Artigo ENEGEP 2011 PDF
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DESENVOLVIMENTO DE
COMPETNCIAS ESTRATGICAS
PARA INOVAO: EVIDNCIAS A
PARTIR DO CASO DO SETOR
AUTOMOTIVO BRASILEIRO
Thiago Leite de Moura e Souza (UFMG)
thiagocyb@gmail.com
Maria Cecilia Pereira (UFMG)
cecilia@dep.ufmg.br
Ana Valeria Carneiro Dias (UFMG)
anakuty@yahoo.fr
Marina Coelho Bachour (UFMG)
marinabachour@globo.com
Raoni Barros Bagno (UFMG/PUCMG)
rbagno@pucminas.br
1. Introduo
A inovao tornou-se um assunto estrategicamente importante para as empresas no terceiro
milnio. A percepo de que novas tecnologias, novos produtos e processos podem propiciar
importantes vantagens competitivas, que vo alm da otimizao da produo (DE NEGRI et
al, 2005), potencializa a ideia de que a nova estratgia exige um remanejamento da estrutura
organizacional e maior planejamento interno para alcanar e sustentar uma organizao que se
pretende inovadora.
No caso especfico do setor automotivo e, em especial, dos fornecedores de motores,
tecnologias inovadoras, particularmente aquelas que reduzam emisses, permitam a
explorao de fontes alternativas de combustvel e aumentem a eficincia esto se
transformando em uma questo de sobrevivncia de todo o setor.
O objetivo deste artigo apresentar resultados de pesquisa acerca do desenvolvimento de
competncias para inovao em uma empresa brasileira. Um dos resultados apresentados
um instrumento gerencial, a matriz Competncias x Etapas da Inovao, que propicia s
organizaes a identificao das competncias consideradas importantes para a inovao,
analisando as caractersticas particulares de cada etapa do ciclo de inovao. A pesquisa e a
posterior construo do instrumento apoiaram-se em um estudo de caso que objetivou
compreender e comparar dois casos de sucesso de inovao em uma subsidiria brasileira que
desenvolve e produz motores e transmisses.
A partir deste estudo de caso, procurou-se compreender como ocorre o desenvolvimento de
competncias para a criao de capacidade para inovao no processo de Pesquisa e
Desenvolvimento de produtos da empresa. Alm disso, investigou-se quais so as variveis
importantes para que uma empresa esteja capacitada a inovar, isto , busque a renovao e o
desenvolvimento de competncias individuais e a institucionalizao desses processos
voltados para a inovao.
O artigo estrutura-se da seguinte forma: a metodologia de pesquisa explicitada
primeiramente; a seguir, apresenta-se o conceito de inovao e diferentes abordagens sobre o
processo de inovao, com foco na perspectiva da cadeia de valor; as competncias
estratgicas para inovao, cujo desenvolvimento d suporte ao processo de inovao, so
conceituadas e categorizadas em seguida; ao final, o estudo de caso apresentado e discutido,
para que seja construda a matriz que relacione as competncias com as etapas da inovao,
importante para direcionar os investimentos em desenvolvimento de competncias
identificadas como prioritrias.
1.1 Metodologia de pesquisa
A pesquisa consistiu em um estudo de caso aprofundado, no qual predomina a dimenso
qualitativa, uma vez que se trata de aprofundar na compreenso de um fenmeno particular
a construo de competncias para a criao de capacidade de inovao, considerando-se as
diferentes etapas do processo de inovao (YIN, 1994). A subsidiria brasileira de uma
empresa de motores e transmisses constitui o universo social e cultural da pesquisa, tendo
sido focalizado o setor de Engenharia do Produto.
O estudo de caso consistiu na compreenso e confrontao de dois casos, com trajetrias
distintas, considerados pelos atores como bem sucedidos em inovao. A escolha de casos
cujo processo de inovao foi estruturado de maneiras diferentes constituiu uma base para
entender as vertentes do prprio processo e permitiu definir algumas das competncias mais
importantes que as pessoas envolvidas em projetos de inovao possuem. Esses dados foram
essenciais para relacionar as competncias consideradas importantes para a inovao com as
peculiaridades de cada etapa do processo que envolve conceito, planejamento e aplicao de
ideias.
Dentro da proposta metodolgica empregada na realizao da pesquisa, os seguintes tipos de
acesso foram utilizados:
Pesquisa documental: anlise de documentos (relatrios, pesquisas j realizadas,
histricos) disponibilizados pela empresa;
Entrevistas semiestruturadas: realizao de entrevistas com roteiros constitudos por
tpicos mais gerais, que no so previamente desdobrados em sub-tpicos. As
verbalizaes foram gravadas em udio e transcritas na ntegra para a realizao das
anlises.
A anlise documental foi baseada nas consultas a documentos disponibilizados pela empresa.
Os dados coletados foram analisados ao longo do processo de obteno dos mesmos e em
discusses posteriores realizadas entre os integrantes do grupo de pesquisa.
As entrevistas semiestruturadas foram realizadas com os principais envolvidos nos dois casos
estudados, dentre engenheiros de produto, gerentes de engenharia de produto e gerentes de
plataforma de produto. Os dilogos com os atores foram guiados por roteiros bsicos, dentro
de tpicos gerais preestabelecidos constituio da equipe de projeto, etapas do projeto,
quem participou de cada etapa, metodologias para gesto do projeto (indicadores e metas de
prazo/oramento), existncia de recompensas para os participantes, etc. apenas para definir
uma sequencia lgica de conduo. As verbalizaes, contudo, procuraram dar abertura para
que os entrevistados chamassem ateno para o que lhes parecia importante e significativo
(GURIN et al, 2004). Dependendo das situaes que eram apresentadas, a tcnica de escuta
atenta era utilizada para lanar perguntas no pensadas inicialmente, a fim de tentar
compreender aspectos mais relacionados prtica situada em determinado contexto.
Com relao especificamente identificao de competncias, uma questo direta nas
entrevistas perguntava, para cada categoria de competncias estratgicas para inovao
(conforme as definies apresentadas na seo 3), quais estavam presentes e quais eram
importantes; alm disso, indiretamente, por meio de outras questes do roteiro bsico,
identificaram-se aquelas que foram efetivamente mobilizadas para o sucesso do projeto.
2. O processo de inovao
Inovao pode ser entendida como a explorao bem sucedida de novas ideias; o sucesso est
relacionado capacidade de introduzir e difundir novos produtos, processos e servios para
sociedade (TIDD et al, 1997). Tal definio implica considerar a inovao como um processo,
que se inicia com uma nova ideia, passa pela seleo de solues para aplicao de tal ideia,
em seguida pelo desenvolvimento da soluo com vistas a transform-la em novo produto,
processo ou servio, finalizando com a efetiva introduo do novo produto ou servio no
mercado ou com a aplicao do novo processo. Como todo processo interno a uma
organizao, o processo de inovao pode ser gerenciado, ou seja, pode-se formalizar,
planejar e controlar o processo de modo a obter maior eficincia e eficcia. Para tal, a
primeira providncia mapear o processo, ou seja, compreender suas etapas, os atores que
delas participam, as recursividades e os objetivos a serem alcanados em cada fase.
Vrios autores propem diferentes abordagens para a estruturao do processo de inovao.
Tidd et al (1997) propem que o processo de inovao constitui-se de quatro fases:
Descrio
Exemplo
Atitude de crena e
perseverana com relao ao
conceito
Visualizao de oportunidades,
definio de um problema de
pesquisa
Conhecimento especialista /
experincia
Identificao de pessoas-chave
Habilidade de relacionamento
com as pessoas no trabalho
Conhecimento do conceito
Conhecimento de metodologias
institucionais e documentos
necessrios
Atitude de autonomia /
iniciativa
fornecedores,
Saber
identificar
responsabilidades
delegveis e distribui-las de modo justo e
racional.
Habilidade gerencial
institucionalizado.
pessoalmente realizado.
Fonte: Os autores
Tabela 1 - Descrio e exemplificao das competncias identificadas
Fraco
Conceito
Mdio
Planejamento
Forte
Desenvolvimento
No se aplica
10
No se aplica
Fonte: Os autores
Tabela 2 - Matriz Competncias x Etapas da Inovao
11
estudo dos dois casos possibilitou que as competncias fossem associadas a cada grande etapa
da cadeia de valor da inovao, como consta na Tabela 2. O objetivo da matriz foi explicitar o
grau de importncia de cada competncia segundo a etapa da cadeia de valor: forte, mdio ou
fraco. O grau de importncia de uma competncia em cada etapa foi classificado pela equipe
conforme a anlise das entrevistas realizadas, luz das categorias de competncia elencadas
na seo 3 e validada pelos atores. O propsito dessa classificao foi possibilitar empresa
que oriente suas aes conforme a etapa que deseja priorizar, seguindo a proposta de Hansen
e Birkinshaw (2007); ou seja, caso a empresa avalie ser necessrio fortalecer a etapa
"conceito", deve priorizar o desenvolvimento das competncias fortemente relacionadas a
essa etapa, e assim por diante.
6. Consideraes Finais
A presente pesquisa visou identificar competncias estratgicas para alcanar capacidade para
inovao na subsidiria brasileira do setor automotivo e, alm isso, buscou oferecer uma
ferramenta gerencial ao relacionar as competncias com as etapas da inovao, com o intuito
de nortear os investimentos em competncias apontadas como prioritrias para o grau de
inovatividade desejado pela organizao. A matriz construda subsidia a compreenso do
percurso das competncias para inovao na empresa estudada, bem como auxilia na tomada
de deciso e construo de instrumentos. Trata-se de uma reflexo contextualizada, situada
nas prticas da engenharia de produto nos casos analisados. Por outro lado, acredita-se que a
discusso possa ser direcionada para outras organizaes do setor automobilstico,
considerando o quadro da inovao, desde que sejam respeitadas as particularidades de cada
universo de estudo.
possvel arguir, a partir do estudo dos dois casos bem sucedidos, que inovaes mais ligadas
ao conceito e que no surgem de uma demanda direta do cliente (Caso Motor) podem ser
consideradas mais arriscadas do que aquelas que nascem de um pedido do cliente e
geralmente exigem uma adaptao de algo j existente (Caso Transmisso). Da surge uma
questo: se, para ter capacidade para inovao, necessrio desenvolver determinadas
competncias estratgicas, como definir quais so prioritrias? O grau de inovatividade
desejado pela organizao algo estritamente estratgico. Sendo assim, se a organizao
desejar inovaes mais disruptivas, dever focar-se, sobretudo, no desenvolvimento de
competncias mais fortes na fase conceito, enquanto que se ela almejar inovaes
incrementais ter de desenvolver competncias mais relacionadas ao planejamento e
desenvolvimento.
A escolha de estudo de casos de sucesso, como os dois tratados neste artigo permitiu definir
algumas competncias que as pessoas envolvidas em projetos de inovao possuem. Embora
esses casos tenham trazido muitas descobertas a respeito do que poderiam ser competncias
estratgicas para inovao, e at boas prticas organizacionais para inovar, como propuseram
Dias et al (2011), eles no auxiliam na compreenso dos fatores que podem atrapalhar o
percurso da inovao, isto , identificar elementos, como competncias ausentes, que foram
determinantes para que um projeto no pudesse avanar em alguma etapa de go/kill no PDP
da organizao. Nesse sentido, pretende-se, a partir de agora, estudar casos de inovao
interrompida, o que poder constituir uma base para que as competncias sejam comparadas,
com o objetivo de se chegar a resultados mais completos sobre como construir uma
organizao inovadora.
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