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História e Liberalismo (Optativa, 2018)

A recepção, entre os historiadores, do livro "O Fim da História e o último homem", de Francis Fukuyama, contribuiu para reforçar a ideia de incompatibilidade entre Liberalismo e História. Da mesma forma, o debate político dos últimos anos, no Brasil e no exterior, tendeu a apresentar, por vezes, o Liberalismo como uma doutrina essencialmente econômica. Pelo contrário, longe de se limitar à justificativa de um determinado modelo econômico ou mesmo de um projeto político, o Liberalismo reuniu autores engajados em questões centrais à prática e à teoria da História. De um ponto de vista epistemológico, estes pensadores se dedicaram a adequar a disciplina à mudança de paradigma científico observada no início do século XX, seja advogando por princípios universais de investigação – como o preceito da falseabilidade de Karl Popper – seja defendendo o distanciamento entre as humanidades e as ciências naturais – como na crítica de Friedrich Hayek ao cientismo. De um ponto de vista temático, historiadores liberais estimularam a análise sobre o papel do indivíduo nos processos históricos. Este desenvolvimento se deu não por meio um retorno à historiografia romântica do século XIX, mas de maneira a responder ao problema das contingências do social na ação humana, tal como enfatizado, ao longo do século XX, por proponentes de visões holísticas da história. Neste percurso, a vertente liberal fomentou a investigação segundo eixos que, se não inéditos entre historiadores, nem sempre haviam sido trabalhados com a mesma centralidade aferida em disciplinas análogas, como a Sociologia, a Economia ou a Ciência Política. São eles os modelos de explicação causal, de agência humana e de ação racional. Este curso tem o objetivo de discutir as principais contribuições do pensamento liberal à escrita da história, às suas conformidades e diferenças em relação a outras linhas interpretativas e à sua pertinência para o debate historiográfico contemporâneo.

História e Liberalismo 1° Semestre de 2018 Prof. Dr. Marcelo Cândido da Silva Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH-USP) Objetivos e justificativa Este curso tem o objetivo de discutir as principais contribuições do pensamento liberal à escrita da História, suas conformidades e diferenças em relação a outras linhas interpretativas e sua pertinência para o debate historiográfico contemporâneo. Tendo como pano de fundo o estudo de autores liberais, o curso pretende abordar três questões essenciais à formação de pesquisadores e de professores de História: a racionalidade, a causalidade e a agência humana. Assim, ao invés de tratar a formação de professores em um tópico específico, “História e Liberalismo” pretende contribuir para esse objetivo através de uma reflexão sobre alguns dos princípios basilares da disciplina histórica. O curso também prevê, como uma das formas de avaliação dos alunos, a realização de seminários, o que ajudará no desenvolvimento da prática pedagógica dos matriculados. A recepção, entre os historiadores, do livro "O Fim da História e o último homem", de Francis Fukuyama, contribuiu para reforçar a ideia de incompatibilidade entre Liberalismo e História. Da mesma forma, o debate político dos últimos anos, no Brasil e no exterior, tendeu a apresentar, por vezes, o Liberalismo como uma doutrina essencialmente econômica. Longe de se limitar à justificativa de um determinado modelo econômico, ou mesmo de um projeto político, o Liberalismo reuniu autores engajados em questões centrais à prática e à teoria da História. De um ponto de vista epistemológico, esses pensadores se dedicaram a adequar a disciplina à mudança de paradigma científico observada no início do século XX, seja advogando princípios universais de investigação – como o preceito da falseabilidade de Karl Popper –, seja defendendo o distanciamento entre as humanidades e as ciências naturais – como na crítica de Friedrich Hayek ao cientificismo. De um ponto de vista temático, historiadores liberais estimularam a análise sobre o papel do indivíduo nos processos históricos. Esse desenvolvimento se deu não por meio um retorno à historiografia romântica do século XIX, mas de maneira a responder ao problema das contingências do social na ação humana, tal como enfatizado, ao longo do século XX, por proponentes de visões holísticas da história. Nesse percurso, a vertente liberal fomentou a investigação segundo eixos que, se não inéditos entre historiadores, nem sempre foram trabalhados com a mesma centralidade aferida em disciplinas análogas, como a Sociologia, a Economia ou a Ciência Política. Esses eixos são os modelos de explicação causal, de agência humana e de ação racional. 1 Programa 1. Liberalismo e "fim da História" - Francis Fukuyama e a democracia liberal 2. Indivíduo e Sociedade - Karl Popper e a crítica ao historicismo - Benedetto Croce e o historicismo da liberdade - Daron Acemoglu: uma abordagem institucional das desigualdades 3. Ordem e liberdade - Norberto Bobbio: Liberalismo e Estado - Milton Friedman e a indivisibilidade da liberdade - Ludwig von Mises: cataláxia e mercado 4. Ação e História - Isaiah Berlin e a inevitabilidade histórica - Friedrich von Hayek: mercado e evolução social - Raymond Aron e a "crise moral" das democracias liberais Avaliação a) Prova em sala; b) Apresentação de seminário em grupo, com tema a ser escolhido na lista que segue: 1) Liberalismo e fim da História; 2) Indivíduo e Sociedade; 3) Ordem e Liberdade; 4) Ação e História. * O roteiro detalhado para a elaboração dos seminários será distribuído no primeiro dia de aula; ** A nota final corresponderá à média aritmética simples das atividades acima. Norma de Recuperação Prova escrita, em data a ser definida. 2 Bibliografia Obras de síntese BEDESCHI, G. Storia del Pensiero Liberale. Bari: Latenza, 1990. HABERMAS, J., RAWLS, J. Debate sobre Barcelona/Buenos Aires/México: Paidós, 1998. el liberalismo político. KOERNER, K. Liberalism and its Critics. Londres: Croom Helm, 1985. MERQUIOR, J.G. O Liberalismo - antigo e moderno. 3a ed. São Paulo: É Realizações, 2014. ROSANVALLON, P. 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