Mudanças – Psicologia da Saúde,
29 (2), Jul.-Dez. 2021
Copyright 2021 pelo Instituto Metodista de
Ensino Superior CGC 44.351.146/0001-57
Psicoterapia breve operacionalizada
aplicada em hospital geral
Denise Mendes*
Kayoko Yamamoto**
Avelino Luiz Rodrigues***
Resumo
O objetivo deste trabalho é apresentar um caso de Psicoterapia Breve Operacionalizada (PBO) em atendido em uma
única sessão em ambiente hospitalar. São descritas as possibilidades de uso das técnicas desenvolvida pelo Prof. Ryad
Simon. Os desdobramentos e as limitações encontradas no processo são expostos por meio do relato de um caso
de crise por perda eminente. A análise desse caso apontou que apesar de se manter os princípios bases da PBO, a
técnica não foi amplamente utilizada devido a necessidade de elaboração através do acolhimento.
Palavras chave: Psicoterapia Breve Operacionalizada (PBO); Psicologia hospitalar; Crise por perda; Psicossomática.
Operationalized short-term psychotherapy in hospital: a clinical case description
Abstract
The objective of this work is to present a case of Operationalized Short Term Therapy in a single session in a hospital
setting. The possibilities of using the techniques developed by Prof. Ryad Simon. The consequences and limitations
found in the process are exposed through the report of a case of crisis due to imminent loss. The analysis of this
case pointed out that despite maintaining the basic principles of Operationalized Short Term Therapy, the technique
was not widely used due to the need for elaboration through reception.
Key words: Operationalized Short Term Therapy; Health Psychology; Crisis for loss; Psychosomatic.
* Psicóloga, Especialista em Psicossomática e Psicoterapia Breve Operacionalizada – Membro do Laboratório de pesquisa Sujeito e Corpo, SuCor – Universidade de São Paulo, USP. E-mail: psico.denisesa@gmail.com
** Prof. Dr. em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, USP – Professora do curso de especialização em Psicoterapia
Breve Operacionalizada – UNIP. E-mail: kayamato@terra.com.br
*** Prof. Dr. do Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, USP. Coordenador do Laboratório de Pesquisa
Sujeito e Corpo, SuCor do Instituto de Psicologia USP. E-mail: avelinoluizr@usp.br
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DENISE MENDES, KAYOKO YAMAMOTO & AVELINO LUIZ RODRIGUES
Introdução
O hospital é marcado por situações de sofrimentos e angústias constantes. O eterno diálogo entre vida
e morte, adoecimento e cura, e nas entrelinhas desses
diálogos emerge o medo, insegurança, raiva e revoltas,
não só para os pacientes, mas também para os familiares
e em certo grau, também, para o profissional de saúde
(Almeida, 2010).
Para Ismael (2005), a psicologia hospitalar aparece
com o intuito de resgatar o subjetivo do sujeito em situações associadas aos adoecimentos em instituições de
saúde. O papel do psicólogo é mais focal, concentrando-se no sofrimento e nas repercussões que a doença gera
na hospitalização, buscando assim amenizar o sofrimento
do paciente e sua família.
O trabalho do psicólogo em hospitais se diferencia
dos ambientes clínicos aos quais esses profissionais estão
mais habituados. O espaço físico é a primeira grande
mudança, por se tratar de um ambiente tumultuado, sem
muita privacidade e com frequentes interrupções por parte de outros profissionais, além dos limites institucionais,
também, emergem limites no que tange quanto ao uso
de estratégias e técnicas – e a PBO tem-se mostrado de
grande eficácia, pois apresenta um manejo do tempo em
que se dá o atendimento, visto a constante mudanças
que os pacientes passam, internações em diferentes enfermarias, podendo chegar a UTI, bem como, por vezes,
uma alta hospitalar abrupta e sem o devido preparo (Almeida, 2010). O atendimento hospitalar exige rapidez e
brevidade, devido as urgentes demandas e a escassez do
profissional psicólogo no ambiente hospitalar (Ramos;
Neme & Dameto, 2008; Oliveira & Rodrigues, 2020).
Diante desses aspectos, nos últimos anos, vem sendo
reavaliada as técnicas e métodos utilizados que proporcionem atendimentos em instituições hospitalares, que seja
de duração inferior às terapias convencionais, mas que dê
o suporte necessário para viabilizar um bom atendimento
(Almeida, 2010).
Nessa busca por um tratamento de curta duração,
uma das técnicas utilizadas é a psicoterapia breve. Essa
técnica permite adaptações para diferentes contextos e permite trabalhar, em curto tempo, o sofrimento dos pacientes
que necessitam do atendimento psicológico, exercendo
importantes funções terapêuticas e preventivas (Ramos;
Neme & Dameto, 2008; Oliveira & Rodrigues, 2020).
De acordo com Almeida (2010), as psicoterapias
breves, usualmente, trabalham com as necessidades imeMudanças – Psicologia da Saúde, 29 (2) 101-106, Jul.-Dez., 2021
diatas do paciente, dessa forma, possuem seus objetivos
mais limitados. O foco passa ser o orientador da condição
de psicoterapia breve. De acordo com a autora: O foco ou
conflito focal refere-se ao conflito ou situação atual do paciente,
subjacente ao qual existe o conflito nuclear exacerbado – pág 97.
Devido a multicausalidade de uma psicopatologia
psicodinâmica, é improvável que uma pessoa tenha apenas um conflito, dessa forma é preciso trabalhar com
situações conflitivas mais significativas dentro daquele
espaço e momento.
Psicoterapia Breve no hospital
Os modelos clínicos de atendimentos psicológicos
não são passíveis de utilização em instituição hospitalar
(Almeida, 2010), (Oliveira & Rodrigues, 2020). Para Ismael (2005), a realidade das instituições hospitalares é
permeada de desafios para o psicólogo, e o profissional
precisa trabalhar na definição de um modelo de atuação
que comporte todo o setting que essas instituições exigem.
Para Almeida (2010) os quatro principais setores
que o psicólogo pode desenvolver um trabalho breve,
são: ambulatório, emergência, enfermaria e unidades de
terapias intensivas.
Para a autora, no ambulatório é o ambiente em que
mais se aproxima da prática clínica do psicólogo. O paciente vem encaminhado, usualmente, por um médico, e o
setting é de algum modo tranquilo, profissional e paciente
e disponibilidade de determinado tempo de sessão.
A emergência ou pronto socorro é marcado pela
angústia de morte, o paciente chega a fim de restabelecer
sua saúde. Nesse cenário, o psicólogo terá de realizar
um atendimento ágil, marcado pela rapidez de ações e
encaminhamentos para continuação do tratamento na
comunidade, ou seja, a intervenção psicoterapêutica visa
a uma intervenção de emergência, possibilitando o paciente a elaborar e externalizar fantasias e sentimentos
em relação a doença que o levou até ao hospital.
A enfermaria é onde ocorre as internações. Neste
local o profissional psicólogo irá auxiliar o paciente a elaborar o significado da internação e auxiliar os familiares a
enfrentarem esse momento de angústia. Nesse ambiente
o paciente perde a sua individualidade, e por muitas
vezes deixa de ser ouvido em sua singularidade. Dessa
forma, a psicoterapia irá atuar buscando resgatar essa
singularidade perdida. As questões a serem tratadas não
devem ser profundas e é importante que os atendimentos
sejam iniciados e terminados, se possível em um único
PSICOTERAPIA BREVE OPERACIONALIZADA APLICADA EM HOSPITAL GERAL
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atendimento, visto a permanência variável do paciente
nessas unidades. Oliveira & Rodrigues (2020) destacam
que não há a necessidade da presença do transtorno
mental para o atendimento psicológico nestes espaços
de prática assistencial, o sofrimento psíquico frente a
própria situação de doença, a internação vivida com
grande ambivalência, dos procedimentos, do prognóstico,
pode-se dizer que esta situação se configura uma crise
existencial, que envolve todos os níveis da vida e do viver,
suas intersubjetividades.
E por último, temos as unidades de terapia intensiva, que é um espaço diferenciado do hospital, concebido
como “a casa da morte” para muitos pacientes e familiares.
Nessa unidade o psicólogo enfrenta desafios de magnitude
considerável, a presença mais intensa e mais frequente da
morte, a nudez dos pacientes, o isolamento dos pacientes
de seus familiares, alterações de nível de consciência, dilemas éticos e um maior contato com os familiares (Oliveira
& Rodrigues, 2020). Assim, o trabalho do profissional
psicólogo se baseia em criar condições de comunicação,
de estabelecer uma escuta atenta aos focos de sofrimento,
prestar esclarecimentos ao paciente de seu estado clínico,
ajudá-lo a pensar, elucidar mal entendidos e assim desfazer
fantasias geradoras de experiências emocionais de grande
sofrimento carregadas de medo e ameaça. avaliar quadros
psicopatológicos e dar suporte familiar nesse momento de
angústia para todos os envolvidos.
Portanto, a situação-problema, não é uma situação
simples que necessita ser resolvida, ela vai além, sendo
uma situação significativa em que o sujeito não pode
ignorá-la por longo tempo, necessita-se encontrar uma
solução. Uma não solução, nesse caso, causaria uma crise
na estrutura psicodinâmica do indivíduo. A fim de evitar
uma crise adaptativa, o paciente terá que, em algum grau,
buscar adaptações para resolver essa nova situação, mesmo que a princípio seja uma solução frustrante.
Para tal investigação, Simon (2008) criou a Escala
Diagnóstica Adaptativa Operacionalizada (EDAO). A
EDAO é um instrumento utilizado para determinar a
eficácia adaptativa do paciente. Através do conteúdo
colhido nas entrevistas, analisa-se as soluções utilizadas
em situações passadas e verifica-se o nível de adequação
dessas soluções. São analisados nessa escala as soluções
que o sujeito tem em quatro setores distintos de sua vida,
pensando sua totalidade, são eles: A-R (afetivo-relacional),
Pr (produtividade), Or (orgânico) e S-C (sócio-cultutal).
As adequações das soluções podem ser aferidas da seguinte forma:
Psicoterapia Breve Operacionalizada – PBO
– Breves considerações
O resultado final dessa análise constitui a adaptação
global do sujeito. Dessa forma, pode-se chegar a um dos
cinco possíveis diagnósticos advindos dessa avaliação
(adaptação global), são eles:
Simon (2011) descreve a psicoterapia breve como: o
futuro da ajuda psicológica mais difundida (p.21).
O método proposto pelo autor é baseado na Teoria
da Adaptação, em que o terapeuta identificará as situações-problema da vida do paciente e irá investigar o seu nível
de adaptação com a utilização da Escala Diagnóstica
Adaptativa Operacionalizada, a EDAO (Simon, 1089).
Para isso, verificará as situações-problema atuais em
comparações com resoluções das situações-problema
antigas e observará as interações psicodinâmicas que
ocorre entre elas.
Por situação problema, o autor propõe o conceito de:
Um vasto desafio que engloba a percepção de um
complexo de variáveis coexistindo e interagindo simultaneamente, pressionando o sujeito a encontrar uma
resposta (p.29).
Se a solução, de fato, resolve o problema do paciente
Se essas soluções trazem satisfação, gratificação e prazer
para o sujeito, e
Se essas soluções estão isentas de conflitos intrapsíquicos
e/ou com o ambiente.
Grupo 1 Adaptação eficaz
Muito bom
prognóstico
5,0 pontos
Grupo 2 Adaptação ineficaz leve
Bom
prognóstico
4,0 pontos
Grupo 3 Adaptação ineficaz moderada
Prognóstico
regular
3,0
3,5 pontos
Grupo 4 Adaptação ineficaz severa
Prognóstico
reservado
2,0
2,5 pontos
Grupo 5 Adaptação ineficaz Mau
grave
prognóstico
1,5 pontos
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DENISE MENDES, KAYOKO YAMAMOTO & AVELINO LUIZ RODRIGUES
Assim sendo, as situações problemas que surgem
na vida do paciente devem ser avaliados de acordo com
essas diretrizes para se chegar ao diagnóstico proposto
pelo autor e traçar o desenvolvimento da Psicoterapia
Breve Operacionalizada.
O presente trabalho foi apresentado XIV Simpósio
de Psicoterapia Breve Operacionalizada a fim de suscitar
o diálogo sobre a aplicação da PBO em hospitais gerais.
com a equipe de enfermagem. Atendimento realizado
em sessão única.
Os nomes dos sujeitos na transcrição dos foram
alterados neste relato para a preservação do anonimato.
As fontes de informações clinicamente relevantes
foram o prontuário médico para mensuração do sintoma
e estabelecimento do plano terapêutico.
Identificação do paciente
André (nome fictício), 44 anos, casado, filho de 15 anos.
História clínica
Diagnóstico
Sobre o atendimento
O atendimento foi realizado no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo, como parte de um
estágio voluntário realizado semanalmente pelo laboratório de pesquisa Sujeito e Corpo – SuCor – do Instituto
de Psicologia, sob a supervisão do Professor Avelino Luiz
Rodrigues. O caso foi selecionado a partir de triagem
Setor
Afeito-Relacional (AR)
Produtividade (Pr)
Após a conversa com o paciente, foi possível
identificar que seu setor Afetivo Relacional estava pouquíssimo adequado e seu setor da Produtividade estava
pouco adequado, pois devido o diagnóstico repentino
da esposa, o paciente não estava conseguindo realizar
qualquer atividade produtiva.
Com essa pontuação, chega-se ao diagnóstico do
grupo 4: Adaptação Ineficaz Severa.
Adequado
Pouco Adequado
Pouquíssimo Adequado
3
2
2
1
1
0,5
CLASSIFICAÇÃO DIAGNÓSTICA
Grupo
Classificação Diagnóstica
Soma Total
1
Adaptação eficaz
5
2
Adaptação ineficaz leve
4
3
Adaptação ineficaz moderada
3,5 ou 3
4
Adaptação ineficaz severa
2,5 ou 2
5
Adaptação ineficaz grave
1,5
Síntese do atendimento e discussão
André chegou ao hospital acompanhando sua esposa que há alguns dias não estava se sentindo bem, com
fraqueza e dificuldade de respirar. Após a realização de
alguns exames, sua esposa foi diagnosticada com câncer
de mama metastático. O caso estava muito avançado,
não tinha bom prognóstico e a recomendação médica
foi de cuidados paliativos.
A esposa estava internada na UTI e a equipe de
enfermagem solicitou atendimento psicológico, com o
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intuito de auxiliar no processo de elaboração desse diagnóstico. Houve algumas tentativas por parte da equipe
de realizar atendimento com ela, porém ela se negava
ser atendida.
Passados alguns dias, sua esposa teve uma piora,
e por toda tensão existente em torno desse caso, a
equipe de enfer magem, novamente, solicitou atendimento psicológico para ela. Nessa altura, ela não
conseguia mais ter comunicação verbal, apenas por
gesticulação.
PSICOTERAPIA BREVE OPERACIONALIZADA APLICADA EM HOSPITAL GERAL
André estava acompanhando sua esposa, quando a
terapeuta, novamente, tentou atendimento para ela, segue
o breve diálogo:
Terapeuta: Boa tarde, Juliana! Sou da equipe de psicologia,
gostaria de conversar brevemente com você. Podemos?
Juliana gesticula com a cabeça que não, levanta a mão
em sinal de afirmativo (ao qual é interpretado que ela
se encontra bem) e com o dedo aponta para o marido.
Terapeuta: você gostaria que eu conversasse com seu
marido?
Juliana aponta positivamente com a mão novamente.
A terapeuta questiona se André gostaria do atendimento, ele aceita prontamente, pois acredita estar
precisando. A terapeuta e André se afastam do leito de
Juliana e ficam próximos da porta do quarto, no qual há
outros pacientes internados. A terapeuta inicia fazendo
o acolhimento inicial, e preparando um melhor setting
possível para acolher sua dor.
Nesse contexto hospitalar, onde já foi apontado
anteriormente toda a dificuldade do setting terapêutico
hospitalar, é importante uma postura de acolhimento maior
por parte do terapeuta para que um vínculo de confiança
de estabeleça em tão pouco tempo (Almeida, 2010).
André inicia contando como tudo está muito difícil
em sua vida, que tudo aconteceu de forma inesperada e
não estava sabendo lidar com a situação. Conta que há
um tempo estava notando o emagrecimento da esposa,
porém como ela sempre teve um perfil magro, não associou a perda de peso com algum problema de saúde.
Percebeu que havia algo errado quando ela apresentou
dificuldades para respirar, então levou-a ao hospital. E.
desde então, viu sua vida mudar completamente.
Diz que ainda não tinha conseguido processar todas
as informações recebidas, pois havia levado a esposa ao
médico por dificuldade respiratória e agora tinha um
câncer espalhado pelo corpo e uma eminência de morte
para lidar.
Para se organizar e executar um atendimento em
PBO, a base fundamental é detectar as situações problemas por setor de adaptação. Os passos necessários para
isso é a realização de entrevistas pormenorizadas, em que
são realizados: anamnese contando a história e evolução
da queixa; resumo da história pregressa do paciente e um
interrogatório complementar a fim de investigar as áreas
afetadas pelos sintomas ou dificuldades (Simon, 2005).
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Diante da realidade hospitalar, com as dificuldades
em construir um setting terapêutico, a qual já fizemos
referência e que os movimentos dos pacientes são constantes de uma área a outra, ficam comprometidos os
passos minuciosos do levantamento desses dados. Dessa
forma, a terapeuta no intuito de fazer minimamente uma
anamnese, pede para que André fale um pouco de sua
história pregressa.
André conta que está casado há 26 anos e tem um
filho de 15 anos. Disse estar com a esposa desde os 18
anos e pontua que tudo que ele tem na vida foi construído com ela. O filho disse para ele que não iria visitar a
mãe no período que ela estivesse internada, e esse foi um
fato que o mobilizou, mas buscou entender e respeitar
sua decisão. Diz ainda que nunca foi um marido perfeito, porém ainda não sabe como seguirá sua vida sem a
esposa. Relata um pouco dos planos futuros que tinha
com a esposa.
Conta que a esposa está consciente de tudo que está
acontecendo e pediu que ele a cremasse, no entanto, ele
não consegue conversar com ela sobre nada que tenha
o tom de despedida. Nesse momento André chora por
longos minutos. A equipe médica entendendo a dificuldade do setting naquele momento, improvisa um espaço
“reservado” com as cortinas divisórias dos leitos para
uma maior privacidade no atendimento.
A terapeuta acolhe e permite a expressão de seu
sofrimento. Quando está novamente apto a conversar,
a terapeuta pergunta a André o que acredita que ainda
precisa ser dito para a esposa.
André pontua que gostaria e dizê-la o quanto ela foi
importante e fundamental em sua vida; que gostaria de
pedir perdão pelos erros que cometeu e que tudo ia ser
difícil por aqui sem ela; que as coisas não foram perfeitas, mas apesar de toda dificuldade a amava e iria amá-la
para sempre, e que já tinha decidido cremá-la e já estava
preparando tudo para isso. Paciente volta se emocionar
muito nesse momento.
Considerando o setting do momento onde não havia
tempo e espaço para a preparação de um plano de ação
através da realização da EDAO, a terapeuta se apropriou
de sua experiência clínica em Psicoterapia Breve Operacionalizada, e diante do que foi exposto no discurso do
paciente, foi detectado que André estava em um momento de crise adaptativa por eminente perda. Seu setor
afetado foi o Afetivo Relacional, gerando uma crise de
perda de uma pessoa amada afetada no setor Orgânico.
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E o paciente não estava encontrando qualquer solução
para lidar com a situação crítica (problema novo). Recebendo a classificação diagnóstica do grupo 4: Adaptação
Ineficaz Severa.
Simon (2005) afirma que a função do terapeuta em
situações de crises adaptativas é dar ao paciente a melhor solução possível dentro dos recursos profissionais
existentes no momento. E que o melhor procedimento
para lidar com uma crise adaptativa é concentrar-se na
situação crítica emergente.
Diante desse conhecimento pregresso, a terapeuta
identificou uma culpa sentida por André pelos erros que
acredita ter cometido em seu casamento, no entanto,
apesar de notar essa culpa a terapeuta percebeu que não
haveria espaço, naquele momento, para uma interpretação teorizada, que de acordo com Simon (2005) é uma
interpretação mais direta que produz uma segurança da
veracidade da construção – onde não se dá para recuperar
o que está reprimido, mas construir com o paciente uma
verdade que alcança o mesmo resultado de algo reprimido
que foi recapturado através de uma postura mais ativa
do terapeuta que confronta o paciente com situações
angustiantes e conflitivas.
Dessa forma, a terapeuta realizou um acolhimento
de todo o sofrimento expresso por André e buscou
oferecer a melhor solução para aquele momento. Então,
diz ao paciente que percebia uma postura dele como se
a esposa já não estivesse mais em vida. Apontou que
André expressava tudo que gostaria de falar para esposa
como se já não houvesse possibilidades de serem ditas.
A terapeuta ainda pontua que no processo de morrer
muitos pacientes precisam dessa conversa franca com
seus familiares para poder ter uma morte menos sofrida,
e então questiona a ele, o que o impende de falar tudo
que precisa para a esposa.
André, emocionado, fica em silencio por alguns
minutos e retoma dizendo que sabe que não tem muito
tempo e que a qualquer momento sua esposa pode ter
uma piora e perder a consciência. Então, pergunta à terapeuta se pode o acompanhar até o leito novamente para
que ele tenha essa conversa com a esposa.
A terapeuta o acompanha distantemente e permite
que o paciente tenha seu diálogo necessário com a esposa.
Ao fim dele, a esposa se apresenta muito emocionada ao
falar sobre a cremação.
Ao final da conversa, André foi, novamente, até a
terapeuta e agradeceu, pois se conscientizou de como esMudanças – Psicologia da Saúde, 29 (2) 101-106, Jul.-Dez., 2021
tava fugindo desse momento necessário, e que isso abriria
espaço para ele conversar mais abertamente no período
em que a esposa ainda estivesse com ele.
O resultado positivo nesse atendimento clínico foi
possível através da criação de um espaço de acolhimento
e empatia, que possibilitaram a detecção das necessidades
imediatas do paciente e, por consequência, o trabalho
psicoterapêutico. E também proporcionou o encaminhamento de André para atendimento psicoterapêutico, pois
haviam muitas outras questões a serem elaboradas para
uma adequação mais profunda na situação vivenciada.
Conclusão
Diante desse relato foi possível observar que apesar de se manter os princípios básicos da PBO, não foi
possível seguir todo o modelo proposto por Simon, por
se tratar de uma situação de crise por perda no setor
Afetivo Relacional. Essa é uma situação muito frequente
no ambiente hospitalar, por se tratar de complicações em
pessoas que têm grau de afetividade e isso exige especial
acolhimento, mas os dados apresentados demonstram que
a PBO, ainda que não seja aplicada em sua integralidade,
evidencia sua eficácia terapêutica. Contudo, o diálogo
sobre a aplicação da PBO em hospital geral foi aberto e
há ainda muitas possibilidades de aplicação nos demais
setores dos hospitais.
Não se pretendeu com esse relato se esgotar o
diálogo do tema em foco, visto que muito ainda se tem
para percorrer, visando a contribuir com a construção
do conhecimento na área.
Referências
Almeida, R. A. (2010). Possibilidades de utilização da psicoterapia breve em hospital
geral. Rev. SBPH, 13(1).
Ismael, S. M. C. (2005). A inserção do psicólogo no contexto hospitalar. São Paulo:
Casa do Psicólogo.
Oliveira, W.L. & Rodrigues, A.L. (2020). Prática psicológica em enfermarias hospitalares. In Rodrigues A.L. (ed) Psicologia da Saúde – Hospitalar: Abordagem
Psicossomática. Barueri: Editora Manole
Oliveira, W.L. & Rodrigues, A.L. (2020). Prática psicológica com paciente em UTI.
In Rodrigues A.L. (ed) Psicologia da Saúde – Hospitalar: Abordagem
Psicossomática. Barueri: Editora Manole
Ramos, F. N. N.; Neme, C. M. B & Dameto, C. A. (2008). Relato de caso clínico:
Psicoterapia breve de paciente oncológico. RedePsi.
Simon, R. (2005). Psicoterapia Breve Operacionalizada – Técnica e Teoria. São Paulo:
Casa do Psicólogo.
Simon, R.; Yamamoto, K. (2008). Psicoterapia Breve Operacionalizada em
situação de crise adaptativa. Mudanças – Psicologia da Saúde, 16(2), jul-dez,
144-151p.
Submetido em: 27-3-2021
Aceito em:7-10-2021