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Language:
Português brasileiro
Stats:
Published:
2019-10-11
Updated:
2020-10-19
Words:
64,651
Chapters:
17/?
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8
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314

Segunda Chance

Chapter 17: Reflexo

Chapter Text

HITSUGAYA POV

Eu disse.

Realmente disse para ela.

Karin me fitava impressionada, meio desnorteada e esse ar desprevenido invés de me deixar inseguro apenas aumentava essa sensação tenra, cálida que sentia no peito. Acho que meu corpo todo estava assim, mergulhado nesse calor. Não consegui desviar o olhar do seu e logo seu rosto corava num tom forte de rosado. Quase sorri, com certeza eu estava igual. Não importa quantas vezes eu veja esse rubor, sempre esse contentamento e prazer me inundava.

Saber que não sou o único a reagir assim, que ela não é indiferente à mim.

Mas agora é diferente. Invés de me acalmar, uma ansiedade me tomava junto com àquela ânsia de ontem. Era mais intensa do que antes enquanto admirava a garota diante de mim. Um lado meu tinha grande vontade de dar a volta pela mesa e esquecer que não estávamos sozinhos nesse restaurante, mas por outro... Eu não quero estragar o que já temos. Karin estava tão mais à vontade perto de mim que não quero me arriscar. Prova disso é ainda não ter fugido depois do que eu disse. Grande progresso.

Engolindo em seco, ela molhou os lábios num gesto de nervosismo e o ato atraiu meu olhar. Eles brilhavam úmidos assim, pareciam mais rosados, macios... Aumentaram esse calor por dentro, me deixando mais quente principalmente quando os entreabriu.

- T... Toushirou....

Um toque de celular a interrompeu, quebrando esse clima entre nós e tanto eu como ela pestanejamos de susto. Rápido ela alcançou a mochila o pegando de um bolso e aproveitei pra respirar fundo encarando a mesa. Merda... Ter confessado que a segui para o Secundário de Karakura não foi só embaraçoso. Foi perigoso. Estou mal conseguindo me segurar agora. Apertava os punhos, inspirando e expirando em tentativa de baixar... Toda essa vontade.

Estava tão distraído me reprimindo que mal percebi o toque parar. Levantei o olhar, estranhando ao ver Karin encarar o display confusa quando o toque de chamada retornou. Suspirando ela atendeu com a voz apática.

- Oi.

A pessoa respondeu e pude ouvir pelo volume meio alto da chamada que era um cara. O tom mal humorado deixou claro isso.

- Eu disse que ia chegar mais tarde – ele disse mais alguma coisa, a deixando irritada e num suspiro conseguiu disfarçar – Não tem nada de errado comigo. Impressão sua.

Era estranho ver o quanto ela se esforçava em parecer calma, visto o quanto era geniosa. Assistindo em como ela ficava tensa ao escutar e segurar um sorriso quase debochado com um olhar irritado para o nada, estreitei os olhos. Essa conversa, ou melhor, discussão era algo frequente e tinha um detalhe importante. Karin e esse sujeito eram íntimos. Bem íntimos. A noção disso me incomodou, dando uma sensação de mal-estar e péssimo humor.

De repente, ela arregalou os olhos indignada.

- Claro que não!

Esse cara não escutou e tentei controlar minha expressão. A última coisa que precisava era ela saber que também estou irritado. Péssima impressão, acredite.

- Ichi-nii, eu disse que não.

Ichi-nii... Franzi o cenho intrigado com o nome. Se virando pra mim ela me olhou derrotada.

- Onde estamos?

- Shibuya, centro comercial.

Respondi por reflexo e rápido ela voltou atenção para o celular.

- Num restaurante de okonomiyaki no centro comercial de Shibuya, perto da estação de metrô – mal ela respondeu e ele disse algo a deixando mais estressada – Por que você quer saber? É uma reunião, claro que estaria com alguém.

Oh... Então ele me ouviu. Senti um prazer secreto por esse sujeito saber que ela não estava sozinha.

- Com o capitão do time, satisfeito?

Pareceu que sim já que não ouvi depois nenhuma frase desaforada e o fato disso aumentou meu ego. Não entendia o que falava com ela, mas o tom superior já me fazia não ir com a cara do sujeito.

- Tá bom, até mais tarde.

Desligando, Karin guardou o celular na mochila.

- Quem era?

- Meu irmão.

Um alivio me inundou. Era apenas seu irmão... Agora faz sentido o nome e tentei disfarçar o constrangimento. O que deu em mim de pensar que era algo mais? Vendo o quanto estava chateada, senti simpatia por ela. Afinal mesmo não sendo do mesmo sangue, Hiyori sabe ser uma irmã bem irritante. Seja lá o que seu irmão disse antes de se despedirem a incomodou e convenceu, tanto que não escondia o desânimo.

- Ele virá te buscar?

- Sim.

Seus ombros murcharam enquanto mordia o lábio. Em outro momento teria me distraído como antes, mas agora...

- Parece preocupada.

Pestanejando, ela me olhou angustiada me intrigando e pegou um copo. Bebericando a água nele, murmurou inquieta.

"Nem faz ideia."

- Como?

- Nada.

Mas pude ouvir.

Não tivemos que esperar muito e logo pela vidraça para a rua vimos um carro preto estacionando perto da estação de metrô. Não era tão distante do restaurante. O motorista assim que saiu do carro atraiu atenção. Era alto, um universitário e parecia bem nervoso. O cabelo laranja e despenteado se destacava como do seu amigo que desceu do carona. O tom vermelho visível daqui. O jeito deles no entanto foi que me intrigou.

Olhavam ao redor, procurando e andando apressados ao atravessarem a rua. Discutiam e o de cabelo vermelho tentava acalmar o outro, ainda mais quando esse olhou diretamente pra cá e caminhou mais rápido até aqui. Suspirei fundo, me recostando no assento bem a tempo quando entraram e ignoraram o garçom caminhando até essa mesa.

Se ainda tinha dúvidas de quem seria o irmão confirmei quando o cara de cabelo laranja me encarou. Ele me analisava com a carranca mal controlada e medindo minha aparência. Só essa atitude piorou a impressão que já tinha dele e devolvi o encarando de volta. Seu olhar endureceu, deixando tanto seu amigo como Karin exasperados. O ruivo revirou os olhos enquanto ela suspirou enfadada.

- Nossa, Ichi-nii. Que bom que chegou, agora vamos.

Sua voz foi carregada de ironia. Se levantando do assento, ela pegou a mochila pendurando a alça no ombro.

- Não vai me apresentar seu amigo?

Karin parou um momento fitando o seu irmão. Podia apostar que estranhava essa pergunta e eu também, afinal ele não gostou nada quando ela disse que estava comigo.

- Como eu disse antes esse é o capitão do time.

- Hitsugaya Toushirou?

Então ele me conhece? Desviei o olhar pela primeira vez para Karin e suas bochechas tinham manchas de rubor. Voltei a encara-lo levantando do assento ao ficar perto dela. Percebi que ele não gostou e seu amigo ruivo observava curioso.

- Isso e você seria...?

- O irmão mais velho dela. Kurosaki Ichigo.

- Prazer.

Não assenti, nem ofereci a mão. Tive a leve impressão que ele iria ignorar. Ouvi um riso disfarçado de tosse e simpatizei um pouco com o amigo dele. O Kurosaki mais velho, no entanto, invés de se irritar curvou os lábios como se curtisse uma piada particular.

- Prazer em te conhecer também. Soube que anda ajudando essa encrenqueira.

Karin arquejou indignada.

- Ichi-nii!

Ele apenas a olhou de soslaio.

- Qual é? Não é verdade que ele anda te livrando dos problemas em que se mete?

- Não é bem assim.

- Kiba disse o contrário. Você precisa mesmo de alguém pra te vigiar.

Espere um pouco, ele queria dizer o mesmo Kiba, nosso assistente técnico? Olhei para Karin e percebi que era sim, além disso ela estava desconfortável com a situação toda. Olhei seu irmão intrigado. Aonde ele queria chegar com isso? Mal disfarçou essa hostilidade contra mim e resolveu provocar sua irmã? Ao meu lado, Karin fumegava.

- Não preciso de uma babá. Já estou bem grandinha.

Concordo.

- Karin sabe bem se cuidar.

Sua postura arrogante mudou quando a chamei pelo primeiro nome. Seu olhar encheu de rancor e senti confusão pela primeira vez desde que entrou no restaurante. Era como se me odiasse profundamente.

- Renji, pode leva-la pro carro? Depois alcanço vocês.

O clima tenso aumentou causando uma reação diferente entre nós. Enrijeci no lugar, estreitando os olhos com essa desculpa do Kurosaki mais velho, Karin assustada com isso e o amigo dele tenso o encarando.

- Ichigo...

- Leve ela, Renji, não vai demorar muito.

O amigo suspirou resignado deixando Karin mais nervosa e com razão. Só havia um motivo para seu irmão querer ficar sozinho comigo e não era para conversar amigavelmente.

- O que você vai fazer, Ichi-nii?

- Nada demais, vai com ele.

- Mas...

Ela hesitou nos olhando incerta. Isso está ficando sério e a fitei para acalma-la.

- Pode ir.

Nesse momento, o tal Renji pôs a mão sobre o ombro dela, a guiando para a saída.

- Vem, baixinha.

Karin engoliu em seco, nos olhando preocupada até sair do estabelecimento junto com o outro. Assim que saíram para a calçada, escutei um som debochado.

- Uma reunião com jantar, nada mal.

Voltei a olhar Kurosaki e só pelo tom de voz percebi o desprezo carregado.

- Não entendi.

- Claro que entendeu, pirralho. Então vamos deixar as coisas claras. O que você quer com a minha irmã?

Respirei fundo, notando os outros clientes do restaurante nervosos com a cena que estávamos armando. Eu não estava escondendo meu comportamento com Karin mesmo e se Kiba realmente contou tudo então dava pra tolerar o “pirralho”. Entretanto, tinha vários jeitos de responder, mas já que ele quis assim bancando o irmão protetor e ciumento não vou recuar.

- Quero namorá-la, Kurosaki-san. Algum problema?

Vi antes que fizesse.

Rápido, ele agarrou a gola da minha camisa ao ponto que quase me sufocava. Poderia ter evitado, mas não quis. O punho dele não tremia e com o aperto de aço notei que mal se esforçava pra me segurar. Isso significava que era forte, bem acostumado a brigar. Um homem se aproximou nervoso de nós e pela visão periférica notei ser o gerente.

- Senhores por favor, sem tumulto. Nada de briga aqui dentro.

Tanto Kurosaki como eu ignoramos o gerente. Eu não desviei o olhar e vi a raiva aumentar no irmão de Karin. Dando um passo, ele sussurrou num tom ácido na minha cara.

- Só por cima do meu cadáver. Eu sei quem é você, moleque. Se depender de mim nunca vai acontecer.

Seria um verdadeiro bate-boca se gritasse, mas com isso ele provou ser bem moderado quando quer. E também... Me desprezava completamente. Estreitei o olhar, segurando seu pulso agarrado na gola da minha camisa. Apertei bem no ponto de pressão sem moderar a força. Ele franziu o rosto, incrédulo, quando seu punho sem querer abriu e o tirei de mim num safanão tão forte que recuou um passo. Sacudindo o pulso, seu ódio amainou pela curiosidade quando me encarou. E agora?

- Então não é só um atleta ikemen.

Meu humor amargou de vez. Agora sim detestei de verdade esse cara. Irmão de Karin ou não, era um babaca e deixei bem claro o que pensava ao encara-lo.

- E você realmente me odeia, Kurosaki-san. Por que será? Não fiz nada à você.

A curiosidade sumiu deixando mais uma vez aquele rancor.

- Tem razão. A gente se vê, moleque.

Dando meia volta, ele caminhou até a saída e pela janela acompanhei até quando chegou ao carro. Karin e o amigo ruivo estavam encostados no automóvel assistindo tudo. Percebi que ela tentou discutir com o irmão, mas foi ignorada. Assim que entraram no carro e foram embora caí sentado no assento, confuso e irritado.

- Mas o que foi isso?

HITSUGAYA POF

KARIN POV

- Ichi-nii, o que foi isso?!

Mal ele tinha assumido o volante e me debrucei no vão dos bancos. A arrancada me jogou para trás de encontro ao assento, mas rápido me ajeitei bem acostumada à isso e pus o cinto de segurança. Renji nem tinha posto direito o dele e olhou irritado pro meu irmão.

- Ei! Pra que tanta pressa?

- Só quero ir embora e esquecer o que houve aqui.

- Depois daquele quase barraco acho bem difícil.

Renji apontou sério. Ichi-nii apenas engoliu um rosnado e puder notar os nós brancos dos seus dedos apertarem o volante com força. Vê-lo me ignorando aumentou a bolha de frustração dentro mim e não aguentei.

- Ichi-nii, o que foi aquilo no restaurante?!

Ele suspirou com desgosto.

- Como assim?

Respondendo com outra pergunta, apenas me estressou.

Como assim? Você foi um completo ogro com meu amigo. Por um momento achei que ia socar a cara dele!

Não tinha como negar. Fiquei com o coração na boca quando o vi agarrar Toushirou pela camisa daquele jeito. Só não voltei porque Renji me segurou.

- Amigo, é?

Não gostei do seu tom, me deixava desconfortável.

- Sim, o que é que tem?

- Muito estranho ele te chamar pra jantar só por causa de uma reunião sobre o clube.

Fiquei super vermelha com a insinuação, quase perdi toda a revolta que sentia pela atitude dele.

- V..você tá exagerando, não foi nada demais.

- Não foi porque cheguei a tempo.

Arfei incrédula. Sério mesmo que disse isso?

- Olha aqui, eu não sou uma donzela em perigo pra vir correndo me buscar, nem são dez da noite.

- Sabe, ela tem razão.

Obrigada Renji! Meu irmão apenas o encarou carrancudo e estressado.

- Você cala a boca.

Renji apenas revirou os olhos.

- Cara... Você me arrastou dizendo que era algo urgente e quando chegamos era só sua irmã jantando com alguém.

Não sei se ficava agradecida por Renji ter me defendido ou se a vergonha me engolfava. Até ele acha que foi tipo um encontro. Espere, foi um encontro? Agora nem eu mesma sei.

- Diz isso porque a irmã não era sua.

- Qual é o seu problema? É normal os dois estarem juntos, afinal ele não é o novo capitão? Ela é a gerente, não é nada demais nessas coisas e sabe você muito bem como é.

Um silêncio pairou dentro do carro, enquanto Renji e eu olhávamos Ichi-nii esperando uma resposta, porque ele tinha que dar. Eu nunca o vi agir daquele jeito. Meu irmão é esquentado? Sim, mas não sai no braço ou discutindo sem motivo e o modo como ele encarava o Toushirou...

- É como se odiasse ele.

No carona Renji pestanejou com meu sussurro e encarou mais desconfiado meu irmão. Nós dois vimos o que aconteceu, nem sei como não houve uma confusão. Suspirando fundo, Ichi-nii soltou uma mão do volante apoiando no câmbio da marcha. Achei estranho, principalmente quando não mudou.

- Não é ódio, só não gostei desse pirralho.

Atá. Ele quer enganar quem? Estreitei o olhar incomodada.

- Toushirou não é um pirralho.

Pelo retrovisor nos encaramos. Sua raiva tinha baixado, mas a cautela não.

- Já se chamam pelos primeiros nomes...

Por algum motivo seu tom controlado me fez gelar por dentro, como se tivesse cometido um erro. Ichi-nii percebeu ficando desconfiado e tentei disfarçar.

- Isso... Não interessa. Somos amigos e ponto final. Você agiu como um babaca, Ichi-nii e sei que não é assim.

- Ela tem razão, Ichigo. Você exagerou.

Por um momento meu irmão parecia que ia xingar o Renji, mas respirou fundo e grunhiu se concentrando nas ruas.

- Ok. Mas não podem me culpar quando descubro que foi jantar com um cara e logo com o sujeito que anda te protegendo.

- É mesmo? Então era verdade...

Renji me lançou um sorriso malicioso sobre o ombro e estremeci mais nervosa e sem graça.

- Não foi um encontro. Por que insistem nisso?

- Vou fingir que acredito.

Esse ruivo soltou um riso e ignorei olhando para Ichi-nii, mas esse simplesmente grunhiu concordando e girando o pulso da mão livre devagar. Agora que lembrei foi justo essa que ele usou para agarrar Toushirou pela camisa e o mesmo se soltou dele. Renji também reparou e franziu a testa.

- Que foi, cara?

- Nada.

Nada? Eu conheço meu irmão e sei que está escondendo alguma coisa. Por enquanto, vou deixar quieto. O clima de desastre amenizou desde que saímos e eu não quero estragar. No entanto, o silencio não poderia durar com Renji e meu irmão debaixo do mesmo teto – mesmo que fosse do carro. Isso se provou quando esse ruivo começou a rir. Deu pra notar a paciência do meu irmão encurtando ao ver Renji se revirar em outro riso.

- O que foi teme?

- Agora entendi. Ele abriu seu pulso, não foi?

Ichi-nii ficou calado o ignorando enquanto fiquei perdida. Do que Renji está falando? Como meu irmão continuou quieto foi confirmação o suficiente para Renji rir mais.

- É verdade então. Caramba, quem diria...

- Também fiquei surpreso.

Ichi-nii tinha um ar curioso e não de dor pelo pulso aberto. Só prova o quanto ele não é normal e então tive um estalo: pulso + “ele” = abriu. Encarei de olhos arregalados sua mão direita no câmbio de marcha. Toushirou fez isso?! Lembrei de quando ele se soltou do agarre de Ichi-nii no restaurante, meu coração quase saltando pela boca enquanto Renji me segurava para não aumentar a confusão.

Por um milagre não rolou uma briga e das feias.

- Pelo ao menos o cara não é um fracote. Lembra daquela vez...

- Renji.

Meu irmão rosnou em aviso, mas foi tarde demais. Me debrucei no vão dos bancos arfando.

- Daquela vez?

- Renji tá brincando.

- Não estou não.

A voz risonha do outro apenas me deixou mais indignada. Eu não acredito que meu irmão já fez isso.

- Quantas vezes você fez uma palhaçada dessas?

Ele nem teve coragem de olhar em relance pra mim!

- Ichi-nii!

E como se de esperar, ele não me respondeu.

 

No dia seguinte

Acordei cansada e irritada por ontem. Meu irmão todo protetor não disse nem uma palavra sobre as outras vezes que intimidou meus amigos. Ou como Renji insinuou, os caras que se interessavam por mim. Ichi-nii me ignorou o caminho todo até em casa e fingiu não ouvir minhas perguntas. Era simplesmente frustrante! E Renji? Sequer abriu o bico depois de soltar essa bomba.

Para completar Hikari não me ligou. Depois de um banho e ficar à vontade em roupas leves esperei sua ligação, mas ela sequer mandou uma mensagem explicando. Tentei ligar, mas só dava na caixa postal. Acho que pode ter acontecido algo com seu namorado. Afinal de contas, os dois saíram juntos. Não vou mentir, não gosto muito dele. Kai é extrovertido e simpático, mas monopoliza demais minha amiga. Sério, ele sempre quer ficar sozinho com ela e se não fosse a felicidade estampada nos olhos de Hikari diria minha opinião crua desse cara.

Hoje antes de ir para o treino à tarde vou conversar com ela, sei que no almoço Hikari quer ficar com Kai e não vou atrapalhar. Mas realmente me deixou curiosa sobre o que tanto queria falar comigo.

- Pra frente! Não percam o foco!

Ergui os olhos para grito do treinador. Zaraki incitava o time da linha lateral e assisti em tempo dos novos titulares avançarem conduzindo a bola pro ataque. Hoje assim que o treino da manhã começou, Zaraki anunciou os substitutos de Noitra-senpai e Rikuo. Olhei para Toushirou intrigada numa pergunta muda e sorriu discreto assentindo. Pela nossa conversa ontem no restaurante Azumi-senpai e Kimura foram a melhor escolha.

Assisti ansiosa e analítica enquanto costuravam a defesa dos reservas, o idiota do Digio correndo ao se posicionar melhor na grande área. Num cruzamento, Azumi-senpai conseguiu conectar a bola com o centroavante, mas... A defesa do time de Karakura era formidável agora.

O corte de um dos zagueiros foi certeiro e pude jurar que ouvi o rosnado de Digio daqui. O contra-ataque rápido e forte me fez morder o bocal da caneta, tensa e nervosa. Era bom por um lado porque significava que nossos reservas sabiam aproveitar a chance de marcar, mas por outro o time principal tinha que provar impedir o avanço. O treinador não parava de berrar.

- Cadê a marcação? Keita, Yami, se alinhem na zaga, porra!

Ai que agonia. Zaraki parecia que estouraria uma veia capilar de tanto estresse. Um chute certeiro no gol e o goleiro mergulhou pro lado esquerdo defendendo no último segundo e mordi o lábio. Quase... Cobrança lateral para os reservas. Vi que nem Akira e Digio voltaram, estavam no meio do campo e voltei os olhos bem quando mais uma vez nosso goleiro defendia e jogava pra frente. Keita alcançou a bola tocando para o jogador mais próximo e prendi fôlego quando Toushirou só deu um toque nela se livrando da marcação e correu junto da bola.

Não consegui desviar o olhar. Hipnotizada enquanto ele avançava driblando cada jogador que tentava pará-lo sem diminuir sua arrancada. Era incrível, principalmente quando ele pulou junto com a bola evitando um carrinho e continuou avançando até a pequena área. Digio gritava pedindo a bola, mas com um zagueiro o marcando a decisão foi óbvia. Toushirou só chutou para o gol, o efeito fazendo a bola curvar entrando bem no canto superior aumentando o placar. Eu pulei gritando empolgada. Nada anormal, afinal os outros jogadores também gritavam e do gramado Toushirou só olhou na minha direção arfando.

Senti uma conexão forte entre nós, minha animação mais baixa ao me lembrar de ontem. Se não fosse pela ligação de Ichi-nii o que teria acontecido? Ao observar os outros comemorando junto com Toushirou abracei o caderno, quieta sem afastar meus olhos dele. Como jogava no ataque desde abril a mudança para a posição de meio-armador devia ser cansativa pra ele. Afinal, meio-campistas correm bem mais que os atacantes durante uma partida, mas sequer parecia exausto. Só fazia a declaração de ontem ser surreal.

Toushirou tinha tudo o que um clube profissional buscava e ainda sim ele escolheu vir para esse colégio... Entrar no clube de futebol daqui... Suspirei com o coração martelando enquanto via ele conversar com os outros. O que Toushirou teria dito pra mim se meu irmão não tivesse interrompido? Droga... Queria tanto saber. Essa ansiedade não me deixava pensar direito e me conheço, vou acabar perguntando pra ele.

Justo nesse instante Zaraki apitou encerrando o treino matutino. Os jogadores se reuniram diante dele e vi Kiba passar esbaforido pelo portão desse campo. Reprimi um grunhido aborrecida com ele. Caramba, o que ele tinha em fofocar tudo o que acontece pro meu irmão? Depois vou ter uma séria conversa com ele – e também pegar as anotações dessa reunião de fim de treino. Ajeitei minhas coisas e segui pro deposito de equipamentos. Quanto mais adiantar a limpeza do campo melhor.

Primeiro peguei os cestos para as bolas e levei até onde mais cedo os rapazes juntaram para o treino de jogo. Assim que acabei empurrei um dos cestos para o deposito, ainda bem que tinha rodinhas. Estava empurrando no canto quando ouvi um barulho e girei em tempo de ver Toushirou trazer os cones. Engoli em seco, de repente inquieta.

- Oi... Gol incrível no final.

Ai meu Deus! Poderia ser mais desajeitada? Toushirou apenas curvou os lábios colocando os cones em cima de uma mesa.

- Obrigado.

Ele apenas se virou para mim e evitei suspirar de novo. Não fique nervosa, essa era uma oportunidade perfeita para perguntar o que não pude ontem. Pigarreando fingi que arrumava umas caixas na prateleira atrás mim.

- Sabe, você nem parece muito cansado depois de correr uma partida inteira.

- Não é problema, já estou bem acostumado.

- Como assim?

Franzi as sobrancelhas confusa e ao olhar sobre o ombro vi em tempo de Toushirou puxar mais um cesto vazio do canto para a saída.

- Eu corro 10km todo dia.

Pisquei impressionada, meio boquiaberta.

- Dez quilômetros ... Todo dia?! A que horas você faz isso?

- De manhã cedo antes de vir para o colégio, é um hábito meu.

Agora de verdade fiquei surpresa enquanto Toushirou apenas dava os ombros levando o cesto para fora. É, faz sentido.

- Daí vem essa resistência absurda.

Girei no lugar tirando o cronômetro do pescoço. Nem cheguei a usar, a bateria acabou e aproveitei pra verificar se os outros de uma caixinha estavam iguais.

- É só um exercício, Karin. Não tem nada de estranho nisso.

Revirei os olhos com seu tom paciente e risonho. Ele tinha me ouvido, claro. Como estava de costas para ele, aproveitei o momento e resolvi entrar no assunto.

- Ainda não acredito que recusou vários convites de clubes profissionais. São chances únicas, sabia? – sorri sentindo seu olhar fixo nas minhas costas e suspirei parando de fingir verificar os cronômetros. – Toushirou... Você veio mesmo para o Secundário de Karakura por minha causa? Sabe, ainda acho difícil de acreditar.

Suspirei com o coração martelando mais uma vez. Senti mais que ouvi sua aproximação e aumentou essa ansiedade.

- Por que?

Engoli em seco, podia sentir o calor do seu corpo bem forte pela pratica em minhas costas. Sem querer meu rosto esquentou e fitei o nada.

- Foi uma promessa de há muito tempo. A gente era criança e agora...

- ... Estamos aqui. Valeu a pena tentar.

Sorri apesar de nervosa, a ansiedade se transformando em contentamento apesar de mim.

- Você é louco, sabia?

- Já me disseram isso.

Ele não disse mais nada e suspirei mais e mais começando a arfar. A tensão cresceu como ontem e dessa vez não senti vontade de fugir. Toushirou deve ter percebido, pois esticou o braço apoiando a mão numa prateleira. Era como se me prendesse e a noção causou uma mini euforia por dentro. Se inclinando sobre mim prendi o fôlego quando sua respiração morna cobriu minha orelha.

- Senti sua falta.

Estremeci fechando os olhos. Sua voz sussurrando me arrepiou inteira, aumentando esse calor que sentia.

- E você?

- Ahn?

Quase nem prestei atenção.

- Não sentiu também?

Outro arrepio me varreu e engoli em seco arfando mais com o coração martelando forte.

- N..não tem porque falar dessas coisas.

Silêncio. Ele não ia dizer mais nada? Seu fôlego banhando minha orelha e a nuca me deixavam mais tonta a cada segundo. Senti mechas de seu cabelo úmido roçando minha têmpora e reprimi um gemido.

- Karin.

- O que?

Essa era minha voz? Quase sem ar?

- Você está tremendo.

Deliberadamente e leve numa caricia seu nariz roçou riscando atrás da minha orelha. Um cronometro que eu segurava caiu dos meus dedos frouxos e engoli outro gemido que com certeza seria alto. Balançando no lugar, senti os dedos da sua mão livre escorregar do meu pulso até minha palma e entrelaçando com os meus.

Com o aperto suave e firme das nossas mãos entreabri os olhos e vi num reflexo de uma placa espelhada nós dois. A visão me deixou mais mole e tanto assisti como senti ele enlaçar minha cintura, me apoiando contra seu corpo. Nem me importei que estivesse suado do treino, seu perfume do sabonete e colônia flutuava entre nós e Toushirou parecia bem à vontade com o rosto aninhado na minha orelha. Pelos suspiros dele, sentia e gostava do meu cheiro também, apenas derreti em seus braços.

- Tão teimosa.

Tremula fechei os olhos sem dizer nada. Pra que? Ele estava coberto de razão. Não tinha como fugir do que havia entre nós e eu era teimosa demais para admitir.

Droga... O reflexo que vi de nós dois era prova o suficiente.