A Viagem Sem Destino Do Lanterna Verde e Arqueiro Verde Pela Contracultura Dos EUA Da Década de 1960-701
A Viagem Sem Destino Do Lanterna Verde e Arqueiro Verde Pela Contracultura Dos EUA Da Década de 1960-701
A Viagem Sem Destino Do Lanterna Verde e Arqueiro Verde Pela Contracultura Dos EUA Da Década de 1960-701
No 18, abril/2014 ‐ ISSN 1808‐9895 ‐ http://www.historiaimagem.com.br
Resumo:
Esse artigo tem o objetivo de investigar como as imagens, mais especificamente como as histórias em
quadrinhos podem vir a ser utilizadas como documento para o exercício da pesquisa histórica, visando perceber
como certos elementos e conceitos são representados em determinado contexto. Para isso, são analisadas
algumas páginas das 13 edições da série Green Lantern Vol. 2 (Green Lantern Co-Starring Green Arrow) e a
produção da mesma publicada pela DC Comics em 1970-71, em um contexto de grandes transformações
políticas e sociais nos Estados Unidos, sob a perspectiva da contracultura.
Palavras-chave:
História em Quadrinhos, Contracultura, Estados Unidos.
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Este artigo é parte do segundo capítulo – com algumas modificações – de minha monografia de final de curso
apresentada em agosto de 2011 na graduação em História, intitulada “No evil shall escape my sight?” História,
Imagem e Ensino de História através da Contracultura: A viagem sem destino do Lanterna Verde e Arqueiro
Verde pelos EUA da década de 1960-70. Rio de Janeiro: UERJ, 2011.
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No início da década de 1960, os Estados Unidos viviam momentos de grande
expectativa com a posse de John F. Kennedy, com grandes possibilidades de mudança com
seu discurso que prometia resolver questões relativas ao bem estar social, como a questão dos
direitos civis. Não é atoa que odiado por muitos conservadores, que já não fossem contrários a
ideia sugerida de equiparação social em termos de diretos com os negros, por exemplo,
odiavam o presidente democrata ainda por ser católico.
Algumas frestas como a Guerra do Vietnã somadas a questão do Feminismo e a dos
Movimentos pelos Direitos Civis inspiram aquilo que podemos chamar de Contracultura, mas
antes de definir o que poderia ser este movimento político e cultural, vejamos como as frestas
citadas se alargaram posteriormente no governo Lyndon B. Johnson. Uma delas é a
disparidade social que apesar da perspectiva de crescimento das riquezas do país aumentava a
largos passos, pois enquanto os subúrbios cresciam rapidamente com população de maioria
branca, as áreas centrais se viam cada vez mais decadentes e tendiam a atrair negros de viam
do Sul, porto-riquenhos e latino-americanos. Geralmente em tais guetos se encontravam em
um clima de abandono urbano e privação social, desligado da ordem geral do período.
Apesar da morte de Kennedy ser uma espécie de divisor de águas na mentalidade da
nação, parte deste descontentamento já estava semeado antes mesmo da tragédia ocorrida em
Dallas, bem abaixo da superfície da classe média da América aparentemente conformista dos
anos de 1950. Vários sinais do que estava por vir se configuram nos casos do crescimento do
movimento beatnik – que com seu anti-intelectualismo, tradição boêmia e desengajamento
inspirariam os hippies mais tarde –, nas lutas raciais que ocorreram em Montgomery e Little
Rock e na popularidade de símbolos de revolta como James Dean ou Elvis Presley. Nesse
sentido, a vida americana já estava carregada de um espírito de protesto que abominava a
sociedade de consumo, a paciência dos negros se esgotava frente ao racismo
institucionalizado e os estudantes e jovens através de sátira, do rock, do humor negro e da
política passavam a compreender a oposição entre a realidade e os valores em que haviam
sido criados.
Por volta do fim de 1968 a sociedade norte-americana parecia dividida em duas, que
viviam lado a lado, uma conservadora que acabara de eleger Richard M. Nixon e uma
“contracultura” que englobava os movimentos negros, ativistas políticos, hippies, feministas,
ecologistas e jovens alienados – ou era o que se diziam dos jovens por aqueles que faziam
parte do grupo conservador –. A juventude estava se tornando consciente de si mesma,
consolidando uma cultura popular jovem formada pelo rock and roll, roupas, gírias, gestos e
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símbolos novos. Sobre a relação entre juventude e esse novo tipo de cultura podemos destacar
o que assinala Hobsbawm:
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Fiel à filosofia utópica do drop out, a juventude engajada na contracultura dos
anos 60 buscava, através deste conjunto de idéias e comportamentos, cair fora
do Sistema. Descrente do futuro e desencantada com o presente – uma
sociedade e uma cultura que, segundo o consenso da época, estavam
simplesmente “doentes” –, o que tentava criar era um mundo alternativo,
underground, situado nos interstícios daquele mundo desacreditado, ou no que
se acreditava ser o outro lado de suas muralhas. Rompia-se com praticamente
todos os hábitos consagrados de pensamento e comportamento da cultura
dominante, realizando-se uma espécie de “crítica selvagem” a esta mesma
cultura e sociedade ocidentais. (PEREIRA, 1984, p. 74)
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segunda característica se diferencia do individualismo burguês buscando entender o indivíduo
como uma fonte de ideias e expressões que não deveria ser obstruído pelas estruturas
burocráticas da sociedade. A terceira característica seria a ambição da revolução
transformadora: “movimentos de vanguarda transgressivos (…), o apego contracultural à
mudança e à experimentação inevitavelmente leva à ampliação dos limites da estética e das
visões aceitas” (GOFFMAN; JOY, 2007, p. 54). Dentro da perspectiva da terceira
característica, a arte experimental se tornou um dos principais campos de manifestação
radical, que dava a subjetividade e a novas possibilidades estéticas maior destaque nas
produções artísticas da época em praticamente todas as linguagens.
Dessa forma, a contracultura possuía um elemento “suave” quanto “intenso”, pessoas
que se voltavam para o zen-busdimo em atrás de saídas e outros que se voltavam na direção
do revólver, alguns que falavam de amor e revolucionários que falavam da derrubada da
sociedade, alguns que preferiam a suavidade dos Beatles e outros que gostavam mais do tom
ríspido dos Rolling Stones, mas através de todas estas contradições corria um único sentido. O
motivo disso é porque a contracultura se preocupava mais com o sentir do que com o fazer,
com a autenticidade da experiência pessoal do que com sua comunicabilidade com outros.
Nesse sentido, em todas as suas manifestações, ela era mais imaginativa e expressiva em vez
de intelectual e analítica, estava mais propensa a procurar novos tipos de experiência do que
melhorar as anteriores. Sua linguagem escatológica, apocalíptica e sua política radical
encorajava que estímulos e imagem fossem remodelados a todo instante e oferecessem novas
versões da sociedade e do indivíduo.
Nesse contexto, Julius Schwartz depois de reformular vários personagens anos antes se
tornou editor da DC Comics e decide revitalizar a série do Lanterna Verde por conta das
baixas vendas ao colocar a frente Dennis O’ Neil (roteiros), Neal Adams (desenho) e Dick
Giordano (arte-final) para repetir o sucesso feito na revitalização do Batman quase que
paralelamente ao momento em que assumem Lanterna Verde. Os autores começaram no
número 76 e iriam até o 89, em um total de 13 edições a frente da segunda série do
personagem, a anterior era a publicada com a versão anterior da década de 1940. Dennis O’
Neil, querendo representar suas próprias convicções políticas e sensibilidade social, decide
colocar junto ao personagem título outro que pudesse ser seu antagonista em termos de
postura social e personalidade, nesse sentido, trouxe o Arqueiro Verde para coestrelar a
revista e o título dela passaria a ser “Green Lantern Co-Starring Green Arrow”. O próprio
autor explica que foi inspirado pelo contexto da época:
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Na verdade essa introdução foi escrita em 1983, quando foi republicada pela primeira vez nos Estados Unidos
dessas edições escritas por Dennis O’ Neil, porém a versão traduzida é datada de 2006 e está disponível no
encadernado Grandes Clássicos DC #6: Lanterna Verde/Arqueiro Verde - Volume 1.
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entre o quadro e os conceitos. (...) muitos termos cruciais numa descrição são
um pouco indiretos, porque em vez de se referirem, antes de tudo, ao quadro
como um objeto físico, referem-se ao efeito que ele produz em nós, (...) deve-
se estar atento ao fato de que a descrição que ,em poucas palavras, fará parte da
explicação, já contém presuntivamente elementos explicativos (...). A descrição
é um ato de demonstração – através do qual indicamos um aspecto que atrai
nosso interesse – e funciona de modo ostensivo: o sentido se forma por um
jogo de referência recíproca, um permanente vai-e-vem entre a própria
descrição e o objeto particular a que ele se reporta. (BAXANDALL, 2006, p.
43-44).
Na primeira edição, o Lanterna Verde visita Star City, cidade no qual seu amigo
Arqueiro Verde vive em sua procura, quando encontra um senhor bem vestido sendo atacado
por jovens ao tentar entrar em um prédio, o herói não pensa duas vezes e intervém no conflito,
porém ao esperar agradecimentos se vê surpreendido quando é alvo de dejetos, latas e outros
objetos tacados contra ele e o senhor que havia salvado pela população que mora no edifício.
O herói, implacavelmente parte para cima de alguns dos manifestantes, quando é impedido
pelo Arqueiro Verde que observara tudo e diz: “Back Off! Go chase a mad scientist o
something!”. Lanterna Verde retruca: “Green Arrow! You’re... defending... these... these
anarchists?” “Can’t you see they’re breaking the law?. Sagazmente, o outro personagem
responde: “Yeah, I can see... lots of things!”. Propondo-se a mostrar a vida dura que os
moradores levavam, explica que ali mora uma senhora que depende do neto para sobreviver,
que o mesmo teve que largar a escola para tal finalidade, justifica ainda a atitude
descontrolado do jovem dizendo que aquele senhor era o dono do prédio que não gastava
dinheiro para consertar o edifício e agora queria despejar os inquilinos de uma hora para outra
com a intenção de construir um estacionamento, muitos deles não tem para onde ir (Figuras 1
e 2).
Entretanto, é na página seguinte que acontece a página de maior expressão das
diferenças sociais que no texto O’ Neil queria demonstrar, se não fosse a fusão perfeita entre
os desenhos de Neal Adams e o roteiro, não teríamos tido “os três quadros que concluem a
cena estão entre os quadrinhos mais reproduzidos na história dos gibis” (O’ NEIL, 2006, p.
7), Nesses três quadros (Figura 3), um senhor negro aparece e faz a pergunta anunciada na
página anterior de maneira direta e afiada: “I been readin’ about you... how you work for the
blue skins... and how on a planet someplace you helped out the orange skins... and you done
considerable for the purple skins! Only there’s skins you never bothered with... the black
skins! I want to know... how come?! Answer me that, Mr. Green Lantern!. Atônito e surpreso,
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o Lanterna Verde só consegue balbuciar: “I... Can’t...”. O’ Neil, aparentemente já tinha a
pretensão de testar outro tipo de abordagem em seus roteiros, sentia necessidade arriscar mais
e usar influências de outras linguagens, entre elas a do novo jornalismo, que na época mistava
ficção e realidade em sua escrita:
Página 04 da edição Green Lantern #76 (Figura 1).
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A abordagem de Dennis O’ Neil para a série do Lanterna Verde pode ser aliada a
perspectiva dos Estudos Culturais no que concerne a refutação das ideias marxistas da Escola
de Frankfurt. A ideia de que a indústria cultural e essas tecnologias que ela utiliza como o
cinema e a música popular, perpetuem juízos que sejam sempre relativos a um “status-quo” e
diferentes apenas superficialmente, visando à manutenção de tal sistema para garantir seu
objetivo final, o lucro (ADORNO, 2007). Tal visão é por vezes extremista, pois renega o
aspecto “vivo” desse alvo, a perspectiva de que não exista negociação na elaboração de tais
produtos, algum tipo de resistência, pressupõe que a massa seja passiva, que todo produto
tenha um caráter uniformizador e não tenha possibilidade de ser crítico.
Martin-Barbiero, é um dos autores que afirma a existência da possibilidade de diálogo
que se estabelece nos produtos culturais, mais especificamente, quando aborda o cinema. Um
diálogo que se torna possível porque o cinema é indústria e porque para obter sucesso é
necessário público. Em função disto, existe um espaço da influência do espectador que é
dado, ainda, pelo fato de que a viabilidade financeira do empreendimento cinematográfico
depende da aceitação por parte do público. Propondo uma análise que se debruce mais sobre o
aspecto de mediação do que um meio de imposição de uma dada perspectiva de mundo,
assinalando que esta cultura popular não deve ser vista apenas a partir da perspectiva de que é
submetida, controlada pela cultura de elite, pois pensa a partir de uma análise na qual à ideia
de cultura de massa deve estar associada à noção de negociação, de fusão entre o popular e o
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culto. O cinema, o rádio, e outras tecnologias de comunicação, possibilitam o acesso das
camadas populares à cultura hegemônica, conferindo a essas classes a possibilidade de fazer
comunicável sua memória e sua experiência. Trata-se de uma operação de “apagamento das
fronteiras, deslanchado com a constituição de um discurso homogêneo e uma imagem
unificada do popular, primeira figura da massa” (BARBIERO, 2003).
A partir de tais questões, entendo que os conceitos da Escola de Frankfurt, devem ser
considerados a partir da necessidade da crítica a certos elementos do envolvimento da
indústria cultural e seu campo de atuação, a sociedade, mas levando em consideração a noção
de mediação, que seria a articulação entre práticas de comunicação e movimentos sociais,
feita através de entrelaçamentos de submissão e resistência, de contradições, e não a partir da
ideia de passividade. Uma passividade que Umberto Eco destacava já não existir, falando
especificamente no caso das histórias em quadrinhos:
Atualmente, mais do que nunca, os casos descritos por Eco, que cita casos de leitores
descontentes que escrevem cartas, reclamando do destino de algum dos personagens quando
versa sobre a penetração das histórias em quadrinhos na sociedade. Ao falar dessa inserção,
Eco explicita a força desta mídia ao apontar como grandes acontecimentos nessas histórias
acabam por tomar um tamanho maior, podendo até mesmo noticiado na TV e jornais à morte
de algum personagem marcante (como nos casos do Superman nos anos 1990 e do Capitão
América na década de 2000). A recepção das histórias que aqui são analisadas também não foi
homogênea, como veremos mais a frente.
Ainda na história contada na edição #76, no epilogo o autor ainda mostra o Arqueiro
Verde indagando o Lanterna Verde sobre o fato de ele seguir as ordens de seus superiores, os
Guardiões do Universo para missões no espaço quando seu próprio país se encontra em
situação problemática, e o convence a ir junto com um guardião em uma viagem pelo país
numa camionete velha. Interessante destacar que em um dos quadros (Figura 4), enquanto o
Arqueiro Verde faz o seu feroz discurso humanista e social, no fundo aparecem, quando ele
cita indiretamente duas mortes importantes nos Estados Unidos naquela época, Martin Luther
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King Jr. e John F. Kennedy: “On the streets of Menphis a good black man died... and in Los
Angeles, a good White man fell... Something is wrong!”. Impossível não olhar os três quadros
que em poucos balões e imagens transmitem um senso de realidade incrível, lembrar-se das
palavras de Gombrich, quando disserta sobre como os cartunistas se abastecem da sociedade e
sobre conceito de condensação, já citado no primeiro capítulo:
Nessa primeira história fica claro a intenção de O’ Neil ao colocar os dois personagens
principais em diálogo, o Lanterna Verde um policial com motivação nobre, mas que pouco
questionava suas ordens recebidas e batia antes se perguntar o porquê de estar fazendo aquilo,
tomando o personagem como uma metáfora para a mentalidade política do país:
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em ambientes nos quais os homens ocupavam. Entretanto, a trama gira em torno dos gurus
que existiam e eram comuns na época encantando jovens com seu estilo de vi alternativo e
chavões espirituais, mas no caso da série Joshua hipnotizava as pessoas e no início da história
uma gangue de motoqueiros aparece, o que era bem comum nos anos 1960 e 1970.
Na edição #79 o tema da história “Ulysses Star is still alive!” é sobre a demarcação de
terras indígenas, nela os heróis encontram um nativo sendo atacado por homens brancos, que
os explica que aqueles homens desejam tomar posse da terra de seu povo. A tribo indígena é
alvo de com plano para que legalmente suas terras sejam consideradas terra de ninguém, pois
seu arquivo incendiou-se misteriosamente e convenientemente o governo perdeu o registro no
qual o antigo chefe da tribo, Ulysses Star, conseguiu garantir a posso legal das terras.
Lanterna Verde e Arqueiro Verde se desentendem sobre o modo de ajudar a tribo, o primeiro
entende que tudo deve ser feito obedecendo à lei e busca a ajuda de um congressista para
defender os interesses daquele povo, já o Arqueiro Verde busca uma resistência mais ativa e
violenta ao personificar Ulysses Star com o objetivo de inspirar a tribo a resistir. Mesmo que
tenham chegado a se agredirem fisicamente por conta das perspectivas opostas, é provado que
os malfeitores interessados nas terras têm envolvimento com o incêndio dos documentos, com
o congressista amigo do Lanterna Verde prometendo prestar mais atenção nas reivindicações
da tribo, mas são as palavras da Canário Negro que mais são sensíveis ao drama das
populações nativas ignoradas pelo governo americano: “They’ve been under the white man’s
heel for so long they’ve lost faith in themselves... they no longer believe in themselves as a
tribe... a society... or even as human beings!”.
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Página 06 da edição Green Lantern #76, com os três quadros clássicos (Figura 3).
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Página 21 da edição Green Lantern #76, Arqueiro Verde cita a realidade (Figura 4).
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Na edição #80, a história “Even na imortal can die!” aparentemente se tem um tema
explicitamente ecológico, apesar de logo no início da história mostrar o Arqueiro Verde e o
capitão do navio se lamentando ao precisar jogar resíduos tóxicos no mar para que o material
explosivo não venha pegar fogo e colocar todos em perigo. No caso o guardião que decidiu
acompanhar o Lanterna Verde e o Arqueiro Verde em sua viagem é acusado pelos seus
irmãos de quebrar uma lei deles, pois esse guardião acabou por intervir no evento anterior
para salvar o Lanterna Verde que foi atingido por uma explosão, ao invés de preferir salvar o
navio que na visão dos outros guardiões coloca em perigo toda a espécie humana por conta
da poluição. Nesse sentido, seus irmãos o mandam para um planeta governado por um homem
que controla máquinas, que se revoltou contra seus superiores por estar cansado de ser não ser
reconhecido, acreditava que o futuro deveria ser governado pelo plástico e materiais
sintéticos, mas ele comandava tudo com um juiz a mão de ferro.
Na revista de número #81, os guardiões decidem o destino do irmão deles que
acompanhava os heróis em sua viagem quase como um antropólogo: ele foi desprovido de
uma imortalidade e enviado para o planeta onde sua raça surgiu. Os heróis junto a Canário
Negro acompanham o amigo até o planeta Maltus e de maneira inesperada são atacados pela
população local assim que pousam. O motivo é a hostilidade contra as mulheres, no caso a
Canário Negro, tudo por conta da logo percebida superpopulação em q eu o planeta enfrenta.
Ela foi ocasionada por um evento natural de uma poeira cósmica que afetou o planeta em sua
passagem e causou em longo prazo o não nascimento de crianças, deixando a população velha
com receio de não perpetuar sua espécie. Visando dar uma solução para o problema de seu
povo, uma senhora surge como líder, a Mother Juna, consegue produzir novas crianças em
laboratório. Porém, como o tempo o efeito passou e mesmo assim a moça continua a produzir
pessoas e coloca-las em sociedade, ocasionando uma superpopulação que o planeta não
suporta, uma vez que não consegue oferecer recursos naturais para todos, provocando histeria
e revoltas da população em busca de suprimentos, comida e qualidade de vida (Figura 5).
Uma metáfora para o futuro do nosso mundo em um contexto no qual a realidade mostrava
crescente aumento populacional e com isso aumento considerável das desigualdades sociais,
os Estados Unidos mesmo crescera economicamente e socialmente de maneira absurda entre
as décadas de 1950 e 1970.
Na edição seguinte, de número #82, a história “How do you fight a nightmare?”,
embora o feminismo exagerado expresso nos personagens das amazonas que auxiliam nossos
heróis – mesmo sendo hostis aos homens – na resolução do caso armado por Sinestro, um ex-
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Lanterna Verde que treinou Hal Jordan – o nosso Lanterna Verde –, mas depois traiu a tropa
e se se tornou o arqui-inimigo dela utilizando-se de um anel que contém os mesmos poderes
do Lanterna Verde – porém com a vantagem dele ser amarelo: a única fraqueza do poder do
herói título –, não há claro tema de relevância social e apenas uma típica trama de heróis
contra vilões. Com a “... and a child shall destroy them!” da edição número #83, os autores
voltam com um tema incomum: exploração infantil por meios dos adultos. Dinah Lance, a
Canário Negro vai com seus amigos visitar uma escola no qual será a nova professora de
educação física, porém o diretor Jason Belmore e o cozinheiro Grandy agem de forma
suspeita a serem hostis a dupla de heróis que estava caracterizadas com suas vestimentas de
batalha, ao contrário da Canário Negro. Como se não bastasse, o interesse romântico do
Lanterna Verde aparece em uma cadeira de rodas – aparentemente ela era a moça que
esbarrou em Grandy que mandou Sybil deixa-la com seus poderes daquele jeito –, para a
surpresa do herói e diz que desde que o diretor chegou a escola as coisas mudaram. A história
aproveita o gancho da paralisia de Carol Ferris – conhecida também como a vilã Safira
Estrela (Sapphire Star) e herdeira da companhia de caças que Hal Jordan trabalha: a Ferris
Aircraft – para tratar as dificuldades de alguém deficiente físico e o quanto o nosso herói
sente por vê-la nessa situação. Grandy controla e abusa da garotinha Sybil e seus dons
paranormais para chegar a seus objetivos, é com ela que enfrenta os heróis, chegando agredi-
la para obedeça fielmente suas ordens. A garotinha que nada faz porque se sente grata por ele
aparentemente dá-la uma situação melhor, chama a atenção por uma característica incomum,
seu rosto como desenhado por Neal Adams é muito semelhante ao – pasme – do presidente
em mandato naquele contexto histórico: Richard Nixon (Figura 6), além disso, Grandy se
assemelhava ao vice-presidente de Nixon, Spiro Agnew. Será que a dor de barriga que Sybil
provocava nos personagens com seus poderes era semelhante a ânsia de vomito que pela
postura conservadora do presidente Nixon provocava em Dennis O’ Neil? Tendo em vista a
semelhança entre a personagem Sybil e Nixon, as palavras de Gombrich mostra o quanto os
quadrinhos são influenciados pela caricatura:
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conveniente tornou possível manter determinados políticos constantemente
diante dos olhos do público em todos os tipos de papéis simbólicos.
(GOMBRICH, 2001, p. 134 e 135)
O tema ecológico volta à tona no número #84, na história “Peril in plastic”, no qual a
cidade que salva de um atentado e de uma inundação ao impedir o rompimento de uma
represa é poluída por fumaça tóxica causada pela produção de artigos de plástico – aliás, a
cidade é toda de plástico –, que é usada inclusive conta o Lanterna Verde, em um plano feito
pelo vilão Mão Negra (Black Hand). Entretanto, são nas edições #85 e #86 que o insight
perfeito entre a realidade e a ficção aparece novamente a exemplo da história da edição #76.
Os autores abordam em um arco de duas histórias o tema das drogas de maneira direta e
corajosa frente aos impedimentos do Comic Code Authority3. Na história “Snowbirds don’t
fly”, o Arqueiro Verde em sua identidade civil, como Oliver Queen, inicialmente é atacado
uma gangue de jovens, que mais tarde descobrem ser um grupo de traficantes, encontrando
seu pupilo junto a eles, mas é no fim da primeira história o Arqueiro Verde surpreende seu
parceiro, Roy Harper – conhecido como Ricardito (Speedy) – injetando heroína em si. A capa
da edição #85 reproduz esse momento de forma emblemática (Figura 7), além disso, deixa
claro o apoio da editora a história possivelmente polêmica com os dizeres em destaque: “The
shocking truth about drugs!” e “DC attacks youth’s greatest problem... DRUGS!”.
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Disponível em < http://www.lambiek.net/comics/code.htm>
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Página dupla (11 e 12) da edição Green Lantern #81 (Dezembro/1971) (Figura 5).
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acontecimentos recentes causavam. A forma quadrinhos poderia ser, durante o
prazo do meu contrato, um veículo de autoexpressão, assim como um meio de
entreter o público. (O’ NEIL, 2006, p. 7)
Os autores continuaram a utilizar o pano de fundo social na edição #87, só que dessa
vez os personagens lidariam com o problema do racismo cada um a sua maneira em histórias
solo. Na primeira história em que o protagonista é o Lanterna Verde, “Beware my power”, ao
constatar que seu substituto no cargo de Lanterna Verde escolhido pelos guardiões – o
professor de educação física Guy Gardner – é gravemente ferido ao tentar salvar pessoas em
um acidente, ele é obrigado a procurar uma outra pessoas para ocupar seu lugar caso aconteça
alguma eventualidade. O escolhido pelos guardiões é o homem negro John Stewart, e durante
seu treinamento juntos se envolvem em uma trama no qual deveriam proteger um senador de
um atentado. John Stewart se recusa a proteger um senador racista e mais tarde descobrem
que o atentado era uma farsa para incitar ódio racial entre brancos e negros dando força a sua
plataforma política conservadora, pois o atirador se revelou negro. O personagem é o segundo
herói negro a não ter a palavra black em seu nome de batalha.
Na segunda história da edição, “What can one man do?”, estrelada pelo Arqueiro
Verde, mostra o herói se perguntando o que poderia fazer mais por sua cidade, apesar de ser
um filantropo e ainda impedir o crime. Paralelamente políticos pensam em seu nome – Oliver
Queen – para possível candidato para prefeito, ao ser comunicado disso, em dúvida liga para
vários amigos, mas logo desiste. Enquanto nota a poluição que abate a cidade em sua ronda,
percebe um conflito entre negros pró-direitos civis, brancos contrários e a força policial
(Figura 11 e 12). O herói tenta intervir entrando no meio do conflito e logo é atacado no meio
da confusão por um jovem negro que o reconhece, imediatamente o jovem se desculpa, mas
enquanto os dois dialogam no meio da confusão o rapaz é atingido pelas costas por um tiro.
Rapidamente o Arqueiro Verde o coloca em seus braços e abre caminho na multidão para
leva-lo ao hospital, infelizmente lá o médico diz que nada mais poderia ser feito, levando o
herói às lagrimas enquanto um poema de Ernest Hemingway ecoa em sua cabeça (Figura 13 e
14). No epílogo, o herói decide se candidatar a prefeito em busca de poder fazer mais e diz a
Canário Negro que na confusão cinco foram mortos e vinte e cindo feridos. Na edição #88,
por conta dos prazos apertados a história não ficou pronta, então foram reeditadas duas
histórias antigas e na edição #89, que seria a última pela dupla – não a última de O’ Neil que
voltaria para mais algumas histórias do Lanterna Verde no futuro, mas sem seguir as ideias ou
ideias desse contexto –, foi publicada a “...And through Him Save a World” mostra a história
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de um ativista da natureza chamado Isaac que se põe contra projetos da Ferris Aircraft, os
seguranças da companhia de aviação acabam torturando e acorrentam Isaac no alto de poste.
Na edição #88, por conta dos prazos apertados a história não ficou pronta, então foram
reeditadas duas histórias antigas e na edição #89, que seria a última pela dupla – não a última
de O’ Neil que voltaria para mais algumas histórias do Lanterna Verde no futuro, mas sem
seguir as ideias ou ideias desse contexto –, foi publicada a “...And through Him Save a
World” mostra a história de um ativista da natureza chamado Isaac que se põe contra projetos
da Ferris Aircraft, os seguranças da companhia de aviação acabam torturando e acorrentam
Isaac no alto de poste. Antes disso, ainda há a dualidade entre a noção de justiça dos heróis,
Lanterna Verde acha que deveria levar Isaac a polícia porque ele sabotou planos da
companhia, já o Arqueiro Verde diz que os culpados são os chefes da companhia que poluem
o mundo e destroem a natureza. Os heróis tentam impedir que Isaac fosse levado, mas acabam
presos também, ao se libertarem horas depois não conseguem salvar o rapaz, que não resiste e
morre como deseja, para servir de exemplo e chamar atenção para sua causa. Carol Ferris,
dona da empresa e relacionamento amoroso do Lanterna Verde intervém e devolve as armas
dos heróis, mas diz que: “I suppose progress must Always claim victims!”. O suficiente para
o Lanterna Verde perder sua pose de bom moço respeitador da lei e destruir a frota de aviões
da companhia com seu anel. Depois de cancelada a série, os autores ainda escreveriam para os
personagens um história publicada em três partes e em três edições da revista The Flash #217-
219 em 1972 e uma pequena em The Flash #226 em 1974.
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Essa receptividade, positiva ou negativa, fica clara quando nos debruçamos sobre as
cartas publicadas nas edições com a impressão de alguns leitores. O leitor Charles N. Greene
de New York na edição #80 diz que “I hope you will continue the social education possible in
your magazine, depicting your man as not glorying in violence, but in sacrificing some of
their time for real help to the people they begin to rescue from oppression by our present
America.”, corroborando a nova condição do título, já no mesmo número o leitor Scott
Dickerson da California critica o idealismo expresso nas páginas e deseja que a abordagem
volte como era antes dos autores trabalharem na série: “About that green-glad caracter – with
the beard and the arrows. How about giving him his own magazine? Anything to get him out
of Green Lantern and get everybody favorite Emerald Warrior back to Coast City, Carol
Ferris – and sanity.”. Outro leitor na edição #81 ainda assinala que O’ Neil está estragando
uma década de boas histórias como “(...) propagandistic extravaganzas.”. Entretanto, a
maioria das cartas publicadas mostra satisfação dos leitores pela série, o leitor Peter Marzano
de Illinois diz na edição #81 que voltou depois de cinco anos a comprar revistas em
quadrinhos por conta da série, que diz ser “Current, relevant, provacative, dramatic, powerful
and metaphysically significant!”, outros cobram os autores quando eles descansam em uma
história ou outra dos temas relevantes para que voltem a perspectiva anterior. Sobre a história
“... and a child shall destroy them!”, o leitor Gary Kuhlmann de Iowa percebe o simbolismo
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politico presente: “I was surprised to see so much editorialism and symbolism ins this story.
I’am not saying this is bad”. É preciso destacar também o efeito da história “Snowbirds don’t
fly” nos leitores, causou um enxurrada de cartas discutindo o assunto e o comentário de Bill
Hoppe da California sintetiza mais ou menos o sentimento que ela causou: “The plight of
drug addicts has been presented to the public in various manners throught the media, but not
the one of those presentations has scared me more than Denny O’ Neil’s shocking story. Yes,
I am scared – scared for the untold number of unfortunable souls who have turned on to
drugs.”.
Na edição #89, um leitor faz um comentário crítico sobre a emergência do personagem
John Stewart, sagazmente o leitor Juan Cole diz que O’ Neil não escapou da mentalidade da
classe média americana ao deixar o personagem a sombra de um mentor branco e não dá-lo
um anel de poder próprio, relegando-o a um personagem secundário. Outro leitor ainda
ressalta as ações da história “What can one man do?”, pois sendo de New Orleans no sul do
país, Donald D. Markstein elogia a introdução do personagem negro e diz que consegue se
simpatizar com situação da história solo do Arqueiro Verde por ela ser algo que realmente
acontece, mais do que qualquer outra abordagem ao racismo antes na série.
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Lendo essas cartas destacas e as outras omitidas aqui por redundância e pela grande
quantidade, pode-se dizer que Dennis O’ Neil conseguiu atingir aquilo que buscava quando
redigia os roteiros dessas histórias, não somente por conta da intenção, mas segundo ele por
conta da situação das revistas em quadrinhos na época:
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prefeito de New York elogiando a coragem de se abordar os problemas das drogas e da
ameaça depois de representar Richard Nixon e Spiro Agnew em uma história de as revistas
não serem distribuídas na Florida pelo então governador democrata Reubin O’ D. Askew,
segundo Adams no documentário. Dos seus colegas de indústria que escolhiam as melhores
obras de cada ano pela Academy of Comic Book Art, O’ Neil ganhou o Shazam Awards nas
categorias “Best Continuing Feature” pela série, “Best Individual Story” pela história“No
evil shall escape my sight!” publicada na edição Green Lantern #76 junto a Neal Adams e
“Best Writer (Dramatic Division)” em 1970. Neal Adams recebeu o prêmio na categoria
“Best Pencil Artist (Dramatic Division)” também em 1970; Em 1971 O’ Neil e Adams
ganhariam novamente por "Snowbirds don't fly" publicada em Green Lantern #85 o prêmio
“Best Individual Story”. Os dois em 1985 foram escolhidos na publicação especial sobre os
50 anos da editora DC Comics, “Fifty Who Made DC Great”, como duas das cinquenta
pessoas que fizeram a editora grande. Dennis O’ Neil ainda mais tarde escreve em 2001,
demonstrando o prestígio que continuou a ter na editora, apesar de ter saído para trabalhar na
Marvel Comics, o Guia Oficial DC Comics – Roteiros (DC Comics Guide to Writing for
Comics,). Neal Adams continuou a desenhar e atualmente para as duas grandes editoras,
Marvel Comics e DC Comics quando solicitado, sem exclusividade.
A tentativa aqui de análise das fontes em que se configuram a série “Green Lantern
Co-Starring Green Arrow” se insere na ideia de uma história de natureza etnográfica, que
busca um significado inscrito pelos contemporâneos em sua produção cultural, além de tentar
entender como funciona a tentativa de representar em determinada linguagem algo relativo ao
seu contexto, como instrumentos de transformação da realidade, em consonância com o foco
da chamada história cultural:
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Para o Burke (2003, p. 227), as imagens não são nem um reflexo da realidade social
nem signos em um sistema sem que não tenha relação com a realidade social, na verdade
pensa que elas ocupam posições variadas entre essas duas extremidades, pois elas são tanto
testemunhos dos estereótipos quanto de mudanças pelas quais os indivíduos enxergam o
mundo social, inclusive aquelas que fazem parte da imaginação. A maioria dos documentos
históricos, bem como no caso as imagens, não foram feitas para ser uma evidência histórica,
mas tiveram seu papel na experiência cultural da sociedade. As imagens não são somente
testemunhos das disposições sociais do passado, mas, sobretudo testemunha de modos que se
pode ver e pensar aquele determinado passado. São visões contemporâneas daquele mundo
que idealizam e satirizam o que representam. Tal perspectiva de Burke se relaciona com a
perspectiva que prefiro adotar sobre a ideia de utilizar as histórias em quadrinhos como
documento histórico, o qual seria a de que elas se constituem melhor como formas
expressivas do imaginário de uma sociedade a respeito de seus desejos, medos e sonhos, ou
seja, como mediadores culturais de uma “visão de mundo”, como uma metáfora ou na
perspectiva de Geertz, uma descrição densa da sociedade (GEERTZ, 1989).
Em uma realidade no qual o real ou a verdade é cada vez mais dependente de uma
construção cultural, o papel do historiador se desloca da do objetivo de contar a verdade sobre
um determinado fato para o objetivo de conhecer diferentes verdades a fim de entender como
foram construídas, não se isentando de escolher aquela que deve descrever e analisar a partir
de determinado significado. Para finalizar este capítulo, acredito que a pesquisa a ser
desenvolvida a partir das treze edições da série Green Lantern Vol. 2 (Green Lantern Co-
Starring Green Arrow), tem como objetivo não somente justificar a utilização das histórias
em quadrinhos como fonte histórica, mas se aproxima muito do que Geertz assinala sobre a
descrição etnográfica: “Assim, há três características da descrição etnográfica: ela é
interpretativa; o que ela interpreta é o fluxo do discurso social e a interpretação envolvida
consiste em tentar salvar o “dito” num tal discurso da sua possibilidade de extinguir-se e fixa-
lo em formas pesquisáveis.” (GEERTZ, 1989, p. 31). E a imagem, no caso as histórias em
quadrinhos, como espero ter explicitado, conseguem de maneira criativa capturar a
efervescência do contexto político-cultural de determinada temporalidade de forma
profundamente imersiva.
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