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Os 500 Anos da Fundação de Arenilha -Memórias de uma «vileta» nascida no decurso da Expansão Portuguesa

2014, Os 500 Anos da Fundação de Arenilha -Memórias de uma «vileta» nascida no decurso da Expansão Portuguesa

Os 500 Anos da Fundação de Arenilha – Memórias de uma «vileta» nascida no decurso da Expansão Portuguesa Fernando Pessanha Dedico este trabalho ao meu mestre, orientador e amigo, Prof. Doutor António Rosa Mendes (1954 – 2013) In Memoriam Índice  Agradecimentos  Breve apresentação  Introdução  O território envolvente antes de Arenilha O Baixo Guadiana Pré-Histórico O Baixo Guadiana Fenício, Grego e Cartaginês O Baixo Guadiana Romano e Visigodo O Baixo Guadiana Medievo-Islâmico O Baixo Guadiana Medievo-Cristão  Primeiras referências a Arenilha  Arenilha - Motivos da Fundação  Castro Marim, Arenilha e a Expansão para o Norte de África  Arenilha na historiografia da Idade Moderna  Os Alcaides de Arenilha  As Construções em Arenilha  Modus vivendi em ArenilhaRevisitar a nossa História. Construir o nosso futuro É com satisfação e noção de importância que o Município de Vila Real de Santo António edita esta obra sobre a nossa História Local, designada de “500 anos da Fundação de Arenilha – Memórias de uma “vileta” nascida no decurso da Expansão Portuguesa.”, da autoria do investigador Fernando Pessanha, natural e Vila Real de Santo António. De facto a publicação de edições de caracter histórico é, a meu ver, um desígnio de qualquer município que tenha orgulho no seu passado e nas gentes que fizeram com sangue, suor e lágrimas a construção da identidade territorial que hoje vivenciamos. Neste âmbito, a investigação realizada por Fernando Pessanha sobre Arenilha, o espaço que deu origem posteriormente à actual Vila Real de Santo António, é matéria que deve ser valorizada e daí que seja com toda a satisfação que a Câmara Municipal assume a sua publicação. O estudo da História, em constante metamorfose, tem levado a que hoje possamos compreender melhor quem somos e de onde viemos e estou certo que esse princípio é fundamental para nos guiarmos nos dias de hoje para um futuro próspero e em que a nossa comunidade se assuma cada vez mais como solidária e unida. A História de Vila Real de Santo António é muito diferente da história de outras cidades e vilas de Portugal. O seu cunho iluminista, cravado nas suas entranhas pelo Marquês de Pombal, o grande reformista Português e uma das mais carismáticas e controversas figuras da História de Portugal, faz de Vila Real de Santo António um caso de estudo por todo o processo que envolveu a decisão da sua construção e a forma expedita como foi concretizado. 4 Importa no entanto percebermos que neste nosso território existia anteriormente a povoação de Santo António de Arenilha, onde a população se dedicava fundamentalmente à pesca. A História de Arenilha, agora revisitada por Fernando Pessanha, na senda de outras obras como a edição “Revisitando Santo António de Arenilha” da autoria do Prof. Hugo Cavaco, é também a História de Vila Real de Santo António e logo é História de todos nós. História essa que a cada um de nós compete construir, preservar e divulgar. O Presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António Luis Gomes 5 Agradecimentos Para a elaboração da presente obra foi fundamental a colaboração de um conjunto de pessoas sem as quais o resultado final seria, certamente, mais pobre. Agradeço, em primeiro lugar, à Dr.ª Madalena Guerreiro, directora do Arquivo Histórico Municipal de Vila Real de Santo António, por se ter mostrado sempre disponível, manifestando o maior interesse em acompanhar-me na elaboração deste trabalho. Também gostaria de agradecer ao Prof. Hugo Cavaco e ao Prof. Doutor José Eduardo Horta Correia pela troca de impressões, sugestões bibliográficas, e pela disponibilização de alguns materiais. De igual modo compete-me agradecer os documentos do Arquivo Histórico Militar digitalizados pelo Tenente Coronel Manuel Rato. Igualmente preciosa foi ajuda do escultor vila-realense Nuno Rufino quanto à elaboração da ilustração relativa a Arenilha, assim como a ajuda do Sr. Mário Mateus na elaboração de mapas e outros gráficos. No decurso do ano em que teve lugar a investigação para o presente trabalho faleceu o meu mestre, orientador e amigo, Prof. Doutor António Rosa Mendes. Ainda que a sua presença não se prenda directamente com a produção deste livro, o seu acompanhamento ao longo de todo o meu percurso académico resultou numa influência tão decisiva quão inevitável para que um dia viesse a produzir labores desta natureza. Aqui lhe deixo estas palavras de sentido reconhecimento e um comovido in memoriam. 6 Breve apresentação “(…) Não há história definitiva, pela simples razão de que a palavra pronunciada, por mais fundadora e fecunda que seja, está, ela própria, sujeita ao tempo, torna-se ela própria passado, objecto de outras experiências, o que quer dizer que tem de ser constantemente renovada, constantemente pronunciada para se manter viva (…)”. (in “Histórias de Portugal”, José Mattoso, a Escrita da História, pp.29) Partindo deste pressuposto, somos levados a exercer como obrigatória uma revisão profiláctica de toda a matéria anteriormente tomada por “intocável”, isto é, de um estudo acabado, tal como preconizaram algumas Escolas Históricas de meados do século XIX e que tiveram os seus epígonos até aos nossos dias. Ora o trabalho que em boa hora rematado e actualizado pelo nosso colega Fernando Pessanha sobre os “500 anos da Fundação de Santo António de Arenilha”, vem, precisamente, colocar em epígrafe o actual padrão de entender e documentar o fazer da História. A documentação agora tida como válida, em detrimento do valor documental antes utilizado como “suficiente”, é, à data de hoje, bem mais lato, e, só por si, leva-nos no presente a induzir a ideia de que é necessário reescrever a História. Como um dia proferiu Lucien Febvre, “A História é filha do seu tempo”, e quem a tomar por estática estará envolvido numa teia que dificilmente a valorizará. Só perante Fontes diversas, complementares e que problematizem a causa-efeito, poderemos fixar-nos perante o puzzle que, na maioria das vezes, nos é colocado. É que, a História ao não ser problematizada, desce degraus no mundo da investigação. Não é por ser História Regional ou 7 História Local que se pode catalogar de inferior relativamente à História Geral. Agora moldar-se por uma História de narrativa simples, não lhe poderemos atribuir outro epíteto que não seja o de “História Crónica”, contrariamente ao de “História Ciência”, aquela que levanta problemas e tenta dar resposta a esses mesmos problemas que a sociedade tem de resolver para não resvalar, em repetição, nos mesmos erros e ardis. É, ao fim e ao cabo, como dizia Sánchez Albornoz, fazer uma História que se possa mencionar como “Ciência dos Porquês”. Foi essa a História que Fernando Pessanha agora nos trouxe para comemorar os “500 anos da Fundação de Arenilha”. Que não fiquem por aqui as investigações sobre a “vileta” que Frei João de São José visitou, em 1577. V.R.S.A., Dezembro de 2013 Hugo Cavaco 8 Introdução As efemérides têm permitido, ao longo dos anos, o pertinente pretexto para dar à estampa variadas investigações de carácter historiográfico. Com efeito, o ano de 2013 assistiu ao 237º aniversário da fundação de Vila Real de Santo António 1 - ou 239º aniversário, de acordo com a habitual interpretação. Contudo, também o ano de 2013 assinalou uma data da maior importância para a História e identidade patrimonial local: os 500 anos da fundação de Santo António de Arenilha. 13 anos volvidos sobre a louvável publicação Revisitando Santo António de Arenilha, o primeiro trabalho exclusivamente dedicado à História da vila de Arenilha, da autoria do Prof. Hugo Cavaco, impõe-se a tradicional actualização de conhecimentos, tão frequente quão imprescindível na área das Ciências Humanas e Sociais. A colocação de novas questões e o aparecimento de novos dados (alguns aparentemente inéditos) impelem-nos a problematizar o actual estado do saber em relação a esta antiga vila de pescadores, situada na margem portuguesa da foz do Guadiana. Deste modo, torna-se imperativa uma nova abordagem ao objecto de estudo, integrada num quadro geográfico mais amplo, e privilegiando as relações, culturais, sociais, políticas e militares que integram Arenilha no designado círculo lusohispano-marroquino. E porquê esta preocupação com a investigação do nosso passado histórico? Porquê esta necessidade de descortinar e divulgar o modus vivendi e o modus operandi daqueles que nos antecederam? Já dizia o saudoso Prof. Doutor António Rosa Mendes: “nós somos feitos de passado, 1 Relembramos que a fundação de Vila Real de Santo António teve lugar no dia 13 de Maio de 1776. 9 somos o resumo daquilo que está para trás de nós”2. Assim sendo, acabamos por herdar uma dívida para com aqueles que nos antecederam, uma dívida que compete ser saldada ao abrigo da gratidão para com a memória daqueles que, com muito sacrifício, lançaram as bases da matéria empírica que nos corporiza. Com o presente trabalho pretendemos, portanto, não só assinalar os 500 anos da fundação de Santo António de Arenilha, como também saldar um pouco da dívida que temos para com os arenilhenses, os homens que se lançaram no ensaio povoador a partir do qual foi alicerçada uma nova vila iluminista, um século e meio depois da extinção de Arenilha. 2 “O tempo que nos corre nas veias”, in Caderno de Artes - Postal do Algarve, Nº 20, 11 de Abril de 2010, p.4. 10 O território envolvente antes de Arenilha Perante a designação de “História Local”, a generalidade dos munícipes vila-realenses tende a associar automaticamente à vila régia fundada pelo Marquês de Pombal em 13 de Maio de 1776. Pontualmente, a tradição oral ainda arranca às brumas do esquecimento a antiga vila de Arenilha, mas sempre envolta num cenário de contornos tão românticos quão idílicos. Deste modo, e de maneira a contextualizar melhor o leitor, façamos uma breve retrospectiva histórica, de forma a compreendermos os antecedentes da presença humana no território e em que conjuntura nasceu a antiga vila de Santo António de Arenilha. O Baixo Guadiana Pré-Histórico A presença humana no território que actualmente compreende o concelho de Vila Real de Santo António remonta à denominada PréHistória. Ao longo das últimas décadas, as sondagens têm vindo a provar essa remota ocupação humana, não só através da identificação de um considerável número de megálitos, como também de outros materiais arqueológicos. Aliás, esta foi uma realidade prontamente constatada por Estácio da Veiga, ainda no decorrer do séc. XIX 3, e que acaba por fazer todo o sentido se tivermos em consideração que o território compreendido entre o Gilão e o Guadiana – especialmente o território cacelense encontra-se bem provido de água doce, a mais imprescindível das necessidades humanas. 3 Sebastião Estácio da Veiga, Antiguidades Monumentaes do Algarve. Tempos Prehistoricos, Vol. I, p.108. 11 Em 1985 teve lugar uma escavação no sítio arqueológico de Aldeia Nova, do qual resultou um estudo geológico, sedimentar e cultural, para além de algumas dezenas de artefactos paleolíticos encontrados em estratigrafia4. Tratou-se de um trabalho de grande importância para o nosso conhecimento do Paleolítico na região do baixo Guadiana e mesmo no Algarve, na medida em que, normalmente, os sítios encontrados costumam apresentar parca qualidade, sendo os artefactos pouco abundantes. Alguns anos mais tarde, em 1997, Luís Raposo voltou a publicar um artigo na sequência de um estudo relativo aos artefactos de sílex provenientes de Aldeia Nova, e cuja cronologia remonta ao Paleolítico Superior 5. Lamentavelmente, a acção do Homem tem vindo a destruir inúmeros sítios arqueológicos ao longo dos anos. Caso gritante, no concelho de Vila Real de Santo António, são os tholoi da Nora e da Marcela, documentados por Estácio da Veiga, referidos por Ataíde de Oliveira6 e classificados como Monumentos Nacionais em 1910 7. Ainda assim, é de assinalar que a preocupação para com o património arqueológico tem vindo a crescer, pelo que outros monumentos Pré-Históricos, identificados nos últimos anos, têm vindo a ser intervencionados no sentido de assegurar a sua preservação. Um bom exemplo reside no túmulo Megalítico de Santa Rita, que podemos 4 J.L. Cardoso; L. Raposo; J. Medeiros, “Novos elementos acerca do corte de Aldeia Nova e das Indústrias Líticas da Região de Vila Real de Santo António”, in Actas da I Reunião do Quaternário Ibérico, Vol. II, pp.175-186; Ver também Nuno Bicho, “A Ocupação Paleolítica e Mesolítica no Algarve”, in Promontória Monográfica 01 - Actas do II Encontro de Arqueologia do Sudoeste Peninsular, p.20. 5 Luís Raposo, “O Sítio de Aldeia Nova (Vila Real de Santo António) ”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, pp.155-159. 6 Ataíde de oliveira, Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, pp.23-34. 7 Apesar da sua classificação como Monumentos Nacionais, em 1910, os túmulos megalíticos da Nora e Marcela foram destruídos, não se encontrando quaisquer vestígios nos locais em questão. 12 visitar in loco, e cujos trabalhos de investigação, liderados pelo arqueólogo Nuno Inácio, remontam ao ano de 2007 8. Fig.1 - Túmulo Megalítico de Santa Rita. O processo de sedentarização dos povos implicou, desde logo, a fixação das comunidades humanas nas margens dos rios e nos seus respectivos afluentes. Deste modo, tornou-se possível o acesso às condições naturais favoráveis às práticas de subsistência neolítica, como a caça, a pesca ou o marisqueio. É, portanto, no decurso deste processo de sedentarização que os primeiros “povoados” acabam por ter origem nas proximidades dos rios, levando ao aparecimento da agricultura, pastorícia e, consequentemente, ao armazenamento de excedentes. Foi neste contexto que as preocupações de carácter defensivo levaram ao surgimento de povoados fortificados, como o Cerro do Castelo de Santa Justa9, exemplo paradigmático desta indústria na região do baixo 8 A.A.V.V., “Pré-História e Megalitismo na região de Cacela. Uma proposta integrada de investigação, valorização e protecção do património arqueológico”, in Xelb 8 – Actas do 5º Encontro de Arqueologia do Algarve, pp.37-49. Dos mesmos autores ver também “O Túmulo Megalítico de Santa Rita (Vila Nova de Cacela). Resultados preliminares de um processo de investigação em curso”, in Xelb 10 – Actas do 7º Encontro de Arqueologia do Algarve, pp.73-86. 9 Victor Gonçalves, “Cerro do Castelo de Santa Justa – um povoado Calcolítico Fortificado no Alto Algarve Oriental”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, pp.183-189. Ver também Fernando Pessanha, “Cerro do Castelo de Santa Justa”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nª 142, Março de 2012, p.20. 13 Guadiana, e construído em pleno Calcolítico, algures durante o terceiro milénio a. C. Por outro lado, este sítio arqueológico reveste-se ainda de outra particularidade bastante interessante. Entre os materiais arqueológicos recolhidos durante as escavações encontram-se metais: escórias e pingos de fundição, o que vem atestar a existência de uma produção local de metalurgia do cobre neste povoado fortificado do baixo Guadiana. O Baixo Guadiana Fenício, Grego e Cartaginês Com efeito, as privilegiadas condições naturais que as proximidades da foz do Guadiana têm a oferecer, permitiu o estabelecimento de povos oriundos do Mediterrâneo oriental, a partir do período orientalizante, ou seja; séculos VIII a VI a. C. A grande riqueza mineira da Península Ibérica, da qual faz parte o Algarve, atraiu desde cedo a atenção destes povos. A razão inicial da sua presença no ocidente está certamente relacionada com a procura de metais como cobre, prata, estanho e ouro, não se limitando exclusivamente a esta actividade, como também ao desenvolvimento de feitorias e à riquíssima indústria da salga de peixe10. No contexto algarvio temos conhecimento de assentamentos fenícios não só no Cerro da Rocha Branca 11, Tavira12 e Faro13, como também em 10 Fernando Pessanha, “Os Fenícios no Algarve”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº152, Janeiro de 2013, p.21. 11 Mário Varela Gomes, “O estabelecimento fenício-púnico no Cerro da Rocha Branca (Silves)”, in Estudos Orientais IV – Os Fenícios no Território Português, pp.73-108. 12 Maria Garcia Pereira Maia, “Tavira Fenícia. O território para Ocidente do Guadiana, nos inícios do I milénio a.C.”, in Fenícios y Território – Actas del II Seminário Internacional sobre Temas Fenícios, pp.12-150. Da mesma autora ver também “Fenícios em Tavira”, in XIV Jornadas de Historia de Ayamonte, pp.70-91. 14 Castro Marim, locais em que as condições geomorfológicas - localizações em promontórios próximos de estuários de rios - permitiam uma rede de navegação de cabotagem, através da qual se podiam estabelecer relações comerciais com as populações autóctones. Segundo Jorge de Alarcão, a progressão do comércio fenício para ocidente justifica, efectivamente, o estabelecimento da feitoria de Castro Marim14, pelo que o Guadiana assumia, portanto, a primordial via de penetração para se poder proceder às transacções comerciais com as populações instaladas no interior. É neste contexto que coube a Baesuris – topónimo actualmente identificado com Castro Marim - o elo de ligação entre o mundo mediterrânico e o interior alentejano. Deste modo, era por esta feitoria, localizada na foz do Guadiana, que saía o precioso minério proveniente desta faixa piritosa ocidental, e entravam as novidades culturais e tecnológicas provenientes do Mediterrâneo oriental, nomeadamente cerâmicas e outros produtos manufacturados15. De resto, esta é uma presença que não se circunscreve ao promontório de Castro Marim. Também no outro lado do rio, em Ayamonte, foram identificados sítios arqueológicos, nomeadamente uma necrópole situada nas imediações do designado Camino del Calvario, e que atesta que a ocupação fenícia no território teve lugar em ambas as margens do Guadiana 16. 13 Cf. Dália Paulo, “As sondagens Arqueológicas Realizadas na Antiga Fábrica da Cerveja de Faro”, in Anais do Município de Faro, Vols XXIX-XXX, pp.17-86; Elisa Sousa; Ana Margarida Arruda, “A gaditanização do Algarve”, in Mainake, XXXII (II), p.953. 14 Jorge Alarcão, “O Primeiro Milénio a. C.”, in De Ulisses a Viriato – O primeiro milénio a. C., p.19. 15 Ana Margarida Arruda, “Os Fenícios no Ocidente”, in De Ulisses a Viriato – O primeiro milénio a. C., pp.35-45. Da mesma autora ver também “Os núcleos urbanos litorais da Idade do Ferro no Algarve” in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, pp.243-255. “O Algarve nos séculos V e VI a.C.” in O Algarve da Antiguidade aos Nossos Dias, pp.23-31. 16 Francisco Gómez Toscano, “Los fenicios en los puertos atlânticos: cuándo, donde y por qué”, in XIII Jornadas de Historia de Ayamonte, pp.180-200. Fernando Pessanha, “«El asentamiento fenicio más occidental de la historia está en Ayamonte»?! Não, não está…”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº161, Outubro de 2013, p.21. 15 Entre a presença fenícia e cartaginesa situa-se a episódica colonização grega, que terá mantido meio século de domínio comercial na costa levantina e meridional da Península Ibérica, algures entre o séc. V e o séc. VI a. C.17. De resto, a abundância de materiais arqueológicos de origem grega recolhidos nas intervenções que tiveram lugar em Baesuris, deram origem ao estudo de Ana Margarida Arruda intitulado As Cerâmicas Áticas do Castelo de Castro Marim – no quadro das exportações gregas para a Península Ibérica 18, uma obra maior importância para o nosso conhecimento da História de Castro Marim durante o fim da Idade do bronze e a Idade do Ferro. O interesse púnico nesta região terá forçado os gregos a optar por outros territórios que fossem propícios ao seu estabelecimento e às suas actividades comerciais. Com a queda de Tiro e eliminada a concorrência grega, o domínio cartaginês acabou por absorver as antigas colónias fenícias, o reino de Tartessos e as colónias gregas do sul da Hispania. Neste contexto, é provável que o topónimo original de Portimão (Portus Hannibalis) indique a fundação púnica de um antigo porto ou povoação19. Aliás, para Vasco Gil Mantas, basta recordar que sítios como Baesuris e Portus Hannibalis facultaram materiais arqueológicos que se podem relacionar com o esforço da presença púnica entre o séc. V a. C. e os primórdios do domínio romano 20. De salientar ainda que os materiais representativos da presença fenícia, grega e cartaginesa, na foz do 17 Ana Margarida Arruda, “Os Gregos no Ocidente”, in De Ulisses a Viriato – O primeiro milénio a. C., pp.46-51. Ver também Vera Teixeira de Freitas; Ana Margarida Arruda, “O castelo de Castro Marim durante os séculos VI e V a.n.e.”, in Anejos de AEspA XLVI, pp.429-446. 18 Ana Margarida Arruda, As Cerâmicas Áticas do Castelo de Castro Marim – no quadro das exportações gregas para a Península Ibérica. 19 Amílcar Guerra, “As fontes clássicas relativas ao actual Algarve: Uma perspectiva crítica sobre o seu contributo histórico”, in Xelb, Nº6, p.336. 20 Vasco Gil Mantas, “As Civitates: Esboço da Geografia Política e Económica do Algarve Romano”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, p.284. 16 Guadiana, podem ser visitados no núcleo museológico instalado na alcáçova do castelo de Castro Marim. Fig.2 - Materiais arqueológicos do núcleo museológico do castelo de Castro Marim. Fig.3 - Materiais arqueológicos do núcleo museológico do castelo de Castro Marim. O Baixo Guadiana Romano e Visigodo Também a presença romana está atestada na região do baixo Guadiana, não somente através do registo arqueológico, como através de vários documentos escritos. Com efeito, algumas fontes da Antiguidade referem Baesuris, sendo a mais conhecida o tradicionalmente designado “Itinerário de Antonino” - ou Antonini Itinerarium - obra que aponta duas estradas principais que na época romana passavam por Castro Marim: a primeira partindo de Baesuris em direcção a Myrtilis (Mértola) e a 17 segunda, partindo de Baesuris, em direcção a Balsa (Luz de Tavira) e Ossonoba (Faro)21. A chegada dos romanos, nos finais do séc. III a.C. ou inícios do séc. II a.C., e a confluência das várias vias conferiu, certamente, um novo impulso económico-comercial a Castro Marim. De resto, esta prosperidade é verificável através do registo arqueológico, não só através da cunhagem de moeda com motivos de peixes, barcos e espigas 22, como através de um importante conjunto de artefactos metálicos que serviram de objecto de estudo a uma dissertação apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa 23. Ainda que o Montinho das Laranjeiras 24, no Concelho de Alcoutim, se apresente como notório exemplo da presença romana no baixo Guadiana, outras prospecções de superfície têm vindo a levantar a hipótese de uma densa malha de povoamento ligada por vias terrestres e marítimas25. Nesse sentido, reveste-se de particular interesse a interpretação arqueológica avançada por Cristina Garcia quanto à região que compreende o território de Cacela: uma região em que a predominância de tegulae, sigillatas, e cerâmicas de envasilhamento, sugerem a existência de propriedades rurais onde se exploravam recursos naturais que posteriormente eram comercializados 26. Aliás, já em 1919-1920 referia Leite de Vanconcelos um assentamento romano em Cacela Velha, a avaliar 21 Sandra Rodrigues, As Vias Romanas do Algarve, p.24. 22 António Marques de Faria, “Moedas de época romana cunhadas no actual território algarvio”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, pp.361-362; Natércia Magalhães, Algarve - Castelos, Cercas e Fortalezas, p.74. 23 Teresa Rita Moura Viana Mateus Pereira, Os Artefactos Metálicos do Castelo de Castro Marim na Idade do Ferro e em Época Romana. Metalurgia em transição: a amostra numa análise de conjunto, Dissertação de Metrado em Pré-História e Arqueologia apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, pp.93-137. 24 Hélder Manuel Ribeiro Coutinho, As Ruínas do Montinho das Laranjeiras, pp.4-17. 25 Vasco Gil Mantas, “Os caminhos da serra e do mar”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, pp.311-325. 26 Cf. Cristina Garcia, Cacela, Terra de Levante – memórias da paisagem algarvia, pp.24-26. 18 por uma série de vestígios que podiam ser observados no local, como tanques, fustes de colunas, moedas e até esculturas em mármore 27. De salientar ainda os tanques de salga de peixe e preparação de garum, identificados por Estácio da Veiga, para além do forno e do complexo industrial de produção de ânforas identificado em Manta Rota 28, o que vem reforçar a teoria de uma intensa actividade produtiva e comercial numa zona atravessada pela via que ligava Baesuris e Balsa. Com a progressiva decadência do Império Romano, a partir do séc. III d. C., e as designadas “invasões bárbaras”, já nos finais do séc. IV d.C., a vida urbana entrou num lento e paulatino processo de declínio, em virtude da ruralização da sociedade. Neste contexto, a intensa actividade comercial que caracterizou do domínio romano perdeu parte da sua importância, o que não quer dizer que se tenha extinguido, pois o já referido Montinho das Laranjeiras - estabelecimento de trocas comerciais com os mercadores que sulcavam o rio até Mértola - apresenta uma ocupação humana que remonta ao período romano e que se estende durante o período visigodo e islâmico29. Fig.4 - Estruturas do Montinho das Laranjeiras, em Alcoutim. 27 José Leite de Vasconcelos, “Coisas Velhas”, in O Archeologo Português, vol. XXIV, pp.215-237. 28 Cristina Garcia, Cacela, Terra de Levante – memórias da paisagem algarvia, p.26. 29 Hélder Manuel Ribeiro Coutinho, As Ruínas do Montinho das Laranjeiras, pp.4-17. 19 O Baixo Guadiana Medievo-Islâmico Depois da invasão da Península Ibérica de 711, liderada por Tarik Ali Ibn Zyad, e da pretensa conquista do ocidente peninsular, comandada pelo governador do Norte de África, Musa ibn Nusair 30, os muçulmanos começaram a estabelecer-se na kura de Ukxnûnuba, de que fazem parte os concelhos do baixo Guadiana. Segundo a historiografia oficial, terá sido Abd al-azir, filho de Musa ibn Nusair, a conquistar definitivamente o Algarve31, porém, o mais provável é que tanto o baixo Guadiana como o restante Algarve tenham sido anexados por capitulação, depois de conquistado o núcleo urbano hispano-visigodo de maior importância no ocidente peninsular: Sevilha,32. Deste modo, os territórios que envolviam a foz do Guadiana continuaram integrados na província de Ukxûnuba, a comarca administrativa e militar que passou a ser governada por Abû Sabah al-Yamani33 e que tinha como capital a cidade de Ukxûnuba, a antiga sede de civitates na época romana (Ossónoba). A avaliar pelo já referido Montinho das Laranjeiras, é provável que o baixo Guadiana tenha assistido a uma continuidade da presença humana na transição do período romano-godo para o período islâmico, tal como 30 Segundo Ahmed Tahiri, não terá sido Musa ibn Nusair a conquistar Sevilha pela força, mas sim Tarik Ali Ibn Zyad, mediante um acordo de capitulação onde estaria previsto o pagamento de um tributo. Ver Ahmed Tahiri, Fath al-Andalus y la incorporación de Occidente a Dar al-Islam, pp.121-122. Ver também Fernando Pessanha, “O início do domínio islâmico no Algarve (Foi há 1300 anos…)”, in Postal do Algarve, Nº1085, 3 de Agosto de 2012, p.9. 31 Helena Catarino, “A Ocupação Islâmica”, in História de Portugal Volume III - O Mundo Luso Romano (II) Portugal Medieval (I), p.273. 32 Fernando Pessanha, A Cidade Islâmica de Faro, pp.19-23. 33 José Garcia Domingues, “Homens Célebres e Famílias Ilustres do Algarve na Época Árabe”, in 3º Congresso do Algarve, p.78; Maria da Conceição Amaral, Caminhos do Gharb – Estratégia de interpretação do património islâmico no Algarve: O caso de Faro e de Silves, p.58. 20 aconteceu noutras villae romanas do Algarve, como Milreu34, em Estói, ou o Cerro da Vila35, em Vilamoura. Ainda assim, outras construções foram edificadas de raiz durante o domínio islâmico. É o caso do Castelo das Relíquias e do Castelo Velho, ambos no concelho de Alcoutim. Trata-se de fortificações localizadas em pontos estratégicos, e que remontam ao período emiral-califal, tendo sido ocupados até finais do séc. XI36, ou seja; numa fase que antecedeu a chegada dos impérios norte africanos ao alAndaluz. Pouco se sabe sobre Castro Marim durante o domínio muçulmano. É possível que, em época islâmica, fosse um pequeno povoado fortificado 37 e que tivesse tido alguma importância como entreposto marítimo e comercial. A julgar pelos abundantes materiais de época romana, é possível que tenha tido maior importância aquando do início da presença muçulmana, pois o registo arqueológico não tem proporcionado nenhuma leitura mais consistente para os séculos do domínio islâmico pleno. Ainda assim, a planta quadrangular que encontramos na alcáçova do castelo, com as suas torres de canto semi-cilíndricas, já foi considerada por Cláudio 34 Theodor Hauschild, “Milreu, «Villa» Romana”, in O Algarve Da Antiguidade aos nossos dias: elementos para a sua história, p.57. Do mesmo autor ver também “Milreu. Estói (Faro) villa romana e santuário”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, p.412. 35 Cláudio Torres & Santiago Macias, Susana Gómez, Terras da Moura Encantada – A Arte Islâmica em Portugal, pp.145-146; Cláudio Torres & Santiago Macias, O Legado Islâmico em Portugal, p.201: José Luís de Matos, “Cerro da Vila”, in al–ulyã – Revista do Arquivo Histórico Municipal de Loulé, Nº5, p.27. Do mesmo autor ver também “Cerro da Vila”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, p.392. 36 Cláudio Torres & Santiago Macias, Susana Gómez, Terras da Moura Encantada – A Arte Islâmica em Portugal, p.127; Helena Catarino, “Castelos Muçulmanos do Algarve”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, p.454; Natércia Magalhães, O Legado Arquitectónico Islâmico no Algarve – El Legado Arquitectónico Islâmico en el Algarve, pp.45-48. 37 Cláudio Torres & Santiago Macias, Susana Gómez, Terras da Moura Encantada – A Arte Islâmica em Portugal, p.127. 21 Torres como volumetricamente decorrente da “tradição bizantinaemiral”38. Caso diferente é o de Cacela (Qastalla), que podemos incluir no grupo dos principais núcleos de povoamento durante o domínio islâmico. Se seguirmos o raciocínio de Garcia Domingues, o território de Cacela terá sido ocupado na primeira fase da conquista islâmica 39, o que não deixa de ir de encontro à opinião de Helena Catarino, para quem o Castelo de Cacela deverá remontar ao domínio emiral-califal na região40. Nessa primeira fase da fath, Qastalla, foi ocupada por uma família berbere, os Banu Darraj, que terão acompanhado Tarik Ali Ibn Zyad na sua demanda expansionista na península Ibérica41. Mais tarde, no séc. X, a terra viu nascer o grande poeta Ibn Darraj al-Quastali, descendente dos Banu Darraj. Tal não foi o seu prestígio literário que Ibn Darraj foi “incorporado na corte de Córdova, em 992, na qualidade de poeta oficial e escritor redactor do Estado califal do poderoso Almançor”42. Nos inícios do século XII, al-Idrisi referiu-se a Cacela como “Uma fortaleza construída à beira mar. Está bem povoada e há nela muitas hortas e campos de figueiras”43. Alguns anos mais tarde, durante o segundo período de taifas, o castelo de Cacela foi ainda um centro de operações 38 Cláudio Torres, “O Al Garbe”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, pp.440-441; Natércia Magalhães, O Legado Arquitectónico Islâmico no Algarve – El Legado Arquitectónico Islâmico en el Algarve, pp.42-44. 39 Cf. José Garcia Domingues, Ossónoba na Época Árabe, pp.26-27. Ver também Fernando Pessanha, A Cidade Islâmica de Faro, pp.19-23. 40 Cf. Helena Catarino, “Castelos Muçulmanos do Algarve”, in Noventa Séculos Entre a Serra e o Mar, p.450. 41 Ahmed Tahiri, Cacela e o seu poeta Ibn Darraj al-Qastalil na História e Literatura do Al-Andaluz, pp.23-24. 42 Fernando Pessanha, “Ibn Darraj al-Qastalli, poeta de Cacela”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nª 134, Julho de 2011, p.27. 43 Al Idrisi. Transcrito de António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe, p.51. Ver também José Garcia Domingues, Ossónoba na Época Árabe, p.19. 22 militares contra Tavira, que acabou por ser conquistada após dois meses de cerco, em 1167 ou 116844. No decurso da conquista cristã, no século XIII, a Ordem de Santiago trocou Estômbar e Alvor por Cacela45, pois aquelas duas conquistas se encontravam afastadas da zona dominada pelos Espatários. Deste modo, chegava ao fim o domínio islâmico em Cacela. Se é verdade que o nosso conhecimento sobre a presença muçulmana neste território era escassa, também é verdade que, nas últimas décadas, novos dados arqueológicos têm vindo a aprofundar esse conhecimento. Para além dos contributos de Estácio da Veiga e de Leite de Vasconcelos 46, outras investigações têm sido fundamentais, nomeadamente a escavação de emergência realizada em 1998, e da qual resultou a identificação do Núcleo islâmico de Cacela Velha, nomeadamente um bairro residencial do período almóada47. Neste contexto, a Câmara Municipal de Vila Real de Santo António adquiriu o terreno onde foram identificas estas estruturas, com o intuito de promover um projecto de estudo, salvaguarda e valorização deste sítio arqueológico. 44 António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe, pp.352; José Garcia Domingues, Ossónoba na Época Árabe, p.19; 45 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, pp.66-67; António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe,pp.372-373. 46 Cristina Garcia, Cacela, Terra de Levante – memórias da paisagem algarvia, pp.26.28; Da mesma autora ver também “Cacela Velha no tempo de al-Idrisi a partir dos dados da arqueologia”, in Itinerários e Reinos – Uma Descoberta do Mundo, O Gharb Al-Andaluz na obra do geógrafo Al-Idrisi, pp.193-201. 47 Cristina Garcia, ”Urbanismo Islâmico em Cacela, uma intervenção inovadora na região do Algarve”, in Urbanismo Islámico en el Sur Peninsular y Norte de África – Actas del Seminario Urbanismo Islámico. Enfoques diversos para una herencia común, pp.21-38; Cláudio Torres & Santiago Macias, O Legado Islâmico em Portugal, p.p.217-218; Natércia Magalhães, O Legado Arquitectónico Islâmico no Algarve – El Legado Arquitectónico Islâmico en el Algarve, pp.39-41. Da mesma autora ver também Algarve Castelos, Cercas e Fortalezas, pp.284-285. 23 Fig.5 - Bairro Islâmico em Cacela Velha. O Baixo Guadiana Medievo-Cristão No decurso da conquista cristã, a Ordem de Santiago, através da acção de Paio Peres Correia, empreendeu uma série de acções militares de modo a controlar posições estratégicas no baixo Guadiana. Em 1238 Mértola foi conquistada48, chegando os cristãos às portas do Algarve. Nos anos seguintes seguiram-se as conquistas de Alcoutim, Castro Marim e Ayamonte, onde, alegadamente, terá participado o próprio rei D. Sancho II49. Quando as posições de Estômbar e Alvor foram conquistadas aos muçulmanos, acabaram por ser trocadas pelo castelo de Cacela 50, na medida em que estas últimas conquistas se encontravam demasiado 48 José Mattoso, História de Portugal – Vol. II – A Monarquia Feudal, p.124; Miguel Gomes Martins, De Ourique a Aljubarrota – A Guerra na Idade Média, p.172; Helena Catarino, “A Ocupação Islâmica”, in História de Portugal Volume III - O Mundo Luso Romano (II) Portugal Medieval (I), p.294. 49 José Mattoso, História de Portugal – Vol. II – A Monarquia Feudal, p.124. 50 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, pp.66-67; António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe,pp.372-373. Ver também Cristina, “Cacela Velha no tempo de al-Idrisi a partir dos dados da arqueologia”, in Itinerários e Reinos – Uma Descoberta do Mundo, O Gharb Al-Andaluz na obra do geógrafo Al-Idrisi, p.199. 24 afastadas da zona dominada pelos cristãos. Deste modo, a troca permitiu que a Ordem de Santiago reforçasse a sua posição na região do baixo Guadiana. Dava-se, então, início a uma nova época; uma época que anunciava o fim do domínio islâmico e o início do domínio cristão. Exagera Ataíde de Oliveira quando afirma: “Em 1249 entrou D. Affonso III na posse definitiva do Reino do Algarve”51. Do ponto de vista jurídico e oficial, estas conquistas só vieram a fazer parte integrante do território português com a assinatura do Tratado de Badajoz de 1267, entre Afonso III de Portugal e Afonso X de Castela. Recordamos que entre a conquista definitiva do Algarve, em 1249, e a assinatura do referido tratado, decorreu um longo litígio entre os dois monarcas, na medida em que ambos tinham pretensões sobre os territórios algarvios. É certo que, no ano de 1240, D. Sancho II doou à Ordem de Santiago os castelos Ayamonte e de Cacela - posteriormente o Papa Inocêncio IV confirmou esta última doação, em 15 de Setembro de 1246 52. Quinze anos mais tarde, depois de D. Afonso III sair vitorioso na guerra que o opôs a D. Sancho II, o Bolonhês confirmou a doação do castelo de Ayamonte 53 e Cacela54 à Ordem de Santiago, em 1255. Porém, o monarca castelhano 51 Ataíde de Oliveira, Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, Vila Real de Santo António, p.62. 52 Carta de confirmação papal da doação do Castelo de Cacela à Ordem de Santiago, em 1240. Documento publicado por Hugo Cavaco, in A Vila de Cacela-a-Velha. Antologia de Fontes Históricas, pp.13-16. 53 Carta de doação do Castelo de Ayamonte à Ordem de Santiago por Afonso III, em 20 de Fevereiro de 1255. Documento publicado por José Marques, “Os Castelos Algarvios da Ordem de Santiago no Reinado de D. Afonso III”, in Actas das I Jornadas de História Medieval do Algarve e Andaluzia, pp.118-121. A.N.T.T., Chancelaria de D. Afonso III, liv. 1, fl. 149. 54 Carta de Doação do Castelo de Cacela à Ordem de Santiago por Afonso III, em 1255. Documento publicado por Hugo Cavaco, in A Vila de Cacela-a-Velha. Antologia de Fontes Históricas, pp.17-19. Documento também publicado por José Marques, “Os Castelos Algarvios da Ordem de Santiago no Reinado de D. Afonso III”, in Actas das I Jornadas de História Medieval do Algarve e Andaluzia, pp.116-118. A.N.T.T., Chancelaria de D. Afonso III, liv. 1, fls. 148-148v. 25 protestava, afirmando as suas pretensões sobre estes territórios, na medida em que o Algarve era, teoricamente, parte integrante do reino de Aben Mafon, um vassalo de Afonso X, o Sábio. Tal como Alexandre Herculano bem observou, “Ibn Mahfot (…) negociou com o infante de Castela cederlhe o direito que tinha ou suponha ter nos distritos ao ocidente do Guadiana e, segundo cremos, o infante assegurou-lhe a conservação futura do senhorio de Niebla ou do Algarve, quase à maneira de feudo”55. O diferendo só veio a ser resolvido através do Tratado de Badajoz, em 1267, no qual D. Afonso X abdicou das suas pretensões, fazendo do seu neto (filho de D. Afonso III e D. Beatriz) o herdeiro legítimo do reino do Algarve. De acordo com o tratado, todos os territórios algarvios a ocidente do Guadiana passavam a fazer parte integrante da coroa portuguesa, com a condição de Portugal renunciar aos castelos conquistados além-Guadiana, entregando, portanto, Ayamonte, Aroche e Aracena56. Deste modo, o Guadiana acabou por resultar numa fronteira natural, compreendida entre a sua foz e a confluência com o rio Caia. Do nascimento desta divisão política e administrativa resultou, desde logo, uma evidente preocupação com a defesa da linha de fronteira, o que levou à reparação e construção de fortalezas ao longo do Guadiana. Castro Marim, pela sua privilegiada localização estratégica, apresentou-se como local propício à construção de uma nova fortificação. Não nos devemos esquecer que as violações dos tratados eram uma possibilidade, pelo que se tornava necessário defender o território português de eventuais incursões castelhanas. Por outro lado, também havia que ter em consideração a proximidade a Marrocos e as frequentes investidas da pirataria magrebina, 55 Alexandre Herculano, História de Portugal - Volume II - Desde o começo da Monarquia até ao fim do Reinado de Afonso III, p.25. Ver também José Garcia Domingues, Aben Mafon e a Conquista do Algarve Pelos Portugueses na «Adh-Dhakhyra As-sanyya», p.25. 56 Valdemar Coutinho, “O fim da Reconquista e a construção/reconstrução de fortificações na região fronteiriça do Algarve”, in Revista da Faculdade de Letras - História (2ª série), vol.15, Nº2, p.858. 26 bastante activa durante o período medievo-cristão57. Deste modo, tornou-se imperativa a adopção de uma política de repovoamento que assegurasse a defesa das fronteiras portuguesas. Com efeito, o povoamento das localidades raianas sempre se apresentou bastante problemático, na medida em que estas eram as zonas mais desprotegidas e propícias a incursões inimigas. É neste sentido que Castro Marim veio a usufruir de um conjunto de privilégios indispensáveis à fixação de alguma população, pois o lugar deve ter ficado praticamente despovoado aquando da conquista cristã. Logo em 1274. D. Afonso III mandou construir o castelo medieval58 e, poucos anos depois, a vila recebeu carta de foral, em 1277, passando-se o mesmo com Cacela, cujo foral foi outorgado por D. Dinis em 17 de Julho de 128359. Tal foi a importância estratégica atribuída à foz do Guadiana que, de acordo com a bula papal Ad ea ex quibus, o castelo de Castro Marim foi destinado à Ordem de Nosso Senhor Cristo, em 131960. A Ordem do Templo, que em Portugal desempenhou um importante papel no processo de conquista cristã, foi extinta em 1312, no decurso de um sórdido processo movido pelo Papa Clemente V e pelo endividado Filipe IV de França61. De modo a manter os bens dos templários em Portugal, foi criada a Ordem de 57 Fernando Pessanha, “Sobre o corso e a pirataria magrebina no Algarve”, in Jornal do Algarve, Nº 2842, 15 de Setembro de 2011, p.15. 58 Natércia Magalhães, Algarve - Castelos, Cercas e Fortalezas, pp.72-81. 59 Carta de foral de Cacela, de 1283. Documento publicado por Hugo Cavaco, in A Vila de Cacela-a- Velha. Antologia de Fontes Históricas, pp.23-37. Ver também Fernando Pessanha, “Os 730 anos do foral de Cacela”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº157, Agosto de 2013, p.21. 60 Ver bula papal Ad ea ex quibus, de 14 de Março de 1319. Documento publicado in Monumenta Henricina, Vol. I, Docs. 61 e 62, pp.97-119. 61 Ademir Cruz da Silva, “O novo Templo português: a formação da Ordem de Cristo – século XIV”, in Anais do XXVI Simpósio Nacional de História, pp.1-7. 27 Cristo, uma nova Ordem que pudesse substituir e receber os bens da Ordem extinta, sendo-lhe concedida o castelo de Castro Marim para sede62. Fig.6 - Vista aérea do Castelo de Castro Marim. Por entre as razões apontadas para se fixar a sede naquela localidade, fez-se referência à privilegiada localização do castelo, nomeadamente, à sua proximidade a Marrocos: “Castello muy forte, a que a disposição do lugar faz muy defensavel que he na frontaria dos ditos inimigos (os Mouros)”63. Com efeito, a presença muçulmana no Norte de África e em Granada constituía uma ameaça ao Algarve cristão, mais susceptível de ataques. Deste modo, a instalação na Ordem na zona de fronteira mais próxima da potencial ameaça enquadrava-se perfeitamente na linha de actuação desenvolvida pelo papado, no âmbito da ideia de cruzada 64. Quando, em 1356, a Ordem de Cristo foi transferida para Tomar, já no reinado de D. Pedro I, a importância de Castro Marim diminuiu e a terra voltou a despovoar-se. Foi nesse sentido, com o intuito de atrair moradores 62 Osvaldo Pires; Pedro Pires, Castro Marim, Baluarte Defensivo do Algarve, pp.20-27. 63 Deffiniçoens & estatutos dos cavalleyros da Ordem de Nosso Senhor Jesu Christo com a historia da origeme della… Transcrito de Valdemar Coutinho, “O fim da Reconquista e a construção/reconstrução de fortificações na região fronteiriça do Algarve”, in Revista da Faculdade de Letras - História (2ª série), vol.15, Nº2, p.860. 64 Isabel L. Morgado de Sousa e Silva, A Ordem de Cristo (1417-1521) - Revista Militarium Ordium Analecta, Nº 6 p.45. 28 para esta zona raiana, que D. Fernando I, então em guerra com Castela, mandou restaurar o castelo e concedeu alguns privilégios aos moradores da vila, nomeadamente não serem obrigados a ir em armadas, frotas ou galés e a permissão de trazerem armas 65. Do mesmo modo, também os moradores deviam respeitar o recolher obrigatório, recolhendo-se ao cair da noite, após o correr do sino; na eventualidade de alguma incursão inimiga, o desrespeito desta ordem poderia resultar em aprisionamentos, diminuindo ainda mais a já insuficiente população da vila 66. Recordamos que em 1354, por exemplo, a vila de Castro Marim foi invadida e saqueada 67. É, portanto, neste contexto que, em 1421, D. João I determinou a criação de um couto para quarenta homiziados em Castro Marim, para o “dicto lugar seer mjlhor pobrado”68. Podiam, portanto, recolher-se à vila os condenados que não tivessem recorrido em traição ou aleivosia69. Desta forma, pretendia o monarca que os acusados de crimes fossem degredados para um território isolado e despovoado, onde deveriam cumprir as suas penas judiciais e, simultaneamente, defender as fronteiras do reino 70. De 65 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 30, fl. 118. 66 Maria de Fátima Botão, “A Definição e a Dinâmica dos Limites Internos no Algarve Medieval” in Revista da Faculdade de Letras – História, (2ª série), vol.15, Nº2, p.745. 67 Abel dos Santos Cruz, “A guerra de corso e pirataria no Mediterrâneo Ocidental ao tempo do conde D. Pedro de Meneses (1415-1437) ”, in A Guerra Naval no Norte de África (séculos XV – XIX),pp.57-58. 68 Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.116. Ver também Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.23; Hugo Cavaco, O Degredo e o Privilégio em Castro Marim (Alguns subsídios para a sua história), p.6. 69 De acordo com Paulo Drummond Braga, muitos acusados de crimes contra a moral sexual vigente iam degredados para Castro Marim. Ver Paulo Drummond Braga Filhas de Safo – Uma História da Homossexualidade Feminina em Portugal, p.64, nota 62. Porém, não deixámos de reparar que, segundo Humberto Baquero Moreno, o couto não era válido para os sodomitas. Ver Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.116. 70 Os Coutos de Homiziados situavam-se nas regiões de fronteira. Além da fixação de pessoas, tinham também como objectivo a defesa do território e eram locais de cumprimento de penas judiciais e não apenas um refúgio de criminosos. Ver Margarida Garcez Ventura, “Os coutos de Homiziados nas 29 resto, até a forma como Henrique Fernandes Sarrão se referiu a Castro Marim, em 1600, é bem representativa da natureza da terra: “Homiziado vem meu rude estilo ao couto da vila”71. Certamente a passagem de D. João I por Castro Marim, no regresso da conquista de Ceuta, em 2 de Setembro de 141572, terá contribuído para a decisão de prover a vila com mais recursos humanos. É bastante verossímil que o monarca tenha encontrado a vila bastante carenciada de população. Só isso poderá explicar a criação de um couto de homiziados, uma vez que estes não eram criados quando a população era suficiente para garantir a prosperidade e defesa da terra73. Em 7 de Janeiro de 1458, permitiu D. Afonso V que se se pudessem instalar quinze homiziados em Alcoutim74. Não deixa de ser curioso o facto de a carta ter sido outorgada em Ceuta, e que em 23 e 24 de Outubro do mesmo ano, o mesmo rei conquistou Alcácer Ceguer75, um pequeno castelo que funcionava como base de frequentes ataques navais ao Algarve daquém. Pode-se, portanto, depreender que “o Africano” pretendia reforçar a presença portuguesa no baixo Guadiana, o território do Algarve mais próximo de Alcácer Ceguer e de Tânger76. Acresce ainda que em 28 de Setembro de 1457, pouco tempo fronteiras com o direito de asilo”, in Revista da Faculdade de Letras. História, 2ª série, Vol. 15, Nº 1, pp.601-625. 71 Henrique Fernandes Sarrão, “História do Reino do Algarve”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.70. 72 Gomes Eanes de Zurara, Crónica da Tomada de Ceuta, Capítulo CI, p.284. Ver também Monumenta Henricina, Vol. I, Doc. 103, p.217. 73 Cf. Margarida Garcez Ventura, “Os coutos de Homiziados nas fronteiras com o direito de asilo”, in Revista da Faculdade de Letras. História, 2ª série, Vol. 15, Nº 1, p.603. 74 Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.123. 75 Ver Rui de Pina, “Crónica do Senhor Rey D. Afonso V”, in Crónicas, pp.772-778; Damião Góis, Chronica do Principe Dom Joam, Capítulos X-XIII, pp.40-54. 76 Com efeito, a intenção inicial do monarca português era atacar Tânger, contudo, o capitão de Ceuta, D. Sancho de Noronha, rapidamente alertou o “Africano” da inviabilidade do projecto, pelo que o ataque 30 antes da criação do couto em Alcoutim, D. Afonso III nomeou Afonso Dias, escudeiro do infante D. Fernando, como escrivão dos homiziados de Castro Marim77. Tratar-se-á de um conjunto de coincidências? Ou seria intenção do monarca reforçar o baixo Guadiana antes de lançar nova ofensiva em Marrocos? A verdade é que os descobrimentos e a expansão portuguesa para o Norte de África transformaram profundamente o Algarve, a região onde se estabeleceu o Infante D. Henrique e de onde passou a coordenar a conquista ultramarina. Não nos devemos esquecer que, logo em 1416, D. João I confiou ao infante a responsabilidade do provimento e defesa de Ceuta78, pelo que o seu estabelecimento no Algarve se tornou inevitável. O próprio D. Henrique permaneceu durante algum tempo nesta vila fronteiriça do Algarve quando ali recebeu o infante D. Fernando, o seu sobrinho e herdeiro, entretanto regressado ao reino, depois da sua passagem por Ceuta79. Do mesmo modo, também outros fidalgos de estabeleceram no Algarve, apoiando o infante na sua demanda e exercendo altos cargos em Castro Marim. Diogo Lopes, cavaleiro da casa do infante D. Henrique e comendador de Castro Marim, foi nomeado vedor dos vassalos régios moradores na dita vila e termo, em 144480. Vasco Eanes Corte Real, que foi acabou por ser dirigido a Alcácer. Ver D. Fernando de Meneses, História de Tânger Durante la Dominacion Portuguesa, p.23. 77 Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.116. 78 Ver Isabel L. Morgado de Sousa e Silva, A Ordem de Cristo (1417-1521) - Revista Militarium Ordium Analecta, Nº 6 Nº 6, p.63. Mais tarde, em 1433, o rei D. Duarte concedeu ao infante D. Henrique um quinto de tudo o que fosse tomado pelos seus navios de corso, que andavam a patrulhar o Estreito de Gibraltar. Ver Monumenta Enricinha, Vol. IV, p.266; Ver também Edite Maria da Conceição Martins Alberto, “Resgatar cristãos em terras no Norte de África – O ofício de Alfaqueque no século XV”, in Estudos de História Luso-Marroquina, p.42. 79 Alberto Iria, O Infante D. Henrique no Algarve (estudos inéditos), p.77. 80 Ver Monumenta Enricinha, Vol. VIII, p.220. 31 capitão da cavalaria de Castro Marim antes de 1433 81, era filho de Vasco Eanes, que acompanhou D. Henrique durante a conquista de Ceuta 82. E porquê esta necessidade de prover Castro Marim com gente de confiança do infante? Porque a vila, pela sua proximidade geográfica a Marrocos, passou a ter um importante papel na defesa da presença portuguesa no Norte de África e no combate contra a pirataria magrebina. Nesse sentido, não podemos deixar de salientar a extraordinária acção de Garcia de Melo, anadel-mor dos besteiros e alcaide-mor de Castro Marim83. Recordamos que em 1504, no mesmo ano em que a vila recebeu o foral manuelino 84, Garcia de Melo liderou um vitorioso ataque a Larache, na altura um conhecido ninho de piratas que incansavelmente atacava as costas do Algarve. Nesse ataque capturou cinco galeotas, dois bergantins e uma caravela, tendo incendiado uma galé e três outras caravelas 85. Com efeito, esta praça-forte do Algarve tornou-se num importante porto piscatório e comercial, o que levou a um aumento da população que atingiu o seu apogeu nos séculos XV e XVI. Aliás, doação da “dísima nova de todo o pescado, que pescarem quaisquer pessoas no mar do Monte Gordo”86, que o rei D. Duarte fez ao seu irmão, o infante D. Henrique, em 81 Ver Monumenta Enricinha, Vol. IV, p.500 82 De acordo com Zurara, Vasco Eanes saltou na praia da vila com o infante D. Henrique e foi o primeiro português a combater os mouros na porta da Almina. Ver Gomes Eanes de Zurara, Crónica da Tomada de Ceuta, Capítulo LXXII, p.225. 83 Não sabemos exactamente em que ano foi investido com a alcaidaria de Castro Marim, contudo, uma carta que foi datada de 1509 apresenta-o como alcaide-mor desta praça de guerra do Algarve, nesse mesmo ano. Ver A.N.T.T., Gaveta 20, Maço V, nº 14. 84 Sobre o Foral Manuelino de 1504 veja-se Hugo Cavaco, Castro Marim Quinhentista. O Foral Novo de (de 1504) e o Tombo da Comenda (de 1509). Subsídios para uma interpretação histórica da vila, pp.1732. 85 Ver Rui Landeiro Godinho, “A Armada do Estreito de Gibraltar no século XVI”, in A Guerra Naval no Norte de África (Séculos XV-XIX), p.120. 86 Joaquim Veríssimo Serrão, História de Portugal – Volume II – A Fundação do Estado Moderno (1415-1495), p.65; Ataíde de Oliveira, Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, p.73. 32 25 de Setembro de 1433, é bem representativa da crescente importância da actividade pesqueira no termo de Castro Marim e da necessidade de protege-la. Foi certamente nesse contexto que, em 1450, Manuel Pessanha foi nomeado por D. Afonso V para guardar e defender os portos do Algarve, inclusive o de Castro Marim87. A defesa da foz do Guadiana revestia-se, portanto, de imperativa importância na medida em que o rio poderia funcionar como uma porta de entrada para que inimigos assaltassem a vila, saqueando, destruindo e capturando a população. A verdade é que não obstante as conquistas e a presença militar portuguesa em Marrocos, no decurso do séc. XV e XVI, a pirataria magrebina nunca deixou de ser uma preocupação constante, nomeadamente, para navegadores, pescadores e comerciantes. De resto, esta preocupação defensiva ficou bem patente quando foi determinada a não construção de casas novas no exterior da cerca de Castro Marim 88, e aquando das obras de restauro que D. Manuel I mandou fazer no castelo, em 150989. Porém, seriam estas obras de restauro e fortificação suficientes para garantir a defesa da foz do Guadiana? 87 Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.27; Osvaldo Pires; Pedro Pires, Castro Marim, Baluarte Defensivo do Algarve, p.31, nota 77; Fernando Pessanha, “Castro Marim – Terra com História”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nª 140, Janeiro de 2012, p.24. 88 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, Liv. 5, fl.33. 89 Natércia Magalhães, Algarve - Castelos, Cercas e Fortalezas, pp.79-80. 33 Fig.7 - Castro Marim representado em O Livro das Fortalezas, de Duarte de Armas. Primeiras referências a Arenilha Antes de avançarmos no presente trabalho, convém esclarecer em que conjuntura política surge o topónimo “Arenilha”. O reinado de Manuel I, “O Venturoso” (1495-1521), foi marcado por profundas transformações resultantes das conquistas, das grandes navegações e das descobertas. Portugal encontrava-se em plena expansão ultramarina e comercial, sendo necessário readaptar o seu funcionamento administrativo e político. As Ordenações Afonsinas (de D. Afonso V, 1438-1448), ainda fortemente influenciadas pelo peso das leis medievais, já dificilmente conseguiam responder aos desafios que então se impunham. Deste modo, o funcionamento do reino acabou por ser reorganizando através das Ordenações Manuelinas (iniciadas em 1495 e publicadas como novo corpus legislativo em 1512). Lançaram-se assim os alicerces do Estado português da Idade Moderna, caracterizado, em boa parte, por uma política de centralização baseada na afirmação do poder régio. Por outro lado, as vizinhas monarquias ibéricas encontravam-se numa fase de unificação 34 territorial, sob a égide de Isabel I de Castela e Fernando II de Aragão, os designados Reis Católicos. Ainda que D. Manuel I tenha promovido uma política de aproximação com Espanha, desposando duas filhas dos Reis Católicos, não deixou de assegurar uma política de fortificação da rede de castelos que percorria a fronteira entre Portugal e o poderoso reino rival. Tornava-se de imperativa importância a manutenção de uma raia fortificada e em condições de resistir a eventuais impulsos expansionistas por parte da vizinha Espanha. Foi nesse contexto que se tornou necessário a elaboração de Livro das Fortalezas, ou seja; um documento onde estivesse registado o estado de conservação de todas as fortificações portuguesas na fronteira com Castela. Tal incumbência recaiu no debuxador Duarte de Armas, Escudeiro da Casa Real. Com efeito, já em 1507 tinha Duarte de Armas seguido na armada de D. João Meneses, numa autêntica operação de espionagem no sentido de debuxar Azamor, Mamora, Larache e Salé, na costa de Marrocos 90, onde D. Manuel I planeava novas ofensivas militares. Ora, sendo Duarte de Armas um funcionário Real e conhecedor da arquitectura militar da época, para além de “boom debuxador”, recebeu o encargo de produzir um documento sobre as fortificações nos “termos” dos domínios portugueses em Marrocos, entre 1507 e 1508 e, posteriormente, na fronteira portuguesa com Castela, entre 1508 e 1510. É no Livro das Fortalezas, onde se encontram inventariadas todas as fortificações portuguesas ao longo da fronteira luso-castelhana, que 90 Segundo Damião Góis, “Como el Rei todo o tempo que viueo, trabalhasse muito por fazer guerra aos Reis de Fez, Miquinez, & Marrocos, & a outras prouincias de Mouros, que sam da conquista desta destes regnos, mandou no anno atras de mil, & quinhentos e sete, dom Ioaõ de Meneses com tres carauellas (...) & hum Duarte Darmas grande pintor, que traçou, & debuxou as entradas destes rios, & a situaçam da terra. O que tudo feito como conuinha, dom Ioaõ de Meneses se veo ao regno a dar informaçaõ a el Rei do que achara”. Ver Damião Góis, Chronica do Serenissimo Senhor Rei D. Manoel, Parte II, Capítulo XXVII, p.208; Teresa Lacerda, “D. João de Meneses. Um retrato da Nobreza Portuguesa em Marrocos”, in Estudos de História Luso-Marroquina, p.126. Lamentavelmente, não é conhecido nenhum dos desenhos produzidos nesta missão. 35 encontramos duas ilustrações do já referido castelo de Castro Marim, uma no sentido Norte-Sul, outra no sentido Sul-Norte91. Tratam-se, portanto, de documentos que se revestem de grande importância, não só por darem a conhecer a configuração do castelo durante o reinado de D. Manuel I, como também por a gravura do sentido Norte-Sul apresentar um elemento de grande interesse: o topónimo de “Arenilha”. Fig.8 - Topónimo “Arenilha” em O Livro das Fortalezas, de Duarte de Armas. Ora, o já mencionado Livro das Fortalezas foi produzido nos primeiros anos do século XVI, talvez por volta de 1509, e já denuncia o topónimo que veio a ser “oficializado” com a carta de privilégio de 12 de Fevereiro de 1513, o documento que manda proceder à edificação da “nossa villa darenilha”, ou seja; o documento que assinala os 500 anos da fundação de Santo António de Arenilha. Assim sendo, como explicar a existência do topónimo ainda antes da carta de privilégio concedida por D. 91 Duarte de Armas, Livro das Fortalezas, fl. 1. Ver também Hugo Cavaco, Pelas Praias de Arenilha e Mares de Monte Gordo, p.14. 36 Manuel I? Antes de mais, devemos debruçar-nos sobre a natureza linguística/etimológica do próprio topónimo. De acordo com o dicionário da Real Academia Española, “arenilla” apresenta-se como sinónimo de “arena menuda”92, ou seja: areia miúda. Quer isto dizer que se trata de um nome com uma evidente origem castelhana e que se refere claramente às características arenosas da margem portuguesa da desembocadura do Guadiana. Aliás, quando em 1775 se pretendeu baptizar a nova vila iluminista com o nome de Vila Real de Santo António de Arenilha, prontamente o Marquês de Pombal proibiu a utilização do nome “Arenilha”, alegando que “é uma palavra hespanhola e Villa Real uma povoação portuguesa”93. Porém, esta intenção não foi ideia original do ministro de D. José I. Já em 1542 determinava D. João III o mesmo sem, no entanto, justificar a razão da erradicação do topónimo original: “Ey por bem e meu serviço que há dita Villa se nomee e chame daquy en diamte A Villa de Samto Antonio e se nam nomee nem chame mais do nome darenilha que asy ate a ora teve”94. Resta-nos indagar as razões dessa origem castelhana. Recordamos que Castro Marim, que já era couto de homiziados desde 1421, justificava o pedido de isenções de alguns encargos pelos “constantes trabalhos que os moradores tinham com os castelhanos, que insistiam em vir pescar ao reino”95. Quer isto dizer que os pescadores castelhanos vinham pescar para as margens portuguesas, não pagando os devidos impostos à Coroa. A existência do topónimo de origem castelhana, ainda antes da elaboração do 92 Dicionario de la Real Academia Española. Disponível em: http://lema.rae.es/drae/?val=arenilla – Consultado dia 10 de Setembro de 2013. 93 Ataíde de Oliveira, Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, p.71. 94 A.N.T.T., Chancelaria de D. João III, liv. 32, fl. 82. Documento publicado por Hugo Cavaco, in Revisitando Santo António de Arenilha, p.47. 95 Margarida Garcez Ventura, “Os coutos de Homiziados nas fronteiras com o direito de asilo”, in Revista da Faculdade de Letras. História, 2ª série, Vol. 15, Nº 1, p.608. A.N.T.T., Chancelaria de D. Afonso V, liv. 2, fl. 30. 37 documento que manda proceder à construção da vila de Arenilha, pode perfeitamente indicar a ocupação sazonal daquele areal na margem portuguesa da foz do Guadiana por populações de pescadores de origem espanhola. Aliás, ainda que não existam indícios arqueológicos que nos possam conduzir a uma interpretação mais consistente, não devemos descartar a possibilidade de uma ocupação sazonal do território em questão96, mesmo para cronologias mais remotas, como o período medievoislâmico. Devemos ter em consideração que a fixação sazonal de comunidades de pescadores nos areais próximos das desembocaduras dos rios algarvios, como o Arade ou o Gilão, foi uma constante ao longo dos tempos. De modo que tal princípio também poderá ser aplicado a Arenilha, ainda que a leitura arqueológica não o possa comprovar. Recordamos que dada a natureza geomorfológica dos areais (móveis e altamente incertos) qualquer tipo de construção implicaria a utilização de materiais que atendessem a um carácter meramente provisório, isto é; construções com materiais baratos e consequentemente perecíveis, como colmo, palhotas ou madeira. Por outras palavras, é bastante provável que já existissem algumas construções nos areais de Arenilha anteriores ao documento que mandou proceder à edificação da vila. Arenilha – motivos da fundação Já em Maio de 2013, num artigo publicado no Jornal do Baixo Guadiana, formulámos a seguinte questão: “se o nascimento de Vila Real resultou da estratégia política, económica e territorial concebida pelo Marquês de Pombal, em finais de 1773, visando a afirmação do Estado 96 Já Hugo Cavaco tinha levantado esta hipótese, em 1995. Ver Hugo Cavaco, Revisitando Santo António de Arenilha, p.12. 38 português face ao Estado espanhol, que dizer da fundação de Arenil ha?”97.Ora, falar dos motivos que levaram à fundação da vila de Santo António de Arenilha é falar de um conjunto de factores de índole económica, política e estratégica. Um desses factores foi o contrabando. Desde que o Algarve daquém foi conquistado pelos cristãos que os pescadores algarvios se habituaram a frequentar os ricos mares das costas marroquinas. Como António Dias Farinha bem observou, o contrabando de todo o género de produtos, nomeadamente armas e outras mercadorias proibidas e exóticas, passaram a então a abundar nos portos do Algarve 98. É possível que esta situação se agravasse no termo de Castro Marim, pois a sua localização geográfica próxima a Marrocos, na foz de um rio e na fronteira com Castela, tornava-se propícia a práticas danosas para os cofres da Coroa. Para além disso, também há que ter em consideração que toda a “erma região entre Cacela e a foz do Guadiana correspondia a um areal não protegido e pouco vigiado”99, pelo que este território se tornava propício à prática de actividades ilícitas, nomeadamente o contrabando. Recordamos que já em 1439 tinha D. Afonso V confirmado a D. Henrique a mercê das presas feitas pelos navios e fustas armados às suas custas 100, ou seja, confirmavam-se as condições para que as embarcações do infante patrulhassem os mares algarvios e aprisionassem as cargas consideradas ilegais. Alguns anos depois, em 1450, D. Afonso V incumbiu o comendador de Castro Marim, Manuel Pessanha, de investigar o muito 97 Fernando Pessanha, “Vila Real de Santo António e Santo António de Arenilha – Duas fundações, uma estratégia”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº155, Maio de 2013, p.21. 98 António Dias Farinha, Os Portugueses em Marrocos, p.15. 99 Fernando Pessanha, “Santo António de Arenilha – Fundada há 500 anos”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº153, Fevereiro de 2013, p.21. 100 Ver carta da Regência, a confirmar ao infante D. Henrique a de el-rei D. Duarte, de 25 de Setembro de 1433, de mercê das presas feitas pelos navios e fustas que aquele armasse e trouxesse de armada à sua custa. Documento publicado in Monumenta Enricinha, Vol. VI, doc. 140, p.320-321. 39 contrabando que então se fazia sentir de “ouro e prata, armas cavallos, guados, e bem asy alguuas outras cousas”101. Quer isto dizer que os contrabandistas que pretendessem fazer o seu negócio encontravam no areal despovoado, situado entre Cacela e Castro Marim, um local propício às suas actividades. Naturalmente que o despovoamento deste território era uma realidade que não interessava à Coroa portuguesa, na medida em que locais não protegidos e pouco vigiados facilitavam a prática do contrabando, danoso para os cofres reais. Além disso, também há que ter em consideração que este ermamento oferecia favoráveis condições de segurança a desembarques e posteriores incursões por parte da pirataria magrebina, muito activa durante a centúria de quinhentos. Ora, é neste contexto que a estratégia D. Manuel I passou pela criação de um couto de homiziados, na praia junto à foz do Guadiana,“asy e da maneira que ho he a nossa Villa de Crastro Marym”. Por outras palavras, pretendeu-se fixar um aglomerado que pudesse vigiar e alertar as povoações vizinhas quanto às embarcações da pirataria que frequentemente apareciam no horizonte. E, por outro lado, também o monarca português afirmava a sua soberania política e administrativa sobre um território frequentado pelos pescadores castelhanos, para além tirar melhores proventos das já referidas pescarias de Monte Gordo. Não se pense, porém, que a criação de um couto para pescadores foi exclusividade de Arenilha. No decurso da investigação para a produção do presente trabalho, deparámo-nos com outros casos de criação de coutos para pescadores, e de onde ressalta preocupação de estes não interromperem a sua actividade em virtude do estatuto de homiziados. É o caso do couto de Caminha, criado por D. João I, em 1406, e destinado a marinheiros e pescadores, ou o couto 101 Carta de D. Afonso V ao Corregedor do Reino do Algarve, em 2 de Junho de 1450. Documento parcialmente publicado por Hugo Cavaco, in Pelas Praias de Arenilha e Mares de Monte Gordo, p.14, nota nº 9. 40 da Mexilhoeira, criado por D. João II, em 1495, para 12 pescadores que desempenhassem o seu ofício 102. Para além dos motivos que compreendiam a soberania política e administrativa, o combate ao contrabando, e a exploração dos proventos das pescarias, temos também que ter em consideração as circunstâncias vivenciadas na vizinha Andaluzia; uma Andaluzia que cresce colossalmente e que procura o alimento indispensável à sua subsistência, através da compra de pescado (e não só) no Algarve oriental, não só em Tavira, como em Castro Marim, Alcoutim e, posteriormente, Arenilha 103. Aliás, Alberto Iria refere, a este propósito, que os ostreiros de Castro Marim exportavam os seus moluscos para os vizinhos portos da Andaluzia104 é o próprio Frei João de São José que, quando se refere a Castro Marim, décadas mais tarde, sublinha que “como tem tão perto de si Castela, onde estes mantimentos sempre valem mais caro, ela tudo lhe come”105. É, portanto, através da já referida Carta de Privilégio que surge a “nossa Villa darenilha que hora mandamos fazer e edifycar”. Deste modo, passava a nova vila a possuir o seu próprio termo, que incluía a praia de Monte Gordo, anteriormente pertencente ao termo de Castro Marim106. De resto, os limites geográficos do termo de Arenilha eram delineados pela Carrasqueira, a Norte, o Atlântico, a Sul, o Guadiana, a Este, o Pinhal do Gancho a Oeste. De resto, estas delimitações podem ser observadas numa 102 José António Conceição de Sousa, "Gente" na Expansão portuguesa: gestão de recursos humanos nos séculos XV e XVI, Dissertação para Mestrado em História e Arqueologia da Expansão e dos Descobrimentos Portugueses apresentada à Universidade Nova de Lisboa, pp.23-24. 103 Joaquim Romero Magalhães, Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, pp.238- 239. 104 Alberto Iria, O Infante D. Henrique no Algarve (estudos inéditos), p.83. 105 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.56. 106 A.N.T.T., Chancelaria de D. João III, liv. 42, fl. 79-79v. 41 carta topográfica já do séc. XVIII, onde está representada a nova Vila de Stº António de Arenilha, Monte Gordo, Castro Marim e Ayamonte. Fig.9 - Carta topográfica do terreno compreendido, entre a praia de Monte Gordo e a Praça de Castro Marim na que se faz ver a situação da Vila de Stº António de Arenilha, os rios de Guadiana, Carrasqueira e Liziria e os esteiros de Castro Marim e de Traveça e o lugar em que é situado o Porto de Ayamonte. PT/TT/MR/1/46. Imagem cedida pelo ANTT. 42 Apresentamos, seguidamente, a transcrição da Carta de Privilégio concedida em 8 de Fevereiro de 1513, e posteriormente confirmada por D. João III, em 25 de Maio de 1526. Por outras palavras, o documento régio que assinala os 500 anos da fundação de Arenilha: “Dom Joham etc.. A quantos esta carta virem faço saber que por parte dos moradores da minha Villa darenilha me foi apresemtada huma carta del Rey meu senhor e padre que samta glorya aja de que ho teor h este que se ao diamte segue: Dom Manuell per graça de Deus Rey de portugall e dos alguarves daquem e dalem maar em africa, senhor de guine, e da comquista, navegaçam, comercio dethiopia, arabya, persya e da Imdia, a quantos esta nossa carta virem fazemos saber que querendo nos fazer graça e merçe aos moradores que morarem na nossa Villa darenilha que hora mandamos fazer e adifycar, temos por bem queremos e nos praz que há dita Villa seja couto asy e da maneira que ho he a nossa Villa de Crasto Marym, e as pessoas que hy viverem gozem dos privylegios, liberdades, framquezas, graças e merces que temos outorgadas aos moradores da dita Villa de Crasto Marym. E porem o noteficamos asy ao nosso Corregedor do Reyno do Alguarve e a todollos outros juízes e justiças, oficiaes e pessoas de nossos Regnos a que esta carta for mostrada e ho conhecimento della pertemçer e lhe mandamos que cumpram e guardem aos moradores da dita Villa darenilha os ditos privylegios e liberdades que tem os moradores da dita Villa de Crasto Marym, por quamto lhos damos e outorgamos sem nyso lhe ser postoduvjda nem embargo algum, os quaes privylegios lhe sejão guardados mostrando o trelado deles em ppublica forma somente. E por certidão dello lhe mandamos passar esta nossa carta, dada em a nossa cidade devora a biij (8) dias de fevereiro. 43 Damyão Dias a fez. Anno do naçimento de nosso senhor Jhsus Xpo de mull e bc (1513) / / Pedimdo me por merçe que lha comfirmasse. E viso seu requerimento ey por bem de há comfirmaar e per esta lha comfirmo / / E mais me praz por lhe fazer merçe que os homiziados que se vierem asemtar na dita Villa darenilha semdo pescadores a que ho alcaide moor e juiz da carta do couto por dous meses se lhe de a dita carta no tempo dos cerquos por quatro meses que he o tempo que dura a sardinha e semdo no lugar do malefiçio nom sayam em terra e estem no maar ate se lhe vemder seu pescado. E porem vollo notefico asy e vos mando que todo compraes esta carta como se nella conthem. Dada em minha Villadalmeirym a xxb (25) dias de mayo. Bastião da Costa a fez de myll e bc xxbj (1526)”107. Castro Marim, Arenilha e a Expansão para o Norte de África Como já anteriormente referimos, é intenção do presente trabalho integrar a História de Arenilha num quadro geográfico, político e estratégico mais amplo, não circunscrevendo o objecto de estudo ao território do baixo Guadiana ou do Algarve, mas integrando-o no designado círculo luso-hispano-marroquino. Com efeito, toda a História do Algarve dos séculos XV e XVI prende-se directamente com a expansão portuguesa para o Norte de África. A verdade é que a necessidade de abastecer e socorrer as praças lusas de Marrocos acabou por desenvolver consideravelmente a região algarvia, nomeadamente através da fixação de uma pequena nobreza que se foi instalando no Algarve no decurso da 107 A.N.T.T., Chancelaria de D. João III, liv. 12, fl.62. Documento publicado por Hugo Cavaco, in Revisitando Santo António de Arenilha, pp.27-28. O mesmo documento encontra-se publicado por Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.32. 44 expansão108. Como Romero de Magalhães bem observou, “a ligação de Portugal com as praças marroquinas fazia-se através do Algarve e, em princípios do século XVI, sobretudo por Tavira”109. De modo que a atenção que o monarca dispensou à margem portuguesa da foz do Guadiana não foi inocente. Já anteriormente mencionámos que, alguns anos após a conquista de Ceuta, determinou D. João I a criação de um couto para quarenta homiziados em Castro Marim, em 1421, para o “dicto lugar seer mjlhor pobrado”110. Poucas décadas depois, mais precisamente em 7 de Janeiro de 1458, determinou D. Afonso V que se instalassem quinze homiziados em Alcoutim111, não deixando de ser curioso o facto de a carta ter sido outorgada em Ceuta, e que em 23 e 24 de Outubro do mesmo ano, o mesmo rei conquistou Alcácer Ceguer 112. Acresce ainda que em 28 de Setembro de 1457, pouco tempo antes da criação do couto em Alcoutim, D. Afonso V nomeou Afonso Dias, escudeiro do infante D. Fernando, como escrivão dos homiziados de Castro Marim113. Tratar-se-á de um conjunto de 108 Fernando Pessanha, “A Nobreza no Algarve”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº148, Setembro de 2012, p.21. 109 Joaquim Romero de Magalhães, O Algarve na Época Moderna, pp.81-96. Do mesmo autor ver também Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, pp.238-239. Sobre a relação entre Tavira e as praças dos Algarves Dalém veja-se Maria Augusta Lima Cruz, “Tavira no processo de abandono de praças portuguesas do Norte de África no século XVI. Abertura de um estudo”, in Espírito e Poder – Tavira nos Tempos da Modernidade, pp.20-45. 110 Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.116. Ver também Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.23; Hugo Cavaco, O Degredo e o Privilégio em Castro Marim (Alguns subsídios para a sua história), p.6. 111 Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.123. 112 Ver Rui de Pina, “Crónica do Senhor Rey D. Afonso V”, in Crónicas, pp.772-778; Damião Góis, Chronica do Principe Dom Joam, Capítulos X-XIII, pp.40-54. 113 Humberto Baquero Moreno, Os Municípios Portugueses nos Séculos XIII a XVI – Estudos de História, p.116. 45 coincidências? Ou seria estratégia da política expansionista portuguesa reforçar o baixo Guadiana sempre que era projectada nova campanha militar em Marrocos? É bastante provável. Temos que ter em consideração que as conquistas em África implicaram, desde logo, o envio de homens para assegurar a defesa e manutenção das praças sob domínio português. E como o Algarve se encontra próximo das terras marroquinas, muitos foram os algarvios que se lançaram na conquista, manutenção e defesa das praças. Caso paradigmático foi o do infante D. Fernando, irmão de D. Afonso V. Ansiando envolver-se em grandes feitos em Ceuta e, não tendo a aprovação do irmão, “mandou aparelhar uma caravela na foz do rio Guadiana e pôsse a caminho”114. Escusado será dizer que parte da tripulação que acompanhou o infante seria, seguramente, originária do termo de Castro Marim. Ora, se a região algarvia já não era muito populosa, ficaria ainda menos abastada de gentes, com empresas desta natureza. Este envio de gente terá, certamente, emagrecido a população de Castro Marim, pelo que o envio de homiziados tornou-se uma medida necessária. É certo que Castro Marim transformou-se num importante porto piscatório e comercial do Algarve, o que levou a um aumento da população que atingiu o seu apogeu nos séculos XV e XVI. Porém, perguntemo-nos: de que tipo de população se tratava? Se excluirmos os mercadores, pescadores e homiziados, é provável que as mulheres e crianças representassem uma fatia bastante considerável na realidade demográfica desta vila. Sublinhamos esta ideia na medida em que muitos terão sido os homens que se lançaram na tomada das cidades norte africanas, aí tendo permanecido 114 Fernando Pessanha, “Sobre o Infante D. Fernando e a Expansão para o Algarve Dalém Mar”, in Jornal do Algarve, Nº2884, 5 de Julho de 2012, p.7. D. Afonso V, preocupado com a impulsividade do irmão, veio ao seu encalço até Tavira e Castro Marim. Tarde demais. O infante acabaria por ser interceptado no estreito de Gibraltar pelo Conde de Odemira, capitão de Ceuta. Após visitar aquela praça foi conduzido ao reino, passando por Tarifa, Castro Marim, Mértola e Beja, onde o esperava a Corte. 46 após as conquistas. Vejamos; em Outubro de 1508 determinou D. Manuel, através de Garcia de Melo, anadel-mor dos besteiros, a nomeação de vários besteiros do monte moradores em Castro Marim. Foi o caso de Barão Martins115, Afonso Eanes Pescoço116, João Lourenço117, Vasco Lourenço Fafez118, Afonso Eanes Galego119, Martim Eanes Pescoço120, etc. Mas terão estes homens permanecido na vila de onde eram naturais? Alguns meses depois, já em 1509, recrutou o alcaide de Castro Marim, Simão Correia, 102 besteiros da vila para irem servir em Arzila, onde deveriam acumular funções como pedreiros 121. De resto, foi frequente a presença de homens naturais de Castro Marim nas praças norte africanas, não só enquanto soldados como também na qualidade de moradores. É o caso de Afonso Roiz, natural de Castro Marim e que encontrámos como besteiro de pé na guarnição de Safim, em 1511 122, ou o caso dos moradores de Castro Marim e Alcoutim que encontrámos em Azamor123. Neste contexto, reveste-se de particular interesse o caso de Gaspar Gonçalves, de Castro Marim, armado cavaleiro em Azamor por mandado do duque de Bragança, depois da conquista daquela praça marroquina, em 1513124. Temos ainda a referir um outro grupo, para além daqueles que iam voluntariamente para as praças africanas, na qualidade de soldados e de moradores. Castro Marim, como zona de fronteira entre a Andaluzia e as 115 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 5, fl. 24v. 116 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 5, fl. 24v. 117 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 5, fl. 24v. 118 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 5, fl. 25. 119 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 5, fl. 25. 120 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv. 5, fl. 25. 121 Rafael Moreira, “História – Histoire”, in Arzila, Torre de Menagem – Le Donjon d’Asilah, p.35. 122 João Cosme, A Guarnição de Safim em 1511, p.151. 123 Maria Augusta Lima Cruz, “Documentos inéditos para a história dos portugueses em Azamor”, in Arquivos do Centro Cultural Português, quadro 1. 124 A.N.T.T., Chancelaria de D. Manuel I, liv.11, fl.53. 47 águas que a separavam das terras magrebinas, constituiu uma zona de passagem para as conquistas e exploração de terras no Norte de África, favorecendo o aparecimento de todo o tipo de criminalidade, por vezes de tal gravidade que tinham como sentença o degredo dos culpados para as praças marroquinas, nomeadamente, para Arzila, Ceuta e Tânger125. Ainda assim, o degredo não era uma pena vil, e aparece associado a uma condição social de relativa qualidade. De acordo com Maria Augusta Lima Cruz, os castigos de açoite ou degredo dependiam da condição social do condenado, ou seja; se o réu se situava abaixo ou acima do escudeiro. Deste modo, os de maior condição social eram condenados a dois anos de degredo em África, "em lugar das penas de açoites com baraço e pregão"126, ao contrário dos de condição social inferior a escudeiros, que podiam ser condenados ao degredo nas galés 127. Haveria então naturais de Castro Marim a serem degredados para as praças de África, roubando ainda mais gente à vila? Seguramente. José António de Jesus Martins inclui Castro Marim entre os espaços concelhios onde o degredo funcionou como pena para actos de criminalidade 128. Exemplo disso é o caso do escudeiro Henrique Vaz, de Castro Marim, condenado a dois anos de degredo em Arzila, “por feridas dadas”129. Ora, a juntar a tudo isto temos ainda os castro-marinenses que se lançaram na epopeia dos descobrimentos. Oliveira Marques, por exemplo, inclui Castro Marim no grupo das terras que mais contribuiu com gentes 125 José António de Jesus Martins, O Reino do Algarve nos finais da Idade Média – Os concelhos algarvios no séc. XV, p.45. 126 Maria Augusta Lima Cruz, “Degredados e arrenegados portugueses no espaço Índico, nos primórdios do séc. XVI”, in Textos de História, Vol. 6, Nº 1-2, pp.169-184. 127 Paulo Drumond Braga, “Os forçados das galés. Percursos de um grupo marginalizado”, in Carlos Alberto Ferreira de Almeida In Memoriam, Vol. I, pp.187-200. 128 Cf. José António de Jesus Martins, O Reino do Algarve nos finais da Idade Média – Os concelhos algarvios no séc. XV, p.45. 129 A.N.T.T., Chancelaria de D. João II, liv. 24, fl.99. 48 que se lançaram nas explorações marítimas130. De acordo com Joaquim Romero de Magalhães, em 1527, a vila contava com 125 fogos e o termo com 151, sendo uma das povoações com menor número de habitantes do Algarve (talvez apenas superior a Aljezur, Alvor e Cacela) 131. Não será, portanto, de estranhar que o couto de Castro Marim tenha sido estabelecido como destino único de degredo dentro do território continental poucos anos antes, em 1524132. Assim sendo, que quantidade de homens disporia o termo de Castro Marim, em finais do séc. XV e inícios do séc. XVI, para defender a porta de entrada no reino que era a foz do Guadiana? Um reino pequeno sublinhe-se – e que se tinha lançado numa cruzada expansionista, despertando invejas e desconfianças por parte dos reinos vizinhos e adversários… É que foi exactamente durante o reinado de D. Manuel I que a política expansionista portuguesa ganhou novo impulso, sendo a cruzada em Marrocos uma das grandes objectivos do “Venturoso”. Tal como João Paulo Oliveira e Costa e Vítor Luís Gaspar Rodrigues bem observaram, logo em 21 de Abril de 1496, começavam os preparativos para quando o rei convocasse a armada para atacar África 133, ou seja; de acordo com a documentação régia, a passagem de D. Manuel I a Marrocos apresentava-se como uma possibilidade tão previsível quão natural. Não é, portanto, de 130 Oliveira Marques, “A Expansão no Atlântico”, in Nova História da Expansão Portuguesa – Vol. II – A Expansão Quatrocentista, p.208. 131 Joaquim Romero Magalhães, Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, p.34; Ver também Luís Miguel Duarte, “Garcia de Melo em Castro Marim (a actuação de um alcaide mor no início do século XVI)”, p.134. 132 José António Conceição de Sousa, "Gente" na Expansão portuguesa: gestão de recursos humanos nos séculos XV e XVI, Dissertação para Mestrado em História e Arqueologia da Expansão e dos Descobrimentos Portugueses apresentada à Universidade Nova de Lisboa, p.27. 133 Trata-se de uma licença para que se fretassem os navios que haviam de carregar 160 toneladas de víveres destinados à armada que deveria atacar África. Ver João Paulo Oliveira Costa; Vítor Luís Gaspar Rodrigues, A Batalha dos Alcaides – 1514. No Apogeu da Presença Portuguesa em Marrocos, p.12. 49 estranhar que a Chronica do Serenissimo Senhor Rei D. Manoel, de Damião Góis, dedique 71 capítulos à guerra em Marrocos, ou seja 22% do total de uma obra que descreve a acção dos portugueses na generalidade do Império134. Ora, como poderiam continuar as conquistas no Algarve Dalém se o próprio Algarve Daquém não se encontrava devidamente provido de gentes? É neste sentido que se torna bastante verosímil que a estratégia da política expansionista portuguesa passasse por reforçar o baixo Guadiana sempre que era projectada nova campanha militar em terras marroquinas. Um outro aspecto induz-nos a assumir este raciocínio. Foi exactamente no ano em que D. Manuel I mandou “fazer e edifycar” a vila de Arenilha que foram feitos os preparativos para a conquista de Azamor, cidade tributária de Portugal desde1486135. Já em 1508 tinha D. João de Menezes tentado conquistar aquela praça marroquina, depois de Rodrigues Bérrio, um armador de Tavira que costumava ir pescar sáveis a Azamor, ter informado D. Manuel I das grandes divisões entre os seus habitantes e do desejo que alguns manifestavam em se tornarem súbditos de Portugal136. De resto, as 134 Joaquim Romero de Magalhães, “Em torno da crónica de D. João III por Francisco de Andrade”, in D. João III e o Império - Actas do Congresso Internacional comemorativo do seu nascimento, pp.140-141. 135 Devido à instabilidade política na região, os seus habitantes escreveram a D. João II, por João Fróis e Martim Reinel, pedindo protecção e manifestando o seu desejo de se tornarem seus vassalos e tributários. Segundo Rui de Pina, “No ano de mil e quatrocentos e oitenta e seis a cidade de Azamor do reino de Fez em África, temendo ser de el-rei tomada e conquistada pela força, para escusarem sua perdição e cativeiro, com acordo e procuração de todos os governantes e moradores dela, enviaram a el-rei, estando em Santarém, sua obediência e o receberam por seu senhor”. Ver Rui de Pina, Crónica de D. João II, Capítulo XXI, p.53. Também Garcia de Resende segue de perto a crónica de Rui de Pina: “No ano de mil e quatrocentos e oitenta e seis os Governadores e moradores da cidade de Zamor em África, temendo mandar el Rei, ou ir sobre ela, e receando a sua destruição, com acordo e procuração de todos mandaram a el Rei sua obediência, e o reconheceram por seu senhor (…) e em tudo se fizeram firmes contratos, que muito inteiramente cumpriram sempre em quanto el Rei viveu”. Ver Garcia de Resende, Biografias da História de Portugal – Vol. XXIX - D. João II, p.56. 136 Atendendo a esses motivos, foi enviada uma armada (50 navios e 2.500 homens) sob o comando de D. João de Menezes, com o apoio de um príncipe oatácida que já estivera em Portugal, Muley Zião. Damião 50 relações comerciais que Tavira - a cidade mais próxima da foz do Guadiana – mantinha com aquela região marroquina são conhecidas. Sabemos, por exemplo, que em 1502 foram dois barcos de Tavira a Mazagão carregar trigo, e que em 1503 e 1504 vinha para Portugal trigo de Mazagão, como demonstra o alvará de 29 de Agosto de 1503137. Também aqui deverá ser salientada a presença de D. Manuel I em Tavira quando, em 1508, Arzila foi cercada pelo rei de Fez 138. É certo que a viagem do monarca prende-se com o socorro que se pretendia enviar para a praça assediada, porém, é bastante possível que, aquando desta passagem pelo sotavento algarvio, o rei tivesse tomado conhecimento do ermamento que se evidenciava no território compreendido entre Cacela e Castro Marim. Entretanto, em 1513, no mesmo ano em que foi fundada Arenilha, deu-se um levantamento geral em Portugal para uma nova empresa contra Azamor, envolto num autêntico “ambiente de vibração patriótica”139. Será coincidência o facto de a Carta de Privilégio que manda proceder à edificação de Arenilha ter sido redigida exactamente na mesma altura em que se procediam aos preparativos para a conquista da cidade magrebina? Se seguirmos a crónica de Damião Góis, apercebemo-nos que o Algarve assumiu um papel de destaque nos preparativos, nomeadamente, através da acção de D. Martinho de Castelbranco, conde da Vila Nova de Portimão, Góis, Chronica do Serenissimo Senhor Rei D. Manoel, I, Capítulo XXVII, pp.208-210; Damião Peres, Conquista de Azamor pelo Duque de Bragança D. Jaime em 1513, pp.8-9; Teresa Lacerda, “D. João de Meneses. Um retrato da Nobreza Portuguesa em Marrocos”, in Estudos de História Luso-Marroquina, p.126. Porém, a expedição fracassou, não só porque o aliado mudara de posição mas também porque os meios envolvidos se revelaram insuficientes para tomar a praça. 137 Vitorino Magalhães Godinho, História Económica e Social da Expansão Portuguesa, pp.87-88. 138 Damião Góis, Chronica do Serenissimo Senhor Rei D. Manoel, I, Capítulo XXIX, pp.212-215. 139 Damião Peres, Conquista de Azamor pelo Duque de Bragança D. Jaime em 1513, p.9. Os preparativos foram realmente de âmbito nacional, como podemos constatar no Auto da Exortação da Guerra, de Gil Vicente, bem ao gosto do espírito de cruzada em voga na corte portuguesa. Gil Vicente, “Auto da Exortação da Guerra”, in Autos e Farsas, p.86. 51 que deu despacho a toda esta armada em apenas quatro meses 140. Realmente, a expedição de 1513, constituiu a maior armada organizada no reinado do venturoso; mais de 400 navios e cerca de 25000 homens, entre soldados, cavaleiros e infantes 141. Finalmente, em 3 de Setembro, o Duque de Bragança entrou triunfante na cidade142 e D. Manuel I acrescentou mais uma praça marroquina ao império português. Fig.10 - A cidade de Azamor no séc. XVI. Gravura de Georg Braun impressa em Civitates Orbis Terrarum (1572). Porém, perguntemo-nos: que tem tudo isto a ver com Arenilha, para além da conquista de Azamor se ter dado no mesmo ano da fundação da vila? É que todo o processo relativo à política dos coutos de homiziados no 140 Acresce ainda que a armada partiu de Lisboa, “foi lançar ancora na baia do Faram, no regno do Algarue”, onde se lhe juntaram mais navios com combatentes do Algarve. Damião Góis, Chronica do Serenissimo Senhor Rei D. Manoel, III, Capítulo LXVI, p.369. 141 Damião Góis, Chronica do Serenissimo Senhor Rei D. Manoel, III, Capítulo XLVI, p.367; Jerónimo Osório, Biografias da História de Portugal – Volume XXVII – D. Manuel I, p.157; João Paulo Oliveira Costa; Vítor Luís Gaspar Rodrigues, A Batalha dos Alcaides – 1514. No Apogeu da Presença Portuguesa em Marrocos, p.28. 142 Jerónimo Osório, Biografias da História de Portugal – Volume XXVII – D. Manuel I – Da Vida e Feitos de El-Rei D. Manuel, p.194; Damião Peres, Conquista de Azamor pelo Duque de Bragança D. Jaime em 1513, p.12; João Paulo Oliveira Costa & Vítor Luís Gaspar Rodrigues, A Batalha dos Alcaides – 1514. No Apogeu da Presença Portuguesa em Marrocos, p.30. 52 baixo Guadiana, nomeadamente o couto de homiziados de Arenilha, acaba por estar intimamente relacionado com a expansão portuguesa e com os recursos humanos que esta roubou aos termos algarvios. Para além das razões de carácter económico e comercial que atrás referimos, tornava-se imperativa a defesa das fronteiras portuguesas, pelo que a presença de uma povoação na foz do Guadiana, numa altura em que os castro-marinenses abandonavam a sua terra no decurso da expansão e dos descobrimentos, acabava por resultar numa estratégia tão pertinente quão necessária. Para além disso, revestem-se de grande interesse as relações entre Arenilha e os intervenientes na expansão para o norte de África. Caso paradigmático é o do primeiro senhor de Arenilha, António Leite, “um cavaleiro português da era de quinhentos que, através da carreira das armas e dos serviços prestados à Coroa em (…) Azamor e Mazagão, viu os seus esforços serem coroados com honras e títulos”143. Por outras palavras, foi preciso recorrer a alguém com experiência de guerra contra o mouro para defender Arenilha das investidas da pirataria magrebina… Arenilha na Historiografia da Idade Moderna É certo que as fontes documentais relativas a Arenilha não são muito abundantes, o que acaba por representar um entrave à investigação historiográfica. Ainda assim, as fontes não são de todo inexistentes. Para além de alguns documentos que podemos encontrar no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, existem também algumas referências à antiga vila em algumas obras da Idade Moderna Portuguesa, que têm vindo a ser publicadas ao longo das últimas décadas. Nesse sentido assume especial 143 Fernando Pessanha, “António Leite – Capitão nas praças do Norte de África e Senhor de Arenilha”, Jornal do Baixo Guadiana, Nª 138, Novembro de 2011, p.24. 53 destaque as Visitações da Ordem de Santiago, ou seja; a inspecção feita às comendas pertencentes à Ordem Militar de Santiago da Espada, e onde se encontram descritos e inventariados o provimento dos edifícios religiosos que o Mestrado detinha na vila de Arenilha. Estes documentos, transcritos e publicados por Hugo Cavaco, em 1987, e por Francisco Lameira e Maria Helena Rodrigues dos Santos, em 1988, revestem-se da maior importância, na medida em que nos dão conta não só do apetrecho, como também da configuração arquitectónica dos templos arenilhenses144. Uma outra referência a Arenilha, ainda que breve, aparece em “Relação da Jornada de el-rei D. Sebastião quando partiu da cidade de Évora”, obra redigida pelo cronista João Cascão, em 1574. Segundo o próprio, o monarca “Foi ver a barra e um lugar pequeno, que está à entrada dela, e defronte de Aiamonte, que chamam Santo António, o qual será de 15 ou 16 vizinhos, e É Senhor dele Luís Leite”145. A informação mais consistente que retiramos desta breve passagem prende-se com a realidade demográfica da vila. Ora, se tivermos em consideração que, durante o século XVI, cada vizinho era constituído por uma média de quatro ou cinco pessoas146, rapidamente chegamos à conclusão que, por então, a população de Arenilha situar-se-ia entre as 60 e as 80 pessoas, ou 144 Não nos detemos na transcrição destes documentos na medida em que os mesmos se encontram publicados na em Hugo Cavaco, “Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio (Subsídios para o estudo da História da Arte no Algarve), pp.242-246; Francisco Lameira; Maria Helena Rodrigues dos Santos, Visitação de Igrejas Algarvias – Ordem de São Tiago, pp.105-108; Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, pp.39-41. 145 João Cascão, “Relação da Jornada de el-rei D. Sebastião quando partiu da cidade de Évora”, in Uma Jornada ao Alentejo e ao Algarve: A alteração das linhas de força da política nacional, p.120. 146 Joaquim Romero de Magalhães, por exemplo, defende que o coeficiente multiplicador para determinar o número de habitantes de um “vizinho” ou “fogo” deverá ser de 4,5. Ver Joaquim Romero de Magalhães, Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, pp.245-246, nota 2. 54 seja; a vila nunca deixou de ser um lugar escassamente povoado, mesmo durante o auge da sua densidade demográfica. Poucos anos depois, em 1577, Frei João de São José referiu-se a Arenilha em Corografia do Reino do Algarve. Passamos de seguida a transcrever as suas palavras: “S. António de Arenilha é ua vileta pequena, situada na foz de Guadiana, na volta que a costa faz da banda de Portugal pera o norte, donde lhe entra este rio. Nem ela nem seu termo têm que lhe façamos mais larga memória nesta escritura. É senhor dela, ao presente, Luís Leite, filho de António Leite, capitão que foi em Mazagão e depois em Azamor, antes que el-rei D. João III deixasse os lugares de África, e este lugar lhe deram em recompensa ou em casamento com a primeira mulher, chamada D. Caterina, segundo alguns dizem”147. Alguns anos mais tarde, em 1600, foi a vez de Henrique Fernandes Sarrão, referir Arenilha em História do Reino do Algarve: “Trataremos brevemente de ua vila de poucos povoadores. A vila de Santo António d’Arenilha está quási à boca da barra do rio Guadiana, duas léguas da vila de Cacela e ua da vila de Castro Marim. O derredor dela é de area, em que prantam alguas vinhas fracas, e tem muitos pinhais. Alguns pescadores vêm de fora a esta vila fazer sua pescaria. Os vezinhos são tão poucos, que não passam de dous: nela se deve contar um por milhar, e a honra ficou em lugar de renda. E porque nesta vila a costa do Algarve se acaba e em muitas partes deste tratado fiz menção das torres de vigia, que nela há, convém declarar a ordem, que nas vigias em toda a costa se tem. Estas torres dão sinais de fogo, quando há nova, ou rebate de Mouros, e de dia têm seus fachos, que 147 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, pp.54-55. 55 abaixam, havendo nova de inimigos, que querem desembarcar, ou estão em terra. E logo na costa se sabe sem outro aviso”148. Em 1621, foi a vez do engenheiro militar Alexandre Massai escrever: “RELAÇAÕ, DE, S,ANTº, DA FOS, DE, GVADIANA, Porqtº a sobredita Villa naõ tem em sj mais q duas ou tres cazas e huã jgreia, della naõ farej mais largua Relaçaõ, Rezeruando a p.ª outro tenpo, o tratar da gente e rendimentº della porq eu a naõ vj nem sei de serto, A comenda e alcaideria mor della esta ao prezente Vaga p.ª Sua Mgde”149. Não pudemos deixar de reparar que também Luíz Caetano de Lima, em 1736 – no século seguinte ao despovoamento da vila - fez referência a Arenilha na sua compendiosa Geografia histórica de todos os estados soberanos de Europa... No entanto, não passou apenas disso: uma fugaz alusão ao dito topónimo, sem se deter em qualquer outro tipo de informação. Refere-o ao debruçar-se sobre algumas “terras do Algarve, que hoje são Lugares ou Aldeas, forão amtigamente Villas acasteladas, como sucede em Salir, Terragudo, Arenilha, &c”150. 148 Henrique Fernandes Sarrão, “História do Reino do Algarve”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.170. 149 Alexandre Massai, “Descripção do Reyno do Algarve” in Lívio da Costa Guedes, Aspectos do Reino do Algarve nos Séculos XVI e XVII – A «Descripção» de Alexandre Massaii (1621), p.96. 150 Luíz Caetano de Lima, Geografia histórica de todos os estados soberanos de Europa, com as mudanças, que houve nos seus domínios, especialmente pelos tratados de Utrecht, Rastad, Badesn, da Barreira, da Quadruple Alliança, de Hannover, e de Sevilha; e com as geneologias das Casas reynantes, e outras muy principaes, dedicada à sacra, real, augusta magestade delrey D. João V Nosso Senhor, Tomo II, Capitulo XIV, p.330. 56 Alguns anos mais tarde, Damião António de Lemos Faria e Castro, já nem sequer refere Arenilha na sua Descripção do Reino do Algarve151, ainda que tenha seguido de perto os trabalhos de Frei João de São José, Henrique Fernandes Sarrão e Luíz Caetano de Lima. Por outras palavras, Arenilha não só se encontrava despovoada há praticamente um século, como também se encontrava esquecida pela historiografia produzida nas últimas décadas da Idade Moderna. Os Alcaides de Arenilha Sabemos que o primeiro alcaide de Arenilha foi António Leite, um indivíduo oriundo de uma família de baixa condição nobiliárquica e que viveu entre os finais do século XV e meados do século XVI. A questão que agora se coloca é por que razão lhe terá sido entregue a dita alcaidaria. Frei João de São José levanta uma hipótese que achamos pouco credível, ou seja; que o senhorio ter-lhe-ia sido entregue por “casamento com a sua primeira mulher, chamada D. Catarina, segundo alguns dizem”152. Porém, descartamos essa hipótese. De acordo com Rui Jorge Ferreira Henriques, António Leite casou com D. Maria de Vasconcelos, ainda durante a sua 151 Damião António de Lemos Faria e Castro, Politica Moral, E Civil, Aula da Nobreza Lusitana, pp.69- 87. De salientar que, em 1776, o próprio Faria e Castro esteve presente nas festas da inauguração de Vila Real de Santo António, tendo mesmo descrito as festividades nos capítulos I e II do Livro III do derradeiro tomo de “História Geral de Portugal e suas Conquistas”, (recusado pela censura em 1787). Descrição essa onde não deixa de manifestar a sua hostilidade em relação à decisão do Marquês de Pombal em proceder à “nova fundação da notável Vila Real nos areais do Guadiana para fazer frente a Ayamonte”, a sua acarinhada cidade dos tempos do “degredo”… Ver Fernando Pessanha, “Damião António de Lemos Faria e Castro – um fidalgo algarvio refugiado em Ayamonte”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº150, Novembro de 2012, p.21. 152 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.55. 57 permanência em Tânger e Arzila, ou seja, antes de 1513 153, o que parece fazer todo o sentido, pois é o próprio Leite que, em carta ao rei datada de Março de 1541, refere ter um filho a servir em Mazagão 154. Por outro lado, a atribuição do senhorio por tal motivo parece-nos altamente improvável. Voltemos, portanto, à mesma questão: por que razão lhe terá sido entregue a alcaidaria de Arenilha? Ora, a resposta a esta questão implica, desde logo, que nos debrucemos sobre o percurso de vida deste primeiro alcaide. Quem era? O que fazia? Quais as suas competências? António Leite foi um oficial da Coroa portuguesa que ascendeu na carreira das armas através dos serviços prestados em Azamor e Mazagão, chegando, por fim, a alcaide-mor de Santo António de Arenilha. Torna-se relativamente fácil seguir o percurso de António Leite. Nos capítulos da autoria de David Lopes presentes na História de Portugal, dirigida por Damião Peres, encontramos várias alusões ao trajecto deste cavaleiro português. Para além disso, abundante epistolografia foi publicada nos vários volumes de Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, para além de outra documentação que podemos encontrar em várias colecções do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, como as Cartas dos Governadores de África, o Corpo Cronológico, ou a Chancelaria Régia. De resto, tal abundância documental permitiu, inclusivamente, a realização de uma Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Nova de Lisboa: “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), da autoria de Rui Jorge Ferreira Henriques. 153 Rui Jorge Ferreira Henriques, “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), Dissertação de Mestrado em História Moderna e dos Descobrimentos apresentada à Universidade Nova de Lisboa, pp.47 e 77. 154 Carta de António Leite a D. João III, em Março de 1541. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. III, doc. LXXXVIII, pp.313-317. 58 Sabemos que António Leite viveu em Tânger e Arzila 155, antes de se ter fixado em Azamor e Mazagão. Em Dezembro de 1513 encontramo-lo como contador de Azamor e, em 1516, aparece na documentação com responsabilidades de chefia em Mazagão, estando, no entanto, submetido à autoridade do capitão de Azamor. Segundo a Crónica Militar de Mazagão, o rei nomeou António Leite para capitão desta praça, em 1516 156. Com efeito, um documento de 28 de Junho de 1517 mostra-nos que António Leite foi substituído das suas funções de contador de Azamor para desempenhar o cargo de comando na fortaleza de Mazagão: “em auzençia d’ António Leyte, comtador d’ella, que ora estaa por capitam do dastello de Mazagam”157. Em carta régia de 20 de Janeiro de 1520, onde era mencionado como cavaleiro da Casa Real, António Leite foi oficialmente nomeado capitão de Mazagão. Também como recompensa pelos serviços prestados à Coroa, o capitão recebeu, ainda no reinado do “venturoso”, a mercê de umas casas na vila de Tavira, benefício que estará na origem da sua relação com o Algarve 158. Em Setembro de 1529, António Leite aparece em Azamor como capitão 159. É bastante provável que tenha voltado à capitania da praça de Mazagão depois de deixar o cargo em Azamor. 155 Carta de António Leite ao Rei a D. Manuel I, em 27 de Julho de 1514. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. I, doc. CXI, pp.575-586. 156 Augusto Ferreira do Amaral, Mazagão- A Epopeia Portuguesa em Marrocos, p.229. 157 Documento de 28 de Junho de 1517, transcrito de António Dias Farinha, “História de Mazagão durante o Período Filipino”, in Stvdia, 26, p.191. 158 Cf. Carta régia de confirmação, feita a 13 de Agosto de 1522, de mercê feita por D. Manuel I. A.N.T.T., Chancelaria de D. João III, liv. 47, fl.56. Ver Rui Jorge Ferreira Henriques, “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), Dissertação de Mestrado em História Moderna e dos Descobrimentos apresentada à Universidade Nova de Lisboa, p.89. 159 Ver Rui Jorge Ferreira Henriques, “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), Dissertação de Mestrado em História Moderna e dos Descobrimentos apresentada à Universidade Nova de Lisboa, p.94. 59 Voltou a ser nomeado capitão de Azamor em 17 de Setembro de 1537 160, ocupando o cargo até Março de 1541. Ao terminar a sua capitania em Azamor e tendo-lhe sido ordenado que aí ficasse a servir, António Leite queixou-se ao rei de não ter sido nomeado para “a capitania de Mazagão”, cargo que “lhe pertencia por carta, que dela tinha del-rei D. Manuel, seu pai”161. É neste contexto que em 20 Agosto de 1542, recebeu a mercê da alcaidaria de Santo António de Arenilha, junto à foz do Guadiana, onde se esclarecia que esse benefício era feito em troca da dita capitania de Mazagão: “Eu ell Rey faco saber a quantos este meu alvará virem que antre as cousas de que me ora prouve fazer merce a Antonio Leite em satisfação da minha capitania da Vila de Mazagão que de mim tinha e ma deixou para eu dela prover quem minha merce for, ouve por bem de lhe fazer merce da alcaidaria mor da Vila de Santo Antonio que se ate ora chamou a Arenilha com as rendas e direitos que por bem das minhas Ordenações pertencem a dita aicaidaria mor da quoal lhe asi fis merce em vida delle ditto Antonio Leite”162. Deste episódio fica claro que, aos olhos da Coroa, António Leite não tinha estatuto social, nem as competências necessárias para estar à frente da nova fortaleza de Mazagão, o grande baluarte português cujas obras tinham custado à Coroa 300 mil cruzados 163 e onde foram concentradas as forças 160 Cf. Instrumento público de entrega da capitania de Azamor a António Leite. Documento publicado por Maria Augusta Lima Cruz, “Documentos inéditos para a história dos portugueses em Azamor”, in Arquivos do Centro Cultural Português, pp.161- 164. 161 Frei Luís de Sousa, Anais de D. João III, Vol. II, p.189. 162 A.N.T.T., Chancelaria da Ordem de Cristo, lv.13, fls. 375 v. – 379 v. Documento publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, doc. V, pp.36-37. 163 Frei Luís de Sousa, Anais de D. João III, Vol. II, p.212; David Lopes, “Os Portugueses em Marrocos…”, in História de Portugal, vol. IV, pp.100-101. 60 portuguesas na região da Duquela após do despejo de Azamor e Safim164. Porém, a experiência de António Leite no combate contra os mouros acabou por ser direccionada para a foz do Guadiana, onde D. Manuel I tinha mandado construir Santo António de Arenilha, em 1513. E seria realmente necessário atribuir a alcaidaria a um indivíduo que já tinha sido capitão nas praças portuguesas da região da Duquela? É que, efectivamente, o alcaide de Arenilha tinha ascendido na carreira das armas… mas onde? Nas praças de guerra que mais tinham sofrido com a pressão dos xerifes, a nova dinastia sádida oriunda do sul de Marrocos. Assim sendo, não seria exagerada esta preocupação com a defesa de uma vileta na foz do Guadiana? Achamos que não. Com efeito, a experiência adquirida por Leite em Azamor era bastante pertinente, já que a localização geográfica daquela vila, na foz do rio Morbeia e proximidades da costa atlântica, ia de encontro à localização de Arenilha, também na foz de um rio e nas proximidades do oceano. Fig.11 - Muralha leste de Azamor, entre os dois baluartes voltados para o rio Morbeia. Para além disso, seria um desperdício não aproveitar a experiência deste antigo capitão numa altura em que a acção da pirataria não dava descanso às populações costeiras. Aliás, era tal a actividade dos piratas que, 164 Fernando Pessanha, As Guarnições Militares nas Praças Portuguesas da Região da Duquela, no Algarve Dalém Mar, Dissertação de Mestrado em História do Algarve apresentada à Universidade do Algarve, pp.65-66. 61 em 1523, Vasco Fernandes César - antigo adaíl de Azamor e capitão da Armada do Estreito165 - foi “incumbido embarcar o conde do Redondo, D. João Coutinho, na vila de Santo António de Arenilha, e escoltá-lo a Arzila”166. A caminho da foz do Guadiana, o navio de Vasco Fernandes César foi atacado por duas naus, tendo-se seguido um combate naval que resultou na explosão de parte da alcáçova, atirando cinco homens ao mar, entre os quais Vasco Fernandes, que ficou gravemente ferido 167. Foi por episódios como este (e muitos outros) que, em 1548, o comendador de Cacela, D. Simão de Meneses, pediu ao rei que providenciasse, por alvará, no sentido de serem coagidos à vigilância da costa todos os que a isso estavam obrigados e não cumpriam. Dizia o comendador, referindo-se especificamente à pirataria moura: “aqui temos novas como fustas de mouros se fazem prestes pera virem a esta costa e fazerem salto em alguns lugares dela prymcypallmente em sãotãotonyo e na guomeira que he termo de Tavira”168. 165 Rui Landeiro Godinho, “A armada do estreito de Gibraltar no século XVI”, in A Guerra Naval no Norte de África (séculos XV – XIX), pp.117-137. 166 Fernando Pessanha, “Vasco Fernandes César – um aventureiro nas costas do Algarve Quinhentista”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº166, Março de 2014, p.21. 167 Segundo José Vergílio Amaro Pissarra, os sobreviventes portugueses por pouco não foram executados. Os que sobreviveram ao combate foram aprisionados e levados para Dieppe. Vasco Fernandes, apesar de ferido, acabou por escapar do cativeiro desfiando uma esteira e escapando por ela da torre onde se encontrava aprisionado. Ver José Vergílio Amaro Pissarra, “Vasco Fernandes César, capitão da Armada do Estreito”, in A Guerra Naval no Norte de África (séculos XV – XIX), pp.144-145. 168 A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 80, doc.92. 62 Fig.12 - Carta de Simão de Meneses a D. João III, em 28 de Abril de 1548. A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 80, doc.92, fl. 2. 63 Fig.13 - Carta de Simão de Meneses a D. João III, em 28 de Abril de 1548. A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 80, doc.92, fl. 1. Fig.14 - Carta de Simão de Meneses a D. João III, em 28 de Abril de 1548. A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 80, doc.92, fl. 1 v. 64 Dizia ainda que se não fossem tomadas medidas urgentes para a protecção das populações, a zona costeira, a mais povoada do Algarve, acabaria por se despovoar, na medida em que os habitantes ver-se-iam na necessidade de se refugiarem no interior. De resto, foi exactamente o que veio a acontecer, pois a demografia das cidades costeiras começou a diminuir a partir de meados do séc. XVI169. Para além dos ataques da pirataria, que seguramente fragilizava o comércio que o baixo Guadiana desenvolvia com a vizinha Andaluzia 170, devemos também ter em consideração um outro interesse estratégico do monarca português e que pode explicar perfeitamente a escolha de um individuo com o historial de António Leite para a alcaidaria de Arenilha. Não nos podemos esquecer que a fundação da pequena vila prende-se com a afirmação da soberania política e administrativa do monarca português sobre um território frequentado por castelhanos. Assim sendo, seria vantajoso que o Senhorio recaísse sobre alguém que conhecesse de perto os vizinhos espanhóis e a sua acção nos Algarves luso-hispano-marroquinos. Seria o caso de António Leite? Seguramente. Uma carta do supra citado a D. João III, quando era capitão em Azamor, revela as movimentações de “huua armada do marques de Aiamonte” no porto de Mazagão e quais as suas intenções171. De resto, é verosímil que os conhecimentos de Leite 169 Valdemar Coutinho, “O Algarve e a política marroquina de D. João III”, in D. João III e o Império - Actas do Congresso Internacional comemorativo do seu nascimento, p.223. Do mesmo autor ver também “Estratégias defensivas na costa algarvia nos séculos XVI e XVII – O caso de Tavira”, in Espírito e Poder – Tavira nos Tempos da Modernidade, p.48. 170 Joaquim Romero Magalhães, Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, pp.238- 239. 171 António Leite refere que duas caravelas e um galeão do marquês de Ayamonte tentaram tomar um navio de Ruão ancorado no porto de Mazagão e que aí costumava comerciar todos os anos. Os navios do Marquês levavam um presente para um dos xerifes, com a intenção de estabelecer um acordo comercial no sul de Marrocos, fragilizando os interesses portugueses. Dadas as circunstâncias, Leite aconselhava o 65 sobre as movimentações do Marquês de Ayamonte tenham sido relevantes no momento em que D. João III decide entregar ao antigo capitão o senhorio de uma vila voltada para Ayamonte. Por outras palavras, os vizinhos vigiavam-se e as acções de espionagem nunca deixaram de ser uma constante ao longo da História de ambos os países…Uma outra razão leva-nos a sublinhar esta teoria. António Leite privou de perto com ayamontinos e temos razões para acreditar na sua desconfiança em relação aos espanhóis, em geral. E porquê? Passaremos de seguida a explicar. Durante o reinado de D. João III, Portugal já não dispunha de recursos humanos para tão vasto império. É certo que eram os “fidalguos e gemte do Allgarve” que frequentemente acudiam ao Algarve Dalém172. Contudo, o Algarve Daquém já não conseguia assegurar sozinho a defesa e abastecimento das praças norte africanas, pelo que tinha de operar em conjugação com a feitoria portuguesa na Andaluzia 173. Desde modo, tornou-se relativamente frequente a contratação de soldados ayamontinos. Tal ocorreu em Abril de 1541, quando António Leite se encontrava em Azamor. É Fernão Peres de Andrade que refere o envio de 550 homens do Algarve e Ayamonte para Azamor e Mazagão: “eu tenho por certo que do Algarve e Aiamonte são partidos para socorro d'Azamor e Mazaguão b l homens”174. O problema é que o recrutamento de soldados e mercenários na monarca português a controlar a navegação comercial nos portos marroquinos, forçando a passagem do trato entre europeus e muçulmanos pelas alfândegas portuguesas, o que permitiria significativos lucros para a Fazenda Real. Ver carta de António Leite a D. João III, em 10 de Setembro de 1529. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. II, Doc. CXIX., pp.475-481; A.N.T.T., Cartas dos Governadores de África, nº64. Ver também Pedro Pinto, “Índice Analítico das Cartas dos Governadores de África na Torre do Tombo”, in Anais da História de Além-Mar, Vol. XI, p.265. 172 Usando as palavras de Romero de Magalhães, o “Algarve era essencial para a defesa das praças ocupadas em Marrocos”. Ver Joaquim Romero de Magalhães, O Algarve na Época Moderna, p.82. 173 Manuel Henrique Corte-Real, “Feitores e escrivães na Andaluzia durante o reinado de D. João III”, in Do Tempo e da História, Vol. I, pp.135-159. 174 Carta de D. João III a Fernão Peres de Andrade, em 13 de Abril de 1541. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. III, doc. CVII, pp.386-389. 66 Andaluzia ficava dispendioso e nem sempre as tropas castelhanas prestavam o auxílio que se era de esperar. Exemplo disso foi o que se passou nesse mesmo ano, quando D. Fernando de Noronha substituiu António Leite como capitão de Azamor. Diz-nos Frei Luís de Sousa que “tomando o governo, achou-se D. Fernando com guerra dos muros a dentro, não lha fazendo os inimigos de fora. Eram a mor força de gente que havia na cidade, castelhanos andaluzes (…) gente que corre a receber soldos nestes lugares grandes (…) homens broncos e lerdos pera a boa disciplina, e mui fáceis e prontos para todo o insulto”175. Eram estes os soldados andaluzes que, desobedientes e insubmissos ao capitão português, chegavam a soltar os presos encarcerados no castelo por culpas graves. Interessava-lhes essencialmente o soldo que se apressavam a exigir, ameaçando saquear a cidade, o que levou o capitão a usar da violência. Para tal, pediu o capitão reforços a Mazagão e ludibriou os cabecilhas dos motins com pagamento dos tão exigidos soldos. Reunidos na sala dos pagamentos, foram desarmados pelos soldados portugueses e, “quando amanheceu o dia seguinte, apareceram enforcados e pendurados nas ameias todos os mais culpados”176. Ora, é muito provável que esta experiência tivesse sido determinante no que se refere à desconfiança de António Leite para com os espanhóis. Leite não só tinha tido contacto com as movimentações do Marquês de Ayamonte, como também conhecia o modo de agir andaluz nos Algarves luso-hispano-marroquinos. De maneira que a escolha de um indivíduo como o antigo capitão de Azamor e Mazagão para marcar posição numa vila frente a Espanha e proteger a margem portuguesa do Guadiana não terá sido, seguramente, inocente. Aliás, a desconfiança do alcaide de Arenilha para com os castelhanos está bem patente na carta que escreve a D. João III 175 Frei Luís de Sousa, in Anais de D. João III, Vol. II, p.189. 176 Frei Luís de Sousa, in Anais de D. João III, Vol. II, p.191. 67 e onde receia o despovoamento da vila, o “que não pesara nada aos castilhanos e aos de sua openyão”177. De resto, esta frase é bem representativa das dúvidas que os vizinhos do outro lado da fronteira despertavam no espírito de Leite, e na consequente necessidade de vigiá-los de perto… Para além das razões que se prendem com o combate à pirataria e a vigilância aos vizinhos do outro lado do rio, outro motivo terá, seguramente, impelido Leite para a foz do Guadiana. Não nos devemos esquecer que, para além dos motivos de honra e brio militar, os oficiais da Coroa portuguesa aspiravam à obtenção de fortuna e novos títulos, depois de servirem nas praças dos Algarves Dalém. De facto, muitos destes títulos eram relativos a rendas no Algarve Daquém pelo que, deste modo, a Coroa conseguia fixar no Algarve peninsular alguma nobreza capaz de socorrer as praças situadas na costa marroquina. Quer isto dizer que os títulos e rendas que fixavam estes fidalgos no Algarve Daquém não eram inocentes e tinham uma intenção claramente estratégica 178. Exemplo paradigmático, para o baixo Guadiana, é caso do capitão de Ceuta, D. Fernando de Meneses, agraciado com o condado de Alcoutim179, ou o caso de Garcia de Melo, nomeado alcaide-mor de Castro Marim depois dos serviços prestados em Larache, Arzila e Safim180. Isto já para não falar de Simão 177 Carta de António Leite a D. João III, em 16 de Novembro de ??? Documento parcialmente publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, pp.16-17 e por Márcia Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.44. 178 Fernando Pessanha, As Guarnições Militares nas Praças Portuguesas da Região da Duquela, no Algarve Dalém Mar, Dissertação de Mestrado em História do Algarve apresentada à Universidade do Algarve, pp.91-94. 179 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, pp.56-57. 180 Luís Miguel Duarte, “Garcia de Melo em Castro Marim (a actuação de um alcaide mor no início do século XVI) ”, in III Jornadas de História Medieval do Algarve e Andaluzia, pp.131-149. Ver também Fernando Pessanha, “Garcia de Melo – Alcaide-mor de Castro Marim e anadel-mor dos besteiros”, in Jornal do Baixo Guadiana, Nº155, Abril de 2013, p.21. 68 Correia, o alcaide-mor de Castro Marim que antecedeu Garcia de Melo 181 e que, se não estamos em erro, será o mesmo Simão Correia que capitaneou Azamor em 1516. Pelo menos vários documentos atestam a sua ligação ao Norte de África, identificando-o não só como alcaide-mor de Castro Marim, mas também como provedor das obras de Arzila 182. Frei João de São José refere-se a estes fidalgos da seguinte maneira: “estes (nobres), não são menos que os que estão em África, vivem sempre com o olho sobre o ombro e recatados dos inimigos que muitas vezes fazem saídas nesta costa, a qual eles no verão vigiam de dia e de noite, com o pé na estribeira e lança em punho, como dizem, sem por isso terem prémio algum mais que a honra de defender a pátria, porque se prezam pouco de ricos e muito de bons cavaleiros. E, como isto assim seja, não pouca obrigação tem o rei de os favorecer a todos com honras e mercês, pois eles vigiam para que nós durmamos. Eles trabalham por que nós descansemos e nos servem de muro e fortaleza, a cuja sombra o reino se tem por seguro. E, quando cá nos chega a nova do rebate, já eles lá têm todo o seu cabedal metido a terreiro”183. De resto, os factos acabam por provar o porquê da escolha de um indivíduo com o historial de António Leite para a alcaidaria de Arenilha. É certo que se tornava necessário proteger o território do termo arenilhense, mas, por outro lado, também convinha ter por perto homens com experiência de guerra que se lançassem no socorro às praças portuguesas do outro lado do estreito. Quando os sádidas começaram a ameaçar as 181 Antes de ser nomeado alcaide-mor de Castro Marim, Garcia de Melo foi anadel-mor dos besteiros em Arzila, numa altura em que o próprio alcaide-mor de Castro Marim, Simão Correia, acumulava funções como vedor da fazenda em Arzila. Ver A.N.T.T., Corpo Cronológico Parte II, maço 17, nº5. 182 A.N.T.T., Corpo Cronológico Parte II, maço 18, nº 19. A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 18, n.º 68; A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 18, n.º 36. Ver também Rafael Moreira, “História – Histoire”, in Arzila, Torre de Menagem – Le Donjon d’Asilah, p.35. 183 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, pp.53-54. 69 praças portuguesas do norte de Marrocos, foi ao alcaide de Arenilha que, em 1547, coube a tarefa de reforçar as muralhas de Alcácer Ceguer 184. Fig.15 - Alcácer-Ceguer, planta da campanha arqueológica de Charles Redman, em 1977, com o traçado circular da cerca e do fosso e a couraça da praia. 184 Numa carta de 2 de Maio de 1547, este pedia provimentos para estas obras. Não foram encontrados mais documentos que esclarecessem melhor quais as suas responsabilidades nesta nova estadia no Norte de África. Ver Rui Jorge Ferreira Henriques, “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), Dissertação de Mestrado em História Moderna e dos Descobrimentos apresentada à Universidade Nova de Lisboa, p.116. Sobre as muralhas de Alcácer Ceguer ver Valdemar Coutinho, “Fortaleza de Alcácer Ceguer. Reconstruída no século XV e abandonada no séc. XVI”, in Estudos de História Luso-Marroquina, pp.79-84; Pedro Dias, A Arquitectura dos Portugueses em Marrocos 1415 – 1769, pp.55-63. Do mesmo autor ver também História da Arte Portuguesa no Mundo – O Espaço Atlântico (séculos XV – XIX), pp.26-32. 70 Fig.16 - Pormenor da couraça de Alcácer Ceguer. Dois anos depois, em 1549, foi sobre o alcaide de Arenilha que recaiu a capitania do forte do Seinal, situado num monte sobranceiro a Alcácer Ceguer. Para além disso, quando D. João III se decidiu pelo abandono desta última praça, foi também a António Leite que coube o encargo da evacuação da vila. É Francisco de Andrada, guarda-mor da Torre do Tombo e cronista-mor do reino, que no-lo diz: “mandou ao Seinal por capitão António Leite, a quem escreueo que mandaua despejar a villa de alcacere”185. Aliás, de acordo com as Visitações da Ordem de Santiago, alguns materiais pétreos do forte do Seinal foram levados para os edifícios religiosos de Arenilha, nomeadamente para a “igreja da Trindade da Villa de Sancto António na barra de Guadiana” e para a “Irmida de Sancto António”186. 185 Francisco de Andrada, Crónica de D. João III, Capítulo, LI, pp.1020-1022. 186 Francisco Lameira; Maria Helena Rodrigues dos Santos, Visitação de Igrejas Algarvias – Ordem de São Tiago, pp.105-108. Ver também Hugo Cavaco, “Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio (Subsídios para o estudo da História da Arte no Algarve), pp.242-246. Márcia Luísa Grilo, “Na 71 Não sabemos exactamente quando morreu António Leite, mas calculamos que terá sido algures entre 1554, ano em que ainda foi referido como Senhor de Arenilha 187, e 1555, ano em que a alcaidaria passou para o seu filho Luís Leite. Depois da morte de António Leite, a sucessão do senhorio foi alvo de disputa. Por um lado, Jerónimo de Melo, fidalgo da Casa Real e alcaide-mor de Castro Marim, reivindicou a alcaidaria-mor de Arenilha. Por outro lado, Luís Leite, frei da Ordem de Cristo e filho de António Leite, reclamou igualmente o senhorio da vila. A questão acabou por resolver-se porque entretanto morreu Jerónimo de Melo, acabando o título por recair no filho do anterior alcaide, em 1555 188. Resta-nos indagar as razões para tal contenda. Não era Arenilha “um lugar pequeno”189 ou uma “vileta pequena (…) nem ela nem seu termo têm que lhe façamos mais larga memória”190? Sim, de facto! Mas temos que ter em consideração que Santo António de Arenilha e Castro Marim eram as duas únicas Comendas da Ordem de Cristo do Algarve, ou seja; o Senhorio das ditas alcaidarias eram motivo de honra e prestígio social numa sociedade ainda bastante influenciada pelas antigas tradições medievo-feudais. Por outro lado, e talvez mais importante do que a honra que advinha das alcaidarias, era a tença anual auferida e a riqueza que resultava da dízima das pescarias no termo de Arenilha, termo esse que incluía Monte Gordo, onde havia uma Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, pp.39-41. 187 Hugo Cavaco, “Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio (Subsídios para o estudo da História da Arte no Algarve), p.246. 188 Rui Jorge Ferreira Henriques, “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), Dissertação de Mestrado em História Moderna e dos Descobrimentos apresentada à Universidade Nova de Lisboa, p.48; Hugo Cavaco, Revisitando Santo António de Arenilha, p.18. 189 João Cascão, “Relação da Jornada de el-rei D. Sebastião quando partiu da cidade de Évora”, in Uma Jornada ao Alentejo e ao Algarve: A alteração das linhas de força da política nacional, p.120. 190 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.55. 72 pescaria bastante rentável. De resto, parte destas pescarias tinham, frequentemente, a Andaluzia como destino191, pelo que nem se punha o problema relativo ao escoamento do produto. Mas perguntemo-nos: quem é este segundo senhor de Arenilha? Terá a sua nomeação seguido o mesmo critério aplicado no caso de António Leite? Ou tratar-se-á de uma nomeação que seguiu o princípio da hereditariedade? Com efeito, o princípio da hereditariedade parece estar presente num documento publicado por Hugo Cavaco, em 1995, e que refere “a dita alcaidaria mor da quoal lhe asi fis merce em vida delle ditto Antonio Leite e de hum seu filho maior barão lidimo que ao tempo de seu falecimento ficar”192. Contudo, e ainda que o factor hereditário fosse muitas vezes determinante na atribuição de mercês, não devemos descartar outras razões que poderiam influenciar as decisões dos monarcas. Vejamos; é o próprio António Leite que, ainda como capitão de Azamor, em Março de 1541, refere ter um filho a servir em Mazagão, com Baltasar Rodrigues 193. Tudo indica, portanto, que se trataria de Luís Leite, filho legítimo do anterior Senhor de Arenilha, cavaleiro da Ordem de Cristo, como fora o seu pai, e homem experimentado no combate contra o mouro. Assim sendo, o candidato natural para suceder o anterior alcaide. De resto, é ele que detém o título aquando da passagem de D. Sebastião pela foz do Guadiana, em 1574: “É Senhor dele Luís Leite”194, passando-se o mesmo quando Frei João de são José se refere a Arenilha, em 1577: “É senhor dela, ao 191 Cf. Joaquim Romero Magalhães, Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, pp.238- 239. 192 A Francisco Pereira de Vasconcelos a Alcaidaria mor de Santo Antonio de Arenilha. Documento publicado por Hugo Cavaco, Revisitando Santo António de Arenilha, pp.36-40. 193 Carta de António Leite a D. João III, em Março de 1541. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. III, doc. LXXXVIII, pp.313-317. 194 João Cascão, “Relação da Jornada de el-rei D. Sebastião quando partiu da cidade de Évora”, in Uma Jornada ao Alentejo e ao Algarve: A alteração das linhas de força da política nacional, p.120. 73 presente, Luís Leite, filho de António Leite”195. O(s) matrimónio(s) de Luís Leite não são consensuais entre os genealogistas: terá casado com D. Genebra e D. Leonor Pinto ou só com D. Leonor de Oliveira? Da união com esta última são mencionados três filhos: António Leite de Vasconcelos, que foi comendador da Ordem de Cristo, Senhor de Arenilha e que não deixou descendência; Francisco Pereira de Vasconcelos, que herdou do irmão a alcaidaria-mor da vila de Santo António de Arenilha, casando três vezes, mas, de igual modo, sem prole; e D. Maria 196. Quando Luís Leite morreu, a alcaidaria da vila de Arenilha passou para o seu filho, António Leite de Vasconcelos, também frei da Ordem de Cristo. É o rei Filipe I que, em 11 de Fevereiro de 1588, fez “merce ao dito frei António Leite de Vasconcelos em sua vida somente”197. Mas voltemos a perguntar: terá a sua nomeação sido determinada pelo princípio da hereditariedade? Ou por reconhecimento de serviços prestados? Ambos os motivos terão pesado, certamente, ainda que, no presente caso, o factor hereditário tenha resultado conveniente para o monarca. A alusão de Filipe I aos serviços prestados por Luís Leite e António Leite mais não parecem do que um modo de legitimar a verdadeira razão que se prende com a atribuição da alcaidaria: o facto de António Leite de Vasconcelos ter entregado a vila de Santo António de Arenilha ao duque de Medina Sidónia por altura das “alterações do Reyno”, ou seja; quando a Coroa portuguesa passou para Filipe II de Espanha, depois da morte do cardeal D. Henrique. Para além disso, outros serviços contaram, como “ir em hum navio 195 Frei João de São José, “Corografia do Reino do Algarve (1577)”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.55. 196 Rui Jorge Ferreira Henriques, “Quão grande trabalho é viver!” António Leite – circuitos da nobreza portuguesa no sul de Marrocos (1513-1549), Dissertação de Mestrado em História Moderna e dos Descobrimentos apresentada à Universidade Nova de Lisboa, pp.47-48. 197 A Francisco Pereira de Vasconcelos a Alcaidaria mor de Santo Antonio de Arenilha. Documento publicado por Hugo Cavaco, Revisitando Santo António de Arenilha, pp.36-40. 74 d’armada a Ceita com quoatro homens a sua custa, e em ambas as jornadas de Africa, e da segunda tornar na armada de Dioguo de Sousa, e acharse na tomada da ilha terceira com ho marques de Santa Crus e servir em huma armada da costa”. Resumidamente, tratava-se de um individuo com experiência de guerra, como podemos depreender pela sua presença em Ceuta e nas armadas. Mas mais importante que isso; um homem cujas acções bem revelam um interessado apoio a Filipe II de Espanha. Uma carta datada de 10 de Agosto de 1601 dá-nos notícia sobre um outro donatário de Arenilha. Chama-se Francisco Pereira de Vasconcelos e é irmão do anterior, que não deixou descendência. Tal como os seus antecessores, recebeu o cargo “em sua vida somente”, e em virtude dos serviços prestados entre 1593 e 1598. Porém, e ao contrário dos seus predecessores, este indivíduo nem era cavaleiro da Ordem de Cristo, nem tinha servido em Marrocos, na guerra contra os mouros. Como justificar, então, a sua nomeação? Bem, a verdade é que por então já não havia muito a defender em Arenilha, na medida em que a população da vila, na altura da alcaidaria de Francisco Pereira de Vasconcelos - em finais do século XVI - tinha decrescido abruptamente. Se a vila contava com quinze ou dezasseis fogos 198 em 1574, em 1600 apenas restavam dois fogos, ou seja; uma média de dez habitantes permanentes: “Os vezinhos são tão poucos, que não passam de dous”199. Como explicar esta quebra na demografia arenilhense? Em 1994, referia Arnaldo Casimiro Anica o “desaparecimento da povoação de Santo António de Arenilha engolida pelo Mar”200. Acreditamos, porém, que o avanço das águas do mar não será a única explicação e que as causas que levaram ao despovoamento e posterior 198 Cf. João Cascão, “Relação da Jornada de el-rei D. Sebastião quando partiu da cidade de Évora”, in Uma Jornada ao Alentejo e ao Algarve: A alteração das linhas de força da política nacional, p.120. 199 Henrique Fernandes Sarrão, “História do Reino do Algarve”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.170. 200 Arnaldo Casimiro Anica, Freguesias, Vilas e Cidades do Algarve (sua antiguidade e população), p.20. 75 desaparecimento de Arenilha devem ser analisadas, contextualizadas e interpretadas num plano mais amplo. Ora, temos de ter em consideração que, para além da constante ameaça que advinha da acção da pirataria magrebina201, outros perigos se faziam sentir nesse final da centúria de quinhentos. O conflito entre a Espanha e a Inglaterra não se ficou pelo conhecido episódio da Armada Invencível, em 1588. Recordamos que da inimizade entre as partes envolvidas resultaram vários assaltos na costa algarvia. Num deles a armada do corsário Sir Francis Drake, depois de saquear Cádiz, atacou Sagres em 1587, quando Dom Fernão Teles de Meneses era Governador do Algarve 202. A fortaleza de Sagres foi saqueada e incendiada, tendo toda a sua artilharia sido levada pelos homens de Drake203. Alguns anos depois, em 25 de Julho de 1596, foi a vez de Faro ser atacada pelo Conde de Essex, sendo igualmente saqueada e incendiada204. Portanto, não será de admirar que as populações que viviam 201 Henrique Fernandes Sarrão, ao referir-se a Cacela, menciona “ser muito frequentada de mouros, porque a costa é, no verão, muito mansa e bem aparelhada para isso”. Ver Henrique Fernandes Sarrão, “História do Reino do Algarve”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.169. Alguns anos depois, em 1621, é Massai também se refere a Cacela dizendo que “os donos das terras as deixaõ de semeár por medo dos cossarios q lhe vem queimar as novidades”. Ver Alexandre Massai, “Descripção do Reyno do Algarve” in Lívio da Costa Guedes, Aspectos do Reino do Algarve nos Séculos XVI e XVII – A «Descripção» de Alexandre Massaii (1621), p.98. 202 Maria do Rosário Duarte Ferreira e Silva, “Dom Fernão Teles de Meneses – Governador do Reino do Algarve”, Anais do Município de Faro, Vols. XXXI – XXXII, p.110. 203 Curiosamente, o primeiro desenho conhecido da Fortaleza de Sagres encontra-se na British Library, em Londres, e é da autoria de William Borough, oficial inglês que participou no assalto a Sagres. Ver Natércia Magalhães, Algarve - Castelos, Cercas e Fortalezas, p.257. 204 Luíz Caetano de Lima, Geografia histórica de todos os estados soberanos de Europa, com as mudanças, que houve nos seus domínios, especialmente pelos tratados de Utrecht, Rastad, Badesn, da Barreira, da Quadruple Alliança, de Hannover, e de Sevilha; e com as geneologias das Casas reynantes, e outras muy principaes, dedicada à sacra, real, augusta magestade delrey D. João V Nosso Senhor, Tomo II, Capitulo XIV, p.317. Ver também Natércia Magalhães, Algarve - Castelos, Cercas e Fortalezas, p.102. 76 em zonas desprotegidas e pouco povoadas, como Arenilha, tivessem optado por locais que oferecessem melhores condições de segurança 205. Ainda assim, é bastante provável que a população aumentasse durante os meses da faina piscatória, na medida em que Henrique Fernandes Sarrão faz alusão aos “pescadores vêm de fora a esta vila fazer sua pescaria”. Seria, portanto, uma ocupação essencialmente sazonal e que convinha ser protegida das incursões inimigas através do sistema de torres de vigia espalhadas ao longo da costa. Se assim não fosse, muito dificilmente a população permanente de Arenilha poderia assegurar a vigilância da costa e proceder aos “sinais de fogo, quando há nova, ou rebate de Mouros”. Quer isto dizer que Arenilha, durante a alcaidaria de Francisco Pereira de Vasconcelos, encontrava-se já num processo de despovoamento que acabaria por arrastar-se ao longo das primeiras décadas do séc. XVII. Aliás, de um modo geral, o período correspondente ao domínio filipino ficou pautado por um sistemático abandono das terras da orla marítima, fruto da incapacidade defensiva face aos inimigos. Não será, portanto, de estranhar que a guarnição da obsoleta fortaleza de Cacela tenha sido, entretanto, transferida para Tavira 206, deixando a orla costeira do extremo algarve oriental ainda mais desprotegida. Para a centúria seiscentista ainda temos notícia de dois alcaides de Arenilha: D. Sebastião de Meneses, em 1624, e D. Diogo de Meneses, em 1627207. Porém, tratar-se-ia de uma alcaidaria que funcionaria mais de jure que de facto, pois dificilmente as responsabilidades militares subjacentes ao cargo de alcaide fariam sentido numa vila praticamente despovoada. Por outras palavras, a subsistência da alcaidaria (de uma vila mais virtual que 205 Cf. Valdemar Coutinho, “O Algarve e a política marroquina de D. João III”, in D. João III e o Império - Actas do Congresso Internacional comemorativo do seu nascimento, p.223. 206 Alexandre Massai, “Descripção do Reyno do Algarve” in Lívio da Costa Guedes, Aspectos do Reino do Algarve nos Séculos XVI e XVII – A «Descripção» de Alexandre Massaii (1621), pp.97-99. 207 Hugo Cavaco, Pelas Praias de Arenilha e Mares de Monte Gordo, p.25. 77 real) terá, certamente, servido de pretexto à atribuição de rendimentos a indivíduos que eram agraciados com mercês régias. É provável que os dois fogos referidos por Henrique Fernandes Sarrão se tivessem mantido durante as primeiras décadas do século XVII, nem que fosse de forma a legitimar a existência da Comenda e da receita que daí advinha. É o próprio Alexandre Massai que, em 1621, e sem ter visto a vila pessoalmente, refere a existência de duas ou três casas, para além da igreja 208. De acordo com as Constituições Sinodais do Bispado do Algarve, já mal se viam “algumas ruínas e sinais de povoação”209 no ano de 1637, mas vivia ainda gente nessa data “que alcançou a pessoas antigas, que reconheceram a dita vila povoada”. Parece-nos, contudo, tratar-se de uma descrição potencialmente exagerada e que tem base na comparação com o período em que Arenilha atingiu o máximo da sua demografia. Tratar-se-ia, portanto, de um confronto entre o estado da vila entre 1637 e aquilo que tinha sido décadas antes, aquando da passagem de João Cascão ou Frei João de São José. Para além disso, uma fonte documental que se encontra na Torre do Tombo e de que trataremos mais adiante, dá-nos conta de um indivíduo nascido em Arenilha entre 1613 e 1615. De resto, é uma informação que parece remeter para a alusão de Alexandre Massai em 1621, ou seja; por então a vila ainda era habitada, pelo que muito dificilmente se encontraria em tal estado de ruina em 1637. Seja como for, o topónimo não aparece no mapa da foz do Guadiana da autoria de Pedro Teixeira, em 1624210, e ainda que alguma família teimasse em residir em Arenilha nos finais da década de 30, 208 Alexandre Massai, “Descripção do Reyno do Algarve” in Lívio da Costa Guedes, Aspectos do Reino do Algarve nos Séculos XVI e XVII – A «Descripção» de Alexandre Massaii (1621), p.96. 209 Constituiçoens Synodaes do Bispado do Algarve novamente feytas, e ordenadas pelo illustrissimo e reverendissimo senhor Dom Frãcisco Barreto…, apud, José Eduardo Horta Correia, Vila Real de Santo António – Urbanismo e Poder na Política Pombalina, p.86, nota 12. 210 Pedro Teixeira, “Descripción de España y de las costas y puertos de sus reinos” (1634), in El Atlas del Rey Planeta, p.57. 78 o rebentar da Guerra da Restauração acabaria por dissuadir a teimosia de qualquer habitante que ainda resistisse. Fig.17 - A foz do Guadiana, em 1634. Mapa da autoria de Pedro Teixeira, in Descripción de España y de las costas y puertos de sus reinos. O topónimo e o termo de “Arenilha” continuaram a existir, ainda que a sua sede tivesse desaparecido. Em 1774, por exemplo, enviava o Marquês de Pombal um tal Luís António de Valleré, em missão secreta, para 79 inspeccionar “a Bella Villa de Sto Antonio de Arenilha, que novamente se está edificando”211. Num outro documento, também de 1774, recomendava o Marquês de Pombal que fossem utilizados soldados condenados nas obras de fortificações, “tal como fora praticado nas obras de Santo António de Arenilha”212. Com efeito, não só o topónimo como a própria câmara de Arenilha continuou em alegadas funções, sem interrupção institucional, durante o período compreendido entre o desaparecimento da vila e a construção de Vila Real de Santo António. Inúmeras fontes documentais comprovam-no. Exemplo disso é o corpus documental compilado por José Eduardo Horta Correia, e onde estão presentes vários acórdãos da Câmara de Arenilha e vária epistolografia dirigida ao governador. A título de exemplo apresentamos a representação da Câmara de Santo António de Arenilha, de 17 de Outubro de 1772213; o acórdão da Câmara de Arenilha de 21 de Março de 1774 214; a ordem régia de 27 de Abril de 1774 transferindo o priorado de Cacela para Arenilha 215; ou a ordem régia de 27 de Abril de 1774 nomeando nova Câmara para Arenilha216. Por outras palavras, a vila de Arenilha continuou a existir, pelo menos do ponto de vista institucional, até à fundação da nova vila régia, em 1776. Aliás, uma planta da nova vila, datada de 1774 e depositada no Arquivo Histórico Municipal de Vila Real de Santo António, ainda 211 A.H.M., Governo de D. Luís da Cunha Manuel, 1ª Divisão, 6ª Secção, cx.52,doc. 35. 212 A.H.M., Governo de D. Luís da Cunha Manuel, 1ª Divisão, 6ª Secção, cx.52, doc.36. 213 Documento publicado por José Eduardo Capa Horta Correia in Vila Real de Santo António – Urbanismo e Poder na Política Pombalina, doc. nº 5, pp.280-281. 214 Documento publicado por José Eduardo Capa Horta Correia in Vila Real de Santo António – Urbanismo e Poder na Política Pombalina, doc. nº 54, pp.335-336. 215 Documento publicado por José Eduardo Capa Horta Correia in Vila Real de Santo António – Urbanismo e Poder na Política Pombalina, doc. nº 65, p.345. Ver também Pedro Bandarra, O Concelho de Cacela e a sua extinção, p.44. 216 Documento publicado por José Eduardo Capa Horta Correia in Vila Real de Santo António – Urbanismo e Poder na Política Pombalina, doc. nº 66, p.345. 80 apresenta o topónimo de “Arenilha” 217, que o ministro de D. José I acabaria por suprimir. E se realmente até essa data foram nomeados juízes e vereadores, é porque os arenilhenses não tinham desaparecido; simplesmente se encontravam espalhados um pouco por todo o termo 218. Fig.18 - Inscrição na planta da Vila de Santo António de Arenilha, de 1774. PT/AMVRS/1221. Fig.19 - Planta da Vila de Santo António de Arenilha, de 1774. PT/AMVRS/1221. 217 218 A.M.V.R.S, Planta da Fundação de Santo António de Arenilha, doc.1221. José Eduardo Horta Correia, O Algarve em Património, p.145. 81 Fig.20 - Levantamento Topográfico de Monte Gordo em 1774. As Construções em Arenilha Lamentavelmente, qualquer tipo de sondagem arqueológica no local onde outrora se ergueu Arenilha resultaria altamente inverosímil. Por um lado, a natureza perecível do material usado na construção das casas (principalmente colmo e madeira) muito dificilmente evidenciar-se-ia no registo arqueológico. 82 Fig.21 - Casas de colmo e madeira representadas na Planta da Vila de Santo António de Arenilha, de 1774. PT/AMVRS/1221. Por outro lado, os materiais pétreos usados na construção dos únicos edifícios em alvenaria – a Igreja da Trindade e a Ermida de Santo António certamente terão tido o tradicional destino subjacente ao reaproveitamento de materiais. Acresce ainda que os terramotos de 1719, 1722 e 1755 219, acabaram inevitavelmente por afectar a margem portuguesa da foz do Guadiana, tendo sido parcialmente engolido pelas águas do mar parte do areal da antiga vila. Ainda assim, algumas fontes documentais, nomeadamente as Visitações da Ordem de Santigo, de 1554, poderão facultar-nos algumas pistas sobre a configuração arquitectónica dos templos arenilhenses. A Igreja da Santíssima Trindade era um pequeno templo de nave única: “he uma so casa”220. Tinha cobertura de duas águas com caniço e o chão bem ladrilhado. Estava orientada no sentido norte-sul, “ao longo do rio hum tiro de besta”, e encontrar-se-ia envolvido pelas casas dos moradores da vila. Em Ecos da Expansão Portuguesa em Marrocos, Hugo 219 Ataíde de Oliveira, Monografia do Concelho de Vila Real de Santo António, pp.68-69. 220 Francisco Lameira; Maria Helena Rodrigues dos Santos, Visitação de Igrejas Algarvias – Ordem de São Tiago, p.106. 83 Cavaco refere o aproveitamento da pedra que tinha pertencido ao forte do Seinal como parte do espólio pertencente às igrejas da extinta Vila de Santo António de Arenilha 221. Destes materiais destacam-se a pia de baptismo da Igreja da Trindade, onde se podia ler “esta pia mandou trazer aly fazer António Lleite estando per Capitão no Sainal”222, assim como a pedra que servia de altar com as “armas na coluna d’Antonio Leite”. A ermida de Santo António revela ser um caso particularmente interessante. Foi edificada numa elevação, ou “cabeço” a poente da vila e apresentava uma planta quase quadrada. “he d’abobeda d’alvenaria”223. Era “ameada per fora”, tinha em cada canto seu “balluarte pequeno; no curuçeo hua crus de pedra bem feita, está bem guarnecida de fora e de dentro”. De acordo com José Eduardo Horta Correia, poderia tratar-se de uma igreja do chamado “gótico alentejano” ou mediterrânico, com os seus melrões e contrafortes redondos224. Discordamos, porém, da hipótese levantada pelo autor quanto à possível existência da dita ermida em data anterior à fundação da vila 225. São as próprias Visitações da Ordem de Santiago que afirmam ter a ermida sido construída pelo alcaide de Arenilha: “A qual mandou fazer António Lleite, Senhor da dita villa”226. Deste modo, a sua data de construção tem de ser forçosamente posterior a 1542, o ano em que o antigo capitão de Azamor e Mazagão foi agraciado 221 Hugo Cavaco, “Ecos da Expansão Portuguesa em Marrocos”, in Contributos para a Construção da História Local, p.23. 222 Francisco Lameira; Maria Helena Rodrigues dos Santos, Visitação de Igrejas Algarvias – Ordem de São Tiago, p.106. Ver também a transcrição de Hugo Cavaco, in “Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio (Subsídios para o estudo da História da Arte no Algarve), p.242. 223 Francisco Lameira; Maria Helena Rodrigues dos Santos, Visitação de Igrejas Algarvias – Ordem de São Tiago, pp.107-108. 224 Sobre o designado “gótico alentejano” ver Paulo Pereira, “Évora e o novo modo gótico”, in História da Arte Portuguesa – Volume II – Do «Modo» Gótico ao Maneirismo, pp.32-42. 225 José Eduardo Horta Correia, O Algarve em Património, p.144. 226 Francisco Lameira; Maria Helena Rodrigues dos Santos, Visitação de Igrejas Algarvias – Ordem de São Tiago, p.108. 84 com o senhorio de Arenilha. De resto, sabemos que foi o próprio alcaide que, em 1550, trouxe do forte do Seinal o altar e a pia de pedra da dita ermida. Mas terá trazido apenas esses materiais? É possível que parte dos materiais pétreos utilizados na construção da ermida também fossem provenientes do forte do Seinal. Analisemos a caso por partes. Em Marrocos, existe a tradição - algo inocente - de atribuir aos portugueses qualquer construção em pedra que pareça centenária. De acordo com a tradição oral marroquina, os portugueses eram capazes de construir fortalezas da noite para o dia. Porém, esses mitos têm uma justificação bastante plausível. As fontes mostram que, depois de conquistados os territórios, as embarcações portuguesas levavam fortalezas em peças, pré-fabricadas em madeira. Só depois se dava início à construção em pedra, por dentro da pré-fabricada. De resto, tal aconteceu no Seinal, onde primeiramente foi construída uma fortaleza em madeira227. Desconhecemos se a construção do forte em pedra foi concluída, no entanto, a contratação de “mil e tresemtos e cimquoenta homens das obras”228 deixa antever a existência de materiais pétreos indispensáveis à empreitada. Aliás, uma carta de Gaspar Dias de Lamdim a D. João III refere que “a gemte d’obra trabalhaern gasalhados de capitãis e soldados, os quais são de pedra e barro, porque ao capitão Amtonio Leite pareçeo ao presemte ser mais necessário que outra cousa que puderão fazer”229. Perguntemo-nos então: se as obras no Seinal foram abortadas por deliberação de D. João III no decorrer de 1550, o que terá sido feito aos 227 Pedro Dias, História da Arte Portuguesa no Mundo – O Espaço Atlântico (séculos XV – XIX),pp.54- 56. Ver também Jorge Correia, Implantação da Cidade Portuguesa no Norte de África - Da tomada de Ceuta a meados do Séc. XVI, p.171. 228 Bernardo Rodrigues, Anais de Arzila, Vol. II, Capítulo LXXXIX, p.440. 229 Carta de Gaspar Dias de Lamdim a D, João III, em 21 de Setembro de 1549. A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 83, nº25. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. IV, doc. CIII, pp.370-771. 85 materiais de construção que andavam a ser utilizados na edificação do forte? Levaria o capitão do Seinal e alcaide de Arenilha apenas a pia de baptismo e a pedra que servia de altar? Deixaria os restantes materiais para que os mouros os utilizassem em seu benefício? Achamos que não. O mais provável é que António Leite tivesse mandado parte desses materiais pétreos para Arenilha, sendo posteriormente utilizados na construção da ermida de Santo António. Repare-se agora na localização geográfica de ambas as construções. O Seinal foi construído numa elevação, de modo a proteger a vila de Alcácer Ceguer, depois de Muley Ahmed ter conquistado o reino de Fez 230. Do mesmo modo, também a ermida de Santo António foi edificada numa elevação, ou “cabeço”, a poente da vila de Arenilha. Acresce ainda que a descrição feita nas Visitações da Ordem de Santiago revelam tratar-se de uma construção aparentemente sólida. Infelizmente, não é conhecido o projecto de Miguel de Arruda para o Seinal, pois seria interessante comparar a configuração arquitectónica de ambas as construções 231. Contudo, a descrição da ermida com planta quase quadrada, “ameada por fora” e com um “baluarte pequeno” em cada canto, remete-nos para uma tipologia - em dimensões reduzidas - que se poderá aproximar das torres de menagem manuelinas. Exemplo paradigmático, nos Algarves Dalém, é a torre de menagem de Arzila, representada por Georg Braun em Civitates Orbis Terrarum, em 1572. De acordo com Jorge Correia, trata-se de uma construção com “Prisma rectangular (…) remate superior ritmado por 230 Esperava-se, então, que o sádida atacasse as praças portuguesas do norte de Marrocos, especialmente Alcácer Ceguer, que se encontrava numa situação mais desfavorável. Por um lado, o seu pequeno recinto não facilitava a sua defesa. Por outro lado, a sua localização, num plano baixo, resultava altamente desfavorável em caso de cerco. 231 Depois do abandono, o local não voltou a ser ocupado pelos muçulmanos. Porém, quaisquer vestígios do forte português que ainda subsistissem in loco terão sido eliminados aquando da construção de instalações militares, durante o protectorado espanhol. 86 ameias e merlões (…) e guaritas semi-circulares nos ângulos”232. Apresentaria a ermida de Santo António a configuração de uma pequena torre de menagem? Tratar-se-ia de um pequeno templo fortificado? Fig.22 - Arzila e a sua torre de menagem, no início do séc. XVI. Gravura de Georg Braun impressa em Civitates Orbis Terrarum (1572). Parece-nos que o local onde foi edificada a ermida, num “cabeço” algo afastado da vila, e a natureza robusta da construção, pode perfeitamente prender-se com um plano de carácter estratégico-defensivo concebido pelo alcaide de Arenilha. Por outras palavras, uma construção de onde se pudessem vigiar as embarcações magrebinas que surgiam no horizonte marítimo e onde a pouca população de Arenilha se pudesse refugiar em caso de ataque. Temos que ter em consideração que com o abandono de Arzila e Alcácer Ceguer os mouros passaram a lançar fustas 232 Jorge Correia, Implantação da Cidade Portuguesa no Norte de África - Da tomada de Ceuta a meados do Séc. XVI, p.199. Sobre a torre de menagem de Arzila ver Rafael Moreira, “História – Histoire”, in Arzila, Torre de Menagem – Le Donjon d’Asilah, pp.23-45. 87 no Estreito de Gibraltar com relativa facilidade de movimentos 233, o que veio a resultar num factor altamente penalizante para as populações que habitavam a costa algarvia. Nesse sentido, e aproveitando os materiais do forte do Seinal, não seria despropositada a construção de um santuário sólido que servisse vários propósitos em caso de necessidade, uma vez que as “tramqueyras e repairos”234 que António Leite mandou construir “com desordenado travalho” dificilmente poderiam suster qualquer ataque mais consistente. De resto, e como sugere José Eduardo Horta Correia, é realmente possível que tivesse sido à ermida de Santo António que Alexandre Massai se referiu na sua Descripção do Reyno do Algarve, e que tenha sido a última construção a desaparecer pela sua localização e robustez235. Fig.23 - A ermida de Santo António e a vila de Arenilha segundo a interpretação do escultor Nuno Rufino. 233 Esta advertência já tinha sido feita por João de Loaisa a el-rei D. João III, em 1549. Ver Bernardo Rodrigues, Anais de Arzila, Vol. II, p.456. 234 Carta de António Leite a D. João III, em 16 de Novembro de ??? Documento parcialmente publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, pp.16-17 e por Márcia Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.44. 235 José Eduardo Horta Correia, O Algarve em Património, pp.144-145. 88 Modus vivendi em Arenilha A vida em Santo António de Arenilha não terá sido fácil. Como anteriormente vimos, a vileta junto à foz do Guadiana foi concebida enquanto couto de homiziados “asy e da maneira que ho he a nossa Villa de Crastro Marym”236. Desta maneira, os seus moradores gozavam dos mesmos privilégios instituídos para os vizinhos castro-marinenses. Pretendia-se facilitar a vida de uma população desterrada para o extremo sudeste do território nacional, pelo que a estratégia para fixá-los no local e angariar novos moradores passava pela aplicação de um conjunto de benesses e liberdades, como a isenção de pagar o dízimo das mercadorias que entravam na vila, desde que as mesmas fossem para consumo próprio e não para venda. Tal como o couto de Caminha, criado em 1406, ou o couto da Mexilhoeira, criado em 1495 237, também Arenilha foi um couto destinado a pescadores. É a própria carta de privilégio que no-lo diz: “homiziados que se vierem a asemtar na dita Villa darenilha semdo pescadores”. Porém, fica a impressão que ter-se-á tentado dinamizar alguma exploração agrícola – para além da agricultura de subsistência - principalmente no que diz respeito à exploração vinícola. É Henrique Fernandes Sarrão que diz que os arenilhenses “prantam alguas vinhas fracas”238 em derredor da vila. Realmente, já em 21 de Maio de 1529 determinava D. João III que os 236 A.N.T.T., Chancelaria de D. João III, liv. 12, fl.62. 237 José António Conceição de Sousa, "Gente" na Expansão portuguesa: gestão de recursos humanos nos séculos XV e XVI, Dissertação para Mestrado em História e Arqueologia da Expansão e dos Descobrimentos Portugueses apresentada à Universidade Nova de Lisboa, pp.23-24. 238 Henrique Fernandes Sarrão, “História do Reino do Algarve”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.170. 89 moradores de Arenilha não pagassem sisa do vinho que vendessem 239, o que parece uma clara medida de incentivo à exploração desta actividade. Como Hugo Cavaco bem observou, a madeira para a construção das casas e dos barcos seria, muito provavelmente, oriunda dos muitos pinhais referidos por Henrique Fernandes Sarrão. É neste sentido que os desenhos de Sande de Vasconcelos, recentemente adquiridos pela Direcção Regional da Cultura do Algarve 240, revestem-se de particular interesse, pois não obstante datarem de 1774, dão-nos uma ideia do espaço (aproximado241) onde outrora se tinha edificado a vila de Arenilha. 239 A.N.T.T., Chancelaria de D. João III, liv.48 fl.24. Documento publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, p.34. Documento também publicado por Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.37. 240 Estas ilustrações, ainda que publicadas no presente trabalho, bem merecem um estudo aprofundado, na medida em que se apresentam como importantíssimos testemunhos para o nosso conhecimento sobre da fundação de Vila Real de Santo António. As reproduções das ilustrações foram cedidas pela Biblioteca Nacional, onde se encontram, à data desta publicação, para avaliação e restauro. É intenção da DRCA entregar os originais à Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, para posterior consulta no Arquivo Municipal de VRSA. 241 Vila Real de Santo António foi edificada no “sítio do Barranco”, 1km a norte da antiga vila de Arenilha. 90 Fig.24 - Prospecto da V.ª de S. Antº. de Arenilha, tirada no dia 28 de Março, e feita no dia seguinte pello Sargento mor Jose de Sande Vasconcellos. Fig.25 - Estaleiro, da V.ª de S. Antº. de Arenilha. 91 92 93 Fig.26 - Vista do Estalleiro Realmente, as ilustrações setecentistas apresentam algum arvoredo que, certamente, terá fornecido a matéria-prima indispensável à construção das casas e dos barcos dos moradores da antiga vila de Arenilha, ainda que não seja de descartar a possibilidade de embarcações provenientes de outros destinos. É nesse contexto que reparámos num elemento que despertou o nosso interesse: a “barca de passagem” que era usada em Arenilha de modo a facilitar a circulação de pessoas, animais e mercadorias entre as duas margens do Guadiana. A referência à dita barca aparece num documento que Márcia Grilo remete para 7 de Julho de 1542 242, ou seja; no mês anterior à nomeação de António Leite como Senhor de Arenilha, em Agosto de 1542 243, e poucos meses depois do abandono de Azamor, em Outubro de 1541 244. Será que António Leite levou a “barca de passagem” de Azamor para Arenilha durante o processo de despejo daquela praça africana? Não é impossível. De facto, Maria Augusta Lima Cruz refere que Azamor tinha ao seu serviço uma embarcação de pequeno calado, que fazia a defesa do rio, equipada por um mestre e dois marinheiros245. Acresce que encontrámos vários documentos da Torre do Tombo onde se encontra mencionada a “barca de 242 Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.38. Reparámos que o documento referido por Márcia Grilo encontra-se publicado por Hugo Cavaco em Revisitando Santo António de Arenilha, e apresentando uma data anterior: 7 de Julho de 1540. 243 A.N.T.T., Chancelaria da Ordem de Cristo, lv.13, fls. 375 v. – 379 v. Documento publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, doc. V, pp.36-37. 244 Calculamos que a transferência de moradores, guarnição e material de guerra deva ter começado logo em Outubro de 1541, a avaliar pela carta de D. João III a Luís de Loureiro, que determina o envio de toda a artilharia, munições de Azamor para Mazagão, assim como a transferência dos militares que serviam de cavalo e as suas respectivas mulheres. Ver Carta de D. João III a Luís Loureiro, em 5 de Outubro de 1541. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. III, doc. CXXXVIII, pp.534-535. 245 Maria Augusta Lima Cruz, “Documentos inéditos para a história dos portugueses em Azamor”, in Arquivos do Centro Cultural Português, p.116. 94 passagem” de Azamor246. Bem, a verdade é que o despejo das possessões portuguesas no Algarve Dalém fez com que muitos dos bens e materiais fossem transferidos para o Algarve Daquém. Já aqui referimos os materiais pétreos que António Leite trouxe do forte do Seinal e que posteriormente foram aproveitados para os edifícios religiosos de Arenilha. Também o Convento de Nossa Senhora da Graça fundado em Tavira, em 1542, resulta da trasladação de um outro convento de Azamor. É Frei João de São José que no-lo diz: “o mosteiro é de religiosos Eremitas do S. P. Agostinho, ao qual deu motivo e prencipio, no ano de 1542, um religioso da mesma ordem, por nome Frei Pedro de Vila Viçosa, o qual já antes disto tinha começado outro em Azamor e, como el rei D. João o 3, neste tempo deixasse os lugares que este reino possuía em África, foi-lhe forçado deixar ele também o que tinha começado. E passando a esta cidade de Tavira, que então ainda estava próspera”247. Do mesmo modo, também Lagos recebeu ornamentos, vestimentas e peças de prata provenientes do convento de são Francisco de Safim248. Assim sendo, também não seria de estranhar que a “barca de passagem” de Azamor fosse aproveitada em Arenilha, de modo a facilitar a circulação de pessoas, animais e mercadorias entre as duas margens do Guadiana. Trata-se, além do mais, da 246 A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 98, nº1; A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 98, nº8; A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 98, nº10; A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 108, nº87; A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte II, maço 108, nº146. 247 Frei João de São José, Chorographia do Reino do Algarve, p.52; Ver também Pedro Dias, A Arquitectura dos Portugueses em Marrocos 1415-1769, p.129; Catarina Almeida Marado, Antigos Conventos do Algarve – um percurso pelo património da região, p.181, nota 2. A este propósito identificámos duas cartas de Azamor a D. João III e que aludem ao “moesteiro e casa de Nosa Senhora da Graça”. Ver carta dos moradores de Azamor a D. João III, em 20 de Março de 1540. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. III, doc. LXIX, pp.241-242. Ver também de António Leite a D. João III em 3 de Abril de 1540. A.N.T.T., Cartas dos Governadores de África, nº 104; Pedro Pinto, “Índice Analítico das Cartas dos Governadores de África na Torre do Tombo”, in Anais da História de Além-Mar, Vol. XI, p.270. 248 A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 70, nº115. 95 mesma barca que transportava o pároco de Ayamonte que assegurava os rituais litúrgicos na vila: “Não aa capellão nesta igreja que he causa de estar çuia e como não deve; mandão chamar hum clérigo de Aiamonte e diz lhes uma misa e pagam lhe de via; se a de prover niso per o perigo das almas”249. A inexistência de um pároco que realizasse baptismos, matrimónios e administrasse sacramentos não deixa de ser um dado curioso. Porque razão não eram estes serviços litúrgicos assegurados pelo pároco de Castro Marim ou de Cacela? Porque razão prefeririam os arenilhenses um “capelão” espanhol? Como já anteriormente referimos, a existência de um topónimo de origem castelhana, ainda antes da elaboração da Carta de Privilégio de 1513, pode perfeitamente indicar a ocupação sazonal do areal na margem portuguesa da foz do Guadiana por pescadores espanhóis. Tal população não terá, certamente, evitado Arenilha aquando da criação do couto. Pelo contrário. Os privilégios régios não só terão fixado alguns dos pescadores castelhanos que ocupavam sazonalmente o território, como terão atraído novos povoadores de Ayamonte e de outros pontos da Andaluzia, para além dos que terão vindo de Castro Marim, Cacela ou Monte Gordo. Ainda que D. João III tivesse pretendido erradicar o topónimo de origem castelhana, em 1542, tal não veio a acontecer, tendo este subsistido até à fundação de Vila Real de Santo António. Cabe-nos indagar porquê. O mais provável é que parte significativa da população arenilhense fosse, efectivamente, castelhana, pelo que o topónimo original não só se terá mantido por uma questão de tradição como também por uma influência exercida in loco. De resto, essa influência poderia perfeitamente justificar a 249 Hugo Cavaco, “Visitações” da Ordem de Santiago no Sotavento Algarvio (Subsídios para o estudo da História da Arte no Algarve), p.242. 96 opção por um pároco vindo de Ayamonte e cuja passagem era paga pelos próprios arenilhenses. Para além disso, não nos devemos esquecer que as linhas de fronteira eram determinadas pelo poder político, mas estas pouco influíam nas relações sociais, económicas e culturais que caracterizavam o quotidiano das populações raianas. É bastante pertinente a alusão que Mária Grilo faz às boas relações entre as populações das duas margens do baixo Guadiana, destacando o ambiente de grande festa vivenciado por portugueses e espanhóis aquando da visita de D. Sebastião, em 1574 250. Com efeito, João Cascão refere o contentamento dos ayamontinos com a visita do rei português e o clima de festa com que foi recebido: “veio correndo Aiamonte todo, ao longo das casas, que é muito comprido. E chegou-se tão longe das casas com o bergantim que o conheciam muito bem de terra, e acudiu à praia toda a gente de Aiamonte, e às janelas, e eirados de sobre o rio muitas, e muito formosas (mulheres). O Rio era coalhado de batéis e bergantins, e com as gritas que havia, e disparar de artilharia da fortaleza, - que o fez duas vezes -, e o repicar dos sinos de Aiamonte, não havia quem se entendesse. E era coisa muito para ver”251. Por outro lado, também temos que ter em consideração que as relações entre portugueses e espanhóis congraçavam laços familiares e interesses estratégicos que resultavam em cumplicidades muitas vezes danosas para os interesses das monarquias. E a que cumplicidades nos referimos? Ao comércio que não pagava impostos, ou seja: contrabando. Ora, como Joaquim Romero de Magalhães bem observou, Arenilha era, tal como Castro Marim e Alcoutim, um dos pontos de passagem ilegal por 250 Márcia Luísa Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.45. 251 João Cascão, “Relação da Jornada de el-rei D. Sebastião quando partiu da cidade de Évora”, in Uma Jornada ao Alentejo e ao Algarve: A alteração das linhas de força da política nacional, p.121. 97 onde castelhanos (e não só) metiam os escravos que afluíam ao Algarve, e que depois eram vendidos para Espanha e, principalmente, para a América espanhola. De resto, o transporte era sempre feito por negreiros algarvios252. Por outras palavras, ser-se português ou espanhol pouco importava quando cada um se batia pela bandeira da subsistência… É nesse contexto que, em 1547, Diogo Fernandes das Póvoas, Provedor e Feitor-mor das Alfândegas do mar e terra dos Reinos de Portugal, tomou providências no sentido de combater o muito contrabando que se verificava no termo de Arenilha. O “Tresllado do Regimento da Villa de Santo Antonio deixado por Diogo Fernandes de Povoas” encontrase publicado por Hugo Cavaco e é bem elucidativo desta situação: “pella ponta de Santo Antonio que he da parte de Castro Marim e pello esteiro da Carrasqueira e outras partes do Rio do Godiana se pasavão muitas mercadorias da Villa de Aymonte e de outras parttes dos Reinos de Castella e de fora delles pera estes Reynos pellos ditos lugares, e assim outras mercadorias, escravos e dinheiro e outras couzas destes Reinos pera os de Castella e pera outras partes sem as dias mercadorias, assim das que entrão no dito Reino como das que sahião delle, pagarem os direitos a Sua Alteza como herão obrigados”253. Como já anteriormente referimos, a vida em Santo António de Arenilha não terá sido fácil. A carta de António Leite a D. João III - e que Hugo Cavaco baliza entre 1542 e 1547 - dá-nos conta das dificuldades sentidas pelo antigo capitão de Azamor e Mazagão. No “Índice Analítico das Cartas dos Governadores de África na Torre do Tombo”, publicano por Pedro Pinto, em Anais da História de Além-Mar, o documento aparece com 252 Joaquim Romero Magalhães, Para o Estudo do Algarve Económico Durante o Século XVI, p.198; Ver também Luís Miguel Duarte, “Garcia de Melo em Castro Marim (a actuação de um alcaide mor no início do século XVI)”, p.134. 253 Tresllado do Regimento da Villa de Santo Antonio deixado por Diogo Fernandes de Povoas. Documento publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, doc. II, pp.29-33. 98 a seguinte designação: “Carta a D. João III sobre a necessidade de fortificar a foz do Guadiana para fazer face aos ataques de mouros. Santo António da Foz do Guadiana”254. Já o Arquivo Nacional da Torre do Tombo apresenta o mesmo documento como: “Carta de António Leite para o rei dando-lhe conta que no lugar em que se encontrava atacava os mouros e que deles se defendia por meio de trincheiras, e que era necessário enviar-lhe socorro”255. Apresentamos, de seguida, a transcrição do supra citado documento: “Eu cuydey que V.A. polo que cumpre a seu serviço tevese deste luguar lemvrança pera o prover do risquo e peryguo em que estaa dos mouros aquy darem e levarem alguns pouquos de jnoçentes que aquy há; este verão passado tyve tanto travalho com hos pouquos que me aquy ajudarão que nunqua outro tal pasey de muytos que já tyve e isto pelos avizos que ouve dos loguares dallem de pessoas que sabem que os mouros trazem muyto em semtido de darem neste lugar, e vigiamo-nos com tramqueyras e repairos que fiz de madeyra com desordenado travalho, o qual o veraão que vem não poderey soster se V. A. Não prover com ajuda, e ate quy fiz nisto e em outras cousas mais do que poso servyr V.A., e fyqua em comdição de se despovoar este verão que vem de que não pesara nada aos castilhanos e aos de sua openyão, e de dioguo luis a V.A. que ajudou a passar o travalho do verão passado pode V. A. Saber isto e outras cousas que pasão (…) De Samto Amtonio da foz dodiana a xbj de novembro”256. 254 Pedro Pinto, “Índice Analítico das Cartas dos Governadores de África na Torre do Tombo”, in Anais da História de Além-Mar, Vol. XI, p.267. 255 A.N.T.T., Cartas dos Governadores de África, Nº78. 256 Carta de António Leite a D. João III, em 16 de Novembro de ??? Documento parcialmente publicado por Hugo Cavaco in Revisitando Santo António de Arenilha, pp.16-17 e por Márcia Grilo, “Na Margem Direita do Guadiana Face a Espanha”, in Vila Real de Santo António e o Urbanismo Iluminista, p.44. 99 Fig.27 - Carta de António Leite para o rei dando-lhe conta que no lugar em que se encontrava atacava os mouros e que deles se defendia por meio de trincheiras, e que era necessário enviar-lhe socorro. PT/TT/CART/877/78. Imagem cedida pelo ANTT. 100 Fig.28 - Carta de António Leite para o rei dando-lhe conta que no lugar em que se encontrava atacava os mouros e que deles se defendia por meio de trincheiras, e que era necessário enviar-lhe socorro. PT/TT/CART/877/78. Imagem cedida pelo ANTT. 101 Ora, das informações facultadas por António Leite podemos tirar algumas conclusões. Em primeiro lugar há a destacar uma situação bastante óbvia: se a fundação de Arenilha pretendia vigiar e alertar as povoações vizinhas das incursões da pirataria, a existência da própria vila acabou por resultar num chamariz para as embarcações magrebinas que surgiam no horizonte marítimo. Em segundo lugar, há a realçar o descontentamento manifestado pelo alcaide e que pode deixar transparecer um certo exagero. Com efeito, o discurso de Leite parece impregnado de um dramatismo que pouco se coaduna com a experiência bélica de alguém que combateu no teatro de guerra hostil e sangrento que era a cruzada portuguesa em Marrocos. Recordamos que nos finais de 1525, as forças comandadas por António Leite conseguiram resistir a um cerco que o rei de Fez pôs a Mazagão, mesmo sem o capitão ter pedido especial socorro a D. João III257. Também foi durante a capitania de Leite em Azamor, em 1530, que o xerife lançou um poderoso ataque em que os muçulmanos penetraram na vila velha e quase entraram no castelo por um baluarte, provocando muito pânico258. Vemos, deste modo, que o alcaide de Arenilha era um homem com bastante experiência no que se refere à defesa de posições atacadas pelos mouros. Assim sendo, seriam legítimas as preocupações manifestas por Leite no que se refere ao “risquo e peryguo em que” Arenilha “estaa dos mouros”? Bem, é certo que a pirataria berberesca se apresentava como uma ameaça constante. A carta do Comendador de Cacela, D. Simão de Meneses, a D. João III, em 1548, comprova-o: “aqui temos novas como fustas de mouros se fazem prestes pera virem a esta costa e fazerem salto em alguns lugares dela prymcypallmente em sãotãotonyo e na guomeira 257 Augusto Ferreira do Amaral, História de Mazagão, p.92. 258 Carta de Vicente Rodrigues Evangelho a D. João III, em 10 de Abril de 1530. Documento publicado in Les Sources Inédites de l’histoire du Maroc, Vol. II, second partie, doc. CXXVI, pp.508-115. 102 que he termo de Tavira”259. Do mesmo modo, também Henrique Fernandes Sarrão, ao referir-se a Cacela, menciona “ser muito frequentada de mouros, porque a costa é, no verão, muito mansa e bem aparelhada para isso”260 e, do mesmo modo, também Massai se refere que “os donos das terras as deixaõ de semeár por medo dos cossarios q lhe vem queimar as novidades”261. No entanto, as palavras do alcaide de Arenilha devem ser interpretadas ao abrigo de um sentido mais crítico que literal. A verdade é que António Leite já tinha capitaneado centenas de homens em Marrocos. Onde? Em Azamor, uma cidade que, de acordo com o bispo do Algarve, D. Jerónimo Osório, já tinha encerrado dentro dos seus muros mais de 5000 fogos262. E que “capitaneava” António Leite em Arenilha? A resposta é: “alguns pouquos de jnoçentes que aquy há”. Não se sentiria o alcaide diminuído com a defesa de um areal praticamente ermo depois de ter defendido possessões portuguesas como a cidade de Azamor ou o castelo manuelino de Mazagão? É bastante possível. Não será, portanto, de estranhar que Leite se queixe ao monarca alegando que “nunqua outro tal pasey de muytos que já tyve e isto pelos avizos que ouve dos loguares dallem”. Por outras palavras, António Leite aspirava a obtenção de mais e melhores condições para poder defender convenientemente a vila. Já aqui falámos das actividades a que se dedicavam os arenilhenses: a pesca, o contrabando e até mesmo alguma agricultura de subsistência. 259 A.N.T.T., Corpo Cronológico, Parte I, maço 80, doc.92. 260 Ver Henrique Fernandes Sarrão, “História do Reino do Algarve”, in Duas Descrições do Algarve do Século XVI, p.169. 261 Ver Alexandre Massai, “Descripção do Reyno do Algarve” in Lívio da Costa Guedes, Aspectos do Reino do Algarve nos Séculos XVI e XVII – A «Descripção» de Alexandre Massaii (1621), p.98. 262 Jerónimo Osório, Biografias da História de Portugal – Volume XXVII – D. Manuel I – Da Vida e Feitos de El-Rei D. Manuel, p.192. Também David Lopes refere-se a Azamor antes da conquista pelo Duque de Bragança: “A cidade era grande, de nobres edifícios e muitas mesquitas sendo 28 de alcorão ou minarete; tinha muito fortes muros e havia neles 80 torres muito altas”. Ver David Lopes, “Os Portugueses em Marrocos no Tempo de D. Manuel I”, in História de Portugal, vol. III, p.516. 103 Seria, então, esse o destino partilhado por todos os naturais da “vileta” da foz do Guadiana? Certamente que não. No decurso da investigação para a elaboração do trabalho que aqui se apresenta, deparámo-nos com um documento de grande importância. Trata-se do processo da inquisição de Jorge da Cunha, um natural “do lugar de Santo Antonio de Arenilha Reyno do Algarue”263. Fig.29 - Processo de Jorge da Cunha. A.N.T.T, Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl. 1. De acordo com o processo, o acusado, solteiro e de 43 anos, era militar com o posto de alferes, na cidade de Tânger. Acusado de blasfémia, foi preso naquela praça norte africana em 30 de Janeiro de 1657. Posteriormente, em 27 de Junho de 1658, deu entrada no cárcere em Lisboa, onde ficou até à leitura da sentença. Foi condenado a auto de fé, em 263 A.N.T.T., Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl.1. 104 15 de Dezembro do mesmo ano, com vela acesa na mão, e açoutado nas ruas públicas de Lisboa. Posteriormente foi degredado para a ilha do Príncipe durante cinco anos. Fig.30 - Abjuraçam de vehementi assinada por Jorge da Cunha. A.N.T.T., Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl. 83. 105 Fig.31 - Termo de segredo assinado por Jorge da Cunha. A.N.T.T., Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl. 85. De um modo geral, trata-se de um documento que se reveste de particular interesse, na medida em que testemunha o percurso de alguém nascido em Arenilha por volta de 1614. Quer isto dizer que Jorge da Cunha seria descendente de um dos dois “vizinhos” referidos por Henrique Fernandes Sarrão em 1600? Será que o supra citado residiu numa das “duas ou tres cazas”264 referidas por Massai, em 1621? Ainda que o processo da inquisição refira Jorge da Cunha enquanto natural “do lugar de Santo 264 Alexandre Massai, “Descripção do Reyno do Algarve” in Lívio da Costa Guedes, Aspectos do Reino do Algarve nos Séculos XVI e XVII – A «Descripção» de Alexandre Massaii (1621), p.96. 106 Antonio de Arenilha”, não devemos excluir a hipótese de o documento referir-se ao termo de Arenilha e não à vila. Não pudemos deixar de reparar que, também neste caso, a história de Arenilha acaba por estar relacionada com a expansão portuguesa para o norte de África, o que é natural se tivermos em consideração que a circulação de gentes dos Algarves entre os dois lados do estreito foi uma constante até ao abandono das praças marroquinas265. O posto de alferes – oficial subalterno266 – deixa antever uma carreira militar iniciada nos alvores da idade adulta, pelo que não seria de estranhar que Jorge da Cunha tivesse abandonado Arenilha com destino a Tânger nos primeiros anos da década de 30 do séc. XVII. Por outras palavras, não é impossível que Jorge da Cunha e os seus familiares tivessem sido dos últimos habitantes da antiga vila de Santo António de Arenilha. 265 Com o abandono de Tânger, em 1562 - cedida à Inglaterra como dote pelo casamento de Catarina de Bragança – Tavira recebeu 130 “casais”; Lagos, 210 e Faro 78. Joaquim Romero Magalhães, O Algarve Económico 1600 – 1773, p.106. 266 Gabinete de Estudos Heráldicos, Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, Vol. I, pp.1371- 1372. 107 FONTES E BIBLIOGRAFIA Arquivos: Arquivo Nacional da Torre do Tombo Chancelaria de D. Afonso III Livro I, fólio 148-148v. Livro I, fólio 149. Chancelaria de D. Afonso V Livro 2, fólio 30. Chancelaria de D. João II Livro 24, fólio 99. Chancelaria de D. Manuel I Livro 5, fólio 24v. Livro 5, fólio 25. Livro 11, fólio 53. Livro 30, fólio 118. Livro 5, fólio33. Chancelaria de D. João III Livro 12, fólio 62. Livro 24, fólio 99. Livro 32, fólio 82. Livro 42, fólios 79-79v. Livro 47, fólio 56. Livro 48, fólio 24. Corpo Cronológico 108 Parte I, maço 70, documento 115. Parte I, maço 80, documento 92. Parte I, maço 83, documento 25. Parte II, maço 17, documento 78. Parte II, maço 17, documento 5. Parte II, maço 18, documento 1. Parte II, maço 18, documento 19. Parte II, maço 18, documento 36. Parte II, maço 18, documento 68. Parte II, maço 18, documento 71. Parte II, maço 18, documento 94. Parte II, maço 18, documento 96. Parte II, maço 18, documento 104. Parte II, maço 98, documento 10. Parte II, maço 108, documento 87. Parte II, maço 108, documento 146. Cartas dos Governadores de África Documento 64. Documento 78. Documento 104. Chancelaria da Ordem de Cristo Livro13, fólios 375 v. – 379 v. Gavetas Gaveta 20, maço V, nº 14, Tribunal do Santo Ofício Inquisição de Lisboa, proc. 10654. Arquivo Histórico Militar PT AHM/DIV/1/06/52/35. PT AHM/DIV/1/06/52/36. 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(on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://www.uniarq.net/projecto-castro-marim.html Fig.3 - Materiais arqueológicos do núcleo museológico do castelo de Castro Marim. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://www.uniarq.net/projecto-castro-marim.html Fig.4 - Estruturas do Montinho das Laranjeiras, em Alcoutim. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://conistorgis.blogspot.pt/2010_04_01_archive.html Fig.5 - Bairro Islâmico em Cacela Velha. Foto: CIIPC/CMVRSA, 2010. 130 Fig.6 - Vista aérea do Castelo de Castro Marim. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://www.cm-castromarim.pt/medievais/images/Castelo_Castro_Marim1.jpg Fig.7 - Castro Marim representado em O Livro das Fortalezas, de Duarte de Armas. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://www.cm-castromarim.pt/site/images/castromarim/gam/duarte.jpg Fig.8 - Topónimo “Arenilha” em O Livro das Fortalezas, de Duarte de Armas. Imagem retirada de ARMAS, Duarte de, Livro das Fortalezas, Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo / Inapa, 1997. Fig.9 - Carta topográfica do terreno compreendido, entre a praia de Monte Gordo e a Praça de Castro Marim na que se faz ver a situação da Vila de Stº António de Arenilha, os rios de Guadiana, Carrasqueira e Liziria e os esteiros de Castro Marim e de Traveça e o lugar em que é situado o Porto de Ayamonte. PT/TT/MR/1/46. Imagem cedida pelo ANTT. Fig.10 - A cidade de Azamor no séc. XVI. Gravura de Georg Braun impressa em Civitates Orbis Terrarum (1572). (on-line), (Extraído em 26 de Fevereiro de 2010), disponível em: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/f2/Braun_Azemmour_HAAB.jpg Fig.11 - Muralha leste de Azamor, entre os dois baluartes voltados para o rio Morbeia. (on-line), (Extraído em 26 de Fevereiro de 2010), disponível em: http://www.tripadvisor.com/LocationPhotos-g644024-w2-Azemmour.html#1597723 Fig.12 - Carta de Simão de Meneses a D. João III, em 28 de Abril de 1548. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=3777776 Fig.13 - Carta de Simão de Meneses a D. João III, em 28 de Abril de 1548. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=3777776 131 Fig.14 - Carta de Simão de Meneses a D. João III, em 28 de Abril de 1548. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=3777776 Fig.15 - Alcácer Ceguer. Planta da campanha arqueológica de Charles Redman, em 1977, com o traçado circular da cerca e do fosso e a couraça da praia. Imagem retirada de DIAS, Pedro, A Arquitectura dos Portugueses em Marrocos 1415 – 1769, Coimbra, Livraria Minerva Editora, 2000, p.56. Fig.16 - Pormenor da couraça de Alcácer Ceguer. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4c/Projecto_de_coura%C3%A7a_de _Alc%C3%A1cer-Ceguer_1502%2C_Boitaca.jpg Fig.17 - A foz do Guadiana, em 1634. Mapa da autoria de Pedro Teixeira, in Descripción de España y de las costas y puertos de sus reinos. Imagem retirada de TEIXEIRA, Pedro, “Descripción de España y de las costas y puertos de sus reinos”, in El Atlas del Rey Planeta, Aldamar, Editorial Nerea, 2002, p.57. Fig.18 - Inscrição na planta da Vila de Santo António de Arenilha, de 1774. Foto: Arquivo Municipal de Vila Real de Santo António, 2013. Fig.19 - Planta da Vila de Santo António de Arenilha, de 1774. Foto: Arquivo Municipal de Vila Real de Santo António, 2013. Fig.20 - Levantamento Topográfico de Monte Gordo em 1774. (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://www.bahop.min- economia.pt/documentos-do-mes/2011/agosto Fig.21 - Casas de colmo e madeira representadas na Planta da Vila de Santo António de Arenilha, de 1774. Foto: Arquivo Municipal de Vila Real de Santo António, 2013. 132 Fig.22- Arzila e a sua torre de menagem, no início do séc. XVI. Gravura de Georg Braun impressa em Civitates Orbis Terrarum (1572). (on-line), (Extraído em 5 de Novembro de 2013), disponível em: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Arzilla_civitates_orbis_terrarum_bnl.png Fig.23 – A ermida de Santo António e a vila de Arenilha segundo a interpretação do escultor Nuno Rufino. Ilustração: Nuno Rufino, 2013. Fig. 24 - Prospecto da V.ª de S. Antº. de Arenilha, tirada no dia 28 de Março, e feita no dia seguinte pello Sargento mor Jose de Sande Vasconcellos. Reprodução de Imagem cedida pela Biblioteca Nacional. Fig.25 - Estaleiro, da V.ª de S. Antº. de Arenilha. Reprodução de Imagem cedida pela Biblioteca Nacional. Fig.26 - Vista do Estalleiro. Reprodução de Imagem cedida pela Biblioteca Nacional. Fig.27 - Carta de António Leite para o rei dando-lhe conta que no lugar em que se encontrava atacava os mouros e que deles se defendia por meio de trincheiras, e que era necessário enviar-lhe socorro. PT/TT/CART/877/78. Imagem cedida pelo ANTT. Fig.28 - Carta de António Leite para o rei dando-lhe conta que no lugar em que se encontrava atacava os mouros e que deles se defendia por meio de trincheiras, e que era necessário enviar-lhe socorro. PT/TT/CART/877/78. Imagem cedida pelo ANTT. Fig.29 - Processo de Jorge da Cunha. A.N.T.T, Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl. 1. Fig.30 - Abjuraçam de vehementi assinada por Jorge da Cunha. A.N.T.T., Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl. 83. Fig.31 - Termo de segredo assinado por Jorge da Cunha. A.N.T.T., Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 10654, fl. 85. 133