O Mal e o Sofrimento - Louis Lavelle
O Mal e o Sofrimento - Louis Lavelle
O Mal e o Sofrimento - Louis Lavelle
Não é logo mais causa de espanto, a relação singularmente estreita que une a dor
à consciência de si. Pois o próprio do conhecimento ou da vontade é aplicar nossa
atividade a um objeto exterior a nós; é nos distanciar de nós mesmos e nos
distrair. E muitos pessimistas podem mesmo pensar que o melhor efeito do
conhecimento e da ação é produzir o esquecimento de si. A alegria que provamos
em compreender, em criar, é a mesma alegria que provamos em sair de nós
mesmos. A sensibilidade, ao contrário, nos traz a atenção para nós mesmos. Mas
há nesse ponto muita diferença entre o prazer e a dor, pois o prazer é
naturalmente expansivo. Há nele uma espécie de abandono a nós mesmos que é
um abandono DE nós mesmos. Nós não temos a consciência de termos sido felizes
senão quando não mais o somos. A boa fortuna cria entre nós e o mundo uma
harmonia onde a consciência tende a se dissolver. Mas a dor nos isola. Quando
sofremos, estamos sós. Quando digo “penso, logo existo”, ou mesmo “ajo, logo
existo”, eu descubro, junto com a minha existência pessoal, uma existência mais
vasta da qual eu participo; eu existo comunicando-me com o mundo. A existência,
tal como ela se mostra a mim na dor, é a do eu individual naquilo que ele tem de
privilegiado e de único, no momento em que ele cessa de se comunicar com o
mundo, o qual não lhe está presente senão para o oprimir e o obrigar a reclinar-se
sobre si mesmo.