito”; e ficamos sabendo que ele foi escolhido — designado
para seu singular destino — antes de o sol, as estrelas e a terra terem surgido. Deus, ali chamado de “Senhor
dos Espíritos” — título só encontrado no I Enoque —, o mantém oculto até o momento da revelação, no Dia
do Juízo.
Este chegará quando um número predeterminado de eleitos for alcançado. Então, o Senhor dos
Espíritos tomará seu lugar no trono da glória, circundado pelas hostes angélicas e pela assembléia de anjos.
Os “livros dos vivos” — os registros das boas e más ações de cada indivíduo — serão abertos e haverá o
julgamento. Esta será a tarefa do Filho do Homem: sentado, como o Senhor dos Espíritos, em um trono de
glória, ele pronunciará as sentenças sobre os vivos e os mortos.48
Ele irá sobretudo condenar os grandes da terra. Confiantes em sua riqueza e dependentes de seus
deuses pagãos, “os reis e os poderosos e os exaltados, e aqueles que possuem a terra” haviam negado o
Senhor dos Espíritos — e também o Filho do Homem.49 Agora irão fitar com terror e desespero o Filho do
Homem. Irão implorar uma suspensão da pena a fim de que possam confessar seus erros e louvar o único
Deus verdadeiro — mas, impassível, o Filho do Homem os entregará aos anjos da punição. Os justos verão
com satisfação seus opressores serem levados da face da terra e lançados para sempre nas trevas
subterrâneas, entre os vermes, sem nenhuma esperança de ressurreição — ou então serem conduzidos ao
tormento eterno no causticante vale do Hinom.50
For meio de seus julgamentos, o Filho do Homem realizará uma purificação da terra. Não só os
pecadores humanos, mas também os anjos decaídos, “aqueles que desencaminharam o mundo”, serão
afastados de uma vez por todas — “e todas as suas obras serão eliminadas da face da terra”. Todo o mal
desaparecerá, vencido pela força do Messias entronizado — “e a partir de então não haverá nada sujeito à
corrupção”.51 Por fim, o Senhor dos Espíritos transformará o céu e a terra em “uma luz e uma bênção
eternas”.52
Na terra transformada, sob o céu transformado, os justos — inclusive os justos mortos, agora
ressuscitados — desfrutarão de imutável bem-aventurança. Os antigos oprimidos triunfarão “em nome do
Senhor dos Espíritos”, e a glória e a honra serão deles. Mais ainda, “a terra se rejubilará, e os justos a
habitarão, e os eleitos irão e caminharão sobre ela”.53 Neles, nos eleitos do novo Israel, a antiga profecia
sobre a posse da Palestina enfim se cumprirá, para todo o sempre.
Embora vivendo na terra, a vida dos justos irá transcender por completo as limitações normais da
existência humana. O Filho do Homem viverá no meio deles e com ele os justos irão morar, comer, dormir
e se levantar, para todo o sempre.54 Eles próprios serão transformados. O Senhor dos Espíritos lhes
proporcionará “as vestimentas de vida”, de modo que se tomem semelhantes aos anjos. E serão imortais:
“os escolhidos [permanecerão] na luz da vida eterna; e não haverá fim para os dias de sua vida [...]”.55
A conclusão das “Similitudes” é assombrosa. Enoque descreve de que modo foi transladado em
espírito até os céus, onde, na presença do Senhor dos Espíritos e de miríades de anjos, o arcanjo Miguel
assegurou-lhe: “Tu és o Filho do Homem que nasceu para a retidão”. O Messias que irá presidir o mundo
transformado e seus habitantes transformados não é outro senão o próprio Enoque. A promessa de Miguel
não poderia ser mais clara nem mais definitiva: “E todos [...] caminharão pela tua senda [...] e contigo será a
morada deles, e contigo o destino deles, e eles não se separarão de ti para sempre e sempre e sempre [...] e
haverá muitos dias com esse Filho do Homem, e os justos encontrarão a paz [...]”56
O significado da expressão “Filho do Homem” no I Enoque foi, e ainda é, objeto de muitos debates
filológicos. Aparentemente, não se tratava de um título, nem ali nem nas passagens dos evangelhos em que
Jesus o emprega referindo-se a si mesmo; na verdade, parece que não havia nenhum significado além do
básico, isto é, de “alguém como um homem” ou, simplesmente, “um homem”. Mas isto pouco importa, pois
no I Enoque a figura chamada de “Filho do Homem” é evidentemente bastante extraordinária.
Em alguns dos ditos atribuídos a Jesus nos evangelhos, o Filho do Homem não é menos
extraordinário. Também ele será enviado dos céus para julgar a humanidade, acompanhado de anjos, e a
condenação dos que o negarem será tão inevitável quanto a daqueles que negaram o próprio Deus. Nem
todos os estudiosos consideram autênticos esses ditos e, mesmo entre os que o fazem, alguns acreditam que
Jesus não se referia ao próprio destino, mas a um ser divino que ainda estava por vir. Para o nosso objetivo,
basta que a Igreja primitiva tenha levado esses ditos em alta conta e, desse modo, assegurado que as
gerações posteriores fizessem o mesmo.57
Capítulo 7
Aplicada a Jesus, a noção de um Messias sobrenatural e transcendente era de fato bem adequada para
explicar e justificar o paradoxo de sua morte miserável. Em primeiro lugar, o Jesus que estava no centro dos
ensinamentos da Igreja primitiva não era o exorcista, curandeiro e pregador que vivera na Palestina, nem o
esperado líder político, mas Jesus, o Messias transcendente, cuja vida e morte terrenas haviam sido
sobretudo o prelúdio para sua ressurreição e glorificação. Por mais extraordinária que tal idéia deva ter
parecido à maioria dos judeus e por menos que os atraísse, ela se revelou satisfatória para alguns. O
sofrimento, a humilhação e a morte de Jesus deixavam de ser um problema se fossem entendidos como
condição prévia de uma exaltação muito além daquela conhecida pelos simples mortais: “Não era preciso
que o Cristo sofresse tudo isto e entrasse em sua glória?”.58
O que as “Similitudes” anunciam de Enoque, o Novo Testamento anuncia repetidas vezes de Jesus:
ele descerá do céu para a terra como o Messias transcendente. Como são Paulo coloca em sua epístola aos
filipenses: “Por isso Deus o sobreexaltou grandemente e o agraciou com o Nome que é sobre todo o nome,
para que, ao nome de Jesus, se dobre todo joelho dos seres celestes, dos terrestres e dos que vivem sob a
terra [...]”.59 Em uma passagem após a outra, nos evangelhos sinóticos, nos Atos e nas epístolas de são
Paulo, Jesus aparece como juiz do mundo — ao lado de Deus ou mesmo no lugar de Deus.
Não que importasse se a pessoa morresse antes. Por cerca de dois séculos,
os judeus haviam se familiarizado com a idéia de que na grande consumação os
justos iriam ressuscitar e receber corpos imortais — e embora alguns judeus,
como os saduceus, rejeitassem tal concepção, outros, como os fariseus, já a
haviam aceitado desde muito. Os primeiros cristãos não só aceitavam a idéia,
como consideravam que a ressurreição já havia começado. Embora a
ressurreição de Jesus sempre tenha ocupado um lugar central na fé da Igreja, seu
significado original foi em grande parte esquecido. Os cristãos primitivos não a
viam apenas como uma dramática intervenção de Deus para justificar seu filho,
mas como sinal e garantia de que todo verdadeiro seguidor de Jesus, mesmo os
que já haviam morrido, poderia habitar para todo o sempre o reino.
Capítulo 8
Tal era a fé dos cristãos primitivos, e ela definiu o modo como viam a si
mesmos. Eles não achavam que estavam iniciando uma nova religião. Todos
eram judeus que continuavam a observar a Lei — e qualquer gentio que se
juntasse a eles também precisava tomar-se judeu. Mesmo quando pregavam
entre os gentios, davam prosseguimento à propaganda iniciada pelo judaísmo
helenístico. Assim como outros judeus, eles opunham ao politeísmo dos pagãos
a doutrina do Deus único, ao mesmo tempo criador e juiz. De modo mais
específico, seu horizonte mental ainda era o dos autores dos apocalipses
judaicos: a noção de Juízo Final, que estava no âmago de seu pensamento,
também estava no centro dos apocalipses judaicos. Entretanto, um aspecto
essencial os distinguia dos outros judeus: eles consideravam que haviam sido
encarregados por Deus da tarefa de proclamar que Jesus havia sido crucificado,
havia ressuscitado e em breve retomaria envolto em glória, a fim de encerrar a
época presente e inaugurar “a era vindoura”. A medida que a seita de Jesus
transformava-se aos poucos na Igreja cristã, essa convicção permaneceu
inseparável do seu sentimento de identidade.
O próprio Cristo, retornando em glória, como juiz dos vivos e dos mortos,
distribuiria esta bem-aventurança eterna a alguns, enquanto os outros seriam por
ele condenados ao tormento eterno — terem-no aceitado ou rejeitado, a ele e aos
seus ensinamentos, seria o critério.
Estas são as pessoas que deram comida, bebida, abrigo e socorro de todo
tipo àqueles a quem Jesus chama de seus “irmãos”.
Ali se diz que Jesus, quando surgir no céu, trará não só a redenção para seus
fiéis seguidores, mas também a perdição para os seus oponentes:
Justo é que Deus pague com tribulação aos que vos oprimem, e que a vós, os oprimidos, vos dê
o repouso juntamente conosco, para quando se revelar o Senhor Jesus. O castigo deles será a
ruína eterna, longe da face do Senhor e do esplendor de sua majestade, quando ele vier,
naquele Dia, para ser glorificado na pessoa dos seus santos, e para ser admirado na pessoa de
todos aqueles que creram [...].73
Capítulo 1
Capítulo 2
Jesus, por sua vez, transmitiu a revelação ao “seu servo João”, que agora se
apresenta como profeta, encarregado da tarefa de difundir a mensagem para a
Igreja, representada por sete igrejas nas proximidades de Éfeso. A obra toda tem
a forma de uma carta e há indícios de que se destinava à leitura litúrgica.
Com sua promessa de ilimitada exaltação para uma elite, essas cartas dão o
tom da obra.
Capítulo 3
Sob a forma de um grande dragão vermelho com sete cabeças e dez chifres,
Satã surge no céu e começa a reduzir ao caos o mundo ordenado. Com o rabo,
arrasta de seus lugares apropriados as estrelas, esses símbolos supremos e
guardiães da ordem estabelecida por Deus, e faz com que um terço delas caia na
terra. Em seguida, enfrenta a “mulher vestida com o sol” no momento em que
esta está prestes a dar à luz e, quando nasce o filho, ele tenta devorá-lo. Deus,
porém, arrebata a criança para junto de si e de seu trono, e prepara para a mulher
um refúgio no deserto; ali ela poderá se esconder durante o período crítico
(herança do Livro de Daniel) de três anos e meio.
Tal como outros autores de apocalipses, ele tinha uma idéia de ordem
cósmica que se chocava inteiramente com as noções adotadas pelo mundo
helenístico em geral e pelo império romano em particular. Assim, em vez de
refletir o governo divino, o domínio de reis e imperadores era uma expressão do
poder de Satã — não por esse domínio ser “objetivamente” opressivo, mas
porque a visão obsessiva de João identificava um antagonismo radical entre a
Igreja e o mundo.10 Isto bastava para sustentar seu entusiasmo pela derrubada da
ordem estabelecida.
Capítulo 4
Em uma das visões de João, Jesus aparece como impetuoso guerreiro num
cavalo branco, à frente de um exército de anjos:
Seus olhos são chama de fogo; sobre sua cabeça há muitos diademas [...] e o nome com que é
chamado é Verbo de Deus. Os exércitos do céu acompanham-no em cavalos brancos, vestidos
com linho de brancura resplandecente. Da sua boca sai uma espada afiada para com ela ferir
as nações. Ele é quem as apascentará com um cetro de ferro. Ele é quem pisa o lagar do vinho
do furor da ira de Deus, o Todo-poderoso. Um nome está escrito sobre seu manto e sobre sua
coxa: “Rei dos reis e Senhor dos senhores”.11
Capítulo 5
O destino do próprio Diabo não é tão definitivo. Um anjo desce dos céus,
acorrenta-o e depois o atira em um abismo, que será em seguida fechado e
lacrado com um selo — não por toda a eternidade, mas por um milênio, ao
término do qual “ele deverá ser solto por pouco tempo”.17 Durante esses mil anos
— o “Milênio” original —, os mártires cristãos, que haviam preferido a morte
para não adorar a besta, receberão uma recompensa especial: irão ressuscitar e
reinar sobre a terra com o Cristo, antes de seguir para a eterna bem-aventurança.
E não serão eles os únicos habitantes da terra: fica claro que, nesse período
intermediário, as nações do mundo terão de se submeter à autoridade de Cristo e
de seus santos, que as governarão com um cetro de ferro.
Terminado o confinamento de mil anos, Satã convoca “as nações dos quatro
cantos da terra” para cercar “o acampamento dos santos e a Cidade amada”.
Esses exércitos são descritos como as hostes de “Gog e Magog”, cujo número é
“como a areia do mar” — uma alusão à profecia em Ezequiel.18 Parece provável
que, na imaginação do vidente, essas legiões não eram for madas por seres
humanos e sim por demônios — os verdadeiros aliados de Satã, que emergiriam
com ele das profundezas da terra em um derradeiro esforço para destruir a
Igreja.19
Quando esses últimos inimigos sobrenaturais são destruídos pelo fogo dos
céus, fica desimpedido o caminho para a realização do Juízo Final. Todos os
mortos serão ressuscitados e julgados de acordo com seus registros. Aqueles
cujos nomes não estiverem no “livro da vida” serão atirados no lago de fogo para
que ali sofram tormentos por toda a eternidade; por outro lado, os justos — e não
apenas os mártires — seguirão para um lugar de bem-aventurança, onde ficarão
para sempre ao lado de Deus, como seus filhos, livres da morte, dos sofrimentos
e das tristezas: “O vencedor receberá esta herança”.20 E assim o tempo chegará à
sua consumação.
Capítulo 6
13 - JUDEUS, ZOROASTRIANOS E
CRISTÃOS
Capítulo 1
Além disso, a única grande diferença entre Angra Mainyu e o Diabo judeu-
cristão já desaparecera na época em que qualquer judeu poderia ter recebido todo
o impacto dos ensinamentos de Zoroastro.
Isto não quer dizer que não existam diferenças entre as expectativas
zoroastrianas (ou zurvanitas) e as expectativas judaicas. Nem o destino dos
indivíduos após a morte nem o destino do mundo após a grande consumação são
concebidos da mesma maneira. Para os zoroastrianos, até o Juízo Final as almas
individuais viviam no céu ou no inferno, desfrutando suas recompensas ou
sofrendo suas penas conforme a vida que haviam levado na terra. Após o
julgamento universal, elas poderiam se reunir a seus corpos — e então os justos
viveriam para sempre na terra tomada perfeita, ao passo que os pecadores seriam
simplesmente aniquilados. Nos apocalipses judaicos, os mortos dormiriam até o
Juízo Final e só então os pecadores seriam condenados à punição eterna. A visão
zoroastriana de um mundo vindouro plenamente bom e feliz, expurgado do mal
e do sofrimento, não tem portanto nenhum paralelo judaico: nos apocalipses, o
inferno continua a existir — imperfeição medonha num mundo perfeito em tudo
o mais. É como se os autores dos apocalipses estivessem tentando reconciliar
concepções zoroastrianas com as antigas noções israelitas/judaicas do Xeol.
A despeito disso, as semelhanças entre o zoroastrismo e as concepções
expressas nos apocalipses judaicos são por demais extraordinárias para que
possam ser explicadas por uma coincidência.
Capítulo 2
Tampouco teriam os judeus dificuldades para tomar conhecimento dessas concepções. Na época
aquemênida, judeus empregados por ricas famílias zoroastrianas como escribas, representantes comerciais,
servos domésticos ou trabalhadores externos podiam facilmente ter sido expostos à religião de seus
senhores. Tal contato teria se prolongado de uma geração a outra, até que os empregados judeus chegassem
a conhecer igualmente o zoroastrismo e a fé judaica — na índia moderna, hindus e muçulmanos
empregados por zoroastrianos passaram pela mesma experiência.
Há indícios mais sólidos sobre os contatos após a queda do império aquemênida. Sabe-se que no
período helenístico os descendentes dos colonos iranianos da época aquemênida eram vizinhos de colonos
judeus em muitas aldeias da Babilônia, na área em torno de Damasco, na Lídia e na Frigia. Ambos os
grupos produziram cidadãos eminentes que serviram juntos nos conselhos das aldeias e das províncias — e,
como o grego se tomara a língua comum dos letrados, a comunicação entre eles terá sido mais fácil do que
antes. E onde quer que vivessem iranianos havia sacerdotes zoroastrianos, muitos dos quais extremamente
devotos e empenhados. Um judeu que conversasse com esses homens, demonstrasse interesse pelas crenças
deles e se dispusesse a harmonizá-las com as suas próprias não teria necessariamente a sensação de estar
traindo a fé que prezava acima de tudo. Porém, se a compreensão do zoroastrismo aumentou na diáspora,
não se limitou a isso: tudo o que resultou de tais contatos logo seria conhecido também na Palestina — pois,
devido às peregrinações e ao envio de contribuições para o Templo, os judeus de toda parte mantinham-se
em contato com Jerusalém.
Nessa época, a mensagem dos sacerdotes zoroastrianos terá ido ao encontro do que alguns judeus
desejavam ouvir. A queda do império aquemênida foi uma experiência traumática para os iranianos. Não
apenas porque um domínio que se considerava divinamente estabelecido e eterno fora obliterado de modo
abrupto e cabal: os aquemênidas foram substituídos primeiro pelas misérias da derrota, em seguida por
gerações de guerra entre os Estados sucessores. Iranianos e judeus não eram mais soberanos e súditos —
eram companheiros de sofrimento em um mundo incerto e atormentado.
Em tais circunstâncias, devem ter adquirido nova urgência as promessas escatológicas incluídas nos
ensinamentos zoroastrianos. Enfrentando os horrores da tirania de Antíoco Epifânio, quando pela primeira
vez foram perseguidos por se manterem fiéis à própria religião e, depois, ao se defrontarem com a
brutalidade do domínio romano, alguns judeus podiam encontrar naqueles ensinamentos a garantia de que o
mal não vinha de Deus mas de um grande adversário de Deus, atuando por meio de representantes
humanos. Também encontravam ali garantia de que o mal não ficaria impune. Tão grande era a
perversidade dos soberanos estrangeiros, tão esmagador o poder das forças do caos, que o próprio cosmos
estava comprometido — mas não por muito tempo: Deus, agindo por intermédio de seus anjos e de seu
Messias, estava prestes a retificar todas as coisas.
Os ensinamentos zoroastrianos eram ainda mais eficazes porque haviam encontrado um novo veículo.
Enquanto o Avesta era transmitido de forma oral, e em iraniano arcaico, agora começava a surgir uma
literatura zoroastriana — e destinada a ser lida por não-iranianos. Oráculos sibilinos persas, modelados em
protótipos gregos e escritos em grego, provavelmente já circulavam no final da época aquemênida. Depois
de o império ter sido conquistado por Alexandre, profecias mais extensas foram produzidas, vaticinando de
que modo o domínio grego seria por sua vez derrubado pelo Saoshyant e de que modo o reino eterno de
Ahura Mazda seria instaurado em uma terra perfeita. Fragmentos dessas obras sobreviveram em meio aos
escritos de apologistas cristãos; e uma delas, os Oráculos de Hystaspes (assim chamada em homenagem ao
patrono de Zoroastro, Vishtaspa), é conhecida em algum detalhe.6 Essas obras certamente terão sido
estudadas pelos eruditos judeus muito antes de existir qualquer cristão: vimos a influência de uma obra
relacionada, o Vahnian Yasht, sobre o autor ou autores do Livro de Daniel.
O apelo do zoroastrismo terá sido reforçado quando, no século II a.C, a potência iraniana reviveu sob
os partos. Quando, no século I a.C., a Judéia caiu sob o severo domínio de Roma, os judeus viram na Pártia
o inimigo mais formidável de Roma. Pompeu e, em seguida, Crasso granjearam enorme impopularidade ao
invadir o Templo — e Crasso chegou a saqueá-lo. Em 53 a.C., Crasso marchou contra os partos e, a
despeito da nítida superioridade numérica, suas legiões foram dizimadas e ele próprio foi morto. Com isso,
os partos tomaram-se ainda mais populares entre os judeus. E em 40 a.C. — quando invadiram a Síria-
Palestina, conquistaram Jerusalém e colocaram no trono um rei judeu no lugar de Herodes, o odiado
preposto romano — podiam ser considerados defensores dos judeus contra os romanos. Embora dois anos
depois Herodes tenha sido reconduzido ao poder pelos romanos, os partos persistiram no esforço de avançar
na direção oeste e expulsar os romanos. Esses acontecimentos com certeza tomaram ainda mais
convincentes as profecias zoroastrianas de redenção, Fim da tirania e chegada do reino de Deus.7
Os contatos entre partos e judeus — mais tarde, inclusive judeus cristãos — prosseguiram fora da
Palestina. A Babilônia, que possuía importante comunidade judaica, encontrava-se sob o domínio parto. E
também na Síria, na Armênia e na Anatólia, as duas culturas permaneceram em contato por inúmeras
gerações.
Capítulo 3
Algumas concepções zoroastrianas foram amplamente aceitas pelos judeus. Assim, os fariseus,
embora pertencentes à principal corrente do judaísmo, não tiveram dificuldade para “interpretar” as
Escrituras à luz das novas doutrinas que consideravam genuinamente judaicas, mas que na verdade eram de
origem zoroastriana.
E, por sua vez, alguns dos primeiros rabinos adotaram tais doutrinas. Por volta da época de Jesus, a
importante escola rabínica liderada por Bet Hillel sustentava que, após a morte, todas as almas seriam
recompensadas ou punidas, no céu ou no inferno, até o fim dos tempos — uma idéia desconhecida na Bíblia
hebraica, mas essencial nos ensinamentos de Zoroastro. E essa herança farisaica perdurou, pois foi
preservada no judaísmo normativo tal como existe hoje, ainda que na prática tenha para os judeus
importância muito menor do que para os cristãos.
Por outro lado, os fariseus nunca aceitaram a idéia de uma grande potência sobrenatural hostil a Deus
— nem mesmo um dualismo limitado lhes interessava, não mais do que ao judaísmo de hoje. A crença no
Diabo, em seu poder e em sua derrocada final permaneceu restrita a certos grupos que haviam se afastado
mais da tradição central do judaísmo. Dois desses grupos ficaram conhecidos na história: a seita de Qumran
e a seita de Jesus.
Já na época em que os Manuscritos começaram a ser divulgados, entre 1947 e 1956, os estudiosos
ficaram impressionados com a afinidade entre a Regra da comunidade, com sua doutrina dos dois grandes
espíritos antagônicos, e a doutrina de Zoroastro, sobretudo na versão zurvanita.8 E embora a seita de
Qumran tenha sido aniquilada ainda antes da queda de Jerusalém, a seita de Jesus, transformada na Igreja
cristã — e, depois, nas Igrejas cristãs —, acabaria mantendo viva ao longo dos séculos uma mescla muito
semelhante de dualismo e escatologia.
Em seguida, há a questão do agente de Deus nos últimos dias. O Messias do Livro do Apocalipse tem
muito menos em comum com qualquer figura messiânica da Bíblia hebraica do que com os guerreiros
divinos nas várias versões do mito do combate — e, dentre eles, nem Indra, nem Marduk, nem Ba’al, nem o
Yahweh primitivo permitem um paralelo tão próximo quanto o Saoshyant zoroastriano. Pois espera-se que
Zoroastro retome, ressurrecto e glorificado, no Saoshyant miraculosamente gerado de sua semente, a fim de
combater e derrotar as hostes demoníacas, trazer os mortos de volta à vida e conduzir o julgamento
escatológico — e o Apocalipse nos diz que do Cristo ressurrecto e glorificado devemos esperar as mesmas
façanhas. Além disso, em ambos os casos a volta do redentor assinala o fim dos tempos e o início do mundo
além do tempo, o reino de Deus na terra.9
Consideradas todas as coisas, dentre os grupos marginais do judaísmo aparentemente a seita que
estava mais exposta à influência do zoroastrismo era a de Jesus. Não há nada de estranho nisso. Sabemos
hoje que desde muito tempo a cultura iraniana estava firmemente estabelecida em áreas para onde seguiram
os primitivos cristãos.10 Havia, por exemplo, forte influência zoroastriana na Anatólia, região de grande
importância no desenvolvimento inicial do cristianismo. E uma região muito bem conhecida pelo autor do
Livro do Apocalipse.
POSFÁCIO
Este livro trata de uma grande mudança na história da consciência humana, buscando descrever como
o destino do mundo e dos seres humanos veio a ser imaginado de uma nova maneira e de que modo se
difundiram essas novas expectativas. Uma breve recapitulação do argumento principal talvez não seja
ociosa.
Até por volta de 1500 a.C, povos como os egípcios, sumérios, babilônios, indo-iranianos e seus
descendentes hindus e iranianos, cananeus, israelitas do período anterior ao exílio, todos concordavam que,
no início, o mundo havia sido organizado, posto em ordem, por um ou por vários deuses, e que em seus
aspectos essenciais esse mundo era imutável. Para cada um desses povos, a segurança — isto é, a fertilidade
da terra, a vitória na guerra, a estabilidade das relações sociais sancionadas pelo costume e pela lei — era o
signo exterior e visível de que havia de fato uma ordem estabelecida nos céus.
No entanto, essa ordem nunca foi tranqüila, estava sempre ameaçada por forças malignas e
destrutivas — por vezes identificadas com enchentes e secas, pragas ou fome, inércia ou a própria morte,
mas, outras vezes, com povos hostis ou conquistadores tirânicos. No mito do combate, em suas várias
formulações, o conflito entre a ordem universal e as forças que a ameaçavam invadir e destruir — ou seja, o
conflito entre o cosmos e o caos — ganhou expressão simbólica. Um jovem herói ou guerreiro divino
recebia dos deuses a tarefa de manter sob controle as forças do caos; em troca, era recompensado com a
soberania sobre o mundo.
Entre 1500 e 1200 a.C, Zoroastro rompeu com essa visão de mundo estática, mas aflitiva. E o fez
reinterpretando de maneira radical a versão iraniana do mito do combate. Na concepção de Zoroastro, o
mundo não era estático nem seria sempre turbulento. Agora mesmo o mundo estava se aproximando, por
meio de incessantes conflitos, de um estado sem nenhum conflito. Chegaria um momento em que, em uma
prodigiosa batalha final, o deus supremo e seus aliados sobrenaturais derrotariam as forças do caos e seus
aliados humanos, aniquilando-os de uma vez por todas. A partir de então, a ordem divinamente estabelecida
estaria presente de maneira absoluta: as necessidades e as misérias físicas seriam desconhecidas, não
haveria nenhum inimigo ameaçador e na comunidade dos redimidos reinaria a unanimidade absoluta; em
uma palavra, a ordem do mundo jamais voltaria a ser perturbada ou ameaçada.
Neste livro, a narrativa dessa mudança segue apenas até o final do século I d.C. — mas a história
continuou ao longo dos séculos. E que história! Muita especulação teológica; incontáveis movimentos
milenaristas, inclusive os que hoje prosperam com tanto vigor nos Estados Unidos; e até mesmo a atração
exercida pela ideologia marxista-leninista — tudo isto pertence a essa história.1 A tradição cujas origens
estudamos aqui continua viva e poderosa. Quem sabe dizer que fantasias, religiosas ou seculares, ela ainda
pode engendrar no imprevisível futuro?
NOTAS
As notas incluem tanto referências bibliográficas como questões de interesse mais acadêmico. De
maneira geral, as obras estão relacionadas segundo a ordem cronológica de sua publicação original. Na
primeira menção de uma obra são dados o título completo, a data e o local de publicação. Nas referências
posteriores que não estejam muito distantes da inicial, mas onde a indicação “op. cit.” não seria suficiente,
aparece o título resumido. Periódicos e traduções de textos são indicados da mesma maneira. Os periódicos
e as coleções citados com mais freqüência são designados por abreviações. [As referências bíblicas em
português foram extraídas de A Bíblia de Jerusalém das Edições Paulinas, São Paulo, 1991. (N. E.)]
1. EGITO (pp. 15-50)
Sobre a civilização e a concepção de mundo do Antigo Egito: J. H. Breasted, The development of religion and thought
in Ancient Egypt, Nova York, 1912, reimp. 1972; J. Baillet, Le régime pharaonique dans ses rapports avec l’évolution de la
morale en Égypte, 2 vols., Blois, 1912-3; John A. Wilson, “Egypt”, in H. Frankfort et a!., The intellectual adventure of ancient
man, Chicago, 1946, reimp. 1977 (ed. inglesa: Before philosophy, Harmondsworth, esgotado); H. Frankfort, Kingship and the
gods: A study of Near Eastern religion as the integration of society and nature, Chicago, 1948, reimp. 1978; idem, Ancient
Egyptian religion: An interpretation, Nova York, 1949; John A. Wilson, The burden of Egypt, Chicago, 1951. reimp. 1956
como The culture of Ancient Egypt* J. Cerny, Ancient Egypt religion, Londres etc., 1952; W. C. Hayes, The scepter of Egypt,
2 vols., Nova York, 1953, 1959; S. Morenz, Egyptian religion, Londres e Ithaca, N.Y., 1973 (trad. do orig. alemão de 1960);
A. H. Gardiner, Egypt of the pharaohs, Londres, 1961; C. J. Bleeker, “The religion of Ancient Egypt”, in C. J. Bleeker & G.
Widengren (eds.), Historia religionum, vol. 1, Leiden, 1969; Phillipe Derchain, “La religion égyptienne”, in H.-C. Puech (ed.),
Histoire des religions, vol. I, Paris, 1970, pp. 63-104; W. W. Hallo & W. K. Simpson, The Ancient Near East: A history, 1971,
Nova York, parte 2;
E. Homung, Conceptions of god in Ancient Egypt: The one and the rnany, 1982 (trad. do orig. alemão de 1971); idem, “Verfall
und Regeneration der Schõpfung”, Eranos 46 (1977), reed. Frankfurt, 1981,411 -49; A. R. David, Cult of the sun: Myth and magic in
Ancient Egypt, Londres etc., 1980; idem, The ancient Egyptians: Religious beliefs andpractices, Londres, Boston etc., 1982;
B. G. Trigger, B. J. Kemp, D. 0’Connor & A. B. Lloyd, Ancient Egypt: A social history, Cambridge, 1983; B. J. Kemp, Ancient
Egypt: Anatomy of a civilization, Londres e Nova York, 1989; D. B. Redford, Egypt, Canaan and Israel in ancient times, Princeton,
1992.
H. Grapow, “Die Welt vor der Schõpfung”, Zeitschrift für âgyptische Sprache und Altertumskunde 67 (Leipzig, 1931), pp. 34-
8.
Cf. J. Assmann, Zeit und Ewigkeit im Alten Àgypten, Heidelberg, 1975, pp. 21-2, 30; Hornung, “Licht und Finstemis in
der Vorstellungswelt Altágyptens”, Studium Generale 18 (Berlim, 1965), pp. 73-83, esp. p. 78.
Cf. Hornung, Conceptions ofgod, p. 170, com referências na nota 105. Uma variante do mito cosmogônico é descrita
em Hornung, Der âgyptische Mythos von der Himmelskuh. Eine Àtiologie des Unvollkommenen, Gõttingen, 1982 (com
resumo nas pp. 96 ss.).
Sobre o demiurgo e a cosmogonia: S. Sauneron & J. Yoyotte, “La naissance du monde selon 1’Egypte ancienne”, in
La naissance du monde, Paris, 1959 (Sources orientales, vol. 1), pp. 19-91; e. de forma mais resumida, David, Ancient
Egyptians, pp. 46-9.
Trad. Bleeker, op. cit., p. 52.
Sobre o conceito de ma’at: Morenz, op. cit., cap. 6; Bleeker, “L’idée de Tordre cosmique dans P ancienne Égypte”, r
hpr 42 (1962), pp. 193-200;
W. Westendorf, “Ursprung und Wesen der Ma’at*\ in F. Comelius (ed.), Festgabe für Walter WUl, Munique, 1966, pp. 201-
25; Hans Heinrich Schmid, Gerechtigkeit ais Weltordnung, Tübingen, 1968, pp. 46-61; J. Bergman, “Zum ‘Mythus vom Staat’ im
Alten Àgypten”, in H. Biezais (ed.), The myth ofthe State, Estocolmo, 1972, pp. 80-101; L. G. Perdue, Wisdom and cult. A criticai
analysis of the views of cult in the wisdom literature of Israel and the Ancient Near East, Missoula, 1977, pp. 19-28; A. Brodie & J.
Macdonald, “The concept of cosmic order in Ancient Egypt in Dynastic and Roman times”, LAntiquité Classique 47 (Bruxelas, 1978),
pp. 106-28; L. Epsztein, La justice sociale dans le Proche-Orient Ancien et le peuple de la Bible, Paris, 1983, pp. 421-78; artigo
“Ma’at”, em l a 3, cols. 1110-9.
Trad. Bleeker, Hathor and Thoth: Two key figures in ancient Egyptian religion, Leiden, 1973, p. 122.
Cf. J. Spiegel, “Der Sonnengott in der Barke ais Richter”, Mitteilungen des deutschen archaologischen Instituts,
Abteilung Kairo 8 (Berlim, 1939), pp. 201-6.
Livro dos mortos, cap. 26. (Para as traduções, ver nota 61.) Cf. sobre o trecho relevante: J. Assmann, Der Kõnig ais
Sonnenpriester, Glückstadt, 1970, pp. 60-4.
Sobre Thoth: Bleeker, Hathor and Thoth.
Idem, ibid., p. 119.
Idem, ibid., p. 122.
Sobre a natureza da monarquia egípcia, ver, além dos trechos relevantes nas obras citadas na nota 1: A. Moret, Du
caractère de la royauté pharaonique, Paris, 1902; H. Goedicke, Die Stellung des Kõnigs im Alten Reich, Wiesbaden, 1960; G.
Posener, De la divinité du pharaon, Paris, 1960.
Sobre Seth: Herman te Velde, Seth, god of confusion: A study ofhis role in Egyptian mythology and religion, Leiden,
1967; E. Hornung, “Seth:
Geschichte und Bedeutung eines àgyptischen Gottes”, Symbolon. Jahrbuch für Symbolforschung, nova série, 2 (Colônia,
1974). O relato mais completo do mito de Seth e Osíris é o de Plutarco em De Iside et Osiride, mas o mito certamente é muito antigo.
Trad. Kemp, op. cit., p. 198. Cf. H. Brunner, Die Geburt des Gottkonigs, Wiesbaden, 1964.
Trad. Kemp, em B. G. Trigger et al., Ancient Egypt: A social history,
p. 74.
vol. 4, p. 228.
R. J. Williams, “Literature as a médium of political propaganda in Ancient Egypt”, em W. S. McCullough (ed.), The seed
ofwisdom: Essays in honour ofT J. Meek, Toronto, 1964, pp. 14-30, esp. pp. 14-9.
O tema já está presente na “Narmer pallete”, que é pré-dinástica; ver reproduções e comentários in Kemp, Ancient
Egypt: Anatomy of a civilization, p. 42.
Cf. os artigos “Feindsymbolik”, l a 2, cols. 146-8, e “Vemichtungsrituale”, ibid. 6, cols. 1010-2; Homung. loc. cit., p.
17; Kemp, loc. cit., p. 47.
Sobre essa literatura: F. Junge, “Die Welt der Klagen”, in Fragen altügyptischer Literatur, Wiesbaden, 1977, pp. 275-
8, esp. pp. 283-4; J. Assmann, “Kõnigsdogma und Heilserwartung Politische und kultische Chaosbes-chreibungen in
àgyptischen Texten”, hell ho l m, pp. 345-77.
Trad. M. Lichtheim, Ancient Egyptian literature, 3 vols., Berkeley etc., 1973-8, vol. 1, pp. 140-4.
Trad. completa em idem, ibid., pp. 150-61.
Idem, ibid., pp. 134-5. (43) Cf. p. 37 (p. 48 do ms.).
Sobre Apófis: E. A. W. Budge, Legends of the gods, edited with translations, Londres, 1912, pp. 12 ss.; Hornung, op.
cit., pp. 158-9; artigo em l a 1, cols. 350-2.
Trad. A. J. Wilson em a net, p. 7.
O texto remanescente (no papiro Bremner-Rhind. do Museu Britânico) data apenas do século III a.C., mas seu
conteúdo é cerca de dois milênios mais antigo. Para uma tradução de toda a obra: R. O. Faulkner, in Journal of Egyptian
Archaeology 22 (Londres, 1936). pp. 221 ss.; ibid. 23 (1937), pp. 10 ss.; ibid. 26 (1938), pp. 41 ss. Para um breve relato, com
citações: Budge, From fetish to god in Ancient Egypt, Oxford, 1934, pp. 516-21.
Cf. Hornung, “Chaotische Bereiche in der geordneten Welt”,
Cf. David, Ancient Egyptians, pp. 127-32; idem, Cult of the sun, pp.
67-70.
vie en Égypte. Bruxelas, 1965, passim, esp. pp. 17, 125; J. Leclant, “Espace et temps, ordre et chãos dans 1’Égypte
pharaonique”, Revue de Synthèse 90 (Paris, 1969), pp. 217-39.
Cf. Hornung, Conceptions of god, pp. 214-5, com reprodução do relevo de Kamak; Bergman, op. cit. (ver nota 8), esp.
pp. 83-93, com reprodução do relevo de Kom Ombo.
Cf. D. Meeks, “Génies, anges et démons en Égypte”, em Génies, anges et démons. Paris, 1971 (Sources orientales,
vol. 8), pp. 19-84.
Cf. Hornung, Geschichte ais Fe st, p. 15.
Cf. Westendorf, “Ursprung und Wesen der Ma’at” (ver nota 8), p. 223; Derchain, “La religion égyptienne”, p. 100.
Todos os estudos da religião egípcia tratam de Osíris e seu culto. Para bibliografia suplementar: David, Ancient Egyptians, p.
242.
Cf. Assmann, Zeit und Ewigkeit, p. 47.
Cf. Hornung, “Licht und Finstemis”, p. 80.
Cf. Hornung, Conceptions of god, pp. 93, 95.
Cf. Leclant, op. cit., p. 235.
Cf. o Livro dos mortos, cap. 175 (para as traduções, ver nota 61); também Hornung, Der àgyptische Mythos von der
Himmelskuh, p. 104.
Cf. C. C. McConn, “Egyptian apocalyptic literature”, Harvard Theological Review 18 (1925), pp. 357-411; G.
Lanczkowski, Altàgyptischer Prophetismus, Wiesbaden, 1960; Jonathan Z. Smith, Map is not territory, Leiden, 1978, pp. 74-
87, esp. o sumário conciso das principais características da profecia egípcia na p. 76; Assmann, “Kõnigsdogma und
Heilserwartung. Politische und kultische Chaosbeschreibungen in ágyptischen Texten”, hk ll ho l m, pp. 345-78. Nem mesmo
a “profecia escatológica”, mencionada no final da obra de Lanczkowski, fala de um futuro sem qualquer referência ao passado.
Concepções sobre a vida após a morte aparecem de maneira proeminente na maioria das obras sobre a visão de mundo
egípcia; uma delas, particularmente exaustiva, é David, Ancient Egyptians. Para estudos detalhados, ver A.
H. Gardiner, The attitude of the ancient Egyptians to death and the dead, Cambridge, 1935 (Conferência Frazer); H. Kees,
a
Totenglaube und Jenseits-vorstellungen der alten Àgypter, 2 ed., Berlim, 1956; A. J. Spencer, Death in Ancient Egypt,
Harmondsworth, 1982, esp. cap. 6. E. Homung, The valley of the kings. Horizon of etemity, Nova York, 1990 (trad. da ed. alemã de
1982), esclarece essa questão muito mais do que se poderia supor pelo tema da obra, os túmulos reais do Novo Império. Valiosas
coleções de textos traduzidos, ilustrando as concepções sobre a vida após a morte, são, para o Antigo Império e o Primeiro Período
Intermediário; S. A. B. Mercer, Thepyramid texts in transiation and commentary\ 4 vols.. Londres, Nova York etc., 1952, e R. O.
Faulkner, The ancient Egyptian pyramid texts, Oxford, 1969; para o Médio Império: Faulkner, The ancient Egyptian coffin texts, 3
vols., Warminster, 1973-8; para o Novo Império: E. A. W. Budge, The hook of the dead, 3 vols., Londres, 1898; T.
G. Allen, The book of the dead or Going forth by day, Chicago, 1974; Faulkner,
The ancient Egyptian book of the dead, Londres, 1972, ed. rev. 1985.
Cf. a inscrição no túmulo de um príncipe do Novo Império, traduzida em parte em Gardiner, The attitude of the
ancient Egyptians, pp. 29-30, e em parte em K. Sethe, Urkunden der 18. Dynastie, Leipzig, 1914, p. 58.
Cf. Westendorf, “Ursprung und Wesen der Ma’at” (ver nota 8), esp. p. 216.
Cf. Hornung, Altagyptische Hõllenvorstellungen. Berlim, 1968 (Abhandlungen der sàchsichen Akademie der
Wissenschaften, Philologisch-historische Klasse 59, 3). Para uma abordagem mais geral: J. Zandee, Death as an enemy,
Leiden, 1960, esp. pp. 14-41.
Trad. Gardiner, op. cit., p. 32.
1. Sobre a civilização e a visão de mundo dos sumérios: S. N. Kramer, Sumerian mythology, Filadélfia, 1944 (Memoirs of
the American Philosophical Society 21); idem, History begins at Sumer, Londres, 1958; idem, The Sumerians: Their history,
culture and character, Chicago, 1963. Sobre a civilização e a visão de mundo da antiga Mesopotâmia em geral: T. Jacobsen,
“Mesopotâmia”, em H. Frankfort et al., The intellectual adventure of ancient man\ Frankfort, Kingship and the gods (para este
e o anterior, ver nota 1 do cap. 1) : E. Dhorme, Les religions de Babylonie et d’Assyrie, Paris, 1949 (vol. 2 da coleção Mana);
J. Bottéro, La religion babylonienne. Paris. 1952; H. W. F. Saggs, The greatness that was Babylon, Londres, 1962, ed. rev.
1988; A. L. Oppenheim, Ancient Mesopotâmia: Portrait of a dead civilization, Chicago, 1964; J. Nougaryol, “La religion
babylonienne”, em H.-C. Puech (ed.), Histoire des religions, vol. 1, Paris, 1970;
W. W. Hallo & W. H. Simpson, The Ancient Near East: A history, Nova York etc., 1971, parte 1; H. Ringgren, Religions of the
Ancient Near East, ed. ing., Londres, 1973; T. Jacobsen, The treasures of darkness: A history of Mesopotamian religion, New Haven e
Londres, 1976; Saggs, The encounter with the divine in Mesopotâmia and Israel, Londres, 1978; Joan Oates, Babylon, Londres. 1979,
ed. rev. 1986; G. Roux, Ancient Iraq, ed. rev., Harmondsworth, 1980; John Gray,
Near Eastem mythology, 2* ed., Londres, 1982, pp. 6-105; Saggs, The might that was Assyria, Londres, 1984; J. Bottéro,
Mésopotamie: Lécriture, la raison et les dieux, Paris, 1987.
Ver também os artigos de Kramer, “Mythology in Sumer and Akkad”, em Kramer (ed.), Mythologies of the ancient world,
Nova York, 1961; de Jacobsen, “Ancient Mesopotamian religion: The central concems”, em Proceedings of the American
ü
Philosophical Society 107, n 6 (Filadélfia, 1963), pp. 473-84; de W.
G. Lambert, “Destiny and divine intervention in Babylon and Israel”, em A. S. Van der Woude (ed.), The witness of tradition,
Leiden, 1972, pp. 65-72; S. N. Kramer & J. Maier, Myths ofEnki, The crafty god, Nova York e Oxford, 1989, esp. cap. 3, “Enki and
Inanna: The organization of the earth and the cultural processes”.
B. Geiger, Die Amesha Spentas, ihr Wesen und ihre ursprüngliche Bedeutung, em Sitzungsberichte der kaiserlichen Akademie
der Wissenschaften in Wien 176 (Viena, 1916), esp. pp. 144-7; Benno Landsberger, “The conceptual autonomy of the Babylonian
world”, originalmente uma Conferência Inaugural (Leipzig, 1926), reed. e trad. em Jacobsen et al., Monographs on the Ancient Near
East, vol. 1, fase. 4. Malibu, Cal., 1976, esp. p. 13; E. A. Speiser, “Authority and law in Mesopotamia”, ja os, suplemento 17 (1954)
(Authority and law in the Ancient Orient), pp. 10-5; J. van Dijk, “Einige Bemerkungen zu sumerischen religionsgeschichtlichen
Problemen”, Orientalische Literaturzeitung 62 (Berlim, 1967), cols. 229-47, esp. col. 231; H. Ringgren, Religions of the Ancient Near
East, pp. 43,103, 112-3. Sobre o relacionamento do sol, ou do deus-sol, com esse princípio: Geiger. loc. cit.; R. Labat, Le caractere
religieux de la royauté assyro-babylonienne. Paris, 1939, pp. 228-33; Hans Heinrich Schmid, Gerechtigkeit ais Weltordnung,
Tübingen, 1968, pp. 61-5; Ringgren, op. cit., pp. 9, 39, 44, 58-9. Para os hititas, ver O. R. Gumey, The Hittites, Londres, 1952, p. 139.
Para outras culturas: R. Pettazoni, The all-knowing g (?d, ed. ing., Londres, 1956, passim; e o cap. 1 desta obra.
1. Sobre o conceito de me: J. van Dijk, La sagesse suméro-accadienne, Leiden, 1953, p. 19; H. H. Schmid, Wesen und
Geschichte der Weisheit: Eine Untersuchung zur altorientalischen und israelitischen Weisheitsliteratur, Berlim, 1966, pp.
115-8; idem, Gerechtigkeit ais Weltordnung, pp. 61-5; G. Farber-Flügge, Der Mythos “Inanna und Enki “ unter besonderer
Berücksichtigung der Liste der me, Roma, 1973, esp. pp. 118-22, 197-9; L. G. Perdue, Wisdom and cult: A criticai analysis of
the views of cult in wisdom literature of Israel and the Ancient Near East, Missoula, 1977, pp. 85-94.
2. Para o que vem a seguir, cf. Labat, op. cit., pp. 234-5; Saggs, The greatness that was Babylon, pp. 364-9.
3. Sobre o papel do rei, além dos trechos relevantes nas obras listadas na nota 1 acima, ver: Labat, op. cit., passim; W. G.
Lambert, “The seed of kingship”, em P. Garelli (ed.), Le palais et la royauté (Archéologie et civilisation), Paris, 1974, pp. 427-
40.
72. Para análises exaustivas da obra: Jacobsen, op. cit., pp. 167-91; Bottéro, Mythes et rites de Babylone, Paris, 1985, pp. 113-
62. Sobre a data provável de composição: W. G. Lambert, “The reign of Nebuchadnezzar I”, em W. S. McCullough (ed.), The seed of
wisdom, Toronto, 1966; W. Sommerfeld, Der
Aufstieg Marduks. Die Stellung Marduks in der babylonischen Religion des zweiten Jahrtausends v. Chr., Neukirchen-Vluyn,
1982, esp. p. 175.
o akitu; para um relato que aponta várias interpretações equivocadas, ver J. A. Black, “The New Year ceremonies in Ancient
Babylon: ‘Taking Bei by the hand”‘, Religion 11 (Londres, 1981), pp. 39-59.
1. Cf. A. H. Gardiner, The attitude ofthe ancient Egyptians to death and the dead, Cambridge, 1935, pp. 16-22.
2. A abordagem mais próxima dessa expectativa talvez seja a que se encontra no documento descrito em P. Hoffken,
“Heilszeitherrschererwartungen im babylonischen Raum”, Die Welt des Orients 9 (Gottingen. 1977), pp. 57-71. Essa fanta-
sia patriótica, originária de Umk e provavelmente dirigida contra os persas, é de âmbito muito restrito. A sugestão de W. Hallo,
“Akkadian apocalypses”, Israel Exploration Journal 16 (Jerusalém, 1966). pp. 231-42, de que o Texto D em W. G. Lambert & A. K.
Grayson, “Akkadian prophecies”, Journal of Cuneiform Studies 18 (New Haven, 1964), pp. 7-30, pode indicar uma “Heilzeit final e
definitiva sob a égide de um rei-redentor” não é confirmada pelas evidências disponíveis. E a “fala profética de Marduk” mencionada
por Grayson em Babylonian historical- literary texts, Toronto e Buffalo, 1975, pp. 13 ss. (que inclui o Texto D) não passa de uma
profecia ex eventu, sem nenhuma importância escatológica.
1. Um relato mais completo da vida nas estepes e suas vicissitudes é apresentado no capítulo 4 deste livro.
a
2. Sobre os indo-arianos e sua chegada ao vale do Indo: A. L. Basham, The wonder that was índio, 3 ed.. Nova York,
1967, pp. 1-34 ss.; S. Wolpert, A new history of índia. Nova York e Oxford, 1982, pp. 10-38.
3. Cf. B. Schlerath, Das Kõnigtum in Rigund Arthavaveda, Wiesbaden, 1960, pp. 122-6.
4. Sobre o Rig Veda: J. Gonda, Vedic literaíure, Wiesbaden, 1975 (vol. 1, fase. 1 de J. Gonda (ed.), A history of Indian
literature). Para uma extraordinária tradução de uma seleção dos hinos rigvédicos: Wendy D. 0’Flaherty, The Rig Veda: An
anthology, Harmondsworth, 1981. Traduções para o inglês completas (mas não necessariamente confiáveis) : R. T. H. Griffith,
The hymns of the Rig Veda, Londres, 1889; H. H. Wilson, Rig-Veda-Sanhita: A collection ofancient Hindu hymns, 6 vols.,
Londres, 1850-88. Uma tradução completa e confiável para o alemão é K. F. Geldner. Der Rig-Veda, 4 vols., Cambridge,
Mass., 1951-7.
a
5. Sobre a visão de mundo védica: H. Oldenberg, Die Religion des Veda, 2 ed., Berlim, 1917, reimp. 1970; A. A.
Macdonnell, Vedic mythology, Strassburg, 1897; H. D. Griswold, The religion of the Rigveda, Londres, 1923;
A. B. Keith, The religion and philosophy of the Veda and Upanishads, 2 vols., Cambridge, Mass., 1925; A. D. Pusalker, The
Vedic age, Londres, 1951 (vol. 1 de R. C. Majundar, ed., History and culture of the Indian people); W. Norman Brown, Man in lhe
universe, Berkeley, 1966, cap. 1; S. Bhattacharji, The Indian theogony, Cambridge, 1970.
1. Para breves descrições das cosmogonias védicas: W. Norman Brown, “Theories of creation in the Rig Veda”, ja os 85,
i (1965), pp. 23-34; F. B. J. Kuiper, “Cosmogony and conception: A query”, h r 10, 2 (1970), pp. 91-138, esp. pp. 99 ss.; M.
Eliade, A history ofreligious ideas, vol. 1, ed. ing., Londres, 1979, pp. 223-7; 0’Flaherty, op. cit., pp. 25-40 (hinos traduzidos e
comentados). Uma cosmogonia particularmente interessante, de origem proto-indo-européia, trata do sacrifício e
desmembramento do homem primordial. A versão védica é dada no Purusha-Sukta (r v 10.90); para tradução e comentário,
ver 0’Flaherty, op. cit., pp. 30-1. Ver também 0’Flaherty, The origins ofevil in Hindu mythology, Berkeley, 1976, pp. 139-40;
Bruce Lincoln, Myth, cosmos and society: Indo-euro-
pean themes ofcreation and destruction, Cambridge, Mass., e Londres, 1986, esp. cap. 1; idem, “The Indo-european myth of
creation”, h r 15, 2 (1975), pp. 121-45; e W. Norman Brown, “Theories of creation”.
1. Sobre Indra, além das passagens relevantes nas obras relacionadas na nota 5, ver: Usna Choudhuri, Indra and Varuna
in Indian mythology, Delhi, 1981;
M. Paliwahadana, The Indra cult as ideology: A clue to power struggle in an ancient society, reimp. de Vidoyana Journal
ofArts, Science and Letters 9 (1981) e 10 (1982). Sobre Indra como deus da fertilidade: E. W. Hopkins, “Indra as god of fertility”, ja os
36 (1917), pp. 243-68; J. Gonda, Aspects of early Visnuism, Utrecht, 1934, pp. 32-55.
Sobre o mito de Vala, ver Hanns-Peter Schmidt. Brhaspati und Indra: Untersuchungen zur vedischen Mythologie und
Kulturgeschichte, Wiesbaden, 1968, passim\ Paliwahadana, op. cit., pp. 89-90, 95-9. Para um breve relato: Oldenberg,
Religion des Veda, pp. 143 ss. Para uma tradução comentada da fonte mais importante (r v 3.31) : 0’Flaherty, op. cit., p. 151.
Outros trechos relevantes são r v 4.3.11; 10.62.2; 10.67,2,3.
W. Norman Brown, “The creation myth of the Rig Veda”, ja os 62 (1942), pp. 85-98; idem, “Mythology of índia”, em
S. N. Kramer (ed.), Mythologies of the ancient world, Nova York, 1961, pp. 281-6.
Para uma tradução comentada do texto rigvédico mais relevante (r v 1.32) : 0’Flaherty, The Rig Veda, pp. 148-51.
Sobre rita e seu equivalente iraniano: H. Lüders, Varuna, ed. L. Alsdorf, vol. 2, Gõttingen, 1959, esp. pp. 568-84 (o
relato mais completo, embora prejudicado por uma identificação demasiado restrita de rita a “verdade”);
J. Duchesne-Guillemin, La religion de Tlran ancien, Paris, 1962, pp. 191-6 (inclui uma crítica de Lüders); M. Boyce, A history
of Zoroastrianism, vol. 1, Leiden, 1975, p. 27 (na série Handbuch der Orientalistik, ed. B. Spuler); J. Gonda, Die Religionen Indiens,
vol. 1, pp. 77-9.
Cf. Lüders, op. cit., vol. 1, 1951, pp. 13-40; I. Gershevitch (ed. e trad.),
The Avestan hymn to Mithra, Cambridge, 1959, esp. pp. 26-54 da introdução;
4
P. Thieme, “The Aryan’ gods of the Mitanni treaties”, ja os 80 (1960), pp. 301- 17, esp. p. 308; Gonda, op. cit., pp. 73-82;
Boyce. op. cit., pp. 22-37.
Cf. Gonda, The Vedic god Mitra, Leiden, 1972, pp. 91, 109-10.
Cf. V. N. Toporov, “Indo-Iranian social and mythological concepts”, em J. C. Heersterman et al. (eds.), Pratidanam:
Studies presented to F. B. J. Kuiper, Haia e Paris, 1968, pp. 108-20 (Mitra, nas pp. 108-13); W. B. Kristensen, “Het Mysterie
van Mithra”, Mededeelingen der Koninklijke Akademie van Wettenschappen, Amsterdam, Aft. Letterkunde 9 (1946), pp. 25-
38, esp. pp. 3-5.
Cf. Choudhuri, op. cit., pp. 12-4, nas quais vários dos trechos relevantes do Rig Veda são traduzidos.
Sobre Soma (a bebida e o deus) : Macdonnell, op. cit., pp. 104-14;
Keith, op. cit., vol. 1, pp. 166-72; Gonda, Religionen Indiens, pp. 62-6 (ver nota 5 acima para referências completas); Boyce,
op. cit., pp. 157-62.
Cf. D. S. Flattery & M. Schwarz, “Haoma e Harmeline”, University of Califórnia Publicaiions in Near Eastem Studies
21 (Berkeley, 1984).
Sobre Agni: Macdonnell, op. cit., pp. 88-100; Keith, op. cit., vol. 1, pp. 154-62; Gonda, op. cit., pp. 67-73; Boyce, op.
cit., pp. 69-70.
Gonda, op. cit., pp. 68-9. Para uma explicação alternativa: Oldenberg, op. cit., pp. 108 ss. (resumida em Boyce, op.
cit., pp. 45-6).
Cf. W. Norman Brown, Man in íhe universe, pp. 58-64. (25) r v 8.101: 15-6 (trad. Brown, ibid., p. 62).
Sobre os sacrifícios védicos: S. Lévi, La doctrine du sacrifice dans les brahmanas, Paris, 1898, reimp. 1966; Keith, op.
cit., vol. 2, pp. 313-66; Gonda, op. cit., pp. 104-73; M. Biardeau & Charles Malamoud, Le sacrifice dans linde ancienne. Paris,
1976.
Cf. Biardeau, op. cit., pp. 7-57.
Sobre Rudra: Gonda, op. cit., pp. 85-9.
Cf. Biardeau, op. cit., p. 25; 0’Flaherty, The origins of evil, p. 79.
Cf. Macdonnell, op. cit., pp. 162-4. (31) Rv 1.104.
Cf. W. Norman Brown, “The Rig-vedic equivalem of hell’\ ja os 61 (1941), pp. 76-80, esp. p. 79.
Cf. E. Arbman, “Tod und unsterblichkeit im vedischen Glauben”, Archiv fiir Religionswissenschaft 25 (Leipzig e
Berlim, 1927), pp. 339-87, e 26 (1928), pp. 152-238; Macdonnell, op. cit., p. 166.
Idem, ibid., p. 168.
1. Sobre Zoroastro e o zoroastrismo no mundo antigo: H. Lommel, Die Religion Zarathustras nach dem Awesta
dargestellt, Tübingen, 1930, reimp. 1971;
R. C. Zaehner, The dawn and tnilight of Zoroastrianism, Londres, 1961, reimp. 1975; J. Duchesnc-Guillemin. La religion de
Tlran ancien, Paris, 1962 (inclui excelente bibliografia); B. Schlerath (ed.), Zarathustra, Wege der Forschung, Darmstadt, 1970
(coletânea de ensaios publicados nos cinquenta anos anteriores);
Gnoli, Zoroaster’s time and homeland, Nápoles, 1980; idem, De Zoroastre à Mani, Paris. 1985; M. Boyce, A history
of Zoroastrianism, 3 vols., Leiden, 1975, 1981, 1991 (na série Handbuch der Orientalistik, ed. B. Spuler); idem, Zoroastrians:
Their religious beliefs and practices, Londres, 1979; idem, Zoroastrianism: Its antiquity and constant vigour, Costa Mesa,
Cal., 1993. Também são relevantes partes de J. R. Hinnells, Persian mythology, Londres etc., 1973 (com introdução ilustrada),
e de G. Widengren, Die Religionen Irans, Stuttgart, 1965.
Para uma bibliografia das melhores traduções dos textos zoroastrianos, ver
Boyce, Zoroastrians, pp. 229-31; Zaehner, The teachings of the Magi, Londres, 1956, é uma antologia de fontes zoroastrianas
do período sassânida, traduzidas e
comentadas. Boyce, Textual sources for the study of Zoroastrianism, Manchester, 1984, é uma antologia de fontes de todos os
períodos, traduzidas e comentadas; exceto quando indicado de outro modo, as citações deste capítulo foram tiradas dessa obra. Outra
antologia proveitosa de trechos traduzidos é W. W. Malandra, An introduction to ancient íranian religion: Readings from the Avesta e
Achaemenid inscriptions, Minneapolis, 1983.
Para a história do Irã antigo até depois do período sassânida: R. N. Frye, The history of Ancient Iran, Munique, 1984 (na série
Handbuch der Altertumwissenschaft, ed. H. Bengton).
1. A data do século vi também foi aceita por W. B. Henning, Zoroaster, politician or witch-doctor?, Oxford, 1951, pp. 35
ss., e Zaehner, Dawn and twilight, p. 33. Sobre o seu fundamento equivocado, ver P. Kingsley, “The Greek origin of the sixth-
century dating of Zoroaster”, bso a s 53 (1990), pp. 245-64.
2. Cf. Boyce, “Persian religion of the Achemenid age”, em The Cambridge History of Judaism, vol. 1, Cambridge etc.,
1984, pp. 275-6; idem, Zoroastrianism, cap. 2; idem, History, vol. 2, pp. 1-3; Gnoli, op. cit., pp. 159 ss.;
E. Eduljee, “The date of Zoroaster”, Journal of the K. R. Cama Oriental Institute 48 (Bombaim, 1960), pp. 103-60.
1. Yasna 44.18. Yasna é a parte do Avesta que contém os textos recitados durante o ato de adoração (yasna); é dividida
em cerca de 72 seções numeradas.
2. Sobre a constituição do cânone do zoroastrismo: H. S. Nyberg, Die Religionen desAlten /rans (orig. sueco), Leipzig,
1983, cap. 8, esp. pp. 415-9.
A única tradução completa para o inglês dos yashts encontra-se em J. Darmesteter, The Zend-Avesta, parte 2, Oxford,
1883 (reimp. Delhi, 1965), que constitui o vol. 23 da coleção Sacred books of the East. Ela é obsoleta em muitas aspectos. A
“Introdução” de Malandra (ver nota 1, acima) inclui uma generosa seleção de yashts, com notas valiosas. Para uma boa
tradução completa para o alemão, também com notas preciosas: H. Lommel, Die Yasts des Awesta, Gõttingen e Leipzig, 1927.
Certos trechos do Rig Veda (sobretudo r v 5.63.3d e 7b,c, r v 5.83.6d) foram por vezes citados como se referissem a
esse deus; ver P. Thieme, “The ‘Aryan’ gods of the Mitanni treaties”, ja os 80 (1960), pp. 301-17, esp. p. 309. Porém, esses
trechos são interpretados de maneira bem diversa por Geldner em sua tradução e comentário, e o mesmo se pode dizer da
única das três passagens (a última) incluídas na tradução de 0’Flaherty. Para as referências completas dessas obras, ver nota 4
do cap. 3.
Texto e tradução: B. T. Anklesaria, Zxmd-Akasih, íranian or Greater Bundahishn, Bombaim, 1964. Há uma seleção de
trechos traduzidos em Boyce, Textual sources.
Cf. nota 6 do cap. 3.
Sobre a criação, por Ahura Mazda, dos Santos Imortais e do mundo físico, ver Boyce, History, vol. 1, pp. 192-5, 202-
3,220-1, 229-31. Sobre o mundo
físico como armadilha para Angra Mainyu, ver também Zaehner, Teachings of the Magi, p. 18, e Dawn and twilight. p. 265
(embora Zaehner associe as noções apenas ao zoroastrismo sassânida).
Sobre o ritual de sacrifício iraniano: Boyce, History, cap. 6; e cf. ibid., pp. 219-20.
A partir da tradução alemã do yasht 10.6 em H. Lommel, Yasts, p. 192.
Sobre o papel soteriológico dos seres humanos: N. Sõderblom, La vie future d’après le mazdéisme, Paris, 1901, pp.
240, 255-7; M. Molé, Culte, mythe et cosmologie dans Vlran ancien, Paris, 1963, p. 395.
Trad. Boyce, Textual sources, p. 100.
Vendidad 3. 23-35, cit. e trad. em M. Schwarz, “The religion of the Achemenian Iran”, em The Camhridge history of
Iran, vol. 2, Cambridge etc., 1985, p. 662.
Cf. Lommel, Religion Zarathustras, p. 238; Boyce, History, vol. 1, pp. 210-1.
Sobre a criação daévica: Lommel, op. cit., pp. 113-20; Boyce, op. cit., pp. 294-307.
Yasna 29.
Vendidad 33.39. A única tradução completa para o inglês do Vendidad está na parte 1 de Darmesteter, The Zend-
Avesta, vol. 4 de Sacred books of the East, Oxford, 1880.
Esta citação e as duas anteriores são do yasht 13, versos 13, 23, 65; trad. Boyce, History, vol. 1, pp. 125-6.
Louis H. Gray, The foundations of the Iranian religions, Bombaim, 1929 (K. R. Cama Oriental Institute Publications
n°5), e A. Christensen, Essai sur la démonologie iranienne, Copenhague, 1941, embora datados, proporcionam um panorama
compreensivo das crenças zoroastrianas e iranianas nos demônios.
Yasna 30.7.
Malandra, op. cit., p. 162; Vendidad 17. 7-10.
A partir da tradução alemã do yasht 13.57 em Lommel, Yasts, p. 119.
Cf. T. Burrow, “The proto-Indo-aryans”, Journal of the Royal Asiatic Society (Londres, 1973), pp. 123-40, e Gnoli, op.
cit., pp. 73 ss.
Cf. Boyce, History, vol. 1, pp. 201, 251-2.
Trechos relevantes no Bundahishn: 1.55 e 34.27; no Dinkard: 9.9.1. Ver também, dos autores mais antigos, J.
Darmesteter, Ormazd et Ahriman, Paris, 1877, pp. 259-65; A. V. W. Jackson, “Die iranische Religion”, em W. Geiger &
E. Kuhn (eds.), Grundriss der iranischen Philologie, Strassburg, 1896-1904, vol. 2, pp. 655-7.
Cf. Boyce, op. cit., p. 252. Alguns estudiosos consideram o conflito como sendo entre diferentes estratos sociais, mais
do que entre diferentes tipos de sociedade; ver Kai Barr, “Avest. dragu, drigu”, em Studia Orientalia loanni
310
Pedersen dicata, Copenhague, 1953, pp. 21-40; Bruce Lincoln, Priests, warriors and cattle: A study in the ecology of religion,
Berkeley etc., 1981, esp. caps. 5 e 6; Gnoli, op. cit., p. 185. Esses estudiosos, contudo, não levam em conta a transformação da guerra
considerada abaixo. Para uma réplica à argumentação de Lincoln, ver Boyce, “Priests, cattle and men”, bso a s 50 (1987), pp. 508-26.
Cf. A. Kammenhuber. DieArierim Vorderen Orient, Heidelberg, 1968; Boyce, Zoroastrians, pp. 2-3, 18; idem,
Zoroastrianism, pp. 37-9.
Cf. P. Friedrich, Proto-lndo-European syntax, Butto, Montana, 1975, pp. 44-6; Boyce, “The bipartite society of the
ancient Iranians’% em M. A. Dandamayev et al. (eds.), Societies and languages in the Ancient Near East: Studies in honour of
1. M. Diakonoff, Warminster, 1982, pp. 33-7. Proposta por Stig Wikander em Der arische Mannerbund (Lund, 1938) e
elaborada por Georges Dumézil em várias de suas obras, a concepção de que a sociedade proto- indo-iraniana e mesmo a
proto-indo-européia já possuíam uma classe de guerreiros profissionais não pode mais ser sustentada, pois desconsidera a
cronologia do neolítico e do início da idade do bronze nas áreas relevantes.
Boyce, Zoroastrians, p. 3. (41) Yasna 32. 11-2.
Cf. Norman Cohn, The pursuit of the millennium, Londres e Nova York, 1957 etc., passim.
Para os ensinamentos zoroastrianos relativos à vida após a morte:
p. 25; idem, Dawn and rwilight, pp. 55-7, 304-7; Boyce, History, vol. 1, pp. 109- 17, 198, 236-41. Para um levantamento
detalhado dos escritos zoroastrianos sobre o tema: Jal Dastur Cursetji Pavri, The Zoroastrian doctrine of a future life from death to the
individual judgment, Nova York, 1926. Para os ensinamentos zoroastrianos relativos ao estado final do mundo, além das passagens
relevantes nas obras gerais relacionadas na nota 1 acima, ver: N. Sõderblom, op. cit. (ver nota 17); G. Widengren, “Leitende Ideen und
Quellen der iranischen Apokalyptic”, hell ho l m, pp. 77-162. O cap. 34 de Bundahishn é especialmente relevante e nele se baseia o
relato seguinte da grande consumação (ver nota 12).
As mesmas duas expectativas contrastantes persistiram entre os indo- arianos por algum tempo depois de sua chegada
à índia; cf. E. Arbman, “Tod und Unsterblichkeit im vedischen Glauben”, Archiv für Religionwissenschaft 25 (Leipzig e
Berlim, 1927), pp. 339-89, e 26 (1928), pp. 187-240.
Bundahishn, cap. 34: 4-5.
Cf. Yasna 44.15 e Yasna 51.9: Sõderblom. op. cit., p. 224; Bloyce, History, vol. 1, pp. 242-4 (com notas remetendo a
relatos mais completos no Bundahishn e outros livros pálavi).
Cf. Lommel, op. cit., pp. 219 ss.
Yasna 51.9.
Bundahishn, cap. 34: 27.
Yasna 30.9; e cf. Yasna 34.15. Cf. também Zaehner, Dawn and twilight, pp. 58-9; Boyce, History, vol. 1, p. 233.
Cf. Dinkard 7, cap. 2 (trechos relevantes traduzidos em Boyce, Textual sources, pp. 72-4).
Cf. Yasna 43.3.
O Avesta descreve o Saoshyant e seu papel nos yashts 13 e 19.
De Zand i Vahman Yasht, cap. 4. Para comentário sobre a origem da profecia, ver Boyce, “On the antiquity of
Zoroastrian apocalyptic”, bso a s 47 (1984), pp. 57-75.
Sobre a influência da conquista de Alexandre: S. K. Eddy, The Idng is dead, Lincoln, Nebrasca, 1961, pp. 10 ss.; e,
para períodos posteriores: Boyce, History, vol. 1, p. 293.
Sobre o possível papel da “heresia zurvanita” na revisão, ver Boyce,
Cf. G. Gnoli, “Politique religieuse et conception de la royauté sous les achéménides”, Acta Iranica 2 (Leiden, 1974),
pp. 118-90, esp. pp. 162-9; K. Koch, “Weltordnung und Reichsidee im alten Iran”, em P. Frei & K. Koch, Reichsidee und
Reichsorganisation im Perserreich, Gõttingen, 1984.
Citações em Boyce, Zoroastrians% p. 55. Cf. Boyce, “Persian religion in the Achaemenid age”, pp. 286-7.
1. Que Verethraghna tenha sido um dragão foi contestado, por exemplo, por E. Benveniste & L. Renou, Vrtra et
Vrthragna: Étude de mythologie indo- iranienne, Paris, 1934, esp. pp. 81 ss.; Boyce, History, vol. 1, p. 64 e nota 280. Para as
primeiras críticas a Benveniste/Renou: A. B. Keith, “Indra and Vrtra”, em Indian culture, vol. 1, Calcutá, 1934; Lommel. op.
cit.
2. Sobre Thor: Jan de Vries, Altgermanische Religion, 2* ed., vol. 2, Berlim. 1957, pp. 107-52; E. O. G. Turville-Petre,
Myth and religion ofthe North, Londres, 1964, pp. 75-105. Há uma tradução recente dos trechos relevantes em Jean I. Young,
Prose Edda, Cambridge, 1954, e Berkeley, 1964.
3. Sobre Indra e Thor: partindo de uma breve indicação de J. Grimm em sua Teutonic mythology, escrita em 1844, o tema
foi plenamente desenvolvido em Wilhelm Mannhardt, Gennanische Mythen, Berlim, 1858, pp. 1-242. Para uma abordagem
mais recente: F. R. Schrõder, “Indra, Thor und Herakles”, Zeitschrift für deutsche Philologie 76 (Berlim, 1957), pp. 1-41; e.
para um resumo breve mas convincente: Turv ille-Petre, op. cit. (ver nota 18 do cap. 13), pp. 113-20.
4. Yasht 19.81; cf. yasht 9.11.
5. Os trechos seguintes nos yashts referem-se aos monstros eliminados por Keresaspa: 19.40; 9.11 (Sruvara); 15.28-9;
5.38-9 (Gandarva); 19.43-4 (Snavidka).
6. Sobre Thraetona e Azi Dahaka: H. Lommel, Der arische Kriegsgott, Frankfurt, 1939, pp. 59-60; Boyce, History, vol.
1, pp. 97-100.
7. Cf. S. E. Greenebaum, “Vrtrahan — Verethraghna: Indian and Iranian”,
em G. L. Larson et al. (eds.), Myth in Indo-European Antiquity, Berkeley etc., 1974, pp. 93-7, esp. p. 96.
1. Tradução inglesa de trechos do yasht 8: Boyce, Textual sources, p. 32; tradução alemã completa: Lommel, Yasts, pp.
46-57. Sobre os nomes: B. Forssman, “Apaosha, der Gegner des Tishtriia”, Zeitschrift für vergleichende Sprachforschung 82
(Gõttingen, 1968), pp. 37-61, esp. pp. 42-9.
2. Sobre as corridas de carruagem: F. B. J. Kuiper, “The ancient Aryan verbal contest”, iu 4 (1960), pp. 220-2; W. W.
Malandra, Introduction to ancient Iranian religion, pp. 141-2. Sobre o contexto ecológico original do mito de Tishtrya: E. C.
Polomé, “Indo-European culture. with special attention to religion”, em Polomé (ed.), The Indo-Europeans in the fourth and
third millennia, Ann Arbor, 1982, p. 165.
3. A afinidade entre os mitos de Tishtrya e Indra já fora observada por
J. Darmesteter, Ormazd et Ahriman, Paris, 1877, p. 126, chega a identificar Tishtrya a Verethraghna, o que é descabido.
1. Sobre Verethraghna: B. Geiger, Die Amesha Spentas. Sitzungsbericht der Kaiserlichen Akademie der Wissenschaften,
Philosophisch-historische Klasse. Viena, 176 (1916), pp. 56-83, esp. pp. 66-83; H. Lommel, Der arische Kriegsgott, pp. 46-
76. Tradução inglesa de trechos do yasht 14: Boyce, Textual sources, pp. 30-1; tradução alemã completa: Lommel, Yasts, pp.
130-43.
2. Cf. Geiger, op. cit., pp. 69-70.
3. Sobre Vahagn: Geiger, op. cit., p. 65; Lommel, op. cit., p. 52; G. Dumézil, “Vahagn”, r h r 117 (1938), pp. 152-70;
idem, Heur et nuilheur du guerrier. Paris, 1969, pp. 116-20.
4. Cf. Geiger, op. cit., p. 65.
5. Cf. J. de Menasce, “La promotion de Vahram”, r h r 133 (1947), pp. 15-8.
6. Além de Lommel, Der arische Kriegsgott, cf. H. W. Bailey, “The second stratum of the Indo-Iranian gods”, in J. R.
Hinnells (ed.), Mythraic studies, vol. 1, Manchester, 1975, pp. 1-20, esp. p. 18.
7. Trad. Boyce, Textual sources, p. 29.
8. Yasht 10.72, trad. I. Gershevitch, The Avestan hymn to Mithra,
Cambridge, 1959.
(20) Habent sua fata libelli! Somente após ter chegado laboriosamente à mesma conclusão foi que deparei com a seguinte
passagem em uma obra publicada há mais de um século: “Le démon qui retient les eaux du ciei fut regardé comme un type de
méchanceté et de pervcrsité. C’est ce côté religieux (...1 qui frappa surtout les Perses, donnant au myth de Vritra un développement
extraordinaire: ils en firent le cadre de leur religion. Le vritra védique devint chez eux Ahriman, et la lutte des deux êtres merveilleux
se prolongea pour les Perses à travers 1’immensité du temps et de 1’espace: lutte morale avant tout, oü chaque homme doit prendre
parti, et dont 1’avenir de tous et de chacun est le prix” [O demônio que retém as águas do céu foi considerado como um tipo de
maldade e perversidade. Foi esse aspecto religioso (...) que impressionou sobretudo aos persas, proporcionando ao mito de Vritra um
extraordinário desenvolvimento: eles o
utilizaram como o quadro de sua religião. O vritra védico tomou-se Ahriman e a luta dos dois seres maravilhosos se prolongou,
para os persas, através da imensidão do tempo e do espaço: antes de tudo, luta moral em que todo homem deve tomar partido e cujo
preço é o futuro de todos e de cada um] — Michel Bréal, Hercule et Cacus. Étude de mythologie comparée, Paris, 1863, pp. 124-5.
6. UGARIT (pp. 161-72)
Sobre a civilização e a visão de mundo dos cananeus: John Gray, The Canaanites, Londres, 1964, esp. caps. 4 e 5;
idem, The legacy ofCanaan, 2* ed., Leiden, 1965; e, de maneira mais resumida: A. F. Rainey, “The kingdom of Ugarit”, The
Biblical Archaeologist 28 (New Haven, 1965); D. Kinet, Ugarít — Geschichte und Kultur einer Stadt in der Umwelt des Alten
Testaments, Stuttgart, 1981; A. Curtis, Ugarit (Ras Shamra), Cambridge, 1985. Sobre o estado dos conhecimentos depois de
meio século de explorações arqueológicas e debates: G.
D. Young (ed.), Ugarit in retrospect: Fifty years of Ugarit and Ugaritic, Winona Lake, Indiana, 1981. Sobre a mitologia
cananéia em particular: C. H. Gordon, “Canaanite mythology”, em S. N. Kramer (ed.), Mythologies ofthe ancient world, Nova York,
1961, pp. 183-217; E. T. Mullen, The divine council in Canaanite and early Hebrew literature, Chico, Cal., 1980, parte 1, pp. 1-112; a
introdução a
A. Caquot & M. Sznycer, Ugaritic religion (na coleção Iconography of religions), Leiden, 1980; Gregorio dei Olmo Lete,
a
Mitos y leyendas de Canaan, Madri, 1981; Gray, Near Eastern mythology, 2 ed., Londres, 1982, pp. 68-102.
Sobre a irrelevância daquilo que muitas vezes foi considerado fonte secundária, ver A. I. Baumgarten, The Phoenician
history of Philo of Byblos: A commentary, Leiden, 1981.
Cf. John C. L. Gibson, Canaanite myths and legends, Edinburgh. 1978, pp. 102, 107.
Gray, “Sacral kingship in Ugarit”, Ugaritica 6 (Paris, 1969), pp. 289- 302, esp. pp. 295-8; M. Heltzer, The internai
organization of the kingdom of Ugarit, Wiesbaden, 1982, esp. pp. 178-81.
Cf. M. Liverani, “Ville et campagne dans le royaume d’Ugarit. Essai d’analyse économique”, em Societies and
languages (ver nota 39 do cap. 4), pp. 250-8.
Cf. Kinet. op. cit., p. 67. As citações traduzidas dos mitos neste capítulo foram extraídas de Gibson, Canaanite myths
and legends, que se baseou parcialmente em G. R. Driver, Canaanite myths and legends. Edinburgh, 1956. C.
H. Gordon, Ugaritic literature. Roma (Pontificium Institutum Biblicum), 1949, inclui, além de lendas e mitos, textos
religiosos, médicos e administrativos. Para detalhes de outras traduções, ver Curtis, op. cit., p. 82. Sobre o possível papel dos cantores
dos templos: Gibson, op. cit., introdução, p. 6.
O papel de El como deus supremo está presente em todos os relatos da mitologia cananéia. Ver também: J. C. de
Moor, “El, the creator”, em G. Rendsburg et al. (eds.), The Bible world, Nova York, 1980, pp. 171-87; Gibson, “The theology
of the Ugaritic Baal cycle”, Orientalia 53 (Roma. 1984), pp. 202-
19. Vários estudiosos argumentaram que, nos textos ugariticos, El aparece sendo efetivamente sobrepujado por Ba’al, mas hoje
tal concepção não encontra muitos adeptos; ver Gibson, loc. cit., p. 209; Del Olmo Lete, op. cit., pp. 68 ss.
na nota 1, ver: A. S. Kapelrud, Baal in the Ras Shamra texts, Copenhague, 1952;
T. H. Gaster, Thespis. Ritual, myth and drama in the Ancient Near East, Nova York, 1961, pp. 114-29: “The Canaanite poem
of Baal”; J. C. de Moor, The seasonal pattern in the Ugarit myth of Ba ‘lu according to the version of Himiliku, Neukirchen-Vluyn,
1971; Gibson, “The theology of the Ugaritic Baal cycle” (ver nota 7). O meu texto deve muito ao artigo de Gibson.
Sobre a distinção entre os papéis criativos de Baal e El: L. R. Fisher, “Creation at Ugarit and in the Old Testament”, v t
15 (1965), pp. 313-24; Gray, “Social aspects of Canaanite religion”, esp. pp. 178, 192; Werner H. Schmidt, Kõnigtum Gottes
a
in Ugarit und Israel, 2 ed., Berlim, 1966, p. 31; Kapelrud, “Baal, Schõpfung und Chãos”, uf 11 (1979), pp. 407-12; R. J.
Clifford, “Cosmogonies in the Ugaritic texts and in the Bible”, Orientalia (1984), pp. 183-201.
Cf. De Moor, The seasonal pattern, p. 141; Gibson, “The last encmy”, Scottish Journal of Theology 32 (Cambridge,
1979), pp. 151-69, esp. p. 155; Kapelrud, “Baal, Schõpfung und Chãos”.
Trad. Gibson, Canaanite myths, pp. 43-4.
Sobre Mot, além das passagens relevantes nas obras relacionadas na nota 9, ver: Gibson, “The last enemy”; B.
Margalit, A matter of “life” and “death”. A study of the Baal-Mot epic, Kevelaer e Neukirchen-Vluyn, 1980, esp. pp. 201-5;
e, mais resumidamente, Margalit, “Death and dying in the Ugaritic epics”, em B. Alster. Death in Mesopotamia, Copenhague,
1980; N. Wyatt, “Cosmic entropy in Ugaritic religious thought”, uf 17 (1986), pp. 383-6.
Cf. Gibson, op. cit., pp. 68-9.
Trad. Gibson, op. cit., p. 109.
K. Spronk, Beatific afterlife in ancient Israel and in the ancient Near East, Kevelaer e Neukirchen-Vluyn, 1986, pp.
139, 204-5.
Trad. Gibson, op. cit., p. 78.
S. Smith, “Interpreting the Baal cycle”, UF 18 (1986), pp. 313-39; e cf. nota 10.
pp. 112-8; Kapelrud, The violent goddess. Anat in the Ras Shamra texts, Oslo, 1969. Na colônia militar judaica, em Elefantina,
Anat aparentemente era adorada como esposa de Yahweh; para referências, ver nota 2 do cap. 8.
Trad. Gibson, Camanite myths, p. 77. Alguns estudiosos interpretaram essa passagem como se Mot fosse, além disso,
um deus-cereal que é joeirado, mas essa posição parece se basear em um equívoco de tradução; ver S. E. Loewenstamm, ‘The
Ugaritic fertility myth”, dois artigos de 1962 e 1963 reimpressos em seu Comparative studies in bihlical and ancient Oriental
literature, Kevelaer e Neukirchen-Vluyn, 1980.
O trecho encontra-se na p. 47 de Gibson, op. cit. Para um resumo das interpretações propostas por vários estudiosos:
Pope, em Haussig, loc. cit., p. 239.
Apud J. C. de Moor, em uf 7 (1975), p. 610.
1. J. A. Soggin, A history of Israel. From the beginning to the Bar Kochba revolt (Londres, 1984; orig. italiano) contém
bibliografias para todas as fases e aspectos da história israelita e judaica no período relevante. A própria história de Soggin é
excepcional pela imparcialidade com que apresenta as opiniões conflitantes sobre temas polêmicos. G. Garbini, History and
ideology in ancient Israel (orig. italiano), Londres, 1988, e N. P. Lemche, Ancient Israel. A new history of Israelite society,
Sheffield, 1988, oferecem uma abordagem radicalmente inovadora, na qual a versão bíblica da história israelita é praticamente
posta de lado.
2. As duas opiniões são exemplificadas por N. K. Gottwald, The tribes of Israel, Nova York, 1979, e D. B. Redford,
Egypt, Canaan and Israel in ancient times, Princeton, 1992, pp. 271-5. Ver também D. Conrad, “An introduction to the
archaeology of Syria and Palestine on the basis of Israelite settlemenf’, apêndice 1 de Soggin, op. cit., pp. 357-67, esp. pp.
362-4; R. B. Coote & K. W. Whitelam. The emergence of Israel in historical perspective, Sheffield, 1987, cap. 4; W. G.
Dever, “The contribution of archaeology to the study of Canaanite and early Israelite religion”, em Ancient Israelite religion,
pp. 208-47. esp. pp. 234-6 (ver a próxima nota).
3. As obras gerais de referência sobre a religião judaica e israelita (por exemplo, as de Kaufmann, Von Rad, Eichrodt,
Rinngren, Fohrer, Clements) e as introduções para o Antigo Testamento ou a Bíblia hebraica (por exemplo, as de Eissfeldt,
Fohrer, Kaiser. Soggin, W. H. Schmidt, Rendtorff) são bem conhecidas e de fácil acesso, mesmo em tradução. Para um quadro
do estado atual das pesquisas, com a devida atenção às opiniões divergentes, ver Patrick D. Miller et al. (eds.), Ancient
Israelite religion. Essays in honor of Frank Moore Cross, Filadélfia, 1987. Sobre as duas formas de iaveísmo: E. W.
Nicholson, God and his people: Covenant and theology in the Old Testament, Oxford, 1986, esp. pp. 191 ss.; e as obras
relacionadas na nota 45 deste capítulo.
Sobre as concepções israelitas de uma ordem estabelecida divinamente: Hans Heinrich Schmid, Gerechtigkeit ais
Weltordnung. Hintergrund and Geschichte des alttestamentlichen Gerechtigkeitsbegriffs, Tübingen, 1968, esp. pp. 3-22, 65-9; idem,
Altorientalische Welt in der alttestamentlicher Theologie,
Zurique, 1974, e esp. o ensaio “Jahweglaube, altorientalisches Denken” (pp. 31- 47). Ver também S. Niditch, Chãos to cosmos:
Studies in biblical pattems of creation, Chico, Cal., 1985. Para a visão de mundo israelita no contexto do Oriente Médio: O. Keel, The
symbolism ofthe biblical world. Ancient Near East icono- graphy and the Book of Psalms, Londres, 1978 (orig. alemão, Die Welt der
alto- rientalischen Bildsymbolik und das Alte Testament: Am Beispiel de Psalmen, Neukirchen, 1972).
a
1. Cf. W. F. Albright, Archaeology and the religion of Israel, 2 ed., Baltimore. 1966, pp. 71-2; M. J. Dahood, “Ancient
Semitic deities in Syria and Palestine”, em S. Moscati (ed.), Antiche divinità semitiche, Roma, 1958, pp. 65- 94, esp. p. 70; R.
A. Oden, “The persistence of Canaanite religion”, Biblical Archaeologist 39 (1976), pp. 31-6; P. C. Craigie, “Ugarit, Canaan
and Israel”, Tyndale Bulletin 34 (Cambridge, 1983), pp. 145-67.
2. Para duas visões opostas, ver John Gray, “The god Yaw in the religion of Canaan”, Journal ofNear Eastem Studies 12
(Chicago, 1953), pp. 278-83, e Garbini, op. cit., pp. 57-8. Gray cita os estudiosos que originalmente identificaram Yaw a
Yahweh, mas rejeita a identificação. Garbini a rearfirma. Redford, op. cit.,
p. 272, sustenta que Yahweh foi adorado pela primeira vez pelos proto-israelitas em Edom.
1. Deuteronômio 33:26.
2. Salmo 29:3,10; e cf. Salmo 93. Sobre a relação entre Ba’al e Yahweh. ou sobre a luta de Yahweh com as águas do
caos: H. G. May, “Some cosmic connotations of Mayim Rabbim, ‘Many Waters’”, jbl 74 (1955), pp. 9-21; R. Rendtorff,
“Kult, Mythos und Geschichte im alten Israel” (1958) e “El, Ba’al und Yahwe” (1966), in idem, Gesammelte Studien zum
Alten Testament, Munique, 1975, pp. 121-9, 277-92; O. Eissfeldt, “Das Chãos in der biblischen und in der phõnizischen
Kosmogonie”, in idem, Kleine Schriften, vol. 2, Tübingen, 1963, pp. 258-62; idem, “Gott und das Meer”, in idem, Kleine
Schriften, vol. 3, Tübingen, 1966, pp. 256-64; B. W. Anderson, Creation versus chãos: The reinterpretation of mythical
symbolism in the Bible, Nova York, 1967 (reimp. 1987), esp. pp. 99 ss.; M. Wakeman, God’s battle with the monster, Leiden,
1973, pp. 56-138; A. Lelièvre, “yhw et la mer dans les Psaumes”. r hpr 56 (1976), pp. 253- 75; A. H. W. Curtis. “The
‘subjugation of water’ motif in the Psalms: Imagery or polemic?”, jss 23 (1978), pp. 245-56; John Gray, The biblical doctrine
of the kingdom of God, Edinburgh, 1979, esp. pp. 39 ss.; J. Day, God’s conflict with the dragon and the sea: Echoes of
Canaanite myth in the Old Testament, Cambridge. 1985, esp. pp. 18 ss.; e, para o Salmo 29 em especial: Carola Kloos,
Yahweh’s combat with the sea: A Canaanite tradition in the religion of ancient Israel, Amsterdam e Leiden, 1986. J. Jeremias.
Das Kõnigtum Gottes, Gõttingen, 1987, esp. pp. 15-45. trata de adaptações israelitas do mito de Ba’al.
3. Para um bom resumo dos argumentos sobre a entronização ritual de Yahweh — desde S. Mowinckel, Psalmenstudien
II, Das Thronbesteigungsfest Jahwüs, Kristiana, 1922 —, ver Gray, op. cit., pp. 7-38. W. R. Mi liar, Isaiah 24- 27 and the
origin of apocalyptic, Missoula, 1976, esp. pp. 91 ss. detecta uma celebração da vitória de Yahweh sobre forças hostis.
4. Gênesis 1:7,9.
(10) Salmo 74:13-4.
Sobre Yahweh como deus da guerra: G. von Rad, Der heilig Krieg im alten Israel, Zurique, 1975 (trad. ing., Grand
Rapids, eu a, e Leominster, gb, 1991); R. Smend, Jahwerkrieg und Stammebund. Erwagungen zur àltesten Geschichte Israéis,
Gõttingen, 1963; F. Stolz, Jahwes und Israéis Kriege. Kriegstheorien und Kriegserfahrungen des alten Israel, Zurique, 1972;
M. Weipert, ‘“Heiliger Krieg’ in Israel und Assyrien: kritische Anmerkungen zu Gerhard von Rads Konzepl des ‘Heiligen
Krieg’ im alten Israel”, za v 84 (1972), pp. 460-93, esp. pp. 488-90; F. M. Cross, Canaanite myth and Hebrew epic: Essays on
the history of the religion of Israel, Cambridge, Mass., 1973, pp. 91-
111 (“The divine warrior”); P. D. Miller, The divine warrior in early Israel, Cambridge, Mass., 1973; Hans Heinrich Schmid,
“Heiliger Krieg und Gottesfrieden im Alten Testament”, em Altorientalische Welt in der alttestamentlicher Theologie, Zurique, 1974,
pp. 91-120; Sa-Moon Kang, Divine war in the Old Testament and the Ancient Near East, Berlim, 1987. A. van der Lingen, Les guerres
de Yahvé, Paris, 1990, sustenta que a terminologia da guerra santa remonta ao exílio, mais do que à história inicial de Israel, e foi
inspirada pela esperança de libertação. Essa reinterpretaçâo radical ainda precisa ser avaliada, mas pode se revelar fecunda.
Deuteronômio 33:2.
Habacuc 3:8 ss.; cf. Ezequiel 29:3-5; também Day, op. cit., pp. 105-9.
Sobre El em diversas culturas do Oriente Medio: F. Stolz, Strukturen und Figuren im Kult von Jerusalem, Berlim,
1970, pp. 126-80. Para várias concepções sobre o relacionamento entre El e Yahweh: O. Eissfeldt, “El and Yahweh”, jss 1
(1956), pp. 25-37; idem, “Jahwe, der Gott der Vàter”, Theologische Literaturzeitung 88 (Leipzig, 1963), cols. 482-90; F. M.
Cross, “Yahweh and the god of the patriarchs”, h tr 55 (1962), pp. 225-59; R. Rendtorff, “El, Ba’al und Jahwe”, za v 78
(1966), pp. 277-92; J. J. M. Roberts, “The Davidic origin of the Zion tradition”, jbl 92 (1973), pp. 329-44; E. Otto, “El und
Jhwh in Jerusalem. Historische und theologische Aspekte einer Religionsintegration”, v t 30 (1980), pp. 316-29; J. van Seters,
‘The religion of the patriarchs in Genesis”, Biblica 61 (Roma, 1980), pp. 220-3; M. Barker, The great angel. A study of
Israel*s second god, Londres, 1992, argumenta enfaticamente que El e Yahweh foram primeiro fundidos durante o exílio, nas
profecias do Segundo Isaías. Se isto for correto, teria de ser modificada a concepção aqui expressa e refeita a datação dos
salmos nos quais ela se baseia. A argumentação geral do capítulo, porém, não seria afetada.
Salmo 29:10. Sobre Yahweh como rei no monte Sião: J. J. Roberts, “Zion in the theology of the Davidic-Solomonic
empire”, em T. Ishida (ed.), Studies in the period ofDavid and Solomon, Tóquio, 1982; B. C. Ollenburger, Zion, the city ofthe
great king, Sheffield, 1987. Sobre a relação entre o monte Sião e o monte Zafon: R. J. Clifford, The cosrnic mountain in
Canaan and the Old Testamento Cambridge, Mass., 1972, pp. 141 ss.
Cf. Ollenburger, op. cit., pp. 53-80; D. G. Johnson, From chãos to restoration. An integrative reading of Isaiah 24-7,
Sheffield, 1988, p. 45.
Sobre o templo de Salomão: Clements, op. cit.; Jonathan Z. Smith, “Earth and gods”, Journal of Religion 49 (Chicago,
1969), pp. 103-27, esp. pp. 111 ss.; Keel, op. cit., cap. 3 (pp. 112-76); M. Barker, The gate of heaven. The history and
symbolism of the ternple in Jerusalem, Londres, 1991. M. Haran, Temples and temple-service in ancient Israel, Oxford, 1978,
preocupa-se sobretudo com o período pós-exílio e o Segundo Templo, mas o cap. 13 (pp. 246-59) tem alguma relevância para
o templo de Salomão.
Cf. Clements, op. cit., pp. 65 ss.; H. H. Rowley, Worship in ancient Israel, Londres, 1967, p. 82.
li Samuel 7:16. (29) Salmo 89:4,36.
Salmo 89:25, trad. comentada de Cross, em Canaanite rnyth and Hebrew epic, pp. 261-2.
Sobre a relação entre a concepção israelita da monarquia e do templo e a de outros povos do Oriente Próximo, ver M.
Weinfeld, ‘*Zion and Jerusalem as religious and political capital”, em R. E. Friedman (ed.), The poet and the historian, Chico,
Cal., 1983. Sobre o rei de Judá como representante de Yahweh: S. Mowinckel, The Psalms in IsraeVs worship, vol. 1, Oxford,
1962, pp. 50-5, 67- 8; A. R. Johnson. Sacral kingship in ancient Israel, Cardiff, 1967, esp. pp. 4-29,
103 ss.; idem, The cultic prophet and Israéis psalmody, Cardiff, 1979, esp. pp.
65. 76, 83; J. H. Eaton, Kingship and the Psalms, Londres, 1976, esp. pp. 135-8, 141-9, 155-68; Keel. op. cit., cap. 5 (pp. 244-
306).
Ver R. A. Rosenberg, “The god Sedeq”, huc a 3 (1965), pp. 161-77. Trechos relevantes na Bíblia: Salmo 89:14; Isaías
45:8,19.
Para o que vem a seguir, ver Deuteronômio 8:15; Números 20:5; Isaías 34:9-15; Isaías 27:1; Salmos 46 e 89; Jeremias
4:11 ss.; e cf. Joh. Pedersen, Israel, its life and culture, vol. 2, Londres, 1926, cap. “The world of life and death” (pp. 453);
Keel, op. cit., cap. 2 (pp. 62-109); Robert Murray, “Prophecy and cult”, em R. Coggins et al., Israéis prophetic tradition:
Essays in honour ofPeter R. Ackroyd, Cambridge, 1982, pp. 200-16, esp. pp. 210-4.
Cf. K. Spronk, Beatific afterlife in ancient Israel and the ancient Near East, Kevelaere Neukirchen-VIuyn, 1986.
1. O EXÍLIO E O PÓS-EXÍLIO (pp. 188-214)
1. Sobre a tradição do “Yahweh sozinho”: Morton Smith, Palestinian parties and polities that shaped the Old Testament,
Nova York e Londres, 1971
(reimp., Londres, 1987), esp. cap. 2; M. Rose, Ausschliesslichkeitsanspruch Jahwes: Deuteronomistische Schultheologie und
die Volksfròmmigkeit der spaten Kônigszeit, Stuttgart, 1975; F. Stolz, “Monotheismus in Israel”, em O. Keel (ed.), Monotheismus im
alten Israel und seiner Umwelt, Fribourg (Suíça), 1980, esp. pp. 163-72; os ensaios de B. Lang e H. Vorlànder, em B. Lang, Der
einzige Gott: Die Geburt des biblischen Monotheismus, Munique. 1981, intitulados, respectivamente, ‘‘Die Jahwe-Allein-Bewegung”
(esp. pp. 55-7, 73) e “Der Monotheismus Israéis ais Antwort auf die Krise des Exils” (esp. pp. 98-102).
(2) Sobre o politeísmo israelita em geral, ver, por exemplo, G. W. Ahlstrom, Aspects of syncretism in Israelite religion, Lund,
1963; idem, Royal administration andnational religion in Palestine, Leiden, 1982, pp. 82-3; J. A. Soggin, “Der offiziell gefõrderte
Synkretismus in Israel wàhrend des zehnten Jahrhunderts”, za v 78 (1966), pp. 179-204; Mark C. Smith, The early history of God:
Yahweh and otherdeities in ancient Israel, San Francisco, 1990. Para o culto israelita de Asera, ver S. M. Olyan, Asherah and the cult
of Yahweh in Israel, Atlanta, 1988;
120. Para a seqüência de divindades menores relacionadas a Yahweh — as “hostes celestes” —, ver W. Herrmann, “Die
Gottersõhne”, Zeitschrift für Religions- und Geistesgeschichte 12 (Colônia, 1960), pp. 247-51, e E. T. Mullen, The divine council in
Canaanite and early Hebrew literature, Chico, Cal., 1980, esp. pp. 186 ss. Os papiros encontrados na colônia militar israelita em
a
Elefantina, no Alto Egito, também contêm indícios de politeísmo; ver E. Meyer, Der Papyrusfund von Elephantine, 3 ed., Leipzig,
1912, esp. pp. 38 ss.; A. Vincent, La religion des judéo-araméens à Elephantine, Paris, 1937, esp. pp. 562 ss.; B. Porten, Archives from
Elephantine; the life ofan ancient Jewish military colony, Berkeley, 1968. Porém, em que medida o politeísmo estava disseminado é
uma questão ainda em debate. Alguns estudiosos sustentam que os indícios onomásticos revelam que foi menos importante do que
sugere a Bíblia; ver J. H. Tigay, You shall have no other gods, Atlanta, 1986; J. D. Fowler, Theophoric personal names in ancient
hebrew, Sheffíeld, 1988 (jso t, sup. 49). Por sua vez, o significado desses indícios também foi questionado; ver Olyan, op. cit., pp. 35
ss.
(4) Cf. R. C. Dentan, The knowledge of god in ancient Israel, Nova York, 1968, pp. 46, 147, 179; Morton Smith, Palestinian
parties, pp. 43-4.
Sofonias 1:4-6.
Deuteronômio 7:6-8 e 5:7-10. Sobre a origem relativamente tardia, no Deuteronômio, da idéia de pacto: L. Perlitt,
Bundestheologie im Alten Testament, Neukirchen-Vluyn, 1969; E. Kutsch, Verheissung und Gnade. Vntersuchungen zum
sogenannten Bund’ im Alten Testament, Berlim e Nova York, 1973.
Para as expectativas israelitas e judaicas de uma consumação gloriosa, ver, além das obras sobre profecia relacionadas
na nota anterior: R. H. Charles (ed.), Eschatology, Nova York, 1963 (reimp. de The doctrine of a future life in Israel, in
a
Judaism and in Christianity: A criticai history, I ed., 1898-9); H. Gressmann, Der Messias, Gòttingen, 1929; J. Klausner, The
a
messianic idea in Israel (trad. da 3 ed. em hebraico), Londres, 1956; S. Mowinckel, He that cometh (trad. da ed. em sueco de
1951), Oxford, 1956; C. Ryder Smith, The biblical doctrine of the hereafter, Londres, 1958; S. Herrmann, Die prophetischen
Heilserwartungen im Alten Testament, Stuttgart, 1965; Hans-Peter Müller, Ursprünge und Strukturen alttestamentlicher
Eschatologie, Berlim, 1969; H. D. Preuss (ed.), Eschatologie im Alten Testament, Darmstadt, 1978 (coletânea de ensaios);
John Gray, The biblical doctrine of the reign of God, Edinburgh, 1979;
J. Becker. Messianic expectation in the Old Testament (trad. da ed. em alemão de 1977), Edinburgh, 1980; C. Westermann,
Prophetische Heilsworte im Alten Testament, Gõttingen, 1987 (trad. ing., Basic forms of prophetic speech, Londres, 1991). D. E.
Gowan, Eschatology in the Old Testament, Edinburgh, 1987, procura relacionar essa escatologia às expectativas de épocas posteriores,
inclusive a nassa.
H. D. Preuss, Jahweglaube und Zukunftsemartung, Stuttgart etc., 1968. oferece uma interpretação diametralmente oposta
àquela apresentada nestas páginas.
J. Blenkinsopp, A history of prophecy in Israel. From the settlement in the land to the Hellenistic period, Londres, 1984. Entre
os estudos recentes importantes incluem-se R. R. Wilson, Prophecy and society in ancient Israel, Filadélfia, 1980;
R. Coggins et al. (eds.), IsraePs prophetic tradition, Cambridge, 1982; e, sobre a recepção e rejeição da profecia, R. P. Carroll,
When prophecy failed: Reactions and responses to failure in the Old Testament prophetic traditions, Lxmdres, 1979. Para o trecho
sobre os povos e o mar: Isaías 17:12.
Jeremias 4:23-5.
Sobre a profecia em geral no período do exílio, ver, além das passagens relevantes nas obras relacionadas acima: S. B.
Frost, Old Testament Apocalyptic, Londres. 1952; P. R. Ackroyd, Exile and restoration: A study of Hebrew thought in the
sixth century BC, Londres, 1968, esp. caps. 5, 7 e 8.
Sobre as condições durante o exílio: Ackroyd, op. cit., caps. 2 e 3; E.
J. Bickerman, “The generation of Ezra and Nehemiah”, Proceedings of the American Academy for Jewish Research 45
(Filadélfia, 1978), pp. 1-18, esp. pp. 17-8. Sobre a percepção do exílio como caos: Jonathan Z. Smith, op. cit. (ver
nota 26 do cap. 7), pp. 118 ss.; A. J. Wensinck, em Verhandelingen der Koninklijke Akademie van Wetenschapen, Afd.
Letterkunde, Amsterdam, nova série, 19 (1919), esp. pp. 51 ss.
Entre os comentários relativamente recentes sobre Ezequiel incluem-se os de D. M. G. Stalker (Londres, 1968); W.
Zimmerli (Neukirchen-Vluyn, 1969); J. W. Wevers (Londres, 1969, New Century Bible); W. Eichrodt ( (trad. da ed. alemà de
1965-6] Londres, 1970); K. M. Carley (Cambridge, 1974). Para um comentário resumido: J. Muilenberg, em Peake,
Commentary on the Bible, ed. rev., 1962, pp. 568-90. Particularmente importante para a presente argumentação são: D.
Baltzer, Ezechiel und Deuterojesaja. Berührungen in der Heilsenxartung der beiden grasse n Exilspmpheten, Berlim, 1971; T.
M. Ritt, A theology of exile: Judgment/Deliverance in Jeremiah and Ezekiel, Filadélfia, 1977.
Ezequiel 20:40.
66 estão os de C. R. North (Oxford, 1964); G. A. F. Knight (Nova York e Nashville, 1965); C. Westermann (trad. ing.,
Londres, 1966); R. N. Whybray (Londres, 1967, New Century Bible); J. McKenzie (Garden City, Nova York, 1968, Anchor Bible); A.
S. Herbert (Cambridge, 1975, Cambridge Commentary to the New English Bible); H. D. Preuss (Neukirchen-Vluyn, 1976). Nem todos
os estudiosos concordam que Isaías 44-55 tratava originalmente do retomo dos deportados; cf. C. C. Torrey, The Second Isaiah. A new
interpretaíion, Edinburgh, 1928; J. D. Smart, History and theology in Second Isaiah, Londres, 1965; J. M. Vincent, Studien zur
literarischen Eigenart und zur geistigen Heimat von Jesaja, Kap. 40-50, Frankfurt; J. H. Eaton, Festal drama in Deutero-lsaiah,
Londres, 1979. Suas dúvidas podem se revelar justificadas; mas, seja qual for a origem do texto, continua sendo verdade que a
interpretação hoje em geral aceita já o era também no início do período pós-exílico.
Isaías 45:4 (e cf. os três versículos anteriores); 44:28. Duas interessantes, mas controversas, interpretações do contexto
político imediato da composição de Isaías 40-55 são: Sydney Smith, Isaiah XL-LV: Uterary criticism and history, Londres,
1944; e Morton Smith, “li Isaiah and the Persians”, ja os 83 (Boston, 1963), pp. 415-21. Por outro lado, os céticos relacionados
na nota 24 consideram as referências a Ciro como interpolações.
Cf. H. Wildberger, “Der Monotheismus Deuterojesjas*’, em H. Donner et al. (eds.), Beitrüge zur alttestamentlichen
Theologie: Festschrift für Walther Zimmerli, Gõttingen, 1977, pp. 506-30; e H. Võrlander, op. cit. (ver nota 1 acima), pp. 93
ss. Até mesmo Margaret Barker, que tanto fez para demonstrar a importância do politeísmo na religião israelita, aceita o
monoteísmo do Segundo Isaías; segundo a autora, ele o alcançou ao identificar Yahweh a El (cf. The Older Testament, pp. 167
ss.; The great angel, pp. 17 ss.
Miquéias 4:5.
Juízes 11:24.
(29) Isaías 45:5; 46:10-1; cf. 43:10 e 44:6,8.
Ibid. 40:4. Cf. Wensinck, op. cit., pp. 52-3. (Ver nota 17 deste capitulo.)
Isaías 55:12.
Ibid. 40:5. Para similaridades e diferenças entre as expectativas de Ezequiel e do Segundo Isaías, ver Baltzer, op. cit.
(Ver nota 18 deste capítulo.)
Isaías 42:13. Cf. F. M. Cross, Canaanite myth and Hebrew epic: Essays in the history of the religion of Israel,
Cambridge, Mass., 1973, pp. 105-10 (no cap. “The divine warrior”); P. D. Miller, The divine warrior in early Israel,
Cambridge, Mass., 1973, pp. 135-42.
Isaías 54:10. (39) Ibid. 51:3,6.
(40) Para uma exposição intransigente da concepção tradicional, ver P.-E. Bonnard, Le Second Isaie, ses disciples e leur
édileurs, Paris, 1972. A concepção adotada nesse capítulo, isto é, a de que o Segundo Isaías não tinha objetivos ou interesses
universalistas, não é nada original. Foi defendida, por exemplo, por N.
H. Snaith, ‘The servant of the Lord in Deutero-lsaiah”, em H. H. Rowley (ed.), Studies in Old Testament prophecy, presented
to professor The odore H. Robinson, Edinburgh, 1950, pp. 186-200; P. A. de Boer, Second Isaiah’s message, Leiden, 1956. pp. 92-
110; R. Martin-Achard. Israel et les nations, la perspective missionnaire de TAncien Testament, Paris. 1959, pp. 8-31 (trad. ing., A
light to the nations, Londres e Edinburgh. 1962); N. F. Snaith, Isaiah 40-66, A study in the teaching of Second Isaiah and its
consequences, e H. M. Orlinsky, Studies on the second part of the Book of Isaiah, ambos em v t s 14 (1967); R. N. Whybray, Isaiah
40-66, Londres, 1967, introd., pp. 31-2, e no comentário passim; D. E. Hollemberg, “Nationalism and ‘the nations’ in Isaiah x l -l v ‘\ v
t 19 (1969). pp. 23-36; A. Schors. I am God Your Saviour; A form-critical study of the main genres in Isaiah XL-LV, Leiden, 1973 (v t
s 24); F. Holmgren, With wings as eagles. Isaiah 40-55. An interpretation, Nova York, 1973. As duas linhas mencionadas no presente
texto são as duas últimas de Isaías 49:6.
Sobre a datação dos acréscimos e das interpolações no Livro de Isaías, além dos caps. 40-50, ver O. Eissfeldt, The Old
a
Testament: An introduction (trad. da 3 ed. alemã), Oxford, 1965, pp. 318-9, 323-7, 342-6; e G. Fohrer, introduction to the
Old Testament (trad. do alemão), Londres, 1970, pp. 369, 372, 385, 388. Snaith, Isaiah 40-66, pp. 139-46, argumenta que os
capítulos 60-2 são do Segundo Isaías. Para comentários sobre Isaías 56-66, ver Westermann, Whybray, Herbert (nota 24 deste
capítulo).
Sobre a profecia pós-exílica em geral, ver, além das obras relacionadas
a
na nota 13 deste capítulo: O. Plõger, Theocracy and eschatology, Oxford, 1968 (I ed. alemã, 1959); P. D. Hanson, The dawn
of the apocalyptic: The historical and sociological roots ofJewish apocalyptic eschatology, Filadélfia, 1975; R. P. Carroll, “Second
Isaiah and the failure of prophecy”, Studia Theologica 32 (Lund, 1978), pp. 119-31.
Ibid. 11:6-9. Alguns estudiosos continuam a atribuir essa passagem ao profeta Isaías do século viu a.C, mas a posição
tomada aqui, de que se trata de uma interpolação posterior ao exílio, está se tomando cada vez mais aceita; ver, por exemplo,
a
O. Kaiser, Das Buch des Propheten Jesaja Kapitel 1-12, 5 ed., Gõttingen. 1981, pp. 240-7 (vol. 17 de Das Alte Testament
Deutsch; trad. ing., Isaiah 1-12, Londres, 1983); e Eissfeldt, The Old Testament, pp. 317-8.
Zacarias 2:5. (51) Joel 2:27-9.
(63) Segundo outra concepção, os ímpios eram, ao contrário, para aqueles que nunca haviam deixado Judá, os exilados que
retomavam — tanto os exilados em geral, como argumenta M. Barker, The Older Testament, Londres, 1987, pp. 212 ss., quanto os
sacerdotes zadoquitas em particular, como propõe Hanson em The dawn ofthe apocalyptic. Para um apoio ao argumento de Hanson,
embora com restrições, ver a resenha de R. P. Carroll, “Twilight of prophecy or dawn of apocalyptic?”, jso t 14 (1979), pp. 3-39. A
concepção expressa no presente capítulo, por outro lado, coincide com a de Ina Willi-Plein, na resenha que fez do livro de Hanson em
v t 29 (1979), pp. 122-7.
1. Sobre a história dos judeus no período em relevo, ver E. Schürer, The history of the Jewish people in the age of Jesus
a a
Christ (175 BC—AD 135) (trad. da 3 e da 4 eds. alemãs), completamente revisado e atualizado por G. Vermes e
F. Millar, 3 vols., Edinburgh, 1973-87; e, de maneira mais resumida: D. S. Russell, The Jews from Alexander to Herod,
Londres, 1967; H. Jagersma, A history’ of Israel from Alexander the Great to Bar Kochba, Londres, 1985. Sobre o helenismo e suas
consequências para os judeus da Palestina: V. Tcherikover, Hellenistic
civilization and the Jews, Filadélfia e Jerusalém, 1959; M. Hengel, Judaism and hellenism: Studies in their encounter in
a
Palestine during the Early Hellenistic Period (trad. da 2 ed. alemã), 2 vols., Londres e Filadélfia, 1974 (o vol. 2 traz o aparato
crítico); F. Millar, “The background of the Maccabaean revolution: Reflections on Martin Hengefs Judaism and hellenism”, jjs 29
(1978), pp. 1-21;
Momigliano, Alien wisdom: The limits of hellenisation, Cambridge, 1975, e Nova York, 1976. Para um relato mais
breve: Schürer, op. cit., vol. 1, pp. 125 ss.
1. Obras sobre o pensamento apocalíptico judaico e o do início do cristianismo em geral, em ordem de publicação: H. H.
a
Rowley, The relevance of apocalyptic, 1944 (3 ed. rev., 1964); J. Bloch, On the apocalyptic in Judaism, Filadélfia, 1952; D.
S. Russell, The method and message ofJewish apocalyptic,
200 BC—AD 100, Londres, 1964; J. D. Schreiner, Alttestamentlich-jüdische Apokalyptik: Eine Einführung, Munique. 1969; W.
Schmithals, The apocalyptic movement. Introduction and interpretation, Nashville, 1975 (trad. do alemão, 1973); M. E. Stone,
Scriptures. Sects and visions, Filadélfia, 1980; G. W. E. Nickelsburg, Jewish literature between the Bible and the Mishnah, Londres,
1981;
C. Rowland, The open heaven. A study in apocalyptic in Judaism and early Christianity, Londres, 1982; J. J. Collins, The
apocalyptic imagination: An introduction to the Jewish matrix of Christianity, Nova York, 1984.
Dentre a vasta quantidade de artigos, os seguintes são especialmente relevantes: P. Vielhauer, “Apocalypsen und Venvandtes”,
introdução a E. Hennecke & W. Schneemelcher. Neutestamentliche Apokryphen, vol. 2, Tübingen, 1964. pp. 408-27 (também na ed.
ing. de 1963); W. R. Murdock, “History and revelation in Jewish apocalypticism”, Interpretation. A Journal of Bihle and Theology 21
(Union Theological Seminary, Virginia, 1967), pp. 167-87; dois artigos em R.
W. Funk (ed.), Apocalypticism (Journal for Theology and Church, vol. 6), Nova York, 1969: H. Betz, “On the problem of the
religio-historical understanding of apocalyptic” (pp. 134-56), e F. M. Cross, “New directions in the study of apocalypticism” (pp. 157-
65); P. D. Hanson, “Jewish apocalyptic against its Near East environment”, Revue Biblique 78 (Paris, 1971), pp. 31-58; idem,
“Apocalypticism” e “Apocalypse, genre”, em Interpreteis dictionary of the Bible: Supplementary volume, Nashville, 1976, pp. 27-34;
a
idem, “An overview of early Jewish and Christian apocalypticism” (apêndice da 2 ed. de The dawn of apocalyptic, Filadélfia, 1979);
Hans-Peter Müller, “Mantische Weisheit und Apokalyptik”, v t s 22 (1972) (vol. do Congresso de Upsala de 1971), pp. 268-93; dois
ensaios em J. Maier & J. Schreiner (eds.), Literatur und Religion des Frühjudentums, Gütersloh, 1973: Karlheinz Müller, “Die Ansâtze
der Apokalyptik” (pp. 31-42), e J. Schreiner, “Die apokalyptische Bewegung” (pp. 214-53); os seguintes artigos de J. J. Collins:
“Apocalyptic eschatology as the transcendence of death”, cbq 196 (1974), pp. 5-22; ‘The symbolism of transcendence in Jewish
apocalyptic”, Biblical Research 19 (Chicago, 1974), pp. 5-22; “The court-tales in Daniel and the development of apocalyptic”, jbl 94
(1975), pp. 21-234; “Jewish apocalyptic against its Near East environment”, Bulletin of the American School of Oriental Research 220
(dez. 1975), pp. 27-36; “Cosmos and salvation. Jewish wisdom and apocalyptic in the Hellenistic age”, h r 17 (1977), pp. 121-42; “The
Jewish apocalypses”, em Collins (ed.), Apocalypse: The
morphology of a genre (Semeia, 14), Missoula, 1979, pp. 21-60; dois artigos em
F. M. Cross et al. (eds.), Magnalia Dei: The mighty acts of God. Essays [...] in memory ofG. E. Wright, Garden City, NY,
1976: P. D. Hanson. “Prolegomena to the study of Jewish apocalyptic” (pp. 389-413), e M. E. Stone, “Revealed things in apocalyptic
literature” (pp. 414-52).
judaico em um contexto mais amplo, tanto em termos históricos como geográficos; aquelas de J. Carmignac, J. C. H. Lebram,
M. Philonenko, K. Koch, E. P. Sanders e H. Stegemann são. além do mais, particularmente relevantes para o presente capítulo. Outros
artigos importantes serão encontrados nas seguintes coletâneas: L. Monloubou (ed.), Apocalypse et théologie de Tespérance, Paris,
1977; M. Philonenko & M. Simon (eds.), Études d’histoire des religions, vol. 3: L’apocalyptique, Paris, 1977.
O avanço dos estudos nesse campo é examinado até o final da década de 1940 em Johann M. Schmidt, Die jüdische
Apokalyptik. Die Geschichte ihren Erforschung von den Anfangen bis zu den Texfunden von Qumran. Neukirchen-Vluyn, 1969; até a
década de 1960, em Klaus Koch, Ra tios vor der Apokalyptik, Gütersloh, 1970 (trad. ing.. The rediscovery of the apocalyptic, Londres,
1972); e até o final da década de 1970, em M. Delcor, “Bilan des études sur 1*apocalyptique”, em Monloubou, op. cit., pp. 27-42; em
J. Barr, “Jewish apocalyptic in recent scholarly study”, Bulletin of the John Rylands Library 58 (Manchester, 1976), pp. 9-35; em R. J.
Bauckham, ‘The rise of apocalyptic”, Themelios, nova série, 3, 2 (Londres, 1978), pp. 10-23; e em M. A. Knibb, “Prophecy and the
emergence of Jewish apocalyptic”, em R. Coggins et al. (eds.), Israéis prophetic tradition: Essays in honour of Peter R. Ackroyd,
Cambridge, 1982, pp. 155-80, que inclui uma bibliografia abrangente. Para outras referências bibliográficas, verG. Delling (ed.),
a
Bibliographie zurjüdisch-hellenistischen und intertestamentarischen Literatur 1900-1965, Berlim, 1969 (2 ed.. 1975), e J. H.
Charlesworth, The Pseudepigrapha and modem research, Missoula, 1976, pp. 66-8. Levantamentos mais gerais do desenvolvimento
do judaísmo no período em foco, mas que dão considerável atenção ao pensamento apocalíptico, são W. Bousset, Die Religion des
Judentuns im spathellenistischen Zeitalter, 3” ed., rev. por H. Gressmann, Tübingen. 1926; P. Grélot, Lespérance juive à I ‘heure de
Jesus, Paris, 1978; D. E. Gowan, Bridge between the Testaments: A reappraisal of Judaismfrom the exile to the birth of Christianity,
a
2 ed., Pittsburgh, 1980; e o vol. 2 de Schürer/Vermes/Millar, esp. pp. 448 ss. Embora notável em sua época, P. Volz, Die
a
Eschatologie der jüdischen Gemeinde im neutestamentlichen Zeitalter, Tübingen, 1934 (I ed., 1903), é irremediavelmente obsoleta
em sua abordagem assim como em suas afirmações factuais.
1. O modo pelo qual os antigos judeus consideravam o tempo, a tradição, a personalidade e a inspiração parece ter tido
algo a ver com a questão; cf. Russell, op. cit., pp. 158-73.
2. Daniel 10:4,14. Sobre os anjos e suas funções, ver o verbete “Angels
H. B. Kuhn, “The angelology of the non-canonical Jewish apocalypses”, jbl 67 (1948), embora superado em parte por estudos
mais recentes da problemática apocalíptica, continua sendo útil.
Cf. H. P. Müller. op. cit.; idem, “Magisch-mantische Weisheit und die Gestal Daniels”, uf 1 (1969), pp. 79-94;
Bauckham, op. cit., pp. 13-7; Collins, ‘The court-tale in Daniel”. A abordagem mais recente é também a mais exaustiva: H. S.
Kvanig, Roots of apocalyptic. The Mesopotamian background of the Enoch figure and of the Son of Man, Neukirchen-Vluyn,
1988.
É possível que os autores dos apocalipses também tenham se baseado em tradição israelita esotérica, transmitida por
meios dos quais nada sabemos; cf. M. Barker, The Older Testament. The survival of themes from the ancient royal cult in
sectarian Judaism and early Christianity, Londres, 1987.
Para a Crônica demótica: C. C. McCown, “Hebrew and Egyptian apocalyptic literature”, h tr 18 (1925), pp. 357-411,
com tradução na p. 389. Para o Oráculo do oleiro: L. Koenen, “The prophecies of a potter: A prophecy of worldrenewal
becomes an apocalypse”, em D. H. Samuel (ed.), Proceedings of the Twelfth International Congress of Papyrology, Toronto,
1970, pp. 249-54. Para os Oráculos de Hystaspes: H. Windisch, Die Orakel des Hy st aspes, Amsterdam, 1929; e cf. F.
Cumont, ‘‘La Fin du monde selon les mages occidentaux”, r h r 103 (1931), pp. 29-96, esp. pp. 64 ss. Ver também Hengel, op.
cit., vol. 1, pp. 184-6, e as referências bibliográficas no vol. 2, pp. 124-5.
Estudos relativamente recentes do Livro de Daniel e comentários sobre ele são os de E. W. Heaton (Londres, 1956); N.
W. Porteous (Londres, 1965); M. Delcor (Paris, 1971); A. Lacocque (Neuchâtel e Paris, 1976; trad. ing., Atlanta,
1979); R. Hammer (Cambridge, 1976, na coleção The Cambridge Bible Commentary); L. F. Hartman & A. A. Di Lella
(Garden City, ny, 1978, com um volume da Bíblia da Anchor); J. Lebram, ‘‘Daniel/Danielbuch und Zusàtze”, em
S. Schwertner (ed.), Theologische Realenzyklopadie, vol. 8, Berlim e Nova York, 1981, pp. 325-49. K. Koch, T. Niewisch & J.
Tubach. Das Buch Daniel, Darmstadt, 1980, fazem um levantamento do estado dos conhecimentos até a data.
vision ofthe Book of Daniel, Missoula, 1977; P. Grelot, ‘‘Histoire et eschatologie dans le livre de Daniel”, em Monloubou, op.
cit., pp. 63-109 (ver nota 2 deste capítulo); P. R. Davies, “Eschatology in the Book of Daniel”, jso t 17 (1980), pp. 33-53.
Sobre a relação entre Daniel 2 e outras abordagens do tema: Eduard Meyer, Ursprung undAnfànge des Christentums,
vol. 2, Stuttgart e Berlim, 1921, pp. 189-91; H. H. Rowley, Darius the Mede and the Four World Empires in the Book of
Daniel, Cardiff, 1935; J. W. Swain, “The theory of the four monarchies: Opposition history under the Roman empire”,
Classical Philology 35 (Chicago, 1940), pp. 1-21, esp. pp. 9-11; D. Flusser, “The four empires in the Fourth Sibyl and in the
Book of Daniel”, Israel Oriental Studies, vol. 2, 1972, pp. 148-75; J.
J. Collins, “The place of the Fourth Sibyl in the development of Jewish Sibyllina”, jjs 25 (1974), pp. 365-80; idem, Apocalyptic
vision, pp. 36-46; G. F. Hasel, “The four world empires of Daniel 2 against the Near East environment”, jso t 12 (1979), pp. 17-30.
Como indica Hasel, a relevância do texto babilónico conhecido como Profecia dinástica é no mínimo duvidosa. Por outro lado, há
extraor
dinária semelhança entre o sonho de Nabucodonosor e aquele atribuído a Zoroastro em dois comentários pálavi em um texto
perdido, o Vahman Yasht. Também no sonho de Zoroastro, cada um dos quatro períodos (mas não impérios) é simbolizado por um
metal, e o quarto, “liga de ferro”, é de longe o pior. Além do mais, esse quarto período deve terminar mil anos depois de Zoroastro, ou
seja, com o aparecimento do primeiro saoshyant. Para os comentários em pálavi, ver
T. Anklesaria, Zand-i Vohuman Yasn. Bombaim, 1957, caps. 1, 3 e 4. Há tradução mais antiga em The Sacred Books
ofthe East, vol. 5, Oxford, 1880, pp. 191 -3, e vol. 37. Oxford, 1891, pp. 18 ss.
Daniel 7:7-8.
Salmo %: 12-3; Zacarias 14:5; Joel 4:12.
Cf. Collins, Apocalyptic vision, pp. 99-104; G. R. Beasley-Murray, “The interpretation of Daniel 7”, cbq 45 (1983),
pp. 44-58.
Cf. Russell, op. cit., pp. 244-9; G. B. Caird, Principalities andpowers, Oxford, 1956, pp. 4-6.
Daniel 8:10-1; ecf. Jó 38:7. Ver também Delcor, op. cit., p. 173; J. J. Collins, “The Son of Man and the Saints of the
Most High in the Book of Daniel”, jbl 93 (1974), parte 1, pp. 50-66.
Cf. A. S. Palmer, “The fali of Lucifer”, Hibbert Journal 11 (Londres, 1913), pp. 766-86, esp. pp. 772-3;
Bousset/Gressmann, op. cit., pp. 322-3.
Cf. O. Morkholm, Studies in the coinage of Antiochus IV of Syria, Copenhague, 1963, pp. 57 ss.; A. Hultgard,
Leschatologie des Testaments des Douze Patriarches, vol. 1, Upsala, 1977, pp. 330-1, e ilustração oposta à p. 336;
J. G. Bunge, “Antiochus-Helios.’ Methoden und Ergebnisse der Reichspolitik Antiochus’ iv Epiphanies von Syrien im Spiegel
seiner Münzen”, Historia. Zeischrift fiir alte Geschichte 24 (Wiesbaden, 1975). pp. 164-88.
Sobre o Filho do Homem em Daniel: A. Caquot, em Semítica 17 (Paris, 1967), pp. 37-71, e M. Casey, The Son ofMan,
Londres, 1979, pp. 30 ss., incluem levantamentos das várias interpretações propostas até aquelas datas. Para o Filho do
Homem como ser humano, ver, por exemplo, H. Schmid, “Daniel, der Menschensohn”, Judaica 27 (Zurique, 1971), pp. 192-
220. Hartman & Di Lella, op. cit. (ver nota 8 deste cap.), pp. 97 ss., e Casey, op. cit., pp. 25 ss., interpretam o Filho do Homem
como um símbolo para os judeus devotos. Lacocque. op. cit., e Collins, The apocalyptic vision in the Book of Daniel, em The
apocalyptic imagination, e também em ‘The Son of Man and the Saints ofthe Most High in the Book of Daniel”, jbl 93 (1974),
o identificam a Miguel. Beasley-Murray, op. cit. (ver nota 13 deste cap.), pp. 55 ss., identifica-o ao Messias.
Daniel 7:14.
Alguns estudiosos consideraram os “santos” como sendo anjos: M. Noth, “The Holy Ones of the Most High”, em The
laws ofthe Pentateuch and other essays, Filadélfia, 1967, pp. 215-28 (o original alemão foi publicado em 1955); L. Dequeker,
em Ephemerides Theologicae Lovanienses 36 (Louvain, 1960), pp. 353-92; idem, “The ‘Saints of the Most High’ in Qumran
and Daniel”, Oudtestamentische Studien 18 (Leiden, 1973), pp. 108-87; J. Coppens, “La vision
daniélique du Fils d’Homme’\ v t 19 (1969), pp. 171-82; idem, “Le chapitre v ii de Daniel. Lecture et commentaire”,
Ephemerides Theologicae 54 (1978), pp. 310-22; Collins (ver nota 19 deste cap.).
As bases para a interpretação proposta neste capítulo — segundo a qual os “santos” são os judeus devotos — encontram-se em:
C. H. W. Brekelmans, em P.
A. H. de Boer (ed.), Oudtestamentische Studien 14 (1965), pp. 305-29; A. Caquot (1967), ver nota 10 deste cap.; R. Hanhart,
em v t s 16 (1967), pp. 90-101; A. Lenglet, em Bíblica 53 (1972), pp. 169-90; G. F. Hasel, em Bíblica 56 (1975), pp. 173-92; V. S.
Poythress, em v t 26 (1976), pp. 208-13. Hartman & Di Lella, Lacocque, Casey (ver notas 8 e 20) concordam. Koch et al., Das Buch
Daniel, p. 239, sugerem que a versão masorética deve ser traduzida como “os santos dos altíssimos”. A implicação seria a de que o
domínio do mundo deve ser atribuído aos judeus (devotos) em virtude de sua estreita conexão com os anjos, que constituem a categoria
mais elevada dos santos.
(26) Sobre o significado dessa profecia, ver G. W. E. Nickelsburg, Ressurection, immortality, and eternal life in
intertestamental Judaism, Cambridge. Mass., e Londres, 1977, pp. 18-27. Hoje parece improvável que Isaías 26:19 de fato remeta para
a passagem em Daniel; cf. D. G. Johnson, From chãos to restoration. An integrative reading oflsaiah 24-27, Sheffield, 1988, pp. 80-1.
1. Duas traduções confiáveis encontram-se agora disponíveis: M. A. Knibb, The Ethiopic Book of Enoch: A new edition
in the light ofthe Aramaic Dead Sea fragments, vol. 2, Oxford, 1978; e M. Black (com J. VanderKam e O. Neugebauer), The
Book of Enoch: A new English edition with commentary and notes, Leiden, 1985. Ambas substituíram aquela que foi por mais
a
de meio século a tradução de referência: R. H. Charles. The Book of Enoch, 2 ed. rev., Oxford, 1912. As citações neste
capítulo foram extraídas de Knibb.
Estudos relativamente recentes do I Enoque, ou de aspectos ou partes do mesmo (com exceção das “Similitudes”) : P. Grelot,
“La légende d’Hénoch dans les apocryphes et dans la Bible: origine et signification”, Recherches de la Science Religieuse 46 (Paris,
1958), pp. 5-26, 181-210; idem, “L^schatologie des Esséniens et le livre d’Hénoch”, r q 1 (1958), pp. 113-31; idem, “Hénoch et ses
écritures”, Revue Biblique 82 (1975), pp. 481-500; J. T. Milik, “Problèmes de la littérature hénochique à la lumière des fragments
araméens de Qumran”, h tr 64 (1971), pp. 333-78; idem, The Books of Enoch: Aramaic fragments of Qumran, cave 4, Oxford, 1976,
introdução; J. C. Greenfield & M. E. Stone, “The Books of Enoch and the traditions of Enoch”, Numen 6 (Leiden, 1979), pp. 89-103
(inclui crítica da datação de Milik); M. Black, “The fragments of the Aramaic
Enoch from Qumran”, em W. C. van Unnik (ed.), La littérature juive entre Tenach et Mischna, quelques problèmes
(Recherches bibliques 9), 1974, pp. 15-28; idem, ‘The new creation in I Enoch”, em R. W. A. McKinney (ed.), Creation, Christ
and culture, Edinburgh, 1976, pp. 13-21; M. E. Stone, “The Book of Enoch and Judaism in the third century bce “, cbq 40
(1978), pp. 479-92; idem, “Enoch and apocalyptic origins” (cap. 5 de seu Scriptures, sects and visions, Filadélfia, 1980);
L. Hartman, Looking for a meaning: A study ofl Enoch 1-5, Gleerup, 1979; J. H. Charlesworth, “The sn t s
Pseudepigrapha seminars at Tübingen and Paris on the Books of Enoch*’, n t s 25 (1979), pp. 315-23; D. Dimant, “The
biography of Enoch and the Books of Enoch”, v t 33 (1983), pp. 14-29; O. Neugebauer, The astronomical chapters of the
Ethiopic Book of Enoch (72-82), Copenhague, 1981;
J. J. Collins, “The apocalyptic technique: Setting and function of the Book of Watchers”, cbq 44 (1982); J. C.
VanderKam, “The theophany of Enoch 1.3b-7.9”, v t 23 (1979), pp. 129-50; idem, Enoch and the growth of an apocalyptic
tradition, Washington, dc, 1984; S. Uhlig, Das üthiopische Henochbuch, Gütersloh, 1984; M. Barker, The Older Testament, 1987,
ver nota 6 do cap. 9; os seguintes artigos de G. W. E. Nickelsburg: ‘The apocalyptic message of i Enoch 92-105”, cbq 39 (1977),
pp. 309-28; “Apocalyptic and myth in Enoch 6-11”, jbl % (1977), pp. 383-405; “Enoch, Levi and Peter: Recipients of revelation
in Upper Galilee”, ibid. 100 (1981), pp. 575-600: “The Epistle of Enoch and the Qumran literature”, jjs 33 (1982), pp. 333-49;
os seguintes ensaios em P. J. Achtemcier (ed.), Society ofBiblical Literature 1978 Se minar Pape rs, vol. 1, Chico, Cal., 1978: J. J.
Collins. “Methodological issues in the study of i Enoch”; G. W. E. Nickelsburg, “Reflections upon reflections: A response to
John Collins* ‘Methodological issues
1. Gênesis 5:21-4.
2. Livro dos Jubileus 4:19,23.
3. Traduções confiáveis do Livro dos Jubileus são as de R. H. Charles, Londres, 1902, e de O. S. Wintermute, em J.
H. Charles (ed.), The Old Testament Pseudepigrapha, vol. 2, Londres, 1985, pp. 52-142, e introdução, pp. 32-50. As
citações neste capítulo foram extraídas da primeira. Estudos úteis: M. Testuz, Les idées religieuses du Livre des
Jubilées, Genebra e Paris, 1960; G. L. Davenport, The eschatology of the Book of Jubilees, Leiden, 1971; J. C.
VanderKam, Textual and historical studies in the Book of Jubilees, Missoula, 1977.
4. Documento de Damasco 16:3-4.
5. Para o que vem a seguir, cf. M. Limbeck, Die Ordnung des Heils. Untersuchungen zum Gesetzesverstandnis des
Frühjudentums, Düsseldorf, 1971, pp. 64-82; U. Luck. “Das Weltverstándnis in der jüdischen Apokalyptik”, Zeitschrift
für Theologie und Kirche 73 (Tübingen, 1976), pp. 283-305.
6. Livro dos Jubileus 2:2.
7. I Enoque 82:2.
(11) Cf. C. Münchow, Ethik und Eschatologie, Ein Beitrag zum Vestandnis
der frühjudischen Apokaliptik mit einem Ausblick auf das Neue Testament, Gõttingen. 1981, pp. 16-64; M.-T. Wacker,
Weltordnung und Gericht: Studien zu I Henoch 22, Würzburg, 1982, esp. pp. 257, 298-305, 314-5.
(19) Cf. P. L. Day, An adversary in heaven. Satan in the Hebrew Bible, Atlanta, 1988.
1 Enoch 6-11”, jbl 96 (1977), pp. 195-233; G. W. E. Nickelsburg, “Apocalyptic and myth in i Enoch 6-11”, ibid., pp. 383-
405; D. Suter, “Fallen angel, fallen priest: The problem of family purity in i Enoch 6-11”, huc a 50 (1979), pp. 115- 35; Barker,
The Older Testament, esp. pp. 21 ss., 94; Forsyth, op. cit., pp. 160 ss.
I Enoque 8:2.
(26) Livro dos Jubileus 10:1-9. (27) Ibid. 11:2,3 e 5;cf. 10:8-12. (28) Ibid. 10:12.
(29) Cf. ibid. 23 (30) Ibid. 12:20. (31) Ibid. 19:28. (32) Ibid. 23:25.
(33) Ibid. 23:23.
I Enoque 11 ss.
Livro dos Jubileus 50:5.
Ibid. 23:27-8. “Nem alguém repleto de dias” é uma correção de VanderKam, op. cit., p. 269, com base nos
manuscritos etíopes.
Sobre a escatologia em particular: Y. Yadin, The scroll of the war of the Sons of Light against the Sons of Darkness,
Oxford. 1962, esp. pp. 229-42, sobre o papel escatológico dos anjos; H. W. Kuhn, Endenvartung und gegenwartiges Heil:
Untersuchungen zu den Gemeindeliedem von Qumran, Gottingen, 1966; P. Grelot, “L’eschatologie des Esséniens et le livre
d’Hénoch”, r q 1 (1958), pp. 112- 31; J. Licht, “An analysis of the Treatise on the Two Spirits”, em C. Roth & Y. Yadin, Aspects
of the Dead Sea Scrolls, Jerusalém, 1958. pp. 88-100; idem, ‘Time and eschatology in apocalyptic literature and Qumran”, jjs
16 (1967), pp. 117- 82; J. Pryke, “Eschatology in the Dead Sea Scrolls”, em M. Black (ed.), The Scrolls and Christianity,
Londres, 1969, pp. 45-57; J. Carmignac, “La future intervention de Dieu”, em M. Delcor (ed.), Qumran. Sa piété, sa théologie et
son milieu, Paris e Louvain. 1978, pp. 119-29; A. Caquot, “Le messianisme qumranien”, ibid., pp. 231-47; J. J. Collins,
“Pattems of eschatology at Qumran”, em B. Halpem & J. D. Levenson, Traditions in transformation: Tuming points in biblical
faith, Winona Lake, Ind., 1981, pp. 351-75. Sobre o calendário em particular: E. Ettisch, “Der grosse Sonnenzyklus und der
Qumran kalender”, Theologische Literaturzeitung 88 (1963), cols. 185-94; M. D. Herr, ‘The calendar”, em Compendia Re rum
Judaicarum ad Novum Testamentum, vol. 1, parte 2, Assen. 1976, pp. 834 ss.
a
Traduções dos Manuscritos: T. H. Gaster, The Dead Sea scriptures in English translation, 2 ed., Garden City, ny, 1964;
a
A. Dupont-Sommer, The Essene writingsfrom Qumran, Oxford, 1961; G. Vermes, The Dead Sea Scrolls in English, 2 ed.,
a
Harmondsworth, 1975, e 3 ed., Sheffield, 1987. Todas as citações neste capítulo foram extraídas de Vermes (1975) e, nas notas
seguintes, os números de páginas referem-se a essa edição. Para facilitar o uso de outras traduções, as referências aos próprios
Manuscritos são dadas entre parênteses, com as abreviaturas usuais; 1q para a Caverna 1 de Qumran, s para a Regra da
Comunidade, H para os Hinos, M para a Regra de Guerra, Melch para o Documento de Melquisedeque, c d para a Regra de
Damasco e Cairo. Também aqui foram adotadas as referências bastante completas de Vermes (1975).
Após atraso de muitos anos, uma quantidade considerável de material adicional dos Manuscritos foi recentemente
posta à disposição dos pesquisadores. Esse material foi publicado, com comentários, em R. Eisenman & M. Wise, The DeacJ
Sea Scrolls uncovered, Shaftesbury, Dorset e Rockport, Mass., 1992. Suas implicações ainda estão sendo avaliadas. Porém, as
teorias que haviam sido suscitadas pelos Manuscritos anteriormente publicados permanecem praticamente as mesmas —
exceto pelo fato de agora parecer certo, e não mais provável, que havia a esperança de uma ressurreição física dos devotos.
(46) Apud Vermes, The Dead Sea Scrolls: Qumran in perspective, pp. 155-6.
(49) P. 267 (2q Melch 2: 9, 13). Cf. P. J. Kobelski, Melchizedek and Melkiresa, Washington, dc, 1981, pp. 6-57; H. G.
May, “Cosmological reference in the Qumran doctrine of the Two Spirits and in Old Testament imagery”, jbl 72 (1963), pp. 1-
14.
P. 172 (Iqh 6:34-5). Porém, ver Vermes, The Dead Sea Scrolls: Qumran in perspective, p. 187.
Cf. Vermes, The Dead Sea Scrolls in English, p. 158 (Iqh 3:20-2).
Sobre o zurvanismo, ver p. 289.
1. A literatura sobre as origens do cristianismo é enorme. Para valiosa bibliografia das obras publicadas no século
xx até meados da década de 1980, ver
important messianic sect of Judaism, Londres, 1985. Outros trabalhos abrangentes sobre o tema, e dos quais o presente
estudo é devedor, são H. C. Kee, Christian origins in sociological perspective, Londres, 1980; A. E. Harvey, Jesus and the
constraints of history, Londres, 1982; E. P. Sanders, Jesus and Judaism, Londres, 1983. Das inúmeras obras sobre o contexto, a
vida e os ensinamentos do próprio Jesus, duas de G. Vermes, Jesus the Jew, A historian ‘s reading of the Gospelsy Londres,
1973, e The religion of Jesus the Je\v% Londres, 1993, reve
e Londres, 1988, é esclarecedora sobre as interpretações mutantes de Jesus nos evangelhos e nos escritos paulinos.
The first followers of Jesus: A sociological analysis of the earliest Christianity,
Londres, 1978.
A importância crucial do reino de Deus no pensamento e no ensino de Jesus nem sempre foi devidamente
a
reconhecida. O primeiro estudioso a chamar atenção para isto foi Johannes Weiss, Die Predigt vom Reiche Gottes, I
ed., 1892 (62 pp.), e ed. rev., 1900 (214 pp.); trad. ing., The proclamation of the kingdom of God, Londres e Filadélfia,
1971. Albert Schweitzer escreveu uma eloqüente, mas metodologicamente falha, obra de vulgarização da descoberta de
Weiss, em Von Reimarus zu Wrede, Tübingen, 1906; a segunda edição e as posteriores foram intituladas Geschichte der
Leben-Jesu-Forschung\ trad. ing., The quest for the histórica! Jesus, Londres. 1910, Nova York, 1922; muitas edições
subseqüentes. Para uma crítica perspicaz de Schweitzer: T. F. Glasson, “Schweitzerís influence: Blessing or bane?”,
Journal ofTheological Studies 28 (Oxford, 1977), pp. 289-
302. Weiss é mais judicioso do que Schweitzer, e o seria ainda mais se usasse o termo “escatológico” em vez de
“apocalíptico”.
Por exemplo, além das obras de Rowland. Sanders e Vermes relacionadas na nota 1, W. G. Kümmel, Promise
a
and fidfilment, Londres, 1957 (trad. da 3 ed. alemã); J. Jeremias, New Testament theology, vol. 1, Londres. 1971, pp. 73
ss.; R. H. Hiers, The kingdom of God in the Synoptic tradition, Gainesville, Flor., 1970; idem, The historical Jesus and the
kingdom of God, Gainesville, Flor., 1973; B. F. Meyer, The aims of Jesus, Londres, 1979. Para levantamentos de outras
interpretações: G. Lundstrõm. The kingdom of God in the teaching of Jesus. A study of interpretations from the last
decades of the nineteenth century to the present day, Edinburgh, 1963 (trad. do sueco); N. Perrin, The kingdom of God in
the teaching of Jesus, Filadélfia e Londres, 1966. Para uma útil antologia dc interpretações: B. Chilton (ed.), The
kingdom of God, Filadélfia e Londres, 1984; e deve-se acrescentar: G. R. Beasley-Murray, Jesus and the kingdom of
God, Grand Rapids e Exeter, Inglaterra (com bibliografia exaustiva).
Mateus 15:31.
Isaías 25:6.
Marcos 14:25.
Cf. Marcos 11:12-4; e Hiers, “Not the season for figs”. jbl 87 (1968), pp. 394-400; idem, Historical Jesus, pp. 83-
5; e, para uma crítica dessa interpretação, ver W. R. Telford, The barren temple and the withered tree, Sheffield, 1980,
pp. 206-8.
Sobre Papias: U. H. J. Kõrtner, Papias von Hieropolis, Gõttingen, 1983.
Esse fragmento foi preservado em Irineu, Adversus Haereses, liv. 5, cap. 33, § 3. Trad. do autor.
Mateus 25:35.
Marcos 10:21. (32) Lucas 14:13-3.
Marcos 7:29.
Lucas 16:17; cf. Mateus 5:18.
I Enoque 89-90 (“Apocalipse animal”); 91:30 (“Apocalipse das semanas”); Livro dos Jubileus 1:15-7.
Cf. Sanders, op. cit., pp. 87, 106.
(43) R. Bomkamm. Theology of the New Testament, vol. 1, Londres, 1952, p. 180.
Atos 1:6.
Ver nota 1 do cap. 10 para as traduções de I Enoque. Sobre outras figu
ras similares ao Enoque das “Similitudes”: J. Theisohn, Der auserwahlte Richíer, Gõttingen, 1975.
(47) Cf. G. R. Beasley-Murray, op. cit. (ver nota 4 deste capítulo), pp. 63-8 (“Excursus: The dâte of similitudes of
Enoch”).
(57) Cf. B. Lindars, Jesus Son of Man, Londres, 1983, esp. p. 14.
(66) Didnche 10:5 ss., trad. Kirsopp Lake, em The Apostolic Fathers, vol. i, 1, Londres, 1912 (Loeb Classical Library).
i Tessalonicenses 5:2,6.
Mateus 3:12. (70) Ibid. 10:32-3. (71) Ibid. 25:31-4,41. (72) Ibid. 13:41-3.
1. Obras valiosas sobre o Apocalipse: R. H. Charles, A criticai and exegetical commentary on the Revelation of St
John, Londres e Nova York, 1920; G.
B. Caird, A commentary on the Revelation of St John the Divine, Londres e Nova York, 1966; W. Harrington,
Understanding the Apocalypse, Washington, Dc,
1969; P. S. Minear, / saw a new earth. 1968; A. Yarbro Collins, Crisis and catharsis. The power of the Apocalypse,
Filadélfia, 1984; L. L. Thompson, The Book of Revelation: Apocalypse and ernpire. Nova York e Oxford. 1990.
1. Apocalipse 1:10-20. A menos que indicado de outro modo, todas as referências bibliográficas a seguir são do
Livro do Apocalipse.
(3) 3:4-5.
(4) 3:10.
(5) 2:26-7.
(6) H. Gunkel, já argumentou que o Apocalipse deve muito ao mito do combate do Oriente Próximo, Schòpfung und
Chãos in Urzeií und Endzeit, Gõttingen, 1885, numa época em que a única versão conhecida do mito era o Enuma elish. Para
uma apresentação mais atual desse argumento, ver R. Halver, Der Mythos im letzten Buch der Bihel, Hamburgo-Bergstadt,
1964.
(8) 13:7.
(9) Cf. Thompson, op. cit., pp. 16, 104. (10) Ibid., esp. pp. 95, 132, 171-81. (11) 19:16.
(12) 19:17.
(13) 18:2.
(14) 18:20.
(15) 14:9.
(17) 20:3.
(20) 21:7.
(21) 21:1-5.
(22) 22:2.
1. A hipótese não é muito difundida, e eu mesmo apenas aos poucos passei a aceitá-la como correta. Por outro
lado, não se trata de uma noção nova. Entre os estudiosos, foi debatida em várias épocas (embora em níveis muito
diversos de erudição) desde a publicação de Zend Avesta. Ouvrage de Zoroastre, contenani les idées théologiques,
physiques et morales de ce législateur, Paris, 1771, pelo extraordinário lingüista e viajante Abraham-Hyacinthe
Anquetil-Duperron; para um breve estudo, ver J. Duchesne-Guillemin, The Western response to Zoroaster, Oxford,
1958, cap. 6. O desenvolvimento da discussão pode ser acompanhado em
J. G. von Herder, Erlauterungen zuni Neuen Testament aus einer neuerõffneten morgenlündischen Quelle, 1775
(Samtliche Werke zur Religion und Theologie. ed.
J. G. Miiller, vol. 9, Stuttgart e Tübingen, 1829); J. S. Semler, apêndice ao anônimo Versuch einer biblischen
Dâmonologie, 1776; Constantin-François Chasseboeuf, conde de Volney, Les ruines, ou Méditation sur les révolutions des
empires, Paris, 1791, cap. 21; J. A. L. Richter, Das Christentum und die altesten Religionen des Orients, 1819; W. Vatke, Die
Religion des Alten Testaments,
Berlim, 1835, pp. 542-51; D. G. C. von Cõlln, Biblische Theologie, Leipzig, 1836, pp. 342-52; E. Stave, Überden Einfluss
des Parsismus auf das Judentum, Haarlem, 1898, esp. parte 3, pp. 117-280; Lawrence H. Mills, Zarathustra, Philo, the
Achaemenids and Israel, Leipzig, 1904, esp. parte 2, pp. 210-460; E. Meyer, Ursprung und Anfànge des Christentums. vol.
a
2,1921; D. W. Bousset, Die Religion des Judeníums im spiithellenistischen Zeitalter, 3 ed., ed. H. Gressmann, Tübingen, 1926,
pp. 469-524; A. von Gall, Basileia tou Theou. Eine religiongeschichtliche Studie zur vorkircMichen Eschatologie, Heidelberg,
1926; R. Otto, The kingdom ofGod and the Son of Man, Londres, 1938 (trad. da ed. alemã revista); C. Autran, Mithra, Zoroastre
et la préhistoire aryenne du christianisme, Paris, 1935, parte 2. pp. 143-269; G. Widengren, “Quelques rapports entre juifs et
iraniens à Tépoque des parthcs”, v t s 4 (1957), pp. 197-241; idem, Iranische-semitische Kulturbegegnung in parthischer Zeit,
Colônia e Opladen, 1960; idem, “Iran and Israel in Parthian times with special reference to the Ethiopic Book of Enoch”,
Temenos 2 (Helsinque, 1966), pp. 139-77; S. K. Eddy, The king is dead. Studies in the Near Eastem Resistance to Hellenism,
Lincoln, Nebraska, 1961; Morton Smith, “li Isaiah and the Persians”, ja os 83 (1963), pp. 415-21; D. Winston, ‘The Iranian
component in the Bible, Apocrypha and Qumran: A review of the evidence”, h r 5, 2 (1966), pp. 183-216; J. R. Hinnells,
“Zoroastrian saviour imagery and its influence on the New Testament”, Numen 16 (1969), pp. 161-84; idem, “Iranian influence
upon the New Testament”, Commémoration Cyrus, 2, Acta Iranica, 2 (1974), pp. 271-84; idem, “Zoroastrian influence on the
Judaeo- Christian tradition”, Journal ofthe K. R. Cama Oriental Institute 65, Bombaim, 1976, pp. 1-23; A. Hultgard, “Das
Judentum in der hellenistisch-rõmischen Zeit und die iranische Religion — eine religiongeschichtliches Problem”, em H.
Temporini & W. Haase (eds.), Aufstieg und Niedergang der rõmischen Welt, vol. 2, Berlim e Nova York, 1979, pp. 512-90, com
bibliografia nas pp. 583 ss.; S. Shaked, “Iranian influence on Judaism: First century bc e to second century c e “, em
Cambridge History of Judaism, vol. 1, Cambridge, 1984, pp. 308-25; M. Boyce, “Persian religion in the Achaemenid age”, em
ibid.; idem, A history of Zoroastrianism, vol. 3, Leiden etc., 1991, cap. 11. E. Bõklen. Die Verwandtschaft der jUdisch-christlichen
und der persichen Eschatologie, Gottingen, 1902, enfatizou as inúmeras semelhanças entre as duas escatologias, mas devido à
incerteza, naquela época, quanto à datação do Avesta, deixou em aberto a questão da influência.
A influência do zoroastrismo foi negada, por exemplo, em N. Sõderblom, La vie future d’après le mazdéisme, 1901; J. H.
Moulton, Early Zoroastrianism, 1913, cap. 11; I. Scheftelowitz, Die Altpersiche Religion und das Judentum, 1920; cardeal Franz
Kõnig, Zarathustras Jenseitvorstellungen und das Alte Testament, Viena, 1964, esp. pp. 243-9. No entanto, Sõderblom apresenta
um relato equivocado das crenças zoroastrianas e Kõnig limita-se a um período da crença israelita tão inicial que não chega a
ser relevante.
1. Para um estudo mais completo dos contatos entre o zoroastrismo e o judaísmo, ver Boyce, op. cit., vol. 3, cap.
11, esp. pp. 410 ss.
2. Sobre os Oráculos de Hystaspes: cf. Windisch, Die Orakel des Hystaspes (Verhandelingen der Konink Akadernie
van Wetenschappen te Amsterdam 28, 3 [1929]). Ver também Boyce, op. cit., vol. 3, pp. 376 ss., com bibliografia na nota
59.
3. As relações judaico-partas são examinadas nas obras de Widengren e Hinnells relacionadas na nota 1 deste cap.
4. Cf. K. G. Kuhn, “Die Sektenschrift und die iranische Religion”, Zeitschrift fiir Theologie und Kirche 49 (1952),
pp. 296-316; H. Wildenberger, “Der Dualismus in den Qumranschriften”, Asiatische Studien 8 (Berna, 1954), pp. 163-
77; J. Duchesne-Guillemin, “Le zervanisme et les manuscrits de la mer Morte”, tu 1 (1957). Para uma abordagem
diferente mas compatível: S. Shaked, “Qumran and Iran: Further considerations”, Israel Oriental Studies 2 (Tel Aviv,
1972), pp. 433-44.
5. É lamentável que alguns estudiosos pertencentes à escola alemã de “história da religião”, ou influenciados por
ela, tentem derivar o transcendente Messias cristão de um hipotético redentor celeste gnóstico, que por sua vez
supostamente se originaria de Gayomart, o homem primordial do zoroastrismo. O equívoco dessa argumentação já foi
apontado: ver K. Colpe, Die religions- geschichtliche Schule: Darstellung und Kritik ihres Bildes vom gnostischen
Erlôsermythus, Gottingen, 1961. O que não deve afastar nossa atenção da semelhança efetiva entre o Shaoshyant e o
Cristo do Livro do Apocalipse.
6. Cf. Hinnells, “Iranian influence upon the New Testament”, pp. 279-80.
POSFÁCIO (pp. 295-6)
(I) Em seu exaustivo estudo When time shall be no more. Prophecy belief in modem American culture, Cambridge, Mass.,
e Londres, 1992, Paul Boyer conclui (p. 15) que as esperanças apocalípticas e milenaristas “tomaram conta do pensamento e da
cultura dos Estados Unidos à medida que o século xx chega ao seu final”. O argumento sobre os elementos quase milenaristas
na ideologia marxista-leninista é desenvolvido em Cohn, The pursuit of the millenium, Londres e Nova York, 1957, esp. no
prefácio e na conclusão, e, de maneira mais completa, na conclusão da 2* ed. (1962). Em 1970, quando saiu a 3* ed., a noção
a
havia se tomado tão familiar que me pareceu apropriado reduzir o argumento a uma breve referência. Na 4 ed. (1993), a
passagem relevante da conclusão de 1962 foi reintroduzida, pois adquirira algum interesse histórico.