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04 A Participacao Da Burguesia

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Revista Científica UNAR (ISSN 1982-4920), Araras (SP), v.15, n.2, p.67-85, 2017.

A PARTICIPAÇÃO DA BURGUESIA FRANCESA NAS REVOLUÇÕES E


MOVIMENTOS SOCIAIS CONTEMPORÂNEOS

BIGOTO, Benedito Marcos¹

RESUMO
Este trabalho de pesquisa partiu do questionamento de como a burguesia, para
defender e garantir seus interesses participou do processo que transformou o Estado
utilizando-se do poder econômico para manipular as massas populares, através dos
meios de comunicação da época, com a propagação dos ideais iluministas, inseridas
na literatura do submundo, resultando na Revolução Francesa. Desta forma,
referendado pelas obras dos renomados historiadores, concluiu-se que entre manobras
políticas, alianças e golpes, a burguesia francesa teve um papel fundamental na
conspiração que provocou o processo revolucionário, que se estendeu até à primeira
metade do século XIX.
Palavras-chave: Burguesia, Iluminismo, Revolução Francesa.

___________________________________________________________________

ABSTRACT
This research work was based on the question of how the bourgeoisie, in order to
defend and secure its interests, participated in the process that transformed the state
using economic power to manipulate the popular masses through the media of the time,
with the propagation of ideals illuminists, inserted in the literature of the underworld,
resulting in the French Revolution. The French bourgeoisie played a key role in the
conspiracy that provoked the revolutionary process, which lasted until the first half of the
nineteenth century, in the form of political maneuvers, alliances and coups.

Keywords: Bourgeoisie, Enlightenment, French Revolution.

________________________________________________________________
¹ Pós-graduado no curso de Especialização em História das Revoluções e Movimentos Sociais pela
Universidade Estadual de Maringá (UEM). Professor de História da Secretaria Municipal de Educação de
Araras e da Secretaria Estadual da Educação do Estado de São Paulo. Licenciado em História e pós-
graduado em Docência do Ensino Superior pelo Centro Universitário Dr. Edmundo Ulson (UNAR).

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Introdução

A Revolução Francesa ocorrida no século XVIII decretou o fim do Antigo


Regime e criou as condições necessárias para transformar o Estado com a
implantação do liberalismo econômico que consolidou a burguesia no poder político.
A burguesia, classe social dominante do sistema capitalista, surgiu na Idade
Média e, no entanto para defender seus interesses econômicos participou de vários
processos revolucionários3 e movimentos sociais4 (CARVALHO, 2007).
O objetivo do artigo é conhecer a origem da burguesia e entender sua
participação na Revolução Francesa refletindo a História da França que possuía
uma sociedade estamental com grandes desigualdades (SOBOUL, 1981) e uma
classe social que já detinha o poder econômico, mas faltava-lhe o poder político para
transformar o Estado e garantir o desenvolvimento do capitalismo (ARANHA, 1993).
A divulgação dos ideais iluministas através da literatura do submundo5 trouxe o
apoio da população descontente com o regime (DARNTON, 1987). Conforme
Darnton (1996) a Revolução Francesa não foi um movimento dirigido por líderes,
mas foi uma revolução de ideais que circularam através da imprensa e após o
objetivo consolidado, a burguesia afastou-se do povo buscando alianças com o
Exército e com a Igreja para se consolidar no governo. O objetivo do trabalho é
abordado ao longo do texto por um elenco de historiadores e obras que fornecem
base científica, como Robert Darnton, Eric Hobsbawm, Albert Soboul, entre outros.
A escolha do tema se deu pela sua importância no processo de
transformação político-social e econômica do século XVIII, iniciado na França e que
influenciou o resto do mundo.
A metodologia adotada para a elaboração desse artigo foi o estudo de caso
descritivo, que de acordo com Yin (2010), fornece parâmetros para se coletar,
apresentar e analisar dados corretamente, e a revisão bibliográfica, que segundo
Marconi e Lakatos (1992), são o levantamento de toda a bibliografia já publicada, em

3
Movimentos revolucionários: Revolução, tentativa acompanhada do uso da violência, de derrubar as
autoridades políticas existentes e de substituí-las, a fim de efetuar profundas mudanças nas relações políticas, no
ordenamento jurídico-constitucional e na esfera socioeconômica (BOBBIO, 1998, p.1121).
4
Movimentos sociais: ação de um grupo organizado com o objetivo de buscar mudanças sociais por meio do
embate político, conforme seus valores e ideologias dentro de uma determinada sociedade e de um contexto
específicos, permeados por tensões sociais (BOBBIO, 1998, p.787-791).
5
Literatura do submundo, subliteratura, literatura dos subliteratos ou submundo literário: Expressões criadas e
utilizadas pelo historiador norte-americano Robert Darnton no livro Boemia Literária e Revolução, que trata da
literatura clandestina na França durante o Antigo Regime (DARNTON, 1987).
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forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita cuja finalidade é


fazer com que o pesquisador entre em contato direto com todo o material sobre um
determinado assunto.

1. Contexto histórico

No século XVII, enquanto o absolutismo triunfa na França, “a Inglaterra sofria


as revoluções lideradas pela burguesia, que visavam limitar a autoridade dos reis”
(ARANHA, 1993, p. 216). A intenção da burguesia pode ser explicada por Vicentino
(1992): durante os séculos XVI e XVII a burguesia mercantil desenvolveu-se com a
ampliação da produção de mercadorias e com as práticas mercantilistas que
resultou no acúmulo de capitais, porém a política intervencionista do Estado
Absolutista passou a ser um obstáculo para o desenvolvimento do capitalismo e a
burguesia começou a defender a liberdade comercial e a criticar o regime.

A burguesia ascendente, já senhora da economia, não mais aceitava um


Estado que não satisfizesse seus anseios. Exprimindo repúdio aos
componentes ainda não completamente capitalistas do período, referia-se à
estrutura social, econômica, política e cultural dessa época (VICENTINO,
1992, p.116).

Na Inglaterra, de acordo com Apolinário (2007), o Absolutismo se


desenvolveu nas Dinastias Tudor e Stuart, período em que houve um grande
desenvolvimento econômico, fruto da consolidação do Anglicanismo e da
Colonização da América do Norte. Hill (1983) complementa: o descontentamento da
burguesia inglesa com a política econômica praticada pelo rei ocasionou as
revoluções que resultaram na consolidação do poder ao Parlamento e
consequentemente à burguesia, garantindo a propriedade privada e estabelecendo
limites para a cobrança de impostos, além dos direitos dos cidadãos.
O aumento do poder burguês no parlamento britânico foi favorável para
estabelecer as bases políticas e econômicas para a Revolução Industrial e segundo
Apolinário (2007) as Revoluções Inglesas do século XVII criaram as condições
políticas e econômicas para a industrialização da Inglaterra.
Ao comentar sobre o liberalismo, resultado da ascensão da burguesia ao
poder, Chauí (2000) afirma que a doutrina se consolidou na Inglaterra com a

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Revolução Gloriosa e nos demais países europeus após a Revolução Francesa e


nos Estados Unidos com a luta pela Independência.
Com a ascensão da burguesia ao poder, “os ideais liberais se converteram
em concepções políticas nos séculos XVII e XVIII e o liberalismo combinado com o
pensamento iluminista influenciou os movimentos de emancipação e sociais, como a
Independência dos Estados Unidos e a Revolução Francesa” (ARANHA, 1993, p.
216-217). “O liberalismo político constituiu-se contra o Absolutismo enquanto que o
liberalismo econômico se opôs à intervenção do Estado na economia” (ARANHA,
1993, p. 217).

No liberalismo político John Locke (1632-1704), contrariando Thomas


Hobbes (1588-1679), estabeleceu a distinção entre o público e o privado,
defendendo a não intervenção do Estado, exceto para garantir o livre
exercício da propriedade e a livre iniciativa privada e no liberalismo
econômico Adam Smith (1723-1790) e David Ricardo (1772-1823)
influenciaram o capitalismo defendendo a propriedade privada dos meios de
produção e a economia de mercado baseado na livre iniciativa, sem a
intervenção do estatal (ARANHA, 1993, p. 217).

Na França as consequências da Revolução Industrial não foram positivas.


Segundo Cotrim (2010) causou reflexos na economia afetando diversos setores que
contribuíram para aumentar as desigualdades sociais e a insatisfação da burguesia.
No período pré-revolucionário compreendido entre 1715, ano da morte de
Luís XIV, até 1789, ano da queda da Bastilha, ocorreu uma mudança brusca na
opinião pública em relação à monarquia francesa e Darnton (1987) explica que: mais
do que um movimento dirigido por líderes foi uma revolução de ideais que
circulavam através da imprensa, e a imprensa atuou como uma força ativa na
história, justamente pela disputa pelo controle da opinião pública. A subversão da
ordem foi constituída através da imprensa tipográfica: panfletos, jornais,
almanaques, cartazes etc., e dessa forma os ideais revolucionários puderam atingir
os 25 milhões de franceses.
Segundo Darnton (1987) não foram somente os ideais iluministas escritos por
Voltaire e Rousseau que influenciaram a revolução, mas os panfletos do submundo
literário que circulavam entre as massas.
A literatura do submundo que circulava entre as camadas populares, teve
um papel decisivo nos momentos que precederam a revolução. Essa
camada menos instruída, que era a grande maioria da população, foi
alcançada pela literatura do submundo que incitaram o povo contra o
regime (DARNTON, 1996, p. 17-18).
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Dessa forma fica claro a intenção da burguesia em manipular o povo contra o


regime utilizando-se dos ideais iluministas e da literatura dos subliteratos. Para
Darnton (1987), esse grupo de filósofos de segundo escalão, editores piratas e
livreiros clandestinos teve papel decisivo na queda do Antigo Regime. Tal grupo
constituiu o submundo literário: filósofos falidos ou “Rousseaus de sarjeta”. Esses
escritores estavam em busca de dinheiro, porém, eles foram verdadeiros
propagadores do descontentamento da ordem vigente do século XVIII. Os recursos
usados eram a sátira e os boatos em torno da Corte, sempre desmoralizando o rei.
Eles atacavam as instituições oficiais, as quais eram responsáveis pela miséria do
povo francês, assim a Revolução Francesa foi sendo desencadeada pelo
descontentamento da população carente.
Nesse contexto, conforme Boulos Junior (2012), a crise nacional alertou as
classes privilegiadas, que ameaçadas, obrigaram Luis XVI a convocar a Assembleia
dos Estados Gerais e, o rei apoiado pela nobreza e pelo clero, decidiu manter o
sistema de votação que desfavorecia o Terceiro Estado, o qual a burguesia fazia
parte. Contrariado, o rei mandou fechar a sala dos deputados dando início à
revolução no dia 14 de julho de 1789 onde a população de Paris tomou a Bastilha,
símbolo do Absolutismo.
Segundo Soboul (1981) a Constituição elaborada pela Assembleia Nacional
em 1791 transformou a França em uma monarquia constitucional, acabando com os
privilégios da nobreza e do clero e instaurando a liberdade de comércio e produção
que contemplava os interesses burgueses. A burguesia procurou garantir, sobretudo
a liberdade econômica.
Porém a burguesia, segundo Hobsbawm (1982) ainda não estava
definitivamente no poder e a década revolucionária foi marcada por violentos
conflitos entre jacobinos e girondinos (apoiados pela burguesia) e encerrou-se com a
ascensão de Napoleão Bonaparte, também com o apoio da burguesia. Com a
derrota de Napoleão e a restauração do Absolutismo pelo Congresso de Viena a
burguesia deu continuidade no processo revolucionário com as Revoluções Liberais
de 1830 e consequentemente em 1848, consolidando a burguesia capitalista no
poder.

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1.1 Origem da burguesia

Para Cotrim (2010) a burguesia surgiu com o desenvolvimento e a expansão


comercial ocorrida entre os séculos XI e XIII na Europa. Segundo Carvalho (2007)
foi resultado do processo de expansão de diversos setores na Europa Ocidental que
contribuíram para o declínio do feudalismo, exigindo o direito de livre comércio e a
liberdade para os cidadãos, preservando a autonomia das cidades que se se
tornaram refúgio para as pessoas que buscavam segurança e desejavam romper
com a servidão feudal.
A segunda fase, séculos XIV e XV, foi marcada por crises econômicas,
políticas e religiosas, que prejudicaram a atividade comercial causando a
intranquilidade da burguesia, levando-a juntamente com os camponeses, a se
revoltarem contra a nobreza feudal. Cotrim (2010) descreve que a incapacidade do
rei de garantir a ordem e a segurança da população era resultado de um sistema
político fragmentado, onde o poder real era compartilhado com o senhor feudal e
isso contribuiu para que a burguesia apoiasse o processo de centralização política,
que foi resultado da aliança rei-burguesia e que ocorreu de forma lenta e com
resistência da nobreza feudal que era contrária a uma autoridade central.
A burguesia acreditava que o Estado centralizado se tornaria um instrumento
a seu favor, fornecendo condições necessárias para sua atividade comercial. Deyon
(1999) expõe as bases do mercantilismo como sendo: a unificação monetária, a
padronização de pesos e medidas, a criação de leis de âmbito nacional, o fim das
taxas alfandegárias, a adoção de mecanismos protecionistas, a garantia da
expansão das atividades comerciais e a adoção de incentivos comerciais.
Segundo Cotrim (2010) a burguesia saiu vitoriosa desse combate contra as
autoridades locais devido à aliança com o rei, e assim os governos nacionais
adotaram medidas para garantir o controle do Estado como a criação de um exército
nacional, sistema jurídico unificado e sistema tributário.
Na Idade Moderna começaram a ocorrer transformações devido à influência
do humanismo, corrente intelectual que buscava explicações racionais contrárias às
respostas impostas pela fé religiosa, onde o teocentrismo deu lugar ao

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antropocentrismo. Segundo Corvisier (1976), as circunstâncias levaram as elites a


buscar certezas religiosas e intelectuais e uma renovação espiritual.
No Renascimento, movimento de inspiração humanista, a burguesia passou a
patrocinar os trabalhos dos artistas e intelectuais com o objetivo de difundir os ideais
renascentistas através das artes, literatura e educação e assim, se favorecer do
choque entre o Renascimento e a Igreja Católica, que condenava a usura, lucro
excessivo nas transações econômicas, explica Pazzinato e Senise (1997).
Portanto o Renascimento proporcionou à burguesia a possibilidade de
progredir economicamente e de instruir-se com o intenso movimento educativo que
se iniciava, e os movimentos reformistas religiosos, como anglicanos, luteranos e
calvinistas, que pregavam essa nova ética, ganharam o apoio da burguesia na sua
difusão pela Europa (CORVISIER, 1976).
No campo econômico, a burguesia que apoiou o rei na centralização política e
financiou a expansão marítima, acabou decepcionada no decorrer da Idade
Moderna. A política do governo absolutista limitava os lucros da burguesia nos
negócios, pois o Mercantilismo tinha como objetivo o fortalecimento do Estado.
Segundo Nazaro (2007) quanto maior era o lucro da burguesia, maior era a
arrecadação para o Estado e quanto maior a diferença entre os valores exportados e
os importados, maior o volume de ouro e prata mantido no país.
O Mercantilismo, conforme Deyon (1999) garantia os monopólios comerciais
em benefício do Estado, baseando-se nos seguintes pilares: balança comercial
favorável, que consistia em exportar mais do que importar; protecionismo, proteção
do mercado interno; metalismo, acúmulo de metais preciosos para fortalecer a
riqueza nacional e pacto colonial, exploração econômica das colônias, onde essas
só podiam comercializar com a metrópole. Essas práticas passaram a opor-se aos
interesses burgueses.
No século XVII o Mercantilismo começou a entrar em declínio, para Nazaro
(2007) foi devido a uma grave crise econômica consequência do excesso de ouro e
prata acumulado pelos países europeus.
Analisando Deyon (1999) e Nazaro (2007) é possível observar que a
burguesia buscava novos mercados e isso seria possível com a independência das
colônias e também com a liberdade comercial que não era possível com o

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monopólio exercido pelo Pacto Colonial. Isso sinalizava que a economia


mercantilista estava ultrapassada.
No século XVIII os ideais liberais se espalharam pela Europa e conforme
Pellegrini (2013) influenciaram os princípios ideológicos das lutas populares contra
antigos privilégios e aos poucos a burguesia europeia foi se aliando ao povo, dando
origem as revoluções burguesas.

1.2 Período pré-revolucionário

Na França, a Revolução não se limitou apenas a um evento histórico, mas a


um longo processo político, social e econômico que resultou no fim do Absolutismo e
criou condições para a implantação do liberalismo econômico, inspirando outros
países (VICENTINO, 1992).
O Absolutismo francês teve início com Luís XIV, até então a centralização do
poder real tinha sido retardado pelas lutas políticas e religiosas dos séculos XVI e
XVII. Luis XIV governou por 72 anos, e a ele foi atribuída à frase: "L' État c'est moi"
(em francês, O Estado sou eu), além de estimular a economia, através do
Colbertismo6, protegeu a manufatura, aumentou os impostos e transformou a França
em potência militar conforme expõe Vicentino (1992). Porém, toda essa
transformação ainda mantinha a sociedade estamental da Idade Média, onde os
grupos sociais emergentes, incluindo a burguesia, continuaram inseridos no Terceiro
Estado. A maior característica do Antigo Regime foi a desigualdade social, causado
pelos privilégios concedidos à Nobreza e ao Clero (COTRIM, 2010).
No início de 1789, a França era o país mais populoso da Europa Ocidental,
com cerca de 25 milhões de habitantes e, sobretudo com uma sociedade medieval,
que apresentava dividida em três ordens.
Conforme Soboul (1981 p.22-30) essas ordens dividiam-se internamente em
grupos, muitas vezes rivais entre si. O Primeiro Estado, ou Clero, dividia-se em Alto
Clero (bispos, abades e cônegos de origem de famílias nobres) e Baixo Clero
(padres pobres, muitos deles simpatizantes com os ideais revolucionários). O
Segundo Estado, ou a Nobreza, dividia-se em: Nobreza Cortesã (que vivia na corte
6
Colbertismo: medidas econômicas de características mercantilistas desenvolvidas por Jean-Baptiste Colbert,
ministro de Luís XIV entre 1661 e 1683, cujos objetivos principais eram a expansão da economia francesa pelo
incremento da produção manufatureira, pelo fortalecimento do comércio externo e pelo aumento das áreas
coloniais e respectivo comércio (VICENTINO, 1992).
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do Palácio de Versalhes), a Nobreza Provincial (que vivia à custa das taxas pagas
pelos camponeses a título de direitos feudais) e a Nobreza de Toga (burgueses ricos
que compravam títulos de nobreza).
O Terceiro Estado, segundo Soboul (1981 p.22-30), era composto pela
grande maioria da população, mais de 24 milhões de pessoas sendo dividido em
diversos grupos sociais, entre eles: os camponeses (trabalhadores rurais, livres ou
servos), os sans-culottes (camada social concentrada em Paris e formada pelos
aprendizes de ofícios, assalariados ou desempregados marginalizados), a pequena
burguesia (formada por pequenos comerciantes e artesãos), a média burguesia
(formada por profissionais liberais como advogados, professores, médicos,
comerciantes etc.) e a alta burguesia (constituída pelos banqueiros, grandes
empresários e comerciantes, incluindo os comerciantes de mercadorias coloniais).
Nesse contexto socioeconômico, Aranha (1993), coloca que os movimentos
revolucionários na França começaram quando a burguesia, que já detinha o poder
econômico, reivindicou sua própria autonomia. Vicentino (1992) complementa que a
Revolução Francesa foi uma prova definitiva da maturidade da burguesia, a queda
do Absolutismo sepultou os últimos entraves ao capitalismo.
Para Cotrim (2010) a Revolução foi resultado de vários fatores, onde se
destacam a grande desigualdade social, problemas econômicos e a necessidade de
mudanças. Vicentino (1992), considera que a burguesia soube assumir as
insatisfações do período e liderar os grupos sociais que surgiam, transformando-se
na vanguarda que tornou possível derrubar as estruturas do Absolutismo.
Nesse período ocorreu a publicação da Enciclopédia, obra mais importante do
Iluminismo e a imprensa, com financiamento da burguesia, teve um papel
fundamental na divulgação desses ideais (DARNTON; ROCHE, 1996).
Mesmo com a censura do governo as obras filosóficas circulavam cada vez
mais e a tentativa em impedir os lançamentos de novos livros fez surgiu o mercado
clandestino. A polícia passou a combater o contrabando ilegal de livros através de
prisões de livreiros, porém as estimativas da época dão conta de que neste período
metade dos homens e um terço das mulheres possuíam um nível razoável de
alfabetização. Por outro lado, devido a este número de pessoas alfabetizadas, havia
um grande interesse comercial, pois com tantas pessoas sabendo ler o mercado
para livros tendia tornar-se cada vez mais rentável. Neste contexto acontece um

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choque de interesses: de um lado a monarquia preocupada com as ideias


veiculadas através dos livros, de outro os livreiros preocupados com os ganhos nas
vendas das obras (DARNTON, 1987).
No século XVIII ocorreu uma valorização da profissão de escritor, o que
resultou no crescente aumento da população de escritores desempregados nas ruas
da França. A vida dos subliteratos era difícil. Eles enfrentavam o fracasso e a grande
maioria se sujeitava a serviços como: produzir pornografia, vender livros proibidos e
até mesmo espionar para a polícia (DARNTON, 1987).
O colapso do Antigo Regime é tributário da complexa rede que se formou na
França do século XVIII ainda atrasada em termo de desenvolvimento do jornalismo
se comparado à Inglaterra, onde o ódio contra a aristocracia que transformava a
república das letras em campo de despotismo era o que empurrava esses homens
ao submundo das letras, transformando-os em revolucionários, sendo a burguesia
foi a grande favorecida (DARNTON, 1987).
Segundo Cotrim (2010) as discussões dos ideais, propostos pelos iluministas
tornaram-se públicas, sendo discutidos nos salões, cafés e pela Maçonaria, além de
associações que tinham o objetivo de divulgas esses textos.

2. O processo revolucionário

Além da grave crise social e econômica que assolava a França, a partir da


segunda metade do século XVIII, a monarquia absolutista não atendia mais os
interesses da burguesia.

Na França, a incapacidade da monarquia absolutista para realizar as


reformas que a burguesia exigia, cada vez com mais determinação, foi fatal
para sua sobrevivência. Os comerciantes e manufatureiros burgueses cujos
interesses estavam ligados à liberdade de comércio e de produção, ao
verificarem que a adoção do liberalismo econômico se tornou impossível,
começaram a se voltar contra a monarquia absolutista. Entre a média
burguesia, sobretudo dos profissionais liberais, também crescia o
descontentamento contra o absolutismo e a convicção de que as coisas
precisavam mudar (FLORENZANO, 1987, p.25).

No século XVIII a burguesia liderava as atividades centrais do capitalismo,


como as finanças, o comércio e a indústria, por outro lado esbarrava nos obstáculos
da estrutura tradicional de propriedade e produção, além dos tributos. Cabia então à

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burguesia eliminar essas barreiras da davam sustentação política ao governo do


Antigo Regime. Embora a participação econômica da burguesia fosse vital para o
Estado, ela não tinha influência política e era marginalizada socialmente devido à
organização estamental (VICENTINO 1992).
A própria monarquia, onde as finanças no rei e do Estado se confundiam,
atravessava um período de falência: os impostos não cobriam as despesas públicas
(PAZZINATO; SENISE, 1997).
Descontentes com o governo e influenciados pelos ideais iluministas, diversos
setores do Terceiro Estado passaram a reivindicar igualdade de todos perante a lei.
A burguesia defendia a reestruturação do Estado favorecendo o desenvolvimento do
capitalismo o que significava combater o Absolutismo (COTRIM, 2010).
De acordo com Pazzinato e Senise (1997) a Independência dos Estados
Unidos em 1776 e a aprovação da Constituição de 1787, inspirada nos princípios
iluministas de Montesquieu, representou a concretização dos ideais liberais através
da instalação de uma República representativa, influenciando aqueles que
desejavam o liberalismo.

Na Europa, acelerou-se a crise do Antigo Regime, transformando o século


das luzes, com suas ideias e teorias, na era das revoluções, com seus
confrontos e guerras. A prática substituía a teoria, a realidade confirmava e
impulsionava os ideais. Ao final do século XVIII novas transformações
explosivas ganhariam força, sepultando o Antigo Regime e consolidando o
modo de produção capitalista (VICENTINO, 1992, p. 170).
Dessa forma à medida que a burguesia consolidava cada vez mais seu
poder econômico e seus valores intelectuais, as instituições do Antigo
Regime foram sendo superadas e esses avanços levaram a burguesia a
fazer a revolução para assegurar-lhe o poder e assim dirigir o Estado no
sentido de atender seus interesses (FLORENZANO, 1987, p.25).

Segundo Cotrim (2010), nesse contexto de crise, as camadas privilegiadas e


ameaçadas alertaram e obrigaram o rei a convocar a Assembleia dos Estados
Gerais, instituição parlamentar que não se reunia desde 1612 e que dela
participavam os representantes dos três estados, porém o Clero e a Nobreza unidos,
sempre tinham vantagens sobre o Terceiro Estado. As consequências da
convocação da Assembleia foram terríveis para o governo, pois além das forças que
apoiavam o rei subestimarem a capacidade política do Terceiro Estado, liderado
pela burguesia, a convocação coincidiu com o momento de crise econômica, miséria

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e fome que a França atravessava, e isso interferiu diretamente na escolha dos


deputados para a Assembleia.
Historiadores consideram que a burguesia aproveitou a oportunidade para
divulgar seu programa de reformas por meio de intensa propaganda. E as
massas camponesas e urbanas tiveram, pela primeira vez, espaço para
demonstrar, em termos políticos, todo o seu descontentamento
(FLORENZANO, 1987, p. 35-36).

2.1 Eclosão da Revolução

A abertura da Assembleia, no Palácio de Versalhes, começou com o conflito


entre os estados privilegiados e o Terceiro Estado. Para Cotrim (2010) a nobreza e o
clero queriam realizar as votações pelo sistema tradicional, um voto para cada
estado independente do número de deputados, mas o Terceiro Estado que possuía
maior número de deputados, mais que a nobreza e o clero juntos, exigia que as
votações fossem individuais.
Conforme Boulos Júnior (2012) Luís XVI apoiado pela nobreza e pelo clero
decidiu que o sistema de votação continuasse sendo por estado e ordenou a retirada
dos deputados do Terceiro Estado do salão. Pazzinato e Senise (1997)
complementam ao colocar que a atitude do rei não intimidou a burguesia que,
apoiada pelo povo, reuniram-se na sala do Jogo da Péla7 onde juraram não se
separar enquanto não elaborassem uma Constituição para a França. Luís XVI
temendo perder o controle obrigou a nobreza e o clero a se unirem à burguesia. “O
Juramento do Jogo da Péla de 20 de junho de 1789 é um ato verdadeiramente
revolucionário, pode-se dizer fundador, que muda tudo. Os deputados do Terceiro
Estado proclamaram-se [...] Assembleia Nacional Constituinte” (VOLVELLE, 2007,
p.30-31).
Luís XVI temendo perder o controle obrigou a nobreza e o clero a se unirem à
burguesia e assim foi proclamada a Assembleia Nacional Constituinte (PAZZINATO;
SENISE, 1997). A tentativa do rei em unir forças para enfrentar a Assembleia,
segundo Vicentino (1992), gerou motins e revoltas populares que tomaram conta
das ruas de Paris sob o lema Liberdade, Igualdade e Fraternidade, e no dia 14 de

7
Jogo da Péla: jogo muito praticado que consistia em atirar uma bola (a Péla) de um lado para o outro com a
mão, ou com o auxílio de um instrumento (raquete, bastão, pandeiro) em local aparelhado para esse fim.
Considerado um dos ancestrais do tênis, desde o século XIII era praticado em salas fechadas, sendo praticado por
clérigos, burgueses e príncipes (VOLVELLE, 2007).
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julho a Bastilha, prisão que simbolizava o absolutismo e onde ficava os presos


políticos contrários a monarquia, foi tomada pela população.
Luis XVI foi obrigado a aceitar a monarquia constitucional, porém não aceitou
a redução do seu poder e conspirou contra os revolucionários tramando uma aliança
secreta com a Áustria e a Prússia, pois uma invasão externa deteria os
revolucionários e reconduziria o rei ao poder, mas o plano foi descoberto e Luís XVI
foi preso e guilhotinado (SOBOUL, 1981).
Porém, a vitória do povo francês, contra os invasores externos, fortaleceu os
jacobinos, que defendiam a igualdade social entre os cidadãos e que eram apoiados
pelos trabalhadores urbanos e rurais, e não contavam com o apoio da burguesia
(HOBSBAWM, 1982).
A Convenção Nacional de 1793 aprovou a nova Constituição instituindo a
República. O governo jacobino adotou medidas que desagradaram os planos da
burguesia, como: tabelamento de preços, confisco de terras de nobres e da Igreja
para vender por preços baixos para os camponeses, abolição da escravidão nas
colônias. A burguesia saiu de um governo absolutista monárquico e entrou num
governo republicano tirano, pois a principal característica dos jacobinos foi à
perseguição dos seus opositores. Robespierre chegou a criar o conceito de
despotismo da liberdade para justificar a tirania: Para defender a liberdade pública e
individual era preciso um governo despótico, tirânico (VAINFAS et al., 2015).
Os excessos praticados pelo governo jacobino, durante a Era do Terror,
acabaram provocando sua própria queda e os girondinos, que apoiavam uma
monarquia constitucional e que tinham o apoio da burguesia, acabaram recebendo
apoio de parte dos jacobinos descontentes e assim a conspiração culminou no golpe
de 1794, onde Robespierre e outros líderes jacobinos foram presos e executados. A
burguesia apoiou esse golpe com receio que a revolução, que ela mesma incitou, se
voltasse contra ela (VAINFAS et al., 2015).

O Termidor (golpe liderado pela alta burguesia girondina que derrubou a


ditadura jacobina, em 27 de julho de 1794) é o fim da heróica e lembrada
fase da Revolução: a dos esfarrapados sans-culottes e dos corretos
cidadãos de bonés vermelhos (...). Não foi uma fase cômoda para se viver,
pois a maioria dos homens sentia fome e muitos tinham medo, mas foi um
fenômeno tão terrível e irreversível quanto a primeira explosão nuclear, e
toda história tem sido permanentemente transformada por ela. E a energia
que ela gerou foi suficiente para varrer os exércitos dos velhos regimes da
Europa como se fossem feitos de palha (HOBSBAWM, 1982, p.90).

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BIGOTO, B. M. (2017)

O desafio da burguesia agora era alcançar a estabilidade política e o avanço


econômico nas bases do programa liberal de 1789-1791.

A grande fraqueza dos termidorianos era que eles não desfrutavam de


nenhum apoio político (no máximo tolerância), espremidos como estavam
entre uma revivida reação aristocrática e os pobres sans-culottes jacobinos
de Paris, que logo se arrependeram da queda de Robespierre. [...] cada vez
mais (o Diretório) tinha que depender do exército para dispersar a oposição.
[...] Mas o Diretório dependia do exército para algo mais do que a supressão
de golpes e conspirações periódicas [...]. A inatividade era a única garantia
segura de poder para um regime fraco e impopular, mas a classe média
necessitava de iniciativa e de expansão [...]. Teria sido surpreendente que,
em consequência, o mais inteligente e capaz dos líderes do exército,
Napoleão Bonaparte, tivesse decidido que o exército podia prescindir
totalmente do débil regime civil? [...], Por outro lado, o exército era uma
carreira como outra qualquer das muitas abertas ao talento pela revolução
burguesa, e os que nele obtiveram sucesso tinham um interesse investido
na estabilidade interna como qualquer outro burguês. Foi isto que fez do
exército, a despeito de seu jacobinismo embutido, um pilar do governo pós-
termidoriano, e de seu líder Bonaparte uma pessoa adequada para concluir
a evolução burguesa e começar o regime burguês (HOBSBAWM, 1982,
p.91-92).

Com a saída dos jacobinos do poder, foi aprovada uma nova Constituição em
1795, que reforçou o direito à propriedade e ao lucro e instalou na França o
Diretório, formado por um grupo de revolucionários que, também fracassou, pois não
havia consenso entre seus membros. Cotrim (2010) coloca que o Diretório vigorou
de 1795 a 1799, período em que tentou conter o descontentamento do povo e
consolidar o controle da burguesia sobre o país.

Durante o Diretório, fase final da Revolução Francesa, a França, cuja


economia estava minada pela inflação, pela especulação e pela corrupção
administrativa, estava mergulhada numa crise. Esta situação desagradava à
população em geral e particularmente a burguesia, que via ameaçada as
conquistas revolucionárias. No plano externo, o país continuava
pressionado pelas potências europeias, que tentavam impedir a expansão
dos ideais burgueses pelo resto da Europa (PAZZINATO; SENISE, 1997,
p.129).

Finalmente em 1799, Cotrim (2010) destaca que o Golpe do 18 do Brumário,


Napoleão com o apoio da burguesia e do Exército, pôs fim ao Diretório criando o
Consulado. Passando por cima das decisões dos demais membros, convocou um
plebiscito que foi aceito pela maioria da população para o retorno da monarquia e
dessa forma Napoleão tornou-se Imperador em 1804.

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BIGOTO, B. M. (2017)

Conforme análise de vários historiadores, Napoleão evitou que setores mais


identificados com os interesses das camadas populares, como os jacobinos,
ascendessem ao poder. Com isso, consolidou as conquistas da alta
burguesia francesa, encerrando o ciclo revolucionário (COTRIM, 2010, p.
147).

Nesse contexto pode-se observar que para a burguesia não importava se a


França fosse republicana ou monárquica, o importante era acabar com os regimes
totalitários e garantir seus interesses econômicos. Conforme Vainfas et al. (2015), o
apoio a Napoleão lhe garantiu o poder, ampliando seus direitos políticos e
econômico, além de receber também muitas conquistas territoriais devido ao grande
número de batalhas que Napoleão empreendeu, e dessa forma, esse período
representou várias conquistas para a França e para a consolidação dos ideais
burgueses adquiridos durante a Revolução Francesa.
Porém durante o Império Napoleônico a situação começou a mudar. O
aumento de impostos e o Bloqueio Continental imposto pelo Imperador entravou o
desenvolvimento econômico francês:

Entretanto, as guerras expansionistas provocaram o choque do Imperador


com a alta burguesia, onerada pelo frequente aumento de impostos. Ao
decretar o Bloqueio Continental, em 1806, Napoleão entravou o
desenvolvimento da economia francesa, pois a falta de matérias-primas
para uma indústria em afirmação impossibilitava a França de substituir as
mercadorias inglesas no mercado europeu. Isso acabou incentivando uma
série de países a iniciarem seu próprio desenvolvimento industrial. Diante
da crise econômica e dos primeiros fracassos de Napoleão, a burguesia não
hesitou em deixar de apoiá-lo, permitindo a invasão de Paris pelas forças
coligadas (1814), que a monarquia fosse restaurada. Impondo ao novo rei,
Luís XVIII, uma Constituição baseada no modelo inglês, a alta burguesia
assegurou o poder político, firmando-se como classe dominante
(PAZZINATO; SENISE, 1997, p.129).

2.2 Período pós-revolucionário

A Revolução Francesa, propriamente dita, acabou quando Napoleão subiu ao


trono, porém o absolutismo ainda não estava morto. Segundo Vicentino (1992) após
a derrota de Napoleão, sob o lema: Restauração e Conservação do Antigo Regime,
o Congresso de Viena (1814-1815) se reuniu com o objetivo de restaurar o
absolutismo e redesenhar o mapa da Europa de antes da Revolução Francesa.

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BIGOTO, B. M. (2017)

O Primeiro-Ministro austríaco Metternich propôs a criação da Santa Aliança,


onde se algum país fosse ameaçado por alguma revolução do tipo da
“Revolução Francesa”, todos os outros o defenderiam. A Santa Aliança foi o
último suspiro do Absolutismo europeu (VAINFAS et al, 2015, p.107).

Para Hobsbawm (1982), a fase reacionária instalada em 1815 e expandida


até 1830 foi um breve intervalo entre a era das revoluções e a consolidação dos
ideais burgueses de construir um Estado e uma sociedade liberais, assim as
Revoluções Liberais, iniciadas na França, movimentaram toda a Europa no século
XIX. A Revolução de 1830, liderada pela alta burguesia, contrária a restauração do
absolutismo e a Revolução de 1848, promovida pela aliança temporária entre grupos
da burguesia e do operariado, que foi consequência de uma sucessão de problemas
econômicos e políticos.
Com a implantação do liberalismo, a burguesia da Europa se fortaleceu e
garantiu seu desenvolvimento a partir da revolução de 1830 e como expõe
Pazzinato e Senise (1997) os burgueses tiveram condições de expandir o sistema
capitalista, cuja evolução dependia de sua permanência como grupo dominante.
O equilíbrio entre a aristocracia tradicional e o liberalismo burguês poderia ter
evitado essa revolta, porém os problemas econômicos e o descontentamento
popular com o regime serviram de agravante para a eclosão da revolução. Desse
modo, as forças liberais burguesas, com apoio popular, reorganizaram-se,
derrubando Carlos X que foi substituído por Luís Filipe de Orléans, conhecido como
o rei burguês, que apoiava a oposição liberal (COTRIM, 2010).
Em 1848 os problemas econômicos e políticos abalaram as forças que davam
sustentação ao governo de Luís Filipe que viu o aumento da miséria, a queda da
produção industrial e as greves operárias e nesse clima, segundo Boulos Júnior
(2012), a burguesia liberal e o operariado se uniram contra o governo, onde um
levante de estudantes e trabalhadores, e alguns setores da Guarda Nacional,
derrubaram Luís Filipe e a monarquia, proclamando a Segunda República.

No mesmo ano Luís Napoleão foi eleito presidente para o período de 1848-
1852, com o apoio de parte do exército, dos camponeses, da Igreja e da
burguesia, que ainda temia revoltas sociais, porém antes do final do seu
mandato Luís Bonaparte promoveu um Golpe de Estado para continuar no
poder e em seguida conseguiu o apoio popular para a realização de um
plebiscito pelo restabelecimento da monarquia francesa (COTRIM, 2010,
p.176).

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Luís Napoleão foi aclamado imperador com o nome de Napoleão III, e de


acordo com Boulos Júnior (2012) seu governo proporcionou duas décadas de
prosperidade e, apoiado pela burguesia, incentivou a indústria e os transportes, além
de investir em obras públicas e combater o desemprego.

A grande revolução de 1789-1848 foi o triunfo não da indústria como tal,


mas da indústria capitalista; não da liberdade e da igualdade em geral, mas
da classe média ou da sociedade burguesa liberal; não da economia
moderna ou do Estado moderno, mas das economias e Estados em uma
determinada região geográfica do mundo (parte da Europa e alguns trechos
da América do Norte) (HOBSBAWN, 1982, p.17).

A Revolução de 1848 encerrou um longo processo que decretou o fim do


Estado Absolutista e consolidou a burguesia no poder político, além de posicionar
definitivamente a burguesia e o proletariado em campos opostos, caracterizando a
História contemporânea (HOBSBAWM, 1982).

Considerações finais

A burguesia enfrentou diversos desafios para se consolidar econômica e


politicamente como classe dominante. Desde o seu surgimento, na Idade Média,
confrontou com o feudalismo, com a Igreja e com o absolutismo monárquico, e para
tal ascensão empreendeu diversas revoluções e alianças políticas.
No período pré-revolucionário francês os elementos literários compostos
pelos ideais iluministas e pela subliteratura, somados a fatores sociais internos como
a desigualdade, os altos impostos e uma sociedade estratificada, com
características medievais, colaboraram para que a burguesia utilizasse o poder
econômico para direcionar o povo contra o governo.
Para defender a transformação do Estado e as conquistas obtidas na
Revolução, participou do golpe de Estado que derrubou a República Jacobina e em
seguida do golpe que elevou Napoleão ao trono, restaurando a Monarquia.
No período pós-revolucionário, após a tentativa de restauração do
absolutismo, compôs alianças com o Exército e com a Igreja consolidando seus
interesses políticos e econômicos nas revoluções liberais.

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BIGOTO, B. M. (2017)

Analisando as obras citadas é possível observar que houve diversos fatores


que contribuíram para que a burguesia francesa criasse as condições necessárias
para derrubar o Antigo Regime e chegar ao poder, ao incitar os movimentos sociais
e utilizando-se do povo como instrumento de manobra. O fim do absolutismo
instalou o liberalismo político e econômico que consolidou o capitalismo como
politica econômica que influenciou outros países.

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