Ditongos Do Latim Ao Português
Ditongos Do Latim Ao Português
Ditongos Do Latim Ao Português
Os ditongos
do latim ao português
Laura Rosane Quednau
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Introdução
Do latim clássíco ao vulgar. nota-se redução a uma única vo-
gal dos ditongos ~t. n11 e ot:
•cnt/11 -1 c(:/lu
•tarmt -1 1/MO/ro/t[o/ro
• poenn -1 p(!/IUI
Percebe-se que há uma resistência maior para au. que apre- Em português, .os ditongos são latinos ou românicos. confor·
senta variante [o]. Segundo llari (1992), Câmara )r. (1957). Couti• me remontam ao latim. ou só aparecem na época da formaç3o do
nho (1976) e Maurer Jr. (1959). entre outros. há também a criaçlio ro~nce. A tendência ra:a se reduzirem ditongos latinos a simples
de novos ditongos pela queda de consoantes intervodlicas ou pela vogaiS ascende ao própno latim vulgar, onde encontramos formas
vocalizaçlio de consoantes: como celm (caelebs). sq~is (saepis). clostrum (claustrurn). Trazemos
exemplos apresentados por Coutinho (1976) sobre como se dá a
• arruwi ""' amafjl passagem desses ditongos do latim ao português.
• malu ""' ma[wl Passemos a tratar, então. de cada um dos ditongos.
• ltgt ...... lt[jJ
• alttn! ""' o(w/tro 2.1 Ae
• abse11tia ""' a[w/sência
. O ditongo ae era pronunctado como um ditongo. soando dis-
A partir dessas observações, verificamos a neces.~idade de tintamente o a e o e. como referem os gramáticos latinos. Às vezes
reunir informações sobre como tem sido descrita a evolução dos encontra·se a grafia ai ao invés. de ~e ~a literatura, como, por
ditongos já existentes e o surgimento de novos ditongos do latim e~e~plo, em um poema de Vorgílío. p1cla1uestís e aquai. A pronón-
ao português. analisando a motivação de sua redução quando esta c~~ d1tongada do ne latino é ainda atestada em exemplos como Cae-
ocorre. Para tanto. apresentamos cada ditongo separadamente,
mostrando como cada um se comporta nos três estágios analisa-
?lia, '?'t$11'
e Caesares. A_s inscrições latinas. mesmo as da época
1mpenal, apresentam o d•tongo a1 em vez de ae: Ti. Clmtd. Caisar.'
dos: latim clássico. latim vulgar e português. Tratamos. também, A pronúncia co~o. monotongo (ls]) era considerada pelos
de algumas caus;\s de formação de ditongos em português, mos- romanos como um rushciSmo. e por isto condenada pelos gramáti-
trando como surgiram. em português, dítongos que n.'o existiam cos. A alternância de llL e t se ob;erva nos representantes români-
em latim. Por fun. apresentamos um quadro-resumo, sintetizando cos de
as informações mais importantes do trabalho: quais dítongos per-
maneceram((au). (1'11), ui, a1), quais foram reduzidos (at -+ [c]. oe -+ • Oitlum (port. rb<, esp. cielo, J'I'OV. e cal. cd, franc. riel, it. cie/o)
(e). au -+ {owl/(o]. tu -+ [o] e [uD. quais surgiram por outros pro- • quatrtrt (port. e esp. qumr, prov. quem, fr. anL lflll'l'7't. iL dr~)
cessos (ali, ti, ai, ou, oi) e quais são as causas da formaçllo de diton- ya1~ lembra~ q~e temos três tipos de pronúncia em latim:
gos em português (smcope, vocalização. metátese, epêntese). prOnUf\Cia reconstltu•da, vemacular e eclesiástica ou italiana. Inte-
ressam-nos ~ duas primeir~. A pronúncia reconstiturda é a que
2 A evoluçlo dos ditongos do latim ao português tenta recons~t01r como o latim clássico era pronunciado. Para tan-
to, os ~stud•~ buscam amparo em infonnações dos próprios
O latim clássico apresentava os grupos de letras ne e oe. que se ~amátlcos latinos e nas semelhar.ças encontradas entre as diversas
enunciavam como /e/ e no latim vulgar sofreram, respectivamen- lt~gu.as românicas. O segundo tipo de pronóncia referido, a pro-
te, a evolução do /e/ e do /é/. Um ditongo decrescente /au/. nunaa vemacular, é o que se aproxima mais da língua materna de
escrito ali, apresentava uma vari<lnte /o/, que a disciplina grama- cada país de língua românica. Assim. o ditongo ae é pronunciado
tical rejeitava. mas muito cedo se tornou preponderante em Roma c<nn()
e em grande parte da România (Câmara Jr.. 1957). Segundo Faria
(1970), os ditongos mais freqüentes no latim clássico eram ate au. • pronóncia reconstituída: ae = ai {aj]
Os ditongos Ot. eu e ui eram raros ocorrendo em poucas palavras. • pronúncia vemacular: ae = {t)
Maurer Jr. (1959) afirma que a língua vulgar conservou au,
mas redUl'-iu cedo ae e Ot a simples vogais longas ({t:] e (e:]). Al-
guns ditongos novos surgem ma:s tarde pela queda de consoantes
(malu >mau. ltgt > 11'1. mdi(t) >vai). por metátese de i e de 11 (prima-
riu > primtiro), etc.
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Há um caso em que o ditongo a1t, quando é átono e está em
Portanto, o tipo de pronúncia corresponde ao que se sabe so- início de palavra, se reduz a a, se a snaba seguinte tiver 11. Ex.:
bre esse ditongo em latim clássico c em português: em latun é pro- Agusto por Augusto (ocorre nas inscrições em Pompéia). Isso é am-
nunciado (ajJ e, em português, passou a (t]. É importante ressaltar plamente confirmado pelas formas romãnicas. o que se vê pelos
que. quando ae é pretõnico. reduz-se a i ou t: derivados dos termos latinos, como augustu (it. agosto, fr. amlt. esp.,
agost, por!. agosto.)
aequak > igual Em português. au transforma-se em ou. Provavelmente
aetate > idade nu-ou......, (passou a ou e variavelmente para o).'
ladilia > lediça (are.)
.usliw > tslio thtsauru > tesouro
atstimare > esmar (are.) ta11ru > fOIITO
)MIICII > pouco
Por outro lado, ae tônico dá (t]' causu > cousa
Clldu >ciu lauru > louro
caecu >cego auru > ouro
praesto > presto rauetJ > rouctJ
saepe > sebe pousare > pousar
f= > fcus
Desde o im~rio, por influência dialetal, tendia este ditongo
Devem ser de origem dialetal a transformar-se em o na ICngua da plebe. Assim se justifica que
praeda > pera > preia (presa) esteja representado também, em português. por o:>
Slld > S<'da poupere > •popere > pobre
Nas inscrições hispânicas. esse ditongo aparece reduzido a e attriettln > oric(u)la > orelha
do século I em diante. fauce > foce > ftn.
ca1tda > coda > c6a (are.)
2.2 Au Conforme Vasconcélloz (1900). são de origem erudita, ou in-
O ditongo decrescente !aw], escrito au, era pronunciado co· troduzidas na linguagem popular em tempos relativamente re-
mo um verdadeiro ditongo, prática esta consagrada mesmo na centes, as palavras portuguesas que retêm o ditongo au, como
pronúncia tradicional portuguesa e brasileira. Entretanto, apre- claustro, náusea, CIIIISII, pousa, lauda, caule, a~uda, aula, etc.
sentava uma variante (o], que se tomou con;'um em Roma e nas
províncias distantes. Essa redução de a11 a o e uma alteração mu•· 2.3 Oe
to observada pelos gramáticos latinos. Maurer Jr. (1959), en!re O ditongo ot era relativamente raro no período dássico,
outros autores, apresenta dois exemplos .nteressantes da pronun· aparecendo mais freqüentemente em palavra$ ~as intro<lul.i·
da vulgar do ditongo au: das no latim, onde é empregado para transcrever o ditongo grego
• Suetônio conta que Vespasiano, cor~gido ~r Aoro q~ando
dizia plostrum em lugar de plaustrum, no dta segumte cumpnmen·
tou-o. chamando-lhe Flaurum (por Florum). . z Niedermann (1953) tttN.ItJ quem.~. herança do indo--europt'U tt.tnsfocmou...e em O
• Claudius Pulcher, em 59 a.C. se fez adotar por uma famfita em latim no fim do UI Soéc. a.C. F.xtmplos:
plebéia, para poder ser eleito tribuno da plebe. mudando seu nome jowxmmtom > jQmmtwm
noutn.r > ndtrix
para Clodius. Undsay supõe qu~ ele me;; mo tenha adotado a forma Da mttm~ foR qwtt, anteft l:rMdomu.r-.em.r. passou por I , • puugemMt:nt
Clodius por Claudius para conquistar a sunpatia da plebe. • • d - peta ....,. Ir>~« """"'CI.Ddllll de toua111.
3 No ponuguês, o dU,onso 011 tamWm •htmOu <Om or (cou.SII - toU~~).
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