Analise Santa Chuva
Analise Santa Chuva
Analise Santa Chuva
Fazendo a análise do texto “Santa Chuva” de Marcelo Camelo, interpretado por Maria
Rita, utilizando o foco de leitura autor – texto –leitor, como mulher, pude experimentar uma
gama de sentimentos que envolvem o fim de um relacionamento amoroso.
O titulo do texto, “Santa chuva”, através da estratégia de leitura da antecipação e
hipóteses, me trouxe, em principio, a lembrança da falta de chuva, pois quando sentimos a
falta de determinadas coisas, é que as valorizamos. Trouxe toda uma memória religiosa de
orações e romarias pedindo a água, ao mesmo tempo que a gratidão quando a chuva vem para
regar a terra e fazer brotar a vida. Também a questão da sobrevivência, da necessidade do
cultivo da terra e de quanto a chuva contribui, ou não, para isto. Mas ao continuar a leitura,
nos primeiros versos, esta hipótese já cai por terra, pois percebe-se quase uma ironia ao
nomear o texto de “Santa chuva”, já que a chuva está provocando mal estar, como diz o verso:
“Que o povo já se cansou de tanto o céu desabar”.
O elemento religioso contido no texto, ao pedir ajuda ao “santo” é o contrario do
esperado, e traz uma intertextualidade com a “Suplica Cearense”, de Luiz Gonzaga, onde o
texto pede que a chuva pare, através da oração. Apesar da hipótese do pedir chuva ter sido
trocada pelo pedir para parar de chover, ainda assim, parece falar do elemento da natureza
“chuva” e suas consequências para o homem.
Mas esta hipótese é novamente quebrada nos versos “Se a chuva quer é trazer você
pra mim.Vem cá, que tá me dando uma vontade de chorar” Neste momento, já há uma duvida
de que chuva se está falando e a vontade de chorar faz pensar que a chuva pode ser “interna”,
um estado de espírito, e “externa”, alguém que chora já por algum tempo sem parar. “A
chuva quer trazer você para mim”, dá para ligar com um dito popular de que “ quem não
chora, não mama”, ora, que o choro tem o poder de conseguir trazer aquilo que queremos,
um poder de convencimento sobre o outro, uma arma que muitos utilizam em ultimo caso e
outros em todos os momentos.
A sequencia, quando o verso diz “Meu coração vai se entregar à tempestade...” parece
que o choro não está convencendo a quem gostaria de convencer, e a tempestade parece um
grande volume de água sem controle, com outros elementos, como raios, trovões, que
geralmente causam estragos em todos os sentidos. Uma chuva mansa pode regar a terra e
fazer brotar a plantação. Uma tempestade pode acabar com tudo, lavar a terra, produzir
sulcos, levar as sementes, uma verdadeiro estrago. Levando para o sentimento que o texto
parece provocar, é como se fosse um aviso que a situação vai mudar, que é a ultima chance de
uma reaproximação. Faz uma intertextualidade com a música “Vambora” de Adriana
Calcanhotto. A urgência de algo acontecer que restaure toda a confusão formada. E o tempo
determinado para isso, em uma: “você tem meia hora pra mudar a minha vida” e em outra :
“Não faz assim, não vá pra lá, meu coração vai se entregar à tempestade...
A segunda parte do texto, pela carga emocional que o som traz, começa mais agressiva
e dá a sensação de uma mudança, não mais de choro, mas de raiva e ao mesmo tempo de
superioridade da mulher. Agora é claro o texto ao dizer “ cadê aquela outra mulher”, que é
uma mulher que está falando. A primeira parte do texto não faz esta referencia, mas como
leitora, acredito ser a mesma mulher, antes numa fase apaixonada e sentindo a ausência do
amado. Como a paixão acaba, especialmente quando é maltratada, isto explicaria a mudança
de atitude da mulher.
A segunda parte parece uma resposta, mesmo que inicie com uma pergunta: “Quem é
você para me chamar aqui se nada aconteceu?” Posso imaginar, pelo tom da pergunta, que o
amado agora busca uma reaproximação, mas que é rejeitado pela mulher, especialmente pela
sua atitude anterior e suas motivações atuais. É como se a mulher, ao estar apaixonada,
perdesse a capacidade de consciência, de avaliar a situação, e isso a torna mais vulnerável.
Mas o sair da paixão, o sofrimento a faz retomar a sua consciência e agora é capaz de
perceber as reais intenções daquele a quem ela dedicou o seu amor. Neste momento o que
antes era suficiente para agrada-la, não serve mais. Ela se torna mais real, e duvida da afeição
que o amado parece oferecer.
A intertextualidade pode se apresentar na música “To fazendo falta” de Joana, com o “
você me parecia tão bem” e “Jeito de que está feliz, De quem está de bem com a vida. Sei lá,
Mas alguma coisa não me convenceu.” Um pouco irônico, e faz ligação com o final do texto
“Meu coração já se cansou de falsidade...” criticando o viver de aparências, mesmo não
estando bem. A mulher busca um relacionamento verdadeiro, concreto e não uma ilusão.
Os elementos trabalhados no início do texto voltam: “chuva, rezar, santo, povo, TV”, o
que faz pensar que a segunda parte seria uma resposta a primeira parte da musica, e que ela
estaria dizendo ao amado que ele não tem o direito de se utilizar destes elementos para
justificar sua atitude, que não há perdão, nem volta, que ninguém, nem o sobrenatural, nem o
humano, estará do lado dele. Parece um pouco duro da parte dela, cruel até, o “devolve aquela
minha TV” parece um divisor de águas, um marco que nada dela deve ficar com ele, por que
ele não a tem mais.
Mas a mulher volta á sua doçura própria ao explicar o porque de tudo isso: Não há
porque chorar por um amor que já morreu. Deixa pra lá. Eu vou, adeus” A vida continua. A
chuva passou. A dor passou.
O texto não é obvio. Buscando outros conhecimentos, me remeto ao rio Nilo, nos
tempos antigos, que após chuvas e enchentes, ficava com uma grande área fértil, capaz de
gerar alimentos e enriquecer o Egito. Uma mulher, quando faz esta experiência do apaixonar-
se, e dentro da paixão, descobrir sua consciência, só tende a crescer enquanto mulher,
enquanto pessoa humana. Apesar do sofrimento, da dor, das lagrimas, pode sair transformada,
como as margens do rio Nilo, e provocar no homem também um crescimento.
A partir desta experiência de leitura percebo que realmente precisamos de muito
conhecimento de mundo para aventurar a ler, e que certamente cada um lê a partir de onde
está.