Professor Titular do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, BRASIL Address: Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Escravidão e liberdades na América Portuguesa e no Império do Brasil, 2024
Embora já existissem na Península Ibérica desde, pelo menos, o fim da época medieval, as coartaçõ... more Embora já existissem na Península Ibérica desde, pelo menos, o fim da época medieval, as coartações chegaram ao seu auge no Novo Mundo, mais precisamente na capitania das Minas Gerais, na América portuguesa, durante o século XVIII. Tratava-se de direito costumeiro, negociado diretamente entre escravos e senhores, a partir do qual os primeiros poderiam se afastar do domínio de seus patronos para buscarem pecúlio com o qual pagariam o valor de suas alforrias em parcelas, durante alguns anos. Ao longo deste período, segundo o costume, o cortado não deixava de ser escravo, mas não poderia ser vendido, legado, alugado, arrestado, emprestado ou trazido novamente ao cativeiro se cumprisse as cláusulas do acordo. Obviamente, ao longo do tempo, várias coartações deram errado, com descumprimentos de ambas as partes envolvidas, resultando, inclusive, em muitos processos judiciais de escravos contra senhores, sendo que em alguns deles os cativos lograram êxito. O sucesso alcançado por essas práticas nas Minas Gerais esteve diretamente relacionado ao enorme contingente de cativos concentrado na região, sobretudo nas áreas urbanas e suburbanas; à economia diversificada e dinâmica, irrigada por relações comerciais que articulavam o local ao global; pela mobilidade social aí engendrada, lastreada também na presença frequente de famílias escravas, libertas e livres não brancas e nas mestiçagens biológicas e culturais que as constituíam fortemente; pelas incontáveis oportunidades reais de inserção econômica e de ascensão social, mesmo entre escravos; pela extraordinária atuação cotidiana das mulheres escravas de distintas "qualidades" (índias, negras, pretas, crioulas, mestiças, pardas, mulatas, cabras, etc..) em todas as dimensões sociais, tornando-se a maioria entre os coartados e os libertos e pela formação de redes femininas de sociabilidade e de solidariedade entre senhoras não brancas e escravas. Ao longo do século XVIII e durante a primeira metade do século XIX esses aspectos garantiram que as Minas Gerais abrigassem a maior população total entre as capitanias brasileiras (c. 360.000 habitantes, em 1786 e c. 520.000, em 1823), assim como uma das maiores concentração de escravos da época (c. 140.000, em 1770 e c. 170.000, em 1820) e,
igualmente, uma das maiores concentrações de forros e seus descendentes livres já vista até então (c. 123.000, já nos anos 1780). Considerando-se as informações existentes na documentação de variada natureza disponível nos arquivos, é possível inferir-se que parcela muito significativa das alforrias tenha derivado dos acertos formais e informais de pagamento parcelado, o que se transformou em um excelente negócio para os senhores, muitos deles ex-escravos e livres não brancos. Na longa duração, esse movimento sustentou o escravismo, pois o reproduziu e fortemente, ao mesmo tempo em que contribuiu para sua extinção, na medida em que gerou grande quantidade de mão de obra liberta e livre, diminuindo a dependência dos tráficos atlântico e interno e da própria escravidão, uma vez que a maioria desses homens e mulheres teve que trabalhar para se sustentar e às suas famílias. Portanto, estudar as coartações é essencial para se compreender a complexidade da história da escravidão e da liberdade no mundo moderno.
Andalucía en el mundo atlántico moderno. Ciudades y redes, 2018
Pocos años después de saberse de la existencia de grande cantidad de oro en el “sertão” (término ... more Pocos años después de saberse de la existencia de grande cantidad de oro en el “sertão” (término de difícil traducción – despoblados, aunque se supiese que había nativos; tierra incógnita, como se ha escrito sobre los mapas) de la América portuguesa se publicó en Sevilla, en 1732, en la Officina de Antonio da Sylva, un libreto curioso: el Itinerario geografico com a verdadeira descripção dos Caminhos, Estradas, Rossas, Citios, Povoaçoens, Lugares, Villas, Rios, Montes, e Serras, que ha da cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro atè as Minas do Ouro. Del autor, Francisco Tavares de Brito, poco se conoce hasta hoy. Se supone, incluso, que no ha sido él que le escribió y se adjunta desde luego la hipótesis de ser falsa la indicación editorial. Entonces, porque tomar un opúsculo de dudosa autoría y de probable falso librero como puente entre la Andalucía y las Minas Gerais de Brasil en la primera mitad del siglo XVIII?
ABSTRACT- The «plebs» of Minas Gerais, in the second half of the century, include blacks and meti... more ABSTRACT- The «plebs» of Minas Gerais, in the second half of the century, include blacks and metis, slaves and Freedmen, born in Brazil or in Africa. The study of wills permits to restore all the complexity of this colonial society in which, unlike what a partly false and stereotyped vision states, opportunities towards integration and social promotion were not rare. Slaves and Freedmen were, in spite of what has been said until today, the independent and creative actors of their own history.
Os registros de coartação e de alforria, inscritos em documentos nomeados como “cartas”, “escritu... more Os registros de coartação e de alforria, inscritos em documentos nomeados como “cartas”, “escrituras” ou “papéis”, são fontes importantíssimas dos processos de libertação de escravos. Em áreas mais urbanizadas, como as Minas Gerais do Setecentos, essas tipologias foram muito acionadas e estiveram intimamente relacionadas com a constituição de enorme população liberta, que quase sempre pagou pela mudança de condição jurídica, seja de uma só vez ou em parcelas negociadas, como no caso das coartações. Muitos desses forros e, principalmente, forras – pois elas formaram a maioria – eram mestiçados, isto é, pessoas identificadas ou que se identificavam com “qualidades” como mestiço, pardo, mulato e cabra. Mas, para além dos aspectos demográfico e de origem dessas gentes, o que esses documentos guardam sem, contudo, explicitarem, é que sua existência em número relevante esteve diretamente relacionada às dinâmicas de mestiçagens. Elas foram imprescindíveis para a conformação daquela sociedade escravista e mestiçada, para a formação de núcleos familiares formais e matrifocais entre escravos e também entre forros e não brancos nascidos livres, para a participação deles na forte economia regional, a partir do que conseguiram pagar suas alforrias. Além disto, elas fomentaram a mobilidade social, a ascensão socioeconômica dessa gente, a integração de significativa parte dela às camadas médias urbanas, possibilitando a consolidação e a diversificação de suas manifestações culturais e, ainda, permitindo que muitos ex-escravos se transformassem em senhores e senhoras, que, muitas vezes, repetiram as próprias trajetórias e libertaram seus cativos. Os registros de coartação e de alforria, sobretudo quando associados a outros como testamentos e inventários post-mortem, acabam “revelando” estes aspectos. Todo esse conjunto diversificado de fontes possui extrema relevância. No passado, garantiu liberdade a muitos antigos escravos e a seus descendentes. No presente, permite ao historiador compreender a complexidade histórica que o produziu e o dotou de sentido. Abstract: The records of coartación and manumission, recorded in documents named “letters”, “writings”, or “papers”, are extremely important sources for understanding the processes of slave liberation. In more urbanized areas, such as eighteenth-century Minas Gerais, these typologies were heavily used and were closely related to the constitution of an enormous population of freed people, who almost always paid for their change in legal status, either all at once or in negotiated installments, as in the case of coartación. Many of these freed people, and especially freedwomen – as they formed the majority – were mixed, that is, people identified or who identified themselves with “qualities” such as mestizo, pardo, mulatto, and cabra. But beyond the demographic and origin aspects of these people, what these documents reveal, without explicitly stating it, is that their existence in significant numbers was directly related to the dynamics of mestizajes. They were essential to the formation of that slave and mestizo society, to the formation of formal and matrifocal family nuclei among slaves and also among non-white people born free, and to their participation in the strong regional economy, from which they were able to pay for their manumission. Furthermore, they fostered social mobility, the socioeconomic rise of these people, their integration into significant parts of the urban “middle classes”, making possible the consolidation and diversification of their cultural expressions, and allowing many former slaves to become masters and mistresses who often repeated their own trajectories and freed their own slaves. The records of coartación and manumission, particularly when associated with others such as wills and post-mortem inventories, end up “revealing” these aspects. All of these diverse sources are extremely relevant. In the past, they guaranteed freedom to many former slaves and their descendants. In the present, they enable the historian to understand the historical complexity that produced them and gave them meaning.
REVISTA DE HISTÓRIA DA SOCIEDADE E DA CULTURA, 2023
Este artigo compara histórias de mestiçados forros em Minas Gerais e Buenos Aires ao longo dos ... more Este artigo compara histórias de mestiçados forros em Minas Gerais e Buenos Aires ao longo dos séculos XVIII e XIX. A análise patenteia dinâmicas sociais semelhantes, mas também diferentes, dimensões claramente atreladas à importância histórica assumi-da por ambas as sociedades e às pujantes economias desenvolvidas nessas regiões. Não obstante as diferenças marcantes encontradas, ficou claro que os mestiçados procura-ram, com maior ou menor grau de sucesso, conduzir as suas vidas, transitando entre o cativeiro e a vida em liberdade, vinculando-se a atividades económicas específicas, for-mando famílias e redes de relacionamento, tornando-se senhores e senhoras de escravos e inserindo-se social e culturalmente nas realidades que ajudaram a conformar.
RESUMO: Proposta metodológica de pensar temas tão extensos, polêmicos e multifacetados, tais como... more RESUMO: Proposta metodológica de pensar temas tão extensos, polêmicos e multifacetados, tais como a escravidão, a presença de africanos de várias origens nas Américas e as mestiçagens biológicas e culturais que aí se processaram, em perspectiva da ...
Nombrar lo nuevo: una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI y XVIII, 2021
1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América ... more 1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América hasta principio del siglo XIX. Quieren decir respectivamente el origen ó la ascendencia (incluso religiosa) y el status jurídico. Así que entre las calidades más comunes se encuentran "indio", "gentil", "blanco", "cristiano", "mestizo", "mameluco", "negro", "prieto", "criollo", "mulato", "pardo", "zambo", además de "judío" y "moro". Las tres condiciones jurídicas eran "libre", "esclavo" y "horro". 2. La "calidad" y la "condición" servían para identificar, distinguir y clasificar individuos y grupos sociales en una sociedad organizada a partir del trabajo compulsorio, que promovió profundas mesclas biológicas y culturales y que se entendía como naturalmente desigual. 3. El léxico de la distinción y del mestizaje se "americanizó" desde la llegada de los europeos, se amplió y se tornó más complejo que el existente antes en Europa e entre los pueblos originales del continente que se llamó de América. En el siglo XVIII él ya se encontraba consolidado. Él nombró el nuevo y dio base para que se desarrollasen las relaciones sociales e las acciones de los grupos y para que se conformase el universo cultural ibero-americano.
Nombrar lo nuevo. Una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI y XVIII, 2021
1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América ... more 1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América hasta principio del siglo XIX.
Por meu trabalho, serviço e indústria : histórias de africanos, crioulos e mestiços na colônia - Minas Gerais, 1716-1789, 1999
This is an investigation about slavery and the formation of the cultural universe in the Brazilia... more This is an investigation about slavery and the formation of the cultural universe in the Brazilian colonial times, which takes Minas Gerais in the 18th century as the basic space and time for my reflections. It´s not intended here to generalize partial conclusions, but to insist on the historical plurality occurred both in the Portuguese America and in Minas Gerais. My main objective is to study the everyday life of freedmen and freedwomen and their descendants. To better approach this theme, I have also focused on the slavery period and on the relationship established among Africans, their children born in the colony, mulattoes, and whites in the colonial daily life. The documents I have explored the most for this research are the wills and post-mortem inventories of inhabitants who lived both in the regions of Rio das Velhas and Rio das Mortes. The most precious legacy left to the future by them are their perception of the world, opinions and account of various aspects of their society such as information about technical knowledge, behavior, clothing, cookery, funiture, family life, tools and working manners. Impressions on the trivial relationship among different social groups and within them; strategies of adaptation, confrontation and resistance as well as examples of hybridand impermeable cultural representations and practices were also left. The freed testator described celebrations of conquered victories such as manumitting and economic ascension through the use of metaphors, insinuations and dissimulated practices. The freedwomen were the ones who better used these stratagems. As a result from this research, data and reflections demonstrate the effective performance of slaves and freed people on the construction of the dynamic and multifaceted colonial society.
Escravidão e liberdades na América Portuguesa e no Império do Brasil, 2024
Embora já existissem na Península Ibérica desde, pelo menos, o fim da época medieval, as coartaçõ... more Embora já existissem na Península Ibérica desde, pelo menos, o fim da época medieval, as coartações chegaram ao seu auge no Novo Mundo, mais precisamente na capitania das Minas Gerais, na América portuguesa, durante o século XVIII. Tratava-se de direito costumeiro, negociado diretamente entre escravos e senhores, a partir do qual os primeiros poderiam se afastar do domínio de seus patronos para buscarem pecúlio com o qual pagariam o valor de suas alforrias em parcelas, durante alguns anos. Ao longo deste período, segundo o costume, o cortado não deixava de ser escravo, mas não poderia ser vendido, legado, alugado, arrestado, emprestado ou trazido novamente ao cativeiro se cumprisse as cláusulas do acordo. Obviamente, ao longo do tempo, várias coartações deram errado, com descumprimentos de ambas as partes envolvidas, resultando, inclusive, em muitos processos judiciais de escravos contra senhores, sendo que em alguns deles os cativos lograram êxito. O sucesso alcançado por essas práticas nas Minas Gerais esteve diretamente relacionado ao enorme contingente de cativos concentrado na região, sobretudo nas áreas urbanas e suburbanas; à economia diversificada e dinâmica, irrigada por relações comerciais que articulavam o local ao global; pela mobilidade social aí engendrada, lastreada também na presença frequente de famílias escravas, libertas e livres não brancas e nas mestiçagens biológicas e culturais que as constituíam fortemente; pelas incontáveis oportunidades reais de inserção econômica e de ascensão social, mesmo entre escravos; pela extraordinária atuação cotidiana das mulheres escravas de distintas "qualidades" (índias, negras, pretas, crioulas, mestiças, pardas, mulatas, cabras, etc..) em todas as dimensões sociais, tornando-se a maioria entre os coartados e os libertos e pela formação de redes femininas de sociabilidade e de solidariedade entre senhoras não brancas e escravas. Ao longo do século XVIII e durante a primeira metade do século XIX esses aspectos garantiram que as Minas Gerais abrigassem a maior população total entre as capitanias brasileiras (c. 360.000 habitantes, em 1786 e c. 520.000, em 1823), assim como uma das maiores concentração de escravos da época (c. 140.000, em 1770 e c. 170.000, em 1820) e,
igualmente, uma das maiores concentrações de forros e seus descendentes livres já vista até então (c. 123.000, já nos anos 1780). Considerando-se as informações existentes na documentação de variada natureza disponível nos arquivos, é possível inferir-se que parcela muito significativa das alforrias tenha derivado dos acertos formais e informais de pagamento parcelado, o que se transformou em um excelente negócio para os senhores, muitos deles ex-escravos e livres não brancos. Na longa duração, esse movimento sustentou o escravismo, pois o reproduziu e fortemente, ao mesmo tempo em que contribuiu para sua extinção, na medida em que gerou grande quantidade de mão de obra liberta e livre, diminuindo a dependência dos tráficos atlântico e interno e da própria escravidão, uma vez que a maioria desses homens e mulheres teve que trabalhar para se sustentar e às suas famílias. Portanto, estudar as coartações é essencial para se compreender a complexidade da história da escravidão e da liberdade no mundo moderno.
Andalucía en el mundo atlántico moderno. Ciudades y redes, 2018
Pocos años después de saberse de la existencia de grande cantidad de oro en el “sertão” (término ... more Pocos años después de saberse de la existencia de grande cantidad de oro en el “sertão” (término de difícil traducción – despoblados, aunque se supiese que había nativos; tierra incógnita, como se ha escrito sobre los mapas) de la América portuguesa se publicó en Sevilla, en 1732, en la Officina de Antonio da Sylva, un libreto curioso: el Itinerario geografico com a verdadeira descripção dos Caminhos, Estradas, Rossas, Citios, Povoaçoens, Lugares, Villas, Rios, Montes, e Serras, que ha da cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro atè as Minas do Ouro. Del autor, Francisco Tavares de Brito, poco se conoce hasta hoy. Se supone, incluso, que no ha sido él que le escribió y se adjunta desde luego la hipótesis de ser falsa la indicación editorial. Entonces, porque tomar un opúsculo de dudosa autoría y de probable falso librero como puente entre la Andalucía y las Minas Gerais de Brasil en la primera mitad del siglo XVIII?
ABSTRACT- The «plebs» of Minas Gerais, in the second half of the century, include blacks and meti... more ABSTRACT- The «plebs» of Minas Gerais, in the second half of the century, include blacks and metis, slaves and Freedmen, born in Brazil or in Africa. The study of wills permits to restore all the complexity of this colonial society in which, unlike what a partly false and stereotyped vision states, opportunities towards integration and social promotion were not rare. Slaves and Freedmen were, in spite of what has been said until today, the independent and creative actors of their own history.
Os registros de coartação e de alforria, inscritos em documentos nomeados como “cartas”, “escritu... more Os registros de coartação e de alforria, inscritos em documentos nomeados como “cartas”, “escrituras” ou “papéis”, são fontes importantíssimas dos processos de libertação de escravos. Em áreas mais urbanizadas, como as Minas Gerais do Setecentos, essas tipologias foram muito acionadas e estiveram intimamente relacionadas com a constituição de enorme população liberta, que quase sempre pagou pela mudança de condição jurídica, seja de uma só vez ou em parcelas negociadas, como no caso das coartações. Muitos desses forros e, principalmente, forras – pois elas formaram a maioria – eram mestiçados, isto é, pessoas identificadas ou que se identificavam com “qualidades” como mestiço, pardo, mulato e cabra. Mas, para além dos aspectos demográfico e de origem dessas gentes, o que esses documentos guardam sem, contudo, explicitarem, é que sua existência em número relevante esteve diretamente relacionada às dinâmicas de mestiçagens. Elas foram imprescindíveis para a conformação daquela sociedade escravista e mestiçada, para a formação de núcleos familiares formais e matrifocais entre escravos e também entre forros e não brancos nascidos livres, para a participação deles na forte economia regional, a partir do que conseguiram pagar suas alforrias. Além disto, elas fomentaram a mobilidade social, a ascensão socioeconômica dessa gente, a integração de significativa parte dela às camadas médias urbanas, possibilitando a consolidação e a diversificação de suas manifestações culturais e, ainda, permitindo que muitos ex-escravos se transformassem em senhores e senhoras, que, muitas vezes, repetiram as próprias trajetórias e libertaram seus cativos. Os registros de coartação e de alforria, sobretudo quando associados a outros como testamentos e inventários post-mortem, acabam “revelando” estes aspectos. Todo esse conjunto diversificado de fontes possui extrema relevância. No passado, garantiu liberdade a muitos antigos escravos e a seus descendentes. No presente, permite ao historiador compreender a complexidade histórica que o produziu e o dotou de sentido. Abstract: The records of coartación and manumission, recorded in documents named “letters”, “writings”, or “papers”, are extremely important sources for understanding the processes of slave liberation. In more urbanized areas, such as eighteenth-century Minas Gerais, these typologies were heavily used and were closely related to the constitution of an enormous population of freed people, who almost always paid for their change in legal status, either all at once or in negotiated installments, as in the case of coartación. Many of these freed people, and especially freedwomen – as they formed the majority – were mixed, that is, people identified or who identified themselves with “qualities” such as mestizo, pardo, mulatto, and cabra. But beyond the demographic and origin aspects of these people, what these documents reveal, without explicitly stating it, is that their existence in significant numbers was directly related to the dynamics of mestizajes. They were essential to the formation of that slave and mestizo society, to the formation of formal and matrifocal family nuclei among slaves and also among non-white people born free, and to their participation in the strong regional economy, from which they were able to pay for their manumission. Furthermore, they fostered social mobility, the socioeconomic rise of these people, their integration into significant parts of the urban “middle classes”, making possible the consolidation and diversification of their cultural expressions, and allowing many former slaves to become masters and mistresses who often repeated their own trajectories and freed their own slaves. The records of coartación and manumission, particularly when associated with others such as wills and post-mortem inventories, end up “revealing” these aspects. All of these diverse sources are extremely relevant. In the past, they guaranteed freedom to many former slaves and their descendants. In the present, they enable the historian to understand the historical complexity that produced them and gave them meaning.
REVISTA DE HISTÓRIA DA SOCIEDADE E DA CULTURA, 2023
Este artigo compara histórias de mestiçados forros em Minas Gerais e Buenos Aires ao longo dos ... more Este artigo compara histórias de mestiçados forros em Minas Gerais e Buenos Aires ao longo dos séculos XVIII e XIX. A análise patenteia dinâmicas sociais semelhantes, mas também diferentes, dimensões claramente atreladas à importância histórica assumi-da por ambas as sociedades e às pujantes economias desenvolvidas nessas regiões. Não obstante as diferenças marcantes encontradas, ficou claro que os mestiçados procura-ram, com maior ou menor grau de sucesso, conduzir as suas vidas, transitando entre o cativeiro e a vida em liberdade, vinculando-se a atividades económicas específicas, for-mando famílias e redes de relacionamento, tornando-se senhores e senhoras de escravos e inserindo-se social e culturalmente nas realidades que ajudaram a conformar.
RESUMO: Proposta metodológica de pensar temas tão extensos, polêmicos e multifacetados, tais como... more RESUMO: Proposta metodológica de pensar temas tão extensos, polêmicos e multifacetados, tais como a escravidão, a presença de africanos de várias origens nas Américas e as mestiçagens biológicas e culturais que aí se processaram, em perspectiva da ...
Nombrar lo nuevo: una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI y XVIII, 2021
1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América ... more 1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América hasta principio del siglo XIX. Quieren decir respectivamente el origen ó la ascendencia (incluso religiosa) y el status jurídico. Así que entre las calidades más comunes se encuentran "indio", "gentil", "blanco", "cristiano", "mestizo", "mameluco", "negro", "prieto", "criollo", "mulato", "pardo", "zambo", además de "judío" y "moro". Las tres condiciones jurídicas eran "libre", "esclavo" y "horro". 2. La "calidad" y la "condición" servían para identificar, distinguir y clasificar individuos y grupos sociales en una sociedad organizada a partir del trabajo compulsorio, que promovió profundas mesclas biológicas y culturales y que se entendía como naturalmente desigual. 3. El léxico de la distinción y del mestizaje se "americanizó" desde la llegada de los europeos, se amplió y se tornó más complejo que el existente antes en Europa e entre los pueblos originales del continente que se llamó de América. En el siglo XVIII él ya se encontraba consolidado. Él nombró el nuevo y dio base para que se desarrollasen las relaciones sociales e las acciones de los grupos y para que se conformase el universo cultural ibero-americano.
Nombrar lo nuevo. Una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI y XVIII, 2021
1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América ... more 1. "Calidad" y "condición" son los dos marcadores sociales más importantes en toda Ibero-América hasta principio del siglo XIX.
Por meu trabalho, serviço e indústria : histórias de africanos, crioulos e mestiços na colônia - Minas Gerais, 1716-1789, 1999
This is an investigation about slavery and the formation of the cultural universe in the Brazilia... more This is an investigation about slavery and the formation of the cultural universe in the Brazilian colonial times, which takes Minas Gerais in the 18th century as the basic space and time for my reflections. It´s not intended here to generalize partial conclusions, but to insist on the historical plurality occurred both in the Portuguese America and in Minas Gerais. My main objective is to study the everyday life of freedmen and freedwomen and their descendants. To better approach this theme, I have also focused on the slavery period and on the relationship established among Africans, their children born in the colony, mulattoes, and whites in the colonial daily life. The documents I have explored the most for this research are the wills and post-mortem inventories of inhabitants who lived both in the regions of Rio das Velhas and Rio das Mortes. The most precious legacy left to the future by them are their perception of the world, opinions and account of various aspects of their society such as information about technical knowledge, behavior, clothing, cookery, funiture, family life, tools and working manners. Impressions on the trivial relationship among different social groups and within them; strategies of adaptation, confrontation and resistance as well as examples of hybridand impermeable cultural representations and practices were also left. The freed testator described celebrations of conquered victories such as manumitting and economic ascension through the use of metaphors, insinuations and dissimulated practices. The freedwomen were the ones who better used these stratagems. As a result from this research, data and reflections demonstrate the effective performance of slaves and freed people on the construction of the dynamic and multifaceted colonial society.
O vocabulário das distinções na Ibero-América - séculos XVI-XIX, 2021
15/04/2021 - 19:30
Conferência para o PPGH-UNIMONTES
. O contexto histórico no qual as distinç... more 15/04/2021 - 19:30 Conferência para o PPGH-UNIMONTES
. O contexto histórico no qual as distinções foram nomeadas, definidas, justificadas, reproduzidas . Um mundo naturalmente desigual, porque o Criador o fez assim . Ler Antonio Manuel Hespanha sobre a ordem e as diferenças das coisas no Gênesis - Imbecilitas, p. 47. . O sentido de se distinguir e as formas das distinções - O MUNDO NATURALMENTE DESIGUAL . Nomear os diferentes no Mundo Mediterrâneo, na Península Ibérica e na Ibero-América . Trânsitos intensos de gentes e culturas em longuíssimo período - guerras, invasões e conquistas, imposições culturais, mesclas biológicas e culturais, surgimento de novos grupos sociais, readaptações, superposições, convivências e coexistências . Identificar os vários grupos, distingui-los, classificá-los e hierarquizá-los foi fundamental para exercer o poder, negociar alianças, garantir forças de trabalho e de defesa, projetar expansões, perpetuar linhagens dominantes e seu entourage . Daí as ideias de pureza ou limpeza da ascendência, das origens e os famosos estatutos de limpeza de sangue . Na Península Ibérica, equivalia à nobreza histórica e a cristãos-velhos . Em um mundo naturalmente desigual, ordenado e hierarquizado houve mais que sentido, houve necessidade de identificar, distinguir e classificar indivíduos e grupos sociais . Dar nomes a eles significou mais do que identificá-los: significou associar lugares sociais aos quais deveriam se ater; associá-los a certos tipos de definições morais, comportamentais e fisionômicas que definiam seu posicionamento na hierarquia social; atrelá-los a funções tais como governar, guerrear ou trabalhar; assim como, de certo modo, moldar o futuro de cada um, definindo-se os limites das trajetórias individuais, mesmo que muitos casos tenham desafiado e vencido esta lógica. . As misturas biológicas e culturais foram uma dessas perspectivas desafiadoras e, por isto, muito precocemente, foram nomeadas, expressando-se todo o incômodo que representavam. . Afinal, misturar-se significou corromper as linhagens puras e aproximar pretensos inferiores de superiores e vice-versa, dependendo do contexto.
MESA 4: Informaciones y saberes (moderador: José Manuel Díaz Blanco).
Eduardo França Paiva (Unive... more MESA 4: Informaciones y saberes (moderador: José Manuel Díaz Blanco). Eduardo França Paiva (Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil).
II COLOQUIO INTERNACIONAL ANDATLAN: ANDALUCÍA EN EL MUNDO ATLÁNTICO MODERNO: CIUDADES Y REDES Organiza: Proyecto de I+D “Andalucía en el mundo atlántico: actividades económicas, realidades sociales y representaciones culturales (s.XVI-XVII)”; Ministerio de Economía y Competitividad; Universidad de Sevilla; Facultad de Geografía e Historia; Departamento de Historia Moderna Universidad de Sevilla
Eduardo Paiva desenvolveu sua fala através de vários pontos discutidos em seu livro "Dar Nome ao ... more Eduardo Paiva desenvolveu sua fala através de vários pontos discutidos em seu livro "Dar Nome ao Novo - Uma história lexical da Ibero-América entre os séculos XVI e XVIII", lançado hoje no Café. Ele busca entender como se nomeavam , em registros, os mais diversos agentes históricos das sociedades mestiças Ibero-Americanas; índios, brancos, negros, criolos, entre outros. Ele propõe um conceito de "dinâmicas de mestiçagem", que busca dizer mais do processo de construção dessas sociedades do que de seus resultados finais. Ele critica a tendência anacrônica dos historiadores de olhar para o passado a partir de conceitos atuais, e tenta organizar as categorias e conceitos, organizações e formas sociais que regiam aquela época histórica.
Sempre um Papo. Casa Fiat. Imagens da Mestiçagem e do Brasil dos Séculos XVII ao XX.Eduardo Franç... more Sempre um Papo. Casa Fiat. Imagens da Mestiçagem e do Brasil dos Séculos XVII ao XX.Eduardo França Paiva.Seminário "Arte em 10 Tempos" . Captação e edição: Caturra Digital.
Conferência pronunciada em 2009.
Memorial para Professor Titular - Departamentode História, UFMG, 2016
SUMÁRIO
Memorial - trajetória, atuações, historicidades …………………………………………. 3
Introdução …………………………... more SUMÁRIO Memorial - trajetória, atuações, historicidades …………………………………………. 3 Introdução ……………………………………………………………………………..... 3 Ingresso no Mestrado em História – UFMG ……………………………………………. 4 Adquirindo experiência profissional e acadêmica – ensino, pesquisa e extensão ……… 7 O Doutorado na Universidade de São Paulo …………………………………………… 9 Ingresso na UFMG como professor do Departamento de História …………………….. 13 1999-2000 ……………………………………………………………………………… 13 2001 …………………………………………………………………………………….. 16 2002 …………………………………………………………………………………….. 20 2003 …………………………………………………………………………………….. 22 2004 …………………………………………………………………………………….. 26 2005 …………………………………………………………………………………….. 27 2006 …………………………………………………………………………………….. 29 2007 …………………………………………………………………………………….. 31 2008 …………………………………………………………………………………….. 35 2009 …………………………………………………………………………………….. 38 2010 …………………………………………………………………………………….. 44 2011 …………………………………………………………………………………….. 47 2012 …………………………………………………………………………………….. 51 2013 …………………………………………………………………………………….. 56 2014 …………………………………………………………………………………….. 60 2015 …………………………………………………………………………………...... 63 2016 …………………………………………………………………………………….. 71 Observações finais ……………………………………………………………………... 76 Anexo 1 ………………………………………………………………………………… 78 Anexo 2 ………………………………………………………………………………… 82 Anexo 3 ………………………………………………………………………………… 85 Anexo 4 ………………………………………………………………………………… 88 Anexo 5 ………………………………………………………………………………… 90 Anexo 6 ………………………………………………………………………………… 92 Anexo 7 ………………………………………………………………………………… 94 Anexo 8 ………………………………………………………………………………… 99 Anexo 9 ……………………………………………………………………………….. 104 Anexo 10 ……………………………………………………………………………… 106
Gostaria de ressaltar, para finalizar, o que ficou mais claro para mim mesmo, quando terminei a escrita deste Memorial. Refiro-me à articulação temática, metodológica, conceitual e historiográfica que foi se estabelecendo e se consolidando ao longo dos anos de trabalho, mas, sobretudo, a partir do segundo marco aqui adotado, isto é, a partir de meu ingresso no Doutorado. Isto se expressa, creio, de maneira explícita e contundente em minha produção mais recente, mas se mostra igualmente forte em minhas aulas e orientações, assim como em conferências que venho proferindo, entrevistas que venho concedendo e atividades de extensão que venho desenvolvendo, como curadorias de exposições, revitalização cultural de locais e monumentos, como a requalificação do Museu do Escravo, em Belo Vale, Minas Gerais, a pedido do Ministério Público Estadual. Para mim, o maior mérito de ter escrito este Memorial foi perceber com mais clareza a organização e as articulações que subjazem em minha trajetória intelectual e profissional. Espero que esta maior clareza possa me ajudar a realizar um trabalho ainda mais proveitoso, maduro e embasado o suficiente para dialogar com as diferenças de outrora e com as inevitáveis e necessárias transformações na História.
O professor Eduardo França Paiva apresenta seus temas de investigação: - História Social da Escr... more O professor Eduardo França Paiva apresenta seus temas de investigação: - História Social da Escravidão, Mestiçagens e Escravidão na Ibero-América - sobre os quais tem orientado na Linha História Social da Cultura na UFMG. https://www.facebook.com/historiasocialUFMG/videos/868951120110352/
Aqui apresento um pouco do trabalho que tenho desenvolvido na Linha de Pesquisa História Social da Cultura, do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais. Os interessados em ingressar no Mestrado ou no Doutorado do PPGHis-UFMG podem assistir aos vídeos de apresentação dos professores acessando o link da Linha de Pesquisa HSC (https://www.facebook.com/search/top/…). Abraços, Eduardo.
Depoimento do Prof. Eduardo França Paiva - 25 de Pós-Graduação em História da UFMG - EPHIS 2015
P... more Depoimento do Prof. Eduardo França Paiva - 25 de Pós-Graduação em História da UFMG - EPHIS 2015 Publicado em 29 de dez de 2014
Em comemoração aos 25 anos do Programa de Pós-Graduação em História da UFMG, o IV EPHIS abordará como tema geral da edição de 2015 a importância e os rumos tomados pelos programas de pós-graduação em História no cenário acadêmico brasileiro.
Grupo de Estudos HISTÓRIA DA ESCRAVIDÃO E HISTÓRIA DOS ÍNDIOS - DIÁLOGOS, 2021
Objetos, História e metodologia
O objeto é registro, é documento, torna-se fonte para o historiad... more Objetos, História e metodologia O objeto é registro, é documento, torna-se fonte para o historiador. O objeto fala! Há que se aprender a escutar MÉTODO O objeto é marcado pelo tempo, pela história e as marcas podem falar também.
Marcel Proust sobre sua avó: “Na verdade, jamais se resignava a comprar qualquer objeto de que não se pudesse tirar algum proveito intelectual e sobretudo o que nos proporcionam as coisas belas, ensinando-nos a buscar deleite em outra parte que não nas satisfações do bem-estar e da vaidade. Até quando tinha que fazer algum presente chamado útil, quando tinha de dar uma poltrona, um serviço de mesa, uma bengala, procurava-os “antigos”, como se, havendo seu longo desuso apagado em tais coisas o caráter de utilidade, parecessem antes destinadas a contar a vida dos homens de outrora que a atender às necessidades de nossa vida atual. (...) Mas minha avó teria julgado mesquinho preocupar-se muito com a solidez de um móvel onde ainda se distinguiam uma flor, um sorriso, às vezes uma bela imaginação do passado. Até aquilo que nesses móveis correspondia a uma necessidade, como se apresentasse de uma feição a que estávamos desabituados, a encantava como esses antigos modos de dizer em que descobrimos uma metáfora, apagada, em nossa linguagem atual, pelo desgaste do hábito.” (Em busca do tempo perdido. No caminho de Swann. Trad. Mário Quintana.)
Sociedades Aldeadas e a Companhia de Jesus na América Portuguesa, 2021
A base de dados - Há 15 anos venho desenvolvendo pesquisas sobre as categorias de distinção no un... more A base de dados - Há 15 anos venho desenvolvendo pesquisas sobre as categorias de distinção no universo ibero-americano, seus antigos significados e empregos Ainda em fase de pesquisa, mas já meio que configurado, está surgindo finalmente o Vocabulário de qualidades e distinções da Ibero-América - séculos XV-XIX. Definições e empregos históricos de termos, expressões e categorias de identificação e de classificação sociais Tratava-se de um mundo que se entendia como “naturalmente” desigual e para os cristãos, como Deus o havia criado. Nada parecido com a ideia de igualdade dos homens apregoada a partir do fim do século XVIII, que, a bem da verdade, parece não ter se efetivado até hoje. Nesse mundo era fundamental identificar e classificar o “outro” em relação a si, em um plano hierárquico Isto justificou guerras, conquistas, domínios e submissões
Minas Faz Ciência no Ar - Crioulo, pardo, caboclo e outros; como termos eram usados no passado, 2018
Minas Faz Ciência no Ar - Crioulo, pardo, caboclo e outros; como termos eram usados no passado
De... more Minas Faz Ciência no Ar - Crioulo, pardo, caboclo e outros; como termos eram usados no passado De acordo com a pesquisa “Dinâmicas de mestiçagens e o mundo do trabalho nas sociedades ibero-americanas em perspectiva comparada séculos XVI a XVIII”, iniciada em 2011 pelo pesquisador Eduardo França Paiva, do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o termo mestiçagem é recente, mas, em regiões dominadas por espanhóis e portugueses, em séculos anteriores ao XIX (em que surgiu), tinha a função de identificar os indivíduos por “qualidade” e não somente por cor e cruzamentos biológicos.
Live - "Encontros com a História" - PPGH-UNIMONTES, 2021
15/04/2021 - 19:30
Conferência para o PPGH-UNIMONTES
O vocabulário das distinções na Ibero-Améric... more 15/04/2021 - 19:30 Conferência para o PPGH-UNIMONTES O vocabulário das distinções na Ibero-América - séculos XVI-XIX . O contexto histórico no qual as distinções foram nomeadas, definidas, justificadas, reproduzidas . Um mundo naturalmente desigual, porque o Criador o fez assim . Ler Antonio Manuel Hespanha sobre a ordem e as diferenças das coisas no Gênesis - Imbecilitas, p. 47. . O sentido de se distinguir e as formas das distinções - O MUNDO NATURALMENTE DESIGUAL . Nomear os diferentes no Mundo Mediterrâneo, na Península Ibérica e na Ibero-América . Trânsitos intensos de gentes e culturas em longuíssimo período - guerras, invasões e conquistas, imposições culturais, mesclas biológicas e culturais, surgimento de novos grupos sociais, readaptações, superposições, convivências e coexistências . Identificar os vários grupos, distingui-los, classificá-los e hierarquizá-los foi fundamental para exercer o poder, negociar alianças, garantir forças de trabalho e de defesa, projetar expansões, perpetuar linhagens dominantes e seu entourage . Daí as ideias de pureza ou limpeza da ascendência, das origens e os famosos estatutos de limpeza de sangue . Na Península Ibérica, equivalia à nobreza histórica e a cristãos-velhos . Em um mundo naturalmente desigual, ordenado e hierarquizado houve mais que sentido, houve necessidade de identificar, distinguir e classificar indivíduos e grupos sociais . Dar nomes a eles significou mais do que identificá-los: significou associar lugares sociais aos quais deveriam se ater; associá-los a certos tipos de definições morais, comportamentais e fisionômicas que definiam seu posicionamento na hierarquia social; atrelá-los a funções tais como governar, guerrear ou trabalhar; assim como, de certo modo, moldar o futuro de cada um, definindo-se os limites das trajetórias individuais, mesmo que muitos casos tenham desafiado e vencido esta lógica. . As misturas biológicas e culturais foram uma dessas perspectivas desafiadoras e, por isto, muito precocemente, foram nomeadas, expressando-se todo o incômodo que representavam. . Afinal, misturar-se significou corromper as linhagens puras e aproximar pretensos inferiores de superiores e vice-versa, dependendo do contexto. . Está aqui, então, o tema geral que deu origem à pesquisa, cujos resultados parciais apresento aqui.
Grupo de Estudos História da Escravidão História dos Índios: diálogos -GEHEHI - Mesa Redonda - De escravo a senhor: trajetórias (séculos XVII-XIX), 2021
. Tudo se iniciou durante os anos 1970/1980, quando uma geração de jovens historiadores decidiu v... more . Tudo se iniciou durante os anos 1970/1980, quando uma geração de jovens historiadores decidiu voltar aos arquivos e aos documentos, contrapondo-se à história sociológica que se lastreava muito mais em modelos teóricos universalistas, em categorias de análise atemporais e em perspectiva teleológica.
. Portanto, voltar aos arquivos, aos documentos e às historicidades do ocorrido e do registrado, buscando maior aproximação com relação às realidades do passado e aos agentes históricos que as produziram se contrapunha às simplificações e generalizações produzidas pela historiografia daquele tempo, salvo exceções, obviamente.
. A chamada "historiografia revisionista" brasileira se ancorou nesta perspectiva, isto é, a de valorizar a complexidade e a pluralidade históricas. . Foi ela que alçou a historiografia brasileira contemporânea à condição referencial que hoje ostenta. . Na época, um de seus principais lastros, talvez o principal deles, era o tema "escravidão", ainda o principal "problema" histórico brasileiro.
. O tema da mesa de hoje nasce nesse período e junto aos procedimentos metodológicos que se desenvolvem a partir daí. . O escravismo em Minas Gerais e nas áreas mais urbanizadas se tornam o centro das atenções e os estudos daí provenientes apresentam ao Brasil histórias da escravidão e dos escravos pouco ou nada conhecidas, distanciadas dos grandes modelos explicativos vigentes. . Daí pra frente estudar e escrever História no Brasil sofreram profundas alterações, que não cabem ser analisadas nesta rápida apresentação.
. Mas, o que mais importa aqui, surgem da imensa massa documental que possuíamos e que passou cada vez mais a ser alvo de projetos de organização, grande quantidade de casos de ex-escravos e de seus descendentes diretos nascidos livres que se transformaram em senhores de escravos. . E mais surpreendente, as mulheres apareciam claramente como as protagonistas mais importantes dessas histórias.
. Quarenta anos se passaram, milhares de dissertações, teses, artigos, capítulos e livros sobre a temática foram escritos e publicados, mas, grosso modo, essa história revisada ainda não foi incorporada ao ensino de História do Brasil, em todos os níveis de formação. . Prevalece, grosso modo, volto a frisar, o dualismo senhor (branco e cruel) X escravo (negro e vitimizado), a ideia de reificação dos escravos e o "imaginário do tronco", alegoria fundada principalmente nos desenhos de Jean-Baptiste Debret (c. 1826) e de Johan Moritz Rugendas (c. 1835), que sumariam perfeitamente esse pensamento.
. Mas, as pesquisas realizadas indicam outros caminhos trilhados pela população de escravos no Brasil, ao longo dos quais, obviamente, ocorreram tratamentos violentos, crueldades e fugas, mas, também, autonomias, formação de famílias, muitas das quais matrifocais e mestiçadas, ascensão econômica e social, muitas alforrias, majoritariamente negociadas com os senhores, sendo parte substancial delas pagas, até em prestações! . Quarenta anos depois, boa parte desses aspectos segue desconhecida dos brasileiros e continua surpreendendo até historiadores não especialistas no tema! . Apenas esta última constatação mereceria muito mais atenção de nossa parte, mas seguimos mantendo-a em posição secundária!
. Não obstante todas as dificuldades que orbitam essa temática e a sua divulgação, temos a convicção de nosso papel como historiadores e professores de História continua lastreado na produção do conhecimento, resultante do diálogo respeitoso com o passado, com os registros produzidos no passado e com os agentes históricos que construíram este passado que escolhemos estudar, sem negligenciarmos nossa visão sempre marcada pelo nosso próprio tempo. . Nesta mesa, "convidamos" alguns protagonistas ex-escravos que se transformaram em senhores de escravos a nos ajudarem a explicar a complexidade histórica da escravidão no Brasil. . É este diálogo que tentaremos reproduzir a partir de agora.
No início do filme "Menino 23" já se deixa claro que aquele período - anos 1920/30 - foi o mais r... more No início do filme "Menino 23" já se deixa claro que aquele período - anos 1920/30 - foi o mais racista da história do Brasil. Era um projeto eugênico, que julgava o passado e o presente do Brasil, dos brasileiros e da "cultura brasileira" (no singular!) como degenerados e atrasados. Diante desta verdade pretensamente irrefutável, cabia, portanto, projetar o futuro, partindo-se de outra base. Buscava-se civilizar a nação e o povo e para tanto era necessário excluir negros, índios e mestiços do novo Brasil que se projetava. À escória social, como aqueles grupos foram definidos por nazistas, fascistas e integralistas, cabiam o trabalho mecânico e as margens sociais. O projeto vigorou até que seus ideólogos saíram derrotados no fim da segunda guerra. Entretanto, nas perspectivas mental e histórica, aquele julgamento ignóbil permaneceu.
Conferência on line sobre História de Minas Gerais, História da Escravidão e História das Mestiça... more Conferência on line sobre História de Minas Gerais, História da Escravidão e História das Mestiçagens
Entrevista concedida pelo prof. Eduardo França Paiva ao prof. Bruno Younes (Centro Educacional Co... more Entrevista concedida pelo prof. Eduardo França Paiva ao prof. Bruno Younes (Centro Educacional Conexão) em 23/05/2020, via facebook.
Apresentação de resultado de pesquisas sobre o uso de joias-amuletos e de corais vermelhos pelas ... more Apresentação de resultado de pesquisas sobre o uso de joias-amuletos e de corais vermelhos pelas negras e crioulas forras nas Minas Gerais dos século XVIII e sobre o impacto social produzido a partir da mobilidade e ascensão socioeconômicas experimentadas por elas. Ainda no alvorecer do século XVIII as Minas Gerais já aguçavam o desejo de enriquecimento e autonomia entre as gentes do Brasil, incluídos escravos e forros, homens e mulheres. Afinal, espalharam-se as notícias sobre o ouro encontrado em profusão, em várias partes, e já se conheciam jazimentos de pedras preciosas e de outras com menor valor. O comércio de grande quantidade de produtos vindos de muitas partes já se fazia e era bastante lucrativo, pois a população aumentava vigorosamente e eram necessários escravos, alimentos, ferramentas, remédios, roupas, adereços, utensílios de toda sorte e já se consumiam itens mais sofisticados, como tecidos finos, prataria e jóias.
Revista Varia Historia
Publicado em 19 de jun de 2018
No segundo episódio da série “Diálogos Nece... more Revista Varia Historia Publicado em 19 de jun de 2018 No segundo episódio da série “Diálogos Necessários”, o Ephis e a Varia Historia conversam com os professores Maria de Deus Manso (Univ. de Évora) e Eduardo França Paiva (UFMG) sobre a história dos trânsitos e mobilidades culturais. Confira agora a entrevista feira por Romilda Alves e, para saber mais, acesse o número 41 de Varia Historia! Roteiro da entrevista: Romilda Alves (doutoranda, PPGH/UFMG) e David Barbuda (doutorando, PPGH/UFMG) Categoria Educação Licença Licença padrão do YouTube
Pode haver uma sugestão filosófica no brinco, 2018
“Pode haver uma sugestão filosófica no brinco”
africanas, crioulas, mulatas, pardas e a cultura m... more “Pode haver uma sugestão filosófica no brinco” africanas, crioulas, mulatas, pardas e a cultura material nas Minas Gerais do século XVIII
Eduardo França Paiva (UFMG)
Resumo: Abordam-se aqui os objetos - principalmente joias/amuletos - usados por africanas e por suas descendentes crioulas, pardas e mulatas nas Minas Gerais do século XVIII, com destaque para corais, âmbar e berloques variados, que complementavam sua indumentária. Em seus testamentos e inventários post-mortem encontram-se muitos destes objetos, assim como ouro, prata, latão e algum marfim. Forras, senhoras de escravos e de bens imóveis, elas experimentaram ascensão econômica e social em sociedade escravista e acabaram fomentando complexa cultura material, que simbolizou a mobilidade social na qual se inseriam e que acabavam por intensificar. Suas trajetórias se confundem com a dinâmica histórica que marcou a formação da sociedade mineira (e ibero-americana), escravista e profundamente mestiçada, e o cotidiano delas fomentou conexões em escala planetária. De “voltas de corais” às saias de seda elas consumiram parte significativa dos itens disponibilizados pelo comércio mundial, engrossando, assim, camada média urbana surgida nesse contexto.
Biografia: Professor Titular de História da Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisador do CNPq, professor e pesquisador visitante em universidades da Bélgica, Chile, Espanha e Portugal, autor de artigos, capítulos de livros e livros publicados no Brasil e no exterior. Seu último livro intitula-se Dar nome ao novo. Uma história lexical da Ibero-América entre os séculos XVI e XVIII - as dinâmicas de mestiçagens e o mundo do trabalho. (Autêntica, 2015) Atualmente, desenvolve pesquisas relacionadas ao Dicionário das mestiçagens na Ibero-América, no qual pretende apresentar conceitos e definições retirados de antigos documentos, que identificaram e distinguiram indivíduos e grupos sociais.
MERCATU MUNDI é uma parte da exposição permanente do Espaço do Conhecimento da UFMG, localizado n... more MERCATU MUNDI é uma parte da exposição permanente do Espaço do Conhecimento da UFMG, localizado na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte. Explico no vídeo o objetivo da exposição, como ela foi idealizada e executada. Trata-se de uma história de conexões e de mestiçagens biológicas e culturais ocorridas no Mundo Moderno, entre os seculos XVI e XVIII, que aproximou as pessoas e as culturas no mundo, intensificando fusões e distinções, forjando porções importantes do que somos hoje e de como nos compreendemos historicamente. Nesta exposição o mercado é tratado para muito mais além das trocas financeiras, sublinhando-se suas dimensões políticas, geográficas, demográficas, culturais e biológicas. A curadoria/consultoria da exposição é de Eduardo França Paiva, os textos são de René Lommez Gomes, a pesquisa iconográfica, os roteiros e os videos contaram com o trabalho de uma equipe extensa. Ver todos os dados em http://www.espacodoconhecimento.org.br/mercatu-mundi/
Esclavitud, escravidão: negros e indígenas na ibero-américa (Séc. XVII – Séc XIX)., 2024
O universo material construído pelas mulheres forras, como
se viu, é um excelente exemplo para pe... more O universo material construído pelas mulheres forras, como se viu, é um excelente exemplo para pensarmos essa globalização desde o local. Consumidoras contumazes de produtos variados, oferecidos pelo comércio intercontinental, elas movimentaram as redes planetárias ao potencializarem a demanda ao longo do período – desde escravos, até tecidos, louça, ferramentas e utensílios domésticos –, provocando a inserção das Minas Gerais no processo de globalização moderna. Por isto mesmo, venho as designando mulheres globais, na tentativa de sublinhar a notável atuação delas, bem como seu protagonismo como agentes articuladoras de mundos apartados, de dinâmicas internas e externas. Vê-se claramente, portanto, a importância de conhecer a complexa história de escravismo, de liberdades, de mestiçagens, de enfrentamentos e de adaptações, de mobilidade, de superposições, de convivência e de coexistência, desenvolvida pelos moradores das Minas Gerais. Todo esse movimento resultou em uma economia importantíssima nos séculos XVIII e XIX, bem como na constituição de população muito diversa, que rapidamente chegou a centenas de milhares de pessoas, o que promoveu intensa movimentação comercial e cultural na região.
Livro que resultou do congresso "De que estamos falando? Antigos conceitos e modernos anacronismo... more Livro que resultou do congresso "De que estamos falando? Antigos conceitos e modernos anacronismos: escravidão e mestiçagens", ocorrido na Universidade Federal de Minas Gerais, em 2015, fruto do convênio de cooperação entre a UFMG e a Universidad de Sevilla (Grupo de Estudos CNPq-UFMG Escravidão, mestiçagem, trânsito de culturas e globalização-séculos XV a XIX; Centro de Estudos sobre a Presença Africana no Mundo Moderno-CEPAMM-UFMG; Departamento de Historia Moderna de la Universidad de Sevilla). Textos de 11 autores (ver Sumário). Neste livro, o leitor encontrará esforços individuais e ecos de reflexões coletivas que pretendem problematizar o emprego de antigos e novos conceitos por agentes históricos e pelos historiadores, buscando melhor compreender suas historicidades, assim como discutir a produção de anacronismos que vêm, por vezes, resultando em incompreensões, imprecisões, simplificações e generalidades que conformam histórias quase ficcionais. O tema central é a história da escravidão e das mestiçagens e há outros temas complementares. Pensá-los, assim com a História, sem anacronismos e sem o emprego de conceitos é algo impossível, uma vez que o campo de conhecimento e a operação metodológica são produtos temporais e, portanto, compõem-se de significados e de procedimentos eles mesmos históricos, variando de época para época, de geração para geração. Não obstante, tornar a História um campo fértil para anacronismos que visam, consciente e inconscientemente, acatar as conveniências do presente parece-nos escolha inaceitável. Buscamos, portanto, refletir sobre este problema central que envolve o trabalho dos historiadores. Por isto, tentamos “voltar” o mais próximo possível às definições, às compreensões e aos usos passados de conceitos empregados ao longo dos tempos por agentes históricos que os aplicaram para explicarem suas maneiras de viver; suas formas de organização social; suas fisionomias; seus costumes e conhecimentos; seu pensamento; as relações de trabalho; as “qualidades” e “condições” que identificavam, distinguiam e hierarquizavam indivíduos e grupos em sociedades escravistas e profundamente mescladas, biológica e culturalmente.Não temos dúvidas quanto à importância deste exercício historiográfico, que impede simplificações e reducionismos de um passado complexo, plural e autônomo com relação aos entendimentos processados a posteriori, ainda que inevitavelmente seja ele, sempre, parcial ou integralmente, versão formulada em outros tempos. Pensamos que por estes motivos a indagação que dá nome a este livro é muito adequada. Ela expressa claramente nosso incômodo em constatar diferenças brutais entre os testemunhos deixados no passado e versões sobre o mesmo passado formuladas posteriormente. De que estamos falando efetivamente quando empregamos hoje conceitos antigos, tais como escravo e mestiço? Algumas respostas a esta pergunta principal podem ser encontradas nesta obra.
UM CONTINENTE, VÁRIOS MUNDOS Sujeitos, fronteiras e instituições nos espaços coloniais sul-americanos (séculos XVI-XIX), 2024
Foi assim que, em 1721, quando a vila de Nossa Senhora da
Conceição de Sabará, sede da comarca do... more Foi assim que, em 1721, quando a vila de Nossa Senhora da Conceição de Sabará, sede da comarca do Rio das Velhas, contava com poucos anos de existência, mas já transformada em um dos principais núcleos urbanos da recém-criada capitania das Minas Gerais, uma moradora liberta ditou seu testamento. A preta forra Catharina de Payva dizia ser natural da Guiné e ter sido escrava do “reverendo padre Matheus de Payva”, que lhe havia passado carta de alforria, assim como o sobrenome. Como era solteira e não tinha descendência, em um gesto de gratidão (que não era inusitado!), instituiu como herdeiro universal “de tudo que restar de minha fazenda o meu senhor que foi”, isto é, o padre Matheus. E, se ele já não estivesse vivo quando a testadora morresse, então sua própria alma seria sua herdeira universal, o que significava dizer que todo o montante existente, depois de pagas as dívidas e cumpridos os legados, deveria ser empregado em missas pela redenção dela. Pelo que deixou relatado, Catharina já não era muito jovem e demonstrava conhecer pessoas importantes de Sabará. Possivelmente, ela havia chegado lá como escrava, nos primeiros anos de ocupação da região, talvez ainda no fim do século XVII. Em trinta anos, mais ou menos, fora liberta, ascendera econômica e socialmente, tornara-se senhora de três escravos, associara-se à irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e formara uma rede de contatos que incluía escravos, forros e “homens bons”, como se costumava dizer. Isto ficava claro por dois motivos: primeiro, por instituir três testamenteiros, entre os quais, dois capitães, e segundo, por indicar que seu corpo deveria ser enterrado na “tumba da irmandade das santas almas para que lhe deixo de esmola dezasseis oitavas de oiro”, uma soma razoável, correspondente a 24$000 (vinte e quatro mil réis), o suficiente para comprar as joias que possuía, isto é, “huma gargantilha de filigrana e huns botõins tudo de ouro e huns botois(sic) pequenos dabertura que tenho mais na mão de hum negro escravo de Joze pereira que tudo pezava dez oitavas de ouro [...] mais coatro pares de botoins de prata de anagoas”.
Esclavas, horras y libres. Historias de mujeres en los mundos ibéricos, siglos XVI-XIX, 2023
Los estudios históricos sobre la esclavitud urbana, la familia esclava y horra, de las manumision... more Los estudios históricos sobre la esclavitud urbana, la familia esclava y horra, de las manumisiones y los de las mujeres como protagonistas, caminaron juntos en Brasil y su desarrollo ha impactado con fuerza en la historiografía de la esclavitud moderna. Desde la década de 1970 historiadores brasileños y «brasilianistas» cambiaron las formas de investigar, de reexionar y de escribir esta historia en relación con las prácticas anteriores. Todo esto ha ocurrido principalmente a partir de los años ochenta del siglo XX, vinculado con la expansión de los programas de posgrado en Historia –maestrías y doctorados– en las universidades públicas y confesionales del país, así como a nuevos acervos documentales organizados y colocados a disposición de los investigadores, a la renovación metodológica y conceptual promovida en el área, a la mayor circulación nacional e internacional de los profesores y a la apertura política que se producía. Para los jóvenes estudiantes de este período, la experiencia política vivida les obligaba a preguntarse sobre el pasado y sobre los hombres y mujeres que lo produjeron. Nadie aceptaba para sí el papel reduccionista de víctimas indefensas e impotentes, y la perspectiva condujo a aquellos nuevos historiadores directamente al pasado esclavista. No se trataba solamente de la idea genérica de esclavos activos, que pasaba a direccionar la lectura de las fuentes y el análisis académico. Después de que los testimonios se volviesen más conocidos, las mujeres irrumpieron como protagonistas de toda aquella historia, a pesar de haber estado prácticamente invisibles hasta entonces.
MARFINS AFRICANOS COMO INSÍGNIAS DE PODER contextos de produção e usos dentro e fora da África, 2023
Desde o fim do século XV e o início do século XVI, o Novo Mundo
passou a integrar antigos circuit... more Desde o fim do século XV e o início do século XVI, o Novo Mundo passou a integrar antigos circuitos intercontinentais de comércio, fomentando e impondo-lhes traços particulares sobre gostos, produção e consumo de objetos. Nesse contexto e associada a essa nova realidade, desenvolveuse uma história excepcional: a dos gostos, comércio e usos de marfins na Ibero-América, particularmente nas Minas Gerais setecentistas. Essas áreas, ressalte-se, já eram conectadas por caminhos, estradas e rios navegáveis nessa época. A Capitania de Minas Gerais era uma das regiões mais dinâmicas do mundo. Nessa região, nesse período, assim como em Potosí, na centúria anterior, os moradores tiveram largo acesso à pauta de itens oferecidos pelo comércio global . Entretanto, o marfim bruto, lavrado ou em pó, entrado nas Minas Gerais – em que pese a necessidade de mais pesquisas sobre o assunto – diferenciava-se parcialmente do comercializado na Europa. Isso ocorria, sobretudo, com os itens lavrados. Saleiros, píxides, olifantes e talheres em marfim africano, manufaturados na África, tão valorizados nos séculos XV e XVI, não chegaram, ao que parece, às Minas do Setecentos nem às outras áreas urbanizadas da Ibero-América, talvez por não despertarem aí o mesmo interesse. Em compensação, pequenos objetos de uso corriqueiro e imagens sacras aparecem na documentação existente nos arquivos. Como entender as ausências e as presenças materiais de marfim nos antigos documentos guardados em nossos arquivos, museus e bibliotecas? Em que medida as presenças e, sobretudo, as ausências de objetos de marfim são indícios reveladores da cultura material desenvolvida nas Minas Gerais e em outras regiões que desenvolveram perfil social semelhante na mesma época? Como lidar metodologicamente com as lacunas e os silêncios dos documentos e como transformá-los em aportes importantes para melhor se conhecer a história dos marfins no mundo moderno? Neste texto, compilo indagações, hipóteses e indícios sobre esses temas e reflito sobre o comércio, os gostos e os usos dos marfins na dinâmica Ibero-América, assim como analiso as conexões comerciais e culturais entre essa região e outras partes do mundo. Link para baixar livro completo: https://www.finotracoeditora.com.br/e-book-marfins-africanos-como-insignias-de-poder-contextos-de-producao-e-usos-dentro-e-fora-da-africa
Reescrevendo histórias do Brasil : conexões e dinâmicas internas no Centro-Norte (séculos XVIII e XIX), 2023
O entendimento do que é ser “brasileiro”, tal como o temos
hoje, resultou de um processo que se i... more O entendimento do que é ser “brasileiro”, tal como o temos hoje, resultou de um processo que se iniciou ainda no século XVIII e que se consolidou ao longo do século XIX. Antes deste gentílico abrangente, indivíduos eram identificados por sua origem, ascendência e linhagem, marcadores “biológicos”, geográficos, sociais, culturais e, até mesmo, religiosos. Em sociedades escravistas e profundamente mestiçadas, como a da América portuguesa, as formas de identificação, distinção e hierarquização não pretenderam aglutinar diferentes, mas, ao contrário, mantê-los separados e devidamente classificados, desde a base até o topo da escala social. A humanidade era definida, naqueles tempos, como um conjunto de desiguais, que, naturalmente, ocupavam degraus inferiores e superiores da hierarquia social. Estas diversidades e distinções, havia séculos, vinham sendo submetidas a um léxico, que servia para nomear e para qualificar pessoas e grupos sociais, assim como territórios e formas de pensar e de viver de seus habitantes. E no Novo Mundo sob o domínio ibérico esse léxico se ampliou muito mais, recontando o passado das gentes que nasciam aí ou que chegavam de outras plagas, bem como definindo, ainda que parcialmente, o presente e até conduzindo o futuro deles. Em sociedades fortemente hierarquizadas, ainda que comportassem mobilidade notável, como foi o caso do Brasil, as categorias de identidade e de distinção desempenhavam também esse papel: o de “desenhar” parcela substancial da vida e das memórias das pessoas.
Reescrevendo histórias do Brasil : conexões e dinâmicas internas no Centro-Norte (séculos XVIII e XIX), 2023
O conteúdo deste livro inscreve-se fortemente na recente história da historiografia brasileira. E... more O conteúdo deste livro inscreve-se fortemente na recente história da historiografia brasileira. Em 14 eixos temáticos, 71 pesquisadores de diferentes gerações, formados em programas de pós-graduação mais an¬tigos e nos mais recentes, apresentam aqui curtos capítulos de divulgação, que expressam a reescrita da história do Brasil ocorrida nos últimos quarenta anos, enfatizando-se as regiões centrais, as do Nordeste e as do Norte, sempre pensadas a partir de conexões e, por vezes, de maneira comparada. O local e o regional assumem nos textos o caráter de produtos his¬tóricos globais, resultados do viver e do pensar no Mun¬do Moderno, dos contatos conflituosos e amistosos entre gentes que possuíam origens, línguas, crenças e interesses muito distintos, mas que ao longo do tempo também se misturaram, guardando velhos costumes e entendimentos e gerando novos. Os Programas de Pós-graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais e da Universidade Federal do Maranhão e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-CAPES patrocinaram esta obra de divulgação gratuita, que pretende ser referencial para pesquisadores interessados pela temática, para professores e estudantes de todos os níveis de ensino e para o público em geral, amante da História.
Sex and Power in a Slave Society - Amulets and Freed Women in Minas Gerais, Brazil, in the Eighteenth Century, 2020
PAIVA, Eduardo França. Sex and Power in a Slave Society - Amulets and Freed Women in Minas Gerais... more PAIVA, Eduardo França. Sex and Power in a Slave Society - Amulets and Freed Women in Minas Gerais, Brazil, in the Eighteenth Century. In: BUENO, Eva Paulino; SILVA, Márcio Douglas de Carvalho e; PEREIRA, Josenildo de Jesus; SILVA, Rodrigo Caetano. Escravos, libertos e livres: histórias de luta e resistência no Brasil e na Argentina. Ribeirão Preto: Mentes Abertas, 2020, p. 93-114. This essay examines issues about sex and power in both the daily life and the social and cultural relations of slaves and freed men and freed women in Portuguese America. For this study, I conducted research in some 1,000 documents, mostly eighteenth-century wills and post mortem inventories held in three of the most important archives in Minas Gerais, Brazil: the Arquivo Público Mineiro/Minerio Public Record Office, in Belo Horizonte, and the notary archives of Sabará (IBRAM-CBG - Instituto Brasileiro de Museus/Brazilian Institut of Museums - Casa Borba Gato/Borba Gato House) and of São João Del Rei (IBRAM - Museu Regional/Regional Museum). In a somewhat unconventional historical approach, the paper starts in nineteenth-century Rio de Janeiro, proceeds to eighteenth-century Minas Gerais, then turns to the global trade networks of the fifteenth to seventeenth centuries, and finally returns to eighteenth- and nineteenth-century Brazil. The instruments I have chosen to guide us through the different cultural and temporal contexts of this journey are what I term “mediator-objects,” simultaneously “memory bearers” and a type of bridge that enables us to link, over time and space, nominally unconnected cultural habits, practices and appropriations. These mediator-objects comprise colorful fabrics, seed pearls (small pearls), amber, and especially corals, used by women in West Africa and by freed women and their descendants in Portuguese America.
"Por meu trabalho, serviço e indústria". Histórias de africanos, crioulos e mestiçados nas Minas Gerais - 1716-1789., 2022
Recebi os exemplares físicos do livro. A capa ficou linda! Embora seja o texto integral da tese d... more Recebi os exemplares físicos do livro. A capa ficou linda! Embora seja o texto integral da tese de doutorado defendida em 1999, ainda gosto muito de vários aspectos desenvolvidos no texto. Eventuais interessados podem comprá-lo no site da Caravana Editorial: https://caravanagrupoeditorial.com.br/.../por-meu.../ Agradeço aos editores, principalmente ao Douglas Lima, o interesse pelo texto e o empenho por trazê-lo integralmente a público, depois de tantos anos. Eduardo França Paiva
Nombrar lo nuevo. Una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI y XVIII (las dinámicas de mestizajes y el mundo del trabajo)., 2020
FRANÇA PAIVA, Eduardo. Nombrar lo nuevo. Una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI... more FRANÇA PAIVA, Eduardo. Nombrar lo nuevo. Una historia léxica de Iberoamérica entre los siglos XVI y XVIII (las dinámicas de mestizajes y el mundo del trabajo). Santiago de Chile: Universitária, Centro de Investigaciones Diego Barros Arana, 2020.
Neste livro abordam-se o circuito que levou o marfim in natura e lavrado para o Brasil e os conte... more Neste livro abordam-se o circuito que levou o marfim in natura e lavrado para o Brasil e os contextos em que objetos desse material foram produzidos, consumidos e admirados. De maneira similar ao ocorrido nos contextos africano e europeu, o marfim também foi adotado nas Américas como bem de distinção, utilizado por brancos, negros e seus descendentes. Esses objetos circularam na Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Grão-Pará, Maranhão, Minas Gerais e em outras regiões, desde o século XVII até o XIX. Novas pesquisas têm mostrado que o marfim africano bruto chegava aos portos do Brasil, oriundo da costa da África centro-ocidental (Angola e Benguela) e da costa leste africana, constituindo contextos que se integravam à história mais ampla do comércio global, iniciada com as expansões ultramarinas, ganhando novos contornos com a abertura dos portos brasileiros, em 1808. Além disto, revê-se a história dos usos dos marfins pelos africanos da costa oeste a partir de uma perspectiva local. Assim, busca-se responder aos problemas apontados pelo projeto Marfins Africanos no Mundo Atlântico – uma reavaliação do marfins luso-africanos, que tem a finalidade de preencher a lacuna historiográfica acerca do comércio, produção, uso, posse e tipologia dos marfins no Brasil e no Mundo Atlântico.
PAIVA, Eduardo França. Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII - estratégias de resi... more PAIVA, Eduardo França. Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII - estratégias de resistência através dos testamentos. 3a. edição. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH-UFMG, 2009.
Tomando como base uma série de 357 testamentos de homens e mulheres livres e libertos, moradores na Comarca do Rio das Mortes - Capitania de Minas Gerais, registrados entre 1720 e 1785, empreendeu-se um estudo sobre o universo colonial e sobre o cotidiano das relações escravistas na região. O cruzamento das informações documentais com as discussões apresentadas por uma bibliografia extensa ensejaram uma análise geral sobre aquele contexto histórico, privilegiando, contudo, três temas fundamentais: as estratégias de resistência empregadas pela população negras contra o sistema escravista; o significativo número de alforrias e de coartações (alforrias pagas parceladamente); e, evidentemente, a grande população forra existente nas Minas Gerais e a atuação das mulheres (cativas e libertas) na construção daquela sociedade setecentista. Foi possível vislumbrar, assim, uma realidade ainda pouco conhecida, na qual escravos, libertos e seus descendentes assumiram, efetiva e continuamente, o papel de agentes históricos e, portanto, de transformadores de seu tempo. Nessa 3a edição o autor inseriu uma apresentação na qual faz autocrítica e registra as transformações de pensamento ocorridas desde a escrita do texto original, as quais o fizeram olhar a temática da escravidão e das alforrias sob outros ângulos, explorando-a a partir de novas categorias conceituais. Foram incluídos, também, um Caderno de Imagens, com iconografia rara e inédita, e um Caderno de Documentos e Transcrições, disponibilizando a reprodução e a transcrição integral de documentos referenciais, explorados no texto.
PAIVA, Eduardo França. Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII - estratégias de resi... more PAIVA, Eduardo França. Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII - estratégias de resistência através dos testamentos. 3a. edição. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH-UFMG, 2009.
Tomando como base uma série de 357 testamentos de homens e mulheres livres e libertos, moradores na Comarca do Rio das Mortes - Capitania de Minas Gerais, registrados entre 1720 e 1785, empreendeu-se um estudo sobre o universo colonial e sobre o cotidiano das relações escravistas na região. O cruzamento das informações documentais com as discussões apresentadas por uma bibliografia extensa ensejaram uma análise geral sobre aquele contexto histórico, privilegiando, contudo, três temas fundamentais: as estratégias de resistência empregadas pela população negras contra o sistema escravista; o significativo número de alforrias e de coartações (alforrias pagas parceladamente); e, evidentemente, a grande população forra existente nas Minas Gerais e a atuação das mulheres (cativas e libertas) na construção daquela sociedade setecentista. Foi possível vislumbrar, assim, uma realidade ainda pouco conhecida, na qual escravos, libertos e seus descendentes assumiram, efetiva e continuamente, o papel de agentes históricos e, portanto, de transformadores de seu tempo. Nessa 3a edição o autor inseriu uma apresentação na qual faz autocrítica e registra as transformações de pensamento ocorridas desde a escrita do texto original, as quais o fizeram olhar a temática da escravidão e das alforrias sob outros ângulos, explorando-a a partir de novas categorias conceituais. Foram incluídos, também, um Caderno de Imagens, com iconografia rara e inédita, e um Caderno de Documentos e Transcrições, disponibilizando a reprodução e a transcrição integral de documentos referenciais, explorados no texto.
Os velhos registros (e os novos também) podem ou não ser (re)lidos, no sentido mais amplo do term... more Os velhos registros (e os novos também) podem ou não ser (re)lidos, no sentido mais amplo do termo, pelos historiadores, que, de alguma forma, os escolhem, os elegem. É neste momento, geralmente, que se transformam em fontes para a história escrita a posteriori. É a transformação de um registro per se, de uma fonte em potencial em uma fonte histórica efetiva, que é lida diferentemente, em tempos e contextos igualmente diferentes. Essas fontes ou o que elas informam, são, portanto, resultados de suas historicidades, isto é, da historicidade de sua produção e das historicidades de seus usos e releituras ao longo dos tempos. 2 Então, pode-se afirmar que nem todo documento é fonte, embora toda fonte seja documento: o documento é o registro de qualquer tipo, já a fonte é o documento eleito, escolhido e (re)construído pelo historiador, que lhe dota (ou o destitui) de importância, a partir do diálogo estabelecido entre o conceito e a evidência.1 Aqui, a meu ver, está o COLÓQUIO DA HISTÓRIA, condição sine qua non para escrevê-la. Significa dizer, também, que um documento e/ou um corpus documental podem ser transformados em fontes, mas, também, podem voltar à categoria de registros "brutos", cuja “vida” dependerá sempre das respostas que podem oferecer às perguntas dos historiadores e de como seus ruídos podem sensibilizar os ouvidos deles.
Vídeo de divulgação do Dicionário das Mestiçagens na Ibero-América. Este é um produto do projeto de Iniciação Científica Voluntária PRPq-UFMG e de Estágio Voluntário do Centro de Estudos sobre a Presença Africana no Mundo Moderno-CEPAMM UFMG 2017-2018, desenvolvido junto aos alunos da Graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais.
Supervisão: Prof. Eduardo França Paiva Produção: Gabriel Souza Assunção (3o período) e Petrus Albino de Oliveira (3o período) Narração: Eduardo Rodrigues (3o período) Demais alunos participantes: Augusto Lopes de Carvalho; Luan Carlos Barros de Moura; Matheus Orlandi; Rafaela Carvalho da Silva (todos do 3o período)
Trata-se do décimo evento internacional vinculado ao Convênio de Cooperação entre a Universidade ... more Trata-se do décimo evento internacional vinculado ao Convênio de Cooperação entre a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidad de Sevilla (Espanha), que vigora desde 2013, sempre focando as áreas de história moderna, história da escravidão e história das mestiçagens. Nesta edição 2024 o eixo temático central são as fontes diversas e sua importância para os estudos da escravidão e das mestiçagens. Considera-se que esta preocupação se atualizou diante do avanço de recentes perspectivas historiográficas que voltam a querer prescindir das fontes. Serão, portanto, dias de reflexões vitais para a historiografia do tema, mas, também, para pensar-se em ações que visem valorizar nossos acervos arquivísticos, bibliográficos e museológicos, explorando sua potencialidade documental e sua relevância cultural, levando pesquisadores, autoridades e população em geral a se engajarem em movimento de restauração, manutenção e proteção desse patrimônio. As conferências e mesas redondas foram organizadas a partir de temas específicos, caros ao desenvolvimento dos estudos pretendidos no Convênio, e contarão com a participação de professores e pesquisadores especialistas, vinculados a universidades de várias regiões do Brasil e do exterior. De forma geral, serão abordados os seguintes temas: família e ciclos de vida; religião e religiosidades; artes e culturas; trabalho; liberdades e autonomias; linguagens; culturas jurídicas e memórias. As experiências dos participantes junto às fontes documentais de acervos espalhados por vários países serão apresentadas e discutidas, visando estreitar as relações entre grupos de pesquisas, assim como divulgar procedimentos metodológicos e perspectivas conceituais entre os assistentes, principalmente entre os estudantes de História. Além disto, pretende-se aprofundar comparações, sublinhar conexões históricas (sobretudo ibero-americanas e africanas), bem como incentivar o desenvolvimento de pesquisas compartilhadas em todos os níveis, a circulação docente e discente entre as universidades parceiras e o desenvolvimento de teses e dissertações a partir de estágios interinstitucionais previstos no Convênio. O Congresso é oportunidade de verticalizar o conhecimento sobre o eixo temático escolhido, vinculando-se isto à dinamização das relações institucionais.
Congresso Internacional - Convênio de Cooperação Universidade Federal de Minas Gerais-Universidad de Sevilla - Fontes para a história da escravidão e das mestiçagens – metodologias, tipologias e potencialidades FAFICH-UFMG, Campus Pampulha Belo Horizonte, 17 a 22 de novembro de 2024, 2024
Trata-se do décimo evento internacional vinculado ao Convênio de Cooperação entre a Universidade ... more Trata-se do décimo evento internacional vinculado ao Convênio de Cooperação entre a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidad de Sevilla (Espanha), que vigora desde 2013, sempre focando as áreas de história moderna, história da escravidão e história das mestiçagens. Nesta edição 2024 o eixo temático central são as fontes diversas e sua importância para os estudos da escravidão e das mestiçagens. Considera-se que esta preocupação se atualizou diante do avanço de recentes perspectivas historiográficas que voltam a querer prescindir das fontes. Serão, portanto, dias de reflexões vitais para a historiografia do tema, mas, também, para pensar-se em ações que visem valorizar nossos acervos arquivísticos, bibliográficos e museológicos, explorando sua potencialidade documental e sua relevância cultural, levando pesquisadores, autoridades e população em geral a se engajarem em movimento de restauração, manutenção e proteção desse patrimônio. As conferências e mesas redondas foram organizadas a partir de temas específicos, caros ao desenvolvimento dos estudos pretendidos no Convênio, e contarão com a participação de professores e pesquisadores especialistas, vinculados a universidades de várias regiões do Brasil e do exterior. De forma geral, serão abordados os seguintes temas: família e ciclos de vida; religião e religiosidades; artes e culturas; trabalho; liberdades e autonomias; linguagens; culturas jurídicas e memórias. As experiências dos participantes junto às fontes documentais de acervos espalhados por vários países serão apresentadas e discutidas, visando estreitar as relações entre grupos de pesquisas, assim como divulgar procedimentos metodológicos e perspectivas conceituais entre os assistentes, principalmente entre os estudantes de História. Além disto, pretende-se aprofundar comparações, sublinhar conexões históricas (sobretudo ibero-americanas e africanas), bem como incentivar o desenvolvimento de pesquisas compartilhadas em todos os níveis, a circulação docente e discente entre as universidades parceiras e o desenvolvimento de teses e dissertações a partir de estágios interinstitucionais previstos no Convênio. O Congresso é oportunidade de verticalizar o conhecimento sobre o eixo temático escolhido, vinculando-se isto à dinamização das relações institucionais.
As 11 Chicas da silva" desconhecidas Pesquisa revela que, como a escrava que virou filme, muitas ... more As 11 Chicas da silva" desconhecidas Pesquisa revela que, como a escrava que virou filme, muitas libertas conseguiram ascender economicamente no Brasil colonial
Os Inclinados De Sabará. Estampilhas do Império do Brasil., 2000
Selos postais e selos fiscais raros, encontrados em documentação do século XIX, no Arquivo da Cas... more Selos postais e selos fiscais raros, encontrados em documentação do século XIX, no Arquivo da Casa Borba Gato, IBRAM, Sabará, Minas Gerais, Brasil.
Uploads
Papers by Eduardo Paiva
igualmente, uma das maiores concentrações de forros e seus descendentes livres já vista até então (c. 123.000, já nos anos 1780). Considerando-se as informações existentes na documentação de variada natureza disponível nos arquivos, é possível inferir-se que parcela muito significativa das alforrias tenha derivado dos acertos formais e informais de pagamento parcelado, o que se transformou em um excelente negócio para os senhores, muitos deles ex-escravos e livres não brancos. Na longa duração, esse movimento sustentou o escravismo, pois o reproduziu e fortemente, ao mesmo tempo em que contribuiu para sua extinção, na medida em que gerou grande quantidade de mão de obra liberta e livre, diminuindo a dependência dos tráficos atlântico e interno e da própria escravidão, uma vez que a maioria desses homens e mulheres teve que trabalhar para se sustentar e às suas famílias. Portanto, estudar as coartações é essencial para se compreender a complexidade da história da escravidão e da liberdade no mundo moderno.
Abstract:
The records of coartación and manumission, recorded in documents named “letters”, “writings”, or “papers”, are extremely important sources for understanding the processes of slave liberation. In more urbanized areas, such as eighteenth-century Minas Gerais, these typologies were heavily used and were closely related to the constitution of an enormous population of freed people, who almost always paid for their change in legal status, either all at once or in negotiated installments, as in the case of coartación. Many of these freed people, and especially freedwomen – as they formed the majority – were mixed, that is, people identified or who identified themselves with “qualities” such as mestizo, pardo, mulatto, and cabra. But beyond the demographic and origin aspects of these people, what these documents reveal, without explicitly stating it, is that their existence in significant numbers was directly related to the dynamics of mestizajes. They were essential to the formation of that slave and mestizo society, to the formation of formal and matrifocal family nuclei among slaves and also among non-white people born free, and to their participation in the strong regional economy, from which they were able to pay for their manumission. Furthermore, they fostered social mobility, the socioeconomic rise of these people, their integration into significant parts of the urban “middle classes”, making possible the consolidation and diversification of their cultural expressions, and allowing many former slaves to become masters and mistresses who often repeated their own trajectories and freed their own slaves. The records of coartación and manumission, particularly when associated with others such as wills and post-mortem inventories, end up “revealing” these aspects. All of these diverse sources are extremely relevant. In the past, they guaranteed freedom to many former slaves and their descendants. In the present, they enable the historian to understand the historical complexity that produced them and gave them meaning.
2. La "calidad" y la "condición" servían para identificar, distinguir y clasificar individuos y grupos sociales en una sociedad organizada a partir del trabajo compulsorio, que promovió profundas mesclas biológicas y culturales y que se entendía como naturalmente desigual.
3. El léxico de la distinción y del mestizaje se "americanizó" desde la llegada de los europeos, se amplió y se tornó más complejo que el existente antes en Europa e entre los pueblos originales del continente que se llamó de América. En el siglo XVIII él ya se encontraba consolidado. Él nombró el nuevo y dio base para que se desarrollasen las relaciones sociales e las acciones de los grupos y para que se conformase el universo cultural ibero-americano.
igualmente, uma das maiores concentrações de forros e seus descendentes livres já vista até então (c. 123.000, já nos anos 1780). Considerando-se as informações existentes na documentação de variada natureza disponível nos arquivos, é possível inferir-se que parcela muito significativa das alforrias tenha derivado dos acertos formais e informais de pagamento parcelado, o que se transformou em um excelente negócio para os senhores, muitos deles ex-escravos e livres não brancos. Na longa duração, esse movimento sustentou o escravismo, pois o reproduziu e fortemente, ao mesmo tempo em que contribuiu para sua extinção, na medida em que gerou grande quantidade de mão de obra liberta e livre, diminuindo a dependência dos tráficos atlântico e interno e da própria escravidão, uma vez que a maioria desses homens e mulheres teve que trabalhar para se sustentar e às suas famílias. Portanto, estudar as coartações é essencial para se compreender a complexidade da história da escravidão e da liberdade no mundo moderno.
Abstract:
The records of coartación and manumission, recorded in documents named “letters”, “writings”, or “papers”, are extremely important sources for understanding the processes of slave liberation. In more urbanized areas, such as eighteenth-century Minas Gerais, these typologies were heavily used and were closely related to the constitution of an enormous population of freed people, who almost always paid for their change in legal status, either all at once or in negotiated installments, as in the case of coartación. Many of these freed people, and especially freedwomen – as they formed the majority – were mixed, that is, people identified or who identified themselves with “qualities” such as mestizo, pardo, mulatto, and cabra. But beyond the demographic and origin aspects of these people, what these documents reveal, without explicitly stating it, is that their existence in significant numbers was directly related to the dynamics of mestizajes. They were essential to the formation of that slave and mestizo society, to the formation of formal and matrifocal family nuclei among slaves and also among non-white people born free, and to their participation in the strong regional economy, from which they were able to pay for their manumission. Furthermore, they fostered social mobility, the socioeconomic rise of these people, their integration into significant parts of the urban “middle classes”, making possible the consolidation and diversification of their cultural expressions, and allowing many former slaves to become masters and mistresses who often repeated their own trajectories and freed their own slaves. The records of coartación and manumission, particularly when associated with others such as wills and post-mortem inventories, end up “revealing” these aspects. All of these diverse sources are extremely relevant. In the past, they guaranteed freedom to many former slaves and their descendants. In the present, they enable the historian to understand the historical complexity that produced them and gave them meaning.
2. La "calidad" y la "condición" servían para identificar, distinguir y clasificar individuos y grupos sociales en una sociedad organizada a partir del trabajo compulsorio, que promovió profundas mesclas biológicas y culturales y que se entendía como naturalmente desigual.
3. El léxico de la distinción y del mestizaje se "americanizó" desde la llegada de los europeos, se amplió y se tornó más complejo que el existente antes en Europa e entre los pueblos originales del continente que se llamó de América. En el siglo XVIII él ya se encontraba consolidado. Él nombró el nuevo y dio base para que se desarrollasen las relaciones sociales e las acciones de los grupos y para que se conformase el universo cultural ibero-americano.
Conferência para o PPGH-UNIMONTES
. O contexto histórico no qual as distinções foram nomeadas, definidas, justificadas, reproduzidas
. Um mundo naturalmente desigual, porque o Criador o fez assim
. Ler Antonio Manuel Hespanha sobre a ordem e as diferenças das coisas no Gênesis - Imbecilitas, p. 47.
. O sentido de se distinguir e as formas das distinções - O MUNDO NATURALMENTE DESIGUAL
. Nomear os diferentes no Mundo Mediterrâneo, na Península Ibérica e na Ibero-América
. Trânsitos intensos de gentes e culturas em longuíssimo período - guerras, invasões e conquistas, imposições culturais, mesclas biológicas e culturais, surgimento de novos grupos sociais, readaptações, superposições, convivências e coexistências
. Identificar os vários grupos, distingui-los, classificá-los e hierarquizá-los foi fundamental para exercer o poder, negociar alianças, garantir forças de trabalho e de defesa, projetar expansões, perpetuar linhagens dominantes e seu entourage
. Daí as ideias de pureza ou limpeza da ascendência, das origens e os famosos estatutos de limpeza de sangue
. Na Península Ibérica, equivalia à nobreza histórica e a cristãos-velhos
. Em um mundo naturalmente desigual, ordenado e hierarquizado houve mais que sentido, houve necessidade de identificar, distinguir e classificar indivíduos e grupos sociais
. Dar nomes a eles significou mais do que identificá-los: significou associar lugares sociais aos quais deveriam se ater; associá-los a certos tipos de definições morais, comportamentais e fisionômicas que definiam seu posicionamento na hierarquia social; atrelá-los a funções tais como governar, guerrear ou trabalhar; assim como, de certo modo, moldar o futuro de cada um, definindo-se os limites das trajetórias individuais, mesmo que muitos casos tenham desafiado e vencido esta lógica.
. As misturas biológicas e culturais foram uma dessas perspectivas desafiadoras e, por isto, muito precocemente, foram nomeadas, expressando-se todo o incômodo que representavam.
. Afinal, misturar-se significou corromper as linhagens puras e aproximar pretensos inferiores de superiores e vice-versa, dependendo do contexto.
Eduardo França Paiva (Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil).
II COLOQUIO INTERNACIONAL ANDATLAN: ANDALUCÍA EN EL MUNDO ATLÁNTICO MODERNO: CIUDADES Y REDES
Organiza: Proyecto de I+D “Andalucía en el mundo atlántico: actividades económicas, realidades sociales y representaciones culturales (s.XVI-XVII)”; Ministerio de Economía y Competitividad; Universidad de Sevilla; Facultad de Geografía e Historia; Departamento de Historia Moderna Universidad de Sevilla
Conferência pronunciada em 2009.
Memorial - trajetória, atuações, historicidades …………………………………………. 3
Introdução ……………………………………………………………………………..... 3
Ingresso no Mestrado em História – UFMG ……………………………………………. 4
Adquirindo experiência profissional e acadêmica – ensino, pesquisa e extensão ……… 7
O Doutorado na Universidade de São Paulo …………………………………………… 9
Ingresso na UFMG como professor do Departamento de História …………………….. 13
1999-2000 ……………………………………………………………………………… 13
2001 …………………………………………………………………………………….. 16
2002 …………………………………………………………………………………….. 20
2003 …………………………………………………………………………………….. 22
2004 …………………………………………………………………………………….. 26
2005 …………………………………………………………………………………….. 27
2006 …………………………………………………………………………………….. 29
2007 …………………………………………………………………………………….. 31
2008 …………………………………………………………………………………….. 35
2009 …………………………………………………………………………………….. 38
2010 …………………………………………………………………………………….. 44
2011 …………………………………………………………………………………….. 47
2012 …………………………………………………………………………………….. 51
2013 …………………………………………………………………………………….. 56
2014 …………………………………………………………………………………….. 60
2015 …………………………………………………………………………………...... 63
2016 …………………………………………………………………………………….. 71
Observações finais ……………………………………………………………………... 76
Anexo 1 ………………………………………………………………………………… 78
Anexo 2 ………………………………………………………………………………… 82
Anexo 3 ………………………………………………………………………………… 85
Anexo 4 ………………………………………………………………………………… 88
Anexo 5 ………………………………………………………………………………… 90
Anexo 6 ………………………………………………………………………………… 92
Anexo 7 ………………………………………………………………………………… 94
Anexo 8 ………………………………………………………………………………… 99
Anexo 9 ……………………………………………………………………………….. 104
Anexo 10 ……………………………………………………………………………… 106
Gostaria de ressaltar, para finalizar, o que ficou mais claro para mim mesmo, quando terminei a escrita deste Memorial. Refiro-me à articulação temática, metodológica, conceitual e historiográfica que foi se estabelecendo e se consolidando ao longo dos anos de trabalho, mas, sobretudo, a partir do segundo marco aqui adotado, isto é, a partir de meu ingresso no Doutorado. Isto se expressa, creio, de maneira explícita e contundente em minha produção mais recente, mas se mostra igualmente forte em minhas aulas e orientações, assim como em conferências que venho proferindo, entrevistas que venho concedendo e atividades de extensão que venho desenvolvendo, como curadorias de exposições, revitalização cultural de locais e monumentos, como a requalificação do Museu do Escravo, em Belo Vale, Minas Gerais, a pedido do Ministério Público Estadual. Para mim, o maior mérito de ter escrito este Memorial foi perceber com mais clareza a organização e as articulações que subjazem em minha trajetória intelectual e profissional. Espero que esta maior clareza possa me ajudar a realizar um trabalho ainda mais proveitoso, maduro e embasado o suficiente para dialogar com as diferenças de outrora e com as inevitáveis e necessárias transformações na História.
https://www.facebook.com/historiasocialUFMG/videos/868951120110352/
Aqui apresento um pouco do trabalho que tenho desenvolvido na Linha de Pesquisa História Social da Cultura, do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais. Os interessados em ingressar no Mestrado ou no Doutorado do PPGHis-UFMG podem assistir aos vídeos de apresentação dos professores acessando o link da Linha de Pesquisa HSC (https://www.facebook.com/search/top/…).
Abraços, Eduardo.
Publicado em 29 de dez de 2014
Em comemoração aos 25 anos do Programa de Pós-Graduação em História da UFMG, o IV EPHIS abordará como tema geral da edição de 2015 a importância e os rumos tomados pelos programas de pós-graduação em História no cenário acadêmico brasileiro.
O objeto é registro, é documento, torna-se fonte para o historiador.
O objeto fala! Há que se aprender a escutar MÉTODO
O objeto é marcado pelo tempo, pela história e as marcas podem falar também.
Marcel Proust sobre sua avó: “Na verdade, jamais se resignava a comprar qualquer objeto de que não se pudesse tirar algum proveito intelectual e sobretudo o que nos proporcionam as coisas belas, ensinando-nos a buscar deleite em outra parte que não nas satisfações do bem-estar e da vaidade. Até quando tinha que fazer algum presente chamado útil, quando tinha de dar uma poltrona, um serviço de mesa, uma bengala, procurava-os “antigos”, como se, havendo seu longo desuso apagado em tais coisas o caráter de utilidade, parecessem antes destinadas a contar a vida dos homens de outrora que a atender às necessidades de nossa vida atual. (...) Mas minha avó teria julgado mesquinho preocupar-se muito com a solidez de um móvel onde ainda se distinguiam uma flor, um sorriso, às vezes uma bela imaginação do passado. Até aquilo que nesses móveis correspondia a uma necessidade, como se apresentasse de uma feição a que estávamos desabituados, a encantava como esses antigos modos de dizer em que descobrimos uma metáfora, apagada, em nossa linguagem atual, pelo desgaste do hábito.” (Em busca do tempo perdido. No caminho de Swann. Trad. Mário Quintana.)
Ainda em fase de pesquisa, mas já meio que configurado, está surgindo finalmente o Vocabulário de qualidades e distinções da Ibero-América - séculos XV-XIX. Definições e empregos históricos de termos, expressões e categorias de identificação e de classificação sociais
Tratava-se de um mundo que se entendia como “naturalmente” desigual e para os cristãos, como Deus o havia criado.
Nada parecido com a ideia de igualdade dos homens apregoada a partir do fim do século XVIII, que, a bem da verdade, parece não ter se efetivado até hoje.
Nesse mundo era fundamental identificar e classificar o “outro” em relação a si, em um plano hierárquico
Isto justificou guerras, conquistas, domínios e submissões
De acordo com a pesquisa “Dinâmicas de mestiçagens e o mundo do trabalho nas sociedades ibero-americanas em perspectiva comparada séculos XVI a XVIII”, iniciada em 2011 pelo pesquisador Eduardo França Paiva, do Departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o termo mestiçagem é recente, mas, em regiões dominadas por espanhóis e portugueses, em séculos anteriores ao XIX (em que surgiu), tinha a função de identificar os indivíduos por “qualidade” e não somente por cor e cruzamentos biológicos.
Conferência para o PPGH-UNIMONTES
O vocabulário das distinções na Ibero-América - séculos XVI-XIX
. O contexto histórico no qual as distinções foram nomeadas, definidas, justificadas, reproduzidas
. Um mundo naturalmente desigual, porque o Criador o fez assim
. Ler Antonio Manuel Hespanha sobre a ordem e as diferenças das coisas no Gênesis - Imbecilitas, p. 47.
. O sentido de se distinguir e as formas das distinções - O MUNDO NATURALMENTE DESIGUAL
. Nomear os diferentes no Mundo Mediterrâneo, na Península Ibérica e na Ibero-América
. Trânsitos intensos de gentes e culturas em longuíssimo período - guerras, invasões e conquistas, imposições culturais, mesclas biológicas e culturais, surgimento de novos grupos sociais, readaptações, superposições, convivências e coexistências
. Identificar os vários grupos, distingui-los, classificá-los e hierarquizá-los foi fundamental para exercer o poder, negociar alianças, garantir forças de trabalho e de defesa, projetar expansões, perpetuar linhagens dominantes e seu entourage
. Daí as ideias de pureza ou limpeza da ascendência, das origens e os famosos estatutos de limpeza de sangue
. Na Península Ibérica, equivalia à nobreza histórica e a cristãos-velhos
. Em um mundo naturalmente desigual, ordenado e hierarquizado houve mais que sentido, houve necessidade de identificar, distinguir e classificar indivíduos e grupos sociais
. Dar nomes a eles significou mais do que identificá-los: significou associar lugares sociais aos quais deveriam se ater; associá-los a certos tipos de definições morais, comportamentais e fisionômicas que definiam seu posicionamento na hierarquia social; atrelá-los a funções tais como governar, guerrear ou trabalhar; assim como, de certo modo, moldar o futuro de cada um, definindo-se os limites das trajetórias individuais, mesmo que muitos casos tenham desafiado e vencido esta lógica.
. As misturas biológicas e culturais foram uma dessas perspectivas desafiadoras e, por isto, muito precocemente, foram nomeadas, expressando-se todo o incômodo que representavam.
. Afinal, misturar-se significou corromper as linhagens puras e aproximar pretensos inferiores de superiores e vice-versa, dependendo do contexto.
. Está aqui, então, o tema geral que deu origem à pesquisa, cujos resultados parciais apresento aqui.
. Portanto, voltar aos arquivos, aos documentos e às historicidades do ocorrido e do registrado, buscando maior aproximação com relação às realidades do passado e aos agentes históricos que as produziram se contrapunha às simplificações e generalizações produzidas pela historiografia daquele tempo, salvo exceções, obviamente.
. A chamada "historiografia revisionista" brasileira se ancorou nesta perspectiva, isto é, a de valorizar a complexidade e a pluralidade históricas.
. Foi ela que alçou a historiografia brasileira contemporânea à condição referencial que hoje ostenta.
. Na época, um de seus principais lastros, talvez o principal deles, era o tema "escravidão", ainda o principal "problema" histórico brasileiro.
. O tema da mesa de hoje nasce nesse período e junto aos procedimentos metodológicos que se desenvolvem a partir daí.
. O escravismo em Minas Gerais e nas áreas mais urbanizadas se tornam o centro das atenções e os estudos daí provenientes apresentam ao Brasil histórias da escravidão e dos escravos pouco ou nada conhecidas, distanciadas dos grandes modelos explicativos vigentes.
. Daí pra frente estudar e escrever História no Brasil sofreram profundas alterações, que não cabem ser analisadas nesta rápida apresentação.
. Mas, o que mais importa aqui, surgem da imensa massa documental que possuíamos e que passou cada vez mais a ser alvo de projetos de organização, grande quantidade de casos de ex-escravos e de seus descendentes diretos nascidos livres que se transformaram em senhores de escravos.
. E mais surpreendente, as mulheres apareciam claramente como as protagonistas mais importantes dessas histórias.
. Quarenta anos se passaram, milhares de dissertações, teses, artigos, capítulos e livros sobre a temática foram escritos e publicados, mas, grosso modo, essa história revisada ainda não foi incorporada ao ensino de História do Brasil, em todos os níveis de formação.
. Prevalece, grosso modo, volto a frisar, o dualismo senhor (branco e cruel) X escravo (negro e vitimizado), a ideia de reificação dos escravos e o "imaginário do tronco", alegoria fundada principalmente nos desenhos de Jean-Baptiste Debret (c. 1826) e de Johan Moritz Rugendas (c. 1835), que sumariam perfeitamente esse pensamento.
. Mas, as pesquisas realizadas indicam outros caminhos trilhados pela população de escravos no Brasil, ao longo dos quais, obviamente, ocorreram tratamentos violentos, crueldades e fugas, mas, também, autonomias, formação de famílias, muitas das quais matrifocais e mestiçadas, ascensão econômica e social, muitas alforrias, majoritariamente negociadas com os senhores, sendo parte substancial delas pagas, até em prestações!
. Quarenta anos depois, boa parte desses aspectos segue desconhecida dos brasileiros e continua surpreendendo até historiadores não especialistas no tema!
. Apenas esta última constatação mereceria muito mais atenção de nossa parte, mas seguimos mantendo-a em posição secundária!
. Não obstante todas as dificuldades que orbitam essa temática e a sua divulgação, temos a convicção de nosso papel como historiadores e professores de História continua lastreado na produção do conhecimento, resultante do diálogo respeitoso com o passado, com os registros produzidos no passado e com os agentes históricos que construíram este passado que escolhemos estudar, sem negligenciarmos nossa visão sempre marcada pelo nosso próprio tempo.
. Nesta mesa, "convidamos" alguns protagonistas ex-escravos que se transformaram em senhores de escravos a nos ajudarem a explicar a complexidade histórica da escravidão no Brasil.
. É este diálogo que tentaremos reproduzir a partir de agora.
Ainda no alvorecer do século XVIII as Minas Gerais já aguçavam o desejo de enriquecimento e autonomia entre as gentes do Brasil, incluídos escravos e forros, homens e mulheres. Afinal, espalharam-se as notícias sobre o ouro encontrado em profusão, em várias partes, e já se conheciam jazimentos de pedras preciosas e de outras com menor valor. O comércio de grande quantidade de produtos vindos de muitas partes já se fazia e era bastante lucrativo, pois a população aumentava vigorosamente e eram necessários escravos, alimentos, ferramentas, remédios, roupas, adereços, utensílios de toda sorte e já se consumiam itens mais sofisticados, como tecidos finos, prataria e jóias.
Publicado em 19 de jun de 2018
No segundo episódio da série “Diálogos Necessários”, o Ephis e a Varia Historia conversam com os professores Maria de Deus Manso (Univ. de Évora) e Eduardo França Paiva (UFMG) sobre a história dos trânsitos e mobilidades culturais. Confira agora a entrevista feira por Romilda Alves e, para saber mais, acesse o número 41 de Varia Historia!
Roteiro da entrevista: Romilda Alves (doutoranda, PPGH/UFMG) e David Barbuda (doutorando, PPGH/UFMG)
Categoria
Educação
Licença
Licença padrão do YouTube
africanas, crioulas, mulatas, pardas e a cultura material nas Minas Gerais do século XVIII
Eduardo França Paiva (UFMG)
Resumo:
Abordam-se aqui os objetos - principalmente joias/amuletos - usados por africanas e por suas descendentes crioulas, pardas e mulatas nas Minas Gerais do século XVIII, com destaque para corais, âmbar e berloques variados, que complementavam sua indumentária. Em seus testamentos e inventários post-mortem encontram-se muitos destes objetos, assim como ouro, prata, latão e algum marfim. Forras, senhoras de escravos e de bens imóveis, elas experimentaram ascensão econômica e social em sociedade escravista e acabaram fomentando complexa cultura material, que simbolizou a mobilidade social na qual se inseriam e que acabavam por intensificar. Suas trajetórias se confundem com a dinâmica histórica que marcou a formação da sociedade mineira (e ibero-americana), escravista e profundamente mestiçada, e o cotidiano delas fomentou conexões em escala planetária. De “voltas de corais” às saias de seda elas consumiram parte significativa dos itens disponibilizados pelo comércio mundial, engrossando, assim, camada média urbana surgida nesse contexto.
Biografia:
Professor Titular de História da Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisador do CNPq, professor e pesquisador visitante em universidades da Bélgica, Chile, Espanha e Portugal, autor de artigos, capítulos de livros e livros publicados no Brasil e no exterior. Seu último livro intitula-se Dar nome ao novo. Uma história lexical da Ibero-América entre os séculos XVI e XVIII - as dinâmicas de mestiçagens e o mundo do trabalho. (Autêntica, 2015) Atualmente, desenvolve pesquisas relacionadas ao Dicionário das mestiçagens na Ibero-América, no qual pretende apresentar conceitos e definições retirados de antigos documentos, que identificaram e distinguiram indivíduos e grupos sociais.
se viu, é um excelente exemplo para pensarmos essa globalização
desde o local. Consumidoras contumazes de produtos
variados, oferecidos pelo comércio intercontinental, elas movimentaram
as redes planetárias ao potencializarem a demanda
ao longo do período – desde escravos, até tecidos, louça, ferramentas
e utensílios domésticos –, provocando a inserção das
Minas Gerais no processo de globalização moderna. Por isto
mesmo, venho as designando mulheres globais, na tentativa de
sublinhar a notável atuação delas, bem como seu protagonismo
como agentes articuladoras de mundos apartados, de dinâmicas
internas e externas.
Vê-se claramente, portanto, a importância de conhecer a
complexa história de escravismo, de liberdades, de mestiçagens,
de enfrentamentos e de adaptações, de mobilidade, de superposições,
de convivência e de coexistência, desenvolvida pelos
moradores das Minas Gerais. Todo esse movimento resultou em
uma economia importantíssima nos séculos XVIII e XIX, bem
como na constituição de população muito diversa, que rapidamente
chegou a centenas de milhares de pessoas, o que promoveu
intensa movimentação comercial e cultural na região.
Neste livro, o leitor encontrará esforços individuais e ecos de reflexões coletivas que pretendem problematizar o emprego de antigos e novos conceitos por agentes históricos e pelos historiadores, buscando melhor compreender suas historicidades, assim como discutir a produção de anacronismos que vêm, por vezes, resultando em incompreensões, imprecisões, simplificações e generalidades que conformam histórias quase ficcionais. O tema central é a história da escravidão e das mestiçagens e há outros temas complementares. Pensá-los, assim com a História, sem anacronismos e sem o emprego de conceitos é algo impossível, uma vez que o campo de conhecimento e a operação metodológica são produtos temporais e, portanto, compõem-se de significados e de procedimentos eles mesmos históricos, variando de época para época, de geração para geração. Não obstante, tornar a História um campo fértil para anacronismos que visam, consciente e inconscientemente, acatar as conveniências do presente parece-nos escolha inaceitável. Buscamos, portanto, refletir sobre este problema central que envolve o trabalho dos historiadores. Por isto, tentamos “voltar” o mais próximo possível às definições, às compreensões e aos usos passados de conceitos empregados ao longo dos tempos por agentes históricos que os aplicaram para explicarem suas maneiras de viver; suas formas de organização social; suas fisionomias; seus costumes e conhecimentos; seu pensamento; as relações de trabalho; as “qualidades” e “condições” que identificavam, distinguiam e hierarquizavam indivíduos e grupos em sociedades escravistas e profundamente mescladas, biológica e culturalmente.Não temos dúvidas quanto à importância deste exercício historiográfico, que impede simplificações e reducionismos de um passado complexo, plural e autônomo com relação aos entendimentos processados a posteriori, ainda que inevitavelmente seja ele, sempre, parcial ou integralmente, versão formulada em outros tempos. Pensamos que por estes motivos a indagação que dá nome a este livro é muito adequada. Ela expressa claramente nosso incômodo em constatar diferenças brutais entre os testemunhos deixados no passado e versões sobre o mesmo passado formuladas posteriormente. De que estamos falando efetivamente quando empregamos hoje conceitos antigos, tais como escravo e mestiço? Algumas respostas a esta pergunta principal podem ser encontradas nesta obra.
Conceição de Sabará, sede da comarca do Rio das Velhas, contava com poucos anos de existência, mas já transformada em um dos
principais núcleos urbanos da recém-criada capitania das Minas
Gerais, uma moradora liberta ditou seu testamento. A preta forra
Catharina de Payva dizia ser natural da Guiné e ter sido escrava do
“reverendo padre Matheus de Payva”, que lhe havia passado carta de
alforria, assim como o sobrenome. Como era solteira e não tinha
descendência, em um gesto de gratidão (que não era inusitado!),
instituiu como herdeiro universal “de tudo que restar de minha
fazenda o meu senhor que foi”, isto é, o padre Matheus. E, se ele já
não estivesse vivo quando a testadora morresse, então sua própria
alma seria sua herdeira universal, o que significava dizer que todo o
montante existente, depois de pagas as dívidas e cumpridos os legados, deveria ser empregado em missas pela redenção dela.
Pelo que deixou relatado, Catharina já não era muito jovem e
demonstrava conhecer pessoas importantes de Sabará. Possivelmente, ela havia chegado lá como escrava, nos primeiros anos de
ocupação da região, talvez ainda no fim do século XVII. Em trinta
anos, mais ou menos, fora liberta, ascendera econômica e socialmente, tornara-se senhora de três escravos, associara-se à irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e formara uma rede
de contatos que incluía escravos, forros e “homens bons”, como
se costumava dizer. Isto ficava claro por dois motivos: primeiro, por instituir três testamenteiros, entre os quais, dois capitães, e
segundo, por indicar que seu corpo deveria ser enterrado na “tumba
da irmandade das santas almas para que lhe deixo de esmola dezasseis oitavas de oiro”, uma soma razoável, correspondente a 24$000
(vinte e quatro mil réis), o suficiente para comprar as joias que possuía, isto é, “huma gargantilha de filigrana e huns botõins tudo de
ouro e huns botois(sic) pequenos dabertura que tenho mais na mão
de hum negro escravo de Joze pereira que tudo pezava dez oitavas
de ouro [...] mais coatro pares de botoins de prata de anagoas”.
passou a integrar antigos circuitos intercontinentais de comércio, fomentando e impondo-lhes traços particulares sobre gostos, produção e consumo de objetos. Nesse contexto e associada a essa nova realidade, desenvolveuse uma história excepcional: a dos gostos, comércio e usos de marfins na Ibero-América, particularmente nas Minas Gerais setecentistas. Essas áreas, ressalte-se, já eram conectadas por caminhos, estradas e rios navegáveis nessa época. A Capitania de Minas Gerais era uma das regiões mais dinâmicas do mundo. Nessa região, nesse período, assim como em Potosí, na centúria anterior, os moradores tiveram largo acesso à pauta de itens oferecidos pelo comércio global . Entretanto, o marfim bruto, lavrado ou em pó, entrado nas Minas Gerais – em que pese a necessidade de mais pesquisas sobre o assunto – diferenciava-se parcialmente do comercializado na Europa. Isso ocorria, sobretudo, com os itens lavrados. Saleiros, píxides, olifantes e talheres em marfim africano, manufaturados na África, tão valorizados nos séculos XV e XVI, não chegaram, ao que parece, às Minas do Setecentos nem às outras áreas urbanizadas da Ibero-América, talvez por não despertarem aí o mesmo interesse. Em compensação, pequenos objetos de uso corriqueiro e imagens sacras aparecem na documentação existente nos arquivos.
Como entender as ausências e as presenças materiais de marfim nos
antigos documentos guardados em nossos arquivos, museus e bibliotecas? Em que medida as presenças e, sobretudo, as ausências de objetos de marfim são indícios reveladores da cultura material desenvolvida nas Minas Gerais e em outras regiões que desenvolveram perfil social semelhante na mesma época? Como lidar metodologicamente com as lacunas e os silêncios dos documentos e como transformá-los em aportes importantes para melhor se conhecer a história dos marfins no mundo moderno? Neste texto, compilo indagações, hipóteses e indícios sobre esses temas e reflito sobre o comércio, os gostos e os usos dos marfins na dinâmica Ibero-América, assim como analiso as conexões comerciais e culturais entre essa região e outras partes do mundo.
Link para baixar livro completo:
https://www.finotracoeditora.com.br/e-book-marfins-africanos-como-insignias-de-poder-contextos-de-producao-e-usos-dentro-e-fora-da-africa
hoje, resultou de um processo que se iniciou ainda no
século XVIII e que se consolidou ao longo do século XIX. Antes
deste gentílico abrangente, indivíduos eram identificados
por sua origem, ascendência e linhagem, marcadores “biológicos”,
geográficos, sociais, culturais e, até mesmo, religiosos.
Em sociedades escravistas e profundamente mestiçadas,
como a da América portuguesa, as formas de identificação,
distinção e hierarquização não pretenderam aglutinar diferentes,
mas, ao contrário, mantê-los separados e devidamente
classificados, desde a base até o topo da escala social. A
humanidade era definida, naqueles tempos, como um conjunto
de desiguais, que, naturalmente, ocupavam degraus inferiores
e superiores da hierarquia social.
Estas diversidades e distinções, havia séculos, vinham sendo submetidas a um léxico, que servia para nomear e
para qualificar pessoas e grupos sociais, assim como territórios
e formas de pensar e de viver de seus habitantes. E no
Novo Mundo sob o domínio ibérico esse léxico se ampliou
muito mais, recontando o passado das gentes que nasciam
aí ou que chegavam de outras plagas, bem como definindo,
ainda que parcialmente, o presente e até conduzindo o futuro
deles. Em sociedades fortemente hierarquizadas, ainda que
comportassem mobilidade notável, como foi o caso do Brasil,
as categorias de identidade e de distinção desempenhavam
também esse papel: o de “desenhar” parcela substancial da
vida e das memórias das pessoas.
In a somewhat unconventional historical approach, the paper starts in nineteenth-century Rio de Janeiro, proceeds to eighteenth-century Minas Gerais, then turns to the global trade networks of the fifteenth to seventeenth centuries, and finally returns to eighteenth- and nineteenth-century Brazil. The instruments I have chosen to guide us through the different cultural and temporal contexts of this journey are what I term “mediator-objects,” simultaneously “memory bearers” and a type of bridge that enables us to link, over time and space, nominally unconnected cultural habits, practices and appropriations. These mediator-objects comprise colorful fabrics, seed pearls (small pearls), amber, and especially corals, used by women in West Africa and by freed women and their descendants in Portuguese America.
Agradeço aos editores, principalmente ao Douglas Lima, o interesse pelo texto e o empenho por trazê-lo integralmente a público, depois de tantos anos.
Eduardo França Paiva
Tomando como base uma série de 357 testamentos de homens e mulheres livres e libertos, moradores na Comarca do Rio das Mortes - Capitania de Minas Gerais, registrados entre 1720 e 1785, empreendeu-se um estudo sobre o universo colonial e sobre o cotidiano das relações escravistas na região. O cruzamento das informações documentais com as discussões apresentadas por uma bibliografia extensa ensejaram uma análise geral sobre aquele contexto histórico, privilegiando, contudo, três temas fundamentais: as estratégias de resistência empregadas pela população negras contra o sistema escravista; o significativo número de alforrias e de coartações (alforrias pagas parceladamente); e, evidentemente, a grande população forra existente nas Minas Gerais e a atuação das mulheres (cativas e libertas) na construção daquela sociedade setecentista. Foi possível vislumbrar, assim, uma realidade ainda pouco conhecida, na qual escravos, libertos e seus descendentes assumiram, efetiva e continuamente, o papel de agentes históricos e, portanto, de transformadores de seu tempo. Nessa 3a edição o autor inseriu uma apresentação na qual faz autocrítica e registra as transformações de pensamento ocorridas desde a escrita do texto original, as quais o fizeram olhar a temática da escravidão e das alforrias sob outros ângulos, explorando-a a partir de novas categorias conceituais. Foram incluídos, também, um Caderno de Imagens, com iconografia rara e inédita, e um Caderno de Documentos e Transcrições, disponibilizando a reprodução e a transcrição integral de documentos referenciais, explorados no texto.
Tomando como base uma série de 357 testamentos de homens e mulheres livres e libertos, moradores na Comarca do Rio das Mortes - Capitania de Minas Gerais, registrados entre 1720 e 1785, empreendeu-se um estudo sobre o universo colonial e sobre o cotidiano das relações escravistas na região. O cruzamento das informações documentais com as discussões apresentadas por uma bibliografia extensa ensejaram uma análise geral sobre aquele contexto histórico, privilegiando, contudo, três temas fundamentais: as estratégias de resistência empregadas pela população negras contra o sistema escravista; o significativo número de alforrias e de coartações (alforrias pagas parceladamente); e, evidentemente, a grande população forra existente nas Minas Gerais e a atuação das mulheres (cativas e libertas) na construção daquela sociedade setecentista. Foi possível vislumbrar, assim, uma realidade ainda pouco conhecida, na qual escravos, libertos e seus descendentes assumiram, efetiva e continuamente, o papel de agentes históricos e, portanto, de transformadores de seu tempo. Nessa 3a edição o autor inseriu uma apresentação na qual faz autocrítica e registra as transformações de pensamento ocorridas desde a escrita do texto original, as quais o fizeram olhar a temática da escravidão e das alforrias sob outros ângulos, explorando-a a partir de novas categorias conceituais. Foram incluídos, também, um Caderno de Imagens, com iconografia rara e inédita, e um Caderno de Documentos e Transcrições, disponibilizando a reprodução e a transcrição integral de documentos referenciais, explorados no texto.
2
Então, pode-se afirmar que nem todo documento é fonte, embora toda fonte seja documento: o documento é o registro de qualquer tipo, já a fonte é o documento eleito, escolhido e (re)construído pelo historiador, que lhe dota (ou o destitui) de importância, a partir do diálogo estabelecido entre o conceito e a evidência.1 Aqui, a meu ver, está o COLÓQUIO DA HISTÓRIA, condição sine qua non para escrevê-la. Significa dizer, também, que um documento e/ou um corpus documental podem ser transformados em fontes, mas, também, podem voltar à categoria de registros "brutos", cuja “vida” dependerá sempre das respostas que podem oferecer às perguntas dos historiadores e de como seus ruídos podem sensibilizar os ouvidos deles.
Vídeo de divulgação do Dicionário das Mestiçagens na Ibero-América. Este é um produto do projeto de Iniciação Científica Voluntária PRPq-UFMG e de Estágio Voluntário do Centro de Estudos sobre a Presença Africana no Mundo Moderno-CEPAMM UFMG 2017-2018, desenvolvido junto aos alunos da Graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais.
Supervisão: Prof. Eduardo França Paiva
Produção: Gabriel Souza Assunção (3o período) e Petrus Albino de Oliveira (3o período)
Narração: Eduardo Rodrigues (3o período)
Demais alunos participantes: Augusto Lopes de Carvalho; Luan Carlos Barros de Moura; Matheus Orlandi; Rafaela Carvalho da Silva (todos do 3o período)
Belo Horizonte, 12 de junho de 2018
link de acesso: https://drive.google.com/file/d/1voEEzFxbnlloThzm0TXPM5HBgOTyZ2mi/view
específicos, caros ao desenvolvimento dos estudos pretendidos no Convênio, e contarão com a participação de professores e pesquisadores especialistas, vinculados a universidades de várias regiões do Brasil e do exterior. De forma geral, serão abordados os seguintes temas: família e ciclos de vida; religião e religiosidades; artes e culturas; trabalho; liberdades e autonomias; linguagens; culturas jurídicas e memórias. As experiências dos participantes junto às fontes documentais de acervos espalhados por vários países serão apresentadas e discutidas, visando estreitar as relações entre grupos de pesquisas, assim como divulgar procedimentos metodológicos e perspectivas conceituais entre os
assistentes, principalmente entre os estudantes de História. Além disto, pretende-se aprofundar comparações, sublinhar conexões históricas (sobretudo ibero-americanas e africanas), bem como incentivar o desenvolvimento de pesquisas compartilhadas em todos os níveis, a circulação docente e discente entre as universidades parceiras e o
desenvolvimento de teses e dissertações a partir de estágios
interinstitucionais previstos no Convênio. O Congresso é
oportunidade de verticalizar o conhecimento sobre o eixo temático escolhido, vinculando-se isto à dinamização das relações institucionais.
Gerais e a Universidad de Sevilla (Espanha), que vigora desde 2013, sempre focando as áreas de história moderna,
história da escravidão e história das mestiçagens. Nesta edição 2024 o eixo temático central são as fontes diversas e
sua importância para os estudos da escravidão e das mestiçagens. Considera-se que esta preocupação se atualizou
diante do avanço de recentes perspectivas historiográficas que voltam a querer prescindir das fontes. Serão, portanto,
dias de reflexões vitais para a historiografia do tema, mas, também, para pensar-se em ações que visem valorizar
nossos acervos arquivísticos, bibliográficos e museológicos, explorando sua potencialidade documental e sua relevância
cultural, levando pesquisadores, autoridades e população em geral a se engajarem em movimento de restauração,
manutenção e proteção desse patrimônio. As conferências e mesas redondas foram organizadas a partir de temas
específicos, caros ao desenvolvimento dos estudos pretendidos no Convênio, e contarão com a participação de
professores e pesquisadores especialistas, vinculados a universidades de várias regiões do Brasil e do exterior. De forma
geral, serão abordados os seguintes temas: família e ciclos de vida; religião e religiosidades; artes e culturas; trabalho;
liberdades e autonomias; linguagens; culturas jurídicas e memórias. As experiências dos participantes junto às fontes
documentais de acervos espalhados por vários países serão apresentadas e discutidas, visando estreitar as relações
entre grupos de pesquisas, assim como divulgar procedimentos metodológicos e perspectivas conceituais entre os
assistentes, principalmente entre os estudantes de História. Além disto, pretende-se aprofundar comparações, sublinhar
conexões históricas (sobretudo ibero-americanas e africanas), bem como incentivar o desenvolvimento de pesquisas
compartilhadas em todos os níveis, a circulação docente e discente entre as universidades parceiras e o
desenvolvimento de teses e dissertações a partir de estágios interinstitucionais previstos no Convênio. O Congresso é
oportunidade de verticalizar o conhecimento sobre o eixo temático escolhido, vinculando-se isto à dinamização das
relações institucionais.