A Ilha do Dr. Moreau
De H.G. Wells
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Sobre este e-book
H.G. Wells
H. G. Wells (1866–1946) was an English writer and is commonly regarded as the father of science fiction. He authored more than 80 short stories and over 50 novels, including ‘The Time Machine’ (1895), ‘The Invisible Man’ (1897), and ‘The War of the Worlds’ (1898). He was nominated for the Nobel Prize in Literature four times and is widely considered a literary genius and futurist visionary.
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A Ilha do Dr. Moreau - H.G. Wells
Esta é uma publicação Principis, selo exclusivo da Ciranda Cultural
© 2020 Ciranda Cultural Editora e Distribuidora Ltda.
Traduzido do original
The island of dr. Moreau
Texto
H. G. Wells
Tradução
Mayra Csatlos
Preparação
Regiane Miyashiro
Revisão
Aiko Mine
Produção editorial e projeto gráfico
Ciranda Cultural
Ebook
Jarbas C. Cerino
Imagens
grynold/Shutterstock.com; Darkness222/Shutterstock.com; OK-SANA/Shutterstock.com;
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD
W453i Wells, H. G., 1866-1946
Ilha do Dr. Moreau [recurso eletrônico] / H. G. Wells ; traduzido por Mayra Csatlos Peres. - Jandira, SP : Principis, 2020.
144 p. ; ePUB ; 1,8 MB. – (Literatura Clássica Mundial)
Tradução de: The Island of dr. Moreau
Inclui índice. ISBN: 978-65-5552-037-8 (Ebook)
1. Literatura inglesa. 2. Romance. I. Peres, Mayra Csatlos. II. Título. III. Série.
Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410
Índice para catálogo sistemático:
1. Literatura inglesa : Romance 823
2. Literatura inglesa : Romance 821.111-31
1a edição em 2020
www.cirandacultural.com.br
Todos os direitos reservados.
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No primeiro dia de fevereiro de 1887, o Lady Vain naufragou após colidir com uma embarcação à deriva a aproximadamente 1 grau de latitude Sul e 107 graus de longitude Oeste.
No quinto dia de janeiro de 1888, ou seja, onze meses e quatro dias após o ocorrido, meu querido tio, Edward Prendick, um reservado cavalheiro, o qual estivera a bordo do Lady Vain na província de Callao e, por consequência, tido como morto, foi resgatado a 5 graus e 3 minutos
de latitude Sul, e 101 graus de longitude Oeste em um pequeno barco de
nome ilegível, o qual pertencera à escuna desaparecida Ipecacuanha.
No entanto, ele prestara informações tão estrambólicas sobre o ocorrido que foi tido como louco, tendo inclusive alegado que não se lembrava de como teria escapado do Lady Vain. Dadas tais circunstâncias, seu estado foi avaliado por diversos psicólogos, que concluíram ser um caso incomum decorrente de um lapso de memória pós-traumático. A narrativa a seguir foi encontrada em meio aos seus documentos por quem vos fala, seu sobrinho e herdeiro, mas sem qualquer pedido de publicação por parte dele.
A única ilha conhecida na região em que meu tio foi resgatado chama-
-se Ilha dos Nobres, uma ilhota vulcânica e inabitada que havia sido visitada apenas em 1891 pela companhia H. M. S. Scorpion. Seus velejadores que, então, desembarcaram na ilhota não encontraram nada além de mariposas brancas peculiares, javalis, lebres e ratazanas atípicas. Haja vista tais circunstâncias, asseguro-lhes que esta narrativa é, em sua mais tenra essência, inusitada. Portanto, em razão de tal excentricidade, creio que divulgá-la não aborreceria meu tio. Em seu nome e memória, afirmo: sim, ele sumiu a 5 graus de latitude Sul e 105 graus de longitude Leste e, sim, reapareceu na mesma extensão do oceano após onze meses. De alguma maneira, ele conseguiu sobreviver durante esse intervalo. Segundo testemunhos coletados em diversos portos do Pacífico Sul, a escuna Ipecacuanha e o capitão bêbado John Davies teriam iniciado
a jornada pelos oceanos com uma puma e outros animais a bordo em janeiro de 1887, no entanto, a embarcação teria desaparecido (com uma grande quantidade de coco seco a bordo), após a partida de Bayna, em dezembro de 1887, data que coincide com a história de meu tio, rumo a um destino incógnito.
Charles Edward Prendick
(A história escrita por Edward Prendick)
Não pretendo acrescentar nada mais ao que foi dito a respeito do naufrágio do Lady Vain. Como todos sabem, ele colidiu com uma embarcação naufragada dez dias após a saída de Callao.
Com sete velejadores a bordo, o escaler foi resgatado após dezoito dias pela canhoneira H. M. Murta, e sua terrível história de privação tornou-se famosa como "o pior caso do tipo Medusa¹". No entanto, devo acrescentar outro detalhe possivelmente tão horripilante quanto bizarro à história publicada sobre o Lady Vain. Até o momento, supôs-
-se que os quatro homens a bordo teriam sucumbido, todavia, essa informação é um enorme equívoco, e detenho evidências contundentes para afirmá-lo: eu mesmo estava a bordo do Lady Vain.
Em primeiro lugar, devo dizer que nunca houve quatro homens na embarcação; éramos três homens apenas. Constans, que era considerado pelo capitão como o "intrépido²", felizmente para nós e infelizmente para ele, não pôde nos alcançar no momento do acidente. Deslizou pelo emaranhado de cordas embaixo do gurupés danificado, mas uma pequena corda enroscou em seu calcanhar e o pendurou de cabeça para baixo antes que ele caísse e colidisse com um mastro, ou obstáculo, que flutuava na água. Tentamos trazê-lo de volta à superfície, mas fracassamos.
Digo que fomos sortudos por Constans não ter nos alcançado, mas, na verdade, a sorte foi dele próprio, já que, após o acidente, nos restaram apenas um punhado de biscoitos encharcados e um pouco de água, tamanho era o despreparo da embarcação e tão inesperado fora o ocorrido.
Então, tentamos chamar a atenção de umas pessoas dentro de uns botes, que supostamente estariam mais bem aprovisionadas do que nós (apesar das aparências o negarem), mas não conseguiram nos ouvir e, na manhã seguinte, quando a garoa deu-nos uma trégua, pouco depois do meio-dia, não as víamos mais. Na verdade, sequer podíamos levantar, tamanho era o balanço da popa e da proa. Os outros dois homens que haviam escapado comigo eram Helmar, tão passageiro quanto eu,
e um marinheiro cujo nome desconheço, um homem grande e musculoso, que tinha uma gagueira peculiar.
À deriva, estávamos famintos e, mais tarde, quando a já escassa água
se esgotou por completo, nos vimos atormentados durante oito
longos dias pela sede excruciante.
Após o segundo dia à deriva, o mar transformou-se em calmaria.
É quase impossível que você, leitor, consiga imaginar o que foram esses oito dias. Com sorte, faltam-lhe experiências para tal imaginação.
Após o primeiro dia, mal nos dirigíamos uns aos outros, apenas permanecemos em nossos lugares. Somente olhávamos para o horizonte, ou melhor, testemunhávamos, com olhos a cada dia mais abugalhados e abatidos, a miséria e a fraqueza tomarem conta de nossos companheiros.
O Sol tornou-se impiedoso. A água acabou no quarto dia, quando começamos a alucinar. Nossos olhares diziam tudo o que nossas bocas não eram capazes. Creio que esse foi, na verdade, o sexto dia antes que Helmar desse voz ao que todos estávamos pensando. Lembro-me de nossas vozes tão ásperas e enfraquecidas a ponto de termos de nos aproximar uns dos outros para que fôssemos ouvidos. Levantei-me com todas as forças em uma tentativa de afundar o bote e perecer junto aos tubarões que nos seguiam há dias; mas quando Helmar, em vez disso, propôs que bebêssemos a água do mar, o marinheiro discordou.
Mal conseguia me mexer naquela noite em que o marinheiro sussurrava insistentemente para Helmar. Sentei-me na proa com um canivete em mãos, embora não tivesse forças para lutar. Na manhã seguinte, concordei com a proposta de Helmar: tiramos cara ou coroa e o marinheiro, o mais forte de todos, saiu na pior. Tendo discordado, atacou Helmar com as mãos. Travaram uma briga e quase se levantaram. Arrastei-me até eles e, na tentativa de auxiliar Helmar, puxei o marinheiro pelas pernas, que, por sua vez, se desequilibrou com a movimentação e rolou para fora do barco, levando Helmar consigo. Os dois afundaram como duas pedras. Lembro-me de rir inesperadamente sem entender por quê.
Em seguida, deitei-me em um dos assentos por não sei quanto tempo, pensando que se tivesse forças, beberia água do mar e me mataria lentamente. E, enquanto permanecia lá, deitado, sem iniciativa, vi uma embarcação vir até mim direto do céu. Minha mente estava provavelmente desvairando, no entanto, lembro-me de tudo perfeitamente. Lembro-me de como minha cabeça balançava com o barco, e de como o horizonte dançava no mesmo ritmo. Recordo-me ainda da convicção de estar morto e da piada que seria se por tão pouco me encontrassem vivo.
Durante um período interminável, como pareceu, permaneci deitado com a cabeça no assento enquanto observava a escuna (era uma pequena embarcação com proa e popa) emergir do mar. Ela balançava para a frente e para trás em um compasso crescente, já que navegava morta pelos ventos. Nunca passou pela minha cabeça chamar sua atenção e não me lembro de mais nada após tê-la visto. Só me lembro de acordar em uma pequena cabine em sua popa.
Ainda tenho uma vaga lembrança de ter sido carregado pelos corredores, bem como de um rosto redondo, cheio de sardas e repleto de cabelos ruivos, o qual me fitava por entre os baluartes. Também tenho a impressão de ter visto um rosto cuja pele era escura e os olhos eram bem grandes. Lembro-me desses olhos bem próximos dos meus; mas este creio ter sido um pesadelo, até que o encontrei novamente. Bem, depois, colocaram algo em minha boca e isso é tudo de que me recordo.
Medusa era uma embarcação francesa que naufragou em 1816. Entre os sobreviventes do desastre, havia 15 pessoas resgatadas em uma jangada, as quais chegaram ao limite da humanidade na tentativa de serem socorridas com vida. (N. R.)
Segundo o periódico Daily News de 17 de março de 1887.
A cabine em que eu estava era diminuta e consideravelmente desorganizada. Sentado ao meu lado enquanto verificava meu pulso, estava um jovem de cabelos claros, com um bigode desgrenhado cor de palha e cujo lábio inferior parecia ligeiramente caído. Por um momento nos encaramos sem que disséssemos nada. Ele tinha olhos acinzentados e um olhar estranhamente vazio. De repente, pude ouvir um som como de metal proveniente de algum compartimento superior seguido de um rosnado de um animal de grande porte. O homem falou ao mesmo tempo, repetindo sua pergunta:
– Como se sente?
Creio ter dito que me sentia bem. Não conseguia me lembrar como havia chegado ali. Ele provavelmente leu essa pergunta na minha expressão facial, já que a minha voz mal podia ser ouvida.
– Você foi encontrado faminto em um barco. O nome da embarcação era Lady Vain. Havia manchas de sangue pelo convés – disse
o homem.
Passei os olhos pelas minhas mãos e elas estavam tão magras que pareciam uma bolsa suja de pele e ossos. Nesse momento, lembrei-me de tudo o que passara no bote à deriva.
– Beba um pouco disto – disse ele enquanto me oferecia uma dose de alguma bebida escarlate gelada.
Tinha gosto de sangue e fez com que me sentisse um pouco melhor.
– Você teve sorte de ter sido encontrado por um navio com um médico a bordo – disse, soltando alguns perdigotos e com uma ligeira sombra de língua presa
na fala.
– Que navio é este? – perguntei com um fio de voz rouca, devido ao longo período recôndito ao meu próprio silêncio.
– É um pequeno navio mercante de Arica e Callao. Tampouco perguntei quando subi a bordo, provavelmente da terra dos tolos. Sou apenas um passageiro de Arica. O dono desta embarcação, um parvo, é, por coincidência, o capitão, chamado Davies. Ele disse que perdeu o certificado de navegação ou algo assim. Você pode imaginar o tipinho que ele é... chama o troço de Ipecacuanha, nomezinho infernal. No entanto, quando os ventos não estão favoráveis, ela até que navega como esperado.
(Neste momento, ouvi o som do compartimento superior mais uma vez, seguido de um rosnado e a voz de um humano. Depois, ouvi outra voz que mandava algum miserável idiota
desistir.)
– Você quase morreu – disse meu interlocutor. – Foi por muito pouco, mas dei-lhe algumas injeções. Vê seu braço? Você ficou inconsciente por quase trinta horas.
Aos poucos, comecei a raciocinar. (Mas distraí-me com os latidos de vários cachorros.)
– Posso comer algo sólido? – perguntei.
– Graças a mim, você pode