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Odudua: diferenças entre revisões

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{{mais notas|data=outubro de 2015}}
==África==
{{Wikificação|data=fevereiro de 2014}}
'''Oduduwa''', foneticamente escrito como Odùduwà, e às vezes contraído como Odudua, Oòdua, geralmente é mantido entre os Yorubas por ser o ancestral dos reis Yorubas coroados.
[[Imagem:Oduduwa groove where Oduduwa is believed to have descended.jpg|thumb|O ponto histórico onde Odudua, o lendário progenitor dos iorubás desembarcou através de uma corrente para encontrar [[Ilê-Ifé]]. Também é conhecido como seu lugar de descanso final]]


'''Odudua'''<ref>FERREIRA, A. B. H. ''Novo dicionário da língua portuguesa''. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986. p. 1 215.</ref> ({{langx|yo|''Odùduwà''}}) é uma das divindades primordiais [[iorubás]]. Ela representa a divinização da [[terra]] e é considerada, ao lado de [[Obatalá]] (a representação divinizada do [[céu]]), como a casal primordial e propulsor da criação. Cada um foi incumbido de determinadas funções no papel da criação do [[Aiê]], o universo incluindo o mundo em que vivemos. O universo é visto dentro do culto aos [[orixá]]s como uma grande [[cabaça]] e esta cabaça é representada por Odudua e [[Obatalá]]. Odudua é considerada como a parte de baixo da cabaça e Obatalá é considerado como a parte de cima da cabaça.
==Brasil==


O nome Odudua pode ser traduzido como "a cabaça de onde jorrou a vida". Muitos costumam se enganar e afirmar que Odudua seria um orixá masculino ao invés de feminino, mas o que ocorre é uma confusão entre a divindade feminina Odudua com o ancestral iorubá divinizado Odudua, que, na verdade, é considerado em território africano como sendo uma forma humana da deusa Odudua, ou seja, o guerreiro legendário e a deusa Odudua seriam as mesmas pessoas. Esta é uma visão muito ampla no que concerne à essência divina mas isso é algo que vai muito além da capacidade de aceitação de algumas pessoas e sacerdotes.
É um [[Orixá]], '''Odùduà''' - '''Oduduwa''' - '''Odùduwà''' , foi um rei que teria vindo do leste, no momento das correntes migratórias causadas por uma invasão berbere no [[Egipto|Egito]].


O surgimento de Odudua, bem como o de Obatalá, é muito interessante. Diz-se que involuntariamente nos primórdios da criação, quando a única coisa existente nos mundos era o Olorum, a grande energia primordial, Odudua, a deusa, surgiu do corpo de [[Olorum]], a grande energia primordial, assim como Obatalá e outra tantas divindades.
Segundo [[Pierre Fatumbi Verger|Pierre Verger]], esse fato provocou deslocamentos de populações inteiras, expulsando-se progressivamente umas às outras, em direção ao oeste, para terminar em [[Borgu]], também chamada região dos [[Baribas]].


Foi Odudua quem criou a terra e todo o universo como o conhecemos e, ao lado de Obatalá, possibilitou o surgimento da vida.<br />
O rei Oduduwa ou Oduwa, era o pai de [[Oranian]] o fundador de [[Oyo]].


Segundo [[Pierre Verger]] (1982, pp. 3-10)<ref>"Etnografia religiosa iorubá e probidade científica". ''Revista Religião e Sociedade'', nº 8, pp. 3-10. Rio de Janeiro, ISER, Editora Cortez, 1982.</ref> - (A cidade de) [[Ilê-Ifé]], chamada de berço da civilização, [...] divinizou os fundadores da dinastia que nelas reinaram – Odudua [de Ifé] [...] foi o herói criador do mundo que chegou (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/agba/ "''Os Àgbàgbà''"]) do Além tendo recebido do Ser Supremo, [[Olodumarê]], o saco da criação contendo uma substância escura, de natureza até então desconhecida. Essa substância, lançada sobre a superfície das primeiras águas, formou um montículo de terra sobre o qual pousou uma galinha com cinco dedos. A galinha começou a arranhar o monte com os pés e com o bico e espalhou a matéria que recobriu pouco a pouco as águas e formou a crosta terrestre, da qual Odudua, [...] se tornou senhor. (Cf. em Barretti Fº, (1984/2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/ile-ife/ "''Ilê-Ifé a Origem do Mundo.''"])
==Referências==
*Ojuade, J. 'Sina (1992) 'The issue of 'Oduduwa' in Yoruba genesis: the myths and realities', ''Transafrican Journal of History'', 21, 139-158.
*Obayemi, A. 1976. The Yoruba and Edo-speaking Peoples and their Neighbors before 1600 AD, in JFA Ajayi & M. Crowder (ed.), History of West Africa 1: 255-322


Em [[Ifé]], [o mito] se complica com uma rivalidade entre [[Obatalá]] (também chamado Orixalá), enviado por Olodumarê para criar o mundo e Odudua, que se aproveitou de um momento de intemperança de seu rival, o qual, tendo bebido em excesso vinho de palma quando estava a caminho para cumprir a sua tarefa, embriagou-se, caiu e adormeceu. Odudua, que vinha atrás, surrupiou o saco da criação e tornou-se assim, ele próprio e em seu lugar, o senhor do mundo (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/oduduwa-ooni-ife/ "''Odùduwà – Óòni Ifè''"]). Mais tarde, quando se reencontraram, Odudua e Obatalá discutiram e lutaram ferozmente. Detalhes sobre esse assunto foram dados em outra obra (Verger, 1965: cap.II e III).
=={{Página externa}}==


Essa lenda da criação do mundo por Odudua só se tornou conhecida do grande público e dos etnólogos em 1912. [...] (e) Foi preciso esperar até 1921 para que ''The History of the Yoruba'' fosse publicada pelo reverendo S. Johnson (Johnson, 1921), cujo manuscrito data de 1897.
* Em Português:
* [http://aulobarretti.sites.uol.com.br/Artigos/Ile_Ife/Ife.htm IIê-Ifé: O Berço Religioso dos Yorubas,de Odùduwà a Sàngó]


*A confusão criada pelo Padre Baudin
* Em Inglês:

*[http://www.sacred-texts.com/afr/yl/yl03.htm The Kingdom Of The Yorubas]
Falamos acima da criação do mundo por Odudua em Ifé e da rivalidade que o opôs a Obatalá (Orixalá), de quem roubou o saco da criação. Os nomes desses orixás aparecem impressos pela primeira vez, que eu saiba, em 1852, no vocabulário da língua iorubá de [[Samuel Ajayi Crowther|
Crowther]]<ref>Crowther, Samuel Ajayi. ''A vocabulary of the yoruba language'', Londres, 1852.</ref> (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/orisaismo/clerigos-yoruba/ "Os Clérigos Nativos ''Yorùbá''"])

O autor indica em rubricas separadas, por um lado, que "Odua ou Odudua (Crowther, op.cit.: 207) é uma deusa de Ifé, tida como a suprema deusa do mundo" e acrescenta que "o céu e a terra são duas grandes cabaças (ele queria dizer meias cabaças, ''ibá''), que, uma vez fechadas (ou mais precisamente, colocadas uma sobre a outra, formando um recipiente fechado), não podem ser abertas (separadas)". Afirma ainda que havia "uma alusão à aparente concavidade do céu, que parece tocar a terra no horizonte". Por outro lado, indica que "Obatalá (é) a grande deusa iorubá, a artesã do corpo da matriz" (ib.: 228). Ao mesmo tempo, Orixalá é indicado como sendo "a grande deusa Obatalá" (ib.: 223). Já assinalamos a tendência de Crowther a chamar os deuses de deusas, mas é evidente que nos encontramos na presença de duas divindades distintas: Odudua e Obatalá (Orixalá).

O padre Baudin<ref>Baudin, Noel. ''Dictionnaire français-yoruba-français''. Cotonou, 1967.</ref> despoja em seguida Obatalá e Odudua de seu caráter hermafrodita para separá-los "em duas divindades perfeitamente distintas", que são então representadas separadamente: Obatalá sob a forma de um guerreiro e Odudua sob a forma de uma mulher amamentando uma criança.

*Os compiladores e discípulos do padre Baudin.
O Tenente Coronel A. E. Ellis<ref>Ellis, A.E. ''The yoruba speaking peoples''. Londres, 1894.</ref> publicou, por sua vez, em 1894, as mesmas divagações, cuidadosamente copiadas por ele do livro do padre Baudin, e, para melhor completar o sistema dualista do tema da falsa dupla Odudua-Obatalá e o tornar comparável à do ''[[Yang]] e do [[Yin]]'' chinês, não hesitou em aproximar a "deusa" Odudua de ''dudu'' (Ellis, 1894) negro em iorubá, para a opor a funfum (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/funfun/ "''Os Òrìṣà Funfun''"]), a cor branca de Obatalá. Mas o tenente-coronel britânico não levou em conta as diferenças de tons (de uma importância primordial em iorubá) existentes entre essas duas palavras.

Trata-se de um sistema dualista, mas correspondente, como vimos, ao casal ''Orixalá-Yemowo'', visível sob a forma de estátuas instaladas lado a lado no ''ilésin'', lugar de adoração do templo de Obatalá em Idetá-Ilé, no bairro Itapa em Ifé, (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/exposicao-arte-yoruba/religiao/ "''No Templo de Ọbàtálá: Ìdèta-Ilé''"]) muito diferente do casal Orixalá-Odudua que, unicamente para o padre Baudin e seus discípulos, seria constituído por dois elementos machos. A tradição de Ifé não deixa nenhuma dúvida sobre o caráter agressivo, hostil, antagônico, das relações existentes entre Orixalá e Odudua, que longe de uni-los num casal geneticamente estéril, os separa e os opõe como se depreende da história antiga do povo Iorubá.

[...] o nome Odudua também pode se referir ao guerreiro viril, vencedor dos ibos, fundador de Ifé, pai de numerosos reis (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/esposas-de-oduduwa/ "As Esposas de ''Odùduwà''"] e [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/a-formacao-do-povo-yoruba/ "Descentes de ''Odùduwà'': filhos e/ou netos"])<ref>[[Aulo Barretti Filho|Barretti Filho, Aulo.]] [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/ile-ife/ ''IIê-Ifé'': O Berço Religioso dos ''Yorùbá'', de ''Odùduwà a Ṣàngó''.] In: [http://aulobarretti.wordpress.com ''Artigos & Textos''.] Internet, (2003) 2012.</ref> e soberano de diversas regiões iorubás. Nesse caso se refere à uma figura masculina já em tempo posterior.

Tanto aspectos masculinos quanto femininos continuam sendo atribuídos à divindade em tradições iorubás, isso muito devido também ao próprio caráter geograficamente variado, além de miticamente alternante e indefinido de muitos orixás.<ref>{{Citar periódico |url=https://www.jstor.org/stable/1581759 |título=Gender in Yoruba Religious Change |data=2002 |acessodata=2024-01-31 |periódico=Journal of Religion in Africa |número=2 |ultimo=Peel |primeiro=J. D. Y. |paginas=136–166 |issn=0022-4200}}</ref> Isso leva a assumir, em alguns contextos, uma certa neutralidade de gênero ou [[androginia]], como na habilidade de Odudua ser tanto marido quando esposa. Mas é fortemente associada ao [[materno]], ao [[Axé (candomblé)|axé]] e ao [[útero]].<ref>{{Citar livro|url=https://books.google.com.br/books?id=qBXIAgAAQBAJ&pg=PA26|título=The Architects of Existence: Aje in Yoruba Cosmology, Ontology, and Orature|ultimo=Washington|primeiro=Teresa N.|data=2014-02-25|editora=Oya's Tornado|lingua=en}}</ref><ref>{{Citar web|url=https://www.oxfordreference.com/display/10.1093/oi/authority.20110803100245987|titulo=Oduduwa, Locked in the Darkness, in a Calabash|website=A Dictionary of African Mythology|publicado=Oxford Reference|lingua=en|doi=10.1093/oi/authority.20110803100245987}}</ref>

{{Referências|col=2}}
* Ojuade, J. 'Sina (1992) 'The issue of 'Oduduwa' in Yoruba genesis: the myths and realities', ''Transafrican Journal of History'', 21, 139-158.
* Obayemi, A. 1976. The Yoruba and Edo-speaking Peoples and their Neighbors before 1600 AD, in JFA Ajayi & M. Crowder (ed.), History of West Africa 1: 255-322

== Ligações externas ==
* Em português:
* [http://aulobarretti.wordpress.com/revista-ebano-ile-ife/ile-ife/ IIê-Ifé: O Berço Religioso dos Yorùbá, de Odùduwà a Sàngó]

* Em inglês:
* [http://www.sacred-texts.com/afr/yl/yl03.htm ''The Kingdom Of The Yorubas'']


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[[sv:Oduduwa]]

Edição atual tal como às 19h12min de 31 de janeiro de 2024

O ponto histórico onde Odudua, o lendário progenitor dos iorubás desembarcou através de uma corrente para encontrar Ilê-Ifé. Também é conhecido como seu lugar de descanso final

Odudua[1] (em iorubá: Odùduwà) é uma das divindades primordiais iorubás. Ela representa a divinização da terra e é considerada, ao lado de Obatalá (a representação divinizada do céu), como a casal primordial e propulsor da criação. Cada um foi incumbido de determinadas funções no papel da criação do Aiê, o universo incluindo o mundo em que vivemos. O universo é visto dentro do culto aos orixás como uma grande cabaça e esta cabaça é representada por Odudua e Obatalá. Odudua é considerada como a parte de baixo da cabaça e Obatalá é considerado como a parte de cima da cabaça.

O nome Odudua pode ser traduzido como "a cabaça de onde jorrou a vida". Muitos costumam se enganar e afirmar que Odudua seria um orixá masculino ao invés de feminino, mas o que ocorre é uma confusão entre a divindade feminina Odudua com o ancestral iorubá divinizado Odudua, que, na verdade, é considerado em território africano como sendo uma forma humana da deusa Odudua, ou seja, o guerreiro legendário e a deusa Odudua seriam as mesmas pessoas. Esta é uma visão muito ampla no que concerne à essência divina mas isso é algo que vai muito além da capacidade de aceitação de algumas pessoas e sacerdotes.

O surgimento de Odudua, bem como o de Obatalá, é muito interessante. Diz-se que involuntariamente nos primórdios da criação, quando a única coisa existente nos mundos era o Olorum, a grande energia primordial, Odudua, a deusa, surgiu do corpo de Olorum, a grande energia primordial, assim como Obatalá e outra tantas divindades.

Foi Odudua quem criou a terra e todo o universo como o conhecemos e, ao lado de Obatalá, possibilitou o surgimento da vida.

Segundo Pierre Verger (1982, pp. 3-10)[2] - (A cidade de) Ilê-Ifé, chamada de berço da civilização, [...] divinizou os fundadores da dinastia que nelas reinaram – Odudua [de Ifé] [...] foi o herói criador do mundo que chegou (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - "Os Àgbàgbà") do Além tendo recebido do Ser Supremo, Olodumarê, o saco da criação contendo uma substância escura, de natureza até então desconhecida. Essa substância, lançada sobre a superfície das primeiras águas, formou um montículo de terra sobre o qual pousou uma galinha com cinco dedos. A galinha começou a arranhar o monte com os pés e com o bico e espalhou a matéria que recobriu pouco a pouco as águas e formou a crosta terrestre, da qual Odudua, [...] se tornou senhor. (Cf. em Barretti Fº, (1984/2003) 2012 - "Ilê-Ifé a Origem do Mundo.")

Em Ifé, [o mito] se complica com uma rivalidade entre Obatalá (também chamado Orixalá), enviado por Olodumarê para criar o mundo e Odudua, que se aproveitou de um momento de intemperança de seu rival, o qual, tendo bebido em excesso vinho de palma quando estava a caminho para cumprir a sua tarefa, embriagou-se, caiu e adormeceu. Odudua, que vinha atrás, surrupiou o saco da criação e tornou-se assim, ele próprio e em seu lugar, o senhor do mundo (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - "Odùduwà – Óòni Ifè"). Mais tarde, quando se reencontraram, Odudua e Obatalá discutiram e lutaram ferozmente. Detalhes sobre esse assunto foram dados em outra obra (Verger, 1965: cap.II e III).

Essa lenda da criação do mundo por Odudua só se tornou conhecida do grande público e dos etnólogos em 1912. [...] (e) Foi preciso esperar até 1921 para que The History of the Yoruba fosse publicada pelo reverendo S. Johnson (Johnson, 1921), cujo manuscrito data de 1897.

  • A confusão criada pelo Padre Baudin

Falamos acima da criação do mundo por Odudua em Ifé e da rivalidade que o opôs a Obatalá (Orixalá), de quem roubou o saco da criação. Os nomes desses orixás aparecem impressos pela primeira vez, que eu saiba, em 1852, no vocabulário da língua iorubá de Crowther[3] (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - "Os Clérigos Nativos Yorùbá")

O autor indica em rubricas separadas, por um lado, que "Odua ou Odudua (Crowther, op.cit.: 207) é uma deusa de Ifé, tida como a suprema deusa do mundo" e acrescenta que "o céu e a terra são duas grandes cabaças (ele queria dizer meias cabaças, ibá), que, uma vez fechadas (ou mais precisamente, colocadas uma sobre a outra, formando um recipiente fechado), não podem ser abertas (separadas)". Afirma ainda que havia "uma alusão à aparente concavidade do céu, que parece tocar a terra no horizonte". Por outro lado, indica que "Obatalá (é) a grande deusa iorubá, a artesã do corpo da matriz" (ib.: 228). Ao mesmo tempo, Orixalá é indicado como sendo "a grande deusa Obatalá" (ib.: 223). Já assinalamos a tendência de Crowther a chamar os deuses de deusas, mas é evidente que nos encontramos na presença de duas divindades distintas: Odudua e Obatalá (Orixalá).

O padre Baudin[4] despoja em seguida Obatalá e Odudua de seu caráter hermafrodita para separá-los "em duas divindades perfeitamente distintas", que são então representadas separadamente: Obatalá sob a forma de um guerreiro e Odudua sob a forma de uma mulher amamentando uma criança.

  • Os compiladores e discípulos do padre Baudin.

O Tenente Coronel A. E. Ellis[5] publicou, por sua vez, em 1894, as mesmas divagações, cuidadosamente copiadas por ele do livro do padre Baudin, e, para melhor completar o sistema dualista do tema da falsa dupla Odudua-Obatalá e o tornar comparável à do Yang e do Yin chinês, não hesitou em aproximar a "deusa" Odudua de dudu (Ellis, 1894) negro em iorubá, para a opor a funfum (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - "Os Òrìṣà Funfun"), a cor branca de Obatalá. Mas o tenente-coronel britânico não levou em conta as diferenças de tons (de uma importância primordial em iorubá) existentes entre essas duas palavras.

Trata-se de um sistema dualista, mas correspondente, como vimos, ao casal Orixalá-Yemowo, visível sob a forma de estátuas instaladas lado a lado no ilésin, lugar de adoração do templo de Obatalá em Idetá-Ilé, no bairro Itapa em Ifé, (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - "No Templo de Ọbàtálá: Ìdèta-Ilé") muito diferente do casal Orixalá-Odudua que, unicamente para o padre Baudin e seus discípulos, seria constituído por dois elementos machos. A tradição de Ifé não deixa nenhuma dúvida sobre o caráter agressivo, hostil, antagônico, das relações existentes entre Orixalá e Odudua, que longe de uni-los num casal geneticamente estéril, os separa e os opõe como se depreende da história antiga do povo Iorubá.

[...] o nome Odudua também pode se referir ao guerreiro viril, vencedor dos ibos, fundador de Ifé, pai de numerosos reis (Cf. em Barretti Fº, (2003) 2012 - "As Esposas de Odùduwà" e "Descentes de Odùduwà: filhos e/ou netos")[6] e soberano de diversas regiões iorubás. Nesse caso se refere à uma figura masculina já em tempo posterior.

Tanto aspectos masculinos quanto femininos continuam sendo atribuídos à divindade em tradições iorubás, isso muito devido também ao próprio caráter geograficamente variado, além de miticamente alternante e indefinido de muitos orixás.[7] Isso leva a assumir, em alguns contextos, uma certa neutralidade de gênero ou androginia, como na habilidade de Odudua ser tanto marido quando esposa. Mas é fortemente associada ao materno, ao axé e ao útero.[8][9]

Referências
  1. FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986. p. 1 215.
  2. "Etnografia religiosa iorubá e probidade científica". Revista Religião e Sociedade, nº 8, pp. 3-10. Rio de Janeiro, ISER, Editora Cortez, 1982.
  3. Crowther, Samuel Ajayi. A vocabulary of the yoruba language, Londres, 1852.
  4. Baudin, Noel. Dictionnaire français-yoruba-français. Cotonou, 1967.
  5. Ellis, A.E. The yoruba speaking peoples. Londres, 1894.
  6. Barretti Filho, Aulo. IIê-Ifé: O Berço Religioso dos Yorùbá, de Odùduwà a Ṣàngó. In: Artigos & Textos. Internet, (2003) 2012.
  7. Peel, J. D. Y. (2002). «Gender in Yoruba Religious Change». Journal of Religion in Africa (2): 136–166. ISSN 0022-4200. Consultado em 31 de janeiro de 2024 
  8. Washington, Teresa N. (25 de fevereiro de 2014). The Architects of Existence: Aje in Yoruba Cosmology, Ontology, and Orature (em inglês). [S.l.]: Oya's Tornado 
  9. «Oduduwa, Locked in the Darkness, in a Calabash». A Dictionary of African Mythology (em inglês). Oxford Reference. doi:10.1093/oi/authority.20110803100245987 
  • Ojuade, J. 'Sina (1992) 'The issue of 'Oduduwa' in Yoruba genesis: the myths and realities', Transafrican Journal of History, 21, 139-158.
  • Obayemi, A. 1976. The Yoruba and Edo-speaking Peoples and their Neighbors before 1600 AD, in JFA Ajayi & M. Crowder (ed.), History of West Africa 1: 255-322

Ligações externas

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