e-ISSN 2175-1803
Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional:
Os caminhos de ferro coloniais em Angola e Moçambique
(c. 1870 - c. 1915)1
Resumo
A partir de começos da década de 1870, Portugal iniciou nas
suas colónias ultramarinas um esforço de fomento
semelhante ao que vinha aplicando no território
metropolitano desde 1851. Até às vésperas da Primeira
Guerra Mundial, milhares de quilómetros de carris foram
assentes tanto em Angola como em Moçambique. Neste
artigo, pretendemos analisar este processo de
implementação tecnológica como produtor de uma nova
cultura material. Mostraremos que esta cultura material, que
espelhava as crenças metropolitanas de progresso assentes
na tecnologia, procurou influenciar as populações africanas
locais e as demais nações coloniais europeias. No final,
tentou contribuir para a implementação de uma identidade
nacional na África Portuguesa e para facilitar a colonização
económica e sobretudo cultural dos domínios ultramarinos
nacionais. Para atingir estes objetivos, recorreremos a fontes
textuais diversas (debates parlamentares, relatórios
técnicos, textos de diplomas legais) e a fontes iconográficas,
guardadas em diversos arquivos portugueses e estrangeiros.
Hugo Silveira Pereira
Doutor em História pela Universidade do Porto.
Investigador auxiliar no Centro Interuniversitário
de História das Ciências e da Tecnologia
(Universidade NOVA de Lisboa); Honorary
Visiting Fellow no Institute of Railway Studies
(Universidade de York).
Caparica - PORTUGAL
hugojose.pereira@gmail.com
orcid.org/0000-0002-7706-2686
Palavras-chave: Nacionalismo Tecnológico. Saint-simonismo.
Colonização. Iconografia.
Para citar este artigo:
PEREIRA, Hugo Silveira. Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os
caminhos de ferro coloniais em Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915). Tempo e
Argumento, Florianópolis, v. 11, n. 27, p. 221 - 254, maio/ago. 2019.
DOI: 10.5965/2175180311272019221
http://dx.doi.org/10.5965/2175180311272019221
* Nesse texto optou-se por manter a grafia da língua nativa (Língua Portuguesa - Portugal).
1
Financiado por Fundos Nacionais: bolsa de pós-doutoramento SFRH/BPD/95212/2013, decreto-lei 57/2016 e
lei 57/2017
Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 11, n. 27, p. 221 - 254, maio/ago. 2019.
p.221
Material culture, progress,
civilization and national identity:
Colonial railways in Angola and
Mozambique (c. 1870-c. 1915)
Tempo & Argumento
Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os caminhos de ferro coloniais em
Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
Hugo Silveira Pereira
Abstract
Since the early 1870s, Portugal applied in its overseas colonies a
developmental agenda like that employed in the metropolitan
territories since 1851. Up until the eve of World War I, thousands
of miles of rails were built both in Angola and Mozambique. In this
paper we aim to analyse this process of technological
implementation as a producer of a new material culture. We seek
to demonstrate that this material culture that reflected the beliefs
on progress through technology sought to influence the local
African populations and the several European colonial nations. In
the end it aimed to contribute to imprinting the national identity
in Africa and to facilitate the economical and mainly cultural
colonization of the Portuguese overseas domains. To achieve
these goals, we will analyse sundry primary textual sources
(parliamentary debates, technical reports, laws and decrees) and
iconographic material preserved in several archives in Portugal
and abroad.
Keywords: Technological Nationalism. Saint-Simonianism.
Colonization. Iconography.
1. Introdução
Não há como os factos materiais, complicados […] e incompreensíveis
aos espíritos sem cultura, […] que firam a imaginação do selvagem,
promovendo-lhe a admiração pela raça branca e o reconhecimento da
sua superioridade. Um revolver […], uma máquina a vapor […], um
caminho-de-ferro, o silvo e o movimento de uma locomotiva […]
produzem no indígena da África acção muito mais eficaz para os efeitos
do seu aperfeiçoamento intelectual, do que muitas missas e pregações
do mais virtuoso missionário – Joaquim José Machado, engenheiro (1879,
apud NAVARRO, 2018, p. 320).
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A partir da segunda metade do século XIX, a abertura de grandes sistemas
tecnológicos (redes ferroviárias, telegráficas, elétricas) foi um elemento marcante na
construção ocidental, indelevelmente influenciada pelo ideário saint-simoniano de
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progresso (LAAK, 2010; VAN DER VLEUTEN, 2006). Eles simbolizavam o desenvolvimento,
a bitola pela qual se media o valor civilizacional das diferentes nações (ADAS, 1989; ADAS,
2006; SCHOT;SCRANTON, 2014) e a excelência dos países do centro da Europa face ao
subdesenvolvimento das periferias (SIMÕES et al., 2003).
Nos territórios africanos e asiáticos, tecnologias como o quinino, os barcos a
vapor, o armamento, o telégrafo e os caminhos de ferro desempenharam um papel
fulcral na penetração, conquista e consolidação da presença europeia naquelas áreas e
sua aproximação ao centro europeu (HEADRICK, 1981). A já existente superioridade
técnica europeia foi reforçada e incentivou o domínio das regiões ultramarinas, sujeitas a
partir de então a um novo imperialismo (ADAS, 1989; HEADRICK, 2010).
Dentre estas tecnologias, a que nos interessa é o caminho de ferro, que, desde a
década de 1830 e graças à ação do engenheiro Michel Chevalier, se tornou um elemento
fulcral da ideologia saint-simoniana (VAN DER VLEUTEN, 2006; VAN DER VLEUTEN et al.,
2007), que tanto influenciou as elites técnicas portuguesas (MACEDO, 2012). A ferrovia, à
sua aptidão para transportar mercadorias e pessoas rapidamente e a longas distâncias,
aliava uma elevada capacidade simbólica e política de reforço da identidade nacional nos
locais onde era implementada, através da criação de uma nova cultura material (NYE,
1999; MACEDO, 2012; SARAIVA, 2007) – conceito que “emphasises how apparently
inanimate things within the environment act on people, and are acted upon by people,
for the purposes of carrying out social functions, regulating social relations and giving
symbolic meaning to human activity” (WOODWARD, 2007, p. 3).
Por exemplo, em Inglaterra, o caminho de ferro contribuiu para a formação da
identidade do rural Englishness (PAYNTON, 1996). Na Suíça, o túnel ferroviário de Saint
Gothard foi durante décadas “a symbol of the country’s independence” (SCHUELER,
2006, p. 82-87). No contexto colonial, a estação de Bombaim representava poder,
orgulho e a naturalização do sistema ferroviário imposto por Inglaterra ao território
(KERR, 2003). Nos domínios europeus em África, a ferrovia assumiu-se como instrumento
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determinante de afirmação de direitos de soberania e de europeização do território
(BLANCHARD;LEMAIRE, 2003; DIOGO, 2009; HALL, 2002; LEE, 1999).
Além de tudo isto, o caminho de ferro oferecia igualmente uma forte componente
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visual, que aliás justificou a atração que sempre exerceu sobre pintores e fotógrafos
(ADAS, 2006; SARAIVA, 2007). Hobsbawm descrevia-o como “o símbolo mais
espectacular desta era [século XIX]” (HOBSBAWM, 1979, p. 63), “por onde deslizavam
cobras com plumas de fumo à velocidade do vento” (HOBSBAWM, 1982, p. 66). No
contexto oitocentista português, o engenheiro Silva Costa opinava que “nada é mais
maravilhoso do que um trem voando […] sobre um caminho de ferro” (DIARIO DO
GOVERNO, 22 maio 1857, p. 690).
Estas
expressões,
além
de
demonstrarem
a
crença
nas
capacidades
desenvolvimentistas da tecnologia (em particular da ferrovia), evidenciavam o
sentimento de sublime técnico, o prazer retirado de observar uma máquina em
funcionamento, como símbolo máximo do triunfo tecnológico do Homem (KASSON,
1976), que, por sua vez, contribuía para a homogeneização de sociedades multiculturais
(NYE, 1999).
A construção de uma nova cultura material proporcionada pelos caminhos de
ferro refletia-se, por fim, na marca que deixavam na paisagem, transformando-a em
paisagem tecnológica. Este conceito foi analisado por Jackson e Nye e decorre do
entendimento segundo o qual a paisagem não é uma realidade natural, mas sim cultural,
com elementos humanos e não-humanos (LATOUR, 2004; MITCHELL, 2002) e inseparável
das tecnologias que configuram o território (JACKSON, 1984; NYE, 1999)2.
Nesta conceptualização epistemológica, a fotografia desempenhou um papel
fundamental, “a connective tissue between humanity and world”, já que a paisagem “as
a social practice has […] vested much of its fate in photographic reproduction” (KELSEY,
2016, p. 71, p. 90). A fotografia, além de fundamental na exploração do continente
2
Ver, para os casos concretos das linhas do Douro e Tua, em Portugal: MACEDO, Marta Coelho de. Projectar
e construir a nação: engenheiros e território em Portugal. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2012;
SPERO, Ellan; PEREIRA, Hugo Silveira. The Tua Valley in transition, symbol and technological landscape.
Cultura, Espaço e Memória, Porto, n. 7, p. 223-241, 2016.
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africano (MARTINS, 2012), e na imposição de uma ideologia colonial (MATOS, 2016), foi
também decisiva para construir paisagens tecnológicas, divulgar o sublime técnico (NYE,
1999), tornar visível um “novo território racional, ordenado e produtivo” (MACEDO, 2012,
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p. 307) e constituir uma “iconography of nationhood” (OSBORNE, 1988).
Neste artigo pretendemos laborar sobre estes conceitos e demonstrar de que
forma o caminho de ferro foi utilizado na África Portuguesa como promotor da
identidade nacional através do fomento de uma cultura material, ao serviço do esforço
imperialista português, no período compreendido entre os primeiros esforços de
fomento no ultramar (c. 1870) e as vésperas da Primeira Guerra Mundial, prosseguindo na
senda de trabalhos recentes sobre esta matéria (DIOGO, 2009; DIOGO;LAAK, 2016;
DIOGO;NAVARRO, 2018; NAVARRO, 2018), que realçaram o papel da tecnologia
(ferroviária e não só) e dos engenheiros portugueses no processo colonizador luso.
Pretendemos ainda contribuir para uma caracterização da mentalidade portuguesa da
época, tendo em conta que uma sociedade não pode ser interpretada sem consideração
pelos seus objetos materiais e que as suas formas distintivas são caracterizadas pela sua
própria cultura material (DANT, 1999). Recorreremos para tal a discursos parlamentares,
relatórios, pareceres, e preâmbulos de leis redigidos por engenheiros e políticos e ainda a
fotografias da construção e da operação ferroviárias guardadas em arquivos portugueses
e estrangeiros.
Deste modo, iremos privilegiar necessariamente as perceções dos agentes
metropolitanos portugueses. Com isto não queremos, porém, insinuar que o projeto
colonialista luso foi aceite passivamente pelas populações nativas. Pelo contrário, a
resistência à presença do colono português em África foi real e intensa, como bem o
demonstram as diversas guerras que opuserem ambas as partes durante os séculos XIX e
XX (PÉLISSIER, 2004). Aliás, urge na historiografia ouvir as vozes nativas preservadas
tanto nos arquivos coloniais como nos arquivos africanos e analisar as suas próprias
representações sobre a colonização3. Neste sentido, reconhecemos que o estudo que
agora apresentamos peca por não incluir tais vozes. No entanto, tendo em conta o
3
Veja-se, para um exemplo metodológico: BASTIAN, Jeannette Allis. Reading Colonial Records Through an
Archival Lens: The Provenance of Place, Space and Creation. Archival Science, Dordrecht, v. 6, p. 267-284,
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estado presente da nossa investigação, a nossa facilidade de acesso aos arquivos
ultramarinos europeus e a própria natureza deste tipo de artigos (de dimensão
necessariamente reduzida), focar-nos-emos apenas na visão portuguesa e metropolitana
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Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os caminhos de ferro coloniais em
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sobre aqueles processos (realçando o papel da ferrovia), abrindo, porém, a porta para
novas pesquisas que incluam as visões nativas sobre o mesmo objeto histórico.
2. A estratégia ferroviária nacional para as colónias
Considerando que neste momento […] as nações mais poderosas se
mostram empenhadas em abrir ao commercio de todo o mundo as
regiões maravilhosas da Africa Central, é indispensavel que sem perda de
tempo ponhamos o remate a esta obra do caminho de ferro de
[Ambaca]. – Pinheiro Chagas, ministro da Marinha e Ultramar (1884,
COLLECÇÃO OFFICIAL DE LEGISLAÇÃO PORTUGUEZA, 1884, p. 535, itálico
nosso).
A partir de inícios da década de 1870, Portugal tomou as primeiras medidas para
estabelecer serviços de obras públicas ultramarinos e assim aplicar um programa de
melhoramentos materiais, baseado no paradigma europeu que privilegiava a técnica e a
ciência modernas, nos seus domínios africanos. Nas décadas seguintes, seriam
construídos milhares de quilómetros de caminhos de ferro em Angola (linhas de Ambaca,
Moçâmedes e Benguela) e Moçambique (Lourenço Marques, Beira, Suazilândia,
Quelimane, Xai-Xai e Inhambane), sendo muitos outros projetados, mas nunca
construídos4 .
Um dos objetivos subjacentes ao projeto ferroviário era modernizar o sistema de
transportes colonial e explorar as imaginadas riquezas do sertão, respondendo ao mito
do Eldorado (ALEXANDRE; DIAS, 1998), na promoção de uma cultura mais materialista
que material. Desta operação, esperava-se a geração de um tráfego suficiente que
redundaria na recuperação do investimento feito. Era, aliás, a aplicação do modelo usado
por outras nações coloniais desde 1850 e intensificado a partir de 1870 (DAY, 1963;
4
Para a história das ferrovias construídas no período colonial em Angola e Moçambique, ver: NAVARRO,
Bruno J. Um império projectado pelo «silvo da locomotiva»: o papel da engenharia portuguesa na
apropriação do espaço colonial africano Angola e Moçambique (1869-1930). Lisboa: Colibri, 2018.
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DIVALL, 2009; HEADRICK, 1981; KERR, 2007) e também a forma matricial da própria
estratégia de investimento portuguesa (ALEGRIA, 1988).
Em 1876, o ministro do Ultramar, Andrade Corvo, evocava as “riquezas naturaes
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do solo” e a “grandeza quasi illimitada das forças produtivas” dos domínios africanos
para justificar a construção de um caminho de ferro de Luanda ao interior (DIARIO DA
CAMARA DOS DEPUTADOS, 2 março 1876, p. 503). A Sociedade de Geografia de Lisboa,
uma das principais promotoras do fomento colonial (GUIMARÃES, 1984), confirmava que
tal empreendimento, “sob o ponto de vista do emprego de capitaes, parece […] uma
empreza não só em extremo viavel, mas de lucros certos e importantes” (COMISSÃO
AFRICANA, 1882 p. 143-170). Anos mais tarde, um outro titular da pasta colonial, Ressano
Garcia, descrevia a “riquissima região que a Companhia de Moçambique tem de
explorar”, como justificativo para lhe ceder várias isenções para construir uma ferrovia
(LEGISLAÇÃO…, 1895-1908, vol. 1, 389.). Estas miríficas expectativas não se
concretizaram, embora seja inegável que os caminhos de ferro introduziram francas
melhorias nos transportes coloniais, com impacto direto sobre o aumento dos volumes
transportados e sobre o desenvolvimento de produções locais.
Em Angola, quando a linha de Ambaca atingiu 150 km de extensão (1890),
transportou pouco menos de 3.000 t de mercadorias. Mas em 1909, quando chegou a
Malange, já carregava quase 28.000 t (CAMINHOS DE FERRO, LUANDA, 1912; CAMINHOS
DE FERRO, MALANGE, 1907-1909; CAMINHOS DE FERRO, LUANDA, AMBACA, MALANGE E
MORMUGÃO…, 1905-1916; CAMINHOS DE FERRO, MALANGE, MAPAS ESTATÍSTICOS…,
1912; CAMINHOS DE FERRO, MALANGE E MOÇÂMEDES…, 1907-1916; MISCELÂNEA,
CAMINHOS DE FERRO, S. TOMÉ…, 1888-1914; ESTATÍSTICA…, 1913). Mais a sul, em
Moçâmedes, as cerca de 1.000 t transportadas no ano da inauguração dos primeiros 73
km (1907) cresceram para 64.000 t em 1914, altura em que a linha já se internava 147 km
na região (CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1910-1916; CAMINHOS DE FERRO,
MOÇÂMEDES, 1906-1908; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1913-1917; CAMINHOS DE
FERRO, MOÇÂMEDES, 1909-1910; CAMINHOS DE FERRO, LUANDA, 1902-1920; CAMINHOS
DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1907-1914; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, RECEITA…,
1913; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, RECEITA…, 1904-1908; MISCELÂNEA,
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CAMINHOS DE FERRO, S. TOMÉ…, 1888-1914; ESTATÍSTICA…, 1913; PEREIRA, 2018b). Os
primeiros números da linha de Benguela indicam um volume de cerca de 21.000 t
transportadas no primeiro ano de operação (1909 com 197 km). Quatro anos e 163 km
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depois a carga era já de 47.500 t (MISCELÂNEA, DIRECÇÃO…, 1889-1923; MISCELÂNEA,
CAMINHOS DE FERRO, S. TOMÉ…, 1888-1914). Este aumento na capacidade de transporte
permitiu o desenvolvimento de alguns negócios locais ligados ao café (em Ambaca),
minério (Moçâmedes) e borracha (Benguela).
Estes números refletiram-se parcialmente no movimento da alfândega que entre
1888 e 1913 subiu de cerca de 6.500 para 12.500 contos, com picos de 15.000 e 18.250
contos em 1899 e 1910 (MESQUITA, 1918).
Em termos de transportes de passageiros, as linhas contribuíram também para
uma maior mobilidade no território. Em Benguela, o número de viajantes duplicou de
30.000 para 60.000 nos anos indicados, enquanto em Moçâmedes o crescimento foi de
400% de 4.000 para 20.000. Ambaca foi uma exceção, tendo a evolução de movimento
acompanhado o ritmo do assentamento da via; assim que este parava, o movimento de
passageiros – leia-se trabalhadores – ressentia-se (CAMINHOS DE FERRO, LUANDA, 1912;
CAMINHOS DE FERRO, MALANGE, 1907-1909; CAMINHOS DE FERRO, LUANDA, AMBACA,
MALANGE E MORMUGÃO…, 1905-1916; CAMINHOS DE FERRO, MALANGE, MAPAS
ESTATÍSTICOS…, 1912; CAMINHOS DE FERRO, MALANGE E MOÇÂMEDES…, 1907-1916;
CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1910-1916; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES,
1906-1908; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1913-1917; CAMINHOS DE FERRO,
MOÇÂMEDES, 1909-1910; CAMINHOS DE FERRO, LUANDA, 1902-1920; CAMINHOS DE
FERRO, MOÇÂMEDES, 1907-1914; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, RECEITA…, 1913;
CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, RECEITA…, 1904-1908; ESTATÍSTICA…, 1913;
MISCELÂNEA, CAMINHOS DE FERRO, S. TOMÉ…, 1888-1914; MISCELÂNEA, DIRECÇÃO…,
1889-1923).
Contudo, em termos de investimento financeiro, os resultados ficaram muito
aquém do desejado: as companhias que exploravam as linhas de Ambaca e Benguela
viviam em constantes dificuldades pecuniárias e a exploração dos caminhos de ferro de
Moçâmedes e Malange pelo Estado acumulava défices (NAVARRO, 2018).
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Em Moçambique, verificou-se algo semelhante, mas com alguns cambiantes. A
linha de Lourenço Marques, que, nos primeiros dez anos de exploração (1889-1898) fez
uma modesta média anual de 41.000 t, atingiu um volume recorde superior a 1.000.000 t
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em 1913 (registando evolução idêntica em termos de transporte de passageiros), graças
sobretudo ao ouro das minas do Transval. Em consequência, tornou-se um dos
empreendimentos mais lucrativos em todo o sector ferroviário nacional (MISCELÂNEA,
CAMINHOS DE FERRO, S. TOMÉ…, 1888-1914: QUESTÃO…, 1887-1918; ESTATÍSTICA…,
1913; BOUENE; SANTOS, 2006). Sobre a linha da Beira não existem dados seguros sobre a
sua operação, uma vez que ela foi assegurada por uma companhia britânica que
praticamente não partilhava informações estatísticas com as autoridades portuguesas
(NAVARRO, 2018). Contudo, o seu efeito sobre as províncias de Manica e Sofala está bem
patente nos dados da alfândega da Beira, cujo movimento comercial passou de 192
contos em 1892, ano do início da construção da linha, para 133.000 contos em 1914, 14
anos depois de a linha estar completa (BOLETIM DA COMPANHIA DE MOÇAMBIQUE,
1893-1910; BOLETIM DO GOVERNO DO TERRITÓRIO DA COMPANHIA DE MOÇAMBIQUE,
1911-1915; BOLETINS ESTATÍSTICOS DO MOVIMENTO COMERCIAL E MARÍTIMO NO
TERRITÓRIO DE MANICA E SOFALA; 1908-1909; BOLETINS ESTATÍSTICOS DO
MOVIMENTO COMERCIAL E MARÍTIMO NO TERRITÓRIO DA COMPANHIA DE
MOÇAMBIQUE, 1910; PEREIRA, 2019). O impacto dos demais caminhos de ferro
moçambicanos foi mais reduzido em virtude da sua curta extensão, pobreza das regiões
atravessadas e caráter inteiramente provincial, não se ligando às colónias vizinhas
(NAVARRO, 2018).
Além deste objetivo eminentemente económico-comercial, Portugal procurava
ainda com a construção de caminhos de ferro em África atingir fins políticos e de
“regeneração espiritual” (para usar a expressão de NYE, 1999, p. XX), que são, aliás, os
que mais interessam neste estudo: construir uma cultura material de matriz tecnológica,
que legitimasse a sua presença nas colónias africanas, respondendo ao mito da herança
sagrada (ALEXANDRE; DIAS, 1998), imprimisse a identidade nacional em espaços
longínquos e civilizasse os povos autóctones.
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3. O caminho de ferro como cultura material e promotor do ideário europeu
de civilização e progresso
Se trouxermos a uma estação de caminho de ferro o homem menos
civilisado, menos culto, um hottentote, ou um cannibal, e lhe
mostrarmos uma locomotiva, emblema da magestade industrial,
producto admiravel das artes mechanicas, ser quasi pensante, este
homem enthusiasmou-se necessariamente pelos caminhos de ferro, e o
seu primeiro desejo é levar esses caminhos para a sua terra. – Belchior
Garcês, deputado (1860, DIARIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS, 23
março 1860, p. 249).
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A ideia de usar o caminho de ferro como instrumento de apropriação territorial
das colónias (“through a repetitive and consistent use of an area by a certain person or
group who, at least to some extent, perceive this area as their own”, de acordo com a
definição de Kärrholm (2012, p. 16; p. 137-138) decorria de esforço semelhante realizado na
metrópole desde 1850 e replicava o modelo usado por outras nações coloniais, como
vimos. Na retórica parlamentar, técnica e jornalística que acompanhou esta agenda
tecnológica, tanto no que se referia às metrópoles europeias como às colónias, os termos
progresso/prosperidade e civilização eram amiúde mencionados (HEADRICK, 1981).
Por exemplo, na década de 1870, o Colonial Office britânico, ponderando uma
possível tomada de posse do distrito de Lourenço Marques de mãos portuguesas,
considerava que uma ferrovia no território contribuiria “enormously to the civilisation of
Eastern Africa” (ELTON, 17 julho 1875, p. 3). O Tesouro inglês estava igualmente convicto
de que tal linha
could not fail to ensure the prosperity if the new Province [Lourenço
Marques] [was] added to Her Majesty’s Dominions and promote the
happiness and welfare of its inhabitants and would thus aid in the work
of civilizing the populations of South Africa (BREWER, 5 fevereiro 1878).
Em Portugal, igual fé estava bem expressa no decreto de 1 de dezembro de 1869,
que reformava a administração ultramarina e, numa “techno-scientific view of progress”
(DIOGO; LAAK, 2016, p. 149), associava o desenvolvimento e a civilização das colónias à
implementação de melhoramentos materiais, designadamente as vias de comunicação
que encurtavam a distância para a metrópole (NAVARRO, 2018).
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Esta representação perdurou ao longo de todo o período analisado. Em 1883,
Andrade Corvo mantinha que “a civilização moderna [e] todo o progresso moral e
material depende das fáceis comunicações; das estradas, dos caminhos de ferro, dos
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Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os caminhos de ferro coloniais em
Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
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telégrafos eléctricos” (apud NAVARRO, 2018, p. 77). Em 1890, no parlamento, o deputado
Alberto Pimentel classificava o caminho de ferro de “fiscal da civilização” (DIARIO DA
CAMARA DOS DEPUTADOS, 24 julho 1890, p. 1484). No final do século, os engenheiros e
jurisconsultos reunidos na Junta Consultiva do Ultramar, órgão consultivo do Ministério
da Marinha e Ultramar (responsável pela gestão das colónias), ao analisar a linha de
Moçâmedes, entendiam que esta contribuiria igualmente “para a grande empreza da
civilisação da Africa” (JUNTA CONSULTIVA DO ULTRAMAR, 10 agosto 1899). Por fim, em
1901, o capitão de engenheiros, Henrique César da Silva Barahona e Costa, acreditava que
a questão das obras publicas […] não só tem alta importancia
economica, mas principalmente se pode considerar uma questão politica,
porque d’ella deriva o engrandecimento da nação, o crescimento da
riqueza publica e o progresso da civilização (COSTA, 1901, p. 429, itálico
nosso).
A imposição de uma cultura material através dos caminhos de ferro no sentido de
trazer o progresso e a civilização a África fez-se num duplo sentido, tendo em conta (1) a
própria nação portuguesa e sua relação com as demais nações coloniais da Europa e (2)
os povos africanos.
3.1. O caminho de ferro como garante da soberania nacional no Ultramar
Além de levar o progresso e a civilização aos confins de África, a ferrovia teria o
condão de transportar Portugal da periferia tecnológica para o seu centro. Ao construir
caminhos de ferro nas paisagens africanas e ali consolidar a presença de uma cultura
material e tecnológica, Portugal equiparava-se às nações do centro europeu que desde
1850 vinham fazendo o mesmo nas suas próprias colónias. Isto mesmo fica demonstrado
no excerto do decreto de 10 de dezembro de 1884 com que abrimos o capítulo 2 deste
artigo. No preâmbulo ao diploma, Pinheiro Chagas lembrava a urgência em construir o
caminho de ferro de Ambaca uma vez que “os importantes problemas da civilização
Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 11, n. 27, p. 221 - 254, maio/ago. 2019.
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africana” eram uma questão com que “hoje toda a Europa culta se preoccupa”
(COLLECÇÃO OFFICIAL DE LEGISLAÇÃO PORTUGUEZA, 1884, p. 535, itálico nosso). Nas
entrelinhas ficava implícito que só os povos incultos, atrasados e periféricos não se
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Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
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preocupavam com a civilização de África. O carácter periférico era considerado injurioso e
conduzia a um sentimento de exclusão (com uma significância cultural e simbólica e não
apenas económica) e a uma necessidade de ligação ao centro (SHILS, 1975; SWARTZ,
1997).
Simultaneamente, a ferrovia era igualmente considerada uma das melhores
soluções para competir com as demais nações coloniais europeias no scramble for Africa
(PAKENHAM, 2011) e assim contrariar as suas ambições expansionistas e a sua cobiça
sobre os domínios ultramarinos nacionais. Após a conferência de Bruxelas (1876) e
sobretudo após a de Berlim (1884-1885), a implementação de caminhos de ferro nas
colónias portuguesas de África foi visto como o meio mais eficaz de solidificar a ocupação
efetiva e, consequentemente, a soberania nacional sobre aqueles territórios africanos
(DIOGO, 2009).
As ambições internacionais, sobretudo as britânicas, ficam bem patentes num
editorial publicado no The Railway Times em 1881, que reforça também o caráter
civilizador do caminho de ferro. Naquele diário, podia ler-se que
it must be borne in mind that Africa cannot any longer be neglected by
them [os portugueses], as all the European nations have now
commenced to diffuse the light of civilization over the face of that «dark»
continent (THE RAILWAY TIMES, 5 novembro 1881, p. 1041).
No ano seguinte, quase como que em resposta ao texto britânico, a Sociedade de
Geografia de Lisboa emitia um parecer sobre o projetado caminho de ferro de Luanda a
Ambaca, considerando-o precisamente “a mais solene […] garantia de soberania e de
ocupação civilizadora” (AMARAL, 1882, p. 3).
Esta preocupação acentuou-se nos anos imediatamente a seguir ao Ultimato
Britânico de 1890, pelo qual Inglaterra exigiu a retirada das forças portuguesas dos
territórios entre Angola e Moçambique, sob pena de corte de relações diplomáticas. Na
reformulação da estrutura de administração de Moçambique, surgida por decreto de 30
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de setembro de 1891 e em resposta àquele incidente diplomático (NAVARRO, 2018; ver
também DIOGO; LAAK, 2016), o ministro da Marinha e Ultramar, Júlio de Vilhena, via no
caminho de ferro uma das melhores formas de confirmar a presença nacional em
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Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
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Moçambique e ali reforçar a vocação colonial da nação. No preâmbulo ao diploma o
ministro era claro:
accusados perante o mundo de povo inerte e sem aptidão colonizadora
[…], precisâmos mostrar que não nos fallece a coragem para os
emprehendimentos grandiosos, nem se nos entibia o animo para operar
a grande obra da nossa restauração colonial (COLLECÇÃO OFFICIAL DE
LEGISLAÇÃO PORTUGUEZA, 1891, p. 555).
Para o fazer, era mister ligar os diversos portos moçambicanos (Lourenço
Marques, Beira, Quelimane, Inhambane, Tungue ou Pemba) por caminho de ferro até ao
sertão. Assim que este ambicioso projeto se concretizasse, “ninguém nos poderá
contestar a soberania da África oriental” (COLLECÇÃO OFFICIAL DE LEGISLAÇÃO
PORTUGUEZA, 1891, p. 555).
Igual prevenção se estendia à contracosta. Sobretudo “hoje, que se põe em
duvida o nosso dominio em alguns pontos de Africa […], urge que tratemos de construir
linhas ferreas” (DIAS, 1890, p. 75) – escrevia o engenheiro Pereira Dias –, como, por
exemplo, o caminho de ferro de Moçâmedes ao Lubango, considerado pela Junta
Consultiva do Ultramar “mais uma evidente e irrecusavel affirmação da soberania de
Portugal” na região (JUNTA CONSULTIVA DO ULTRAMAR…, 10 agosto 1899).
Contudo, este potencial identitário do caminho de ferro podia ser posto em causa
se a sua implementação fugisse ao controlo nacional, uma questão que nunca foi muito
bem resolvida pelas autoridades nacionais.
A vida da linha de Ambaca, por exemplo, ficou sempre marcada pela influência dos
obrigacionistas ingleses da companhia que a construíra e operava. Uma vez que o
caminho de ferro não produzia rendimento suficiente para pagar os juros das obrigações,
os obrigacionistas, nos termos do contrato, podiam tomar conta da propriedade da linha.
Nesta situação o caminho de ferro, poderoso instrumento de soberania nacional, poderia
desempenhar o papel oposto e transformar-se numa ameaça a essa mesma soberania.
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Para o evitar, os sucessivos governos tomaram diversas medidas que garantiam o
pagamento dos juros dos títulos de dívida (GUIMARÃES, 1983).
O caminho de ferro da Beira tornou-se um caso paradigmático desta situação. A
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linha fora construída, no rescaldo do Ultimato, por uma companhia britânica,
praticamente sem qualquer supervisão das autoridades portuguesas (NAVARRO, 2018).
Em 1896, o oficial do Exército português, Aires Ornelas, ao escoltar um corpo militar
britânico à Rodésia (atual Zimbabwe), descrevia o caminho de ferro em tons
deprimentes: na exploração, falava-se inglês; as medidas usadas eram as imperiais (pé,
jarda, milha); a maior parte das terras limítrofes à via pertencia a britânicos. A ferrovia era
“verdadeira via dolorosa desde a Beira á fronteira”. A situação era intricada, pois, se por
um lado, se antevia “difficil tornar de facto portugueza uma região que hoje apenas o é
no nome” (ORNELAS, 1896, p. 264), por outro lado, a companhia inglesa contribuía para o
desenvolvimento comercial da província (como vimos), não sendo portanto boa política
“pôr entraves ao que no fundo está facilitando o commercio e a civilisação de Africa”
(COPIA…, p. 176).
Por estas razões, na década de 1890, o reforço da soberania passou a ser um
argumento muito frequentemente trazido à colação sempre que um empreendedor ou
um ministro requeria autorização ao parlamento para construir um caminho de ferro em
qualquer parte do Império português (A QUESTÃO…, 1912, p. 17; AREZ, 5 março 1911;
BALEN, 5 dezembro 1890; DOCUMENTOS…, 1912, p. 18-25; LIMA, 17 julho 1914;
PORCHERON; VORSTER, 9 maio 1891; NAVARRO, 2018). Pelas mesmas razões, no início do
século XX, os negócios em torno das concessões das linhas de Benguela e Suazilândia
envolveram-se em polémica precisamente por abrir as colónias à interferência britânica.
O então ministro da Marinha e Ultramar, Teixeira de Sousa, recorreu ao expediente de
exigir verbas exorbitantes como depósitos de garantia para afastar os interessados.
Porém, se o empreendedor australiano interessado na linha da Suazilândia, Walter
“Karri” Davies, quando confrontado com a proposta do ministro, “hardly believed his
own ears” (LANSDOWNE, 28 fevereiro 1903; PEREIRA, 2017), o escocês Robert Williams,
interessado na linha de Benguela, cobriu a aposta de Teixeira de Sousa e depositou 100
mil libras para garantir a concessão do caminho de ferro (NAVARRO, 2018;). De facto, a
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situação nunca foi efetivamente resolvida e o potencial apropriador do caminho de ferro
podia ser perfeitamente contraproducente se deixado sob controlo estrangeiro.
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3.2. O caminho de ferro como instrumento da civilização do negro
Se bem que os objetivos de levar a civilização e o progresso a África, através do
caminho de ferro, fosse um fim em si mesmo (e a tecnologia incorporasse integralmente
aqueles dois conceitos), entendia-se na altura que a ação da ferrovia devia estender-se
em particular à civilização do africano.
Nos contextos francês e inglês, África era vista como a ausência de civilização e os
seus habitantes como criaturas obtusas, sem ambição nem espírito de iniciativa,
incompreensivelmente alheados do sistema económico capitalista ocidental. A certeza da
superioridade dos europeus era combinada com um sentido de responsabilidade para
com as raças nativas tendo em vista a sua educação de acordo com os ideais europeus
(CANNADINE, 2002; HALL, 2002; LEMAIRE; BLANCHARD, 2003).
Os portugueses partilhavam desta ideologia, considerando o negro um ser
inferior, incapaz de potenciar os recursos do seu próprio continente. Só os brancos o
podiam fazer, sendo, portanto, indispensável a sua presença em África, “sem a qual a
prosperidade de qualquer colonia, e a propria civilisação do continente africano não é
possivel” (JUNTA CONSULTIVA DE OBRAS PÚBLICAS E MINAS, 1890, p. 324) – concluía a
Junta Consultiva de Obras Públicas em 1890. Na visão dos colonizadores portugueses, ao
negro, restava apenas o papel passivo de ser civilizado, pela religião, pela instrução, pelas
armas, mas sobretudo pelo trabalho e pela tecnologia (JERÓNIMO, 2015). Aliás, a própria
religião tentou apropriar-se da tecnologia, sobretudo nos momentos inaugurais das linhas
nos quais se ligava o progresso, tendo também a tecnologia atribuído a si própria algumas
facetas moralizantes e indutoras de omnipotência, devoção e reverência normalmente
associados à religiosidade (NOBLE, 1997. NYE, 1999. PEREIRA, 2018a).
De qualquer modo, a expectativa do uso do caminho de ferro como ferramenta de
instrução, educação e civilização do africano está bem patente, por exemplo, nos escritos
de Joaquim José Machado, o autor da citação com que abrimos este artigo e um dos
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principais protagonistas da aventura ferroviária nacional em África (NAVARRO, 2018).
Ainda na década de 1870, este engenheiro arguia que no “século do vapor e da
electricidade, a Europa não deve empregar para civilizar a África os processos seculares
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das sociedades antigas”. A solução era outra, de cariz material e tecnológico:
muitos quilómetros de estradas e vias férreas é o que as nações cultas
têm a fazer na África […] para terminarem a escravidão da raça negra,
promover o seu aperfeiçoamento moral e intelectual, e aproveitar as
consideráveis riquezas naturais de tão extenso território (MACHADO
apud NAVARRO, 2018, p. 320).
Esta retórica encontrava eco na imprensa da especialidade. Num número de 1905
da Gazeta dos Caminhos de Ferro, publicada quinzenalmente em Portugal, afirmava-se que
as estações ferroviárias e as casas de guarda são mais eficazes para a
pacificação e domínio do que os fortes e redutos militares […]. Não
afugentam o indígena, atraem-no. Não o castigam, educam-no,
aumentando-lhe o bem-estar, valorizam-lhe a sua riqueza, civilizam-no
(apud NAVARRO, 2018, p. 463).
As estações representavam no século XIX aquilo que as catedrais configuravam
em séculos anteriores (FAITH, 1991). Eram estruturas retóricas, demonstrando o poderio
dos seus construtores (NYE, 1999; PEREIRA, 2018a). A importância da sua imponência
visual foi um fator preponderante, por exemplo, na decisão de construir uma nova gare
em Lourenço Marques, nos inícios do século XX. Muito embora a decisão se ficasse
também a dever a questões logísticas (ligadas ao aumento do movimento na linha),
respondia igualmente a quesitos de “decoro nacional”: a antiga estação era “verdadeiro
ponto negro” na cidade, que “desprestigiava Portugal, «perante nacionais e
estrangeiros», contrastando flagrantemente com estações congéneres” da África do Sul.
Pelo contrário, a nova gare (figura 1) apresentava uma “imponência majestática” e
“«certa grandeza de linhas como convém a obra tão importante»” (NAVARRO, 2012, p.
174, p. 178). A estação terminal de Moçâmedes, na cidade com o mesmo nome, embora
não tão imponente como a de Lourenço Marques, transmitia de igual modo a solidez,
austeridade e funcionalidade que o caminho de ferro prometia (figura 2).
Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 11, n. 27, p. 221 - 254, maio/ago. 2019.
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Figura 1 – Estação de Lourenço Marques em 1922
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Fonte: LIMA, 1971, v. 1, p. 39
Figura 2 – Estação de Moçâmedes, em construção, em 1910
Fonte: CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1910-1916
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Contudo, o próprio progresso material tinha uma forte componente moral: o
caminho de ferro era percecionado como um influente instrumento civilizador, um
“desinfectante e um purificador moral”, do qual fugiam “todos os maus preconceitos,
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todas as reacções, toda a ignorância e a indolência, o crime e o vício” (Pedro Romano
Folque, engenheiro fiscal da linha de Ambaca, apud NAVARRO, 2018, p. 279).
Esta ação civilizadora era sobretudo executada através do trabalho e na obrigação
de labor imposta aos nativos. Na linha de Moçâmedes, por exemplo, “obrigar os Cumatos
a dar braços para a construcção do caminho-de-ferro […] hade concorrer para a sua
civilisação” (OSÓRIO, 30 setembro 1907) – aconselhava o seu diretor de construção. Era
assim imperativo e parte da missão civilizadora do caminho de ferro
fazer trabalhar aquele que não tem necessidades criadas, a quem a
natureza fornece gratuitamente os meios de subsistência, a quem, enfim,
a indolência e o alcoolismo mantinham num completo estado de
embrutecimento (relatório da Companhia do Caminho de Ferro Através
de África, concessionária da linha de Ambaca, apud NAVARRO, 2018, p.
276).
Figuras 3 e 4 – A instrução do negro pelo trabalho: aspetos da construção das linhas da Beira e de
Moçâmedes
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Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os caminhos de ferro coloniais em
Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
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Fontes: BAXTER, 1998; CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1906-1908
O uso das linhas era também apresentado como terapêutica para a instrução do
indígena. Citando novamente como exemplo a linha de Moçâmedes, a Junta Consultiva
do Ultramar recomendava a criação de uma tarifa diferenciada, mais baixa, para o nativo
para que este, “rude e ignorante, se habitue e affeiçoe a ser transportado em caminhode-ferro” (JUNTA CONSULTIVA DO ULTRAMAR…, 4 março 1907). Esperava-se assim que
no médio/longo prazo, tudo isto contribuísse para a educação dos povos africanos, que,
por sua vez, permitiria “preferir á guerra de exterminio contra os indigenas o instrumento
economico do seu progresso e civilização” (CURTO, 26 janeiro 1905). Aliás, foi para obstar
às revoltas e motins de Angola a partir de 1910 (PÉLISSIER, 1986) que se impôs a
satisfação da “imperiosa necessidade de levar por meio de caminho de ferro a acção
civilizadora àquelas isoladas e remotas paragens” (DOCUMENTOS…, 1912, p. 18-25).
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4. Cultura material e paisagem tecnológica
Em cada uma das fotografias do Douro torna-se possível ler uma
paisagem tecnológica e científica recém-construída, uma tecnologia
moderna de representação e o projecto de construção da imagem da
nação oitocentista (MACEDO, 2012, p. 309).
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Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os caminhos de ferro coloniais em
Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
Hugo Silveira Pereira
O papel do caminho de ferro na promoção de uma cultura material em África
deixou também marcas profundas na paisagem africana. Cortada a partir de então por
carris, pontes, viadutos, estações, locomotivas e carruagens, que lhe emprestavam uma
parte do seu sublime, a paisagem assumiu laivos de paisagem tecnológica.
No século XIX e inícios do século XX, a tecnologia não era encarada como uma
violação da natureza ou da paisagem, mas sim como uma sua extensão. Ao se
construírem paisagens tecnológicas, entendia-se que a natureza era dominada e deixaria
de pertencer aos selvagens que a não sabiam aproveitar (NYE, 1999).
Fotografias da época contribuíram para a solidificação e divulgação desta
transformação e para a construção de um retrato demonstrativo do esforço que Portugal
fazia para civilizar África. Permitem ainda ilustrar alguns aspetos determinantes das
paisagens tecnológicas e analisar as representações coevas que acarretavam (ver figuras
5 a 10).
Figura 5 – Locomotiva sobre a ponte de Chicongene em 1887
Fonte: McMURDO; FOWLER, 1887
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p.240
Figura 6 – A linha da Beira na floresta de Amatongas (década de 1890)
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Fonte: O TERRITORIO…, 1902
Figura 7 – Toma de água e máquina na linha de Moçâmedes (1907)
Fonte: CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1906-1908
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Figura 8 – Acampamento no caminho de ferro de Moçâmedes (1908)
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Fonte: CAMINHOS DE FERRO, MOÇÂMEDES, 1906-1908
Figura 9 – O viaduto do Lengue na linha de Benguela (1906)
Fonte: THE RAILWAY TIMES, 30 março 1907, 329-332
Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 11, n. 27, p. 221 - 254, maio/ago. 2019.
p.242
Figura 10 – Locomotiva sobre a ponte Comandante Álvaro Machado no desfiladeiro do Lengue na
linha de Benguela (década de 1930)
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Fonte: BENGUELA…, 1960
As fotos analisadas têm dois aspetos em comum. Em primeiro lugar, em todas elas
o caminho de ferro é representado como se albergado na perfeição pela paisagem. A
partir de certa altura e noutros contextos, a fotografia foi usada na construção de uma
representação quintessencial da natureza, “as though human civilization did not exist”
(KELSEY, 2016, p. 81-90). Não era este o caso analisado. A tecnologia era publicitada, não
como invadindo um espaço virginal, mas sim imiscuindo-se naturalmente na paisagem.
Em segundo lugar, a paisagem é apresentada na sua parte mais agreste e inóspita,
enaltecendo assim a capacidade da ferrovia para vencer os obstáculos mais difíceis,
domesticar a natureza e civilizar África. As figuras 6 e 7 são particularmente elucidativas
deste aspeto: na primeira, a via-férrea é captada a entrar corajosamente na densa floresta
de Amatongas, ao passo que na segunda a locomotiva aparece como único elemento vivo
numa paisagem desértica.
Deste modo, passado e futuro eram ligados entre si, demonstrando o que era e o
que viria a ser: o passado representado pela paisagem selvagem ou árida de África; o
futuro pela locomotiva ou pelas pontes metálicas. A fotografia assumia-se assim como “a
way of moving into the future by reorienting oneself to the past […], a way to proclaim
the emergence of a new sensibility about history and its consequences” (KELSEY, 2016, p.
80).
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p.243
Outro detalhe importante respeita à coexistência de elementos humanos e nãohumanos na paisagem, embora algumas das fotografias retratem apenas o elemento
técnico (figura 10). A inclusão de figuras humanas junto das suas criações tecnológicas,
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além de servir de escala para medir a grandeza das novas infraestruturas, identificava os
seus autores e elevava-os à categoria de pontas de lança do progresso. Um olhar mais
cuidado denota que as figuras humanas estão rigorosamente a posar para a fotografia.
Não estão no seu quotidiano laboral, mas simplesmente a marcar presença como
responsáveis pelo novo elemento material da paisagem.
Tudo isto ia ao encontro e reforçava a mensagem que se pretendia passar através
da construção de caminhos de ferro em África: a ferrovia e a nova cultura material por ela
trazida representavam um processo evolutivo natural, o futuro e o domínio das forças da
natureza, encetados pelas mãos de europeus, de brancos, de portugueses.
5. Conclusão
A construção de caminhos de ferro é normalmente associada a empreendimentos
capitalistas buscando o lucro ou a iniciativas estatais de serviço público. Através da
implementação da tecnologia ferroviária, ambos procuram potenciar as capacidades e
aumentar a oferta de transporte em determinadas sociedades. Contudo, a ferrovia tem
também importantes aspetos culturais e políticos, ligados à mensagem de modernidade
que transmite, sobretudo no século XIX/inícios do século XX, mas em grande medida
também ainda no século XXI – basta olhar para o revivalismo da construção ferroviária
espoletado pela recente solução tecnológica dos comboios de alta velocidade (GIUNTINI,
2014).
Neste artigo, procuramos realçar estas últimas facetas – a importância política e
cultural do caminho de ferro na África Portuguesa, mais do que a sua relevância
económica ou eminentemente técnica – e seu contributo para a formação de uma cultura
material nas colónias africanas nacionais ao serviço do imperialismo europeu sobre África.
Simultaneamente, demonstramos como essa cultura espelhava a mentalidade das elites
técnicas e políticas da época e sua crença na ciência e tecnologia.
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p.244
A imposição dessa nova cultura material através do caminho de ferro fez-se num
duplo sentido: para o exterior e para o interior. Por um lado, deveria mostrar, perante as
nações europeias, a vocação colonial de Portugal e o seu direito a uma presença em
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Hugo Silveira Pereira
África. Por outro, perante as sociedades locais, evidenciava uma alegada superioridade
técnica europeia e a sua legitimidade, não só tecnológica, mas sobretudo moral e
civilizacional, para se impor sobre civilizações consideradas atrasadas e que deveriam ser
trazidas para a modernidade através da tecnologia.
A construção de paisagens tecnológicas através do caminho de ferro e sua
promoção através da fotografia contribuiu para aqueles dois objetivos. Imagens de
ferrovias cruzando selvas ou panoramas desérticos ou de negros trabalhando sob
supervisão europeia demonstrava que Portugal se empenhava em explorar os recursos
de naturais de África, levar o progresso (a tecnologia e a ciência) ao derrogatoriamente
chamado continente negro e civilizar o nativo (escondendo, porém, a realidade do
trabalho forçado que as pessoas na Europa não queriam ver).
Com isto não queremos dizer que o caminho de ferro desempenhou este papel de
forma completamente isolada. A ferrovia foi apenas uma das tecnologias colocadas ao
serviço dos europeus no processo de colonização de África, tão importante como o
quinino que os inoculava contra as doenças tropicais, o telégrafo que facilitava a
administração do território ou as armas que pacificavam as tribos locais.
Pretendemos com este artigo contribuir para o argumento de Daniel Headrick
sobre a marca que a tecnologia deixou nas civilizações africanas – talvez mais vincada que
a deixada pelo cristianismo, capitalismo ou qualquer outra ideologia subjacente
(HEADRICK, 1981) – para os paradigmas recentes de caracterização da sociedade
portuguesa como profundamente influenciada pelos preceitos científicos e tecnológicos
(MACEDO, 2012; SARAIVA, 2007), para a discussão sobre a importância da tecnologia na
colonização portuguesa (DIOGO, 2009; DIOGO; LAAK, 2016; DIOGO; NAVARRO, 2018;
NAVARRO, 2018) e para o debate sobre a importância das representações de tecnologia
na formação de uma identidade nacional e na sua imposição sobre culturas diferentes.
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Reconhecemos, todavia, que a nossa análise é parcial por apenas incluir as
perceções dos colonizadores. Em futuros desenvolvimentos deste estudo, importa ouvir
as vozes e representações dos povos colonizados, de modo a obter uma apreciação mais
Tempo & Argumento
Cultura material, progresso, civilização e identidade nacional: Os caminhos de ferro coloniais em
Angola e Moçambique (c. 1870 - c. 1915)
Hugo Silveira Pereira
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Recebido em 05/06/2018
Aprovado em 16/04/2019
Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC
Programa de Pós-Graduação em História - PPGH
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Volume 11 - Número 27 - Ano 2019
tempoeargumento@gmail.com
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