Falsificação de Documentos em Processos Eletrônicos
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Sobre este e-book
A difusão, nos tribunais brasileiros, a partir da Lei nº 11.419/2006, dos chamados "processos eletrônicos", nos quais toda a documentação encartada, inclusive aquela probatória, é oferecida no formato eletrônico, estimulou a ocorrência de falsificações por meios digitais. Tal processo é facilitado pelo acesso difuso e barato a modernos equipamentos informáticos e a poderosos softwares gráficos.
Documentos falsificados digitalmente são utilizados para as mais variadas finalidades, desde criação de empresas, abertura de contas bancárias e realização de operações comerciais ou financeiras até a produção de provas falsas em processos judiciais.
A gama de usos de documentos falsificados digitalmente é extremamente ampla e abrange múltiplos e fundamentais aspectos de segurança.
Este livro trata questões de documentoscopia e grafoscopia relacionadas a documentos de todos os tipos, falsificados, ao menos em parte, por meios digitais e/ou apresentados em formato digital, mesmo que sucessivamente produzidos também em formato cartáceo.
Também são tratadas outras técnicas e metodologias que podem ser utilizadas para detectar falsificações em e-mails, imagens e outros tipos de documentos digitais.
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Falsificação de Documentos em Processos Eletrônicos - Lorenzo Parodi
Bibliografia
1
Premissas e Elementos de Base
Com o advento dos modernos computadores, dos avançados softwares de gráfica, dos escâneres (scanners
, em língua inglesa) e das impressoras de qualidade (jato de tinta e laser), e, mais em geral, das elevadas capacidades gráficas que esses conjuntos proporcionam, começaram a aparecer também as falsificações de documentos realizadas através do aproveitamento dos meios digitais, que, hoje, são poderosos, amplamente disponíveis e de uso econômico.
Tais documentos falsificados são utilizados para as mais variadas finalidades, desde criação de empresas, abertura de contas bancárias e realização de operações comerciais ou financeiras (fraudulentas ou não), até a produção de provas falsas em processos judiciais. A gama de usos de documentos falsificados digitalmente é extremamente ampla e abrange múltiplos e fundamentais aspectos de segurança.
Qualquer documento pode ser utilizado como prova (art. 369 NCPC e artigos 231 e 232 CPP); porém, a admissibilidade e a validade de um documento em formato eletrônico, como meio de prova em um processo judicial, dependem da garantia e inequivocidade de sua autoria e origem e da certeza de sua integridade (ou seja, a garantia de que não foi alterado desde sua origem até chegar no processo). É importante observar que nem todo tipo de documento em formato digital pode oferecer tais certezas e garantias.
É evidente que a criação e difusão, nos tribunais brasileiros, a partir da entrada em vigor da Lei nº 11.419/2006, dos chamados processos digitais
, ou eletrônicos
, nos quais toda a documentação encartada, inclusive aquela probatória, é oferecida no formato digital (ou seja, em prevalência, cópias escaneadas de documentos, convertidas para o formato PDF), estimulou ainda mais a ocorrência de falsificações por meios digitais.
Este livro aborda questões de documentoscopia e grafoscopia relacionadas, especificamente, a documentos de todos os tipos, falsificados, ao menos em parte, por meios digitais e/ou apresentados em formato digital (arquivos digitais), mesmo que sucessivamente produzidos também em formato cartáceo. A obra não pretende, porém, ser um tratado exaustivo de documentoscopia nem de grafoscopia, sendo seu alcance limitado aos tipos de documentos e falsificações já mencionados. Também são tratadas outras técnicas e metodologias que podem ser utilizadas para detectar falsificações em determinados tipos de documentos digitais.
É necessário definir o que é um documento digital. Existem essencialmente duas tipologias de documentos digitais. Na primeira trata-se de documentos que foram originados por um computador ou outro sistema eletrônico, sem nunca terem sido impressos ou transferidos em papel (é o caso de uma fotografia digital, de um documento escrito em Word e transformado em um arquivo PDF, de um logotipo criado num software de gráfica e salvo em um arquivo JPG etc.). Na segunda trata-se de documentos que foram convertidos de um formato físico (ou seja normalmente, um documento em suporte cartáceo) para um formato digital através de um processo de escaneamento ou fotografia digital ou outro. Podem ainda existir documentos com origem mista, sendo que parte do documento tem origem puramente digital enquanto outra foi escaneada a partir de um suporte físico.
Um documento digital é composto por bits (8 bits compõem um byte), cada um representando pontos ou pequenos pedaços
da informação contida no documento. Quanto maior o número de bits, maior o número de pontos (ou pixels) representativos de informações, e consequentemente maior a qualidade ou resolução do documento e sua proximidade/semelhança com o eventual original analógico (no caso de o documento digital ter origem em um documento físico digitalizado).
Na realidade dos tribunais se encontram documentos com qualidade muito variável, dependendo da origem e disponibilidade, além de, em alguns casos, limitações técnicas dos sistemas dos tribunais. Um documento original, escaneado profissionalmente pelo advogado e encaminhado para protocolo no processo eletrônico, terá provavelmente uma qualidade muito boa. Outros casos, como o de cheques arquivados pelos bancos (através do processo de microfilmagem digital
), podem ter qualidade extremamente baixa, podendo chegar a dificultar sobremaneira qualquer análise. Oportuno se atentar ainda ao caso (nada incomum) de documentos que têm baixa qualidade intencional
, para disfarçar eventuais adulterações ou falsificações.
Podemos ainda dividir os documentos em duas outras grandes categorias: aqueles onde há algum grafismo manual (assinaturas, texto escrito à mão, formulários com preenchimentos manuais etc.) e aqueles que não possuem essa característica (e-mails, notas fiscais automatizadas, extratos bancários etc.) e que, portanto, não estão sujeitos à aplicação de técnicas grafoscópicas.
Um breve resumo dos casos mais comuns de uso de documentos falsificados digitalmente (todos com possíveis consequências, diretas ou indiretas, em processos judiciais) pode ser o seguinte:
1. Prover provas falsas em processos judiciais das mais variadas naturezas (trabalhistas, cíveis, criminais, administrativos, tributários, societários, sucessórios, familiares etc.), tanto no que diz respeito ao assunto supostamente comprovado pelo teor do documento falsificado quanto no que diz respeito a sua origem, autoria e data (que também pode ser falsificada, ver item 5.6).
2. Integrar contratos comerciais ou transações de diversas naturezas (inclusive financiamentos, compras/vendas, assinatura de serviços, locações etc.).
3. Ser meio de identificação (originais
ou cópias de documentos de identidade ou de certidões de nascimento ou casamento) para os mais diversos fins.
4. Formar a base para conseguir outros documentos autênticos ou autorizações ou ainda serviços públicos de diversas naturezas.
5. Homologar testamentos ou outros procedimentos inerentes a heranças e sucessões. Pense, por exemplo, nas consequências da comprovação (através da falsificação de uma autenticação com indicação da data) da assinatura de algum contrato ou doação, ou, ainda, testamento, por parte de uma determinada pessoa em data anterior à de seu falecimento.
6. Serem utilizados para conseguir benefícios, direitos, acesso a recursos, bens ou serviços, ou, ainda, para participar de licitações e concorrências.
Tais documentos podem ter naturezas muito diferentes, dependendo do uso pretendido. Alguns exemplos, entre muitos outros possíveis, de documentos potencialmente falsificados por meios digitais e encontrados nos casos e situações anteriormente descritos são:
1. Contratos e acordos em original ou cópia, autenticada ou não.
2. Testamentos e doações em original ou cópia, autenticada ou não.
3. Recibos, promissórias ou declarações em original ou cópia, autenticada ou não.
4. Documentos de identidade e afins em original
ou cópia, autenticada ou não.
5. E-mails e mensagens/comunicações em geral.
6. Comprovantes de vários tipos (endereço, renda, extratos etc.) e ingressos, em original ou cópias, autenticadas ou não.
7. Atos públicos (certidões, procurações, decisões, alvarás etc.) em original ou cópia, autenticada ou não.
8. Cédulas de dinheiro e folhas de cheques.
9. Cartas em original ou cópia, autenticada ou não.
10. Receitas e certificados médicos em original ou cópia, autenticada ou não.
Como já dito, o advento dos processos judiciais digitais e de outros procedimentos por meios digitais, tanto no setor público quanto no privado (bancos, seguradoras, financeiras, imobiliárias etc.), fomentou grandemente o aparecimento, cada dia mais frequente, de falsificações digitais mais ou menos sofisticadas. Um documento dessa natureza, usado como prova em um processo, pode facilmente dar origem a graves injustiças e a decisões equivocadas, por serem baseadas em um documento falso.
Por todas essas razões, é de primordial importância adquirir a capacidade de identificar indícios de possível falsificação, de forma a poder submeter os documentos suspeitos à apropriada perícia técnica, antes que estes possam causar danos irreversíveis. Isso, inclusive, à luz das modalidades e dos prazos previstos nos diplomas legais para a arguição de falsidade (tanto em processos cíveis quando em processos penais) e a consequente abertura de um incidente de falsidade (ver item 1.1, sobre este assunto).
Merece destaque a importância que tal identificação precoce de indícios de falsificação tem por parte dos julgadores. Uma tutela antecipada
, em um processo eletrônico, fundamentada em documentos falsificados digitalmente, pode gerar prejuízos graves e dificilmente recuperáveis.
Trabalhar com documentos em cópia ou em formato digital não permite realizar uma perícia conclusiva quanto à autenticidade. Na melhor hipótese, será possível constatar a ausência de indícios de falsidade. Por outro lado, quando existirem elementos suficientes e incontestáveis, será possível a comprovação conclusiva de uma eventual falsidade. Por essa razão pode ser errado afirmar, sempre, a impossibilidade de realizar uma perícia quando não presentes os documentos originais. Isso porque é perfeitamente possível que as cópias presentes (digitais ou não) sejam suficientes para comprovar a falsidade de, ao menos, um elemento (o que viciaria de falsidade o documento como um todo) e, assim, seja possível entregar um laudo pericial consistente e útil.
Importante lembrar que meios digitais podem ser usados também para falsificar documentos físicos (em papel), contando com a qualidade que pode ser alcançada pelas modernas impressoras, as quais, muitas vezes, tornam difícil a distinção, a olho nu, entre uma cópia e um original, e também a possibilidade (ver capítulo específico neste livro) de falsificar autenticações de cópias e reconhecimentos de assinaturas.
Necessário ainda deixar claro, mais uma vez, que este livro não pretende tratar de forma completa as técnicas tradicionais da grafoscopia e documentoscopia, que dificilmente poderiam ser aplicadas de forma plena em documentos originados digitalmente. Contudo, é oportuno sublinhar a extrema utilidade do conhecimento das bases da grafoscopia e documentoscopia para a condução exaustiva e eficaz das análises descritas neste livro. Por essa razão foi também introduzido um capítulo descrevendo sumariamente os conceitos de base das análises grafoscópicas. De forma geral, serão abordadas somente as técnicas que tenham relevância e utilidade dentro do escopo deste livro.
Na bibliografia presente nas últimas páginas, são indicadas ainda algumas relevantes obras sobre grafoscopia e documentoscopia, que, em parte, utilizei como referência e certamente são recomendadas a quem desejar se aprofundar nesse segmento. Fundamental observar que os assuntos tratados neste livro são objeto de contínuo desenvolvimento de novas técnicas e, por isso, requerem constante atualização e