O MAIS IMPORTANTE PARA O INVESTIDOR
O livro é a porta que se abre para a realização do homem.
Jair Lot Vieira
HOWARD MARKS
O MAIS IMPORTANTE
PARA O INVESTIDOR
Lições de um gênio do mercado financeiro
PREFÁCIO
Henrique Bredda
Sócio da gestora Alaska Asset Management,
engenheiro pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP).
TRADUÇÃO
Daniel Moreira Miranda
Copyright da tradução e desta edição © 2020 by Edipro Edições Profissionais Ltda.
Título original: The Most Important Thing. Publicado originalmente nos Estados Unidos em 2011 pela
Columbia University Press. Traduzido com base na 1ª edição.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida ou transmitida de
qualquer forma ou por quaisquer meios, eletrônicos ou mecânicos, incluindo fotocópia, gravação ou
qualquer sistema de armazenamento e recuperação de informações, sem permissão por escrito do
editor.
Grafia conforme o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
1ª edição do e-book, 2020.
Editores: Jair Lot Vieira e Maíra Lot Vieira Micales
Coordenação editorial: Fernanda Godoy Tarcinalli
Produção editorial: Carla Bitelli
Edição de textos: Marta Almeida de Sá
Assistente editorial: Thiago Santos
Preparação de texto: Thiago de Christo
Revisão: Cátia de Almeida
Revisão técnica: Kátia Lopes Kazedani e Bruno Nunes Medeiro
Diagramação: Estúdio Design do Livro
Adaptação da capa da edição original: Marcela Badolatto
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Marks, Howard.
O mais importante para o investidor [livro eletrônico] : Lições de um gênio do mercado financeiro
/ Howard Marks ; prefácio de Henrique Bredda ; tradução de Daniel Moreira Miranda. – São Paulo :
Edipro, 2020.
1,5 Mb ; e-pub
Título original: The Most Important Thing.
ISBN 978-65-5660-021-5 (e-pub)
ISBN 978-65-5660-020-8 (impresso)
1. Análise de investimentos 2. Investimentos I. Bredda, Henrique. II. Título.
20-47257
Índice para catálogo sistemático:
CDD-332.6
1. Investimentos : Economia 332.6
Bibliotecária Cibele Maria Dias CRB-8/9427
Para Nancy, Jane e Andrew,
com todo o meu amor.
Sumário
Prefácio, por Henrique Bredda
Introdução
1. O mais importante é… o pensamento de segundo nível
2. O mais importante é… entender a eficiência do mercado
(e suas limitações)
3. O mais importante é… o valor
4. O mais importante é… a relação entre preço e valor
5. O mais importante é… entender o risco
6. O mais importante é… reconhecer o risco
7. O mais importante é… controlar o risco
8. O mais importante é… estar atento aos ciclos
9. O mais importante é… estar ciente do pêndulo
10. O mais importante é… combater as influências negativas
11. O mais importante é… o ponto de vista contrário
12. O mais importante é… encontrar pechinchas
13. O mais importante é… o oportunismo paciente
14. O mais importante é… saber o que não sabemos
15. O mais importante é… entender nossa posição
16. O mais importante é… apreciar o papel da sorte
17. O mais importante é… investir de forma defensiva
18. O mais importante é… evitar armadilhas
19. O mais importante é… agregar valor
20. O mais importante é… juntar tudo
Prefácio
A arte de escolher ações de empresas para investir, como diz Charlie Munger,
é um subproduto de algo muito maior: conhecimento sobre o mundo ou,
melhor dizendo, em inglês, worldly wisdom. Quem deseja desenvolver-se na
atividade de investimentos, cedo ou tarde, descobre que se trata de uma
jornada sem fim em busca de conhecimento — sobre o mundo — e,
sobretudo, uma eterna busca de autoconhecimento.
Por onde começar essa busca? O que temos de estudar? Quais livros
temos de ler? Qual a bibliografia recomendada? A resposta mais fácil seria
dizer “leia tudo”, sobre qualquer assunto, o tempo todo. Charlie Munger já
disse “Em toda a minha vida, nunca vi pessoas sábias que não lessem o
tempo todo — nenhuma, zero. Vocês ficariam espantados com o tanto que o
Warren lê e o quanto eu leio.”
Mas “ler tudo sobre qualquer assunto”, apesar de ser a resposta mais
honesta, pode ser transformado, a princípio, em “ler algumas coisas muito
importantes”, e, depois, ampliar o leque de conhecimento e se aprofundar o
máximo que puder nos temas de maior interesse. Na minha busca por
conhecimento, dividi a tarefa em duas partes: adquirir experiência prática
trabalhando sempre ao lado de pessoas talentosas, disciplinadas e as quais eu
admiro (atividade em que tive muita sorte) e ler os livros certos. Eu gostaria
de encurtar a jornada de aprendizado. Mas como fazer isso? Como ler um
livro que vale por dez? E outro que vale por vinte? Se eu conseguisse esse
atalho, poderia acelerar o aprendizado. Contudo, quais livros seriam esses
que valem por muitos? Como selecionar os livros mais efetivos? Pensei em
uma estratégia para achar esses livros.
Meu grande norte são os meus ídolos. Desde quando comecei a me
interessar por investimentos, a cada nova pesquisa, em cada notícia ou em
cada livro que eu lia, novos heróis surgiam. Warren Buffett foi o início de
tudo. Começou aos poucos. Em 2006, quando tivemos a notícia sobre a
doação gigantesca de 30 bilhões de dólares da fortuna do Buffett para a
fundação Melinda Gates, houve grande publicidade nas mídias focadas em
investimentos. Lembro-me de ter visto a notícia no canal da Bloomberg.
Aquele simpático investidor me chamou muito a atenção. (Como ele
acumulou 30 bilhões de dólares só investindo? Esse simpático senhor deve
ser bom em investimentos!) Nos anos seguintes, reparei que, nos dias do meu
aniversário, havia várias reportagens longas sobre aquele simpático senhor,
também aniversariante do dia 30 de agosto. Uma coisa levou a outra, e lá
estava eu lendo reportagens sobre esse grande investidor e frases dele.
Profissionalmente, eu já trabalhava como analista de empresas, e cada nova
frase ou novo livro sobre o Buffett, além de ser uma delícia de ler, me dava
mais certeza de qual caminho profissional eu deveria trilhar.
No entanto, o grande estalo para começar a definir o estilo de
investimento ao qual eu mais me identifico veio de um texto chamado “A arte
de investir em ações”, de Charlie Munger, o lendário sócio de Warren Buffett
na Berkshire Hathaway. São cerca de dezoito páginas de transcrição de um
discurso de Charlie para um grupo de estudantes, no qual argumenta que,
para se desenvolver nessa arte de investimento em ações, é necessário
dominar alguns poderosos modelos mentais. Não todos, mas os
fundamentais. É preciso conhecer os principais conceitos de contabilidade,
matemática, história, psicologia, biologia evolutiva (darwinismo,
adaptabilidade), entre outros. Esse texto me despertou a necessidade urgente
de ler mais, muito mais. Felizmente, ao ler o livro dedicado a Charlie
Munger, Poor Charlie’s Almanack: The Wit and Wisdom of Charles T.
Munger, que mais se parece com um livro de arte de tão pesado e ilustrado,
reparei que, no final, Charlie recomenda cinquenta livros que ele considera
essenciais, variando de Física a Biologia, passando pela história dos
escoceses, por psicologia, biografias de Warren Buffett e Benjamin Franklin
(grande ídolo e modelo de Munger).
Pronto, meu mapa estava bem mais nítido. Se você tem ídolos, tente saber
o que eles leram, o que estudaram, como aprenderam o que sabem e quais
atitudes os levaram a se tornar o seu ídolo. Ao ir atrás de cada livro, novos
autores surgiam, novos e ilustres investidores (até então desconhecidos por
mim) apareciam: Benjamin Graham, Seth Klarman, Walter Schloss, Martin
Whitman, Philip Fisher, Peter Lynch, e um que, imediatamente, me chamou
muito a atenção: Howard Marks.
Nas minhas buscas na Amazon, ranqueando os livros com as melhores
notas e avaliações, o livro O mais importante para o investidor logo se
destacou. Intrigado com o pretensioso título, comprei-o sem saber quem era,
de fato, Howard Marks. Quando vi que Joel Greenblatt, atual grande
referência em value investing na Columbia Business School, Jeremy
Granthan, o estrategista e CIO do grupo de investimentos GMO (que
publicou uma grande quantidade de artigos sobre investimentos), Seth
Klarman, autor do famoso livro Margin of Safety e presidente/gestor do The
Baupost Group, John Bogle, fundador da Vanguard Group e pai dos
investimentos passivos, e o próprio Warren Buffett estavam elogiando
Howard Marks, percebi que tinha nas minhas mãos mais uma excelente
leitura.
Entretanto, era bem mais do que isso. O livro O mais importante para o
investidor não tem a pretensão de ser um guia completo sobre investimentos,
mas, a meu ver, acabou se tornando praticamente isso. Esta obra é o mais
próximo do que você vai encontrar de um guia completo sobre os mais
variados assuntos que envolvem investimento: psicologia do investidor, a
diferença entre preço e valor, entendimento, reconhecimento e controle de
risco e, o que mais chamou minha atenção, ciclos de mercado.
Muitos temas que aparecem no livro já foram exaustivamente estudados
por outros investidores, mas foi na explicação sobre ciclos de mercado que
encontrei a maior novidade.
Benjamin Graham introduziu a ideia de que a ação representa uma fatia
patrimonial de uma empresa, e como tal esse ativo deve ser tratado. No
famoso capítulo 8 do livro O investidor inteligente, Ben Graham fala sobre o
“senhor mercado”, um senhor bipolar que muda de opinião sobre o preço dos
ativos conforme o humor do dia. É o começo do entendimento de que o
mercado acionário se trata, literalmente, de um local onde pessoas
comercializam fatias de empresas. É uma peixaria, uma central de
abastecimento. Mas, em vez de se comercializarem peixes ou frutas e
verduras, negociam-se fatias patrimoniais de companhias de capital aberto.
Ninguém é obrigado a vender ou comprar uma fatia de uma empresa por um
preço que não queira. O mercado está lá para servi-lo, e não obrigá-lo.
Walter Schloss, simples, humilde, extremamente consistente e um dos
alunos mais longevos de Benjamin Graham, nunca fez faculdade, mas fez o
curso de Ben Graham à noite e levava muito a sério a disciplina de adquirir
por um preço baixo algumas frações de empresas. Seu grande raciocínio
estava em calcular o valor dos ativos da empresa. Pensar na empresa como
um ativo real, tão tangível como uma fazenda, um terreno ou uma reserva de
petróleo, e não como um múltiplo do lucro corrente. Essa filosofia dava a paz
de espírito necessária para que Schloss pudesse fazer excelentes
investimentos. Lucros são muito voláteis, mas o valor das empresas nem
tanto. Se sua fazenda dá um lucro quatro vezes menor do que no ano anterior,
ela não passa a ter um valor justo imediatamente quatro vezes menor
também. Há circunstâncias temporárias que afetam o lucro corrente de uma
empresa, mas o valor justo dela depende de um fluxo de caixa futuro muito
maior do que o lucro corrente.
Warren Buffett é muito vocal sobre longo prazo, sobre a diferença entre
preço e valor, paciência, e sobre o poder dos juros compostos quando se
investe em excelentes negócios. É interessante notar a evolução de Warren
Buffett, mudando da fase 1, quando ele comprava praticamente qualquer tipo
de negócio, desde que o preço estivesse substancialmente abaixo do valor
justo, valor este praticamente visível a olho nu, evidenciado pela quantidade
de dinheiro no caixa da empresa, dos ativos da companhia, ou na soma dos
ativos líquidos (ativo menos o passivo). Era o Cigar Butt Investing, na alusão
às bitucas de charuto que as pessoas descartavam nas arquibancadas das
corridas de jóquei, e que ainda rendiam algumas tragadas para quem se
interessasse em pegá-las no chão para acendê-las. Na fase 2, sob a influência
de Charlie Munger, seu sócio, Warren Buffett muda para a procura de
excelentes negócios, empresas com marcas reconhecidas, fluxo de caixa
resiliente e que sejam à prova de administradores incompetentes. Coca-Cola
foi a grande representante dessa mudança de estilo, embora a filosofia tivesse
se iniciado com a See’s Candies.
Charlie Munger é o investidor filósofo, insistente sobre temas
relacionados a psicologia do investidor e nossas falhas cognitivas, que nos
levam a tomar decisões irracionais. Foi ele quem convenceu Buffett sobre a
superioridade de performance das excelentes empresas. Munger, quando foi
perguntado certa vez sobre como se definiria, não titubeou: “sou uma pessoa
racional”.
Seth Klarman foca na margem de segurança e nos ativos extremamente
descontados. É o investidor de valor clássico, indo atrás dos ativos.
Philip Fisher descreve com precisão o que procura numa empresa, dando
ênfase à capacidade de a empresa continuar crescendo por muitos anos
seguidos. O famoso Método Scuttlebutt, com uma sequência de quinze
perguntas essenciais para avaliar e descobrir empresas lucrativas para
investir, é uma verdadeira aula de como analisar e concluir se a empresa é ou
não uma excelente alternativa de investimento. Como curiosidade, Warren
Buffet se autodefine como sendo 85% Benjamin Graham e 15% Philip
Fisher. Particularmente, acredito no contrário. Pelos investimentos da
Berkshire Hathaway, parece-me que Buffett começou de fato 85%-15%, mas
foi se tornando cada vez mais 15%-85% com o tempo. Já Peter Lynch fala e
escreve muito bem sobre o quão acessível e factível é, para as pessoas
comuns, investir em ações. Se as pessoas focassem em negócios que já
conhecem por conviver no dia a dia, seja a empresa de cadeia de lojas que
vendem seus produtos preferidos ou aquele fabricante de sua sobremesa
predileta ou de seu carro preferido, teriam uma capacidade superior de
análise. Por que analisar aquela empresa que você nunca visitou, que fabrica
aquele produto que você nunca consumiu, se você pode parar para analisar
aquele administrador de shopping center que você frequenta, de que gosta e
do qual conhece os lojistas?
Todos os grandes investidores, referências, anteriormente mencionados,
de uma forma ou de outra focam na empresa, na sustentabilidade de longo
prazo de suas operações, nas vantagens competitivas, nas barreiras de
entrada, na diferença entre preço e valor e na análise psicológica dos
investidores e de nossas falhas cognitivas, que nos levam a tomar decisões
irracionais.
Apesar de comum e bem explorado por praticamente todos os investidores
autores, como podemos ver no breve resumo apresentado, a relação entre
preço e valor e a determinação do valor em si também são exploradas por
Howard Marks em dois capítulos. Essa relação é a coluna vertebral de
qualquer investidor de valor. A frase é do escritor irlandês Oscar Wilde, mas
pode ser usada para descrever a maioria dos participantes de mercado:
“Atualmente, as pessoas sabem o preço de tudo e o valor de nada.”.
O único tema que não é discutido pelos investidores fundamentalistas, e
muitas vezes criticado por eles como sendo uma perda de tempo, são os
ciclos de mercado. Essa foi a grande novidade, pelo menos para mim, trazida
por Howard Marks.
Um simples parágrafo do livro O mais importante para o investidor me
ajudou muito a entender o que estávamos observando no Brasil no final de
2015. Aquele nível de preços me remeteu imediatamente a Howard Marks.
Quando li o trecho em que ele diz que “[…] devemos lembrar que quase tudo
é cíclico. Mesmo tendo algumas poucas certezas, sei que as seguintes
afirmações são verdadeiras: ao final, os ciclos sempre prevalecem. Nada
caminha para sempre em uma só direção. As árvores não crescem até o céu.
Poucas coisas chegam a zero. Quase nada é tão perigoso para a saúde dos
investidores quanto a insistência em extrapolar os eventos atuais para o
futuro”, isso imediatamente me acendeu o sinal de alerta de que estávamos
próximo ao fundo do poço ou exatamente no fundo. Vários investidores, num
consenso raro, imaginavam que o Brasil estava caminhando inevitavelmente
para se tornar uma próxima Venezuela. Ativos iriam “para zero”. Estavam
extrapolando “os eventos atuais para o futuro”. Com essa ideia em mente,
aliada ao tradicional método de calcular o valor justo dos ativos, formamos a
convicção de que estávamos perto de um limite de baixa dos preços. Ter
“ouvido” Howard Marks foi extremamente rentável.
O livro também aborda todos os outros temas que são objetos de reflexão
por boa parte dos mais renomados investidores fundamentalistas que eu havia
estudado. O tema psicologia do investidor, pensamento de segundo nível, é
muito presente no primeiro capítulo; chama a atenção com exemplos práticos
sobre os problemas que surgem quando pensamos convencionalmente.
Raciocínios convencionais trazem resultados convencionais. Hoje é muito
comum o tema “finanças comportamentais”. Daniel Kahneman, Dan Ariely,
entre outros, popularizaram ainda mais o tema, evidenciando os vieses
irracionais que atrapalham a nossa tomada de decisão em várias situações,
não só investimentos. Howard Marks deixa esse tema bem prático para o
investidor. A primeira conclusão, aquela óbvia, pode não ser a correta. Se for
óbvia para todos os investidores, já não será óbvia.
A humildade com que Howard Marks reconhece alguns poderosos
conceitos sobre a teoria dos mercados eficientes, sem deixar de pontuar suas
limitações, é reconfortante. Jogar na lata do lixo o CAPM1 ou segui-lo às
cegas pode ser igualmente ruim para seus investimentos. Reconhecer que o
mercado é razoavelmente eficiente, e, quanto mais longo o seu horizonte de
investimento, mais eficiente o mercado tende a ser, é uma ideia poderosa.
O tema mais presente neste livro e que talvez seja o de maior utilidade
para os investidores já profissionais é sobre risco: entendimento,
reconhecimento e controle. A maioria dos meus maiores erros como
investidor veio de falhas ao lidar com o risco. Ter a constante ciência de que
risco significa que podem acontecer mais coisas do que as que vão acontecer
é uma poderosa ferramenta para avaliar se o seu portfólio aguenta o choque
de eventos dramaticamente improváveis.
O ponto mais alto do livro, surgindo como a grande novidade entre os
melhores investidores fundamentalistas que conhecia, é sobre os ciclos,
explorado em dois capítulos.
Tanto Howard Marks como meu grande herói e sócio Luiz Alves Paes de
Barros já disseram, em situações diferentes, que, quanto mais tempo se passa
no mundo dos investimentos, mais se aprecia a natureza cíclica de tudo. O
envolvimento das pessoas é a razão básica para o comportamento cíclico do
mundo. Tudo passa por ciclos de crescimento e declínio, ascensão e queda: as
economias, os mercados e as empresas.
Numa oportunidade, perguntado sobre a razão de se pensar em ciclos,
assim como Howard Marks, Luiz Alves respondeu: “E por acaso existe
alguma outra forma de pensar nos preços de mercado no longo prazo que não
em ciclos?”.
O livro não tem a pretensão de ensinar tudo sobre investimentos, mas ao
final você descobrirá que a leitura abordou praticamente todos os assuntos. É
de fato um guia extraordinário para direcionar os investidores nos mais
diversos aspectos dessa atividade de investir — parte arte, parte ciência.
O livro ensina quase tudo. Quase. Em uma de suas viagens ao Brasil, meu
amigo doutor Luiz Carlos Vasconcellos de Moraes Junior (o qual tive o
privilégio de conhecer por causa de nosso interesse mútuo na obra de Howard
Marks) teve a oportunidade, ao final de uma palestra, de fazer a seguinte
pergunta direta para Howard: “Se basta seguir suas regras para que uma
pessoa possa investir razoavelmente bem, por que as pessoas não
aprendem?”.
Howard Marks respondeu: “Podemos ensinar tudo sobre basquete para
uma pessoa. Podemos ensiná-la a arremessar, passar a bola, correr; podemos
ensinar as regras. Ensinamos tudo, só não podemos ensinar a pessoa a ser
alta. E, para jogar basquete, altura é fundamental.”.
A altura do jogador de basquete é o temperamento para o investidor de
empresas. Sem o temperamento adequado, você pode ter problemas. Mas, se
você tem o temperamento, com uma boa dose de paciência, disciplina e
capacidade de pensar de forma independente das outras pessoas, este livro o
tornará um investidor mais completo.
Se você tem ídolos, descubra o que eles leram, estudaram, como
aprenderam o que sabem e quais atitudes os levaram a tornar-se seus ídolos.
Com esse mapa na mão, comece a trilhar essa mesma escalada. A aventura
será somente sua, assim como cada queda, aprendizado e cicatriz, mas a vista
quando atingir o pico será igualmente linda.
O livro O mais importante para o investidor é uma parte imprescindível
desse mapa. A seguinte frase de Mark Twain resume muito bem a filosofia de
investimentos de Howard Marks: “A história não se repete, mas rima.”.
Henrique Bredda
SÓCIO DA GESTORA ALASKA ASSET MANAGEMENT.
ENGENHEIRO PELA ESCOLA POLITÉCNICA DA UNIVERSIDADE
DE SÃO PAULO (USP) E UM DOS INVESTIDORES DE MAIOR
RENOME DO MERCADO NACIONAL.
Introdução
Nos últimos vinte anos, escrevi memorandos ocasionais aos meus clientes,
primeiro na Trust Company of the West e depois na Oaktree Capital
Management, a empresa cofundada por mim em 1995. Utilizo-os para definir
minha filosofia de investimentos, explicar o funcionamento das finanças e
oferecer minha opinião sobre acontecimentos recentes. Esses documentos
formam a essência deste livro, e você encontrará passagens de muitos deles
nas próximas páginas; acredito que hoje as lições contidas neles sejam tão
úteis quanto eram na época em que foram redigidos. Fiz algumas pequenas
modificações para poder integrá-los ao livro; principalmente para que a
mensagem de cada um ficasse mais clara.
O que, exatamente, é “o mais importante”? Para responder a essa
pergunta, em julho de 2003, escrevi um memorando com o mesmo título,
reunindo os elementos que, do meu ponto de vista, eram essenciais para um
bom investimento. Começava assim: “Quando me encontro com clientes
efetivos ou prospectivos, percebo que digo de forma repetitiva que a coisa
mais importante é X; e, então, dez minutos depois, digo que a coisa mais
importante é Y. Logo em seguida, digo que é Z, e assim por diante.”. Ao
final, o memorando insere-se na discussão de dezoito coisas “mais
importantes”.
Desde a elaboração daquele documento original, fiz ajustes nas coisas que
considero “mais importantes”, mas a ideia fundamental não mudou: todas são
importantes. O bom investimento requer atenção criteriosa a diversos
aspectos distintos ao mesmo tempo. Omita qualquer um deles e,
provavelmente, o resultado não chegará a ser nem mesmo satisfatório. Por
esse motivo, o livro foi elaborado em torno da ideia das coisas mais
importantes — cada uma delas é um tijolo daquilo que acredito ser uma
parede sólida, e nenhuma delas é dispensável.
A proposta deste livro não está concentrada na produção de um manual
sobre como investir. Esta obra é mais uma declaração sobre minha filosofia
de investimentos, que considero ser meu credo e tem servido a mim como
uma religião no curso da minha carreira. Essas são as coisas em que acredito,
as sinalizações que indicam o caminho a ser seguido. Considero que as
mensagens deste livro são as mais duradouras. Acredito plenamente que elas
continuarão sendo relevantes.
Este não é um livro didático. Não há receita infalível para um bom
investimento. Não ofereço instruções passo a passo. Não há nenhuma
fórmula de avaliação contendo constantes matemáticas ou proporções fixas
— na verdade, pouquíssimos números. Ofereço uma forma de pensar que
pode ajudá-lo a tomar decisões acertadas e, talvez mais importante, evitar
armadilhas que capturam tantas pessoas.
Meu objetivo não é simplificar o ato de investir. Na verdade, quero deixar
bastante claro que investir é um ato muito complexo. Aqueles que tentam
simplificá-lo prestam um grande desserviço ao seu público. Vou me limitar
às ideias gerais sobre retorno, risco e processo; toda vez que discuto sobre
classes específicas de ativos e táticas, faço apenas para exemplificar meu
ponto de vista.
Um pouco sobre a organização do livro. Mencionei antes que o bom
investimento envolve a atenção criteriosa e simultânea a muitas áreas. Se
fosse possível, eu discutiria todas elas ao mesmo tempo. Mas, infelizmente,
as limitações da linguagem me forçam a atender um tópico por vez. Assim,
para estabelecer nosso espaço de atuação, começo com uma discussão sobre
o ambiente do mercado em que os investimentos são realizados. Em seguida,
passo a discutir os investidores e os elementos que afetam o êxito ou o
fracasso de seus investimentos e as ações que podem ser tomadas para
melhorar suas chances. Os capítulos finais têm caráter de resumo,
apresentam-se como uma tentativa de reunir essas duas ideias. Embora minha
filosofia seja de algo integral, alguns conceitos são relevantes para mais de
um capítulo — por isso, peço aos leitores paciência quando notarem
repetições.
Espero que considerem o conteúdo deste livro original, instigante e,
talvez, até controverso. Se alguém me disser algo como “gostei muito do seu
livro, ele confirma tudo o que eu já li até agora”, sentirei que fracasso em
minha tentativa. Meu objetivo é compartilhar ideias e formas de pensar sobre
tópicos de investimentos que ainda sejam desconhecidos para o leitor. Seis
palavrinhas me elevariam: “eu nunca pensei nisso dessa forma”.
Notem que passo mais tempo discutindo risco e as formas de limitá-lo do
que como obter retorno dos investimentos. A meu ver, o aspecto mais
interessante, desafiador e essencial de um investimento é o risco.
Quando clientes em potencial querem entender o que faz a Oaktree funcionar
bem, eles costumam perguntar sobre as nossas principais estratégias de
sucesso. Minha resposta é simples: uma filosofia de investimento eficaz,
desenvolvida e aprimorada ao longo de mais de quatro décadas e
implementada de um modo consciente por indivíduos altamente qualificados
que possuem cultura e valores compartilhados.
De onde vem uma filosofia de investimento? Se há algo que posso afirmar
categoricamente é que ninguém inicia sua carreira de investimentos com uma
filosofia já amadurecida. Ela é a soma de muitas ideias acumuladas,
derivadas de múltiplas fontes no decorrer de um longo período. Não é
possível desenvolver uma filosofia eficaz sem ter sido exposto às lições da
vida. Eu tive muita sorte com experiências enriquecedoras e lições profundas.
O tempo que passei em duas grandes faculdades de administração me
ofereceu uma combinação muito eficaz e provocativa: elementos básicos e
instrução qualitativa no período pré-teórico de minha graduação na Wharton
School (University of Pennsylvania) e uma educação teórica e quantitativa na
pós-graduação na University of Chicago. Contudo, determino como mais
importante, antes mesmo dos fatos e processos específicos assimilados, estar
exposto às duas principais escolas de pensamento sobre investimentos e ter
de refletir sobre como reconciliá-las e transformá-las em uma abordagem
própria.
É importante dizer que uma filosofia como a minha nasce quando
passamos pela vida com os olhos abertos. É preciso estar atento aos
acontecimentos do mundo e aos resultados desses eventos. Somente assim se
adquire a capacidade de praticar as lições aprendidas sempre que
circunstâncias semelhantes surgirem. Não conseguir fazer isso é o que —
mais do que qualquer outra coisa — condena a maioria dos investidores a
serem vítimas constantes de um ciclo de altos e baixos.
Gosto de afirmar que, “quando não conseguimos o que queríamos,
ganhamos experiência”. Os bons tempos ensinam apenas lições ruins, isto é,
que investir é fácil, que conhecemos os segredos dos investimentos e que não
precisamos nos preocupar com os riscos. As lições mais valiosas são
aprendidas em tempos difíceis. Nesse sentido, tive “sorte” de ter passado por
alguns momentos assim: a crise do petróleo, a estagflação, o colapso das
Nifty Fifty (as cinquenta ações mais atraentes) e a “morte das ações” (death of
equities) na década de 1970; a segunda-feira negra de 1987, quando o Índice
Industrial Dow Jones perdeu 22,6% de seu valor em um único dia; o aumento
das taxas de juros de 1994, que colocou instrumentos de dívida sensíveis à
taxa em queda livre; a crise do mercado emergente, a inadimplência russa e o
colapso do fundo de investimento Long-Term Capital Management (LTCM)
em 1998; o estouro da bolha da internet (ou bolha das empresas “ponto com”)
em 2000-2001; os escândalos contábeis de 2001-2002; e a crise financeira
mundial de 2007-2008.
A década de 1970, período em que surgiram muitos desafios, foi
particularmente importante para minha formação. Conseguir um emprego na
área de investimentos nessa época era praticamente impossível, pois, para
obter experiência na área durante esse período, era preciso estar empregado
no ano anterior. Quantas pessoas que começaram nos anos 60 ainda estavam
trabalhando na época em que ocorreu a bolha da internet, no final dos anos
90? Não muitas. A maioria dos investidores profissionais havia começado a
trabalhar na década de 1980 ou 1990 e não sabia que o mercado era capaz de
sofrer uma queda que superasse 5%, a maior observada entre 1982 e 1999.
Quando lemos muito, aprendemos com pessoas cujas ideias merecem ser
publicadas. Para mim, os textos de mais importância foram: o grande artigo
de Charley Elli, “The loser’s game” (O jogo dos perdedores), no The
Financial Analysts Journal, julho-agosto de 1975; de John Kenneth
Galbraith, A short story of financial euphoria (Um conto sobre euforia
financeira), Nova York, Viking, 1990; e de Nassim Nicholas Taleb, Fooled
by randomness (Iludido pelo acaso), Nova York, Texere, 2001. Estes
exerceram bastante influência sobre minha maneira de refletir.
Por fim, fui afortunado por aprender diretamente com alguns excelentes
pensadores: sobre as falhas humanas, com John Kenneth Galbraith; sobre
paciência e pontos de vista contrários, com Warren Buffett; Charlie Munger
me ensinou sobre a importância das expectativas razoáveis; Bruce Newberg,
sobre “probabilidade e resultado”; Michael Milken, sobre o risco consciente;
e Ric Kayne, sobre a criação de “armadilhas” (oportunidades de investimento
subestimadas em que é possível ganhar muito sem perder muito). Também
lucrei ao me associar a Peter Bernstein, Seth Klarman, Jack Bogle, Jacob
Rothschild, Jeremy Grantham, Joel Greenblatt, Tony Pace, Orin Kramer, Jim
Grant e Doug Kass.
A verdade é que fui exposto a todos esses elementos de forma consciente,
podendo combiná-los em uma filosofia de investimentos que tem gerado
lucros para minhas empresas — e, portanto, para os clientes — por muitos
anos. Embora não seja a única filosofia possível — há muitas maneiras de
acertar um alvo —, funcionou para nós.
Apresso-me a salientar que ela não teria muito significado se não fosse
implementada de forma qualificada pelos incríveis cofundadores da Oaktree
— Bruce Karsh, Sheldon Stone, Larry Keele, Richard Masson e Steve
Kaplan —, com os quais tive a sorte de me unir entre 1983 e 1993. Convencime de que nenhuma ideia pode ser melhor do que a ação tomada sobre ela, e
isso é especialmente verdadeiro no mundo dos investimentos. A filosofia que
compartilho aqui não teria atraído atenção se não considerasse as realizações
desses parceiros e de outros colegas da Oaktree.
1
O mais importante é… o pensamento de segundo
nível
A arte do investimento tem uma característica que não costuma
ser apreciada. Um resultado admirável, mesmo que não muito
espetacular, pode ser alcançado pelo investidor leigo com um
mínimo de esforço e capacidade; mas a melhora desse padrão
facilmente atingível requer muita dedicação e muito mais do
que apenas um traço de sabedoria.
BEN GRAHAM, O INVESTIDOR INTELIGENTE
Tudo deve ser feito da maneira mais simples possível, mas não
simples demais.
ALBERT EINSTEIN
Não é para ser fácil. É estúpido quem acha fácil.
CHARLIE MUNGER
Poucos têm vocação para ser grandes investidores. Alguns podem ser
ensinados, mas nem todos… E aos que podem ser ensinados não há como
ensinar tudo. Abordagens válidas funcionam algumas vezes, não sempre.
Além disso, não há como reduzir o ato de investir a um algoritmo e entregálo a um computador. Mesmo os melhores investidores não acertam sempre.
As razões dessas limitações são simples: não há regras que funcionem em
todos os casos; o ambiente não é controlável, e as circunstâncias raramente se
repetem exatamente da mesma forma. A psicologia desempenha um papel
importante nos mercados, e as relações de causa e efeito, por serem muito
variáveis, não são confiáveis. Uma abordagem de investimento pode
funcionar por um tempo, mas chegará um momento em que as ações exigidas
por ela mudarão o ambiente, revelando a necessidade de se buscar uma nova
abordagem. Ademais, a eficácia de uma abordagem fica reduzida quando
outras passam a imitá-la.
Investir, assim como a ciência econômica, é mais arte do que ciência. O
que significa que pode causar um pouco de confusão.
Uma das coisas mais importantes a se ter em mente hoje é que economia não é
uma ciência exata. É até mesmo possível que não seja uma ciência, no sentido de
que, na ciência, é possível realizar experimentos controlados, replicar resultados
passados com confiança e garantir a manutenção das relações de causa e efeito.
“WILL IT WORK?” (VAI DAR CERTO?), 5 DE MARÇO DE 2009
Tendo em vista que investir é, no mínimo, tanto uma arte quanto uma
ciência, não tenho nenhuma intenção de sugerir — neste livro ou em qualquer
outro lugar — que possamos fazer investimentos por meio de ações
rotineiras. Na verdade, uma das coisas que mais quero enfatizar é a grande
importância de se fazer uma abordagem de investimento intuitiva e adaptável,
em vez de determinada e mecanicista.
No fundo, tudo depende do que se pretende realizar. Qualquer um pode
atingir um desempenho médio — basta investir em um fundo de índice que
compra um pouco de tudo. Isso lhe dará o que é conhecido como “retorno de
mercado” — simplesmente igualando-se ao mercado. Mas investidores bemsucedidos querem mais; querem uma performance acima dos índices de
mercado, isto é, vencer o mercado.
Acredito que esta seja a definição de investimento bem-sucedido: ter uma
performance melhor que a do mercado e a de outros investidores. Para chegar
a isso, é necessário ter boa sorte ou uma percepção excepcional. Contar com
a sorte não é um grande plano, então o melhor a fazer é nos concentrarmos na
percepção. No basquete dizem que é impossível treinar a altura das pessoas,
querendo dizer que nenhum treinador do mundo será capaz de tornar um
jogador mais alto. É quase tão difícil quanto ensinar percepção às pessoas.
Como em qualquer outra forma de arte, algumas pessoas sabem investir
melhor. Elas têm — ou conseguiram adquirir — aquele “traço de sabedoria”
necessário de que Ben Graham trata de forma tão eloquente.
Todos querem ganhar dinheiro. Toda a economia é baseada na crença da
universalidade da motivação do lucro. Assim também é o capitalismo; a
motivação do lucro faz que as pessoas trabalhem de forma mais árdua e
arrisquem o seu capital. A busca por lucros produziu grande parte do
progresso material existente no mundo.
Porém, por causa dessa universalidade, ganhar do mercado, isto é, ter uma
performance acima dos índices de mercado, passa a ser uma tarefa difícil.
Milhões de pessoas competem por cada dólar disponível. Quem ganhará? A
pessoa que estiver um passo à frente das demais. Em algumas atividades, ser
o melhor significa ter mais estudos, passar mais tempo na academia ou na
biblioteca, estar mais bem nutrido, transpirar mais, ter mais resistência ou um
melhor equipamento. Investir, no entanto — uma área em que essas coisas
não valem muito —, é uma atividade que exige pensamento mais
perceptivo… algo que chamo de pensamento de segundo nível.
Os futuros investidores podem fazer cursos de finanças e contabilidade,
ler muito e, se tiverem sorte, receber mentoria de alguém com uma
compreensão profunda do processo de investimento. Mas apenas alguns deles
terão a percepção, a intuição, o senso psicológico de valor e a consciência
excelentes que são necessários para obter resultados que estejam
consistentemente acima da média. Para isso é necessário o pensamento de
segundo nível.
Lembre-se de que não desejamos obter retornos médios ao investir; queremos
estar acima da média. Assim, seu pensamento precisa ser melhor do que o
dos outros — deve ser mais poderoso e estar em um nível mais alto. Uma vez
que outros investidores podem ser inteligentes, bem informados e altamente
informatizados, é preciso encontrar alguma vantagem que eles não tenham,
pensar em algo a que eles não se ativeram, ver coisas que eles não
conseguiram enxergar ou perceber o que eles não perceberam. É preciso
reagir e se comportar de forma diferente. Em suma, estar certo pode ser uma
condição necessária para o sucesso do investimento, mas não será suficiente.
Você deve estar mais certo do que os outros…, que, por definição, significa
que seu pensamento tem de ser diferente.
O que é pensamento de segundo nível?
• O pensamento de primeiro nível diz: “Esta é uma boa empresa, vamos
comprar ações!”. O pensamento de segundo nível diz: “Esta é uma boa
empresa, no entanto, todos a consideram uma grande empresa, e ela não é.
Por isso, suas ações estão superestimadas e sobrevalorizadas. Vamos
vender!”.
• O pensamento de primeiro nível diz: “O cenário exige baixo crescimento e
aumento da inflação. Vamos vender nossas ações!”. O de segundo nível
diz: “O cenário está ruim, mas todos os outros estão vendendo porque
estão em pânico. Vamos comprar!”.
• O pensamento de primeiro nível diz: “Eu acho que os lucros da empresa
vão cair; venda!”. O de segundo nível diz: “Eu acho que os lucros da
empresa vão diminuir menos do que as pessoas esperam, e essa boa
surpresa fará as ações subirem; vamos comprar!”.
O pensamento de primeiro nível é simplista, superficial e comum a quase
todas as pessoas (e isso não é um bom sinal para qualquer coisa que envolva
uma tentativa de superioridade). Tudo o que o pensador de primeiro nível
precisa é de uma opinião sobre o futuro, como, por exemplo, “o cenário para
a empresa é favorável e, por isso, as ações subirão”.
O pensamento de segundo nível é profundo e complexo. O pensador deste
nível leva muitas coisas em conta:
•
•
•
•
•
•
Qual é a gama de prováveis resultados futuros?
Que resultado eu acho que vai ocorrer?
Qual é a probabilidade de eu estar certo?
Qual é o consenso?
Em que aspectos minha expectativa difere do consenso?
Como o preço atual do ativo se comporta com base na visão consensual do
futuro? E na minha visão?
• A psicologia de consenso que está incorporada ao preço é muito otimista
ou pessimista?
• O que acontecerá com o preço do ativo se o consenso estiver certo? E se
eu estiver certo?
A diferença de carga de trabalho entre o pensamento de primeiro e
segundo nível é claramente gigantesca; e o número de pessoas capazes de
realizar este último tipo de pensamento é pequeno em comparação ao número
de pessoas capazes de realizar o primeiro tipo.
Pensadores de primeiro nível buscam fórmulas simples e respostas fáceis.
Os de segundo nível sabem que investir bem é a antítese da simplicidade.
Isso não quer dizer que não se encontre muita gente tentando ao máximo
fazer com que investir pareça simples. Chamo algumas dessas pessoas de
“mercenárias”. As corretoras tentam convencer seus clientes de que todos são
capazes de investir — a 10 dólares por transação. As empresas de fundos
mútuos não desejam que seus clientes sintam-se capazes para investir com
sucesso; querem fazê-los acreditar que só elas podem. Nesse caso, coloca-se
o dinheiro em fundos gerenciados ativamente e pagam-se altas taxas de
administração.
Outras que simplificam são aquelas que chamo de “proselitizadoras”.
Algumas são acadêmicas que dão aulas sobre investimentos, outras são
praticantes bem-intencionadas que superestimam até que ponto estão no
controle; acredito que a maioria não consegue determinar a soma de seus
históricos, ou ignora os anos ruins, ou atribui suas perdas ao azar. Por fim, há
os que simplesmente não conseguem entender a complexidade do assunto.
Um comentarista convidado da estação de rádio que costumo ouvir no carro
disse o seguinte: “se a sua experiência com um produto foi boa, compre ações
da empresa”. Ocorre que, para ser um bom investidor, é preciso muito mais
do que apenas isso.
Pensadores de primeiro nível pensam da mesma forma que outros
pensadores de primeiro nível sobre os mesmos temas e, em geral, chegam às
mesmas conclusões. Por definição, esse não pode ser o caminho para chegar
aos melhores resultados. Não há como todos os investidores terem
performance superior ao nível do mercado, pois, coletivamente, eles são o
mercado.
Antes de tentar competir em um mundo de investimentos de soma zero,
precisamos nos perguntar se temos uma boa razão para fazer parte da metade
superior. Para superar o investidor médio, precisamos ter a capacidade de
pensar melhor do que o consenso. Você é capaz de fazer isso? Por que
acredita nisso?
O problema é que o desempenho extraordinário nasce apenas de previsões
não consensuais corretas, mas previsões não consensuais são difíceis de
serem feitas de forma correta e exigem uma difícil tomada de ação. Ao longo
dos anos, muitas pessoas me disseram que o quadro mostrado a seguir causou
grande impacto nelas:
Não é possível fazer as mesmas coisas que os outros fazem e esperar superá-los…
A não convencionalidade não deveria ser um objetivo em si, mas, sim, uma
maneira de pensar. Para nos diferenciarmos dos outros, precisamos ter ideias
diferentes e processá-las de forma diferente. Eu descrevo a situação em um quadro
2 × 2 simples:
Comportamento
convencional
Comportamento não
convencional
Resultados favoráveis
Resultados bons (dentro da
média)
Resultados acima da média
Resultados
desfavoráveis
Resultados ruins (dentro da
média)
Resultados abaixo da média
Embora nada seja tão fácil e tão claro, acredito que essa seja a situação geral. Se
nosso comportamento for convencional, provavelmente atingiremos resultados
convencionais — bons ou ruins. Somente se seu comportamento é não
convencional, é provável que seu desempenho seja não convencional e, somente se
seus julgamentos são superiores, é provável que seu desempenho seja acima da
média.
“DARE TO BE GREAT” (OUSE SER GRANDE), 7 DE SETEMBRO DE 2006
O resultado é simples: para que investimentos tenham resultados
superiores, precisamos ter opiniões não consensuais sobre valor, e elas devem
ser precisas. Isso não é fácil.
A atratividade de comprar algo por menos do que vale faz todo sentido. Então,
como encontrar pechinchas em mercados eficientes? Para isso, precisamos ter
habilidade analítica, capacidade de percepção ou de previsão excepcionais. No
entanto, poucas pessoas têm essa excepcionalidade.
“RETURNS AND HOW THEY GET THAT WAY” (RENDIMENTOS E COMO SE TORNAM O
QUE SÃO), 11 DE NOVEMBRO DE 2002
Para que o desempenho divirja da norma, suas expectativas e, portanto,
seu portfólio devem seguir o mesmo caminho; e você precisa estar mais certo
do que o consenso. Diferente e melhor: essa é uma boa descrição do
pensamento de segundo nível.
Os que consideram o processo de investimento como algo simples não
costumam estar cientes da necessidade — ou mesmo da existência — do
pensamento de segundo nível. Assim, muitas pessoas são enganadas e
levadas a acreditar que todos podem ser investidores bem-sucedidos, mas
nem todos conseguem. A boa notícia é que a prevalência de pensadores de
primeiro nível eleva os retornos disponíveis para os de segundo nível. Para
que retornos de investimentos sejam superiores de forma consistente,
devemos ser um destes.
2
O mais importante é… entender a eficiência do
mercado
(e suas limitações)
Em teoria, não há diferença entre teoria e prática, mas na prática
há.
YOGI BERRA
A década de 1960 testemunhou o surgimento de uma nova teoria sobre
finanças e investimentos, um conjunto de ideias conhecido como Escola de
Chicago, por ter se originado no departamento de economia da University of
Chicago. Tendo estudado lá entre 1967 e 1969, eu me encontrava no
epicentro da nova teoria. Essa escola de pensamento econômico exerceu
grande influência sobre minhas ideias.
A teoria inclui conceitos que se tornaram elementos importantes das
discussões sobre investimentos: aversão ao risco, volatilidade como definição
de risco, retornos ajustados ao risco, risco sistemático e não sistemático, alfa,
beta, a hipótese do passeio aleatório e a hipótese do mercado eficiente.
(Todos esses conceitos serão abordados nas próximas páginas.) Desde sua
propositura, este último conceito se mostrou particularmente influente no
campo dos investimentos, tão significativo que, aqui, merece um capítulo
próprio.
A hipótese do mercado eficiente afirma que:
• Há muitos participantes nos mercados; todos compartilham acesso
aproximadamente igual a todas as informações relevantes. Todos são
inteligentes, objetivos, altamente motivados e trabalhadores. Seus modelos
analíticos são amplamente conhecidos e utilizados.
• Devido aos esforços coletivos desses participantes, a informação se reflete
plena e imediatamente no preço de mercado de cada ativo. E como os
participantes do mercado se movimentarão instantaneamente para comprar
qualquer ativo que seja muito barato ou vender um que seja muito caro, os
ativos são precificados de forma justa, seja em termos absolutos ou relativos
uns aos outros.
• Assim, os preços de mercado representam estimativas precisas do valor
intrínseco dos ativos, e, por isso, nenhum participante é capaz de identificar e
lucrar de modo constante quando os preços de mercado estão errados.
• Os ativos, portanto, são vendidos a preços pelos quais se esperam que
entreguem retornos ajustados ao risco “justos” em relação aos outros ativos.
Ativos mais arriscados oferecem retornos maiores para atrair compradores. O
mercado definirá os preços de modo que esse pareça ser o caso, mas não
oferecerá “almoço grátis”. Ou seja, não haverá retorno incremental que não
esteja relacionado (e que não seja compensatório) ao risco incremental.
Esse é um resumo mais ou menos oficial dos destaques. Agora, minha opinião:
quando falo sobre essa teoria, também uso a palavra eficiente, mas a utilizo no
sentido de “veloz, rápido para incorporar informações” e não no sentido de
“correto”.
Visto que os investidores se esforçam arduamente para avaliar cada nova
informação, concordo que os preços dos ativos refletem de forma imediata a visão
consensual sobre a importância das informações. No entanto, não creio que a visão
consensual esteja necessariamente correta. Em janeiro de 2000, as ações do Yahoo
eram vendidas a 237 dólares. Em abril de 2001, o preço era 11 dólares. Quem
afirma que o mercado estava certo nas duas ocasiões estava muito distraído; em
pelo menos uma dessas ocasiões o mercado estava necessariamente errado. Mas
isso não significa que muitos investidores tenham conseguido detectar o erro e
responder a ele.
Se, em mercados eficientes, os preços já refletem o consenso, então compartilhar a
visão de consenso nos fará provavelmente ganhar apenas um retorno médio. Para
vencer o mercado, deve-se ter uma visão peculiar — ou não consensual.
O ponto principal é o seguinte: mesmo que os mercados mais eficientes costumem
errar na precificação dos ativos, não é fácil — quando trabalhamos com as mesmas
informações que todos os outros e estamos sujeitos às mesmas influências
psicológicas — manter, de modo constante, opiniões diferentes das emitidas por
consenso e que, também, se aproximem mais de estar corretas. É isso que torna os
mercados tradicionais terrivelmente difíceis de serem vencidos — mesmo que eles
nem sempre estejam certos.
“WHAT’S IT ALL ABOUT, ALPHA?” (DO QUE SE TRATA, ALFA?), 11 DE JULHO DE 2001
O resultado mais importante da hipótese do mercado eficiente é a
conclusão de que “você não pode vencer o mercado”. Além de essa
conclusão estar logicamente baseada na visão de Chicago sobre o mercado,
também foi reforçada por estudos sobre o desempenho dos fundos mútuos.
Desses fundos, pouquíssimos se destacaram por seus resultados.
Alguém pode trazer os fundos de cinco estrelas à discussão. Leia as letras
pequenas: os fundos mútuos são classificados em relação uns aos outros. As
classificações não dizem nada sobre serem maiores que algum padrão
objetivo, como, por exemplo, um índice de mercado.
E os célebres investidores sobre os quais ouvimos tanto falar? Primeiro,
um ou dois bons anos não provam nada; a própria sorte, sozinha, é capaz de
produzir quase qualquer resultado. Em segundo lugar, os estatísticos insistem
que nada pode ser provado com significância estatística até que você tenha
dados de um número suficiente de anos; lembro-me de uma cifra de 64 anos,
e quase ninguém consegue administrar dinheiro por tanto tempo. Por fim, o
surgimento de um ou dois grandes investidores não refuta a teoria. O fato de
que os Warren Buffetts deste mundo atraem tanta atenção é uma indicação
clara de que o bom desempenho contínuo é algo excepcional.
Uma das maiores ramificações da teoria da Escola de Chicago tem sido o
desenvolvimento de veículos de investimento passivo conhecidos como
fundos de índice. Se nem mesmo a maioria dos gestores de carteira ativa, que
fazem “apostas ativas” em quais investimentos dar maior ou menor peso, são
capazes de vencer o mercado, por que pagar o preço — na forma de custos de
transação e taxas de administração — que essa tentativa implica? Levando
em conta essa questão, os investidores têm colocado quantias cada vez
maiores em fundos que simplesmente investem uma quantia determinada
pelo mercado em cada ação ou título de certo índice de mercado. Dessa
forma, os investidores desfrutam de retornos de mercado pagando uma taxa
de apenas alguns centésimos por cento ao ano.
Tudo se move em ciclos, conforme discutirei mais tarde, e isso inclui a
“sabedoria aceita”. Desse modo, a hipótese do mercado eficiente se alastrou
rapidamente na década de 1960 e criou muitos adeptos. Desde então, foram
levantadas objeções ao modelo e, assim, a visão geral sobre sua
aplicabilidade é instável. Tenho minhas próprias reservas em relação à teoria,
e a maior delas refere-se à forma como essa teoria vincula os conceitos de
retorno e de risco.
De acordo com a teoria do investimento, as pessoas são avessas ao risco
por natureza, o que significa que, em geral, preferem se submeter a menos
riscos. Para que façam investimentos mais arriscados, precisam ser induzidas
pela promessa de maiores retornos. Assim, os mercados ajustarão os preços
dos investimentos para que, com base nos fatos conhecidos e nas percepções
comuns, os mais arriscados pareçam prometer maiores retornos.
Já que a teoria fala em mercado eficiente, o modelo não comporta nenhum
tipo de competência (que hoje costumamos chamar de alfa) que permitiria a
alguém vencer o mercado; toda a diferença de retorno entre um investimento
e outro — ou entre o portfólio de uma pessoa e o de outra — é atribuída à
diferença de risco. Na verdade, se mostrarmos a um adepto da hipótese do
mercado eficiente os dados de algum investimento que pareça ser superior,
como eu tenho feito, a resposta recairá sobre o seguinte: “esse retorno maior
pode ser explicado pelo risco oculto” (o recurso seria dizer: “você não tem
dados de um número suficiente de anos”).
De vez em quando experimentamos períodos em que tudo vai bem, e
investimentos mais arriscados nos entregam os retornos maiores que parecem
prometer. Esses períodos de despreocupação fazem as pessoas acreditarem
que, para obter maiores retornos, tudo de que precisam é realizar
investimentos mais arriscados. Mas ignoram algo que é facilmente esquecido
nos tempos de fartura: isso não pode ser verdade, pois, se os investimentos
mais arriscados produzissem maiores retornos de forma confiável, então não
poderíamos dizer que eles são mais arriscados.
Às vezes, as pessoas aprendem uma lição essencial. Percebem que nada
— certamente, nem a aceitação indiscriminada do risco — cumpre a
promessa de almoço grátis e, assim, são novamente lembradas sobre as
limitações da teoria do investimento.
Essa é a teoria e suas implicações. A principal questão é se ela está correta ou
não: Será que o mercado é realmente invencível? As pessoas que tentam
vencê-lo estão perdendo tempo? Os clientes que pagam taxas aos gestores de
investimentos estão desperdiçando seu dinheiro? Como a maioria das outras
coisas no meu mundo, as respostas não são simples… e, certamente, não
podem ser respondidas com “sim” ou “não”.
Não acredito que a noção de eficiência de mercado mereça ser
imediatamente descartada. Em princípio, é justo concluir que, se milhares de
pessoas racionais e capazes de fazer cálculos coletarem informações sobre
um ativo e o avaliarem de forma criteriosa e objetiva, o preço do ativo não
deverá ficar muito distante de seu valor intrínseco. Os erros de precificação
não devem ser comuns; isso significa que deve ser difícil vencer o mercado.
Na verdade, algumas classes de ativos são bastante eficientes. Na maioria
dessas:
• a classe de ativos é amplamente conhecida e tem um amplo número de
seguidores;
• a classe é socialmente aceitável, não controversa ou tabu;
• os méritos da classe são claros e compreensíveis, pelo menos
aparentemente; e
• as informações sobre a classe e seus componentes são distribuídas de
forma ampla e uniforme.
Se essas condições forem atendidas, não há razão para que a classe de
ativos seja sistematicamente negligenciada, mal interpretada ou subestimada.
Veja o exemplo do câmbio. O que determina os movimentos de uma
moeda em relação a outra? Taxas de crescimento futuras e taxas de inflação.
É possível que uma única pessoa seja capaz de saber sistematicamente muito
mais sobre esses determinantes do que todas as outras? Provavelmente não.
E, se não, então ninguém deve ser capaz de obter retornos ajustados pelo
risco regularmente acima da média por meio de negociação cambial.
E os principais mercados de ações, como a Bolsa de Valores de Nova
York? Aqui milhões de pessoas estão prospectando, motivadas pelo desejo de
lucro. Todas possuem as mesmas informações; na verdade, um dos objetivos
da nossa regulamentação de mercado é que todos devem, ao mesmo tempo,
ter acesso às mesmas informações das empresas. Com milhões de pessoas
fazendo análises semelhantes com base em informações semelhantes, com
que frequência as ações acabam sendo mal precificadas e com que
regularidade uma pessoa pode detectar erros nos preços?
Resposta: com pouca frequência e de forma pouco confiável. Mas essa é a
essência do pensamento de segundo nível.
Pensadores de segundo nível sabem que, para alcançar resultados
superiores, precisam ter uma vantagem em relação às informações, à análise
ou a ambas. Eles estão alertas para os casos de uma percepção errônea. Meu
filho, Andrew, é um investidor em ascensão; ele tem muitas ideias para
realizar investimentos atraentes, todas baseadas em fatos atuais e perspectivas
do futuro. Mas ele foi bem treinado. Sua primeira pergunta-teste é sempre a
mesma: “Quem não sabe disso?”.
No vocabulário da teoria, pensadores de segundo nível confiam na
ineficiência. O termo ineficiência generalizou-se nos últimos quarenta anos
como contraponto à crença de que os investidores não podem vencer o
mercado. Penso que descrever um mercado como ineficiente é uma maneira
de dizer que ele está propenso a erros que podem ser aproveitados.
De onde vêm os erros? Vamos considerar as suposições que sustentam a
teoria dos mercados eficientes:
• há muitos investidores se esforçando de forma árdua;
• eles são inteligentes, diligentes, objetivos, motivados e bem equipados;
• todos têm acesso às informações disponíveis, e o acesso a elas é
semelhante; e
• estão todos abertos a comprar, vender ou vender a descoberto (ou seja,
apostar contra) todos os ativos.
Por essas razões, a teoria diz que todas as informações disponíveis serão
transformadas, sem percalços e de forma eficiente, em preços e gerarão sinais
sempre que surgirem discrepâncias de preço/valor, para que essas
discrepâncias sejam descartadas.
Mas é impossível afirmar que os preços de mercado estão sempre certos.
Na verdade, se verificarmos as quatro suposições listadas, uma se destaca
como particularmente tênue: a objetividade. Os seres humanos não são
máquinas de computação sem emoções. De fato, a maioria das pessoas é
motivada por ganância, medo, inveja e outras emoções que tornam a
objetividade impossível e oferecem espaço para erros consideráveis.
Da mesma forma, o que dizer sobre a quarta suposição? Consideramos
que os investidores estão supostamente abertos a qualquer ativo — e tanto a
possuí-lo quanto a vendê-lo a descoberto —, mas a verdade é muito diferente.
A maioria dos profissionais trabalha com certos nichos específicos de
mercado, alguns trabalham no departamento de renda variável, outros são
gestores de títulos. E a porcentagem de investidores que vendem a descoberto
é realmente pequena. Quem, então, toma e implementa as decisões que
afastariam os erros relativos de precificação entre as classes de ativos?
Um mercado caracterizado por erros e precificações errôneas pode ser
vencido por pessoas que possuam uma percepção rara. Assim, a existência de
ineficiências dá origem à possibilidade da performance superior e é uma
condição necessária para isso. Entretanto, elas não garantem esse resultado.
Um mercado ineficiente, como o entendo, é caracterizado por pelo menos uma (e
provavelmente, como resultado, por todas) das seguintes características:
• Os preços de mercado estão frequentemente errados. Tendo em vista a grande
imperfeição do acesso à informação e de sua subsequente análise, os preços de
mercado costumam estar muito acima ou muito abaixo dos valores intrínsecos;
• O retorno ajustado ao risco de uma classe de ativos pode estar muito
desalinhado em relação ao de outras classes de ativos. Tendo em vista que os
ativos são frequentemente avaliados a preços que divergem do justo, uma
classe de ativos pode oferecer um retorno ajustado ao risco significativamente
muito alto (um almoço grátis) ou muito baixo em relação a outras classes de
ativos; e
• Alguns investidores são capazes de superar outros de forma consistente. Tendo
em vista a existência de (a) grandes avaliações errôneas e (b) diferenças entre
os participantes em termos de competência, discernimento e acesso à
informação, é possível identificar as avaliações errôneas e lucrar regularmente
com elas.
Este último ponto é muito importante em termos do que quer dizer e do que não
quer. Os mercados ineficientes não garantem necessariamente retornos generosos
aos seus participantes. Na verdade, acredito que ofereçam a matéria-prima — erros
de precificação — para que algumas pessoas possam ganhar e outras perder com
base em alguma competência diferencial. Se os preços podem estar muito errados,
isso significa a possibilidade da existência de pechinchas ou de preços excessivos.
Em um mercado ineficiente, para cada boa compra, há alguém vendendo muito
barato. Um dos grandes ditados do pôquer é que em todo jogo há um jogador ruim,
conhecido como peixe. Se você jogou por 45 minutos e ainda não descobriu quem
é o peixe, então ele é você. Isso também se aplica ao investimento em mercados
ineficientes.
“WHAT’S IT ALL ABOUT, ALPHA?” (DO QUE SE TRATA, ALFA?) 11 DE JULHO DE 2001
No grande debate sobre eficiência e ineficiência, concluí que não existe
mercado estabelecido totalmente sobre apenas uma das duas. É só uma
questão de gradação. Aprecio profundamente as oportunidades que a
ineficiência pode proporcionar, mas também respeito o conceito de eficiência
de mercado; além disso, também creio fortemente que os principais mercados
de valores mobiliários chegam a ser tão eficientes que a busca por vencedores
acaba se tornando uma grande perda de tempo.
A conclusão sobre essa reflexão parece-me interessante: a eficiência não é
tão universal a ponto de fazer com que desistamos do desempenho superior.
Ao mesmo tempo, eficiência é aquilo que os advogados chamam de
“presunção refutável” — algo que se presume verdadeiro até que se
apresentem provas contrárias. Devemos, então, assumir que a eficiência será
um obstáculo para realizarmos o que desejamos, a menos que tenhamos boas
razões para acreditar, em um caso apresentado, que não seja.
O respeito pela eficiência diz que, antes de tomarmos alguma atitude,
devemos nos fazer algumas perguntas: será que os erros e as precificações
errôneas foram afastados por meio dos esforços conjuntos dos investidores?
Ou ainda existem? E por quê?
Devemos pensar assim:
• Por que existem pechinchas se há milhares de investidores sempre prontos
e dispostos a oferecer um preço maior para qualquer coisa que seja muito
barata?
• Quando o retorno parece demasiadamente generoso em relação ao risco,
será que podemos estar nos esquecendo de algum risco oculto?
• Por que o vendedor do ativo estaria disposto a se desfazer dele a um preço
que pode nos oferecer um retorno excessivo?
• Será que realmente sabemos mais sobre o ativo do que o vendedor?
• Se a proposta é tão boa, por que o ativo ainda não foi vendido?
Outra coisa que se deve levar em consideração: só porque existem
eficiências hoje não quer dizer que sejam eternas.
Aqui o ponto principal reside no fato de a ineficiência ser condição
necessária para a obtenção de retornos superiores. Tentar obter desempenho
superior em um mercado perfeitamente eficiente é como um cara ou coroa:
nossa melhor probabilidade é de 50%. Para que investidores estejam um
passo à frente, é preciso haver ineficiências no processo subjacente —
imperfeições, erros de precificação — que possam ser aproveitadas.
Mas, mesmo que tomemos sua existência como certa, isso não garante que
vamos superar o mercado. Os preços nem sempre são justos, e há erros:
alguns ativos estão subvalorizados; outros, sobrevalorizados. E ainda
precisamos ter uma percepção maior que a dos outros investidores para que
consigamos comprar regularmente mais ativos do primeiro tipo e menos do
segundo. Muitas das melhores pechinchas, em qualquer momento, são
encontradas naquilo que outros investidores não podem fazer ou não querem
fazer. Deixemos que acreditem que mercados não podem ser vencidos. A
abstenção daqueles que não se expõem cria oportunidades para quem se
arrisca.
Será que a teoria do investimento, com sua noção de eficiência de mercado,
equivale a uma lei física, universalmente verdadeira? Ou é apenas uma noção
fantasiosa e irrelevante que deve ser ignorada? Não: é uma questão de
equilíbrio — decorrente da aplicação de um senso comum bem informado.
Pessoalmente, a transformação de minha trajetória como gestor de
investimentos se deu quando compreendi a relevância da noção de eficiência
de mercado; a partir daí, concluí que deveria limitar meus esforços a
mercados relativamente ineficientes, pois neles a competência e o trabalho
árduo são mais bem recompensados. Apoiei-me em embasamento teórico, o
que evitou desperdício de tempo com mercados convencionais, mas há
limites na teoria, e compreendi que não é preciso aceitar completamente os
argumentos contrários à gestão ativa.
Em suma, acredito que a teoria deve embasar nossas decisões sem dominá-las.
Ignorar a teoria por completo pode ser um grande erro. Podemos nos enganar,
imaginar que é possível saber mais do que todos os outros e, com isso, vencer com
regularidade em mercados altamente populosos. Podemos comprar ativos por seus
retornos e, ao mesmo tempo, ignorar seu risco; adquirir cinquenta ativos
correlacionados ao concluir equivocadamente que estamos diversificando…
Por outro lado, aceitar a teoria em sua integralidade pode nos fazer desistir das
pechinchas, entregar o processo para um computador e deixar de obter a
contribuição de algumas pessoas muito competentes. A imagem aqui é a do
professor de finanças que acredita na hipótese do mercado eficiente e está dando
uma volta com um aluno.
— Não é uma nota de 10 dólares no chão? — pergunta o aluno.
— Não, não pode ser uma nota de 10 dólares — responde o professor. — Se fosse,
alguém já teria pegado a nota.
O professor vai embora, e o aluno pega a nota e toma uma cerveja.
“WHAT’S IT ALL ABOUT, ALPHA?” (DO QUE SE TRATA, ALFA?) 11 DE JULHO DE 2001
3
O mais importante é… o valor
A estimativa precisa do valor intrínseco é o ponto de partida
indispensável para que possamos investir de forma
positivamente confiável. Sem ela, qualquer esperança de êxito
contínuo como investidor é exatamente isto: uma esperança.
A regra de investimento mais antiga é também a mais simples: compre na
baixa, venda na alta. Isso parece algo extremamente óbvio: quem faria algo
diferente? Mas o que essa regra realmente significa? Mais uma vez, óbvio —
na superfície, significa que você deve comprar algo por um preço baixo e
vendê-lo por um preço alto. Mas, por sua vez, o que isso quer realmente
dizer? O que é alto(a) e o que é baixo(a)?
Em um nível superficial, é possível aceitar que isso significa que o
objetivo é comprar algo por menos do que será vendido. Entretanto, uma vez
que a venda somente acontecerá no final do processo, isso não nos ajuda
muito a descobrir qual o preço de compra adequado para hoje. Precisamos ter
algum padrão objetivo para os termos “alto(a)” e “baixo(a)”; e o padrão mais
útil seria o valor intrínseco do ativo. Agora o significado do ditado fica claro:
compre por um preço abaixo do valor intrínseco e venda por um preço acima.
É óbvio que, para isso, precisamos ter uma boa ideia do que é valor
intrínseco. Uma estimativa precisa do valor intrínseco é o ponto de partida
indispensável.
Para simplificar (ou simplificar demais), todas as abordagens para investir em
ativos de empresas podem ser divididas em dois tipos básicos: aquelas
baseadas na análise dos atributos da empresa, conhecidos como
“fundamentos”, e aquelas baseadas em estudos do comportamento dos preços
dos próprios ativos. Em outras palavras, um investidor tem duas opções
básicas: avaliar o valor intrínseco subjacente do ativo e comprar ou vender
sempre que o preço divergir desse valor, ou basear suas decisões puramente
nas expectativas relativas aos movimentos dos preços futuros.
Falarei primeiro desta última, pois não acredito nela e consigo descartá-la
de imediato. A análise técnica de ações, isto é, o estudo do comportamento
histórico dos preços das ações, tem sido praticada desde que entrei para o
ramo (e bem antes disso), mas essa é uma ferramenta em declínio. As
observações atuais sobre os padrões históricos dos preços podem ser usadas
para complementar a análise fundamentalista; atualmente, no entanto, não
vemos muitas pessoas tomando decisões com base, principalmente, naquilo
que os movimentos dos preços lhes dizem.
Parte do declínio da análise técnica pode ser atribuída à hipótese do
passeio aleatório, um componente da teoria da Escola de Chicago,
desenvolvida no início da década de 1960, principalmente pelo professor
Eugene Fama. A hipótese do passeio aleatório diz que os movimentos dos
preços passados de uma ação não ajudam a prever movimentos futuros. Em
outras palavras, é um processo aleatório, semelhante ao cara e coroa. Todos
sabemos que, mesmo que obtenhamos dez caras seguidas, a probabilidade de
o próximo lançamento da moeda para cima resultar em cara continuará sendo
de 50%. Da mesma forma, informa-nos a hipótese, o fato de o preço de uma
ação ter aumentado nos últimos dez dias não nos diz nada sobre o que
acontecerá amanhã.
Outra forma de confiar nos movimentos dos preços das ações no passado
para obter alguma informação é um método de investimento chamado de
momentum.1 Ele também contraria a hipótese do passeio aleatório. Não sou
capaz de defendê-lo. Como vejo, investidores que praticam essa abordagem
operam sob a suposição de que podem prever a continuidade do aumento de
uma ação que já estava em tendência de subida.
O método momentum de investimento teoricamente nos permitiria
participar de um mercado que se mantém em tendência de alta, mas isso
acarreta muitas desvantagens. Uma delas se refere à observação irônica do
economista Herb Stein: “se algo não pode continuar para sempre, parará em
algum momento”. Então, o que acontece com investidores que seguem esse
método? Como essa abordagem os ajudará a vender a tempo para evitar
perdas? E o que farão em mercados em queda?
Parece claro que o momentum não é uma forma inteligente de
posicionamento. O exemplo mais claro disso ocorreu de 1998 a 1999, com o
surgimento dos day traders, pessoas de outros ramos de atuação, sem
experiência em investimentos, que foram seduzidas pela esperança de ganhar
dinheiro fácil com o boom das ações do setor de tecnologia, mídia e
telecomunicações. Raramente mantinham suas posições da noite para o dia,
uma vez que isso exigiria que pagassem por elas, e tentavam adivinhar, várias
vezes em um mesmo dia, se uma ação que observavam subiria ou cairia nas
próximas horas.
Nunca consegui entender como as pessoas chegavam a tais conclusões.
Comparo o método a ficar olhando para a rua e tentar adivinhar se o próximo
a virar a esquina será uma mulher ou um homem. Os day traders acreditavam
que haviam feito um bom trabalho se comprassem uma ação por 10 dólares e
a vendessem por 11 dólares, a comprassem de novo, na semana seguinte, por
24 dólares e a vendessem por 25 dólares e, por fim, a comprassem uma
semana depois por 39 dólares e a vendessem por 40 dólares. Se você não
conseguir enxergar a debilidade desse sistema — note que o operador
(trader) ganhou 3 dólares em uma ação que, no período, valorizou 30 dólares
—, talvez seja melhor não ler o resto deste livro.
Se nos afastarmos dos investidores de impulso (momentum) e de seus
conselhos ineficazes, e também de todas as outras formas de investimento
que evitem a análise inteligente, ficaremos com duas estratégias
fundamentalistas: investimento de valor e investimento de crescimento. Em
poucas palavras, o objetivo dos investidores de valor é chegar a um valor
intrínseco e comprar quando o preço estiver abaixo desse valor; os
investidores de crescimento tentam encontrar ativos cujo valor aumentará
rapidamente no futuro.
Para os investidores de valor, um ativo não é um conceito efêmero no qual
investem por considerá-lo atrativo (ou por acreditarem que outras pessoas o
consideram assim). O ativo é um objeto tangível que deve ter um valor intrínseco
passível de ser avaliado, e se for possível comprá-lo por um preço abaixo desse
valor intrínseco, devem considerar fazê-lo. Assim, o investimento inteligente deve
ser construído com base nas estimativas do valor intrínseco. Elas devem ser obtidas
diligentemente, com análise de todas as informações disponíveis.
“THE MOST IMPORTANT THING” (O MAIS IMPORTANTE), 1O DE JULHO DE 2003
O que torna um ativo — ou a empresa subjacente — valioso? Há muitos
candidatos: recursos financeiros, gestão, fábricas, lojas de varejo, patentes,
recursos humanos, marcas, potencial de crescimento e, acima de tudo,
capacidade de gerar lucros e fluxo de caixa. De fato, a maioria das
abordagens analíticas explicaria que todas essas outras características —
recursos financeiros, gestão, fábricas, lojas de varejo, patentes, recursos
humanos, marcas e potencial de crescimento — são valiosas precisamente
porque, ao final, podem ser traduzidas em lucros e fluxo de caixa.
A ênfase do investimento em valor compõe os fatores tangíveis, como
ativos físicos e fluxos de caixa. Os bens intangíveis, como talento, modismos
e potencial de crescimento a longo prazo, recebem um peso menor. Há linhas
de investimento em valor que focam exclusivamente os ativos físicos. Há, até
mesmo, algo chamado “investimento net-net”, no qual as pessoas compram
quando o valor total de mercado das ações de uma empresa é menor do que o
valor do ativo circulante da empresa — como dinheiro, recebíveis e estoques
— menos o seu passivo total. Nesse caso, em teoria, seria possível comprar
todas as ações da empresa, liquidar os ativos circulantes, pagar as dívidas e,
ao final, manter o negócio e ficar com algum dinheiro. Se o caixa que sobrou
for igual ao custo das ações e ainda houver algumas outras sobras, você terá
pagado “menos que nada” pela empresa.
O investimento em valor busca o que é barato. Os investidores dessa
modalidade geralmente dão atenção a métricas financeiras, como lucros,
fluxo de caixa, dividendos, ativos físicos e valor empresarial, e, de acordo
com elas, realçam o “comprar barato”. O principal objetivo dos investidores
de valor, então, é quantificar o valor atual da empresa e comprar seus ativos
quando estiverem baratos.
O investimento em crescimento situa-se entre a monotonia do
investimento em valor e a adrenalina da estratégia momentum. Seu objetivo é
identificar empresas com um futuro promissor. Isso significa, por definição,
que a estratégia dá menos atenção aos atributos atuais da empresa e mais ao
seu potencial.
Podemos resumir a diferença entre essas duas principais escolas de investimento da
seguinte forma:
• Investidores de valor compram ações (mesmo aquelas cujo valor intrínseco
deve crescer pouco no futuro) por convicção de que o valor atual é alto em
relação ao preço atual; e
• Investidores de crescimento compram ações (mesmo aquelas cujo valor atual é
baixo em relação ao seu preço atual) porque acreditam num futuro em que o
valor crescerá suficientemente rápido e produzirá uma apreciação
considerável.
Assim, parece-me que não se trata de uma escolha entre valor e crescimento, mas
entre valor atual e valor futuro. O investimento em crescimento representa uma
aposta no desempenho da empresa que pode ou não ocorrer no futuro, enquanto o
investimento em valor se baseia principalmente na análise do valor atual de uma
empresa.
“THE HAPPY MEDIUM” (O BOM MEIO-TERMO), 21 DE JULHO DE 2004
Seria conveniente dizer que o investimento em valor permite que
investidores evitem fazer conjecturas sobre o futuro e que o investimento em
crescimento consiste apenas nelas, mas isso seria um grande exagero. Afinal
de contas, para que possamos estabelecer o valor atual de uma empresa,
precisamos ter uma opinião sobre seu futuro e levar em conta o provável
ambiente macroeconômico, a competitividade e os avanços tecnológicos. Até
mesmo um investimento net-net promissor pode estar condenado ao fracasso
se os ativos da empresa forem desperdiçados em operações com perdas ou
aquisições imprudentes.
Não há uma clara linha divisória entre valor e crescimento; ambos exigem
que lidemos com o futuro. Os investidores de valor pensam no potencial de
crescimento da empresa, e a escola do “crescimento a um preço razoável”
presta homenagem ao valor. É tudo uma questão de gradação. No entanto,
penso que o investimento em crescimento trata do futuro, enquanto o
investimento em valor enfatiza as considerações atuais, mas não há como
deixar de lidar com o futuro.
Para darmos um exemplo extremo de investimento em crescimento, voltemos
aos dias das Nifty Fifty (as cinquenta ações mais atraentes), um modismo que
contrastou com o investimento em valor e mostrou até que ponto uma mania
de crescimento era capaz de chegar.
Em 1968 consegui meu primeiro emprego no setor de gestão de
investimentos; trabalhei, durante as férias de verão, no Departamento de
Pesquisa de Investimentos do First National City Bank (atual Citibank). O
banco seguia uma abordagem conhecida como “investimento Nifty Fifty”.
Seu objetivo era identificar as empresas com as melhores perspectivas de
crescimento dos lucros a longo prazo. Além da taxa de crescimento, os
gestores de investimentos do banco davam prioridade à “qualidade”, ou seja,
à alta probabilidade de concretização das expectativas de crescimento. A
ordem oficial dizia que, se uma empresa estava crescendo de forma
suficientemente rápida e com boa qualidade, o preço de compra de ações
deixava de ser importante. Se, com base nas métricas atuais, uma ação
estivesse cara, bastaria esperar alguns anos e ela cresceria até chegar a um
preço justo.
Na época, assim como hoje, as carteiras de ações em crescimento estavam
fortemente voltadas para os setores farmacêutico, de tecnologia e de produtos
de consumo. As carteiras do banco incluíam nomes altamente respeitados
como IBM, Xerox, Kodak, Polaroid, Merck, Eli Lilly, Avon, Coca-Cola,
Philip Morris, Hewlett-Packard, Motorola, Texas Instruments e Perkin-Elmer
— as grandes empresas americanas, todas com perspectivas promissoras de
crescimento. E já que nada de errado deveria ocorrer com essas empresas,
não se hesitava em pagar alto por suas ações.
Avancemos algumas décadas; o que podemos notar nessa lista de
empresas? Algumas delas, como a Kodak e a Polaroid, viram suas atividades
básicas serem dizimadas por mudanças tecnológicas imprevistas. Outras,
como a IBM e a Xerox, tornaram-se presas lentas, fáceis de serem
consumidas pelos novos concorrentes. A lista de melhores empresas
americanas daquele banco se viu eivada pela deterioração e, até mesmo, pela
falência nos 42 anos posteriores à época do meu primeiro emprego. Isso é o
que posso dizer sobre a persistência no crescimento de longo prazo — bem
como sobre a capacidade de prevê-lo com precisão.
Comparado ao investimento em valor, o objetivo principal do investidores
de crescimento é tentar encontrar grandes vencedores. Se não existissem
grandes vencedores no horizonte, por que suportar a incerteza que envolve a
tentativa de adivinhar o futuro? Não há dúvida: é mais difícil prever o futuro
do que o presente. Desse modo, o número de vezes que, em média, os
investidores de crescimento acertam deve ser menor, mas a recompensa pode
ser maior. O retorno por ter conseguido prever corretamente quais empresas
criariam o melhor e mais novo fármaco, o computador mais poderoso ou os
filmes com melhores bilheterias deve ser bastante considerável.
Em geral, o potencial de lucro por estar certo sobre o crescimento é mais
dramático, enquanto o potencial de lucro por estar certo sobre o valor é mais
consistente. Minha estratégia é o investimento em valor. A meu ver, a
consistência supera o drama.
Já que o investimento em valor é capaz de produzir resultados favoráveis de
forma consistente, será que isso significa que é de fácil realização? Não. Por
uma razão: o investimento depende de uma estimativa precisa sobre o valor.
Sem ela, qualquer esperança de obter êxito de forma robusta como investidor
é exatamente isto: apenas uma esperança. Se falta precisão, também
acabamos tendo a mesma probabilidade de pagar a mais ou a menos. Pagando
a mais, precisaremos que o valor da empresa tenha uma melhora
surpreendente, de um mercado forte ou de um comprador ainda menos
exigente (o que costumávamos chamar de “um tolo maior”) que pague sua
fiança.
Há mais. Se o investimento em valor é definido como a melhor estratégia
e negocia-se tendo em vista o valor intrínseco para um título ou ativo, o
próximo movimento importante é mantê-lo de forma convicta. Isso porque,
no mundo dos investimentos, estar certo sobre algo não costuma ser sinônimo
de estar certo agora.
É difícil sempre fazer a coisa certa como investidor. E é impossível fazer
sempre a coisa certa na hora certa. O máximo que um investidor de valor
pode esperar é estar correto a respeito do valor de um ativo e comprar quando
ele estiver disponível por um preço mais baixo. Porém, fazer isso hoje não
significa que você vai começar a ganhar dinheiro amanhã. Uma visão
mantida com convicção sobre o valor pode ajudar a lidar com essa
desconexão.
Digamos que se descubra algo que vale 80, mas se tenha a oportunidade
de comprá-lo por 60. As chances de comprar bem abaixo do valor real não
aparecem todos os dias, por isso devem ser acolhidas de forma positiva.
Warren Buffett as descreve como “comprar um dólar por 50 centavos”. Então
a compra é realizada e o investidor se sente bem por ter feito uma coisa boa.
Mas não devemos esperar êxito imediato. Na verdade, muitas vezes,
perceberemos que se compra uma ação em meio a uma tendência de baixa
contínua. Em pouco tempo, notam-se as perdas. E como um dos maiores
anúncios de investimento nos lembra: “Estar muito à frente do seu tempo é
indistinguível de estar errado”. Então, aquele ativo que vale 80 está, agora,
custando 50 em vez de 60. O que deve ser feito?
Aprendemos nas primeiras aulas de microeconomia que a curva de
demanda de alguma coisa é descendente para a direita; à medida que o preço
sobe, a quantidade demandada diminui. Em outras palavras, as pessoas
querem menos bens a preços mais altos e mais bens a preços mais baixos. Faz
sentido; é por isso que as lojas vendem mais quando há liquidação de
mercadorias.
É assim que funciona na maioria dos lugares; no mundo dos
investimentos, no entanto, quase nunca é o que acontece. Nele, muitas
pessoas tendem a se apaixonar ainda mais pela coisa que compraram à
medida que seu preço sobe, pois se sentem validadas, e gostam menos
quando o preço cai, porque começam a duvidar de sua decisão de compra.
Isso torna muito difícil manter a posição e comprar mais a preços mais
baixos (o que os investidores chamam de fazer preço médio — em inglês,
averaging down), especialmente se o declínio acabar se tornando muito
grande. Se o valor era bom a 60, será melhor a 50… e muito mais a 40 e a 30.
Não é, porém, assim tão fácil. Ninguém se sente confortável com perdas; em
algum momento, todos acabam imaginando:
— Talvez eu não esteja certo. Talvez o mercado esteja.
O perigo fica extremado quando começam a pensar:
— Está muito baixo, é melhor eu sair antes que chegue a zero.
Esse é o tipo de pensamento que cria níveis mínimos e faz com que as
pessoas vendam neste ponto.
Investidores sem conhecimento (ou preocupação) relativo a lucros, dividendos,
precificação ou à conduta do negócio simplesmente não têm a determinação
necessária para fazer a coisa certa no momento certo. Quando veem todos ao seu
redor comprando e ganhando dinheiro, não conseguem saber se a ação está muito
cara e, portanto, resistir à compra. E com um mercado em queda livre, talvez não
tenham a confiança necessária para manter sua posição ou comprar a preços muito
reduzidos.
“IRRATIONAL EXUBERANCE” (EXUBERÂNCIA IRRACIONAL), 1O DE MAIO DE 2000
Quando a opinião precisa sobre o valor não é mantida com convicção, ela
só é capaz de oferecer ajuda limitada. Uma opinião incorreta sobre o valor,
mantida com convicção, é muito pior. Essa afirmação, por si só, nos mostra
como é difícil acertar tudo.
Ofereça uma dose de soro da verdade à maioria dos investidores — e
certamente também à maioria dos investidores amadores — e, em seguida,
pergunte a eles qual abordagem utilizam para investir. A resposta inevitável
será: “busco ativos que subirão de preço”.
A procura pelo lucro, entretanto, deve ser baseada na tangibilidade. Do
meu ponto de vista, o melhor candidato a atingi-la é o valor intrínseco que se
obtém da análise fundamentalista. Estimativas precisas do valor intrínseco
formam a base essencial para a realização de investimentos estáveis, não
emotivos e potencialmente rentáveis.
Investidores de valor obtêm seus maiores lucros quando compram um
ativo subvalorizado, adicionam mais ações ao preço mais baixo (preço
médio) e analisam a situação corretamente. Assim, existem dois ingredientes
essenciais para se obter lucro em um mercado em baixa: precisamos ter uma
visão sobre o valor intrínseco e manter essa visão com bastante convicção,
para que não vendamos e para que compremos, mesmo que a queda de preços
sugira uma escolha errada. E há um terceiro ingrediente: devemos estar
certos.
4
O mais importante é… a relação entre preço e valor
Não é “comprando coisas boas” que obtemos êxito em nossos
investimentos, mas quando “compramos bem as coisas”.
Imagine que estejamos convencidos da eficácia do investimento em valor e
conseguimos estimar o valor intrínseco de uma ação ou de outro ativo;
digamos, ainda, que a estimativa esteja correta. Ainda não acabamos. Para
sabermos qual ação comprar, é necessário analisar o preço do ativo em
relação ao seu valor. O estabelecimento de uma relação saudável entre os
fundamentos — valor — e o preço é um dos principais elementos do bom
investimento.
O preço deve ser o ponto de partida do investidor de valor. É fato conhecido que
nenhum ativo é tão bom que não possa se tornar um investimento ruim se for
comprado a um preço muito alto. E há poucos ativos que sejam tão ruins que não
possam ser um bom investimento quando forem comprados suficientemente
baratos.
Quando as pessoas dizem de forma categórica “nós só compramos A” ou “A é uma
classe de ativos superior”, isso soa muito como “compraríamos A a qualquer
preço… e, além disso, o compraríamos antes de B, C ou D”. Isso só pode ser um
erro. Nenhuma classe de ativos ou investimento possui, meramente por sua origem,
altas taxas de retorno. Eles serão atrativos se o seu preço estiver correto.
Quando ponho meu carro à venda, espero que o potencial comprador queira saber
o preço antes de aceitar minha proposta. Assim, seria igualmente tolo decidir-se
por um investimento sem considerar cuidadosamente se o seu preço é justo ou não.
Isso é exatamente o que as pessoas fazem quando decidem que, sem qualquer
avaliação disciplinada de valor, desejam possuir algo, como ocorreu com as ações
de tecnologia no final da década de 1990, ou quando simplesmente decidem que
não querem algo, como fizeram com os títulos especulativos1 na década de 1970 e
início da década de 1980.
Resumindo: não existe boa ou má ideia independentemente do preço!
“THE MOST IMPORTANT THING” (O MAIS IMPORTANTE), 1O DE JULHO DE 2003
Uma premissa fundamental da hipótese do mercado eficiente — que faz todo
sentido — diz que, se comprarmos algo por seu valor justo, obteremos um
retorno adequado, dado o risco. Mas os investidores ativos não estão nessa
atividade para obter retornos ajustados aos riscos justos; eles querem retornos
superiores (se há satisfação com retornos justos, por que não investir
passivamente em um fundo de índice e evitar vários problemas?). Então, é
muito comum comprar pelo valor intrínseco, e pagar por alguma coisa mais
do que ela vale é claramente um erro; é preciso muito trabalho ou muita sorte
para transformar algo comprado a um preço muito alto em um bom
investimento.
Estão lembrados do investimento nas Nifty Fifty que descrevi no capítulo
anterior? Em suas altas, muitas empresas vigorosas alavancadas pelo modelo
ostentavam quocientes preço/lucro (a relação entre o preço da ação e o lucro
por ação) entre 80 e 90 (para efeito comparativo, o quociente preço/lucro
médio do pós-guerra para ações girava, em geral, entre 15 e 17). Nenhum dos
investidores desse modelo parecia se preocupar com avaliações tão elevadas.
Então, em pouco tempo, tudo mudou. No início da década de 1970, o
mercado de ações arrefeceu, fatores exógenos como a crise do petróleo e o
aumento da inflação ofuscaram o quadro geral: as ações das Nifty Fifty
entraram em colapso. Em alguns anos, os quocientes preço/lucro de 80 ou 90
caíram para 8 ou 9; os investidores das melhores empresas americanas
haviam perdido 90% de seu dinheiro. Embora as pessoas tenham comprado
ações de grandes empresas, pagaram o preço errado. Na Oaktree costumamos
dizer que só se vende bem o que se compra bem. Não gastamos muito tempo
pensando no preço a que conseguiremos vender, nem quando, nem para
quem, nem por quais meios. Se comprarmos por um preço baixo, essas
informações serão obtidas em algum momento, de qualquer forma. Se a
estimativa do valor intrínseco estiver correta, o preço de um ativo acaba, com
o tempo, convergindo para o seu valor.
Quanto as empresas valem? Ao final, tudo se resume a isso. Não basta comprar
uma ação de uma boa ideia, nem mesmo de um bom negócio. Precisamos comprála a um preço razoável (ou, se possível, a um preço de pechincha).
“BUBBLE.COM” (BOLHA.COM), 3 DE JANEIRO DE 2000
Tudo isso levanta a questão: como o preço é composto? Em que um potencial
comprador deve prestar atenção para ter certeza de que a precificação está
correta? No valor fundamental subjacente, é claro, mas, na maioria das vezes,
o preço de um ativo será, no mínimo, afetado da mesma forma por outros
dois fatores — psicológico e técnico —, o que determinará primariamente as
flutuações de curto prazo.
A maioria dos investidores — o que compreende, sem dúvida, os
amadores — conhece pouco sobre os fatores técnicos. Estes não são
considerados fundamentais — ou seja, infere-se que não estão ligados ao
valor — para afetar a oferta e a procura por ativos. Dois exemplos: a venda
forçada que ocorre quando as crises dos mercados fazem com que
investidores alavancados recebam margin calls2 e tenham de vender a preços
muito baixos; e as entradas de dinheiro para fundos mútuos que obriguem os
gestores a comprar. Em ambos os casos, as pessoas são levadas a negociar
ativos sem considerar o preço.
Acredite em mim, não há nada melhor do que comprar de alguém que,
durante uma crise, precisa vender, independentemente do preço. Muitas das
melhores compras que já fizemos na Oaktree ocorreram por essa razão.
Devemos, no entanto, fazer duas observações:
• não há como fazer carreira comprando de pessoas forçadas a vender e
vendendo para as que são impelidas a comprar; essas oportunidades não
estão por perto o tempo todo, apenas em raras ocasiões, nos pontos
extremos de crises e bolhas; e,
• uma vez que comprar de quem é obrigado a vender configura a melhor
coisa do nosso mundo, ser um desses vendedores é a pior coisa. Isso
significa que é essencial organizar os negócios para que seja possível
manter nossa posição e não vender, mesmo nos piores momentos. Isso
requer capital de longo prazo e fortes recursos psicológicos.
E isso me leva ao segundo fator que exerce uma forte influência no preço:
o psicológico. É impossível exagerar a importância dele. Na verdade, é tão
vital que dedico vários capítulos à discussão sobre a psicologia dos
investidores e sobre a forma de lidar com suas manifestações.
Se, por um lado, a chave para a determinação do valor é a análise
financeira qualificada, por outro, a utilizada para entender o quociente
preço/valor (e suas perspectivas) insere-se, em grande parte, na percepção do
funcionamento da mente de outros investidores. Estes podem, por razões
psicológicas, fazer com que o preço de um ativo se estabeleça em qualquer
nível no curto prazo, independentemente dos seus fundamentos.
A disciplina mais importante não é a contabilidade nem a economia, é a psicologia.
É importante saber quem gosta e quem não gosta do investimento neste exato
momento. As mudanças futuras de preços serão determinadas de acordo com a
apreciação dos ativos por mais ou menos pessoas no futuro.
Investir assemelha-se a um concurso de popularidade em que a ação mais perigosa
é comprar algo no auge de sua popularidade. Nesse ponto, todos os fatos e opiniões
favoráveis já estão contabilizados no preço, e não aparecem novos investidores
desejando comprá-los.
A ação mais segura e potencialmente lucrativa seria comprar quando o ativo não é
desejado por ninguém. Com o tempo, sua popularidade e, portanto, seu preço só
podem seguir um sentido: para cima.
“RANDOM THOUGHTS ON THE IDENTIFICATION OF INVESTMENT OPPORTUNITIES”
(PENSAMENTOS ALEATÓRIOS SOBRE A IDENTIFICAÇÃO DAS OPORTUNIDADES DE
INVESTIMENTO), 24 DE JANEIRO DE 1994
Claramente, essa é mais uma área (a) de importância crítica e (b)
extremamente difícil de ser dominada. Em primeiro lugar, a psicologia é
fugidia. E, em segundo, os fatores psicológicos que afetam a mente de outros
investidores e influenciam suas ações nos afetarão também. Como
mostraremos em capítulos posteriores, essas forças tendem a levar as pessoas
a agir de modo oposto ao de um investidor competente. Então, para que
possamos nos proteger, devemos investir tempo e energia para entender a
psicologia do mercado.
É essencial apreender que a avaliação fundamentalista será apenas uma
das variáveis que determinarão o preço de um ativo no dia de sua compra.
Também precisamos manter os fatores técnicos e psicológicos ao nosso lado.
Em oposição ao investimento em valor consciente, temos a busca
indiscriminada de bolhas, nas quais o quociente preço/valor é totalmente
ignorado.
Todas as bolhas começam com alguma pitada de verdade:
• tulipas são lindas e raras (na Holanda do século 17);
• a internet vai mudar o mundo;
• o investimento em imóveis é capaz de acompanhar a inflação; além disso,
sempre poderemos viver em uma casa.
Alguns investidores inteligentes descobrem (ou talvez até mesmo
preveem) essas verdades, investem no ativo e começam a lucrar. Em seguida,
outros entendem a ideia — ou apenas percebem que as pessoas estão
ganhando dinheiro — e também compram, elevando o preço do ativo. No
entanto, à medida que o preço sobe, eles se sentem cada vez mais encorajados
pela possibilidade de ganhar dinheiro fácil e avaliam cada vez menos a
adequação do preço. É uma interpretação extrema do fenômeno que descrevi
anteriormente: as pessoas deveriam apreciar menos um ativo quando seu
preço sobe; na seara dos investimentos, entretanto, elas costumam gostar
mais desse tipo de ativo.
Entre 2004 e 2006, por exemplo, diziam-se coisas boas sobre os
investimentos em imóveis: o desejo de participar do sonho americano da casa
própria; a capacidade de se beneficiar da inflação; o fato de que os
empréstimos hipotecários eram baratos e os pagamentos seriam dedutíveis; e,
por fim, o conhecimento popular de que “os preços das casas só aumentam”.
Sabemos o que aconteceu com aquela pequena pérola de sabedoria.
O que dizer sobre a ideia infame de que não há como perder com esse
investimento? Na bolha tecnológica, os compradores não se preocupavam
com os preços altos de uma ação, pois tinham certeza de que alguém sempre
estaria disposto a pagar mais por ela. Infelizmente, a teoria de que sempre
haverá alguém mais tolo funciona até o momento em que deixa de funcionar.
A avaliação passa, em algum momento, a fazer parte do jogo; e aqueles que
estiverem carregando muitas ações sem valor terão de enfrentar as
consequências.
• Os pontos positivos das ações podem ser genuínos e, ainda assim, produzir
perdas se o preço pago por elas for muito alto.
• Esses pontos positivos (e os enormes lucros que aparentemente todos os outros
vêm obtendo) podem eventualmente fazer com que os resistentes à
participação no negócio se rendam e comprem.
• Uma ação, um grupo ou mercado atinge o topo quando o último investidor
reticente se torna um comprador. O momento em que isso ocorre não costuma
estar relacionado com a evolução dos fundamentos.
• “Os preços estão muito altos” está longe de ser sinônimo de “o próximo
movimento será de queda”. Pode haver sobrepreço e a manutenção dele por
muito tempo… ou os ativos podem encarecer ainda mais.
• Em algum momento, porém, a avaliação acaba prevalecendo.
“BUBBLE.COM” (BOLHA.COM), 3 DE JANEIRO DE 2000
O problema é que, nas bolhas, “atraente” se torna “atraente a qualquer
preço”. As pessoas costumam dizer: “não é barato, mas acho que vai
continuar subindo por causa do excesso de liquidez” (ou por qualquer outra
série de razões). Em outras palavras, é dito: “está caro, mas acho que vai ficar
mais caro”. Comprar ou manter a posição com base nesse raciocínio é
extremamente arriscado, no entanto, é assim que as bolhas funcionam.
No momento em que se formam, a paixão pelo momento do mercado
supera qualquer noção de valor e preço justo ou adequado, e a ganância (além
da dificuldade de nada fazer enquanto os outros ganham dinheiro
aparentemente fácil) neutraliza qualquer prudência que, em outra situação,
seria predominante.
Resumindo, acredito que a estratégia de investimento mais confiável é
aquela que se baseia em algum valor genuíno. Em contraste, contar com os
outros para obter lucro, independentemente do valor, contando com uma
bolha, é provavelmente a estratégia menos acertada.
Considere alguns caminhos possíveis para obter lucros de um investimento:
• Beneficiar-se do aumento no valor intrínseco do ativo. O problema é que
aumentos de valor são difíceis de prever com precisão. Além disso,
convencionalmente, os ativos já incluem em seus preços os possíveis
acréscimos, o que significa que, a menos que tenhamos uma visão
diferente e melhor que a do consenso, é provável que já estejamos
pagando pelos possíveis aumentos. Em certas áreas de investimento —
mais notadamente em private equity3 e imóveis —, os “investidores de
controle” podem se esforçar para criar aumentos no valor por meio da
gestão ativa do ativo. Isso vale a pena, mas é demorado e incerto, requer
profissionais muito especializados. Além disso, pode ser difícil melhorar,
por exemplo, uma empresa que já é boa.
• Aplicar a alavancagem financeira. O problema aqui é que essa
modalidade — comprar com dinheiro emprestado — não torna um
investimento melhor nem aumenta a sua probabilidade de lucros. Ela
simplesmente potencializa possíveis lucros ou prejuízos. E, ainda,
introduz o risco de perda sempre que a carteira não conseguir satisfazer
um teste de valor contratual e os credores puderem exigir seu dinheiro de
volta em um momento em que os preços e a liquidez estão deprimidos. Ao
longo dos anos, a alavancagem tem sido associada a altos retornos, bem
como a perdas e crises espetaculares.
• Vender o ativo por mais do que vale. Todos esperam que surja um
comprador disposto a pagar mais pelo que temos a vender. É óbvio,
entretanto, que não podemos contar com a chegada desse “trouxa”. Ao
contrário de ter um ativo subestimado que atinja seu valor justo, esperar
que um ativo com preço justo ou sobreprecificado fique mais valorizado
requer uma irracionalidade por parte dos compradores em que não se pode
confiar.
• Comprar algo por menos do que vale. Tenho convicção de que é disso
que se trata — a maneira mais confiável de ganhar dinheiro. Comprar algo
com desconto em relação ao seu valor intrínseco e aguardar que o preço
do ativo se mova em direção ao seu valor não requer boa sorte, mas, sim,
que os participantes do mercado acordem para a realidade. Quando o
mercado está funcionando corretamente, o valor exerce uma atração
magnética sobre o preço.
De todos os caminhos possíveis para se obter lucro nos investimentos,
comprar barato é claramente o mais confiável. No entanto, isso não é
sinônimo de garantia. Podemos estar errados sobre o valor atual. Ou podem
acontecer eventos que reduzam esse valor. Ou a deterioração das atitudes ou
dos mercados pode fazer com que ativos sejam vendidos abaixo de seu valor.
Ou a convergência entre preço e valor intrínseco pode levar mais tempo do
que dispomos… Segundo John Maynard Keynes, “o mercado pode
permanecer irracional por mais tempo do que o investidor é capaz de se
manter solvente”.
Tentar comprar abaixo do valor não é infalível, mas é a melhor chance
que temos.
5
O mais importante é… entender o risco
Risco significa que podem acontecer mais coisas do que as que
acontecerão.
ELROY DIMSON
Investir consiste exatamente em uma coisa: dar atenção ao futuro. E como
nenhum de nós é capaz de ter certeza sobre os acontecimentos futuros, o risco
é algo inevitável; é o elemento essencial para a realização de investimentos.
Não é difícil definir ativos que têm potencial de alta. Caminhamos na direção
correta quando encontramos um número suficiente desses investimentos. Mas
é improvável que tenhamos êxito por muito tempo se não dermos atenção
explícita ao risco. Entendê-lo configura o primeiro passo nesse sentido; o
segundo é reconhecer quando há alto risco. O último passo importante é
controlá-lo. Já que a questão é muito complexa e importante, dedico três
capítulos à análise do risco em profundidade.
Por que digo que a avaliação do risco é um elemento essencial no processo de
investimento? Há três fortes razões.
Primeiro, o risco é algo ruim e, por isso, a maioria dos investidores quer
minimizá-lo. Em finanças, assumimos que as pessoas são naturalmente
avessas ao risco, o que significa que preferem evitá-lo. Assim, para começar,
quando um investidor deseja realizar uma determinada negociação, precisa
fazer julgamentos sobre os seus riscos e entender se é capaz de conviver com
eles.
Segundo, quando desejamos investir, a decisão deve ser em função dos
riscos incorridos, bem como dos rendimentos potenciais. Tendo em vista a
aversão ao primeiro, investidores devem ser estimulados pela possibilidade
de maiores rendimentos prospectivos — para que possam assumir mais
riscos. Simplificando, se tanto uma nota do tesouro americano quanto as
ações de pequenas empresas tivessem a possibilidade de render 7% ao ano,
todos correriam para comprar aquela (aumentando seu preço e reduzindo o
retorno prospectivo) e liquidar estas (diminuindo seu preço e, assim,
aumentando seu retorno). Supõe-se que o processo de ajuste dos preços
relativos, que os economistas chamam de equilíbrio, faça com que os
retornos prospectivos sejam proporcionais ao risco.
Assim, além de determinar sua capacidade de suportar a quantidade
absoluta de riscos assumidos, o investidor precisa decidir se o rendimento de
um determinado investimento justifica ou não o risco assumido. Claramente,
o retorno nos conta apenas metade da história e, por isso, se faz necessária
uma avaliação de risco.
Terceiro, quando consideramos os resultados de um investimento, o
rendimento, por si só possui um significado limitado; o risco assumido
também precisa ser avaliado. Os rendimentos foram obtidos com
instrumentos seguros ou arriscados? Com títulos de renda fixa ou ações?
Com grandes empresas consolidadas ou com empresas menores e mais
instáveis? Com ações e títulos líquidos ou private placements1 ilíquidos?
Com ajuda de alavancagem ou sem? Com uma carteira concentrada ou
diversificada?
É certo que, quando os investidores recebem suas declarações de
resultados e descobrem que sua conta ganhou 10% no ano, eles não sabem
dizer se seus gerentes financeiros trabalharam bem ou não. Para chegar a essa
conclusão, precisam ter alguma ideia de quanto risco seus gestores correram.
Em outras palavras, precisam avaliar o “retorno ajustado ao risco”.
É com base na relação entre risco e retorno que surge o gráfico que se
tornou onipresente no mundo dos investimentos (figura 5.1). Ele mostra a
“linha do mercado de capitais” como uma curva ascendente para a direita,
indicando a relação positiva entre risco e retorno. Os mercados se organizam
de modo que os ativos mais arriscados pareçam oferecer maiores retornos. Se
não fosse esse o caso, quem os compraria?
O conhecido gráfico da relação entre risco e retorno é elegante em sua
simplicidade. Infelizmente, muitos tiram uma conclusão errada sobre ele e
isso os põe em apuros.
Figura 5.1
Especialmente durante os períodos bons, muitas pessoas costumam dizer que os
investimentos mais arriscados são os que proporcionam maiores retornos. E que,
por isso, quem quer ganhar mais dinheiro deve correr mais riscos. Ocorre que não
podemos afirmar que os investimentos mais arriscados oferecem maiores retornos.
Por que não? É simples: se os investimentos mais arriscados produzissem retornos
mais altos, não seriam mais arriscados!
A formulação correta é que, para atrair capital, investimentos mais arriscados
devem oferecer a perspectiva de maiores retornos, ou de maiores retornos
prometidos, ou maiores retornos esperados. Mas não há absolutamente nada que
garanta que esses retornos prospectivos mais altos vão realmente ocorrer.
A forma como vejo a linha de mercado de capital torna mais fácil a compreensão
da relação subjacente a tudo isso (figura 5.2).
Figura 5.2
Os investimentos mais arriscados são aqueles para os quais o resultado é menos
certo. Ou seja, a distribuição de probabilidade dos retornos é maior. Quando os
preços são justos, os investimentos mais arriscados devem implicar o seguinte:
• maiores retornos esperados;
• possibilidade de retornos mais baixos; e,
• em alguns casos, a possibilidade de perdas.
O gráfico risco/retorno tradicional (figura 5.1) é enganoso porque nos mostra uma
conexão positiva entre risco e retorno, mas não sugere a incerteza que a envolve.
Isso causou miséria a muita gente, pois insinua que, de forma inabalável, correr
mais risco significa ganhar mais dinheiro.
Espero que minha versão do gráfico seja mais útil. Ela deve sugerir (a) a relação
positiva entre o risco e o retorno esperado; e (b) o fato de que a incerteza sobre o
retorno e a possibilidade de perda aumentam à medida que o risco também.
“RISK” (RISCO), 19 DE JANEIRO DE 2006
Nossa próxima grande tarefa é definir risco. O que é exatamente? É possível
termos uma ideia por seus sinônimos: perigo, ameaça, apuro. Todos parecem
candidatos razoáveis e bastante indesejáveis.
Ainda assim, a teoria financeira (a mesma teoria que contribuiu para a
criação do gráfico de risco/retorno mostrado na figura 5.1 e o conceito de
ajustamento ao risco) define, de modo preciso, o risco como volatilidade (ou
variabilidade ou desvio). Nada disso transmite o sentido necessário de
“perigo”.
Segundo os acadêmicos que desenvolveram a teoria do mercado de capitais, risco e
volatilidade são sinônimos, pois a volatilidade indica a instabilidade de um
investimento. Vejo um grande problema com essa definição.
De forma consciente ou não, os acadêmicos aceitam que a volatilidade representa o
risco por questão de conveniência. Eles precisavam de um número para seus
cálculos que fosse objetivo e pudesse ser apurado por meio de dados históricos e
extrapolado para o futuro. A volatilidade se encaixa nesse papel; a maioria dos
outros tipos de risco, não. O problema com tudo isso, no entanto, é que não tenho a
crença de que a volatilidade seja o risco mais importante para a maioria dos
investidores.
Há muitos tipos de risco; a volatilidade talvez seja o menos relevante de todos. A
teoria diz que os investidores esperam maiores retornos dos investimentos mais
voláteis. Ainda assim, para que o mercado defina os preços de forma que os
investimentos mais voláteis pareçam estar mais propensos a produzir maiores
retornos, é preciso que existam pessoas demandando essa relação; nunca as
encontrei. Nunca ouvi ninguém dizer — nem na Oaktree nem em qualquer outro
lugar — que não compraria um ativo porque seu preço poderia sofrer grandes
flutuações ou que não compraria porque seu preço poderia baixar em algum
trimestre. Assim, acho difícil acreditar que a volatilidade seja o risco levado em
conta pelos investidores na hora de definir preços e retornos prospectivos.
Em vez da volatilidade, creio que as pessoas se recusam a fazer investimentos
principalmente porque estão preocupadas com a perda de capital ou com retornos
inaceitavelmente baixos. A frase “eu preciso de um potencial de lucro maior
porque tenho medo de perder dinheiro” faz muito mais sentido do que “eu preciso
de um potencial de lucro maior porque tenho medo de que o preço flutue”. Não,
tenho certeza de que “risco” é, antes de mais nada, a probabilidade de perder
dinheiro.
“RISK” (RISCO), 19 DE JANEIRO DE 2006
A possibilidade de perder dinheiro de forma permanente é o risco de
maior preocupação para mim, para a Oaktree e para todos os investidores
práticos que conheço. Devemos, contudo, prestar atenção em muitos outros
tipos de risco, pois eles podem (a) nos afetar ou (b) afetar os outros e, assim,
gerar oportunidades de lucro.
Há muitas formas de risco de investimento. Muitos preocupam alguns investidores,
mas não outros, e podem fazer um determinado investimento parecer seguro para
alguns investidores, porém, arriscado para outros.
• Ficar aquém do objetivo — os investidores têm necessidades diferentes e, para
cada um deles, o fato de não conseguir atendê-las representa um risco. Para um
executivo aposentado que talvez precise de 4% ao ano para poder pagar suas
contas, 6% representaria um lucro inesperado. Porém, para um fundo de
pensão que precisa obter uma média de 8% ao ano, um longo período com
retornos de 6% implicaria um sério risco. Obviamente esse risco é pessoal e
subjetivo, e não absoluto e objetivo. Nesse sentido, um determinado
investimento pode ser arriscado para algumas pessoas, mas não oferecer risco
para outras. Então, este pode não ser o risco para o qual “o mercado” exija
compensação sob a forma de maiores retornos prospectivos.
• Desempenho insatisfatório — Digamos que um gestor de investimentos saiba
que seu cliente não investirá mais dinheiro em uma conta, independentemente
de seu bom desempenho; ocorre que, se a conta não for capaz de acompanhar
algum índice, o gestor a perderá. Este é o “risco do benchmark”; o gestor pode
eliminar esse risco ao espelhar o índice. Mas todo investidor que não esteja
disposto a desistir dos lucros superiores ao índice e que, em sua busca, resolva
desviar-se do índice passará por períodos em que o desempenho de seus
investimentos será menor. De fato, uma vez que muitos dos melhores
investidores se apegam mais fortemente à sua estratégia, e como nenhuma
delas funciona o tempo todo, os melhores investidores podem passar pelos
maiores períodos de desempenho insatisfatório de seus ativos.
Especificamente, em períodos de loucura, os investidores disciplinados
aceitam voluntariamente o risco de não correr suficiente risco para acompanhar
o mercado (veja Warren Buffett e Julian Robertson em 1999. Naquele ano, o
desempenho insatisfatório era um símbolo de coragem, pois significava a
recusa em participar da bolha tecnológica).
• Risco para a carreira do gestor — esta é a forma extrema de risco de
desempenho insatisfatório: é o risco que surge quando as pessoas que
gerenciam o dinheiro não são donas dele. Nesses casos, os gestores (ou
“agentes”) podem não se importar muito com os ganhos (que não serão
compartilhados com eles), porém, podem ter medo mortal de perdas que
possam custar seus empregos. A implicação é clara: não vale a pena correr um
risco capaz de comprometer os rendimentos a tal ponto que possa chegar a
custar o emprego de um agente.
• Não convencionalidade — em linhas semelhantes ao item anterior, há o risco
de ser diferente. Os administradores de dinheiro alheio talvez se sintam mais
confortáveis com a obtenção de um desempenho médio dos ativos gerenciados
por eles — independentemente do que isso implique em termos absolutos —
do que com a possibilidade de que ações não convencionais não tenham êxito e
resultem em suas demissões… A preocupação com esse risco impede que
muitas pessoas tenham grandes resultados, mas também cria oportunidades em
investimentos não ortodoxos para aqueles que ousam ser diferentes.
• Iliquidez — Quando um investidor precisa de dinheiro para pagar uma cirurgia
daqui a três meses ou para comprar uma casa daqui a um ano, talvez não seja
capaz de realizar investimentos que não tenham a liquidez desejada para
atender ao seu cronograma. Então, para ele, risco não é apenas perder dinheiro,
ou a volatilidade, ou qualquer um dos tópicos citados; é não conseguir, quando
necessário, transformar — a preço razoável — um investimento em dinheiro.
“RISK” (RISCO), 19 DE JANEIRO DE 2006
Agora, quero falar um pouco sobre os fatores que dão origem ao risco de
perda.
A princípio, o risco de perda não decorre necessariamente de fundamentos
ruins. Um ativo com fundamentos fracos — as ações de uma empresa em
más condições, um título podre ou um edifício situado no pior lugar da
cidade — pode se transformar em um investimento muito bom se for
comprado a um preço suficientemente baixo.
Em segundo lugar, o risco pode estar presente mesmo em um
macroambiente sem fraquezas. A combinação entre arrogância, falta de
compreensão e aceitação do risco, e um pequeno evento negativo, pode ser
suficiente para causar estragos. Qualquer um que não dedique tempo e
esforços necessários para entender os processos subjacentes de seu portfólio
está suscetível a isso.
Na maioria das vezes, se resume ao fator psicológico, isto é, a um
otimismo excessivo e, portanto, mira preços muito elevados. Os investidores
tendem a associar histórias emocionantes e encorajadoras a altos rendimentos
potenciais. Também esperam altos retornos daquilo que, ultimamente, têm
performado bem. Mesmo que esses investimentos em alta consigam cumprir
as expectativas das pessoas por um tempo, certamente implicam alto risco.
Após serem carregados nos ombros da emoção da multidão e elevados ao que
eu chamo de “pedestal da popularidade”, oferecem a possibilidade de
retornos elevados contínuos, mas também de rendimentos baixos ou
negativos.
A teoria diz que o retorno alto está associado ao risco alto porque o
primeiro existe para compensar o segundo. Os investidores de valor,
pragmáticos, entretanto, não enxergam isso: acreditam na possibilidade de
obter um retorno alto e, simultaneamente, manter o risco baixo ao comprar
ativos por menos do que valem. Da mesma forma, pagar demais implica um
retorno baixo e um risco alto.
Aqueles ativos maçantes, ignorados e possivelmente malvistos e baratos
— muitas vezes são pechinchas justamente por seu mau desempenho —
costumam ser a preferência de investidores de valor para obter retornos altos.
Os retornos que obtêm em mercados altistas2 não costumam ser os mais altos,
mas, na média, os ativos geralmente possuem um excelente desempenho, que
costuma ser mais consistente do que o das ações “quentes” e, também,
possuem baixa variabilidade, baixo risco fundamental e perdas menores
quando os mercados não estão bem. Na maior parte do tempo, o maior risco
dessas negociações pouco brilhosas reside na possibilidade de obterem
desempenho insatisfatório em mercados com tendência altista. Entretanto, o
investidor de valor, ciente do risco, está disposto a conviver com isso.
Tenho certeza de que concordamos que os investidores devem exigir — e o
fazem — maiores retornos prospectivos sobre os investimentos que
consideram mais arriscados. E espero podermos concordar que o risco de
perder dinheiro é o que mais preocupa as pessoas quando exigem retornos
prospectivos e, portanto, definem preços para os investimentos. Ainda não
respondemos a uma questão: como esse risco é medido?
Em primeiro lugar, está claro que não é nada além de uma questão de
opinião: mesmo que, com sorte, seja uma estimativa esclarecida e competente
sobre o futuro, ainda assim é apenas uma estimativa.
Em segundo lugar, não existe nenhum padrão para sua quantificação.
Escolha um investimento qualquer e algumas pessoas dirão que seu risco é
alto e outras dirão que é baixo. Algumas afirmarão que o risco é a
probabilidade de não ganhar dinheiro; outros dirão que é a probabilidade de
perder determinada parcela de seu dinheiro (e assim por diante). Alguns
verão o risco como a possibilidade de perder dinheiro ao longo de um ano;
outros, como a possibilidade de perder dinheiro durante todo o período que
estiverem com o ativo em mãos. Claramente, mesmo que todos os
investidores envolvidos se reunissem em uma sala e mostrassem suas cartas,
nunca concordariam com um número único que representasse o risco de um
investimento. E mesmo que concordassem, é provável que nunca o
conseguissem comparar com outro número, definido por outro grupo de
investidores, para outro investimento. Essa é uma das razões pelas quais eu
falo que o risco e a decisão sobre o quociente risco/retorno não funcionam em
um algoritmo, isto é, não são passíveis de serem entregues a um computador.
Há mais de sessenta anos, Ben Graham e David Dodd disseram, na
segunda edição de Security analysis [Análise de investimentos], a bíblia dos
investidores de valor: “a relação entre diferentes tipos de investimento e o
risco de perda é muito indefinida e flutua demais com as mudanças do
entorno; por isso, não permite uma formulação matemática sólida”.
Em terceiro lugar, o risco é enganoso. É fácil levar em conta as
ponderações convencionais, como a probabilidade de que eventos geralmente
recorrentes se repitam. Porém, situações anômalas, aquelas que ocorrem
apenas uma vez na vida, são muito difíceis de quantificar. O fato de um
investimento estar sujeito a um risco particularmente grave que poderá
ocorrer com frequência bastante baixa — chamo isso de desastre improvável
— significa que o investimento pode parecer mais seguro do que realmente é.
A questão é que, analisando-o de forma prospectiva, grande parte do risco
é subjetivo, oculto e imensurável.
Como ficamos então? Qual a melhor forma de tratar o risco de perda se
ele é subjetivo e não pode ser medido, quantificado ou observado? Os
investidores competentes são capazes de ter uma noção dos riscos presentes
em determinada situação. Eles formam uma opinião com base principalmente
em dois fatores: (a) a estabilidade e confiabilidade do valor e (b) a relação, ou
quociente, entre preço e valor. Eles examinarão outros, mas a maior parte de
sua opinião dependerá desses dois fatores.
Ultimamente tem havido muitos esforços para que a avaliação do risco se
torne mais científica. As instituições financeiras costumam utilizar “gestores
de risco” quantitativos, separando-os de suas equipes de gestão de ativos e,
além disso, têm adotado modelos computadorizados, como o value at risk
(valor em risco), para mensurar o risco de uma carteira. Entretanto, os
resultados produzidos por essas pessoas e suas ferramentas não serão
melhores do que os dados de entrada em que confiam e nos julgamentos que
fazem sobre como processar essas informações; na forma como vejo, eles
nunca serão tão bons quanto os resultados baseados nas opiniões subjetivas
dos melhores investidores.
Dada a dificuldade de quantificar a probabilidade de sofrer perdas, os
investidores que querem ter alguma medida objetiva do retorno ajustado ao
risco — e são muitos — só possuem um indicador, chamado de índice de
Sharpe. Ele mede a relação do retorno excedente de uma aplicação financeira
(seu retorno acima da “taxa de juros sem risco” ou da taxa das letras do
tesouro de curto prazo) e o desvio padrão do retorno. Esse cálculo parece útil
para os ativos negociados no mercado, o qual realiza negociações e
precificações frequentes; há alguma lógica nesse processo, e isso é realmente
o melhor que temos. Embora não diga nada explicitamente sobre a
probabilidade de perda, pode haver razões para acreditar que os preços dos
ativos mais arriscados devido aos seus fundamentos flutuam mais do que os
dos ativos mais seguros e que, portanto, o índice de Sharpe tem alguma
relevância. Para ativos privados sem preços de mercado — como imóveis e
empresas inteiras —, não há alternativa para o ajuste subjetivo de riscos.
Alguns anos atrás, enquanto pensava sobre a dificuldade de mensurar o risco,
percebi que, graças à sua natureza potencial, não quantitativa e subjetiva, o
risco de um investimento — definido como a probabilidade de perda — não
pode ser medido em retrospectiva nem por suposições.
Digamos que um investimento funcione conforme o esperado. Será que
isso quer dizer que não havia risco? Podemos, por exemplo, ter comprado
algo por 100 dólares e vendido, um ano depois, por 200 dólares. Houve
risco? Quem pode dizer? Talvez o investimento tenha nos exposto a grandes
incertezas potenciais que não se concretizaram. Assim, o risco real pode ter
sido alto. Ou, então, digamos que o investimento produz uma perda. Isso quer
dizer que havia risco ou, talvez, que a aplicação deveria ter sido percebida
como arriscada no momento em que foi analisada e registrada?
Se refletirmos sobre isso, veremos que a resposta a essas perguntas é
simples: o fato de algo ter ocorrido — neste caso, a perda — não significa
que deveria necessariamente acontecer, e o fato de algo não ter ocorrido não
significa que era um evento improvável.
O livro de Nassim Nicholas Taleb — este, considerado uma das maiores
autoridades sobre o assunto — Fooled by randomness (Iludido pelo acaso)
conta “histórias alternativas” que, embora pudessem ter ocorrido, não
aconteceram. No capítulo 16, falo mais sobre esse livro e sua importância; no
momento, entretanto, estou interessado em entender como a ideia de histórias
alternativas se relaciona com o risco.
No mundo dos investimentos pode-se viver bem por anos com uma grande
conquista ou uma previsão radical que, ao final, se mostra correta. Mas o que se
prova com um único êxito? Quando os mercados estão em movimento de alta, os
melhores resultados acabam nas mãos daqueles que assumem os maiores riscos.
Será que estamos falando de pessoas inteligentes que foram capazes de prever o
bom momento ou de pessoas agressivas por natureza que se viram tomadas pela
sorte? De forma mais simples: em nosso negócio, quantas vezes as pessoas estão
certas pela razão errada? Nassim Nicholas Taleb chama essas pessoas de “tolas
sortudas”; a curto prazo, é realmente difícil diferenciá-las dos investidores
competentes.
A questão é que, mesmo depois de um investimento ter sido finalizado, é
impossível quantificar o risco incorrido. Certamente o fato de a negociação ter
funcionado não significa que isso não foi arriscado, e vice-versa. No que diz
respeito a um investimento bem-sucedido, como saber se o resultado favorável era
inevitável ou apenas uma entre centenas de possibilidades (muitas delas
desagradáveis)? E o mesmo em relação a um resultado de perda: como saber se
estávamos realizando um investimento razoável, mas sem sorte, ou se era apenas
um palpite sem noção que merecia ser punido? Será que o investidor fez um bom
trabalho ao tentar avaliar o risco do investimento?
Essa é outra boa pergunta difícil de responder. Precisa de um modelo? Pense no
meteorologista. Ele diz que a probabilidade de que chova amanhã é de 70%.
Chove; ele estava certo ou errado? Se não chove, ele estava certo ou errado? Em se
tratando de probabilidades, se o número de observações não for muito alto, será
impossível avaliar a certeza de estimativas que não sejam 0% ou 100%.
“RISK” (RISCO), 19 DE JANEIRO DE 2006
E isso me leva à citação de Elroy Dimson que dá início a este capítulo:
“Risco significa que podem acontecer mais coisas do que as que
acontecerão”. Agora vamos em direção aos aspectos metafísicos do risco.
Talvez você se lembre da frase de abertura deste capítulo: investir consiste
exatamente em uma coisa: dar atenção ao futuro. No entanto, é obviamente
impossível “saber” qualquer coisa sobre o futuro. Se conseguirmos ser
clarividentes, poderemos ter uma ideia da gama de resultados futuros e da
relativa probabilidade de estes ocorrerem — ou seja, poderemos construir
uma distribuição de probabilidades aproximada. (Por outro lado, se não
conseguirmos, nunca saberemos dessas coisas e tudo não passará de mera
adivinhação.) Se tivermos alguma ideia sobre os acontecimentos futuros,
poderemos predizer o resultado mais provável, os resultados que têm uma
boa chance de ocorrer, a amplitude e o alcance deles; portanto, o “resultado
esperado”, que é calculado ao se ponderar cada resultado por sua
probabilidade de ocorrência, é uma figura que diz muito — porém não tudo
— sobre o futuro provável.
Mas, mesmo quando conhecemos o formato da curva de distribuição de
probabilidades, o resultado mais provável e o resultado esperado — e mesmo
que nossas expectativas estejam razoavelmente corretas —, conhecemos
apenas as probabilidades ou as tendências. Passei horas jogando gin rummy e
gamão com meu bom amigo Bruce Newberg. O tempo que passamos entre
cartas e dados, em que as probabilidades são totalmente conhecidas, nos
mostrou o importante papel desempenhado pela aleatoriedade e, portanto, os
caprichos das probabilidades. Bruce descreveu o entendimento de forma
admirável: “Há uma grande diferença entre probabilidade e resultado. As
coisas prováveis deixam de ocorrer — e as improváveis ocorrem — o tempo
todo.”. Essa é uma das coisas mais importantes que se pode saber sobre risco
em investimentos.
Enquanto ainda estamos falando de distribuições de probabilidades, quero
abrir parênteses para fazer menção especial à distribuição normal. Os
investidores, obviamente, são obrigados a opinar sobre eventos futuros. Para
isso, estabelece-se um valor central em torno do qual acredita-se que os
eventos provavelmente se agruparão (medidas de tendência central). Ele pode
ser a média ou o valor esperado (o resultado que, geralmente, se espera que
ocorra), a mediana (o resultado que, de um lado, agrupa metade das
possibilidades e, do outro, a outra metade) ou a moda (o resultado mais
provável). Mas, para lidar com o futuro, não é suficiente ter uma expectativa
central; precisamos de uma noção dos outros resultados possíveis e de suas
probabilidades. Precisamos de uma distribuição que descreva todas as
possibilidades.
A maioria dos fenômenos que tende a um valor central — por exemplo, a
altura das pessoas — compõe a conhecida curva em forma de sino, com a
probabilidade de dada observação atingir seu ponto máximo no centro e cair
em direção às extremidades do gráfico. Talvez haja mais homens de 1,78
metro do que de qualquer outra altura, e, então, pode haver menos homens
com 1,76 metro ou 1,80 metro, muito menos com 1,60 metro ou 1,96 metro, e
quase nenhum que meça 1,42 ou 2,14. Em vez de enumerar a probabilidade
de cada observação individualmente, a distribuição padrão nos oferece uma
maneira conveniente de resumir as probabilidades, de modo que alguns
números estatísticos podem nos dizer tudo o que precisamos saber sobre a
forma das coisas que estão por vir.
A distribuição em forma de sino mais comum é chamada de distribuição
“normal”. Embora as pessoas muitas vezes usem os termos em forma de sino
e normal como sinônimos, essas distribuições não são iguais. A primeira é de
um tipo geral, enquanto a segunda é uma distribuição específica em forma de
sino com propriedades estatísticas muito bem definidas. A atual crise de
crédito passa, sem dúvida, pela incapacidade de distinguir entre uma e outra
distribuição.
Nos anos que antecederam a crise, engenheiros financeiros, ou quants,
tiveram um papel importante para a criação e avaliação de produtos
financeiros, como derivativos e produtos estruturados. Em muitos casos,
supuseram que os eventos futuros teriam uma distribuição normal.
Entretanto, ela pressupõe que os eventos nas pontas distantes da curva
ocorrerão muito raramente; assim, a distribuição da evolução financeira —
moldada pelos seres humanos, com sua tendência de comportamentos
extremos movidos pela emoção — provavelmente deveria ter caudas “mais
grossas”. Assim, quando a inadimplência hipotecária começou a se tornar
generalizada, eventos que, antes, eram considerados improváveis passaram a
recair regularmente sobre veículos relacionados a hipotecas. Os investidores
que usaram veículos de investimentos construídos com base em distribuições
normais, sem muito subsídio para os “eventos das pontas do gráfico” (alguns
usam o termo “cisnes negros”, de Nassim Nicholas Taleb), perderam as
rodas.
Agora que investir tornou-se algo tão dependente da matemática
avançada, precisamos ficar atentos às ocasiões em que as pessoas, de forma
errônea, aplicam suposições simplistas a um mundo complexo. A
quantificação costuma oferecer um excesso de confiabilidade a afirmações
que devem ser aceitas com um certo grau de desconfiança. Isso gera um
grande potencial para criar problemas.
Eis a chave para entendermos o risco: ele é, em grande parte, questão de
opinião. E é difícil tê-la de forma definitiva quando se envolve o risco,
mesmo depois de o evento ter ocorrido. Poderíamos observar um investidor
que, em tempos difíceis, tenha perdido menos do que outro e concluir que
aquele investidor assumiu menos riscos. Ou poderíamos notar que um
investimento se desvalorizou mais do que outro em um determinado
ambiente e, assim, dizer que era mais arriscado. Essas afirmações são
necessariamente precisas?
Na maioria das vezes, creio ser justo dizer que o desempenho do
investimento é o que acontece quando um conjunto de acontecimentos —
geopolíticos, macroeconômicos, empresariais, técnicos e psicológicos —
encontra um portfólio já existente. Muitos futuros são possíveis,
parafraseando Dimson, mas apenas um ocorre. Poderá ser benéfico para sua
carteira ou prejudicá-la, de acordo com previsões, prudência ou sorte. O
desempenho de uma carteira sob um único cenário que se desenrola não diz
nada sobre como a carteira poderia se comportar sob as muitas “histórias
alternativas” que poderiam ter ocorrido.
• É possível criarmos uma carteira que seja capaz de resistir a 99% dos
cenários e que, mesmo assim, seja um fracasso porque o que se concretiza
é aquele que tem apenas 1% de chance de ocorrer. Com base no resultado,
o negócio parece ter sido arriscado, mas talvez tenhamos tomado bastante
cuidado.
• Podemos estruturar uma outra carteira para que funcione muito bem em
metade dos cenários e muito mal na outra metade. Mas, se o ambiente
desejado se concretizar, beneficiando a carteira, os espectadores talvez
concluam que o portfólio apresentava baixo risco.
• O êxito de uma terceira carteira talvez dependa completamente de uma
única ocorrência inusitada. No entanto, se esse evento ocorrer, pode ser
que algo que não passa de um posicionamento agressivo e selvagem seja
confundido com conservadorismo e previdência.
O retorno por si só — e especialmente o que ocorre em curtos períodos —
nos diz muito pouco sobre a qualidade das decisões de investimento. O
retorno deve ser avaliado em relação à quantidade de risco assumida para
obtê-lo. E, mesmo assim, não há como se mensurar o risco. Certamente não
pode ser medido com base no que “todos estão dizendo” em um dado
momento. O risco só pode ser julgado por pensadores de segundo nível,
sofisticados e experientes.
Eis o meu resumo sobre o tema do capítulo, isto é, “entender o risco”:
Na maioria dos casos, é impossível antecipar o risco do investimento — exceto,
talvez, para pessoas com uma visão incomum —, mesmo depois de ter sido
finalizado. Por essa razão, muitos dos grandes desastres financeiros que temos
visto ocorrem por falhas na previsão e gestão de riscos. Há várias razões para isso.
• O risco só existe no futuro, e é impossível saber com certeza o que o futuro nos
reserva… Quando olhamos para o passado, nenhuma ambiguidade se mostra
evidente. Só aconteceram as coisas que aconteceram. Mas essa certeza não
significa que o processo que cria resultados seja claro e confiável. Muitas
coisas poderiam ter acontecido no passado, e o fato de apenas uma ter ocorrido
minimiza a importância da variabilidade que existia naquele momento.
• As decisões sobre suportar um risco ou não são tomadas pela observação de
padrões normais que ocorrem na maior parte das vezes. Mas, de vez em
quando, algo muito diferente acontece… Ocasionalmente, acontece o
improvável.
• As projeções tendem a se agrupar em torno de padrões históricos e exigem
apenas pequenas mudanças. Isto é, as pessoas geralmente esperam que o futuro
seja igual ao passado e subestimam o potencial da mudança.
• Ouvimos muito se falar sobre projeções para o “pior caso”, as quais, muitas
vezes, acabam não sendo suficientemente negativas. Gosto de contar a história
que meu pai me contava sobre o jogador que costumava perder. Um dia ele
ouviu falar de uma corrida com apenas um cavalo e resolveu apostar o dinheiro
guardado para pagar o aluguel. No meio da corrida, o cavalo pulou a cerca e
fugiu. As coisas podem sempre ser piores do que esperamos. Talvez a
expressão “pior caso” signifique “o pior com que já deparamos no passado”.
Isso não significa que as coisas não possam ser piores no futuro. Em 2007, as
suposições de pior caso de muitas pessoas foram superadas.
• O risco aparece de forma irregular. Quando dizemos “2% das hipotecas não
são pagas” a cada ano, mesmo que isso seja verdade em uma média de vários
anos, uma onda incomum de inadimplência pode ocorrer em algum momento e
levar à ruína um veículo financeiro estruturado. Será sempre o caso de alguns
investidores — especialmente aqueles que operam com alto grau de
alavancagem —, que não sobreviverão a esses períodos.
• As pessoas superestimam sua capacidade de mensurar os riscos e de entender
mecanismos que nunca viram em funcionamento. Em teoria, uma coisa que
distingue os humanos de outras espécies é que somos capazes de entender que
uma situação é perigosa sem a necessidade de passar por ela. Não precisamos
nos queimar para saber que não devemos nos sentar no fogo. Contudo, em
períodos de alta dos mercados, as pessoas tendem a não utilizar esse
conhecimento. Em vez de reconhecerem o risco à frente, tendem a
superestimar sua capacidade de entender como as novas invenções financeiras
funcionarão.
• Por fim, e de bastante importância, a maioria das pessoas vê o risco como uma
maneira de ganhar dinheiro. Riscos maiores geralmente produzem maiores
retornos. O mercado precisa configurar-se de modo a manter a aparência de
que é exatamente isso que ocorre; se não fosse assim, um investidor não
entraria em negócios arriscados. Mas as coisas não funcionam dessa forma,
senão os investimentos arriscados não seriam arriscados. E, quando tomar
risco não funciona, realmente não funciona: nesse momento, as pessoas se
lembram exatamente do que é o risco.
“NO DIFFERENT THIS TIME” (NÃO É DIFERENTE DESTA VEZ), 17 DE DEZEMBRO DE
2007
6
O mais importante é… reconhecer o risco
Já que agora o sistema está mais estável, acredito que nós o
deixaremos menos estável por meio de maiores alavancagens e
assunções de risco.
MYRON SCHOLES
A sabedoria popular nos diz que o risco aumenta nas recessões
e diminui durante os períodos de fartura. Ao contrário, seria
mais útil imaginar que o risco aumenta durante os períodos de
melhoria, enquanto os desequilíbrios financeiros se acumulam,
e se materializam em recessões.
ANDREW CROCKETT
Não importa quão bons sejam os fundamentos de um ativo,
pois, quando exercem sua ganância e propensão a errar, as
pessoas são capazes de pôr tudo a perder.1
Um grande investimento precisa gerar retornos e controlar riscos; o
reconhecimento do risco é pré-requisito absoluto para poder controlá-lo.
Espero que tenha me expressado claramente sobre o que compreendo
como risco (e o que não). Ele é a incerteza sobre quais resultados irão ocorrer
e quais as possibilidades de perda quando ocorrer algo desfavorável. O
próximo passo importante é descrever o processo pelo qual o risco pode ser
reconhecido pelo que é.
Isso começa a desenvolver-se, geralmente, pelo entendimento dos
momentos em que os investidores dão pouca atenção ao risco: otimistas,
pagam muito por um determinado ativo. Em outras palavras, o principal
acompanhante do risco elevado é o preço elevado, seja de um ativo individual
ou outro sobrevalorizado (portanto, caro), seja de um mercado inteiro
estimulado por um sentimento altista (portanto, com preços altos); a principal
fonte de riscos é participar das negociações — em vez de afastar-se delas —
quando os preços estão altos.
Enquanto o teórico credita a retorno e risco dois conceitos distintos, ainda
que correlacionados, o investidor de valor acredita que o risco elevado e o
retorno prospectivo baixo são apenas os dois lados de uma mesma moeda,
ambos decorrentes principalmente dos preços altos. Assim, ter ciência da
relação entre preço e valor — em relação a um único ativo ou a todo o
mercado — é componente essencial para lidar bem com o risco.
Quando os mercados sobem tanto que os preços acabam implicando
perdas maiores do que os potenciais ganhos que deveriam gerar, o risco
surge. E o seu gerenciamento se inicia ao reconhecermos que ele existe.
Ao longo da inclinação positiva da linha de mercado de capital, o crescimento do
rendimento potencial representa uma compensação pelo incremento do risco
assumido. Com exceção das pessoas que conseguem gerar “alfa” ou que possuem
acesso a gerentes que possuem “alfa”, os outros investidores não devem tentar
obter retornos adicionais se não quiserem assumir riscos incrementais. E se
resolverem tentar, devem exigir prêmios de risco.
No entanto, em algum ponto da oscilação do pêndulo,2 as pessoas se esquecem e
abraçam o risco de forma excessiva. Em suma, nos mercados altistas —
geralmente quando as coisas estão indo bem há algum tempo —, as pessoas
tendem a dizer: “O risco é meu amigo. Quanto mais risco eu correr, maior será
meu retorno. Dê-me mais risco!”.
A verdade é que a tolerância ao risco é contrária à obtenção de êxito nos
investimentos. Quando não se tem medo do risco, ele é aceito mesmo sem
nenhuma compensação por fazê-lo… E, assim, a compensação pela assunção do
risco desaparece. Esta é uma relação simples e inevitável. Ao não se preocupar e,
na verdade, tolerar os riscos, os investidores compram ações com quocientes
preço/lucro altos e empresas privadas em múltiplos de EBITDA elevados (fluxo de
caixa, definido como os lucros antes dos juros, dos impostos, da depreciação e da
amortização) e, por fim, passam a acumular títulos (bonds), apesar de suas margens
estreitas de lucro e imóveis a “taxas de capitalização” mínimas (o quociente entre
lucro operacional líquido e preço).
Poucas coisas são tão enganosas quanto a crença generalizada de que não há risco,
pois somente quando os investidores são adequadamente avessos a ele os retornos
prospectivos incorporam prêmios de risco apropriados. Espero que no futuro (a) os
investidores se lembrem de temer os riscos e exigir prêmios de risco e (b)
continuemos alertas para os momentos em que essa situação não ocorre.
“SO MUCH THAT’S FALSE AND NUTTY” (TANTO QUE É FALSO E LOUCO), 8 DE JULHO
DE 2009
Desse modo, um elemento primordial para a criação de riscos é a crença
de que estes estão menores ou talvez tenham até desaparecido por completo.
Acreditar nisso eleva os preços e impele investidores a realizar atitudes
arriscadas, mesmo com baixo valor dos retornos prospectivos.
Entre 2005 e 2007, a visão geral de que o risco havia desaparecido fez os
preços aumentarem ao patamar de uma bolha, o que levou investidores a
participar de atividades que, mais tarde, se revelaram arriscadas. Dentre todos
os processos, esse é um dos mais perigosos; sua tendência à repetição é
notável.
Dos muitos contos de fadas contados ao longo dos últimos anos, um dos mais
sedutores — e, portanto, mais perigosos — foi o da redução global do risco. Ele
dizia o seguinte:
• O risco de ciclos econômicos vem diminuindo por causa da boa gestão do
banco central dos Estados Unidos;
• Por causa da globalização, o risco tem se espalhado pelo mundo em vez de se
concentrar geograficamente;
• A securitização e o empréstimo sindicado têm feito o risco ser distribuído entre
muitos participantes do mercado, evitando que se concentre em apenas alguns;
• O risco foi dividido entre os investidores mais capazes de suportá-lo;
• A alavancagem tornou-se menos arriscada porque as taxas de juros e as
condições da dívida são muito mais favoráveis aos mutuários;
• As compras alavancadas (leveraged buyouts, em inglês) são mais seguras
porque as empresas que estão submetidas a compra são fundamentalmente
mais fortes.
• A proteção (hedge) do risco pode ser realizada por meio da estratégia de
retorno absoluto e da estratégia comprada/vendida ou por meio do uso de
derivativos projetados para esse fim.
• Os avanços da informática, da matemática e da modelagem nos fizeram
compreender melhor os mercados, tornando-os, portanto, menos arriscados.
A revista Pension & Investments (https://www.pionline.com) (20 de agosto de
2007) lançou uma boa metáfora: “Jill Fredston é uma especialista em avalanches
reconhecida em todo o país… Ela conhece um tipo de risco moral, em que os
melhores equipamentos de segurança podem persuadir alpinistas a assumir mais
riscos, ‘tornando-os, de fato, menos seguros’.” Assim como ocorre nas
oportunidades de ganhar dinheiro, o grau de risco presente em um mercado
origina-se do comportamento dos participantes, e não dos ativos, das estratégias e
das instituições. Independentemente de como as estruturas do mercado estejam
construídas, o risco será baixo apenas se os investidores se comportarem com
prudência.
O ponto principal é que histórias como essa, que tratam do controle do risco,
raramente acabam sendo verdadeiras. O risco não pode ser eliminado; ele é apenas
transferido e distribuído. E os acontecimentos que fazem o mundo parecer menos
arriscado são, em geral, ilusórios e, portanto, ao apresentar um quadro otimista,
tendem a tornar o mundo mais arriscado. Estas são as lições mais importantes de
2007.
“NOW IT’S ALL BAD” (AGORA, TUDO VAI MAL), 10 DE SETEMBRO DE 2007
O mito de que não existe mais risco é uma das fontes de risco mais
perigosas, um dos principais fatores para a criação de bolhas. No ponto
máximo do movimento pendular, a crença no baixo risco e na produção certa
de lucros intoxica o rebanho e faz com que seus membros esqueçam a
cautela, a preocupação e o medo da perda e, em vez disso, fiquem obcecados
com o risco de perder oportunidades.
A última crise se fez presente, principalmente, porque as pessoas começaram a
investir enormes montantes em coisas novas, complexas e perigosas. Assumiram
muita alavancagem e comprometeram muito capital em investimentos ilíquidos.
Por que fizeram isso? Os investidores acreditaram em demasia, se preocuparam
muito pouco e, portanto, se arriscaram demais. Resumindo, convenceram-se de que
viviam em um mundo de baixo risco…
A preocupação e os outros sentimentos aparentados, a saber, a desconfiança, o
ceticismo e a aversão ao risco, são ingredientes essenciais em um sistema
financeiro seguro. A preocupação impede que se façam empréstimos arriscados,
que as empresas ultrapassem seu nível sustentável de endividamento, que as
carteiras se tornem excessivamente concentradas e que as estratégias não
comprovadas se transformem em manias populares.
Quando preocupação e aversão ao risco estiverem presentes, como deveria ser
sempre, os investidores questionarão, investigarão e agirão com prudência;
investimentos arriscados não serão realizados ou terão a obrigação de fornecer
compensação adequada em termos de retorno esperado.
Ocorre que os mercados somente oferecerão prêmios de risco adequados quando os
investidores forem suficientemente avessos ao risco. Quando poucos se
preocupam, os tomadores de empréstimos arriscados e as estratégias questionáveis
têm fácil acesso ao capital; consequentemente, isso precariza o sistema financeiro.
Muito dinheiro será depositado no arriscado e no novo, elevando os preços dos
ativos e causando a redução dos retornos prospectivos e da segurança.
Claramente, nos meses e anos que antecederam a crise, poucos participantes se
preocuparam tanto quanto deveriam.
“TOUCHSTONES” (CRITÉRIOS), 10 DE NOVEMBRO DE 2009
O risco dos investimentos tem origem principalmente nos preços muito altos;
e os preços muito altos costumam originar-se do excesso de otimismo, do
ceticismo inadequado e da aversão ao risco. Outros fatores subjacentes
podem incluir os baixos retornos prospectivos em investimentos mais
seguros, algum bom desempenho recente nos mais arriscados, fortes entradas
de capital e fácil disponibilidade de crédito. A questão, aqui, é entender o
impacto que tudo isso tem.
O processo mental relativo aos investimentos é uma corrente em que cada
elo, isto é, cada investimento, define as exigências do próximo. Em 2004,
descrevi o processo da seguinte maneira:
Usarei um mercado “típico” de alguns anos atrás para ilustrar como isso funciona
na vida real. Digamos que a taxa de juros das letras do tesouro americano de trinta
dias é de 4%. Então, os investidores dizem que, se investirem por cinco anos,
desejam obter 5%. E, para comprar a nota de dez anos, querem 6%. Quanto maior
for o prazo de vencimento, mais juros serão exigidos pelos investidores, porque
sua preocupação é com o risco ao seu poder de compra, que supõem que aumente
com o aumento do prazo de vencimento. É por isso que a curva de rendimento, que
na realidade é uma parcela da linha de mercado de capital, geralmente inclina-se
positivamente com o aumento da vida dos ativos.
Agora vamos juntar o risco de crédito a isso. “Se a letra do tesouro de dez anos
paga 6%, não comprarei títulos de dívida corporativa de uma empresa com rating
‘A’, a menos que me pague 7%.” Isso introduz o conceito de spreads de crédito.
Nosso investidor hipotético quer 100 pontos-base para deixar de investir em títulos
do governo e passar a investir em títulos empresariais. Se for consenso entre os
investidores, então esse será o spread3 do rendimento.
E se nos afastarmos dos títulos com investment-grade?4 “Não investirei em um
título de alto rendimento (high yield) a menos que obtenha 600 pontos básicos
sobre uma nota do tesouro americano de maturidade semelhante.” Assim, os títulos
de alto rendimento são obrigados a render 12% — isto é, um spread de 6% em
relação à nota do tesouro — para que consigam atrair compradores.
Agora, deixemos a renda fixa de lado. As coisas ficam mais difíceis, porque em
certos investimentos, como nas ações, não existem retornos prospectivos (isso
porque, simplesmente, seus retornos não são fixos, são conjecturais). Mas os
investidores possuem uma boa percepção em relação a essas coisas.
“Historicamente as ações da Standard & Poors tiveram rendimento de 10%, e as
comprarei somente se eu achar que elas continuarão da mesma forma… E, as ações
mais arriscadas precisarão me oferecer um maior retorno; não vou comprar na
Nasdaq a menos que eu acredite que possa chegar a 13%.”
A partir daí, as condições deverão apenas melhorar. “Se consigo 10% com ações,
então precisarei de 15% para aceitar a iliquidez e a incerteza associadas ao setor
imobiliário. E 25% caso eu queira investir em aquisições do tipo buyout,5 e 30%
para me induzir a investir em venture capital,6 com sua baixa taxa de êxito.”
É assim que deveria funcionar, e na verdade eu acho que geralmente funciona
(embora os requisitos não sejam os mesmos em todos os momentos). O resultado é
uma linha de mercado de capital bastante familiar para muitos de nós, conforme a
mostrada na figura 6.1.
Um dos grandes problemas do retorno dos investimentos atualmente surge do
ponto de partida desse processo: A taxa de risco não é de 4%; está mais próxima de
1%…
Figura 6.1
Os investidores típicos requererão retornos mais atrativos para que possam aceitar
o risco dos prazos maiores, mas com o ponto de partida em +1%, 4% é, agora, a
taxa correta para dez anos (e não 6%). Eles não investirão em ações a menos que
possam obter 6% ou 7%. E as obrigações especulativas talvez não valham a pena
se seus rendimentos forem inferiores a 7%. O mercado imobiliário terá de render
8% ou mais. Para que as aquisições do tipo buyout sejam atraentes, devem
prometer 15%, e assim por diante. Agora temos uma linha de mercado de capital
como a mostrada na figura 6.2, que está (a) em um nível muito menor e é (b) muito
mais achatada.
Figura 6.2
Explica-se a parte mais baixa da linha pelas baixas taxas de juros, cujo ponto de
partida é a baixa taxa de juros sem risco. Afinal, cada um dos investimentos
precisa competir com os outros por capital, mas naquele ano, devido às baixas
taxas de juros, os retornos mínimos para cada um dos investimentos
sucessivamente mais arriscados foi a mais baixa que vi em toda a minha carreira.
Além de a linha de mercado de capital estar, hoje, em um nível baixo em termos de
retorno, há também uma série de fatores que conspiraram para o seu achatamento.
(Isso é importante, porque a inclinação da linha, ou o quanto o retorno esperado
aumenta por unidade de aumento do risco, quantifica o prêmio de risco.) Em
primeiro lugar, os investidores esforçaram-se avidamente para fugir de
investimentos de baixo risco e baixo retorno. Segundo, os investimentos arriscados
têm sido muito gratificantes por mais de vinte anos e se saíram particularmente
bem em 2003. Assim, os investidores são atraídos mais (ou repelidos menos) do
que deveriam por investimentos arriscados e exigem menos compensação de risco
para começar a investir neles. Terceiro, os investidores têm a percepção de que,
atualmente, o risco é limitado…
Em resumo, para usar as palavras dos quants, a aversão ao risco está menor. De
alguma forma, nessa alquimia única à psicologia dos investidores, “não quero isso
nem de graça” tinha se transformado em “para mim, parece um investimento
sólido”.
“RISK AND RETURN TODAY” (RISCO E RETORNO NA ATUALIDADE), 27 DE OUTUBRO
DE 2004
Esse processo de “enriquecimento” acaba nos levando a quocientes
preço/lucro elevados, spreads de crédito estreitos, comportamento
indisciplinado dos investidores, uso indiscriminado da alavancagem e forte
demanda por todos os tipos de veículos de investimento. Tudo isso, além de
causar o aumento dos preços e a redução do retorno prospectivo, também cria
um ambiente de alto risco.
O risco é incrivelmente importante para os investidores, também efêmero e
imensurável, entretanto, essas características tornam difícil o seu
reconhecimento, especialmente em situações influenciadas pelas emoções.
Mas é imperativo que o façamos. No próximo trecho, escrito em julho de
2007, eu mostro o processo de avaliação que usamos na Oaktree para avaliar
o ambiente de investimento e o “humor ao risco” na época. Em outros
momentos, as especificidades podem ser diferentes, espero, contudo, que este
exemplo de nosso processo de tomada de decisão seja útil.
Como estamos hoje [meados de 2007]? Acredito não haver muito mistério. Vejo
baixos níveis de ceticismo, medo e aversão ao risco. A maioria das pessoas
costuma estar disposta a realizar investimentos arriscados porque os retornos
prometidos pelos investimentos tradicionais e seguros parecem muito baixos. Isso
é verdade, embora a falta de interesse por investimentos seguros e a aceitação de
investimentos mais arriscados tenham deixado a inclinação da curva risco/retorno
bastante achatada. Os prêmios de risco são geralmente os mais baixos que já vi,
mas poucas pessoas deixam de aceitar os riscos incrementais…
Recentemente, os mercados mostraram uma tendência à subida quando há
acontecimentos positivos e a se recuperar facilmente dos eventos negativos. Vejo
pouquíssima gente querendo ansiosamente se desfazer de seus ativos e poucos
vendedores forçados a fazer isso; na verdade, há uma forte demanda pela maioria
dos ativos. Como resultado, não conheço nenhum grande mercado que possa ser
descrito como subprecificado ou esvaziado…
É o que é. Temos vivido em um período otimista. O ciclo tem sido bastante altista.
Os preços estão altos e os prêmios de risco são baixos. A confiança substituiu o
ceticismo e o entusiasmo substituiu a moderação. Você concorda ou discorda? Eis
a questão. Responda-a primeiro, e as implicações dessa resposta para os
investimentos se tornarão claras.
No primeiro trimestre do ano, houve um grande aumento das inadimplências
relativas aos empréstimos hipotecários de alto risco (subprime mortgages, em
inglês). As partes envolvidas diretamente perderam muito dinheiro e os
espectadores se preocuparam com o contágio de outras partes da economia e outros
mercados. No segundo trimestre, o impacto atingiu as CDOs (Collateralized Debt
Obligation), ou obrigações de dívida colateralizadas (produtos financeiros
estruturados e em “camadas” ou tranches) que haviam investido em carteiras de
empréstimos hipotecários subprime e hedge funds7 que haviam comprado dívida
de CDOs, incluindo dois fundos da Bear Stearns.8 Aqueles que precisaram liquidar
seus ativos foram forçados — como de costume em cenários de dificuldades — a
vender o que podiam, não o que queriam e muito menos apenas os indesejados
ativos ligados à crise do subprime. Começamos a ver notícias sobre o
rebaixamento das notas de risco, exigências por maiores garantias (margin calls) e
vendas apressadas a preços baixos (fire sales), isto é, o combustível geralmente
utilizado para o colapso do mercado de capitais. E nas últimas semanas
começamos a ver que os investidores estão ficando mais reticentes, e as novas
emissões de dívidas de baixa classificação de crédito precisaram ser renegociadas,
postergadas ou retiradas, deixando os empréstimos-ponte sem financiamento.
Os últimos quatro anos e meio foram de despreocupação para os investidores. Isso
não significa que continuará assim. Darei a última palavra a Warren Buffett, como
costumo fazer: “Descobrimos quem está nadando nu somente quando a maré
baixa”. Lembrem-se, Polianas: a maré não se mantém alta para sempre.
“IT’S ALL GOOD” (ESTÁ TUDO BEM), 16 DE JULHO DE 2007
Quero salientar enfaticamente que os comentários do memorando de julho
de 2007 e os meus outros avisos não têm nada a ver com previsão do futuro.
Tudo o que precisávamos saber nos anos que antecederam a crise poderia ter
sido percebido ao se acompanhar de forma consciente os acontecimentos do
presente.
A realidade do risco é muito mais complexa e menos direta do que a
percepção que podemos ter dela. As pessoas superestimam muito sua
capacidade de reconhecer o risco e subestimam o que é preciso fazer para
evitá-lo; assim, aceitam o risco sem saber e, ao fazê-lo, contribuem para sua
criação. Por esse motivo, é essencial aplicarmos o pensamento incomum de
segundo nível ao tema.
O risco surge à medida que o comportamento do investidor altera o
mercado. Quanto mais desejam os ativos, acelerando uma valorização que
somente ocorreria no futuro, mais reduzem os retornos prospectivos.
Conforme fatores psicológicos os fortalecem e eles se tornam mais ousados e
menos preocupados, deixam de requerer prêmios de risco adequados. A
ironia final está no fato de que a recompensa por assumir riscos incrementais
diminui quando mais pessoas entram no jogo.
Assim, o mercado não é uma arena estática em que os investidores
realizam suas operações. Ele é responsivo, formado pelo próprio
comportamento dos investidores. O aumento de confiança dos investidores
cria mais motivos de preocupação, assim como o aumento do medo e aversão
ao risco combinam-se para ampliar os prêmios de risco ao mesmo tempo que
reduzem o risco. Eu chamo isso de “perversidade do risco”.
“Não vou comprar a qualquer preço — todos sabem que é muito arriscado.” Essa é
uma frase que ouvi muito em minha vida e que deu origem às melhores
oportunidades de investimento de minha carreira…
A verdade é que o rebanho está errado sobre o risco, pelo menos com a mesma
frequência que está errado sobre o retorno. O consenso de que algo está muito
quente para poder ser manuseado está quase sempre errado. Em geral, a verdade
está no contrário disso.
Estou firmemente convencido de que o risco dos investimentos costuma estar onde
é menos percebido, e vice-versa:
• Quando todos acreditam que algo apresenta risco, a relutância em comprá-lo
geralmente reduz seu preço a ponto de não mais tornar sua negociação
arriscada. A opinião amplamente negativa pode anular o risco, uma vez que o
otimismo deixou de fazer parte de seu preço.
• E, obviamente, conforme demonstrado pela experiência, quando todos
acreditam que um investimento não é arriscado, os investidores das Nifty Fifty
geralmente elevam o desejo por ele a um ponto tão extremo que passa a ser
extremamente arriscado. Já que não se teme nenhum risco, não se exige nem se
dá nenhuma compensação pelos riscos — nenhum “prêmio de risco”. Isso
pode transformar o ativo mais estimado no mais arriscado.
Esse paradoxo existe porque a maioria dos investidores acha que a qualidade, ao
contrário do preço, é o que determina o risco. Ocorre que ativos de alta qualidade
podem ser arriscados e ativos de baixa qualidade podem ser seguros. Tudo é uma
questão do quanto se paga por eles… A opinião popular, então, não é apenas uma
fonte de baixo potencial de retorno, mas, também, de alto risco.
“EVERYONE KNOWS” (TODO MUNDO SABE), 26 DE ABRIL DE 2007
7
O mais importante é… controlar o risco
Ao juntar tudo, vemos que, em busca de lucro, o trabalho do
investidor é assumir riscos de forma inteligente. Fazer isso bem
é o que separa o bom investidor do resto.
Como avalio, os investidores que mais se destacam distinguem-se, no
mínimo, tanto por sua capacidade de controlar o risco quanto pela habilidade
de gerar resultados positivos.
O retorno absoluto alto é muito mais reconhecível e estimulante do que o
desempenho excelente, ajustado ao risco. É por isso que somente os grandes
retornos levam as fotos de seus investidores aos jornais; já que o risco e o
desempenho ajustado ao risco (mesmo após a ocorrência do fato) são de
difícil mensuração e já que a importância de gerenciar o risco é extremamente
subestimada, os investidores raramente são reconhecidos por ter realizado um
bom trabalho nesse sentido. Isso é especialmente verdadeiro nos períodos de
alta.
A meu ver, contudo, grandes investidores são aqueles que assumem riscos
menores proporcionalmente aos rendimentos que obtêm. Eles podem
produzir retornos moderados com baixo risco ou retornos elevados com risco
moderado. Entretanto, a obtenção de rendimentos elevados mediante riscos
também elevados significa muito pouco — a menos que consigamos fazer
isso por muitos anos; nesse caso, ou o “alto risco” percebido não era
realmente alto ou foi excepcionalmente bem administrado.
Pensemos nos investidores que são reconhecidos porque realizam um bom
trabalho, pessoas como Warren Buffett, Peter Lynch, Bill Miller e Julian
Robertson. Possuem trajetórias notáveis por se manterem consistentes sem
grandes contratempos, não apenas por seus retornos elevados. É verdade que
podem ter passado por um ou dois anos ruins, mas em geral administraram
bem tanto os riscos quanto os retornos.
Quaisquer que sejam os poucos prêmios concedidos ao controle de riscos,
eles nunca são dados nos períodos bons. A razão é que o risco é furtivo,
invisível. O risco — a possibilidade de perda — não é observável. O que se
pode observar é a perda; e ela geralmente só acontece quando o risco e os
eventos negativos se encontram.
Esse é um ponto muito importante, então descreverei duas analogias para
que o tema seja apresentado claramente. 1) Germes causam doenças, mas, em
si, não são doenças. Podemos dizer que a doença é o que acontece quando os
germes se estabelecem em algum organismo. 2) Na Califórnia, as casas
podem ter (ou não) falhas de construção que podem fazê-las desmoronar
durante terremotos. Isso é algo que só é possível descobrir quando ocorre um
terremoto.
Da mesma forma, perda é o que ocorre quando risco e adversidade se
encontram. O primeiro representa a possibilidade de sofrer perdas quando as
coisas dão errado. Enquanto tudo vai bem, as perdas não aparecem. O risco
só gera perdas quando ocorrem eventos negativos no ambiente.
Devemos lembrar que, quando o ambiente é salutar, esse é apenas um dos
ambientes com probabilidade de materialização naquele dia (ou naquele ano).
(Essa é a ideia de histórias alternativas de Nassim Nicholas Taleb, descrita
com mais detalhes no capítulo 16). O fato de o ambiente não ser negativo não
significa que não poderia ter sido. E o fato de o ambiente não ser negativo
não significa que o controle de risco não fosse aconselhável, embora, da
forma como as coisas aconteceram, ele não fosse necessário naquele
momento.
O importante aqui é a percepção de que talvez o risco estivesse presente,
mesmo que a perda não tenha ocorrido. Portanto, a ausência de perdas não
significa necessariamente que a carteira tenha sido construída de forma
segura. Então, o controle de risco pode estar presente nos bons momentos,
mas não é algo observável porque não é testado. E, por isso, não há prêmios.
Apenas um observador competente e sofisticado é capaz de observar uma
carteira nos períodos bons e adivinhar se ela é de baixo ou de alto risco.
Para que uma carteira consiga atravessar os períodos difíceis, o risco
precisa, em geral, estar muito bem controlado. Contudo, se a carteira prospera
nos períodos bons, não podemos dizer se o controle de risco (a) estava
presente e não era necessário ou (b) não existia.
Resumindo: apesar de o controle de risco ser invisível durante os períodos
bons, ainda assim, é essencial, já que períodos bons podem facilmente se
transformar em momentos ruins.
Qual é a definição de um trabalho benfeito?
A maioria dos observadores acredita que a vantagem dos mercados ineficientes
reside no fato de que um gestor pode assumir o mesmo risco que o benchmark, por
exemplo, e obter uma taxa de retorno maior. A figura 7.1 apresenta essa ideia e
retrata o “alfa” do gestor, isto é, o valor agregado por sua competência.
Figura 7.1
Este gestor realizou um bom trabalho, mas isso me parece apenas uma parte da
história — e, acredito, a parte desinteressante. Um mercado ineficiente também
permite que o investidor competente obtenha o mesmo retorno do benchmark e, ao
mesmo tempo, assuma riscos menores. Para mim, isso é uma grande conquista
(figura 7.2).
Aqui o valor agregado pelo gestor não é obtido por meio de um maior retorno em
relação a um risco determinado, mas, sim, por meio de menor risco em relação ao
retorno determinado. Isso também é um bom trabalho — talvez até melhor que o
do primeiro.
Parte disso é apenas uma questão de semântica e depende de como olhamos para
os gráficos. Não obstante, como acredito que a redução do risco fundamental pode
ser a base para uma experiência de investimento extremamente próspera, esse
conceito deveria receber mais atenção do que em geral recebe. Como poderíamos
participar do lucro total gerado pelos mercados altistas e, ao mesmo tempo, nos
posicionar para obter resultados excelentes em mercados com tendência de baixa?
Capturando um lucro superior ao do mercado e assumindo riscos menores que o do
mercado…
Figura 7.2
“RETURNS, ABSOLUTE RETURNS AND RISK” (RETORNOS, RETORNOS ABSOLUTOS E
RISCO), 13 DE JUNHO DE 2006
Agora podemos voltar aos germes que não se estabeleceram no organismo
ou talvez aos terremotos que não aconteceram. Um bom construtor é capaz de
evitar falhas em sua construção, enquanto um construtor ruim incorpora
falhas a sua construção. Pode ser difícil diferenciar um do outro enquanto não
há um terremoto.
Da mesma forma, um excelente investidor pode ser aquele que, em vez de
obter retornos maiores, consegue o mesmo retorno, porém com risco menor
(ou, até mesmo, um retorno ligeiramente menor com muito menos risco).
Quando os mercados se mantêm estáveis ou estão em crescimento, não é
possível descobrir o risco em que uma carteira incorre. É isso que está por
trás do que disse Warren Buffett sobre a maré: não há como saber quem está
nadando nu ou vestido, senão quando a maré baixa.
Obter o mesmo retorno dos investidores que correm maiores riscos e fazêlo com riscos menores é uma realização admirável. Na maioria das vezes,
entretanto, trata-se de uma realização sutil e oculta que só pode ser apreciada
por meio de julgamentos sofisticados.
Já que, em geral, há mais anos bons nos mercados do que anos ruins, e
como são necessários anos ruins para que o valor do controle de risco se
mostre evidente em termos de redução de perdas, o custo do controle de risco
— na forma de rendimentos não aproveitados — pode parecer excessivo. Nos
anos bons do mercado, os investidores que se preocupam com o risco devem
dar-se por satisfeitos, pois se beneficiaram de um sistema de controle em suas
carteiras, mesmo que este não tenha sido necessário. Eles são como donos
prudentes de imóveis que fazem seguro de sua propriedade e se sentem bem
por saber que estão protegidos… mesmo quando não é preciso acioná-lo.
Controlar o risco do portfólio é muito importante e vale a pena. Os frutos,
no entanto, surgem apenas na forma de perdas que deixam de acontecer.
Cálculos do tipo “e se…” são muito complicados em períodos de
tranquilidade.
Assumir risco de forma inconsciente pode ser um grande erro; isso, no entanto, é o
que fazem repetidamente as pessoas que compram ativos mais populares e
desejados em um determinado momento — esses investidores creem que “nada de
ruim pode acontecer”. Por outro lado, aceitar de forma inteligente o risco
reconhecido com o objetivo de se obter lucro está por trás de alguns dos
investimentos mais sábios e rentáveis — mesmo que (ou talvez devido ao fato de
que) a maioria dos investidores os descarte por considerá-los especulações
perigosas.
Ao juntar tudo, vemos que o trabalho do investidor é assumir riscos de forma
inteligente para obter lucros. Fazer isso bem é o que separa o bom investidor dos
outros.
O que significa assumir riscos de forma inteligente para obter lucros? Vejamos o
exemplo do seguro de vida: como as companhias de seguros, que estão entre as
empresas mais conservadoras da América, asseguram a vida das pessoas quando
sabem que todas elas vão morrer?
• É um risco que conhecem. Sabem que todos vão morrer, então, incluem essa
realidade em sua abordagem.
• É um risco que elas são capazes de analisar, e por isso todas contam com
médicos que avaliam a saúde dos futuros assegurados.
• É um risco que pode ser diversificado. Ao garantir uma mistura de assegurados
por idade, sexo, ocupação e localização, não estarão expostas a situações
anômalas e perdas generalizadas.
• É um risco assumido pelo qual, certamente, serão bem recompensadas. Essas
empresas estabelecem prêmios para que tenham lucro em caso de falecimento
do assegurado, de acordo com as médias de suas tabelas atuariais. E, se o
mercado de seguros for ineficiente — por exemplo, se a empresa for capaz de
vender uma apólice a uma pessoa com probabilidade de morrer aos 80 anos
cobrando um prêmio que pressupõe que ela morrerá aos 70 —, as companhias
estarão mais protegidas contra os riscos e mais bem posicionadas para a
obtenção de lucros excepcionais, se tudo ocorrer conforme o esperado.
Fazemos exatamente o mesmo em relação aos títulos de alto rendimento e em
relação a todas as outras estratégias da Oaktree. Tentamos estar cientes dos riscos;
algo essencial, pois nosso trabalho envolve muitos ativos que alguns, de maneira
simplista, chamam de “arriscados”. Empregamos profissionais altamente
qualificados, capazes de analisar investimentos e avaliar riscos. Diversificamos
nossos portfólios de forma adequada. E somente investimos quando estamos
convencidos de que o provável retorno mais do que compensará o risco assumido.
Há anos digo que os ativos de risco podem ser bons investimentos sempre que
estiverem suficientemente baratos. O elemento essencial é saber quando isso
acontece. É isso: assumir de forma inteligente o risco para a obtenção de lucros é o
melhor modo de se obter êxitos que se repetem durante um longo período.
“RISK” (RISCO), 19 DE JANEIRO DE 2006
Se, por um lado, o controle de risco é essencial, a assunção de riscos, em si,
não é nem sábia nem imprudente, mas inevitável para a maior parte das
estratégias e dos nichos de investimentos. Pode ser bem feita ou malfeita, no
momento certo ou no momento errado. Estamos no melhor dos mundos
quando somos capazes de mudar para nichos mais agressivos e manter o risco
sob controle. Há armadilhas pelo caminho, mas podemos evitá-las.
Aqueles que controlam o risco de forma cautelosa sabem que não
conhecem o futuro e compreendem que esse futuro acarreta possíveis
resultados negativos; não podem mensurar exatamente, no entanto, o quão
ruins esses resultados podem ser ou quais são as probabilidades de ocorrer.
Então, não saber o “quão ruim é ruim” apresenta-se como uma dessas
principais armadilhas; cair nela desencadeia subsequentes más decisões.
A volatilidade e as perdas extremas são raras. E à medida que o tempo passa sem
que aconteçam, começa a parecer cada vez mais provável que nunca venham a
ocorrer, levando-nos a crer que as suposições sobre o risco eram muito
conservadoras. Daí surge a tentação de relaxar as regras e aumentar a
alavancagem. E, muitas vezes, isso é feito pouco antes do surgimento do risco.
Conforme nos informa Nassim Nicholas Taleb em seu livro Iludido pelo acaso:
A realidade é muito mais cruel do que uma roleta-russa. Primeiro, ela raramente
libera a bala fatal, como um revólver cujo tambor não tivesse apenas seis
câmaras, mas centenas, e até mesmo milhares. Após algumas dezenas de
tentativas, os participantes, sob uma falsa sensação de segurança entorpecente,
se esquecem da existência de uma bala. Em segundo lugar, ao contrário de um
jogo preciso e bem definido como a roleta-russa, em que os riscos podem ser
enxergados por qualquer um capaz de multiplicar e dividir por seis, o tambor da
realidade não é algo que se possa observar. Portanto, sem perceber, podemos
estar jogando roleta-russa e chamando-a por algum nome alternativo que denote
“baixo risco”.
Imaginando que estivessem num jogo de baixo risco, as instituições financeiras,
entre 2004 e 2007, tomavam parte de um negócio de alto risco, tudo porque suas
hipóteses sobre perdas e volatilidade eram muito vagas. Estaríamos assistindo a um
filme completamente diferente se fosse dito por essas instituições: “Isso tudo talvez
seja muito arriscado. Uma vez que os preços das casas subiram tanto e o acesso ao
crédito hipotecário se tornou tão fácil e disponível, então é possível que, desta vez,
os preços dos imóveis sofram quedas generalizadas. Por isso, nossa alavancagem
não passará da metade do que nos sugere o nosso desempenho no passado.”.
É fácil dizer que suas assunções de risco deveriam ter sido mais conservadoras.
Mas quão conservadoras? Não há como administrar com base nas piores hipóteses.
Ficaríamos paralisados. E, de qualquer forma, uma “pior hipótese” é um termo
realmente equivocado; isso não existe, pois a pior hipótese é a perda de tudo.
Sabemos que os quants não deveriam ter aceitado a suposição de que os preços dos
imóveis não poderiam sofrer um declínio em todo o país. Contudo, assim que
aceitamos que esse declínio é possível, para qual extensão de queda deveremos nos
preparar (2%, 10%, 50%…)?
As manchetes [de 2008] estão repletas de companhias que perderam muito, e
talvez até quebraram, porque compraram ativos por meio de alavancagem… Esses
investidores utilizaram alavancagens que poderiam ter sido mais apropriadas para a
negociação de ativos de volatilidade moderada e esbarraram na maior volatilidade
já vista até então. É fácil dizer que cometeram um erro.
Mas seria razoável esperar que se preparassem para eventos insólitos?
Se todas as carteiras precisassem suportar quedas como as que testemunhamos
neste ano [2008], é possível que ninguém mais, nunca, viesse a utilizar a
alavancagem novamente. Será que essa é uma reação sensata? (De fato, é possível
que ninguém jamais invista nessas classes de ativos, mesmo sem alavancagem).
Em todos os aspectos de nossas vidas, embasamos nossas decisões no que achamos
que tem maior probabilidade de ocorrer. E, para tanto, essa maior probabilidade, na
maioria das vezes, tem como base os eventos regulares do passado. Esperamos que
os resultados estejam próximos da média (A) na maioria das vezes, mas sabemos
que podemos obter resultados melhores (B) ou piores (C). Mesmo que tenhamos
em mente que, de vez em quando, um resultado estará fora do alcance habitual (D),
tendemos a nos esquecer das possíveis extremidades. E, conforme exemplificado
pelos acontecimentos recentes, raramente consideramos os resultados que ocorrem
apenas uma vez por século, ou que nunca tenham acontecido (E) (figura 7.3).
Figura 7.3
Mesmo sabendo que coisas incomuns e improváveis podem acontecer, tomamos
decisões fundamentadas para que possamos agir e, conscientemente, aceitamos
esse risco quando somos bem pagos para aceitá-lo. De vez em quando surge um
“cisne negro”. Entretanto, se, no futuro, sempre disséssemos que não há
possibilidade de realizar certas ações porque o resultado poderia ser o pior de
todos, ficaríamos paralisados e nunca tomaríamos nenhuma decisão.
Então, na maioria das vezes, não temos como nos preparar para o pior. Deveria ser
suficiente estarmos precavidos para eventos que somente ocorrem uma vez a cada
geração. Mas uma geração não dura para sempre, e haverá momentos que vão
ultrapassar esse padrão. O que fazer? Pensei bastante sobre quanta atenção
devemos dedicar a um desastre improvável. Entre outras coisas, os eventos de
2007-2008 provam que não há uma resposta fácil.
“VOLATILITY + LEVERAGE = DYNAMITE” (VOLATILIDADE + ALAVANCAGEM =
DINAMITE), 17 DE DEZEMBRO DE 2008
Especialmente por causa das ideias apresentadas anteriormente neste
capítulo, devo esclarecer uma importante distinção entre controlar os riscos e
evitá-los. O controle é o melhor caminho para evitar perdas. Evitar os riscos,
por outro lado, provavelmente também nos fará evitar os retornos. De vez em
quando, ouço alguém dizer que a Oaktree deseja evitar os riscos relacionados
aos investimentos; claro que discordo totalmente dessa afirmação.
A Oaktree, obviamente, não foge dos riscos. Nós os aceitamos no momento certo,
nas situações certas e pelo preço certo. Poderíamos facilmente evitar todos os
riscos, e você também. Mas, se agíssemos assim, certamente não obteríamos
retornos acima da taxa sem riscos. Will Rogers disse que às vezes precisamos nos
arriscar em galhos mais altos, pois é ali que estão as frutas. Nenhum de nós está
neste ramo para ganhar 4%.
Assim, embora o primeiro princípio da filosofia de investimentos da Oaktree
enfatize “a importância do controle de riscos”, isso não tem nada a ver com evitálos.
É pela assunção do risco, quando somos bem pagos para fazê-lo — e
especialmente por assumir riscos a que os outros são extremamente avessos —,
que nos esforçamos para agregar valor aos nossos clientes. Quando formulado
dessa maneira, o grande papel que o risco desempenha em nosso processo se torna
óbvio.
Rick Funston, da Deloitte & Touche, diz, no artigo que motivou este memorando
(“Quando o risco corporativo se torna pessoal”, Suplemento Especial da revista
Corporate Board Member, de 2005), que “precisamos garantir que os (…) riscos e
exposições sejam compreendidos, administrados de forma adequada e mais
transparentes para todos (…) Isso não é aversão ao risco, é inteligência de risco”. É
para isso que a Oaktree se esforça todos os dias.
“RISK” (RISCO), 19 DE JANEIRO DE 2006
Investir com êxito por um longo prazo depende mais do controle de risco
do que da agressividade. Os resultados da maioria dos investidores serão
determinados, ao final de sua carreira, mais pela quantidade de seus
investimentos ruins e pelo quão ruins eles foram do que pela grandeza de
seus bons investimentos. O controle de risco competente é a marca do bom
investidor.
8
O mais importante é… estar atento aos ciclos
Devemos lembrar que quase tudo é cíclico. Mesmo tendo
algumas poucas certezas, sei que as seguintes afirmações são
verdadeiras: ao final, os ciclos sempre prevalecem. Nada
caminha para sempre em uma só direção. As árvores não
crescem até o céu. Poucas coisas chegam a zero. Quase nada é
tão perigoso para a saúde dos investidores quanto a insistência
em extrapolar os eventos atuais para o futuro.
Quanto mais tempo passo no mundo dos investimentos, mais aprecio a
natureza cíclica de tudo. Em novembro de 2001 dediquei um memorando
inteiro ao assunto. Eu o chamei de “You can’t predict. You can prepare”
(Você não pode prever. Você pode se preparar), tomando emprestado o
slogan publicitário da companhia de seguros MassMutual Life, pois concordo
plenamente com o tema abordado: não temos como saber o que ocorrerá no
futuro, mas podemos nos preparar para as eventualidades e reduzir suas
repercussões.
Nos investimentos, assim como na vida, poucas coisas são garantidas.
Valores podem evaporar, estimativas carregam a possibilidade de erro,
circunstâncias se modificam e “coisas certas” transformam-se em incertas.
No entanto, podemos confiar em dois conceitos:
• Regra número um: a maioria das coisas se comportará de maneira cíclica.
• Regra número dois: algumas das maiores situações de ganhos e perdas
ocorrem quando as pessoas se esquecem da regra número um.
Poucas coisas se movem em linha reta. Há expansão e, depois, retração.
Tudo vai bem por um tempo, e depois vai mal. A expansão pode,
inicialmente, ocorrer de forma rápida e, em seguida, desacelerar. A retração
pode surgir gradualmente e, depois, atingir seu pico. Mas o princípio
subjacente é que tudo passa por ciclos de crescimento e declínio, ascensão e
queda. Isso também vale para as economias, os mercados e as empresas:
períodos de ascensão e queda.
A razão básica para o comportamento cíclico do mundo é o envolvimento
dos humanos. As coisas mecânicas podem seguir uma linha reta, o tempo
avança de forma contínua; o mesmo pode fazer uma máquina sempre que
estiver adequadamente alimentada. Mas os processos da história e da
economia envolvem pessoas, e, quando há pessoas envolvidas, os resultados
passam a ser variáveis e cíclicos. Acredito que a principal razão para isso é
que nós, seres humanos, somos muito mais emotivos e inconsistentes do que
estáveis e analíticos.
Fatores objetivos certamente desempenham um papel importante nos
ciclos — fatores como as relações quantitativas, os eventos mundiais, as
mudanças ambientais, os progressos tecnológicos e as decisões corporativas.
No entanto, são as respostas psicológicas a esses fatores que fazem os
investidores reagirem de forma exagerada ou apática e, assim, determinam a
amplitude das flutuações cíclicas.
Quando as pessoas se sentem bem com sua situação atual e otimistas com
o futuro, seu comportamento é fortemente impactado. Elas gastam mais e
economizam menos. Tomam emprestado para aumentar seus prazeres ou seu
potencial de lucro, mesmo que isso torne sua situação financeira mais
precária (é claro, conceitos como precariedade são esquecidos em períodos de
otimismo). E se mostram dispostas a pagar mais pelo valor atual ou por uma
parte do valor futuro.
Tudo pode mudar em apenas um segundo; um dos meus cartuns favoritos
mostra um comentarista de tevê dizendo “tudo o que foi bom para o mercado
ontem não é bom para ele hoje”. Os extremos dos ciclos são, em grande
parte, resultado das emoções e fraquezas das pessoas, de sua falta de
objetividade e suas inconsistências.
Os ciclos se autocorrigem, e sua inversão não depende necessariamente de eventos
exógenos. Eles se invertem (em vez de continuarem para sempre em linha reta)
porque as tendências criam motivos para sua própria inversão. Por tudo isso, gosto
de dizer que o sucesso carrega dentro de si as sementes do fracasso, e o fracasso, as
sementes do sucesso.
“YOU CAN’T PREDICT. YOU CAN PREPARE” (VOCÊ NÃO PODE PREVER. VOCÊ PODE SE
PREPARAR), 20 DE NOVEMBRO DE 2001
O ciclo do crédito merece uma menção muito especial por sua
inevitabilidade, extrema volatilidade e capacidade de criar oportunidades para
os investidores atentos a ele. De todos os ciclos, este é o meu favorito.
Quanto mais tempo me envolvo com os investimentos, mais impressionado fico
com a força do ciclo de crédito. É preciso apenas uma pequena flutuação na
economia para produzir uma grande flutuação na disponibilidade de crédito,
gerando grande impacto nos preços dos ativos e, por fim, novamente na própria
economia.
O processo é simples:
• a economia entra em um período de prosperidade;
• os provedores de capital prosperam, aumentando sua base de capital;
• já que há poucas más notícias, os riscos associados aos empréstimos e
investimentos parecem ter diminuído;
• a aversão ao risco desaparece;
• as instituições financeiras começam a expandir seus negócios, ou seja, a
oferecer mais capital; e
• competem por fatias do mercado, reduzindo os retornos exigidos (por exemplo,
cortando as taxas de juros), reduzindo os padrões de crédito, oferecendo mais
capital para uma determinada transação e flexibilizando seus contratos.
Em seu extremo, os provedores de capital acabam financiando mutuários e projetos
que não mereceriam financiamento. Segundo um artigo publicado na revista The
Economist, “os piores empréstimos são concedidos nos melhores períodos”. Isso
leva à destruição do capital, ou seja, leva a investimentos em projetos em que o
custo do capital é maior que o retorno sobre o capital (ROIC, na sigla em inglês), e
eventualmente há casos em que não ocorre nenhum retorno de capital.
Quando atinge esse ponto, o ponto mais alto do ciclo, ocorre uma inversão do
período anteriormente descrito:
• por causa das perdas, os credores ficam desanimados e se afastam do mercado;
• a aversão ao risco aumenta e, com ela, as taxas de juros, as restrições ao
crédito e as exigências contratuais;
• há menos capital disponível — e na parte mais baixa do ciclo, quando houver
crédito, estará disponível apenas para os mutuários mais qualificados;
• as empresas não conseguem obter financiamento. Os mutuários não
conseguem estender o prazo de pagamento de suas dívidas, levando a
inadimplências e falências; e
• esse processo contribui e reforça a contração econômica.
É claro que, em última análise, o processo está pronto para sofrer uma nova
inversão. Tendo em vista a pouca concorrência para se conceder empréstimos ou
realizar investimentos, é possível se exigir rendimentos mais altos com uma alta
qualidade creditícia. Os investidores com visão contrária que comprometem seu
capital neste momento têm uma boa chance de obter retornos altos, e esses
tentadores rendimentos potenciais começam a atrair mais capital. Dessa forma,
uma recuperação começa a se configurar.
Afirmei anteriormente que os ciclos se autocorrigem. O ciclo de crédito se corrige
por meio dos processos descritos anteriormente e representa um dos fatores que
orientam as flutuações do ciclo econômico. A prosperidade traz uma expansão dos
empréstimos, o que leva a empréstimos imprudentes que geram grandes perdas,
que, por sua vez, fazem com que credores parem de emprestar, o que acaba com o
período de prosperidade… e assim por diante.
Na próxima crise, olhe ao seu redor; você provavelmente encontrará alguém
disposto a emprestar. Os provedores de capital extremamente permissivos
costumam ajudar e instigar as bolhas financeiras. Há inúmeros exemplos recentes
em que o crédito fácil contribuiu para crescimentos econômicos seguidos de crises
famosas: crise dos imóveis entre 1989 e 1992; dos mercados emergentes entre
1994 e 1998; da gestão de capital de longo prazo em 1998; da indústria
cinematográfica em 1999-2000; dos fundos de venture capital e empresas de
telecomunicações entre 2000 e 2001. Em cada uma delas, credores e investidores
ofereceram muito dinheiro barato, resultando em crescimento excessivo e perdas
dramáticas. No filme Campo dos sonhos, dizem a Ray Kinsella, personagem de
Kevin Costner: “se você o construir, eles virão”. No mundo financeiro, quando
alguém oferece dinheiro barato, as pessoas tomarão emprestado, comprarão e
construirão, muitas vezes de forma indisciplinada e com consequências muito
negativas.
“YOU CAN’T PREDICT. YOU CAN PREPARE” (VOCÊ NÃO PODE PREVER. VOCÊ PODE SE
PREPARAR), 20 DE NOVEMBRO DE 2001
Note que esse memorando, escrito há quase dez anos, descreve
perfeitamente o processo de surgimento da crise financeira de 2007-2008.
Não foi nenhuma capacidade de prever o futuro que me permitiu escrever o
texto, foi apenas a familiaridade com um ciclo subjacente interminável.
Os ciclos nunca deixarão de ocorrer. Se existisse um mercado completamente
eficiente, e se as pessoas realmente tomassem decisões de forma racional e
não movidas pelas emoções, talvez os ciclos (ou pelo menos seus extremos)
deixassem de existir. Mas isso nunca acontecerá.
As economias verão períodos de crescimento e de declínio à medida que
os consumidores aumentam ou diminuem seus gastos, respondendo
emocionalmente a fatores econômicos ou eventos exógenos, geopolíticos ou
de ocorrência natural. As empresas continuarão esperando por um futuro
brilhante durante o ciclo de expansão e, por isso, ampliarão instalações e
estoques de maneira excessiva, o que se tornará oneroso quando a economia
entrar em declínio. Os provedores de capital serão muito generosos quando a
economia estiver indo bem, apoiando a superexpansão com dinheiro barato,
e, então, eles puxarão as rédeas com força quando o cenário deixar de parecer
tão positivo. Os investidores supervalorizarão as empresas quando elas
estiverem indo bem e as subvalorizarão quando as coisas ficarem difíceis.
E, ainda assim, a cada década, mais ou menos, as pessoas dirão que os
ciclos acabaram. Ou elas acreditam que os períodos bons nunca terão fim ou
que as tendências negativas não podem ser controladas. Nesses momentos,
elas falam sobre “ciclos virtuosos” ou “ciclos viciosos” que se
retroalimentam e continuam para sempre em uma direção ou outra.
Caso em questão: no dia 15 de novembro de 1996, The Wall Street
Journal publicou uma reportagem sobre um tema que vinha se transformando
em consenso. Segundo o jornal, havia uma concordância geral de que os
grandes ciclos econômicos negativos haviam chegado ao fim. Alguém se
lembra de um ambiente econômico estável e sem ciclos desde então? O que
explicaria a crise de 1998, a recessão de 2002 e a crise financeira de 2008 —
a pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial?
A crença de que os ciclos acabaram exemplifica uma maneira de pensar
com base na premissa perigosa de que “desta vez é diferente”. Essas quatro
palavras devem amedrontar (talvez sugerir uma oportunidade de lucro) quem
entende o passado e sabe que ele se repete. Assim, é muito importante que
consigamos reconhecer esse tipo de erro sempre que ele surgir.
Um dos meus livros favoritos é um pequeno volume, publicado em 1932 e
intitulado Oh Yeah?, uma compilação da sabedoria de empresários e líderes
políticos antes da crise de 1929. Parece que, mesmo naquela época, os
especialistas previam uma economia sem ciclos:
• Nossa prosperidade atual não será interrompida (Myron E. Forbes,
presidente da Pierce Arrow Motor Car Company, 1o de janeiro de 1928).
• Não posso deixar de levantar uma voz dissidente às afirmações de que… a
prosperidade neste país vai necessariamente diminuir e recuar no futuro.
(E.H.H. Simmons, presidente da Bolsa de Valores de Nova York, 12 de
janeiro de 1928).
• Estamos apenas no início de um período que entrará para a história como
a era de ouro (Irving T. Bush, presidente da Bush Terminal Company, 15
de novembro de 1928).
• Os fundamentos econômicos do país (…) têm uma base sólida e próspera.
(presidente Herbert Hoover, 25 de outubro de 1929)
De vez em quando, há um longo e/ou extremo período de alta ou de baixa, e as
pessoas começam a dizer “desta vez é diferente”. Elas citam as mudanças
geopolíticas, institucionais, tecnológicas ou comportamentais que tornaram
obsoletas as “velhas regras”; tomam decisões de investimento que extrapolam a
tendência recente. E, então, acontece que as regras antigas ainda são válidas, e o
ciclo recomeça. No final, as árvores não crescem até o céu, e poucas coisas chegam
a zero. Em vez disso, a maioria dos fenômenos acaba se revelando cíclica.
“YOU CAN’T PREDICT. YOU CAN PREPARE” (VOCÊ NÃO PODE PREVER. VOCÊ PODE SE
PREPARAR), 20 DE NOVEMBRO DE 2001
Nossa conclusão é que, na maioria das vezes, o futuro se parecerá muito com o
passado e terá ciclos de alta e de baixa. Há um momento certo para afirmar que as
coisas serão melhores; isso ocorre quando o mercado está em baixa e todos estão
vendendo a preços baixíssimos. Entretanto, quando o mercado está em níveis
recordes, é perigoso tentar impor uma racionalização positiva que, no passado,
nunca se mostrou verdadeira. Mas isso já foi feito antes e será feito de novo.
“WILL IT BE DIFFERENT THIS TIME?” (SERÁ QUE VAI SER DIFERENTE DESTA VEZ?), 25
DE NOVEMBRO DE 1996
Ignorar ciclos e extrapolar tendências é uma das coisas mais perigosas que
um investidor pode fazer. As pessoas geralmente agem como se as empresas
que estão bem hoje fossem continuar assim para sempre e como se os
investimentos que hoje são bons fossem permanecer bons, e vice-versa. Em
vez disso, o oposto é o que tem mais probabilidade de ser verdade.
Quando os investidores novatos veem esse fenômeno ocorrer pela
primeira vez, é compreensível que aceitem que algo que nunca tenha
acontecido antes — a cessação dos ciclos — possa acontecer. Entretanto,
quando testemunham isso pela segunda ou terceira vez, esses investidores,
agora experientes, deveriam perceber que os ciclos nunca deixarão de existir
e transformar esse entendimento em uma vantagem.
Da próxima vez que você for abordado por alguém com uma proposta de
investimentos com base na previsão de que os ciclos vão deixar de ocorrer,
lembre-se de que essa é, invariavelmente, uma aposta perdida.
9
O mais importante é… estar ciente do pêndulo
Quando tudo vai bem e os preços estão altos, os investidores
correm para comprar, deixando de lado toda a prudência. Então,
quando há caos por toda parte e os ativos estão expostos no
balcão da pechincha, eles perdem toda a vontade de assumir
riscos e correm para vender. E sempre será assim.
O segundo memorando que escrevi, em 1991, foi dedicado quase
inteiramente a um assunto sobre o qual, ao longo dos anos, passei a pensar
cada vez mais: a oscilação pendular das posturas e dos comportamentos dos
investidores.
As mudanças de humor dos mercados de valores mobiliários se assemelham ao
movimento de um pêndulo. Embora o ponto médio do arco seja o que melhor
descreva a localização do pêndulo “em média”, ele realmente passa muito pouco
tempo nesse ponto. Em vez disso, está quase sempre oscilando entre os extremos
de seu arco. No entanto, sempre que o pêndulo está perto de uma das extremidades,
mais cedo ou mais tarde, volta inevitavelmente para o ponto médio. Na verdade, é
o movimento em direção a um extremo em si que fornece energia para que oscile
até o outro extremo.
Os mercados de investimento oscilam de forma similar a um pêndulo:
• entre a euforia e a depressão;
• entre a celebração dos acontecimentos positivos e a obsessão pelos negativos;
e, assim,
• entre a sobrevalorização e a subvalorização.
Essa oscilação é uma das características mais confiáveis do mundo dos
investimentos, e os fatores psicológicos dos investidores parecem levá-los a passar
muito mais tempo nos extremos do que em um “bom meio-termo”.
“FIRST QUARTER PERFORMANCE” (DESEMPENHO DO PRIMEIRO TRIMESTRE), 11 DE
ABRIL DE 1991
Treze anos depois, em outro memorando, revisitei longamente o assunto
do pêndulo. Nele, observei que, além dos elementos mencionados
anteriormente, o pêndulo também oscila entre a ganância e o medo; entre a
disposição para enxergar os fatos através de um filtro otimista ou pessimista;
em direção à fé em acontecimentos que estão por vir; entre a credulidade e o
ceticismo; e entre a tolerância e a aversão ao risco.
Esta última oscilação (posturas relacionadas ao risco) é uma característica
comum de muitas flutuações do mercado.
A aversão ao risco é o principal ingrediente de um mercado racional,
como eu já disse anteriormente, e a posição do pêndulo em relação a ela é
particularmente importante. Uma aversão inadequada ao risco é um dos
principais fatores dos excessos do mercado e posteriores bolhas e crises. É
uma simplificação excessiva — mas não grave — dizer que a pouca aversão
ao risco constitui a característica inevitável das bolhas. Nas crises, por outro
lado, os investidores estão demasiadamente temerosos. A aversão excessiva
ao risco os impede de comprar, até mesmo quando os preços não incorporam
nenhum otimismo (apenas o pessimismo) e quando as avaliações estão
absurdamente baixas.
Em minha opinião, o ciclo ganância-medo é causado pela mudança de postura em
relação ao risco. Quando a ganância é predominante, isso significa que os
investidores se sentem extremamente confortáveis com o risco e com a ideia de
assumi-lo para obter maiores lucros. Por outro lado, o medo generalizado indica
um alto grau de aversão ao risco. Os acadêmicos veem as posturas dos investidores
em relação a situações arriscadas como uma constante, mas certamente ela tem
uma grande variabilidade. A teoria das finanças depende fortemente da suposição
de que os investidores são avessos ao risco. Ou seja, eles não preferem o risco, e
devem ser induzidos — coagidos — a assumi-lo pela promessa de retornos
almejados mais elevados.
Obter retornos muito altos de investimentos arriscados é um oximoro. Mas há
momentos em que essa ressalva é ignorada: quando as pessoas estão muito
confortáveis com o risco e, portanto, quando os preços dos ativos incorporam um
prêmio inadequado para compensar o risco que os investidores estão assumindo…
Quando os investidores em geral estão muito tolerantes ao risco, os preços dos
ativos podem incorporar mais risco do que retornos. Quando os investidores estão
muito avessos ao risco, os preços podem oferecer mais retornos do que risco.
“THE HAPPY MEDIUM” (O BOM MEIO-TERMO), 21 DE JULHO DE 2004
O balanço pendular em relação às posturas tomadas acerca do risco é um
dos mais poderosos. Por isso, recentemente, limitei a dois os principais riscos
de se investir: o risco de perder dinheiro e o risco de perder oportunidades. É
possível eliminar qualquer um deles quase inteiramente, mas não ambos. Em
um mundo ideal, os investidores conciliam essas duas preocupações. Mas, de
tempos em tempos, nos pontos extremos da oscilação do pêndulo, um deles
acaba predominando. Por exemplo:
• Em 2005, 2006 e início de 2007, com as coisas indo tão bem e o mercado
de capitais bastante aberto, poucas pessoas imaginaram que haveria perdas
logo à frente. Muitos acreditavam que não havia mais risco. Sua única
preocupação era perder uma oportunidade; se Wall Street inventasse
algum novo milagre financeiro e outros investidores o comprassem (e,
ainda, se o milagre funcionasse), acabariam parecendo muito
conservadores e perderiam terreno. Como não estavam preocupados em
perder dinheiro, não insistiram em preços baixos, prêmios de risco
adequados ou proteção ao investidor. Em suma, eles se comportaram de
forma extremamente agressiva.
• Então, no final de 2007 e em 2008, em meio à crise de crédito, as pessoas
começaram a temer um colapso completo do sistema financeiro mundial.
Ninguém mais se preocupava com perder oportunidades; o pêndulo havia
oscilado para um ponto em que as pessoas só conseguiam se preocupar
com a perda; por isso, passaram a fugir de qualquer coisa que tivesse o
mínimo cintilar de risco (independentemente do rendimento potencial) e
buscaram a segurança dos títulos públicos, com rendimentos próximos a
zero. Nesse ponto, então, os investidores ficaram extremamente
temerosos, vendiam rapidamente e criavam carteiras muito defensivas.
Assim, os últimos anos nos ofereceram uma oportunidade
extraordinariamente clara de testemunhar a oscilação do pêndulo… e ver
como a maioria das pessoas faz, de forma consistente, a coisa errada na hora
errada. Quando tudo vai bem, e os preços estão altos, os investidores correm
para comprar, deixando de lado toda a prudência. Então, quando há caos por
toda parte e os ativos estão expostos no balcão da pechincha, eles perdem
toda a vontade de assumir riscos e correm para vender. E sempre será assim.
Bem no início da minha carreira, um investidor veterano me contou sobre as
três etapas de um mercado com tendência altista. Agora vou compartilhá-las:
• primeira, quando algumas pessoas com visão prospectiva começam a
acreditar que as coisas serão melhores;
• segunda, quando a maioria dos investidores percebe que a melhora está
realmente acontecendo; e
• terceira, quando todos concluem que as coisas serão sempre melhores.
Por que perder tempo em busca de uma descrição melhor? O texto a
seguir explica. É importante que entendamos seu significado.
O mercado tem mente própria, e as mudanças dos parâmetros de valoração de
ativos, causadas principalmente pelas mudanças psicológicas dos investidores (não
mudanças nos fundamentos), respondem pela maior parte das mudanças de curto
prazo nos preços dos ativos. Esses fatores psicológicos também oscilam como um
pêndulo.
Ações são mais baratas quando tudo parece sombrio. O cenário deprimente as
mantém baratas, e apenas alguns caçadores de pechinchas, astutos e corajosos,
estão dispostos a assumir novos posicionamentos. Talvez por atraírem alguma
atenção ao serem compradas ou talvez porque o cenário tenha se tornado um pouco
menos deprimente (por uma razão ou outra), o mercado começa a subir.
Depois de um tempo, o cenário começa a parecer um pouco menos pessimista. As
pessoas começam a perceber melhorias e deixam de precisar de muitas desculpas
para voltar a comprar. É claro que, assim que a economia e o mercado saem da
crise, passam a pagar preços que refletem mais os valores justos das ações.
E, no tempo devido, a tontice volta ao mercado. Encorajadas pela melhora dos
resultados econômicos e corporativos, as pessoas veem-se dispostas a extrapolar
isso. As massas ficam animadas (e invejosas) com os lucros obtidos pelos
investidores que chegaram mais cedo ao mercado e querem participar. Além disso,
ignoram a natureza cíclica das coisas e concluem que os lucros continuarão a
existir para sempre. É por isso que eu amo o velho ditado “tudo que o sábio faz no
início o tolo faz no final”. Há algo mais importante: nos estágios finais dos grandes
mercados altistas, as pessoas estão dispostas a pagar preços altos pelas ações,
presumindo que esse período bom se manterá assim para sempre.
“YOU CAN’T PREDICT. YOU CAN PREPARE” (VOCÊ NÃO PODE PREVER. VOCÊ PODE SE
PREPARAR), 20 DE NOVEMBRO DE 2001
Trinta e cinco anos depois de eu ter aprendido sobre as etapas de um
mercado com tendência altista, depois que as fraquezas das hipotecas
subprime (e seus detentores) foram expostas, e enquanto as pessoas estavam
preocupadas com uma crise mundial pelo contágio, resolvi descrever o outro
lado da moeda, isto é, as três etapas de um mercado com tendência baixista:
• primeira, quando apenas alguns investidores sensatos reconhecem que, apesar
da alta predominante, as coisas não continuarão boas para sempre;
• segunda, quando a maioria dos investidores reconhece que as coisas estão se
deteriorando; e
• terceira, quando todos estão convencidos de que as coisas só podem piorar.
Estamos certamente na segunda etapa dessas três. Houve muitas más notícias e
baixas. As pessoas vêm reconhecendo cada vez mais os perigos inerentes a coisas
como inovação, alavancagem, derivativos, risco de contrapartida e contabilidade
de marcação a mercado (em inglês, mark-to-market). Além disso, os problemas
parecem cada vez mais insolúveis.
Um dia desses, porém, chegaremos à terceira etapa e as pessoas desistirão de
buscar uma solução. E a menos que o mundo financeiro realmente acabe, é
provável que encontremos as melhores oportunidades de investimento de nossa
vida. As maiores baixas ocorrem quando todos se esquecem de que a maré também
volta a subir. Vivemos para esses momentos.
“THE TIDE GOES OUT” (CHEGA A MARÉ BAIXA), 18 DE MARÇO DE 2008
Apenas seis meses depois de eu ter escrito esse texto, os acontecimentos já
tinham nos levado à terceira etapa. Naquele momento, considerava-se
possível um colapso total do sistema financeiro mundial; na verdade, os
primeiros passos já haviam ocorrido — a falência do Lehman Brothers e a
absorção ou resgate de Bear Stearns, Merrill Lynch, AIG, Fannie Mae,
Freddie Mac, Wachovia e WaMu. Como essa havia sido a maior crise de
todos os tempos, os investidores, mais do que nunca, aderiram à terceira
etapa, durante a qual “todos estão convencidos de que as coisas só podem
piorar”. Assim, em muitas classes de ativos, os eventos determinados pela
oscilação do pêndulo, a saber, o declínio dos preços em 2008, as
oportunidades de investimentos no ponto mais baixo e os lucros em 2009,
foram os maiores que eu já vi.
A importância de tudo isso está na oportunidade que oferece àqueles que
entendem os acontecimentos e enxergam suas implicações. Em um extremo
do pêndulo — o período mais sombrio —, é preciso ter habilidade analítica,
objetividade, determinação e até mesmo imaginação para acreditar que as
coisas serão melhores. Poucos, os que possuem essas qualidades, conseguem
obter lucros incomuns e com baixo risco. No outro extremo, entretanto, em
que todos fazem suas suposições e levam os preços a níveis impossíveis —
melhorias eternas —, fica estabelecido o cenário das perdas dolorosas.
Tudo acontece em conjunto. Nada disso é um evento isolado ou uma
ocorrência casual. Todos são, na verdade, elementos de um padrão recorrente
que pode ser entendido e aproveitado.
A oscilação pendular do investidor é muito semelhante à flutuação de altas e
baixas dos ciclos econômicos e de mercado descritos no capítulo 8. Por
alguma razão, eu me encontro fazendo uma distinção entre as duas e falando
delas em termos diferentes, mas ambas são altamente importantes, e as
principais lições das duas são as mesmas. Com a vantagem dos quase vinte
anos de experiência que se passaram desde que escrevi o primeiro
memorando sobre o pêndulo, em 1991, reformularei suas principais
observações:
• Em teoria, no que diz respeito a polaridades, como medo e ganância, o
pêndulo deveria permanecer mais tempo em um ponto médio entre os
extremos. Mas não permanece ali por muito tempo.
• Principalmente por causa da forma como funcionam os fatores
psicológicos dos investidores, geralmente o pêndulo está oscilando em
direção a uma de suas extremidades ou saindo delas.
• O pêndulo não pode continuar a movimentar-se em direção a um único
extremo, ou nele permanecerá para sempre (ainda que as pessoas
costumem descrever o ponto máximo do pêndulo como uma condição
permanente).
• Semelhante a um pêndulo, a oscilação emocional dos investidores em
direção a uma das extremidades leva a um acúmulo de energia que, ao
final, contribuirá para que o pêndulo se dirija à outra extremidade. Às
vezes, a energia acumulada é em si a causa da mudança de direção, ou
seja, a oscilação do pêndulo em direção a um extremo é corrigida por seu
próprio peso.
• O movimento de volta é geralmente mais rápido — e, portanto, leva muito
menos tempo — do que as oscilações que levam o pêndulo até a
extremidade. (Ou, como costuma dizer meu sócio Sheldon Stone, “o ar sai
do balão muito mais rápido do que entrou”.)
A ocorrência desse padrão similar a um pêndulo é extremamente confiável
na maioria dos fenômenos de mercado. Contudo, assim como ocorre na
oscilação dos ciclos, nunca temos conhecimento sobre:
• qual será o ponto máximo do arco de oscilação do pêndulo;
• o que pode fazer com que o movimento até uma extremidade pare e mude
sua direção;
• em que momento ocorrerá a reversão; ou
• qual será seu ponto máximo na direção oposta.
Para que uma fase de tendência altista (…) ocorra, o ambiente deve ter como
características a ganância, o otimismo, a exuberância, a confiança, a credulidade, a
ousadia, a tolerância ao risco e a agressividade. Mas essas características não
governarão um mercado para sempre. Chegará um momento em que serão
substituídas por medo, pessimismo, prudência, incerteza, ceticismo, cautela,
aversão ao risco e reticência… As crises são produto dos booms, e estou
convencido de que é geralmente mais correto atribuir uma crise aos excessos do
boom do que ao evento específico que desencadeia a correção do curso.
“NOW WHAT?” (E AGORA?), 10 DE JANEIRO DE 2008
Podemos ter certeza de poucas coisas, esta é uma delas: o comportamento
extremo do mercado será revertido. Aqueles que acreditam que o pêndulo se
manterá para sempre em uma mesma direção — ou permanecerá em uma das
extremidades indefinidamente — perderão grandes somas em um momento
ou em outro. Aqueles que entendem o comportamento pendular poderão
obter enormes benefícios.
10
O mais importante é… combater as influências
negativas
O querer mais, o medo de perder oportunidades, a tendência de
se comparar com os outros, a influência da multidão e o sonho
da garantia de certeza são fatores quase universais. Assim,
causam um profundo impacto coletivo na maioria dos
investidores e dos mercados. O resultado são os erros, e estes
são frequentes, generalizados e recorrentes.
As ineficiências (precificações erradas, percepções erradas, erros que outras
pessoas cometem) oferecem oportunidades potenciais para a obtenção de
maiores lucros. Explorá-las é, de fato, o único caminho para a obtenção
consistente de lucros acima da média. Para se distinguir dos outros, é preciso
tomar proveito desses erros.
Por que os erros ocorrem? Porque investir é uma ação empreendida por seres
humanos, e a maioria deles está à mercê de suas estruturas mentais e
emocionais. Muitas pessoas têm inteligência necessária para analisar dados,
mas poucas conseguem observar e resistir à poderosa influência dos fatores
psicológicos. Para dizer isso de outra forma, muitas chegarão a conclusões
cognitivas semelhantes a partir de suas análises, porém o que fazem com
essas conclusões varia profundamente, porque os fatores psicológicos as
afetam de diferentes formas. Em termos de investimentos, os maiores erros
não têm origem em fatores ligados à informação ou à análise, mas em fatores
psicológicos. Os aspectos psicológicos dos investidores, que vamos examinar
neste capítulo, incluem muitos elementos distintos; entretanto, o ponto mais
importante é lembrar que eles costumam resultar em decisões incorretas.
Podemos acomodar grande parte disso sob um único cabeçalho: natureza
humana.
A primeira emoção que mina os esforços dos investidores é o desejo por
dinheiro, especialmente quando se transforma em ganância.
A maioria das pessoas investe para ganhar dinheiro. (Embora algumas
pessoas participem do mercado como um exercício intelectual ou por este ser
um bom campo para dar vazão à sua competitividade, elas também verificam
seu êxito em termos financeiros. É possível que o dinheiro em si não seja o
objetivo de todas as pessoas, mas essa é a unidade de medida de todos. Em
geral, quem não se importa com dinheiro não investe.)
Não há nada de errado em tentar ganhar dinheiro. De fato, o desejo de
lucro é um dos elementos mais importantes no funcionamento do mercado e
da economia global. O perigo ocorre quando se transforma em ganância,
termo definido pelo dicionário Merriam-Webster como “avidez desordenada
ou desmedida e geralmente repreensível, especialmente por riqueza ou
lucro”.
A ganância é uma força extremamente poderosa. Tem força suficiente
para superar o senso comum, a aversão ao risco, a prudência, a cautela, a
lógica, a memória de dolorosas lições do passado, a determinação, o medo e
todos os outros elementos que manteriam os investidores longe de problemas.
Em vez disso, de tempos em tempos a ganância leva os investidores a lançarse à sorte junto com a multidão em busca do lucro; contudo, acabam pagando
o preço ao final.
Ganância e otimismo, juntos, levam o investidor a buscar estratégias que, pensa,
produzirão altos retornos com baixo risco; a pagar preços elevados por ativos que
estão na moda; e a segurar ativos mesmo depois de terem se tornado extremamente
caros, esperando que ainda recebam alguma valorização. Mais tarde, o olhar
retrospectivo mostrará a todos o que deu errado: as expectativas eram irrealistas e
os riscos foram ignorados.
“HINDSIGHT FIRST, PLEASE (OR, WHAT WERE THEY THINKING?)” [RETROSPECTIVA
PRIMEIRO, POR FAVOR (OU, EM QUE ESTAVAM PENSANDO?)], 17 DE OUTUBRO DE 2005
A contrapartida da ganância é o medo — o segundo fator psicológico que
devemos considerar. No mundo dos investimentos, o termo não significa
aversão lógica e sensata ao risco. O medo — assim como a ganância —
conota o excesso. Medo, então, é algo mais parecido com o pânico, uma
preocupação excessiva que impede os investidores de tomar decisões
construtivas no momento certo.
Muitas vezes, ao longo de minha carreira, fiquei impressionado com a
facilidade que as pessoas têm de, por vontade própria, suspender as regras da
realidade. Assim, o terceiro fator que gostaria de discutir se refere à tendência
das pessoas a descartar a lógica, a história e os modelos tradicionalmente
estabelecidos. Por meio dessa tendência, aceitam propostas improváveis para
torná-las ricas que não fazem nenhum sentido. Charlie Munger me ofereceu
uma bela citação de Demóstenes sobre o tema: “Nada é mais fácil do que se
iludir, pois as pessoas acreditam que aquilo que desejam seja também
verdadeiro”. A crença de que algumas restrições fundamentais não são mais
válidas — e, portanto, que as noções históricas relativas a valor justo não
importam mais — está invariavelmente no centro de todas as bolhas e,
consequentemente, das crises.
Na ficção, a suspensão das regras da realidade nos oferece maior diversão. Quando
assistimos a Peter Pan, não queremos ouvir a pessoa sentada ao nosso lado dizer
que consegue ver os fios que suspendem os personagens no ar (mesmo sabendo
que há realmente fios). Embora saibamos que os garotos não podem voar, não nos
importamos com isso. Estamos ali pela diversão.
Porém vemos os investimentos como algo sério, não como diversão, e devemos
estar constantemente atentos a coisas que não podem realmente ocorrer. Em suma,
o processo de investimento requer uma forte dose de realidade… O ceticismo
inadequado contribui para perdas em investimentos. Com muita frequência, as
autópsias dos desastres financeiros incluem duas frases clássicas: “Era bom demais
para ser verdade!” e “Em que estavam pensando?”.
“HINDSIGHT FIRST, PLEASE (OR, WHAT WERE THEY THINKING?)” [RETROSPECTIVA
PRIMEIRO, POR FAVOR (OU, EM QUE ESTAVAM PENSANDO?)], 17 DE OUTUBRO DE 2005
O que faz os investidores caírem nessas ilusões? A resposta costuma estar
na facilidade com que — geralmente a serviço da ganância — descartam ou
ignoram as lições do passado. A “extrema brevidade da memória financeira”,
nas belíssimas palavras de John Kenneth Galbraith, impede que os
participantes do mercado reconheçam a natureza recorrente desses padrões e,
portanto, sua inevitabilidade:
Quando as mesmas circunstâncias ou outras extremamente semelhantes ocorrem
novamente, às vezes, apenas alguns anos depois, já são saudadas por uma nova
geração, geralmente jovem e extremamente autoconfiante, como uma descoberta
brilhante e inovadora do mundo financeiro e econômico. Há poucas áreas do
esforço humano em que a história vale tão pouco quanto no mundo das finanças. A
experiência do passado, na medida em que faz parte da memória, é descartada
como o refúgio primitivo daqueles que não têm a visão de apreciar as incríveis
maravilhas do presente. (John Kenneth Galbraith. A Short History of Financial
Euphoria. New York: Viking, 1990)1
Vale a pena discutirmos mais sobre o investimento infalível que, segundo
se acredita, produzirá altos retornos sem nenhum risco: a coisa certa ou
almoço grátis.
Quando um mercado, um indivíduo ou uma técnica de investimento produz
retornos impressionantes durante certo tempo, geralmente atraem devoção
excessiva (e inquestionável). Eu chamo essa solução do momento de “bala de
prata”.
Os investidores estão sempre procurando por ela. Independentemente do nome,
seja Santo Graal ou almoço grátis, todos querem a fórmula da riqueza sem risco.
Poucos questionam se isso é algo possível e, se for, porque estaria disponível para
elas. Em essência, a esperança é a última que morre.
Mas a bala de prata não existe. Nenhuma estratégia é capaz de produzir altas taxas
de retorno sem risco. E ninguém tem todas as respostas; somos humanos. Os
mercados são altamente dinâmicos e, entre outras coisas, costumam funcionar de
modo a descartar as oportunidades de lucros incomuns. A crença ilusória de que a
bala de prata está ao alcance das mãos acaba penalizando todo o nosso capital.
“THE REALIST’S CREED” (O CREDO REALISTA), 31 DE MAIO DE 2002
O que nos faz acreditar em balas de prata? Em primeiro lugar, geralmente
há uma ponta de verdade. É contada por meio de uma história com aparência
de teoria inteligente; seus adeptos, em cima de palanques improvisados,
espalham a ideia, tentando convencer os outros. Então, durante certo tempo,
gera lucros, seja por mérito próprio, seja porque as compras dos novos
convertidos elevaram o preço do ativo. Por fim, a aparência de que (a) há um
atalho certo para ficar rico, e (b) está funcionando, transforma a “bala” em
uma moda. Como disse Warren Buffett ao Congresso em 2 de junho de 2010:
“Os preços crescentes são um narcótico que afeta o poder de raciocínio de
todos”. Mas, depois de já ter ocorrido — depois de ter estourado —, uma
moda passa a ser chamada de bolha.
O quarto fator psicológico que contribui para que o investidor cometa
erros é a tendência a se conformar com a visão do rebanho, em vez de
resistir, mesmo quando essa visão é claramente absurda. Em How markets
fail (Como os mercados quebram), John Cassidy descreve experimentos
clássicos de psicologia conduzidos na década de 1950 por Solomon Asch na
Faculdade de Psicologia da Swarthmore College. Asch pediu às pessoas dos
grupos participantes da pesquisa que fizessem julgamentos sobre peças
visuais; todos os “participantes”, exceto um em cada grupo, eram associados
ao pesquisador. Os associados produziam erros intencionais, cujo impacto
sobre o único participante real era dramático. Cassidy explica, “essa
configuração colocou o participante real em uma posição embaraçosa;
[conforme disse Asch], ‘carregamos seus ombros com duas forças opostas: a
evidência de seus sentidos e a opinião unânime de seus pares’”.
Uma grande porcentagem dos participantes reais ignorou o que viu e ficou
do lado dos outros membros do grupo, embora estivessem obviamente
errados. Isso indica a influência da multidão e, portanto, sugere reservas
sobre a validade das decisões do consenso.
“Assim como os participantes dos experimentos visuais de Solomon Asch
na década de 1950”, escreve Cassidy, “muitas pessoas que não compartilham
a visão consensual do mercado começam a sentir-se como párias. Por fim, há
um momento em que as pessoas que aparentam estar loucas são aquelas que
não estão no mercado”.
Com muita frequência, a combinação entre a pressão para se conformar e
o desejo de enriquecer faz com que as pessoas abandonem sua independência
e o ceticismo e superem a aversão inata ao risco; as pessoas passam a
acreditar em coisas que não fazem sentido. Esse comportamento ocorre de
forma tão regular que não acredito que seja algo aleatório; é possível que
exista uma causa distinta por trás disso.
A quinta influência psicológica é a inveja. Por mais negativa que seja a
força da ganância, estimulando as pessoas a querer sempre mais, o impacto é
ainda mais forte quando elas se comparam às outras. Esse é um dos aspectos
mais nocivos do que chamamos de natureza humana.
Pessoas que, sozinhas, são perfeitamente felizes com sua sorte podem se
tornar melancólicas ao encontrar outras em situação melhor que a delas. No
caso dos investimentos, a maioria acha terrivelmente difícil ficar sentada e
apenas assistir aos outros ganhando mais dinheiro.
Conheço uma instituição sem fins lucrativos cujos fundos tiveram lucros
de 16% ao ano de junho de 1994 a junho de 1999, mas havia desânimo, pois
seus pares conseguiram obter uma média de 23%. Por não possuir ações de
crescimento, ações de tecnologia, aquisições do tipo buyout nem venture
capital, o fundo não manteve o mesmo passo de seus pares por meia década.
As ações de tecnologia, entretanto, entraram em colapso e, de junho de 2000
a junho de 2003, a instituição ganhou 3% ao ano, enquanto a maioria das
outras instituições sofria perdas. Os stakeholders ficaram entusiasmados.
Há algo errado aqui. Como as pessoas podem ser infelizes lucrando 16%
ao ano e felizes ganhando 3%? A resposta está na tendência de nos
compararmos aos outros e no impacto deletério que isso pode ter no que
deveria ser um processo construtivo e analítico.
A sexta grande influência é o ego. Talvez seja extremamente desafiador
manter-se objetivo e calculista diante de fatos como estes:
• os resultados dos investimentos são avaliados e comparados a curto prazo;
• em geral, tomar a decisão incorreta, ou mesmo imprudente, de assumir
riscos maiores resulta nos melhores retornos nos períodos bons (sabendose que a maioria dos períodos é composta de períodos bons); e
• os melhores retornos trazem as maiores recompensas para o ego —
quando tudo vai bem, é muito agradável se sentir inteligente e notar outras
pessoas concordando com isso.
Em contraste, os investidores sensatos podem trabalhar na obscuridade,
obtendo lucros sólidos nos períodos bons e perdendo menos do que outros
nos ruins. Evitam compartilhar o comportamento mais arriscado porque estão
cientes do quanto não sabem e porque mantêm seus egos sob controle. Essa,
como vejo, é a melhor fórmula para a criação de riqueza a longo prazo —
contudo, não oferece grandes gratificações ao ego em um prazo curto. Não é
muito glamoroso seguir um caminho que enfatize a humildade, a prudência e
o controle de riscos. Embora os investimentos e o glamour não devessem
andar de mãos dadas, isso é o que muitas vezes acontece.
Finalmente, quero mencionar um fenômeno que chamo de capitulação,
uma característica comum do comportamento dos investidores no final dos
ciclos. Esses investidores mantêm suas convicções o máximo que podem,
mas, quando as pressões econômicas e psicológicas se tornam irresistíveis,
eles se rendem e se juntam aos outros.
Em geral, as pessoas que escolhem trabalhar com investimentos são
inteligentes, bem-educadas, bem informadas e dominam conhecimentos
matemáticos. Elas conhecem as nuances dos negócios e da economia e
entendem as teorias complexas. Muitas são capazes de chegar a conclusões
razoáveis sobre valores e perspectivas.
Mas então a psicologia e as influências da multidão se envolvem no jogo.
Na maior parte do tempo, os ativos estão sobreprecificados e ficando mais
caros ou subprecificados e ficando ainda mais baratos. Em certo momento,
essas tendências acabam tendo um efeito corrosivo que envolve a psique, a
convicção e a determinação dos investidores. As ações que foram rejeitadas
dão dinheiro a outros, aquelas que foram compradas estão cada dia mais
baratas, e os conceitos deixados de lado por parecer inseguros ou
imprudentes (investimentos da moda, ações de tecnologia de alto preço e sem
lucros, derivativos hipotecários altamente alavancados) são descritos
diariamente como ativos que geram lucros a outros.
Já que uma ação sobreprecificada fica ainda mais cara ou uma ação
subprecificada continua a ficar mais barata, deveria ser mais fácil fazer a
coisa certa: vender a primeira e comprar a segunda. Mas não é isso que
acontece. A tendência de duvidarmos de nós mesmos junta-se com as notícias
do êxito de outras pessoas, o que forma uma força poderosa que leva os
investidores a fazer a coisa errada; o processo toma corpo à medida que a
tendência ganha continuidade. É mais uma influência que deve ser
combatida.
O querer mais, o medo de perder oportunidades, a tendência de se
comparar com outros, a influência da multidão e o sonho da certeza são
fatores quase universais. Assim, causam um profundo impacto coletivo na
maioria dos investidores e dos mercados. Isso ocorre especialmente nas
extremidades do mercado. Os resultados são os erros, e esses erros são
frequentes, generalizados e recorrentes.
Tudo isso parece muito teórico, algo que não pode ser aplicado a você?
Espero sinceramente que tenha razão. Porém, caso duvide que as pessoas
racionais podem sucumbir às forças prejudiciais da emoção, deixe-me
lembrá-lo de duas palavrinhas: bolha tecnológica. Já mencionei anteriormente
esse momento louco como prova do que acontece quando os investidores
desconsideram a necessidade de uma relação razoável entre valor e preço. Por
que eles abandonam o bom senso? Por causa de algumas das mesmas
emoções de que falamos anteriormente: a ganância, o medo, a inveja, a
ilusão, o ego. Façamos uma revisão do cenário para assistirmos aos fatores
psicológicos em ação.
A década de 1990 foi um período muito bom para as ações. Houve dias e
meses ruins, é claro, e momentos traumáticos — como o grande aumento das
taxas de juros em 1994 —, mas o índice Standard & Poor’s 500 apresentou
lucros em todos os anos entre 1991 e 1999, inclusive, seu retorno foi de
20,8% ao ano. Esses resultados foram suficientes para criar um sentimento
otimista entre os investidores e torná-los mais receptivos às histórias de alta.
As ações de crescimento tiveram um desempenho um pouco melhor do
que as ações de valor no início da década — talvez como resposta aos bons
rendimentos relativos das ações de valor na década de 1980. Isso também fez
aumentar a disposição dos investidores em valorizar o potencial de
crescimento das empresas.
Os investidores estavam encantados com as inovações tecnológicas.
Parecia que a banda larga, a internet e o comércio eletrônico estavam prestes
a mudar o mundo; por isso, os empreendedores de tecnologia e
telecomunicações eram idolatrados.
As ações de tecnologia ficaram mais caras, atraindo mais compradores, o
que levou a uma maior valorização, em um processo que, como de costume,
assumia a aparência de um círculo virtuoso sem fim.
As racionalizações aparentemente lógicas desempenham um grande papel
na maioria dos mercados com tendência altista, e, neste caso, não é diferente:
as ações de tecnologia superarão todas as outras ações devido à excelência
das empresas. Um número maior de empresas de tecnologia será
acrescentado aos índices de ações, refletindo sua crescente importância na
economia. Isso obrigará os fundos de índice e os closet indexers,2 que
emulam de forma encoberta os índices, a comprar mais ações dessas
empresas; os investidores ativos também comprarão para acompanhar a
tendência. Cada vez mais pessoas criarão planos de aposentadoria 401(k),3 e
os investidores desse planos aumentarão a representatividade das ações
tecnológicas em suas carteiras, substituindo suas outras ações pelas ações de
empresas de tecnologia. Por essas razões, as ações de tecnologia (a)
continuarão subindo e (b) superarão as outras ações. Assim, atrairão ainda
mais compras. O fato de todos esses fenômenos realmente terem ocorrido por
certo período ofereceu credibilidade a essa teoria.
O valor das ofertas públicas iniciais4 de ações de tecnologia começou a
aumentar dezenas e até centenas de pontos porcentuais no mesmo dia da
emissão das ações, as quais assumiam uma aparência de vencedoras certas. O
acesso aos IPOs tornou-se uma mania bastante popular.
Do ponto de vista psicológico, o que estava acontecendo com os IPOs é
particularmente fascinante. Era algo mais ou menos assim: a pessoa ao seu
lado no escritório fala de um IPO que está comprando. Você pergunta o que a
empresa faz. Ela diz que não sabe, mas afirma que o corretor disse que o IPO
dobrará de valor no dia de sua emissão. Então você diz que isso é ridículo.
Uma semana depois, ela diz que as ações não dobraram, mas triplicaram. E
ela ainda não sabe o que a empresa faz. Depois de testemunhar alguns IPOs
similares, fica difícil resistir. Você sabe que não faz sentido, mas quer se
proteger contra a sensação de parecer um idiota. Então, em um exemplo
primordial de capitulação, você compra algumas centenas de ações do
próximo IPO… e o combustível da fogueira aumenta ainda mais com a
compra realizada por novos convertidos como você.
Os fundos de venture capital que haviam investido em startups de
bastante êxito atraíram grande atenção e capital. No ano em que o Google
entrou na bolsa, o fundo que o financiou valorizou 350% com base apenas
nesse êxito.
Os investidores de ações de tecnologia foram elogiados pela mídia por seu
brilhantismo. Os menos restringidos, pela experiência e pelo ceticismo — e,
portanto, que estavam ganhando mais dinheiro —, eram investidores na casa
dos 30 anos e até mesmo na casa dos 20 anos. Ninguém nunca havia dito a
eles que talvez estivessem se beneficiando de um mercado irracional e não de
sua incrível astúcia.
Vocês se lembram de meu comentário: todas as bolhas começam com um
mínimo de verdade? No cenário que descrevi, a semente da verdade estava no
verdadeiro potencial da tecnologia. O fertilizante veio das racionalizações dos
participantes desses mercados altistas. E o excesso de energia veio da
valorização dos preços, que parecia não ter mais fim.
É claro que todo o furor em relação às ações de tecnologia, e-commerce e
telecomunicações decorre do potencial que essas empresas têm para mudar o
mundo. Não tenho nenhuma dúvida de que esses movimentos estão
revolucionando a vida como a conhecemos ou que, em alguns poucos anos,
tornarão o mundo quase irreconhecível. O desafio está em descobrir quem serão os
vencedores e qual é o verdadeiro valor atual deles…
Sublinhar que as ações de tecnologia, da internet e das telecomunicações estão
muito altas e, dessa forma, prestes a declinar é como querer ficar parado em frente
a um trem de carga. Dizer que elas se beneficiaram de um boom de proporções
colossais e que devem ser examinadas com ceticismo é algo que me sinto obrigado
a dizer-lhes.
“BUBBLE.COM” (BOLHA.COM), 3 DE JANEIRO DE 2000
Logo após a publicação do memorando de janeiro de 2000, as ações de
tecnologia começaram a entrar em colapso por seu próprio peso, mesmo na
ausência de qualquer evento único que causasse esse movimento. De repente,
ficou claro que os preços das ações tinham ido longe demais e deveriam ser
corrigidos. Quando um investimento da moda vai mal, The Wall Street
Journal costuma lançar uma tabela com as perdas resultantes, mostrando
ações representativas com queda de 90% ou mais. Quando a bolha
tecnológica estourou, no entanto, a tabela apresentada mostrava perdas
superiores a 99%. Todos os índices amplos testemunharam seu primeiro
declínio de três anos desde a Grande Depressão, e as ações de tecnologia — e
as ações em geral — acabaram perdendo seu encanto especial.
Quando olhamos para o passado, para a primeira década do século 21,
vemos que os desenvolvimentos tecnológicos mudaram o mundo, que as
empresas vencedoras são extremamente valiosas e que mídias como jornais e
CDs foram profundamente afetadas. Mas é igualmente óbvio que os
investidores permitiram que seu bom senso fosse anulado durante a bolha.
Eles ignoraram o fato de que nem todas as empresas sairiam vencedoras, que
haveria um longo período de shake-out (declínio do valor dos ativos), que
não haveria rentabilidade fácil pela prestação de serviços gratuitos e que as
ações de empresas que perdiam dinheiro, avaliadas em altos múltiplos de
vendas5 (uma vez que não havia lucros), traziam grande perigo.
A ganância, a excitação, a falta de lógica, o descrédito da realidade e a
ignorância sobre o valor das coisas custaram a perda de muito dinheiro às
pessoas que participaram da bolha tecnológica. E, a propósito, muitos
investidores de valor, brilhantes e disciplinados, foram vistos como burros
nos meses e anos anteriores ao estouro da bolha, que, é claro, acabou
ocorrendo.
Para evitar perder dinheiro em bolhas, é importante não entrar no jogo
quando a ganância e o erro humano fazem os pontos positivos serem
superestimados, e os negativos, ignorados. Isso não é fácil; poucos
conseguem se abster. Da mesma forma, é essencial que investidores evitem
vender — de preferência, devem comprar — quando o medo se torna
excessivo durante uma crise. (Isso me lembra que devo salientar que as
bolhas são capazes de surgir por conta própria e que não precisam ser
precedidas por crises, enquanto as crises são invariavelmente precedidas por
bolhas.)
Por mais difícil que, para a maioria das pessoas, tenha sido resistir a
comprar na bolha tecnológica, foi ainda mais difícil deixar de vender — e
ainda mais difícil comprar — durante as profundezas da crise de crédito. Na
pior das hipóteses, não comprar em um mercado com tendência altista faz
com que outros nos vejam como investidores lentos que sofrem com os
custos de oportunidade. Na crise de 2008, entretanto, a desvantagem de não
vender parecia ser a perda ilimitada. O apocalipse parecia possível.
O que, enfim, deve-se fazer com esses impulsos psicológicos que nos
levam a realizar tolices? Um investidor precisa aprender a vê-los como são;
esse é o primeiro passo para ter coragem e resistir. Deve ser realista. Os
investidores que acreditam ser imunes às forças descritas neste capítulo o
fazem por sua conta e risco. Se essas forças conseguem influenciar os outros
a ponto de movimentar mercados inteiros, por que não seriam capazes de
afetá-lo também? Se um mercado com tendência altista é tão poderoso que
tem o potencial de fazer um adulto ignorar as avaliações excessivamente
elevadas e negar a impossibilidade da máquina de movimento perpétuo, por
que não teria a mesma influência sobre você? Se uma história de terror de
perdas ilimitadas é suficientemente poderosa para obrigar outros a vender a
preço de banana, o que impediria que isso também o atingisse?
Acreditem, não é difícil resistir à tentação de comprar em um mercado
otimista (e mais difícil ainda vender) quando todos os outros estão
comprando, os especialistas estão otimistas, a racionalização é aceita por
todos, os preços estão subindo e aqueles que mais arriscam estão obtendo
retornos gigantescos. Da mesma forma, é difícil resistir à tentação de vender
(e mais difícil à tentação de comprar) quando o oposto é verdadeiro e nos
parece que manter uma posição ou comprar implicaria risco de perda total.
Como tantas outras coisas descritas neste livro, não há uma solução
simples: não há fórmula que nos diga quando o mercado se encontra em uma
extremidade irracional, não há ferramenta infalível que nos mantenha do lado
certo dessas decisões, não há pílula mágica que nos proteja das emoções
destrutivas. Conforme diz Charlie Munger, “não é para ser fácil”.
De que armas você dispõe para aumentar suas chances de êxito?
Estas são as que funcionam para a Oaktree:
• uma boa percepção sobre o valor intrínseco dos ativos;
• insistência em agir da forma correta quando o preço diverge do valor;
• bom conhecimento dos ciclos passados — primeiro, por meio da leitura e
de conversas com os investidores veteranos e, posteriormente, pela
experiência — para saber que os excessos do mercado são, enfim,
punidos, não recompensados;
• uma compreensão completa do efeito insidioso da psicologia sobre o
processo de investimento nas extremidades do mercado;
• uma promessa de nos lembrarmos de que, quando as coisas parecem “boas
demais para ser verdade”, geralmente são mesmo;
• disposição para parecermos errados quando o mercado passa de preços
errados para preços mais errados ainda (algo que, invariavelmente,
ocorrerá); e
• cercar-se de amigos e colegas que tenham o mesmo pensamento e possam
nos oferecer apoio (e a quem também possamos apoiar).
Embora não possamos garantir que essas armas nos levem ao êxito,
sabemos que, ao menos, nos dão uma chance de lutar.
11
O mais importante é… o ponto de vista contrário
Precisa-se de muita coragem para comprar quando os outros
estão vendendo de forma melancólica e vender quando outros
estão comprando com euforia; isso, entretanto, é o que
proporciona os maiores lucros.
JOHN TEMPLETON
Há uma única maneira de descrever a maioria dos investidores: seguidores de
tendência. Os bons investidores são exatamente o oposto. O bom
investimento, como espero ter conseguido convencer os leitores, requer um
pensamento de segundo nível, isto é, uma maneira de pensar diferente
daquela dos outros, mais complexa e mais perspicaz. Por definição, a
multidão não compartilha desse tipo de pensamento. Assim, os juízos feitos
por ela não constituem princípios que nos levam ao êxito. Em vez disso, a
tendência, a visão de consenso, é algo a ser combatido; devemos divergir da
carteira construída pelo consenso. Na mesma proporção em que o pêndulo
oscila ou o mercado passa por seus ciclos, o êxito depende de fazermos o
oposto.
Este é o cerne do conselho tantas vezes citado de Warren Buffett: “Quanto
menor a prudência com a qual os outros conduzem seus negócios, maior deve
ser a prudência com a qual devemos conduzir os nossos próprios negócios”.
Ele está nos estimulando a fazer o oposto do que os outros fazem: ter o ponto
de vista contrário.
Fazer a mesma coisa que os outros fazem nos expõe a flutuações que, em parte, são
aumentadas pelas ações dos outros e pelas nossas. É certamente algo indesejável
fazer parte do rebanho quando ele debanda em direção ao penhasco, mas, para
evitar isso, é preciso ter habilidade, percepção e disciplina raras.
“THE REALIST’S CREED” (O CREDO REALISTA), 31 DE MAIO DE 2002
A lógica do erro da multidão é clara e quase matemática:
• os mercados oscilam dramaticamente, do mercado com tendência altista
para o baixista e de sobreprecificado para subprecificado;
• seus movimentos são guiados pelas ações da “multidão”, do “rebanho” ou
da “maioria das pessoas”; os mercados altistas ocorrem porque mais
pessoas querem comprar do que vender ou os compradores estão mais
motivados do que os vendedores; o mercado sobe à medida que
investidores deixam de ser vendedores e passam a ser compradores, e à
medida que os compradores ficam ainda mais motivados, e os vendedores,
menos (o mercado não estaria em ascensão se não fosse dominado pelos
compradores);
• as extremidades do mercado representam pontos de inflexão; isso ocorre
quando a alta ou a baixa atingem seu ponto máximo (De modo figurativo,
há um ponto máximo quando a última pessoa que se tornará compradora o
faz. Já que todos os compradores já se juntaram ao rebanho altista no
momento em que o mercado chega ao ponto máximo, a tendência altista
não tem como seguir aumentando e o mercado se encontra no ponto de
maior alta possível. Comprar ou manter-se nessa posição é perigoso.);
• como não sobrou mais ninguém para manter a alta, o mercado para de
subir; e se, no dia seguinte, apenas uma pessoa deixar de ser compradora e
passar a ser vendedora, o mercado começa a cair;
• então, nas extremidades, que são criadas pelo que “a maioria das pessoas”
acredita, a maioria das pessoas está errada;
• portanto, a chave para obter êxito em investimentos só pode estar no
oposto, isto é, divergir da multidão — os que conseguem reconhecer os
erros dos outros podem lucrar muito utilizando o ponto de vista contrário.
De tempos em tempos, vemos compradores furiosos ou vendedores aterrorizados;
urgência para entrar ou sair; mercados superaquecidos ou mercados gelados; e
preços insustentavelmente altos ou ridiculamente baixos. Certamente, tanto os
mercados quanto as atitudes e posturas dos investidores passam apenas uma
pequena parte de seu tempo no “bom meio-termo”.
O que isso diz sobre como devemos agir? Juntarmo-nos ao rebanho e participar dos
extremos desses ciclos pode obviamente ser perigoso para a nossa saúde
financeira. As extremidades máximas dos mercados são criadas quando os
compradores ávidos estão no controle, elevando os preços para patamares que
talvez nunca mais sejam novamente vistos. As baixas são criadas quando os
vendedores, em pânico, são maioria e estão dispostos a se desfazer de ativos a
preços que muitas vezes acabam sendo demasiadamente baixos.
“Comprar barato; vender caro” é o ditado tradicional, mas quem é carregado pelos
ciclos do mercado costuma fazer exatamente o oposto. A resposta adequada está no
comportamento com base no ponto de vista contrário: comprar quando os outros
odeiam os ativos e vender quando eles os adoram. Esses raros eventos extremos do
mercado parecem ocorrer uma vez a cada década ou mais, isto é, não costumam
ocorrer de forma suficientemente corriqueira para que algum investidor baseie sua
vida de investimentos unicamente neles. Mas tentar capitalizar sobre esses eventos
é um componente importante da abordagem de todo investidor.
Não pense, contudo, que é fácil. O investidor precisa ser capaz de detectar casos
em que os preços divergem significativamente do valor intrínseco. O investidor
deve ter estômago forte para desafiar a sabedoria popular (um dos maiores
oximoros) e resistir ao mito de que o mercado é sempre eficiente e, portanto, está
sempre certo. O investidor precisa ter experiência e nela basear um comportamento
resoluto. O investidor deve ter o apoio de um grupo de pessoas compreensivas e
pacientes. Se não tiver tempo suficiente para manter-se firme nas extremidades do
ciclo enquanto espera a razão voltar a prevalecer, o investidor se tornará a mais
típica das vítimas do mercado: a pessoa de 1,80 metro de altura que se afogou
cruzando o córrego que, em média, tinha 1,50 metro de profundidade. Mas, se
estiver alerta para a oscilação pendular dos mercados, é possível que consiga
reconhecer as oportunidades que ocasionalmente surgem para ser colhidas.
“THE HAPPY MEDIUM” (O BOM MEIO-TERMO), 21 DE JULHO DE 2004
Aceitar o conceito amplo do ponto de vista contrário é uma coisa; colocá-lo
em prática é outra. Por um lado, nunca sabemos qual será o ponto de
oscilação máxima do pêndulo, quando ele vai reverter seu movimento e até
que ponto ele seguirá na direção oposta.
Por outro lado, podemos ter certeza de que, uma vez que atinja uma
posição máxima, o mercado eventualmente voltará para o ponto médio (ou
além). Os investidores que acreditavam que o pêndulo continuaria em uma
direção para sempre — ou, tendo atingido uma extremidade, permaneceria lá
— estão inevitavelmente decepcionados.
E, por fim, em virtude da variabilidade dos muitos fatores que influenciam
os mercados, não há nenhuma ferramenta — nem mesmo o ponto de vista
contrário — em que se possa confiar inteiramente.
• O ponto de vista contrário não é uma abordagem que nos fará ganhar
dinheiro o tempo todo. Na maioria das vezes, não ocorrem grandes
excessos no mercado para que possamos apostar contra.
• Mesmo quando há um excesso, devemos nos lembrar de que
“sobreprecificado” é totalmente diferente de “amanhã seu preço cairá”.
• Os mercados podem estar sobreprecificados ou subprecificados e manterse assim — ou continuar nessa progressão — por anos.
• É extremamente doloroso quando a tendência caminha em direção oposta
à nossa.
• Pode até parecer que “todos” chegaram à conclusão de que o rebanho está
errado. O que quero dizer é que o ponto de vista contrário em si pode
parecer ter se tornado muito popular e, assim, acabar sendo confundido
com o comportamento de rebanho.
• Por fim, não basta apostar contra a multidão. Em consequência das
dificuldades associadas ao ponto de vista contrário que acabei de citar, o
reconhecimento das divergências do pensamento consensual — com
possibilidade de gerar lucros — deve ter como base a razão e a análise.
Não devemos tomar algumas atitudes só porque elas são opostas às
atitudes da multidão, mas porque sabemos o motivo pelo qual a multidão
está errada. Só então seremos capazes de manter nossos pontos de vista de
maneira firme e talvez continuar comprando, mesmo que nossas posições
pareçam erros e, em vez de ganhos, se acumulem perdas.
As dotações da Yale University são dirigidas por David Swensen. O
desempenho desse fundo tem sido excelente e, nas últimas décadas, Swensen
foi a pessoa que causou maior impacto no mundo dos investimentos em
dotações. Sua abordagem, que era altamente incomum quando Yale começou
a implementá-la na década de 1980, tornou-se a forma-padrão desse tipo de
investimento. Swensen tem uma bela maneira de descrever as dificuldades
associadas ao ponto de vista contrário.
O êxito em investimentos exige a manutenção de posicionamentos desconfortáveis
por serem diferentes da opinião popular. Os compromissos fortuitos abrem o
caminho para reversões fortuitas, expondo os gestores de carteiras ao ciclo
prejudicial do comprar caro e vender barato. Somente a confiança criada por um
forte processo de tomada de decisão permite que os investidores vendam por preço
de excesso especulativo e comprem valor ao preço do desespero.
(…) Estratégias de gestão ativa exigem que as instituições se comportem de forma
não institucional, criando um paradoxo que poucos são capazes de resolver.
Estabelecer e manter um perfil de investimento não convencional requer a
aceitação de carteiras desconfortavelmente peculiares, que, aos olhos da sabedoria
convencional, costumam parecer extremamente imprudentes.
PIONEERING PORTFOLIO MANAGEMENT, 20001
As ações de investimento mais rentáveis são, por definição, as
encontradas pelo ponto de vista contrário: um investidor está comprando
enquanto todos os outros estão vendendo (e, por isso, o preço está baixo) ou
um investidor está vendendo enquanto todos os outros estão comprando (e o
preço está alto). Essas são ações solitárias e, como diz Swensen,
desconfortáveis. Como podemos saber que a ação confortável é a do
consenso? Sabemos disso quando a maioria das pessoas está realizando a
mesma ação.
O que eu acho mais interessante no universo dos investimentos é o quão paradoxal
ele é: quantas vezes as coisas óbvias — nas quais todos concordam — acabam não
sendo verdadeiras.
Não estou dizendo que a sabedoria popular sobre investimentos algumas vezes é
válida e outras vezes não. A realidade é mais simples e muito mais sistemática: a
maioria das pessoas não entende o processo por meio do qual um ativo passa a ter
a possibilidade de gerar grandes rendimentos.
Aquilo que parece óbvio para o consenso dos investidores está quase sempre
errado. A própria generalização da opinião popular sobre um investimento tende a
eliminar suas possibilidades de lucro (…). Tomemos, por exemplo, aquele
investimento que “todos” acreditam ser uma ótima ideia. Em minha opinião, por
definição, isso simplesmente não pode ser assim.
• Se todos gostam, provavelmente é porque o ativo vem dando bons resultados.
A maioria das pessoas parece pensar que um ótimo desempenho até o
momento é garantia de que o mesmo aconteça no futuro. Na verdade, é mais
provável que o ótimo desempenho até o momento tenha sido tomado
emprestado do futuro e, portanto, é o presságio de um desempenho abaixo da
média a partir de agora.
• Se todos gostam, é provável que, como reflexo dessa adulação, o preço tenha
atingido um patamar no qual só se poderá ganhar apenas um aumento
relativamente pequeno. (É claro que é possível que algo passe de
“sobrevalorizado” para “mais sobrevalorizado ainda”, mas eu não contaria
com esse acontecimento);
• Se todos gostam, é provável que a área já tenha sido tão explorada — contando
com um enorme fluxo de capital — que não restem mais pechinchas.
• Se todos gostam, há um risco significativo de que os preços caiam no momento
em que a mente coletiva da multidão mudar de ideia e resolver buscar a saída.
Os bons investidores sabem — e compram — quando o preço de algo é menor do
que deveria ser. E o preço de um investimento é menor do que deveria ser apenas
quando a maioria das pessoas não enxerga o seu mérito. Há uma frase famosa de
Yogi Berra: “ninguém vai mais naquele restaurante; está muito lotado”. É tão
absurdo como dizer: “todos viram que o investimento é uma pechincha”. Se todos
viram, eles comprarão e, nesse caso, o preço não permanecerá baixo…
Não há como obter lucros gigantescos quando compramos o que agrada a todos.
Eles são obtidos quando compramos ativos subestimados por todos…
Em suma, há dois elementos primários para realizar grandes investimentos:
• enxergar alguma qualidade que os outros não enxergam ou não apreciam (e
isso é algo que não se reflete no preço); e
• essa qualidade ser verdadeira (ou pelo menos aceita pelo mercado).
Pelo primeiro elemento, deveria estar claro que o processo precisa ter início com
investidores que sejam extraordinariamente perceptivos, não convencionais,
iconoclastas ou precoces. É por isso que, segundo dizem, os bem-sucedidos
passam grande parte de seu tempo sozinhos.
“EVERYONE KNOWS” (TODO MUNDO SABE), 26 DE ABRIL DE 2007
A crise de crédito mundial de 2007-2008 representa a maior que já
testemunhei. As lições a serem aprendidas por essa experiência são muitas,
razão pela qual discuto aspectos dela em mais de um capítulo. Para mim, uma
dessas lições foi ter ganhado uma nova compreensão sobre o ceticismo
necessário para ser capaz de raciocinar por meio de um ponto de vista
contrário. Geralmente não sou dado a epifanias, mas tive uma sobre a questão
do ceticismo.
Toda vez que uma bolha estoura, um mercado altista entra em colapso ou
uma bala de prata não funciona, ouvimos as pessoas lamentarem seu erro. O
cético, extremamente consciente disso, tenta identificar as ilusões antes do
tempo e evita aceitá-las ou alinhar-se com a multidão. Assim, geralmente, o
ceticismo em relação aos investimentos está associado à rejeição de
modismos, às manias dos mercados com tendência de alta e aos esquemas
Ponzi, ou pirâmides financeiras. Minha epifania ocorreu em meados de
outubro de 2008, próximo do ponto mais baixo da crise de crédito mundial.
Naquele momento estávamos vendo e ouvindo coisas que nunca
imaginávamos possíveis:
• o fim ou resgate das empresas Lehman Brothers, Bear Stearns, Freddie
Mac, Fannie Mae e AIG;
• preocupação com a viabilidade das empresas Goldman Sachs e Morgan
Stanley e enormes declínios em suas ações;
• aumento dos preços dos credit default swaps (CDS) sobre os títulos do
tesouro dos Estados Unidos;
• taxas das letras do tesouro a curto prazo próximas de zero, causado pela
busca de segurança; e
• a consciência (pela primeira vez, acredito) de que os recursos financeiros
do governo dos Estados Unidos são finitos e de que há limites em sua
capacidade de produzir dinheiro e resolver todos os problemas.
Imediatamente após a falência do Lehman Brothers, parecia bastante claro que (…)
a situação sairia do controle e ninguém seria capaz de prever como nem quando
tudo terminaria. Esse era o verdadeiro problema: todos os cenários negativos eram
vistos como possíveis; e qualquer cenário que incorporasse um pouco de otimismo
era descartado como uma ingenuidade polianesca.
É claro que havia nisso tudo um grão de verdade: nada era impossível. Mas, ao
lidar com o futuro, devemos pensar em duas coisas: (a) quais eventos podem
acontecer e (b) qual a probabilidade de que esses eventos aconteçam.
Durante a crise, muitas coisas ruins pareciam possíveis, o que não significa que
elas realmente ocorreriam. Em tempos de crise, as pessoas não fazem essa
distinção…
Por quarenta anos eu testemunhei as loucas oscilações do pêndulo maníacodepressivo da psicologia dos investidores: agitando-se entre o medo e a ganância
— todos nós conhecemos o refrão —, mas também entre o otimismo e o
pessimismo e entre a credulidade e o ceticismo. Em geral, seguir as crenças do
rebanho e oscilar com o pêndulo resultará em rendimentos médios a longo prazo e
a possibilidade de acabarmos arruinados nas extremidades da oscilação…
Quando começarmos a acreditar na história em que todos acreditam, faremos o que
os outros fazem. Compraremos ativos na alta de preços e os venderemos na baixa.
Cairemos no conto da “bala de prata”, isto é, acreditaremos em uma estratégia
capaz de entregar altos retornos sem nenhum risco. Compraremos os ativos que
vão bem e venderemos os que vão mal. Perderemos nos momentos de crise e não
conseguiremos entrar no mercado quando este começar a se recuperar. Em outras
palavras, seremos conformistas e não dissidentes; seguidores e não alguém com
ponto de vista contrário.
Precisamos ser céticos quando analisamos um balanço patrimonial, ou o último
milagre da engenharia financeira, ou aquela história do investimento imperdível…
Somente o cético é capaz de separar as coisas que soam bem e são boas das coisas
que soam bem e não são boas. Os melhores investidores que conheço são exemplos
dessa característica. Trata-se de uma necessidade absoluta.
Para dar início à crise de crédito, aconteceram muitas coisas ruins que eram
consideradas improváveis (e até mesmo impossíveis) — e aconteceram todas ao
mesmo tempo — por investidores que estavam significativamente alavancados.
Assim, a explicação fácil é que os afetados pela crise de crédito não foram
suficientemente céticos — ou pessimistas.
Isso, entretanto, desencadeou a epifania: ceticismo e pessimismo não são
sinônimos. O ceticismo é pessimista quando há excesso de otimismo. Por outro
lado, o ceticismo é otimista quando há excesso de pessimismo.
Na semana passada, assim que a crise de crédito atingiu seu pico, encontrei poucos
otimistas; a maioria estava, em maior ou menor grau, pessimista. Nenhuma das
pessoas foi cética nem disse que aquela história de terror não parecia ser
verdadeira. Havia apenas uma única coisa que ninguém estava realizando na
semana passada, a saber, ofertas de compras agressivas por ativos. Assim, os
preços despencaram vários pontos-base de uma só vez.
A solução — como de costume — era ter sido cético sobre o que “todo mundo”
estava dizendo e fazendo. A história negativa pode ter parecido convincente, mas é
a história positiva (em que poucos acreditaram) que detinha, e ainda detém, o
maior potencial de lucro.
“THE LIMITS TO NEGATIVISM” (OS LIMITES DO NEGATIVISMO), 15 DE OUTUBRO DE
2008
O erro está claro. O rebanho é otimista nas altas e pessimista nas baixas. Assim,
para obter vantagens, devemos ser céticos acerca do otimismo que prospera
durante as altas do mercado e céticos quanto ao pessimismo que prevalece durante
as baixas.
“TOUCHSTONES” (CRITÉRIOS), 10 DE NOVEMBRO DE 2009
Em geral, imagina-se que ceticismo significa dizer “não, isso é bom
demais para ser verdade” nos momentos certos. Porém, em 2008 — e, em
retrospectiva, agora parece tão óbvio —, eu percebi que às vezes o ceticismo
pede que digamos: “não, isso é muito ruim para ser verdade”.
A maioria das compras de títulos de dívida de empresas em dificuldades2
realizadas no quarto trimestre de 2008 rendeu retornos de 50% a 100% ou
mais nos dezoito meses seguintes. Comprar era extremamente difícil sob
essas circunstâncias difíceis, mas ficou mais fácil quando percebemos que
quase ninguém estava dizendo “não, as coisas não podem estar tão mal
assim”. Naquele momento, ser otimista e comprar foi a expressão mais
elevada do ponto de vista contrário.
Há certos temas comuns que se repetem nos melhores investimentos que
testemunhei. Eles costumam seguir um ponto de vista contrário, são
desafiadores e desconfortáveis — mesmo que o investidor mais experiente
saiba que está bem em sua posição longe do rebanho. Sempre que o mercado
de dívidas entra em colapso, por exemplo, a maioria das pessoas diz que é
imprudente tentar pegar uma faca em plena queda, pois isso é algo muito
perigoso, e costuma arrematar o pensamento dizendo que se deve esperar a
poeira baixar e a incerteza ser resolvida. O que essa maioria quer dizer,
claramente, é que está assustada e insegura em relação ao próximo passo.
A única coisa de que tenho certeza é que, quando a faca parar de cair, a
poeira baixar e a incerteza tiver sido resolvida, não haverá mais nenhuma
grande pechincha. Sempre que uma compra se torna novamente confortável,
isso significa que seu preço já não está tão baixo a ponto de podermos
chamá-la de uma grande barganha. Assim, um investimento extremamente
rentável que não comece com algum desconforto costuma ser um
paradoxismo.
É nosso trabalho, como investidores com ponto de vista contrário, pegar
as facas que estão caindo, com cuidado e habilidade. É por isso que o
conceito de valor intrínseco é tão importante. Se tivermos uma opinião
relativa ao valor que nos permita comprar quando todos os outros estiverem
vendendo e se nossa opinião estiver correta, esse será o melhor caminho para
obter grandes recompensas com o menor risco.
12
O mais importante é… encontrar pechinchas
As melhores oportunidades são geralmente encontradas naquilo
que a maioria das outras pessoas não faz.
O processo de construção inteligente de um portfólio consiste em comprar os
melhores investimentos, dando-lhes espaço vendendo ativos que não são
muito bons, e ficando longe dos piores. As matérias-primas do processo
consistem em (a) uma lista de potenciais investimentos; (b) estimativas de
seu valor intrínseco; (c) alguma percepção sobre como comparar seus preços
ao seu valor intrínseco; e (d) uma compreensão sobre os riscos envolvidos em
cada um dos investimentos e sobre o efeito que sua inclusão causaria na
carteira a ser montada.
O primeiro passo é geralmente garantir que os ativos que estão sendo
considerados satisfaçam alguns padrões absolutos. Talvez nunca se ouça de
investidores sofisticados algo como “se estiver suficientemente barato,
compro qualquer coisa”. O que costumam fazer de forma mais frequente é
criar uma lista de candidatos a investimentos que atendam a seus critérios
mínimos e, dos ativos listados, escolher as melhores pechinchas. É disso que
se trata este capítulo.
Por exemplo, um investidor pode começar reduzindo a lista de
possibilidades para os ativos cujo risco esteja dentro de certos limites
aceitáveis, pois alguns deles não se sentem confortáveis com alguns tipos de
risco; exemplos abrangem o risco de obsolescência de um segmento
tecnológico que se mova muito rapidamente e o risco de que um produto de
consumo da moda perca sua popularidade. Outros investidores têm tendência
a considerar que alguns assuntos não fazem parte do universo de seus
conhecimentos especializados. E outros ainda demonstrarão inclinação a não
aceitar, absolutamente, algumas empresas, seja porque o ramo de negócios do
qual participam é muito imprevisível, seja porque suas demonstrações
financeiras não são suficientemente transparentes.
É completamente razoável querer priorizar ativos que se enquadrem em
uma determinada parcela do espectro de risco. É possível que, por um lado,
os ativos considerados extremamente seguros pelo mercado ofereçam
rendimentos desinteressantes e, por outro lado, os que se encontram no
extremo oposto ultrapassem a tolerância ao risco dos investidores. Em outras
palavras, é razoavelmente possível que existam ativos que investidores não
aceitem, independentemente do preço.
Não só pode haver riscos que os investidores não queiram assumir como
também que seus clientes não queiram que eles assumam. Especialmente no
mundo institucional, raramente se diz aos gestores “aqui está o meu dinheiro,
faça o que quiser com ele”. O trabalho do gestor de capitais não é apenas
realizar investimentos com potencial de lucro, mas também entregar aos
clientes o que eles querem, uma vez que a maioria dos investidores
institucionais é contratada para realizar atribuições específicas em termos de
classes de ativos e estilos de investimento. Se o cliente deseja um tipo de
investimento, há pouco que ganhar em outros, independentemente de sua
atratividade. Por exemplo, se o cliente quer um gestor com expertise em
ações de alta qualidade e capitalização, correrá risco comercial se investir em
startups de alta tecnologia.
Desse modo, é improvável que o ponto de partida para a construção de
uma carteira tenha um universo ilimitado de investimentos como base.
Alguns investimentos são vistos como candidatos realistas a serem incluídos
na carteira, outros, não.
Assim, após definido o “conjunto viável”, o próximo passo é selecionar em
quais deles investir. Isso é feito identificando aqueles que oferecem a melhor
relação entre rendimentos potenciais e risco, ou os que oferecem maior valor
para o dinheiro. Isso é o que Sid Cottle, editor do livro Security analysis, de
Graham e Dodd, quis dizer quando me falou que, em sua opinião, “investir é
a disciplina da seleção relativa”. Essa frase tem me acompanhado por 35
anos.
Embora simples, a frase de Sid incorpora duas mensagens importantes.
Primeiro, o processo de investimento tem de ser rigoroso e disciplinado.
Segundo, ele é necessariamente comparativo. Mesmo que os preços estejam
baixos ou altos e, portanto, que os retornos prospectivos sejam altos ou
baixos, precisamos encontrar os melhores investimentos possíveis. E, já que
não podemos mudar o mercado, se quisermos participar, nossa opção é
selecionar os melhores investimentos dentre as possibilidades existentes.
Essas são decisões relativas.
O que faz com que um ativo seja o excelente investimento que procuramos?
Conforme mencionei no capítulo 4, trata-se, em grande medida, de uma
questão de preço. Nosso objetivo não é encontrar bons ativos, mas boas
compras. Desse modo, não se trata do que compramos; trata-se do quanto
pagamos pela compra. Um ativo de alta qualidade pode ser uma compra boa
ou ruim; um ativo de baixa qualidade também. A tendência de confundir o
mérito objetivo e a oportunidade de investimento, bem como a falha em
conseguir distinguir entre os bons ativos e as boas compras, coloca a maioria
dos investidores em apuros.
Uma vez que buscamos boas compras, meu principal objetivo neste
capítulo é explicar o que torna uma compra boa. Em geral, isso significa que
o preço está baixo em relação ao valor e que o rendimento potencial está alto
em relação ao risco. De que forma as pechinchas se tornam o que são?
No capítulo 10, usei a mania por ações de tecnologia como exemplo de
um processo confiável por meio do qual uma boa ideia sobre os fundamentos
pode se transformar em uma bolha sobreprecificada. Em geral, tudo começa
com um ativo claramente atraente. À medida que a opinião dos investidores
sobre o ativo melhora, mais querem comprá-lo. Isso faz com que o capital
flua para ele e seu preço suba. As pessoas tomam o aumento do preço como
um sinal de mérito do investimento e, então, compram ainda mais. Outras
ouvem sobre ele pela primeira vez e também resolvem comprar; assim, a
tendência ascendente assume a aparência de um ciclo virtuoso sem fim. É, em
suma, um concurso de popularidade em que o ativo em questão é o vencedor.
Quando continuam por tempo satisfatório e ganham força suficiente, os
investimentos da moda se transformam em bolhas. E bolhas podem oferecer
aos investidores sensatos muitas oportunidades para vender e para vender a
descoberto.
O processo pelo qual se criam pechinchas é, em grande medida, o oposto.
Assim, para encontrá-las, é necessário entender o que faz um ativo se tornar
preterido. Isso não ocorre necessariamente como resultado de um processo
analítico. Na verdade, grande parte do processo é antianalítico, o que
significa que é importante pensar sobre as forças psicológicas por trás dele e
sobre as suas mudanças de popularidade.
Então, o que torna o preço baixo em relação ao valor e o retorno alto em
relação ao risco? Em outras palavras, o que faz o preço de venda de um ativo
ser menor do que deveria ser?
• Ao contrário de ativos que se tornam objeto de manias, as possíveis
pechinchas costumam apresentar algum defeito objetivo. É possível que
uma classe de ativos possua fraquezas, por exemplo, uma empresa pode
apresentar defasagem em relação ao seu próprio setor, um balanço
patrimonial pode estar excessivamente alavancado, ou, talvez, um ativo
ofereça proteção estrutural inadequada aos seus detentores.
• Uma vez que o processo de fixação de preços justos do mercado eficiente
requer o envolvimento de pessoas analíticas e objetivas, as pechinchas, em
geral, fundamentam-se na irracionalidade ou em alguma compreensão
incompleta. Por isso, as pechinchas costumam ser criadas quando os
investidores não consideram um ativo de forma justa, ou deixam de
examinar aspectos mais profundos para entendê-lo de maneira completa,
ou não conseguem superar alguma tradição, viés ou restrição não baseada
em valor.
• Ao contrário dos queridinhos do mercado, o ativo órfão é ignorado ou
desprezado. Quando é mencionado pela mídia e nos coquetéis, isso é feito
em termos pouco lisonjeiros.
• Geralmente seu preço vem caindo, fazendo o pensador de primeiro nível
se perguntar: quem compraria esse tipo de ativo? (É preciso reiterar que a
maioria dos investidores extrapola os resultados históricos para o futuro
esperando que as tendências se mantenham contínuas, em vez de levar em
consideração algo muito mais confiável, isto é, a regressão para a média.
Os pensadores de primeiro nível tendem a ver a fragilidade dos preços
históricos como algo preocupante, não como um sinal de que o ativo tenha
ficado mais barato.)
• Como resultado, um ativo em pechincha tende a ser altamente impopular.
O capital fica longe dele ou foge, e ninguém é capaz de imaginar uma
única razão para comprá-lo.
Eis um exemplo de como as pechinchas podem ser criadas quando uma
classe inteira de ativos sai de moda.
A história dos títulos (bonds) nos últimos sessenta anos é o espelho oposto do
aumento da popularidade desfrutada pelas ações (stocks). Os títulos começaram a
perder sua popularidade quando as ações passaram a monopolizar os holofotes nas
décadas de 1950 e 1960 até que, no final de 1969, o informe semanal do First
National City Bank com dados sobre títulos teve sua última publicação com a
seguinte manchete: “A última edição”, em fundo preto. Os títulos foram dizimados
no ambiente de altas taxas de juros dos anos 70, e mesmo que as taxas de juros
tenham sofrido constante diminuição durante as décadas de 1980 e 1990, os títulos
não tinham fôlego para enfrentar os enormes lucros das ações.
Na segunda metade da década de 1990, qualquer investimento em títulos em vez
de ações era visto como uma âncora que restringia a rentabilidade de qualquer
carteira. Presidi o comitê de investimentos de uma instituição sem fins lucrativos e
pude testemunhar uma organização-irmã de outra cidade (que sofria há anos com
um mix de títulos e ações de 80% e 20%, respectivamente) passar a investir
somente em ações. Imaginei um investidor institucional típico dizendo o seguinte:
Uma pequena parte de nossos investimentos está alocada em renda fixa. Não sei
dizer por quê. Trata-se de um acidente histórico. Meu antecessor criou isso,
porém seus motivos ficaram perdidos no passado. Agora estamos revisando
nossas participações em títulos com o objetivo de reduzi-las.
Embora o interesse pela compra de mais ações tenha permanecido baixo durante a
década atual, aplicou-se pouco dinheiro nos títulos de alta qualidade creditícia. A
queda contínua da popularidade dos títulos foi causada, entre outras coisas, pela
decisão do FED de Greenspan1 de manter as taxas de juros baixas para estimular a
economia e combater choques exógenos (como o pânico do bug do milênio). Os
títulos do tesouro dos Estados Unidos e os de alta qualidade creditícia rendiam
entre 3% e 4%, por isso, não geravam muito interesse de investidores institucionais
que buscavam obter rendimentos de 8%.
“HEMLINES”2 (BARRA DAS SAIAS), 10 DE SETEMBRO DE 2010
Como o processo descrito anteriormente durou um período suficiente e os
investidores reduziram suas participações, os títulos já estavam posicionados
para obter rendimentos ótimos. Bastou uma mudança no ambiente, e foi
gerado um aumento do anseio por segurança em relação ao potencial de
lucro. E, como geralmente acontece depois que um ativo é valorizado por um
tempo, os investidores, de repente, perceberam o atrativo dos títulos e
notaram que não detinham uma quantidade aceitável desses títulos. Esse é um
padrão que costuma gerar lucros para aqueles que descobrem isso antes dos
outros.
Os ativos com preços razoáveis nunca são nosso objetivo, já que é razoável
concluir que eles geram apenas retornos justos para o risco assumido. E,
claro, os ativos sobreprecificados não nos fazem nenhum bem.
Nosso objetivo é encontrar ativos que estejam subprecificados. Onde
devemos procurá-los?
Um bom lugar para começar é entre as coisas que:
•
•
•
•
•
•
•
são pouco conhecidas e não totalmente compreendidas;
são fundamentalmente questionáveis à primeira vista;
são controversas, impróprias ou assustadoras;
são consideradas inadequados para carteiras “respeitáveis”;
não são apreciadas, são impopulares e não são adoradas;
possuem um histórico de retornos ruins; e
recentemente tenham sido objeto de desinvestimento, não de acumulação.
Para resumir tudo em apenas uma frase, eu diria que a condição necessária
para a existência de pechinchas é que a percepção seja consideravelmente
pior do que a realidade. Isso significa que as melhores oportunidades são
geralmente encontradas naquilo que a maioria das outras pessoas não faz.
Afinal, quando todos se sentem bem com algo e estão felizes em participar, o
preço, certamente, não será uma pechincha.
Em 1978, quando saí do segmento de pesquisa de renda variável (equity
research) do Citibank e passei para a gestão de carteiras, tive a sorte de ser
convidado para trabalhar com classes de ativos que atendiam a alguns ou a
todos esses critérios. Meu primeiro trabalho foi em ativos conversíveis.
Ainda era um mercado muito menor e mais subestimado do que o é
atualmente. Já que esses ativos ofereciam aos investidores tanto as vantagens
dos títulos quanto as das ações, eles eram emitidos apenas como último
recurso por empresas fracas e sem alternativas, como conglomerados e
companhias ferroviárias e aéreas. Os principais investidores achavam que
esse mercado trazia complexidades desnecessárias; se as pessoas querem
ativos com as características dos títulos e das ações ao mesmo tempo, podem
questionar: “Por que não comprar alguns títulos e algumas ações? E se a
empresa lhe agrada, por que não comprar as ações e receber seus rendimentos
integrais, em vez de investir em um veículo híbrido e defensivo?”. Bem,
sempre que “todos” acreditam que algo não tem nenhum mérito, é razoável
suspeitar que esse objeto não seja apreciado, que ninguém o queira e,
portanto, que seu preço esteja possivelmente subestimado. É por isso que um
artigo da BusinessWeek, de 1984, sobre mim trazia a seguinte frase: “Homens
de verdade não compram ativos conversíveis, por isso medrosos como eu
conseguem comprar barato”.
Em 1978, me pediram para criar um fundo de títulos de alto rendimento.
Esses títulos de baixa classificação, onerados com o apelido desagradável de
títulos especulativos (ou, em tradução literal, títulos podres), ficavam aquém
da exigência mínima da maioria das instituições de investimentos, isto é, não
chegavam a ser avaliados com “grau de investimento ou melhor” ou nota “A
ou melhor”. Os títulos especulativos podem se tornar inadimplentes, então,
como poderiam ser ativos apropriados para os fundos de pensão ou dotações
de universidades? E se um fundo comprasse um título de uma empresa com
grau especulativo (com risco de calote) e ela quebrasse, como os
administradores poderiam escapar do constrangimento e da culpa por ter feito
algo que, antecipadamente, sabiam ser arriscado? Uma boa pista para o
potencial desses ativos poderia ser encontrada na descrição que uma agência
de classificação oferece para os títulos com classificação de risco “B”: “em
geral, não possuem as características de um investimento desejável”. Neste
momento, o leitor deve estar se perguntando como alguém é capaz de
reprovar toda uma possível classe de investimentos sem fazer qualquer
referência ao preço. A história que se seguiu sobre esses títulos mostra que,
(a) se ninguém possui algo, a demanda pelo objeto (e, portanto, o preço) só
pode subir e, (b) ao deixar de ser tabu e tornar-se minimamente tolerado,
pode oferecer um bom rendimento.
Finalmente, em 1987, meus sócios Bruce Karsh e Sheldon Stone vieram
até mim com a brilhante ideia de criar um fundo para investir em títulos de
dívida de empresas em dificuldades (distressed debt). O que poderia ser mais
impróprio e menos respeitável do que investir em títulos de empresas falidas
ou que estejam nesse caminho? Quem investiria em empresas que já
demonstrassem sua falta de viabilidade financeira e a debilidade de sua
gestão? Como alguém poderia investir de forma responsável em empresas em
queda livre? Claro que, dada a forma como os investidores se comportam,
qualquer ativo que seja considerado o pior em determinado momento tem
uma boa probabilidade de ser o mais barato. Não há sinonímia necessária
entre pechinchas e alta qualidade. Na verdade, as coisas tendem a ser mais
baratas quando a baixa qualidade dos ativos afasta as pessoas.
Cada uma dessas classes de ativos satisfazia à maioria dos critérios
listados anteriormente neste capítulo. Eram pouco conhecidas, não eram
compreendidas nem respeitadas. Ninguém tinha algo bom para dizer sobre
esses ativos. Todos os títulos eram exemplos de investimentos
desconfortavelmente peculiares e imprudentes, concordando com o que dizia
David Swensen (ver capítulo 11)… E, portanto, todos eles se transformaram
em um ótimo lugar para estar pelos próximos vinte ou trinta anos. Espero que
esses exemplos de grande escala lhe deem uma boa ideia de onde as
pechinchas podem ser encontradas.
Uma vez que as pechinchas oferecem valor a preços injustificadamente
baixos — e, portanto, razões incomuns entre retorno e risco —, pode-se dizer
que representam o Santo Graal dos investidores. De acordo com os motivos
especificados no capítulo 2, essas oportunidades não deveriam existir em um
mercado eficiente. No entanto, tudo na minha experiência me diz que,
embora as pechinchas não sejam a regra, as forças que deveriam eliminá-las
muitas vezes não o fazem.
Somos investidores ativos porque acreditamos que podemos vencer o
mercado, identificando as melhores oportunidades. Por outro lado, muitas das
“oportunidades especiais” que nos oferecem são boas demais para serem
verdadeiras, e evitá-las é essencial para se obter êxito nos investimentos.
Assim, como acontece com tantas outras coisas, é preciso equilibrar o
otimismo que leva alguém a se tornar um investidor ativo e o ceticismo que
emerge da hipótese dos mercados eficientes.
É óbvio que os investidores podem cometer erros por alguma fraqueza
psicológica, um erro analítico ou a recusa de pisar em solo desconhecido.
Esses equívocos criam pechinchas para os pensadores de segundo nível,
capazes de enxergar as falhas dos outros.
13
O mais importante é… o oportunismo paciente
O mercado não é uma máquina muito acolhedora; ele não lhe
oferecerá rendimentos altos só porque você precisa deles.
PETER BERNSTEIN
O ciclo de rápido crescimento e colapso associado à crise financeira global
nos deu a chance de vender em níveis extremamente elevados no período
entre 2005 e o início de 2007, e, em seguida, comprar a preços de pânico
entre o final de 2007 e o ano de 2008. Esta foi, em muitos aspectos, a chance
de uma vida. Os investidores com ponto de vista contrário que lutam para não
ser engolidos pelos ciclos tiveram uma oportunidade de ouro para se
distinguir. Entretanto, uma das coisas que quero destacar neste capítulo é a
indicação de que nem sempre há muita coisa a se fazer; às vezes, nossa maior
contribuição está em nos mantermos criteriosos e relativamente inativos. O
oportunismo paciente — à espera de pechinchas — é muitas vezes nossa
melhor estratégia.
Então, ofereço uma dica: teremos melhores resultados se esperarmos que
os investimentos venham até nós em vez de irmos atrás deles. Há uma
tendência de conseguirmos melhores compras quando nossa seleção é feita
com base na lista de coisas que os vendedores estão dispostos a vender, em
vez de começar com uma ideia fixa sobre o que queremos possuir. O
oportunista compra coisas porque são oferecidas a preços de pechincha. Não
há nada de especial em comprar quando os preços não estão baixos.
Na Oaktree, um de nossos lemas é “não buscamos nossos investimentos;
eles nos encontram”. Tentamos esperar. Nós não saímos com uma “lista de
compras”; em vez disso, esperamos o telefone tocar. Se ligarmos para o dono
e dissermos “você é dono de X e queremos comprar”, o preço subirá. Porém,
quando o proprietário nos ligar e disser: “temos X e queremos vender”, o
preço cairá. Assim, em vez de iniciar as negociações, preferimos reagir de
forma oportunista.
Em todos os momentos, o ambiente de investimento é um dado e não
temos outra alternativa a não ser aceitá-lo e investir dentro de seus limites.
Nem sempre há um pêndulo ou extremidade de um ciclo contra o qual
apostar. Às vezes, ganância e medo, otimismo e pessimismo e credulidade e
ceticismo estão em equilíbrio; portanto, as pessoas não estão cometendo erros
claros. Em vez de estar obviamente sobreprecificada ou subprecificada, a
maioria das coisas aparenta ser negociada por um preço razoavelmente justo.
Nesse caso, é possível que não haja grandes pechinchas a se comprar nem
vendas persuasivas a se fazer.
Para que o investimento tenha êxito, é importante que reconheçamos a
condição do mercado e, levando isso em conta, decidamos sobre nossas
ações. As outras possibilidades são (a) agir sem reconhecer a situação do
mercado, (b) agir com indiferença à sua situação e (c) acreditar que podemos
de alguma forma mudar essa situação. Todas são possibilidades muito
imprudentes. Faz todo o sentido investirmos de forma adequada às
circunstâncias que nos são apresentadas. Na verdade, nenhum outro caminho
faz sentido.
Essa conclusão tem base filosófica:
Em meados dos anos 60, os alunos da Wharton precisavam cursar disciplinas
optativas que não tivessem relação com a administração de empresas; eu resolvi
frequentar cinco cursos de estudos japoneses. Surpreendentemente, esses cursos se
tornaram o ponto alto de minha carreira universitária e, mais tarde, contribuíram
para a elaboração de minha filosofia de investimentos de uma forma bastante
significativa.
O conceito conhecido como mujo1 era um dos valores apreciados pela antiga
cultura japonesa. Para mim, ele é definido tradicionalmente como o
reconhecimento do “movimento da roda da lei”, isto é, a aceitação da
inevitabilidade da mudança, da ascensão e da queda… Em outras palavras, mujo
significa que os ciclos atingirão o topo e declinarão, as coisas surgirão e
desaparecerão, e nosso ambiente passará por modificações além do nosso controle.
Assim, devemos reconhecer, aceitar, lidar com isso e responder: não é essa a
essência dos investimentos?
(…) O passado está no passado e não pode ser desfeito. O que fizemos nos traz às
circunstâncias que agora enfrentamos. Tudo o que podemos fazer é reconhecer
essas circunstâncias pelo que são e tomar as melhores decisões que pudermos de
acordo com aquilo que nos foi entregue.
“IT IS WHAT IT IS” (É O QUE É), 27 DE MARÇO DE 2006
A filosofia de Warren Buffett é um pouco menos espiritualizada que a
minha. Em vez de mujo, ele fala de beisebol.
No Relatório anual da Berkshire Hathaway de 1997, Buffett falou sobre Ted
Williams,2 conhecido como “Splendid Splinter”, um dos grandes rebatedores da
história. Ele estudava o seu próprio jogo de forma aprofundada; esse foi um dos
fatores que contribuíram para seu sucesso. Após ter dividido a zona de strike3 em
77 “células” do tamanho de uma bola de beisebol, ele mapeou seus resultados em
uma tabela e descobriu que a média de rebatidas era muito melhor quando ele
tentava rebater apenas os arremessos que atingiam um ponto ideal, o “sweet spot”.
E, mesmo sabendo disso, era óbvio que não podia esperar o dia todo pelo
arremesso perfeito; se ele deixasse passar três arremessos sem tentar acertar as
bolas, seria eliminado.
Voltando no tempo até a edição da revista Forbes de 1o de novembro de 1974,
Buffett ressaltou que os investidores tinham uma vantagem nesse sentido, bastava
aproveitá-la. Já que não podem ser eliminados se ficarem apenas olhando, não
precisam se sentir pressionados a agir. Eles podem deixar passar muitas
oportunidades até que surja uma espetacular.
Investir é o melhor negócio do mundo porque você nunca precisa rebater. Nós
nos mantemos em nossa posição e o lançador passa a nos arremessar
oportunidades; General Motors a 47! U.S. Steel a 39! E ninguém nos põe fora
do jogo. Não há penalidades, apenas oportunidades. Podemos esperar pelo
arremesso que mais nos agrade e, então, quando os defensores (fielders)
estiverem dormindo, nós nos levantamos e damos a tacada certa.
“WHAT’S YOUR GAME PLAN?” (QUAL É O SEU ESQUEMA DE JOGO?), 5 DE SETEMBRO
DE 2003
Uma das grandes coisas no mundo dos investimentos é que a única
penalidade real ocorre quando fazemos investimentos que podem gerar
perdas. Obviamente, não há penalidade por não aceitarmos investimentos que
podem gerar perdas, apenas recompensas. E, mesmo quando deixamos passar
alguns bons investimentos, a penalidade não é algo insuportável.
Em que consiste essa penalidade por deixar passar bons investimentos?
Bem, os investidores são geralmente competitivos e participam do mercado
pelo dinheiro. Assim, ninguém se sente completamente confortável em deixar
passar uma oportunidade lucrativa.
No caso dos investidores profissionais, que são pagos para gerenciar o
dinheiro dos outros, as apostas em jogo são bem maiores. Se os gestores
deixarem passar muitas oportunidades e se seus retornos forem muito baixos
nos períodos bons, podem sofrer pressão dos clientes e eventualmente perder
clientes. Muito disso depende das informações anteriores repassadas. Na
Oaktree, sempre deixamos nosso credo bastante claro: perder uma
oportunidade lucrativa é menos importante do que investir em algo ruim.
Assim, nossos clientes estão preparados para resultados que privilegiam o
controle de riscos em detrimento da participação plena nos lucros.
Manter-se em sua posição com o bastão nos ombros é a versão de Buffett
sobre o oportunismo paciente. O bastão será retirado de nossos ombros e
utilizado para rebater somente quando existirem oportunidades de lucro com
risco controlado. Podemos ser seletivos nesse sentido quando empreendemos
todos os esforços para verificar se nos encontramos em um ambiente de
baixos ou de altos rendimentos.
Alguns anos atrás, criei uma alegoria para os ambientes de baixos
rendimentos. Chamava-se “o gato, a árvore, a cenoura e a vareta”. O gato é
um investidor cujo trabalho é lidar com o ambiente de investimentos, do qual
a árvore faz parte. A cenoura — o incentivo para se aceitar o aumento do
risco — é obtida a partir dos rendimentos maiores que, aparentemente, são
disponibilizados pelos investimentos mais arriscados. E a vareta — a
motivação para deixar de lado a segurança — origina-se dos modestos
retornos prospectivos oferecidos por investimentos mais seguros.
A cenoura atrai o gato a galhos mais altos — estratégias mais arriscadas
— para conseguir seu jantar (seu retorno desejado), e a vareta faz o gato subir
na árvore, pois ele não poderá jantar enquanto estiver perto do chão.
Juntas, a vareta e a cenoura podem fazer com que o gato suba até que ele
finalmente chegue ao alto da árvore, deixando-o em uma posição perigosa. A
observação mais importante é que o gato busca altos retornos, mesmo em um
ambiente de rendimentos baixos, e suporta as consequências — aumento do
risco —, embora muitas vezes sem saber.
Os investidores em títulos chamam esse processo de “busca pelo
rendimento”. Consiste, tradicionalmente, em investir em títulos mais
arriscados à medida que diminuem os rendimentos dos títulos mais seguros,
e, então, obter os retornos aos quais os investidores estavam acostumados
antes de o mercado subir. Esse mesmo padrão de assumir riscos novos e
maiores para manter o mesmo retorno muitas vezes se repete em um padrão
cíclico. O lema daqueles que realizam a busca pelo retorno parece ser:
“Quando o retorno de que precisamos não puder ser obtido por meio de
investimentos seguros, devemos buscá-lo nos investimentos arriscados”.
Pudemos testemunhar esse tipo de comportamento em meados da primeira
década do século 21:
[Nos dias antes da crise de crédito], os investidores sucumbiam ao canto da sereia
proporcionado pela alavancagem. Tomavam emprestado de fundos baratos de
curto prazo — quanto menor o prazo, mais baratos (é possível obter dinheiro
barato quando estamos dispostos a prometer reembolsos mensais) e usavam esse
dinheiro para comprar ativos que ofereciam maiores retornos porque implicavam
iliquidez e/ou risco em seus fundamentos. E, desse modo, os investidores
institucionais de todo o mundo aceitaram as duas mais novas “balas de prata” de
Wall Street que prometiam altos retornos com baixo risco: a securitização e os
investimentos estruturados.
Superficialmente, esses investimentos faziam sentido. Prometiam retornos
absolutos satisfatórios, já que os retornos das compras alavancadas mais do que
pagariam o custo do capital. Os resultados seriam ótimos, desde que nada
desagradável acontecesse.
Mas, como de costume, a busca por lucro leva a erros. Os retornos esperados
pareciam bons, mas a gama de possíveis resultados incluía alguns muito
desagradáveis. O êxito de muitas técnicas e estruturas dependia de um futuro que
fosse parecido com o passado. Confiava-se em muitos “milagres modernos” que
não haviam sido testados.
“NO DIFFERENT THIS TIME” (NÃO É DIFERENTE DESTA VEZ), 17 DE DEZEMBRO DE
2007
É notável que muitos dos principais concorrentes de nossos primeiros
anos como investidores tenham deixado de ser concorrentes proeminentes (ou
tenham mesmo deixado de ser concorrentes). Enquanto algumas pessoas
foram vítimas dos erros de sua organização ou modelo de negócios, outros
desapareceram porque insistiram em buscar altos retornos em ambientes de
rendimentos baixos.
Não há como criar oportunidades de investimento quando elas não
existem. Tentar perpetuar altos rendimentos — e sacrificar todos os lucros
durante a tentativa — é a coisa mais tola que podemos fazer. Se as
oportunidades não existem, não haverá esperança que as crie.
Quando os preços estão altos, é inevitável que os retornos prospectivos
sejam baixos (e os riscos altos). Por si só, essa frase oferece muitas
orientações quanto às ações adequadas para a carteira. Como integrar essa
observação às nossas práticas?
Em 2004 escrevi um memorando intitulado “Risk and return today”
(Risco e retorno hoje). Nele, conforme descrevi no capítulo 6, expressei
minha opinião de que (a) a linha de mercado de capital naquele momento era
“baixa e plana”, o que significava que os retornos prospectivos em quase
todos os mercados estavam entre os mais baixos já testemunhados até então e
que os prêmios de risco eram os menores; e que (b), se os retornos
prospectivos aumentassem, isso aconteceria por meio da queda nos preços.
Mas a pergunta é: o que podemos fazer sobre isso? Algumas semanas
depois, sugeri algumas possibilidades:
O que fazer quando o mercado parece estar oferecendo rendimentos muito baixos?
• Investir como se os rendimentos baixos não fossem verdade — o problema
disso é que “desejar que não seja verdade, não fará com que isso se torne uma
realidade”. Simplificando, não faz sentido esperarmos por retornos tradicionais
quando os preços elevados dos ativos sugerem que isso não acontecerá. Fiquei
feliz em receber uma carta de Peter Bernstein em resposta ao meu memorando;
ele disse algo maravilhoso: “O mercado não é uma máquina muito acolhedora;
ele não lhe oferecerá rendimentos altos só porque você precisa deles”.
• Investir mesmo assim — tentando obter retornos relativos aceitáveis sob as
circunstâncias, mesmo que sejam pouco atraentes em termos absolutos.
• Investir — ignorando o risco de curto prazo e focando o longo prazo. Isso não
é irracional, especialmente quando aceitamos a ideia de que o market timing e
a alocação tática de ativos não são estratégias fáceis. Mas, antes de tomarmos
esse caminho, é preciso que nosso comitê de investimentos ou outros
interessados aceitem as perdas de curto prazo, ignorando-as.
• Cash holding (manter posição de caixa) — mas isso é difícil para as pessoas
que precisam cumprir uma certa pressuposição atuarial ou taxa de execução;
que querem que seu dinheiro esteja “totalmente empregado” em todos os
momentos; ou que ficarão desconfortáveis (ou perderão seus empregos) se
precisarem ficar apenas observando enquanto os outros ganham o dinheiro que
elas não estão ganhando.
• Concentrar os investimentos em “nichos especiais e pessoas especiais”, como
eu tenho falado sem parar nos últimos dois anos. Mas isso fica mais difícil à
medida que a carteira se torna maior. Além disso, não é nada fácil encontrar
gestores que sejam verdadeiramente talentosos, disciplinados e pacientes.
A verdade é que não há uma resposta fácil para ajudar o investidor que precisa
trabalhar com retornos prospectivos e prêmios de risco acanhados. Mas há uma
forma de agir — um erro clássico — que acredito ser a mais equivocada de todas:
a busca pelo rendimento.
Dada a atual escassez de retorno prospectivo quando investimos em ativos de
baixo risco e a grande propaganda e sensacionalismo das soluções de alto risco,
muitos investidores estão levando seu capital para investimentos mais arriscados
(ou pelo menos tradicionais). Mas (a) eles fazem investimentos mais arriscados
justamente no momento em que os retornos prospectivos desses investimentos
estão em seus níveis mais baixos; (b) aceitam maior risco em troca de incrementos
mínimos de seus rendimentos; e (c) investem hoje em coisas que recusaram (ou em
que investiram pouco) no passado, quando os retornos prospectivos eram muito
maiores. Este talvez seja o pior momento para correr maiores riscos em busca de
maior rentabilidade. Desejamos correr riscos quando outros estão fugindo dele, não
quando estão competindo conosco por maiores riscos.
“THERE THEY GO AGAIN” (LÁ VÃO ELES DE NOVO), 6 DE MAIO DE 2005
Está claro que isso foi escrito cedo demais. Maio de 2005 ainda não era o
momento perfeito para pular fora do carrossel; o momento certo ocorreu em
maio de 2007. Esse tipo de antecedência nos alerta sobre como é doloroso
estar muito à frente do próprio tempo. Dito isso, foi muito melhor ter saído
cedo, em maio de 2005, do que continuado no mercado até depois de maio de
2007.
Tentei deixar claro que o ambiente de investimentos influencia muito os
resultados. Para que consigamos obter rendimentos altos em um ambiente de
baixos retornos, devemos ter a capacidade de nadar contra a maré e encontrar
os relativamente poucos vencedores. Isso fundamenta-se em alguma
combinação entre a competência excepcional, a assunção de riscos altos e a
boa sorte.
Os ambientes de rendimentos elevados, por outro lado, oferecem
oportunidades de rendimentos generosos por meio de compras a preços
baixos, e, geralmente, seus riscos também são baixos. Nas crises de 1990,
2002 e 2008, por exemplo, não só nossos fundos ganharam retornos
extraordinariamente altos como tínhamos a sensação de que isso ocorria por
meio de investimentos nos quais a perda de dinheiro era improvável.
As melhores oportunidades de compra surgem quando os titulares de
ativos são forçados a vender; nessas crises eles estavam presentes em grande
número. De tempos em tempos, os titulares são forçados a vender por razões
como estas:
• os fundos que gerenciam sofrem retiradas;
• os ativos que têm em carteira violam diretrizes de investimentos, como
qualidade mínima de crédito ou posições máximas; e
• surgem exigências por maiores garantias (margin calls) porque o valor de
seus ativos não satisfaz os requisitos acordados em contratos com seus
credores.
Como já disse muitas vezes, o verdadeiro objetivo da gestão ativa de
investimentos é comprar coisas por menos do que valem. Isso é o que a
hipótese eficiente do mercado diz que não podemos fazer. A objeção da
teoria parece razoável: por que podemos comprar algo a preço de pechincha,
especialmente quando o potencial vendedor está bem informado e é racional?
Em geral, os vendedores equilibram o desejo de obter um bom preço e o
desejo de realizar a negociação o mais breve possível. A beleza dos
vendedores forçados é que eles não têm escolha. Eles têm uma arma apontada
para a cabeça e precisam vender, independentemente do preço. Estas últimas
três palavras — independentemente do preço — são as mais belas do mundo
quando estamos do outro lado da transação.
Quando um único titular é forçado a vender, muitos compradores estão
prontos para fazer uma oferta, de modo que a negociação pode ocorrer a um
preço apenas ligeiramente reduzido. Mas, quando o caos é generalizado,
muitas pessoas são forçadas a vender ao mesmo tempo e poucas se
encontram em posição de oferecer a liquidez necessária. As dificuldades que
obrigam a vender — queda de preços, falta de crédito, pânico das
contrapartes ou dos clientes — têm o mesmo impacto na maioria dos
investidores. Nesse caso, os preços podem ficar muito abaixo do valor
intrínseco dos ativos.
O quarto trimestre de 2008 nos oferece um excelente exemplo sobre a
necessidade de liquidez em tempos de caos. Vamos nos concentrar nas
dívidas bancárias seniores detidas pelas entidades de investimento
alavancadas. Já que essas dívidas tinham uma nota de risco elevada e que
havia bastante crédito disponível durante os anos anteriores à crise, era fácil
obter empréstimos de grandes somas que, posteriormente, alavancariam
carteiras de dívidas, ampliando os rendimentos potenciais. Geralmente, o
investidor típico concordava em aportar mais capital sempre que o preço das
garantias caía abaixo de 85% de seu valor nominal; aceitava a proposta
porque estava seguro de que, no passado, os empréstimos desse tipo nunca
haviam sido negociados muito abaixo do valor nominal.
Com a chegada da crise de crédito, tudo deu errado para os investidores
alavancados por meio de dívidas bancárias. (E como os rendimentos desses
empréstimos supostamente seguros haviam sido tão baixos até aquele
momento, quase todos os compradores tinham usado a alavancagem para
melhorar seus retornos esperados.) Os preços dos empréstimos caíram. A
liquidez secou, uma vez que grande parte das compras havia sido realizada
com fundos emprestados, a contração do mercado de crédito afetou um
grande número de titulares. À medida que o número de vendedores potenciais
aumentava vertiginosamente, os compradores com liquidez desapareciam. E
já que não havia crédito adicional disponível, também desapareceram os
novos compradores alavancados para absorver toda a venda.
Os preços caíram para 95%, depois para 90% e, finalmente, para 85% do
valor nominal. E à medida que as carteiras atingiam seu ponto crítico, os
bancos começaram a realizar as margin calls, isto é, passaram a exigir um
novo aporte de capital ou aumento das garantias. Poucos investidores tinham
os recursos e a coragem necessários para fazer aportes de capital nesse
ambiente, de modo que os bancos assumiram as carteiras e as liquidaram.
BWIC (pronunciado “bi-uik”, acrônimo de bid wanted in competition, isto é,
solicitação de ofertas em concorrência) passou a ser um processo de uso
comum. Os investidores eram informados de uma BWIC à tarde e
convidados a fazer suas ofertas de compra em um leilão que ocorreria na
manhã seguinte. Os poucos compradores que podiam fazer ofertas davam
lances baixos, esperando conseguir verdadeiras pechinchas (ninguém
precisava se preocupar com os lances muito baixos, já que tinham certeza de
que seriam convidados para outra BWIC depois daquela). Além disso, não
era preocupação dos bancos obter preços justos; tudo o que precisavam era de
rendimentos suficientes para cobrir seus empréstimos (talvez 75% ou 80% do
valor nominal). Todo valor acima disso era do investidor, mas os bancos não
estavam se importando em gerar nada para eles. Dessa forma, as BWICs
ocorriam a preços incrivelmente baixos.
Em um dado momento, os preços dos empréstimos chegaram a 60%, e
todos os titulares de créditos de curto prazo que não puderam aportar o
capital adicional foram provavelmente excluídos do sistema. Os preços de
venda eram ridículos. As quedas dos índices das dívidas seniores em 2008
excederam as quedas dos índices dos títulos subordinados de alto rendimento,
certamente sinalizando uma ineficiência. Era possível comprar um dívida
com garantia real a preços que atingiriam o equilíbrio entre perdas e ganhos
mesmo se a empresa emissora valesse entre 20% e 40% do que um fundo de
aquisições do tipo buyout havia pagado por ela apenas um ano ou dois antes.
Os rendimentos esperados eram muito grandes e, na verdade, muitos desses
títulos ficaram extremamente valorizados em 2009.
Esse foi o momento de o investidor, oportunista e paciente, dar um passo à
frente. Os que mais aproveitaram foram aqueles que estavam cientes dos
riscos em 2006 e 2007 e que se mantiveram cautelosos, aguardando por uma
oportunidade.
Durante uma crise, é importante ficarmos (a) longe das forças que nos
façam vender e (b) bem posicionados para sermos compradores. Para
satisfazer esses critérios, o investidor precisa do seguinte: confiança firme no
valor do ativo, nenhuma (ou pouca) alavancagem, capital de longo prazo e
estômago forte. O oportunismo paciente, reforçado pelo ponto de vista
contrário e por um balanço patrimonial sólido, é capaz de produzir lucros
incríveis durante os períodos de crise.
14
O mais importante é… saber o que não sabemos
Temos dois tipos de pessoas que fazem prognósticos: aquelas
que não sabem e aquelas que não sabem que não sabem.
JOHN KENNETH GALBRAITH
É assustador imaginar que não sabemos algo, mas mais
assustador ainda é imaginar que, em geral, o mundo é dirigido
por pessoas que acreditam saber exatamente o que está
acontecendo.
AMOS TVERSKY
Há dois tipos de pessoas que perdem dinheiro: aqueles que não
sabem nada e aqueles que sabem tudo.
HENRY KAUFMAN
Escolhi apenas três epígrafes para abrir este capítulo; eu poderia citar mais
um milhão de outras semelhantes a essas. Estar consciente dos limites de
nosso conhecimento sobre o futuro é um componente essencial de minha
abordagem de investimentos.
Estou bastante convencido de que (a) é difícil saber o que o futuro
macroeconômico nos reserva e (b) que poucas pessoas têm conhecimentos
incomparáveis sobre esses assuntos que lhes garantam alguma vantagem
regular no mundo dos investimentos. Há duas ressalvas, no entanto:
• quanto mais nos concentramos em fatos menores, mais conseguimos obter
alguma vantagem informacional. Com trabalho duro e competência,
podemos saber de forma confiável mais do que nosso colega sobre
empresas e ativos específicos, mas isso é muito menos provável de ocorrer
em relação aos mercados e às economias. Assim, sugiro que as pessoas
tentem “saber o que é possível saber”; e
• há uma exceção relativa a uma sugestão feita por mim, e que será
explicitada no próximo capítulo; acredito que os investidores devem tentar
descobrir, em termos de ciclos e pêndulos, onde se encontram em um
dado momento. Isso não os fará prever o exato momento das reviravoltas
futuras, mas poderá prepará-los para esses eventos prováveis.
Não tentarei provar minha alegação de que o futuro é desconhecido. Não
se pode provar uma frase negativa, o que certamente inclui a minha. No
entanto, ainda não conheci ninguém que saiba de forma fiel o que está por vir
em termos macroeconômicos. Dentre todos os economistas e estrategistas
que você segue, há alguém que esteja certo na maioria das vezes?
Minhas “pesquisas” sobre esse assunto (e uso aspas porque meus esforços na
área são muito limitados e anedóticos para serem chamados de pesquisas
sérias) consistem principalmente em ler previsões e observar sua falta de
utilidade. Escrevi dois memorandos sobre isso, “The value of predictions, or
where’d all this rain come from?” (O valor das previsões, ou de onde veio
essa chuva toda?, 15 de fevereiro de 1993) e “The value of prediction II, or
give that man a cigar” (O valor das previsões II, ou dê um charuto àquele
homem, 22 de agosto de 1996). No segundo memorando, usei dados de três
pesquisas econômicas semestrais do The Wall Street Journal para examinar a
utilidade das previsões.
Em primeiro lugar, será que as previsões eram, em geral, precisas? A
resposta: não, obviamente. Na média, as previsões para a taxa de juros das
letras do tesouro de 90 dias, a taxa dos títulos de trinta anos e a taxa de
câmbio iene/dólar para os seis e doze meses seguintes tiveram um erro
superior a 15%. A previsão da taxa de juros dos títulos de longo prazo seis
meses depois apresentou erro de 96 pontos-base (basis points, em inglês) —
uma divergência suficientemente grande para transformar o valor de um título
de 1.000 dólares em 120 dólares.
Em segundo lugar, será que as previsões têm algum valor? As previsões se
mostram muito úteis quando são capazes de antecipar corretamente as
mudanças. Se alguém prevê que algo não vai mudar e esse algo realmente
não muda, é provável que esse tipo de previsão não gere muito dinheiro para
quem a realizou. Entretanto, prever com precisão as mudanças pode ser muito
lucrativo. Nas pesquisas do jornal, percebi que os prognósticos deixaram de
prever várias mudanças importantes (quando previsões precisas teriam
ajudado as pessoas a ganhar dinheiro ou evitar perdas): os aumentos das taxas
de juros de 1994 e 1996, o declínio da taxa em 1995 e as revoluções
gigantescas da relação dólar/iene. Em resumo, simplesmente não havia muita
correlação entre as mudanças previstas e as mudanças reais.
Em terceiro lugar, qual era a fonte das previsões? A resposta aqui é
simples: a maioria das previsões consistia em extrapolações. Na média, as
previsões estavam até 5% acima ou abaixo dos níveis avaliados no momento
em que foram feitas. Como muitos que fazem previsões, esses economistas
estavam dirigindo com os olhos colados no retrovisor e, assim, podiam dizer
onde as coisas estiveram até aquele ponto, mas não para onde iam. Isso
remonta a um velho adágio: “é difícil fazer previsões precisas, especialmente
no que diz respeito ao futuro”. Seu corolário também é verdadeiro: prever o
passado é muito fácil.
Em quarto lugar, as pessoas que faziam previsões estiveram certas em
algum momento? A resposta é um sim forte. Por exemplo, nas previsões
semestrais, alguém sempre acertava precisamente o rendimento dos títulos de
trinta anos com erro de 10 ou 20 pontos-base, mesmo quando as taxas de
juros mudavam radicalmente. Essa previsão era muito mais precisa do que a
do consenso, cujo erro ficava entre 70 e 130 pontos-base.
Em quinto lugar, se as pessoas às vezes acertavam de forma tão dramática,
então por que ainda somos tão negativos em relação às previsões? Porque, ao
realizá-las, o importante não é acertar uma vez, mas acertar de forma
consistente.
O memorando que escrevi em 1996 continuava assim: “duas coisas podem
nos levar a pensar duas vezes antes de darmos ouvidos àqueles que fizeram
previsões corretas”. Primeiro, eles, em geral, não conseguiram fazer
previsões precisas em outras pesquisas, apenas naquela que acertaram. E,
segundo, nas previsões que não acertaram, pelo menos metade delas estava
muito mais errada que as previsões do consenso. A coisa mais importante, é
claro, não são os dados, mas as conclusões (supondo que estejam corretas e
possam ser generalizadas) e suas ramificações.
Uma maneira de estar certo é seguir sempre apenas uma tendência, seja a altista ou
a baixista; se mantivermos uma visão única por bastante tempo, cedo ou tarde
acabamos acertando. E se fizermos apenas previsões que estejam fora da curva, é
possível que sejamos aplaudidos por alguma previsão pouco convencional que
tenha enxergado corretamente o que ninguém mais conseguiu. Mas isso não
significa que essas previsões possuam regularmente algum valor…
É possível estar certo sobre o futuro macroeconômico de vez em quando, mas não
de forma regular. Não adianta ter acesso a um levantamento de 64 previsões que
incluam algumas corretas; é preciso saber quais estão certas. E se as previsões
corretas forem feitas a cada seis meses por diferentes economistas, será difícil
acreditar que haja algum valor nas previsões coletivas.
“THE VALUE OF PREDICTION II, OR GIVE THAT MAN A CIGAR” (O VALOR DAS
PREVISÕES II, OU DÊ UM CHARUTO ÀQUELE HOMEM), 22 DE AGOSTO DE 1996
A discussão sobre previsões nos sugere um dilema: os resultados dos
investimentos serão inteiramente determinados pelo que acontece no futuro e,
embora consigamos saber, na maior parte do tempo, o que aconteceria
quando as coisas ocorressem de forma “normal”, não somos capazes de saber
o que vai acontecer naqueles momentos em que esse conhecimento faria toda
diferença.
• Na maior parte do tempo, as pessoas preveem um futuro muito parecido
com o passado recente.
• Elas não estão necessariamente erradas: na maioria das vezes, o futuro é
em grande parte uma reprise do passado recente.
• Com base nesses dois pontos, é possível concluir que as previsões estarão
corretas na maior parte do tempo: em geral, elas extrapolam a experiência
recente e são precisas.
• No entanto, as muitas previsões que extrapolam corretamente a
experiência passada têm pouco valor. Assim como as pessoas que fazem
previsões costumam supor um futuro muito parecido com o passado, os
mercados fazem o mesmo e costumam precificar pressupondo a
continuidade do histórico mais recente. Assim, se o futuro for como o
passado, é improvável que as pessoas ganhem muito dinheiro, mesmo
aquelas que fizeram uma previsão acertada.
• De vez em quando, no entanto, o futuro acaba sendo muito diferente do
passado.
• É nesses momentos que as previsões precisas teriam muito valor.
• É também nesses momentos que as previsões costumam estar incorretas.
• Algumas previsões podem estar corretas nesses momentos cruciais,
sugerindo a possibilidade de se prever corretamente certos eventos
essenciais, mas é improvável que as mesmas pessoas tenham tido
antevisões como essas de forma consistente.
• A discussão sugere que, ao final, as previsões têm pouquíssimo valor.
Caso o leitor precise de provas, pergunte a si mesmo quantas pessoas
previram corretamente o problema do subprime, a crise global de crédito e o
gigantesco colapso de 2007-2008. Talvez você encontre algumas pessoas e
conclua que as previsões desses indivíduos eram valiosas. Mas, então,
pergunte a si mesmo quantos desses poucos foram capazes de prever a
recuperação econômica que começou lentamente em 2009 e a enorme
retomada do mercado naquele ano. Penso que a resposta seja:
“pouquíssimos”.
E isso não é um acidente. Aqueles que acertaram sobre a crise de 2007 e
2008 provavelmente o fizeram, pelo menos em parte, por causa de sua
tendência pessimista; provavelmente continuaram pessimistas em relação a
2009. Por isso, a utilidade geral dessas previsões não foi boa, mesmo tendo
antecipado corretamente alguns dos eventos financeiros mais importantes dos
últimos oitenta anos.
Então a questão mais importante não é saber se as previsões acertam de
vez em quando. A pergunta mais importante é: será que as previsões, como
um todo (ou previsões individuais de uma pessoa qualquer) são úteis e
valiosas de forma consistente? Ninguém deve apostar muito em uma resposta
afirmativa.
Em 2007-2008, a previsão de uma crise global teria sido extremamente
valiosa. Entretanto, será que teríamos tomado alguma atitude se víssemos que
a previsão vinha de alguém sem histórico consistente de acertos, alguém com
um viés pessimista visível? Esse é o problema quando as pessoas que fazem
as previsões são inconsistentes: não que elas nunca estejam certas, mas o
histórico de suas elucubrações não é suficientemente positivo para inspirar
confiança e nos levar a agir.
Não é segredo que não tenho uma opinião muito boa sobre as pessoas que
fazem previsões e sobre aquelas que acreditam piamente nelas. Por isso, dei
um apelido para essas pessoas.
A maioria dos investidores que conheci ao longo dos anos pertence à escola do “eu
sei”. É fácil identificá-los:
• eles acreditam que, para fazer bons investimentos, é essencial conhecer a
direção futura das economias, as taxas de juros, os mercados e as ações
tradicionais amplamente seguidas;
• garantem que é possível conhecer tudo isso;
• sabem que eles conseguem;
• estão cientes de que muitas outras pessoas estão tentando fazer o mesmo, mas
acreditam que ou (a) todos podem ganhar ao mesmo tempo ou (b) apenas
alguns podem, incluindo eles;
• sentem-se confortáveis ao investir com base em suas próprias opiniões sobre o
futuro;
• gostam muito de compartilhar suas opiniões com os outros, mesmo sabendo
que as previsões corretas são tão valiosas que ninguém as entregaria de graça;
• raramente analisam suas previsões para avaliar rigorosamente seu histórico de
acertos e erros.
Confiança é a palavra-chave para descrever os membros dessa escola. Para a
escola do “eu não sei”, por outro lado, a palavra-chave, especialmente quando se
lida com o futuro macroeconômico, é cautela. Seus adeptos geralmente acreditam
ser impossível conhecer o futuro, que não precisam saber o que o futuro nos
reserva e que o objetivo mais apropriado do investidor é realizar o melhor trabalho
possível sem nenhum conhecimento prévio sobre o futuro.
Como membro da escola do “eu sei”, as pessoas podem opinar sobre o futuro (e
talvez outras pessoas tomem notas). Você pode ser procurado por suas opiniões e
ser considerado como um convidado desejável para o jantar (…) especialmente
quando o mercado de ações está subindo.
Junte-se à escola do “eu não sei” e os resultados serão mais variados. Logo se
cansará de dizer “eu não sei” para amigos e estranhos. Depois de um tempo, até os
parentes vão parar de perguntar sua opinião sobre os caminhos do mercado. Nunca
desfrutará daquele momento incrível em que sua previsão estará correta e o The
Wall Street Journal publicará sua foto. Por outro lado, entretanto, será poupado de
todos os momentos em que as previsões erraram, bem como das perdas que podem
ocorrer quando se investe com base em um conhecimento superestimado do futuro.
“US AND THEM” (NÓS E ELES), 7 DE MAIO DE 2004
Ninguém gosta de investir no futuro sabendo que o futuro é em grande
parte desconhecido. Por outro lado, se for assim, será melhor aceitarmos a
situação e buscarmos outra maneira de lidar com o problema que não seja por
meio das previsões. É muito melhor reconhecer e acomodar as limitações que
nos são impostas no mundo dos investimentos do que negá-las e seguir
adiante.
Ah, sim, mais uma coisa: os maiores problemas tendem a surgir quando os
investidores esquecem a diferença entre probabilidade e resultado, ou seja,
quando se esquecem dos limites das previsões:
• quando acreditam que a forma da distribuição de probabilidade é um dado
conhecido e certo (e que sabem disso);
• quando presumem que o resultado mais provável é o que vai acontecer;
• quando presumem que o resultado esperado representa o resultado real
com precisão; ou,
• talvez o mais importante, quando ignoram a possibilidade de resultados
improváveis.
Os investidores imprudentes que ignoram essas limitações tendem a
cometer erros em suas carteiras e, ocasionalmente, sofrem enormes perdas.
Essa é a história do que ocorreu entre 2004 e 2007: muitas pessoas
superestimaram até que ponto os resultados eram conhecidos e controláveis e
subestimaram o risco presente nas coisas que faziam.
Saber se as tentativas de prever o futuro vão (ou não) funcionar não é apenas
uma questão de mera curiosidade ou reflexão acadêmica. Isso tem, ou deveria
ter, consequências importantes em relação ao comportamento dos
investidores. Quando nos comprometemos em uma atividade que envolve
decisões com consequências para o futuro, parece bastante óbvio agir de uma
forma se acreditamos que o futuro pode ser previsto e de outra se acreditamos
que não pode.
Uma pergunta fundamental que os investidores precisam responder a si mesmos é
se, para eles, o futuro é um dado conhecido ou desconhecido. Os investidores que
acreditam saber o que o futuro reserva agirão de forma assertiva: farão apostas
numa direção, concentrarão suas posições, alavancarão suas participações e
contarão com crescimento futuro — ou seja, farão coisas que, na ausência de uma
previsão, aumentariam o risco. Por outro lado, aqueles que acreditam não saber o
que o futuro reserva agirão de forma bem diferente: diversificarão, farão hedge dos
riscos, farão menos dívidas (ou não as farão), darão maior prioridade ao valor
presente e não ao crescimento futuro, manterão uma estrutura de capital saudável
e, geralmente, se prepararão para uma variedade de resultados possíveis.
O primeiro grupo de investidores se saiu muito melhor nos anos que antecederam a
crise. Mas o segundo grupo estava mais bem preparado para a crise e tinha mais
capital disponível (e estava psicologicamente mais intacto) para poder lucrar com
compras a preços muito baixos.
“TOUCHSTONES” (CRITÉRIOS), 10 DE NOVEMBRO DE 2009
Quem diz conhecer o futuro não precisa jogar na defensiva. E, assim, deve
comportar-se com agressividade e buscar as tacadas certeiras, pois não deve
temer a perda. A diversificação é desnecessária e pode-se empregar o
endividamento (alavancagem) máximo. Na verdade, ser indevidamente
modesto sobre o que sabe pode resultar em custos de oportunidade (lucros
que se deixa escapar).
Por outro lado, quem não sabe o que o futuro reserva não age como se
soubesse, pois isso seria imprudente. Se voltarmos a Amos Tversky e à
poderosa citação que abriu este capítulo, veremos que a conclusão é bastante
clara. Investir em um futuro desconhecido como agnóstico é uma perspectiva
assustadora, mas, se a possibilidade de previsão é pouco confiável, investir
como se o futuro fosse um dado conhecido é uma loucura. Talvez Mark
Twain1 tenha dito isso melhor: “O que nos põe em apuros não são as coisas
que não sabemos. São aquelas que, mesmo não sendo verdadeiras, temos
certeza de que são.”.
Superestimarmos o que somos capazes de saber ou fazer pode ser
extremamente perigoso — seja em uma operação de cérebro, seja em uma
corrida transoceânica, seja na realização de investimentos. Reconhecermos os
limites do que somos capazes de saber — e trabalharmos dentro desses
limites em vez de nos aventurarmos em águas desconhecidas — pode nos dar
uma grande vantagem.
15
O mais importante é… entender nossa posição
Talvez nunca saibamos para onde vamos, mas é melhor termos
uma boa ideia de onde estamos.
Os ciclos do mercado apresentam ao investidor um desafio assustador, dado
que:
• seus altos e baixos são inevitáveis;
• influenciam profundamente nosso desempenho como investidores;
• são imprevisíveis quanto ao tamanho e, especialmente, em relação ao
momento em que podem ocorrer.
Precisamos, assim, lidar com uma força que causará grande impacto e que
é em grande parte desconhecida. Então, o que devemos fazer a respeito dos
ciclos? Essa é uma questão de importância vital cujas respostas óbvias —
como de costume — não são as certas.
A primeira possibilidade é que, em vez de aceitar a imprevisibilidade dos
ciclos, devemos redobrar nossos esforços para prever o futuro, dedicando
mais recursos à batalha e apostando cada vez mais em nossas conclusões.
Mas um volume gigantesco de dados (e toda a minha experiência) me diz que
a única coisa que podemos prever sobre os ciclos é que são inevitáveis. Além
disso, no mundo dos investimentos, para obter resultados ótimos, precisamos
saber mais que os outros; e, até o momento, ninguém conseguiu me mostrar
de forma satisfatória que há pessoas que saibam mais do que o consenso
sobre o momento exato e o tamanho dos ciclos futuros.
A segunda possibilidade é aceitar que o futuro é um dado desconhecido,
levantar as mãos e simplesmente ignorar os ciclos. Em vez de tentar prevêlos, podemos tentar fazer bons investimentos e mantê-los durante os ciclos. Já
que não temos como saber se devemos manter uma quantidade maior ou
menor, ou quando nossa postura de investimento deve se tornar mais
agressiva ou mais defensiva, podemos simplesmente investir, ignorando
completamente os ciclos e seus profundos impactos. Essa estratégia é
chamada de compre e mantenha (buy and hold).
No entanto, há uma terceira possibilidade que é de longe, em minha
opinião, a mais correta. Por que não tentar simplesmente descobrir em que
ponto do ciclo nos encontramos e o que isso significa para nossas ações?
No mundo dos investimentos (…) nada é tão confiável quanto os ciclos. Os
fundamentos, os fatores psicológicos, os preços e os rendimentos aumentarão e
diminuirão, apresentando oportunidades de cometer erros ou lucrar com os erros
dos outros. Estes são os fatos conhecidos.
Não temos como saber qual será o alcance de uma tendência, quando ela mudará
de direção, o que a fará parar e mudar ou qual será o alcance máximo na direção
oposta. Mas tenho certeza de que, cedo ou tarde, todas as tendências atingem um
ponto de parada. Nada dura para sempre.
Então, o que podemos fazer sobre os ciclos? Se não podemos saber com
antecedência como e quando as curvas ocorrerão, como devemos lidar com isso?
Sou dogmático em relação a esse tema: talvez nunca saibamos para onde vamos,
mas é melhor termos uma boa ideia de onde estamos. Ou seja, mesmo que não
possamos prever o momento e o tamanho das flutuações cíclicas, é essencial que
nos esforcemos para determinar em que ponto do ciclo nos encontramos e agir de
acordo com esse dado.
“IT IS WHAT IT IS” (É O QUE É), 27 DE MARÇO DE 2006
Seria maravilhoso podermos prever com êxito as oscilações do pêndulo e sempre
nos movermos na direção apropriada, mas esta é certamente uma expectativa irreal.
Considero muito mais razoável (a) ficarmos atentos para as ocasiões em que um
mercado tenha atingido uma extremidade; (b) ajustarmos nosso comportamento
como resposta; e (c), o mais importante, não aceitarmos o comportamento do
rebanho que leva tantos investidores a tomar decisões erradas nas altas e nas
baixas.
“FIRST QUARTER PERFORMANCE” (DESEMPENHO DO PRIMEIRO TRIMESTRE), 11 DE
ABRIL DE 1991
Não estou sugerindo que, se descobrirmos o ponto do ciclo em que nos
encontramos, saberemos exatamente o que está por vir. Mas acredito que esse
conhecimento poderá nos oferecer uma percepção valiosa dos eventos futuros
e da forma de lidar com eles; isso é tudo o que podemos esperar.
Quando digo que é possível conhecermos nossa posição atual (ao contrário da
posição futura), não quero insinuar que esse entendimento será automático.
Como quase tudo no mundo dos investimentos, isso demanda muito trabalho.
É, porém, factível. Eis alguns conceitos que considero essenciais para esse
esforço.
Primeiro, devemos estar alertas para o que está acontecendo. O filósofo
Santayana disse que “aqueles que não se lembram do passado estão
condenados a repeti-lo”. Da mesma forma, acredito que aqueles que não
estão cientes do que está acontecendo ao seu redor estão destinados a ser
esbofeteados pelos acontecimentos.
Por mais difícil que seja conhecer o futuro, não é tão difícil entender o
presente. Para isso, precisamos “tirar a temperatura do mercado”. Quando
estamos alertas e perceptivos, podemos medir o comportamento das pessoas
ao nosso redor e, a partir disso, julgar o que devemos fazer.
O ingrediente essencial aqui é a inferência, uma de minhas palavras
favoritas. Todos nós temos notícias sobre os acontecimentos diários,
conforme relatados pela mídia. Mas quantas pessoas se esforçam para
entender o que esses eventos cotidianos dizem sobre a mentalidade dos
participantes do mercado, sobre o clima dos investimentos e, portanto, sobre
o que devemos fazer em resposta?
Simplificando, devemos nos esforçar para entender as implicações dos
acontecimentos de nosso entorno. Quando os outros são imprudentemente
confiantes e estão comprando de forma agressiva, devemos ser extremamente
cautelosos; quando os outros estão paralisados de medo ou vendendo com
base no pânico, devemos nos tornar agressivos.
Então, devemos olhar ao redor e nos perguntar: os investidores estão
otimistas ou pessimistas? Os líderes midiáticos dizem que é hora de entrar ou
fugir dos mercados? As novas estratégias de investimento estão sendo
prontamente aceitas ou descartadas imediatamente? As ofertas de ativos e
aberturas de fundos estão sendo tratadas como oportunidades para enriquecer
ou possíveis armadilhas? O ciclo de crédito tem facilitado ou impossibilitado
a disponibilização de capital? Os quocientes preço/lucro estão altos ou baixos
em relação aos dados históricos, e os spreads de rendimento estão pequenos
ou grandes? Todos esses fatores são importantes e, ainda assim, nenhum
deles implica uma previsão. É possível tomarmos decisões de investimento
excelentes com base nas observações atuais sem precisarmos dar palpites
sobre o futuro.
Para isso, devemos anotar esses fatores citados e deixá-los nos dizer o que
fazer. Enquanto os mercados não requerem nossa ação diária com base nesses
fatores, eles o fazem em suas extremidades, quando os dados coletados se
tornam muito importantes.
Os anos de 2007 e 2008 podem ser vistos como um momento doloroso para
os mercados e seus participantes, ou como a maior experiência de
aprendizado de nossas vidas. Foram, obviamente, as duas coisas, mas a
primeira não nos oferece muita ajuda. Já o entendimento da segunda pode nos
tornar melhores investidores. Não há exemplo melhor do que a devastadora
crise de crédito para ilustrar a importância de efetuar observações precisas
sobre o presente e a loucura de tentar prever o futuro. E merece uma
discussão detalhada.
É óbvio, em retrospectiva, que meados de 2007, o período que antecedeu
o início da crise financeira, foi uma época em que os investidores assumiam
riscos desenfreados e inconscientes. Estavam descrentes em relação aos
títulos e às ações e, por isso, o dinheiro passou a frequentar “investimentos
alternativos”, como o private equity ou buyout em quantidades que bastavam
para condená-los ao fracasso. Aceitava-se de forma inquestionável a proposta
de que casas e outros bens imóveis proporcionariam lucros seguros e
proteção contra a inflação. Assim, o acesso extremamente fácil ao crédito, as
baixas taxas de juros e as poucas exigências incentivaram o uso do
endividamento (alavancagem) em níveis que se mostraram excessivos.
Conhecer o risco após o fato já ter ocorrido não nos ajuda muito. A
questão é saber se a atenção e a inferência teriam nos ajudado a evitar a mão
pesada dos declínios do mercado ocorridos em 2007-2008. Eis alguns dos
indicadores de aquecimento que percebemos:
• A emissão de títulos de alto rendimento e empréstimos alavancados de
baixa qualidade creditícia estava em níveis recordes por amplas margens.
• Uma gigantesca porcentagem dos títulos de alto rendimento emitidos tinha
nota de risco CCC, uma classificação de crédito que, em geral, não
permite que os títulos sejam vendidos em grandes quantidades.
• As empresas se endividavam, de forma rotineira, para pagar dividendos
aos seus acionistas. Em períodos normais, essas transações, que aumentam
o risco dos emissores e nada faz pelos credores, são mais difíceis de serem
efetuadas.
• Emitia-se cada vez mais títulos de dívidas com cupons que podiam ser
pagos por meio de outros títulos de dívidas, e a fixação de poucos ou
nenhum covenant1 para proteger os credores.
• As anteriormente raras notas de crédito AAA para títulos de dívidas eram
agora atribuídas aos milhares a veículos estruturados ainda não testados.
• As compras do tipo buyout eram realizadas em múltiplos do fluxo de caixa
e níveis de alavancagem cada vez maiores. Em média, as empresas de
private equity pagaram 50% a mais por cada dólar de fluxo de caixa em
2007 com relação a 2001.
• Foram realizados buyouts em setores altamente cíclicos, como o de
fabricação de semicondutores. Em períodos de maior ceticismo, os
investidores não gostam muito de combinar alavancagem e atividades
cíclicas.
Levando todas essas coisas em consideração, foi possível realizar uma
inferência clara: os provedores de capital estavam competindo para fazê-lo,
facilitando suas condições e taxas de juros em vez de exigir proteção e
recompensas potenciais adequadas. As sete palavras mais assustadoras do
mundo para o investidor atencioso — muito dinheiro em busca de
pouquíssimos negócios — definem muito bem as condições do mercado
naquele momento.
É possível perceber quando há muito dinheiro competindo para ser
aplicado. Há um aumento do número de negócios que estão sendo feitos,
aumenta também a facilidade de se fazer negócios; o custo do capital
diminui; e o preço do ativo que está sendo negociado sobe a cada transação
sucessiva. Uma torrente de dinheiro é o que faz tudo isso acontecer.
Se o objetivo do fabricante de carros é vender mais a longo prazo, ou seja,
aumentar seu market share (participação de mercado) à custa de seus concorrentes,
ele precisará melhorar o seu produto. É por isso que (de uma maneira ou de outra)
o discurso de venda, em sua maior parte, diz “o nosso produto é melhor”. No
entanto, existem produtos que não podem ser diferenciados; os economistas os
chamam de commodities. São bens em que as qualidades ofertadas por um
vendedor não são muito diferentes daquelas ofertadas por outro qualquer. Elas
tendem a ser negociadas apenas por seu preço, sendo que os compradores
provavelmente aceitarão a oferta que tiver o menor preço. Assim, se você é
negociante de commodities e deseja vender mais, há, em geral, uma maneira de
fazer isso: baixar o preço…
Pode ser bastante útil pensar no dinheiro como uma outra commodity qualquer. O
dinheiro de qualquer um de nós é praticamente o mesmo. No entanto, as
instituições buscam aumentar seu volume de empréstimos, bem como os fundos de
private equity e os hedge funds que buscam aumentar suas comissões; todos
querem movimentar mais dinheiro. Então, quando queremos emprestar mais
dinheiro — ou seja, fazer com que as pessoas nos procurem, e não nossos
concorrentes, para obter empréstimos —, ele precisará ser mais barato.
Uma maneira de baixar o preço de nosso dinheiro é por meio da redução da taxa de
juros dos empréstimos. Uma maneira um pouco mais sutil é concordar com um
preço mais alto pelo que estamos comprando, por exemplo, pagando um quociente
preço/lucro mais alto por uma ação ordinária ou, ao comprarmos uma empresa, um
preço total de transação maior. Seja como for, acabamos aceitando um retorno
prospectivo menor.
“THE RACE TO THE BOTTOM” (A CORRIDA ATÉ O FUNDO), 17 DE FEVEREIRO DE 2007
Uma tendência que os investidores poderiam ter observado durante esse
período perigoso, se estivessem alertas, seria o movimento ao longo do
espectro que vai do ceticismo até a credulidade em relação ao que descrevi
anteriormente como a bala de prata ou investimento imperdível. Os
investidores sensatos poderiam ter notado que o apetite por balas de prata
estava aumentando, o que significa que a ganância havia vencido o medo e
que estavam diante de um mercado em que o ceticismo estaria ausente,
portanto, em um mercado arriscado.
Na última década, os hedge funds passaram a ser vistos como
extremamente seguros, especialmente aqueles chamados de fundos de
“retorno absoluto”. Eram do tipo comprado/vendido (long/short, em inglês)
ou fundos com estratégia de arbitragem2 que não buscavam altos retornos por
meio de apostas “direcionais” sobre a tendência do mercado. Em vez disso, a
competência dos gestores ou sua tecnologia permitiria que produzissem
retornos consistentes na faixa de 8% a 11%, independentemente do caminho
tomado pelo mercado.
Pouca gente reconheceu que esse nível de retornos sólidos era um feito
admirável — talvez bom demais para ser verdade (note que isso é exatamente
o que Bernard Madoff dizia estar ganhando). Pouca gente se interessou em
saber (a) quantos gestores existiam com talento suficiente para produzir esse
tipo de milagre, especialmente após a dedução das comissões substanciais de
gestão e de performance; (b) com quanto dinheiro eles poderiam fazer isso; e
(c), em um ambiente hostil, como se comportariam essas apostas altamente
alavancadas em pequenas discrepâncias estatísticas (o difícil ano de 2008 nos
mostrou que o termo retorno absoluto foi utilizado de forma excessiva e má,
pois o fundo médio perdeu cerca de 18%).
Conforme descrito longamente no capítulo 6, ouvíamos na época que o
risco havia sido eliminado pelos mais novos e maravilhosos instrumentos
populares: securitização, tranching (dividir em camadas), selling onward,3
desintermediação e dissociação. O tranching merece atenção especial.
Consiste em alocar o valor e o fluxo de caixa de uma carteira aos investidores
em vários níveis de precedência. Os titulares do nível mais alto são os
primeiros a serem pagos; assim, desfrutam de maior segurança e aceitam
retornos relativamente baixos. Investidores do nível mais baixo estão na
posição de “primeiros a perder”. Em troca desse maior risco, desfrutam do
potencial de rendimentos maiores, constituídos pela sobra após o pagamento
dos valores fixos dos níveis mais altos.
Durante o período 2004-2007, surgiu a ideia de que o risco desapareceria
se fosse dividido em pequenas partes que seriam vendidas aos investidores
mais adequados para mantê-las. Parece mágica. Assim, não é coincidência
que as securitizações com tranching, das quais tanto se esperava, se
tornassem o foco de muitas das piores crises. Não existe nenhuma mágica no
mundo dos investimentos.
Fundos de retorno absoluto, alavancagem de baixo custo, investimentos
imobiliários sem risco e veículos de financiamento estruturado em tranches
estavam na moda. O erro de todas essas estratégias tornou-se obviamente
claro a partir de agosto de 2007. Percebeu-se que o risco não havia sido
banido e que, de fato, estava mais alto por causa da confiança excessiva e do
pouco ceticismo dos investidores.
Se os investidores estivessem atentos ao que estava acontecendo e
tivessem confiança para agir, o período de 2004 a meados de 2007 teria lhes
apresentado uma das maiores oportunidades para vencer o mercado,
reduzindo o risco deles. Tudo o que precisavam realmente fazer era medir a
temperatura do mercado durante um período superaquecido e desembarcar
enquanto a tendência de alta fosse mantida. Aqueles que conseguiram realizar
esse feito exemplificam os princípios do ponto de vista contrário, discutidos
no capítulo 11. Os investidores com ponto de vista contrário, que cortaram
seus riscos e se prepararam para a crise, perderam menos durante a crise de
2008 e estavam mais bem posicionados para aproveitar as enormes barganhas
criadas.
Há poucas áreas em que as decisões sobre estratégias e táticas não são
influenciadas pelo que vemos em nosso ambiente. O quanto pisamos no acelerador
varia, pois depende de a estrada estar cheia ou vazia. O golfista escolhe seu taco de
acordo com o vento. A roupa que vestimos para sair varia de acordo com as
condições climáticas. Nossas ações de investimento não deveriam estar igualmente
afetadas pelo clima de investimento do mercado?
A maioria das pessoas se esforça para ajustar suas carteiras com base no que
imaginam que acontecerá no futuro. Ao mesmo tempo, essa mesma maioria admite
que o futuro é pouco previsível. Por isso, acredito que devemos responder às
realidades do presente e às suas implicações, em vez de ficar esperando que o
futuro se torne mais claro.
“IT IS WHAT IT IS” (É O QUE É), 27 DE MARÇO DE 2006
GUIA DO HOMEM COMUM PARA AVALIAR O MERCADO
Aqui está um simples exercício que pode ajudá-lo a tirar a temperatura dos
mercados futuros. Listei uma série de características do mercado. Para cada par,
assinale o termo que lhe parece melhor para descrever o mercado atual. E, se
descobrir que assinalou a maioria dos termos da coluna da esquerda, faça como eu
e mantenha a cautela.
Economia:
Perspectivas:
Vibrante
Positivas
Lenta
Negativas
Credores:
Mercado de
capitais:
Capital:
Condições:
Taxas de juros:
Spread:
Investidores:
Titulares de
ativos:
Vendedores:
Mercados:
Fundos:
Ansiosos
Reticentes
Aberto
Restrito
Abundante
Fáceis
Baixas
Pequeno
Escasso
Restritivas
Altas
Grande
Otimistas
Confiantes
Ansiosos para comprar
Pessimistas
Aflitos
Desinteressados em comprar
Querem mantê-los
Querem vendê-los
Poucos
Lotados
Acesso difícil
Novos diariamente
Os sócios em nome coletivo4 dão
todas as cartas
Muitos
Buscando atenção
Aberto a qualquer um
Só os melhores obtêm dinheiro
Os sócios limitados5 têm poder
de barganha
Desempenho
Forte
recente:
Preços dos ativos: Altos
Retornos
Baixos
prospectivos:
Risco:
Alto
Agressividade
Qualidades
Alcance amplo
populares:
Fraco
Baixos
Altos
Baixo
Cautela e disciplina
Seletividade
“IT IS WHAT IT IS” (É O QUE É), 27 DE MARÇO DE 2006
O movimento dos mercados é cíclico, sobem e descem. O pêndulo oscila e
raramente para no “bom meio-termo”, no ponto médio do arco. Isso será uma
fonte de perigo ou de oportunidades? O que os investidores devem fazer
quanto a isso? Minha resposta é simples: devemos tentar descobrir o que está
acontecendo ao nosso redor e, então, usar isso para guiar nossas ações.
16
O mais importante é… apreciar o papel da sorte
De vez em quando, alguém faz uma aposta arriscada em um
resultado improvável ou incerto e acaba parecendo um gênio.
Mas devemos reconhecer que isso aconteceu por causa de sorte
e ousadia, não por habilidade.
O mundo dos investimentos não é um lugar ordenado e lógico em que o
futuro pode ser previsto e as ações específicas produzem resultados
específicos. A verdade é que muito depende da sorte. Alguns podem preferir
chamá-la de acaso ou aleatoriedade, e essas palavras soam mais sofisticadas
do que sorte. Todas, porém, se resumem ao mesmo: grande parte do sucesso
de tudo o que fazemos como investidores será fortemente influenciada pelo
lance dos dados.
Objetivando explorar a ideia de sorte por completo, utilizarei, neste
capítulo, algumas ideias expostas por Nassim Nicholas Taleb em seu livro
Iludido pelo acaso. Alguns dos conceitos aqui explorados já haviam ocorrido
a mim antes de lê-lo, mas o livro de Taleb reuniu todos e acrescentou outros.
Considero-o um dos livros mais importantes para os investidores. Tomei
algumas das ideias de Taleb emprestadas para um memorando de 2002
intitulado “Returns and how they get that way” (Rendimentos e como se
tornam o que são), que incorporou trechos de Iludido pelo acaso,
representados a seguir em itálico.
O acaso (ou a sorte) desempenha um papel importante nos resultados da vida, e as
consequências que decorrem de eventos aleatórios devem ser vistas como
diferentes daquelas que não o são.
Assim, ao considerar se o histórico de um investimento poderá se repetir, é
importante pensarmos sobre o papel do acaso nos resultados do gestor, e se o bom
desempenho é resultado de sua competência ou se ele apenas teve sorte.
Ganhar 10 milhões na roleta-russa não tem o mesmo valor que ganhar 10
milhões pela prática diligente e habilidosa da odontologia. O valor ganho é o
mesmo e pode comprar os mesmos bens, contudo, um depende muito mais do
acaso do que o outro. Para o seu contador, porém, eles seriam idênticos… No
fundo, não posso deixar de considerá-los como qualitativamente diferentes.
Todos os históricos devem ser considerados à luz dos outros resultados possíveis
— Taleb os chama de “histórias alternativas” — que poderiam ter facilmente
ocorrido da mesma forma que as “histórias visíveis”.
Claramente a forma como julgo as questões é probabilística por natureza; se
baseia na noção do que poderia ter acontecido…
Se já ouvimos falar [dos grandes generais e inventores da história], é
simplesmente porque eles assumiram riscos consideráveis, como milhares de
outros, e acabaram vencendo. Eram pessoas inteligentes, corajosas, nobres (às
vezes) e tinham a melhor educação possível de sua época — mas as outras
milhares de pessoas, que hoje vivem nas notas de rodapé bolorentas da
história, também possuíam as mesmas qualidades.
De vez em quando, alguém faz uma aposta arriscada em um resultado improvável
ou incerto e acaba parecendo um gênio. Mas devemos reconhecer que isso
aconteceu por causa de sorte e ousadia, não por habilidade.
Pense em um jogador agressivo de gamão que só poderá ganhar se conseguir um
duplo seis nos dados, cuja probabilidade de acontecer é de uma em cada 36. O
jogador aceita os dados, dobrando a aposta; em seguida, lança-os, obtendo um
duplo seis. Poderia ter sido uma aposta imprudente, mas, como ele saiu vitorioso,
todos consideram o jogador brilhante. Deveríamos imaginar qual seria a
probabilidade de ele ter obtido algo que não fosse o duplo seis e, portanto, na sorte
que o jogador precisou ter para vencer. Isso diz muito sobre a probabilidade de o
jogador voltar a ganhar…
A curto prazo, os êxitos em relação aos investimentos podem ser apenas o
resultado de estar no lugar certo na hora certa. Eu sempre digo que, para obter
lucro, precisamos de agressividade, tempo e habilidade, e que alguém bastante
agressivo na hora certa não precisa de muita habilidade.
Em um dado momento nos mercados, os gestores mais rentáveis serão
provavelmente aqueles que mais se adequaram ao ciclo mais recente. Isso não
costuma ocorrer com dentistas ou pianistas — devido à natureza do acaso.
A maneira mais fácil de ver isso é notar que, em períodos de prosperidade, os
maiores retornos encontram, muitas vezes, aqueles que assumem maiores riscos.
Isso nada diz sobre o fato de essas pessoas serem melhores investidores.
O apêndice de Warren Buffett para a quarta edição revisada de O investidor
inteligente (livro de Benjamin Graham) descreve um concurso em que cada um dos
225 milhões de americanos começa com 1 dólar e lança uma moeda uma vez por
dia. As pessoas que acertam no primeiro dia recolhem um dólar daqueles que
erraram; é feito um novo lançamento no segundo dia, e assim por diante. Dez dias
depois, 220 mil pessoas acertaram dez vezes seguidas e ganharam 1.000 dólares.
“Talvez tentem ser modestas, mas, nas festas, admitirão ocasionalmente, aos
membros atraentes do sexo oposto, suas técnicas e os maravilhosos insights que
podem oferecer para o estudo do lançamento de moedas.” Depois de mais dez dias,
estamos com 215 sobreviventes que acertaram vinte vezes seguidas e ganharam 1
milhão de dólares cada. Essas pessoas escrevem livros intitulados “Como
transformei um dólar em um milhão em vinte dias trabalhando trinta segundos por
manhã” e passam a ganhar dinheiro com palestras. Soa familiar?
Assim, o acaso destrói ou contribui para o histórico de resultados de um
investimento a um grau que poucas pessoas chegam a apreciar plenamente. Como
resultado, subestimam os perigos que se escondem atrás de estratégias que, até
agora, funcionaram bem.
Talvez uma boa maneira de resumir as opiniões de Taleb seja por meio de um
quadro de seu livro. Ele lista, na primeira coluna, uma série de aspectos que podem
ser facilmente confundidos com os aspectos da segundo coluna.
Sorte
Acaso
Probabilidade
Crença, conjectura
Teoria
Anedota, coincidência
Viés de sobrevivência
Tolos sortudos
Habilidade
Determinismo
Certeza
Conhecimento, certeza
Realidade
Causalidade, lei
Grandes rendimentos
Investidor qualificado
Acredito que essa dicotomização seja brilhante. Todos sabemos que, quando as
coisas estão bem, a sorte e a habilidade se confundem. Coincidência e causalidade
se tornam parecidas. Um tolo sortudo acaba parecendo um investidor habilidoso. É
claro que saber que o acaso pode gerar esse efeito não torna fácil a distinção entre
investidores sortudos e investidores habilidosos. Mas devemos continuar tentando.
Tendo a concordar com essencialmente todos os pontos importantes citados por
Taleb.
• Os investidores estão certos (e errados) o tempo todo pela “razão errada”.
Alguém compra uma ação porque espera certo acontecimento; este não ocorre;
mesmo assim, o mercado eleva as ações; o investidor parece bom (e costuma
aceitar essa consideração).
• Não podemos avaliar se uma decisão está correta com base em resultado. No
entanto, é assim que as pessoas a avaliam. Uma boa decisão é a melhor decisão
possível que pode ser tomada no ponto em que é realizada, momento em que o
futuro é, por definição, desconhecido. Assim, as decisões corretas muitas vezes
não têm êxito, e vice-versa.
• O acaso por si só é capaz de produzir quaisquer resultados a curto prazo. Nas
carteiras em que os movimentos do acaso são permitidos em sua plenitude, os
movimentos do mercado podem facilmente encobrir a habilidade do gestor (ou
a falta dela). Certamente os movimentos do mercado não podem ser creditados
aos gestores (a menos que vejamos o raro caso de pessoas capazes de adivinhar
repetidamente esses movimentos).
• Por essas razões, os investidores costumam receber crédito por algo que não
merecem. Um bom golpe de sorte pode ser suficiente para construir toda uma
reputação, mas isso claramente depende totalmente do acaso. Poucos desses
“gênios” acertaram mais de uma ou duas vezes seguidas.
• Assim, é essencial ter uma grande amostra de casos — muitos anos de dados
— antes de analisar a capacidade de um determinado gestor.
“RETURNS AND HOW THEY GET THAT WAY” (RENDIMENTOS E COMO SE TORNAM O
QUE SÃO), 11 DE NOVEMBRO DE 2002
A ideia de Taleb de “histórias alternativas” — as outras coisas que poderiam
razoavelmente ter acontecido — é um conceito fascinante e particularmente
relevante para os investimentos.
A maioria das pessoas reconhece a incerteza que cerca o futuro, mas sente
que pelo menos o passado é um dado conhecido e permanente. Afinal, o
passado é história, absoluta e imutável. Taleb, entretanto, sugere que as
coisas que aconteceram são apenas um pequeno subconjunto das coisas que
poderiam ter acontecido. Assim, o fato de que uma estratégia ou ação tenha
funcionado — sob as circunstâncias que se desenrolaram — não prova
necessariamente que a decisão que a motivou fosse sensata.
É possível que o êxito dessa decisão esteja ligado a um evento
completamente improvável, que, naquele momento, dependia apenas da
sorte. Nesse caso, a decisão — por mais êxito que tenha obtido — talvez
tenha sido imprudente, e as muitas outras histórias que poderiam ter
acontecido teriam demonstrado o erro.
Quanto crédito deveria receber um decisor por ter apostado em um
resultado altamente incerto que, por sorte, teve um final feliz? Essa é uma
boa questão e merece ser analisada com maior profundidade.
Uma das primeiras coisas que lembro ter aprendido quando entrei na
Wharton, em 1963, foi que a qualidade de uma decisão não é determinada por
seu resultado. Os eventos que podem ocorrer após a tomada das decisões as
tornam boas ou más; contudo, esses eventos costumam estar muito além de
qualquer antevisão. Essa foi extremamente reforçada pelo livro de Taleb. Ele
destaca a capacidade do acaso para recompensar decisões imprudentes e
penalizar as boas. O que é uma boa decisão? Digamos que alguém decida
construir um resort de esqui em Miami; três meses depois, uma nevasca
estranha atinge o sul da Flórida, deixando 4 metros de neve. Em sua primeira
temporada, a área de esqui recebe lucros robustos. Será que isso quer dizer
que a ideia de construir o resort foi boa? Não.
Uma boa decisão é aquela que uma pessoa lógica, inteligente e bem
informada teria tomado sob as circunstâncias como elas se apresentavam
naquele momento, antes de o resultado se tornar conhecido. Por essa norma,
o resort de esqui em Miami parece uma loucura.
Assim como acontece com o risco de perder dinheiro, muitas coisas que
não podem ser conhecidas ou quantificadas com antecedência irão afetar a
percepção da qualidade da decisão tomada. Mesmo após a ocorrência do fato,
é difícil saber com certeza quem tomou uma boa decisão baseada em uma
análise sólida, mas foi penalizado por uma situação anômala, e quem se
beneficiou ao apostar na sorte em investimentos altamente especulativos.
Portanto, pode ser difícil saber quem tomou a melhor decisão. Por outro lado,
os retornos passados podem ser avaliados de maneira simples, jogando luz
naquele que tomou a decisão mais rentável. Embora seja fácil confundir as
decisões, os investidores alertas precisam estar muito conscientes da sua
diferença.
A longo prazo, não há alternativa razoável senão acreditar que as boas
decisões acarretam lucros. A curto prazo, no entanto, devemos nos manter
impassíveis quando elas não nos trazem lucros.
Uma vez que os investidores da escola do “eu sei”, descrita no capítulo 14,
acreditam que seja possível conhecer o futuro, também decidem como este
será, constroem carteiras projetadas para maximizar os retornos com base
nesse cenário e, em grande parte, desconsideram as outras possibilidades. Os
“subotimizadores” da escola do “eu não sei”, por outro lado, colocam sua
ênfase na construção de carteiras que se sairão bem em cenários que
consideram prováveis e não muito mal no restante.
Os investidores da escola do “eu sei” preveem o resultado do lance de
dados, atribuem seus sucessos à sua astuta intuição sobre o futuro e, quando
as coisas não saem do seu jeito, culpam o azar. A pergunta que devemos
fazer quando eles estão certos é: “será que realmente tiveram um vislumbre
do futuro ou não?”. Já que sua abordagem é probabilística, os investidores da
escola do “eu não sei” entendem que o resultado depende em grande parte
dos deuses e, portanto, que o crédito ou a culpa dos investidores
(especialmente no curto prazo) seja algo adequadamente limitado.
A escola do “eu sei” divide, de forma rápida e confiante, seus membros
em vencedores e perdedores com base no primeiro ou segundo lance de
dados. Os investidores da escola do “eu não sei” entendem que sua habilidade
deve ser julgada apenas depois de os dados terem sido lançados muitas vezes,
não depois de apenas um lançamento (e que os lances podem ser poucos e
distantes no tempo entre si). Assim, eles aceitam que sua abordagem
cautelosa e “subotimizada” pode, por certo tempo, produzir resultados
indistintos, confiam, no entanto, que somente o longo prazo poderá dizer se
são investidores de excelência.
Os ganhos e as perdas de curto prazo são potenciais impostores, pois nenhum deles
indica necessariamente a competência (ou incompetência) real do investidor.
Retornos surpreendentemente bons são muitas vezes apenas o outro lado da moeda
dos retornos surpreendentemente ruins. Um ano de bons rendimentos pode inflar a
competência do gestor e obscurecer o risco que ele assumiu. Ainda assim, as
pessoas ficam surpresas quando esse ano de bons resultados é seguido de um ano
terrível.
Os investidores costumam esquecer que tanto os ganhos quanto as perdas de curto
prazo podem ser impostores, e que é importante esforçar-se muito para entender o
que está por trás deles.
Desempenho de investimento é o que acontece com uma carteira quando os
eventos se desenrolam. As pessoas prestam bastante atenção no resultado do
desempenho, devem, entretanto, questionar duas coisas: os eventos que acabaram
acontecendo (e as outras possibilidades que não ocorreram) eram realmente parte
dos conhecimentos do gestor da carteira? A segunda: qual teria sido a performance
se outros eventos tivessem ocorrido? Esses outros eventos são as “histórias
alternativas” de Taleb.
“PIGWEED” (ERVA DANINHA), 7 DE DEZEMBRO DE 2006
Considero as ideias de Taleb novas e provocativas. No momento em que
entendemos quanto o acaso pode afetar os resultados dos investimentos, tudo
passa a ser visto de uma forma bastante diferente.
As ações da escola do “eu sei” fundamentam-se em um único futuro
possível, o qual pode ser conhecido e conquistado. As pessoas da minha
escola do “eu não sei” veem os eventos futuros em termos de uma
distribuição de probabilidades. Essa é uma grande diferença. Neste último
caso, podemos ter uma ideia do resultado mais provável, mas também
sabemos que há muitas outras possibilidades, e que esses outros resultados
podem ter uma probabilidade coletiva muito maior do que o considerado
mais provável por nós.
Claramente, a visão de Taleb sobre um mundo incerto é muito mais
parecida com a minha forma de vê-lo. Tudo o que eu acredito e recomendo
sobre investimentos procede dessa escola de pensamento.
• Devemos gastar nosso tempo tentando encontrar valor no que é possível
saber — setores, empresas e ativos —, em vez de basear nossas decisões
em expectativas em relação ao menos conhecido, como o cenário
macroeconômico mundial e o desempenho do mercado amplo (broad
market, em inglês).
• Dado que não sabemos exatamente qual futuro ocorrerá, temos de manter
o valor do nosso lado, tendo uma opinião forte e bem analisada sobre ele e
comprando por menos quando as oportunidades se apresentarem.
• Precisamos investir de forma defensiva, já que provavelmente estaremos
na contramão de muitos resultados. É mais importante garantir a
sobrevivência durante o período de resultados negativos do que garantir o
máximo de retornos em períodos favoráveis.
• Para melhorar nossas chances de êxito, temos de enfatizar a visão
contrária à do rebanho nos períodos em que o mercado se encontra nas
extremidades, sendo agressivo quando o mercado está em baixa e
cauteloso quando está em alta.
• Dada a natureza altamente indeterminada dos resultados, devemos ver
estratégias e seus resultados — bons e ruins — com suspeita até que se
mostrem bons (ou ruins) após um grande número de testes.
Muitos aspectos caminham juntos para as pessoas que enxergam o mundo
como um lugar incerto: respeito saudável ao risco; consciência de que não
sabemos o que o futuro nos reserva; um entendimento de que o melhor que
podemos fazer é ver o futuro como uma distribuição de probabilidades e
investir de acordo com esse conhecimento; insistência no investimento
defensivo; e ênfase em evitar armadilhas. Para mim, é disso que se trata
investir de forma sensata.
17
O mais importante é… investir de forma defensiva
Há investidores velhos e há investidores ousados, mas não há
investidores velhos e ousados.
Quando os amigos me pedem conselhos de investimento pessoal, meu
primeiro passo é tentar entender sua atitude em relação ao risco e aos
retornos. Pedir conselhos de investimento sem especificar esse
posicionamento é como pedir um bom remédio a um médico sem lhe contar o
que nos incomoda.
Então eu pergunto: “o que é mais importante para você, ganhar dinheiro
ou evitar perdas?”. A resposta costuma ser a mesma: as duas coisas.
O problema é que não é possível fazer o máximo para conseguir obter
lucros e, ao mesmo tempo, evitar perdas. Cada investidor precisa estar bem
posicionado em relação a essas duas metas e, em geral, isso requer um
equilíbrio razoável. A decisão deve ser tomada de forma consciente e
racional. Este capítulo é sobre essa escolha… e minha recomendação.
A melhor maneira de colocar essa decisão em perspectiva é pensar nela
em termos de ataque e defesa. E uma das melhores maneiras de considerar
isso é com a metáfora esportiva.
Para estabelecer as bases para essa discussão, farei referência ao
maravilhoso artigo de Charles Ellis, intitulado “The loser’s game” (O jogo
dos perdedores), que apareceu no The Financial Analysts Journal em 1975.
Talvez essa tenha sido minha primeira exposição a uma analogia direta entre
investimentos e esportes, e foi fundamental em relação à ênfase que dou à
forma defensiva de se investir.
O artigo de Ellis descreveu a análise perceptiva do jogo de tênis feita no
livro Extraordinary tennis for the ordinary tennis player (Tênis
extraordinário para tenistas comuns), escrito pelo doutor Simon Ramo, o “R”
da marca TRW, antigo conglomerado de produtos que iam desde peças de
automóveis até serviços de avaliação de risco de crédito. Ramo mostrou que
o tênis profissional é um “jogo de vencedores”, no qual ganha a partida o
jogador que conseguir realizar o maior número de golpes vencedores
(winner): golpes rápidos e bem colocados que o oponente não consegue
rebater.
Fora o lançamento absolutamente vencedor (winner) do oponente, os
tenistas profissionais podem dar os golpes que quiserem durante quase o
tempo todo: forte ou leve, no fundo da quadra (drive) ou próximo da rede
(deixadinha), do lado esquerdo ou direito, chapado (flat) ou com giro (spin).
Os jogadores profissionais não se incomodam com as coisas que tornam o
jogo desafiador para os amadores: um quicar estranho; vento; sol nos olhos;
limitações de velocidade, resistência e habilidade; ou os esforços de um
oponente para colocar a bola fora do alcance. Os profissionais alcançam a
maioria dos golpes dados por seus oponentes e, na maior parte do tempo,
rebatem a bola da maneira que querem. Na verdade, os profissionais
conseguem fazer isso de forma tão consistente que as estatísticas do jogo
acompanham as exceções relativamente raras sob o título de “erros não
forçados”.
Mas o tênis que o resto de nós joga é um “jogo de perdedores”, vence o
jogador que rebater o menor número golpes perdedores (losers). O vencedor
mantém a bola em jogo até que o perdedor a acerte na rede ou fora da quadra.
Em outras palavras, no tênis amador, pontos não são ganhos, são perdidos.
Reconheci, nessa estratégia de evitar perdas, a versão do tênis que tento
jogar.
Charley Ellis levou a ideia de Ramo um passo adiante, aplicando-a a
investimentos. Suas opiniões sobre a eficiência do mercado e o alto custo de
transação o levaram a concluir que a busca por ações vencedoras nos
principais mercados de ações dificilmente trará recompensas aos investidores.
Em vez disso, é preciso tentar evitar as ações perdedoras. Essa forma de
investir é, a meu ver, absolutamente convincente.
A escolha entre investir de forma ofensiva ou defensiva deve basear-se em
quanto o investidor acredita estar sob seu controle. Em minha opinião,
investir implica muitos aspectos que não estão sob nosso controle.
Os tenistas profissionais têm certeza de que, se fizerem A, B, C e D com
os pés, o corpo, os braços e a raquete, a bola fará E na grande maioria das
vezes; existem relativamente poucas variáveis aleatórias em operação. Mas
investir é cheio de quiques estranhos e acontecimentos inesperados, além
disso, as dimensões da quadra e a altura da rede mudam o tempo todo. O
funcionamento das economias e dos mercados é altamente impreciso e
variável, e os pensamentos e o comportamento dos outros atores fazem com
que o ambiente seja modificado de maneira frequente. Mesmo se fizermos
tudo corretamente, outros investidores podem ignorar nossas ações favoritas;
a gestão pode desperdiçar as oportunidades da empresa; o governo pode
mudar as regras; ou a natureza pode nos oferecer uma catástrofe.
Tanta coisa está dentro do controle dos tenistas profissionais que eles
realmente devem sempre buscar o golpe vencedor. E é melhor que façam
isso, pois, se entregarem bolas fáceis, seus oponentes vão lhes devolver
golpes vencedores por conta própria e fazer pontos. Em contraste, os
resultados dos investimentos estão apenas parcialmente sob controle dos
investidores, e eles podem ganhar um bom dinheiro — e superar seus
oponentes — sem tentar golpes difíceis.
A questão é que mesmo os investidores altamente qualificados podem ser
culpados de rebater mal, e o golpe extremamente agressivo tem potencial de
levá-los a perder a partida. Assim, a defesa — ênfase expressiva em tentar
evitar que as coisas deem errado — é uma parte importante do jogo de todos
os grandes investidores.
Há muitas coisas de que gosto em relação aos investimentos, e a maioria
delas também se refere aos esportes.
• É competitivo — alguns ganham e outros perdem; a distinção é bastante
clara.
• É quantitativo — podemos ver os resultados claramente;
• É uma meritocracia — a longo prazo, os melhores investidores recebem
os melhores retornos.
• É orientado para o trabalho em equipe — um grupo eficaz pode realizar
mais do que uma pessoa sozinha.
• É satisfatório e divertido — sobretudo quando ganhamos.
Esses pontos positivos podem fazer o investimento ser uma atividade
muito gratificante. Entretanto, assim como nos esportes, também há pontos
negativos.
• Pode haver um prêmio para a agressividade, que não nos presta um bom
serviço a longo prazo.
• Quiques azarados podem ser frustrantes.
• O sucesso a curto prazo pode nos levar a ter um reconhecimento
generalizado sem atenção suficiente à provável durabilidade e
consistência dos resultados.
No geral, acredito que investimentos e esportes sejam bastante
semelhantes, assim como as decisões que ambos exigem de nós.
Pense em uma partida de futebol americano. O ataque está com a bola. Ele tem
quatro tentativas para avançar dez jardas. Se não o fizer, o árbitro apita. O relógio
para. O ataque sai do campo e entram os jogadores da defesa, cujo trabalho é
impedir que o outro time avance com a bola.
Será que o futebol americano é uma boa metáfora de seu modo de ver os
investimentos? Bem, para mim não é. No mundo dos investimos, não existe o apito
do juiz; raramente sabemos quando parar de atacar e começar a defender; e não há
intervalos para efetuarmos as mudanças.
Não, eu acho que investir é mais como o futebol que é jogado no resto do mundo.
No futebol, os mesmos onze jogadores estão em campo durante praticamente todo
o jogo. Não há uma equipe de ataque e uma equipe de defesa. As mesmas pessoas
precisam realizar ambas as ações… precisam saber lidar com todas as situações.
Coletivamente, esses onze jogadores precisam ter o potencial de fazer gols e
impedir que o time adversário faça mais gols que eles.
O treinador de futebol precisa decidir se quer colocar em campo um time que
enfatize o ataque (a fim de marcar muitos gols e, de alguma forma, permitir que
outro time faça menos gols), a defesa (na esperança de impedir o avanço do outro
time e tentar fazer pelo menos um gol), ou um time equilibrado. Os treinadores
sabem que não terão muitas oportunidades para trocar seus jogadores ofensivos e
defensivos durante o jogo, precisam se esforçar para, já de início, montar uma
equipe vencedora e mantê-la praticamente inalterada.
É assim que vejo os investimentos. Poucas pessoas (ou talvez ninguém) têm a
capacidade de mudar de tática para se alinhar às condições do mercado no
momento correto. Assim, os investidores devem se comprometer com uma
estratégia — com sorte, uma que lhes sirva bem em diferentes cenários. Podem
resolver ser agressivos, esperando ganhar muito com as ações vencedoras e perder
pouco com as perdedoras. Podem enfatizar a defesa, esperando se manter bem em
bons momentos e perder menos que os outros em momentos ruins. Ou, ainda,
podem manter ataque e defesa em equilíbrio, desistindo, em grande parte, das
alterações táticas, tentando vencer pela seleção ótima dos ativos, tanto nos
mercados com tendência de alta quanto naqueles com tendência de baixa.
É óbvia a preferência da Oaktree pela defesa. Nos períodos bons, achamos que não
há problema em apenas acompanharmos os índices (e, na melhor das hipóteses,
podemos até ficar um pouco defasados). Mas mesmo os investidores médios
ganham muito dinheiro nos períodos bons, e duvido que muitos gestores sejam
demitidos por serem apenas medianos durante as tendências altistas. As carteiras
da Oaktree são criadas para ter bons resultados durante os períodos ruins, e é aí que
consideramos o desempenho de bons resultados essencial. Obviamente, quando
conseguimos nos manter na média durante os períodos bons e termos bons
resultados nos períodos ruins, teremos resultados acima da média durante um ciclo
completo com volatilidade abaixo da média, e nossos clientes terão bons resultados
quando os outros estarão sofrendo.
“WHAT’S YOUR GAME PLAN?” (QUAL É O SEU ESQUEMA DE JOGO?), 5 DE SETEMBRO
DE 2003
O que é mais importante para você: marcar pontos ou impedir que seu
oponente os marque? Ao investir, você prefere dar golpes vencedores ou
prefere tentar evitar os perdedores? (Ou, talvez de forma mais apropriada,
como equilibrará ambos?) É muito perigoso não levarmos essas questões em
consideração.
E, a propósito, não há escolha certa entre ataque e defesa. Muitos
caminhos podem nos levar ao êxito; e a decisão depende de personalidade e
inclinações, do quanto acreditamos em nossa capacidade, das peculiaridades
dos mercados em que operamos e dos clientes para quem trabalhamos.
Em relação aos investimentos, o que é ser ofensivo ou defensivo? O primeiro
é de fácil definição: adotar táticas agressivas e de riscos elevados buscando
ganhos acima da média. E no que consiste ser defensivo? Em vez de fazer a
coisa certa, a principal ênfase do investidor defensivo é não fazer a coisa
errada.
Há alguma diferença entre fazer a coisa certa e evitar fazer a coisa errada?
Talvez pareçam iguais superficialmente, mas, quando visto com mais
atenção, há uma grande diferença entre o entendimento necessário para um e
para o outro, e uma grande diferença nas táticas a que os dois conduzem.
Embora a postura defensiva possa aparentar ser somente um pouco mais
do que tentar evitar resultados ruins, não é tão negativa ou sem aspirações.
Na verdade, ser defensivo pode ser visto como uma tentativa de se obter
maiores retornos, muito mais pela prevenção dos prejuízos do que pela
conquista de lucros, e muito mais por meio de um progresso consistente,
possivelmente moderado, do que por acessos ocasionais de brilhantismo.
Há dois elementos principais no modo defensivo. O primeiro é a exclusão
de ativos perdedores das carteiras. A melhor maneira de se realizar isso é com
um grande processo de diligência prévia (em inglês, due diligence), aplicação
de padrões rígidos, exigência de preço baixo e margem generosa de erro (ver
mais adiante neste capítulo), bem como menor disposição em apostar na
prosperidade contínua, nas previsões excessivamente otimistas e em
acontecimentos incertos.
O segundo elemento é escapar dos anos ruins e, especialmente, da
exposição ao fracasso durante as crises. Além dos ingredientes descritos
anteriormente que nos ajudam a manter os investimentos perdedores fora de
nossa carteira, esse aspecto do modo defensivo requer uma diversificação
cuidadosa da carteira, limitações sobre o risco geral assumido e uma
tendência generalizada para a segurança.
Concentração (o oposto de diversificação) e alavancagem são dois
exemplos do modo ofensivo. Embora ofereçam retornos quando funcionam,
mostram-se prejudiciais quando não o fazem; isto é, as táticas agressivas
oferecem a possibilidade de maiores altas e menores baixas. Se abusarmos
delas, no entanto, podem comprometer a sobrevivência de nossos
investimentos quando as coisas não derem certo. O modo defensivo, por
outro lado, trabalha com a possibilidade de aumento da probabilidade de
passarmos ilesos pelos momentos ruins e sobreviver o bastante para
conseguir desfrutar das eventuais recompensas por termos investido de forma
inteligente.
Os investidores devem se preparar para os acontecimentos desfavoráveis. Há
diversas atividades financeiras das quais podemos esperar, na média, um
funcionamento razoavelmente bom; no entanto, podem comportar-se mal um dia e
nos causar perdas enormes, devido a nossa estrutura precária ou ao excesso de
alavancagem.
Mas será que é assim tão simples? É fácil dizer que devemos nos precaver para os
dias ruins. Mas quão ruins? Qual é o pior cenário? Devemos estar preparados para
enfrentar esse tipo de ocorrência todos os dias?
Como tudo no mundo dos investimentos, não são questões tão simples assim. A
quantidade de risco que assumimos depende da quantidade de rendimentos que
estamos buscando. O nível de segurança de nossa carteira deve ser baseado em
quanto rendimento potencial estamos dispostos a renunciar. Não há respostas
certas, apenas trocas entre perdas e ganhos (trade-offs). Foi por isso que adicionei a
seguinte conclusão em dezembro de 2007: “como garantir a capacidade de
sobrevivência em circunstâncias adversas é incompatível com a maximização dos
retornos nos períodos bons, os investidores devem escolher entre os dois”.
“THE AVIARY” (O AVIÁRIO), 16 DE MAIO DE 2008
O elemento mais importante do investimento defensivo é o que Warren
Buffett chama de “margem de segurança” ou “margem de erro” — ele parece
utilizar os dois termos sem distingui-los. Esse assunto merece uma discussão
mais aprofundada.
Não é difícil realizar investimentos que terão êxito se o futuro se
desenrolar conforme o esperado. Há pouco mistério em como lucrar sob a
suposição de que a economia adotará certo comportamento e que certos
setores e empresas se sairão melhores que outros. Os investimentos
rigidamente direcionados podem ser altamente vantajosos quando o futuro se
desenrola da maneira esperada.
Mas precisamos pensar sobre o que acontecerá conosco caso o futuro não
siga nossas previsões. Em suma, o que faz com que os resultados sejam
toleráveis mesmo quando o futuro não corresponde às nossas expectativas? A
resposta é: a margem de erro.
Pensemos no que acontece quando um credor faz um empréstimo. Não é
difícil fazer empréstimos que serão pagos se as condições permanecerem
como estão — por exemplo, se não houver recessão e o tomador se mantiver
empregado. Mas o que permitirá que esse empréstimo seja pago se as
condições se deteriorarem? A resposta é: a margem de erro. Se o tomador
ficar desempregado, a probabilidade de pagamento do empréstimo é maior se
ele tiver poupança, ativos que possa vender ou fontes alternativas de renda.
Essas coisas oferecem ao credor uma margem de erro.
O contraste é simples. O credor que insistir na margem de erro e
emprestar apenas a tomadores sólidos sofrerá poucas perdas por falta de
crédito. Mas os altos padrões desse credor farão com que ele ou ela desista de
oportunidades de empréstimo, as quais serão passadas para aqueles credores
que são menos assertivos em relação à qualidade creditícia. O credor
agressivo parecerá mais inteligente do que o prudente (e ganhará mais
dinheiro) enquanto o ambiente permanecer salutar. A recompensa do credor
prudente surgirá nos períodos ruins, na forma de menores perdas de crédito.
O credor que insistir na margem de erro não desfrutará do ponto máximo das
altas, porém evitará os pontos mínimos das baixas. É o que acontece com
aqueles que preferem a defesa.
Eis outro exemplo de margem de erro. Encontramos algo com que
esperamos poder chegar a $ 100. Se o comprarmos por $ 90, teremos uma
boa chance de obter lucros, bem como uma chance moderada de perda, caso
nossas suposições se mostrem muito otimistas. Mas se o comprarmos a $ 70,
em vez de $ 90, nossa chance de perda é menor. A redução de $ 20 nos
oferece um espaço adicional para estarmos errados e, ainda assim, não
perdermos dinheiro. O preço baixo é a fonte mais importante da margem de
erro.
Assim, a oposição é simples: tentar maximizar os retornos por meio de
táticas agressivas ou nos proteger com a margem de erro. Não há maneira de
utilizar plenamente as duas táticas ao mesmo tempo. Qual escolher: o modo
ofensivo, defensivo ou alguma mistura dessas duas táticas (e, se este último
for o caso, em qual proporção)?
Das duas maneiras de atuar como investidor — acumular ganhos
excepcionais e evitar perdas —, acredito que a segunda seja a mais confiável.
Obter ganhos costuma ter algo a ver com estar certo sobre eventos que
acontecerão no futuro, enquanto as perdas podem ser minimizadas quando
verificamos a presença de um valor tangível, quando as expectativas do
rebanho são moderadas e os preços estão baixos. Minha experiência me diz
que a segunda técnica pode ser aplicada de forma mais consistente.
Precisamos atingir um equilíbrio consciente entre a obtenção de retornos e
a limitação do risco — ataque e defesa. Na renda fixa, onde comecei minha
carreira como gestor de carteiras, os retornos são limitados, evitar perdas é a
maior contribuição que o gestor pode oferecer. Como a valorização é
realmente “fixa”, a única variabilidade está na desvalorização, a qual deve ser
evitada. Assim, deixar claro que somos investidores em títulos não é uma
questão de quais títulos solventes possuímos, mas, em grande parte, de
conseguirmos excluir os insolventes. De acordo com Graham e Dodd, a
ênfase na exclusão faz com que o investimento em renda fixa seja uma arte
negativa.
Por outro lado, nos mercados de renda variável e outras áreas mais
orientadas à valorização, evitar perdas não é suficiente; o potencial de retorno
também deve fazer parte do presente. Embora o investidor em renda fixa
possa utilizar somente o modo defensivo, o investidor que vai além da renda
fixa — geralmente em busca de maiores retornos — precisa equilibrar o
ataque e a defesa.
A chave está na palavra equilíbrio. O fato de os investidores precisarem
atacar e defender não significa que devam se manter indiferentes à mistura
entre os dois modos. Se desejam mais retornos, geralmente têm de assumir
mais incertezas — mais riscos. Se os investidores buscarem retornos mais
altos do que podem ser alcançados com os títulos, não atingirão seus
objetivos se ficarem presos à prevenção de perdas. É necessário algum
ataque; com o ataque surge mais incerteza. A decisão de seguir esse caminho
deve ser tomada de forma consciente e inteligente.
Talvez mais do que em qualquer outra coisa, as atividades da Oaktree
fundamentam-se na defesa. (Mas não excluímos a agressividade, o ataque.
Nem tudo em que nos envolvemos é uma arte negativa. Não se pode investir
com sucesso em títulos conversíveis, títulos de dívidas de empresas em
dificuldades ou imóveis quando não se está disposto a pensar nos dois lados:
ganhos e perdas.)
Investir é um mundo carregado de testosterona onde muitas pessoas se imaginam
muito boas e pensam no quanto poderão ganhar se conseguirem dar a tacada
perfeita e se sair bem. Peça a alguns investidores da escola do “eu sei” que digam o
que os torna bons, e ouviremos muito sobre as grandes tacadas que deram no
passado e sobre as tacadas “em construção” de sua carteira atual. Quantos deles
falam de consistência ou do fato de que seu pior ano não foi tão ruim assim?
Uma das coisas mais marcantes que notei nos últimos 35 anos é o quão breves são
as carreiras de investimentos de maior destaque. Não tão curtas quanto as carreiras
dos atletas profissionais, porém mais curtas do que deveriam ser em uma profissão
que não é fisicamente destrutiva.
Onde estão os principais concorrentes dos dias em que, pela primeira vez, fui
gestor de títulos de alto rendimento há uns 25 ou 30 anos? Quase ninguém
continua trabalhando. E, surpreendentemente, nenhum de nossos grandes
concorrentes da área de títulos de dívida de empresas em dificuldades de quinze ou
vinte anos atrás mantém posição de liderança atualmente.
Para onde foram? Muitos deles desapareceram devido a algumas falhas
organizacionais, o que tornou seus esquemas de jogo insustentáveis. E o resto se
foi porque apostou alto e perdeu.
Isso traz à tona algo que considero um grande paradoxo: não acredito que a
carreira de muitos gestores de investimentos termine porque eles não conseguem
dar grandes tacadas. Em vez disso, acabam fora do jogo porque costumam errar
muito — não porque não tenham um bom número de ativos vencedores, mas
porque possuem muitos perdedores. E, ainda assim, muitos gestores insistem em
tentar a tacada perfeita. Eles:
• apostam muito alto quando imaginam ter uma ideia vencedora ou uma visão
correta do futuro, concentrando suas carteiras em vez de diversificá-las;
• incorrem em custos de transação excessivos, alterando suas carteiras com
muita frequência ou tentando antecipar-se ao mercado; e
• posicionam suas carteiras para que ganhem em cenários favoráveis e resultados
esperados, em vez de garantir que consigam sobreviver a algum inevitável erro
de cálculo ou golpe de má sorte.
Na Oaktree, por outro lado, acreditamos firmemente que “se evitarmos os ativos
perdedores, os vencedores cuidarão de si mesmos”. Esse tem sido nosso lema
desde o início, e sempre o será. Buscamos a média de rebatidas e não as raras
“tacadas perfeitas”. Sabemos que os outros terão os nomes em manchetes por suas
grandes vitórias e temporadas espetaculares. No entanto, esperamos estar sempre
no jogo devido a resultados bons e consistentes que produzam clientes satisfeitos.
“WHAT’S YOUR GAME PLAN?” (QUAL É O SEU ESQUEMA DE JOGO?), 5 DE SETEMBRO
DE 2003
As figuras 5.1 e 5.2 (capítulo 5) sugerem que podemos obter lucros
quando assumimos o risco. A diferença entre as duas figuras, é claro, é que a
primeira não indica a grande incerteza gerada pelo maior risco, enquanto a
segunda o faz. Como a figura 5.2 esclarece, os investimentos mais arriscados
implicam maiores amplitudes de resultados, incluindo a possibilidade de
perdas em vez de ganhos esperados.
Jogar no ataque — tentar apostar nos ativos vencedores, assumindo mais
riscos — é uma atividade extremamente intensa. Pode trazer os lucros que
buscamos ou profundas decepções. E aqui temos outra coisa a pensar: quanto
mais desafiadoras e potencialmente lucrativas são as águas em que pescamos,
maior a probabilidade de que tenham atraído pescadores muito qualificados.
A menos que nossas competências nos tornem bons competidores, é mais
provável que, em vez de pescadores, sejamos as presas. Se não tivermos a
competência necessária, não devemos tentar jogar no ataque, correr risco e
operar em campos tecnicamente desafiadores.
Além do domínio de habilidades técnicas, para investir agressivamente,
também é preciso ter estômago, clientes pacientes (quando somos gestores do
dinheiro alheio) e capital confiável. Quando uma situação se tornar adversa,
precisaremos dos três componentes para sobreviver. As decisões de
investimento podem ter o potencial de dar certo no longo prazo ou em média,
mas, sem essas características elencadas anteriormente, é possível que o
agressivo não chegue ao longo prazo.
Gerir uma carteira de alto risco é como andar na corda bamba sem rede de
proteção. A recompensa pelo êxito pode ser alta e trazer muitas interjeições
de admiração. Mas os descuidos podem nos levar à morte.
Em resumo, a obtenção de rendimentos muito altos tem a ver com a ousadia de ser
grande… Uma das primeiras e mais importantes decisões do investidor deve ser
sobre a questão de quão longe a carteira poderá se aventurar. Quanta ênfase
devemos dar à diversificação, evitando as perdas e nos assegurando contra os
rendimentos abaixo da média; e quanto devemos sacrificar esses pontos esperando
ganhar mais?
Aprendi muito com meu biscoito da sorte: os cautelosos raramente erram ou
escrevem grandes poemas. É uma faca de dois gumes e, por essa razão, uma frase
instigante. A cautela pode nos ajudar a evitar erros, mas também pode impedir que
realizemos ações extraordinárias.
Pessoalmente, prefiro gestores cautelosos. Em muitos casos, acredito que é mais
fácil evitar as perdas e os anos ruins do que obter êxitos de maneira continuada;
portanto, acredito que o controle de risco tenha maior probabilidade de criar uma
base sólida de um excelente histórico de investimentos a longo prazo. Os sinais
indicadores dos melhores investidores que conheço são investir com medo, a
exigência de um bom valor e de uma grande margem de erro, bem como estar
ciente do que não se sabe e não se pode controlar.
“DARE TO BE GREAT” (OUSE SER GRANDE), 7 DE SETEMBRO DE 2006
A escolha entre o ataque e a defesa, como tantas outras neste livro, não
possui uma elaboração simples. Por exemplo, considere a seguinte situação
problemática: muitas pessoas parecem não querer fazer algo (por exemplo,
comprar uma ação, comprometer-se com uma classe de ativos ou investir
com um gestor) que, caso não funcione, tenha a possibilidade de prejudicar
seus resultados de forma significativa. Mas para que algo, caso funcione,
possa ter a possibilidade de ajudar a aumentar os resultados, é preciso realizar
esse algo, mesmo que a decisão possa nos prejudicar bastante, caso não
funcione.
No mundo dos investimentos, quase tudo é uma faca de dois gumes. Isso
vale para as seguintes opções: correr maiores riscos, substituir a
diversificação pela concentração e usar alavancagem para ampliar os lucros.
A única exceção é a verdadeira habilidade pessoal. Quanto ao resto, se ajuda
quando funciona significa que prejudica quando não funciona. É isso que
torna a escolha entre ataque e defesa importante e desafiadora.
Muitos veem essa questão como a escolha entre querer mais e se contentar
com menos. Para o investidor sensato, no entanto, o resultado observado é
que a defesa pode proporcionar bons retornos, alcançados de forma
consistente, enquanto o ataque pode ser feito de sonhos que não costumam se
tornar realidade. Eu, pessoalmente, prefiro a defesa.
Investir defensivamente pode fazer com que deixemos passar certas oportunidades
e pode fazer com que não rebatamos muitos lançamentos. Daremos menos tacadas
perfeitas que outros investidores, mas é provável que fracassemos menos.
Investir de forma defensiva soa muito erudito, mas posso simplificar: devemos
investir com medo! Devemos nos preocupar com a possibilidade de perda.
Precisamos nos precaver, pois existem muitas coisas das quais nada sabemos.
Devemos estar cientes de que, mesmo quando fazemos boas escolhas, podemos ser
surpreendidos por má sorte ou eventos imprevisíveis. Investir com medo não nos
permite ser arrogantes, porque nos mantém em guarda e faz a adrenalina mental
continuar fluindo; nos obriga a requerer uma margem de segurança adequada e
aumenta as chances de nossas carteiras estarem preparadas para quaisquer
eventualidades. E, caso nada dê errado, os ativos vencedores certamente cuidarão
de si mesmos.
“THE MOST IMPORTANT THING” (O MAIS IMPORTANTE), 1O DE JULHO DE 2003
18
O mais importante é… evitar armadilhas
O investidor precisa fazer apenas algumas poucas coisas
corretas, desde que evite os grandes erros.
WARREN BUFFETT
Tentar evitar perdas nos investimentos, a meu ver, é mais importante do que
lutar por grandes êxitos. Embora o êxito possa ser alcançado algumas vezes,
os fracassos ocasionais podem ser incapacitantes. O primeiro realiza-se com
mais frequência e de forma mais confiável — quando essa estratégia falha,
suas consequências são mais toleráveis. Com uma carteira arriscada, uma
flutuação descendente pode nos levar a perder a fé ou nos forçar a vender
durante as baixas do mercado. Uma carteira com pouquíssimo risco pode nos
levar a obter menos rendimentos em um mercado altista, mas ninguém nunca
faliu com isso; há destinos muito piores.
Para evitar perdas, precisamos entender e evitar as armadilhas que as criam.
Neste capítulo, reuni algumas das principais questões discutidas nos capítulos
anteriores, esperando que, ao destacá-las em um mesmo lugar, os investidores
fiquem mais alertas com relação ao que se apresenta como problemático. O
ponto de partida consiste em perceber que existem muitos tipos de armadilhas
e aprender a identificá-las.
No meu entendimento, as fontes de erro podem ser divididas
principalmente em analíticas/intelectuais ou psicológicas/emocionais. Os
primeiros erros são bastante simples: coletamos poucas informações ou elas
estão incorretas. Ou talvez apliquemos os processos analíticos incorretos,
cometamos erros em nossos cálculos ou omitamos aquilo que deveríamos ter
realizado. Há muitos erros desse tipo para que sejam enumerados, e, de
qualquer forma, este livro é mais sobre filosofia e mentalidade do que sobre
processos analíticos.
Um tipo de erro analítico que eu quero discutir um pouco mais, no
entanto, é o que chamo de “falta de imaginação”. Com isso, quero dizer a
incapacidade de conceber todos os resultados possíveis ou não entender
completamente as consequências das ocorrências mais extremas. Eu me
estenderei mais nesse assunto na próxima seção.
Muitas das fontes psicológicas ou emocionais de erro foram discutidas em
capítulos anteriores: ganância e medo; disposição para suspender as regras da
realidade e o ceticismo; ego e inveja; o impulso para buscar altos retornos
pela assunção de riscos; e a tendência a superestimarmos nosso conhecimento
sobre o futuro. Esses temas discutidos contribuem para que sejam criados
cenários de altas e de crises, nos quais a maioria dos investidores se junta
para fazer exatamente a mesma coisa errada.
Outra armadilha importante — em grande parte psicológica, mas tão
importante que pode constituir sua própria categoria — é a incapacidade de
reconhecer ciclos e manias do mercado e caminhar na direção oposta. As
extremidades dos ciclos e das tendências não ocorrem com frequência e,
portanto, não são fonte frequente de erro; dão origem, contudo, aos maiores
deles. O poder da psicologia de rebanho para obrigar todos a se conformar e
se submeter ao consenso é quase irresistível, por isso, é importantíssimo que
os investidores resistam a essas ideias. Isso também já foi discutido
anteriormente.
A “falta de imaginação” — a incapacidade de entender com antecedência a
amplitude de todos os resultados possíveis — é particularmente interessante e
produz efeitos de muitas maneiras.
Como disse antes, investir consiste inteiramente em lidar com o futuro.
Para investir, precisamos ter uma visão de como imaginamos o futuro. Em
geral, não temos outra escolha senão supor que será muito parecido com o
passado. Assim, é relativamente incomum ouvir alguém dizer que “o
quociente preço/lucro médio das ações dos Estados Unidos tem sido de 15
nos últimos cinquenta anos; prevejo, então, que nos próximos anos será de 10
(ou 20)”.
Assim, a maioria dos investidores extrapola os eventos do passado —
especialmente os eventos do passado recente — para o futuro. Por que os
eventos do passado recente? Em primeiro lugar, muitos fenômenos
financeiros importantes seguem longos ciclos, o que significa que aqueles
que testemunharam algum evento extremo muitas vezes já se aposentaram ou
morreram antes da ocorrência do seguinte. Segundo, como disse John
Kenneth Galbraith, a memória financeira tende a ser extremamente curta. E
terceiro, qualquer possibilidade de trazer o passado à tona é apagada pela
promessa de dinheiro fácil que, inevitavelmente, seguirá a moda do
momento.
Na maioria das vezes, o futuro é realmente similar ao passado, então a
extrapolação não faz mal algum. Entretanto, nos importantes pontos de
inflexão, quando o futuro deixa de ser como o passado, a extrapolação
fracassa e, nesse momento, perde-se ou deixa-se de ganhar muito dinheiro.
Assim, é importante voltar à observação mordaz de Bruce Newberg sobre
a grande diferença entre probabilidade e resultado. As coisas que não
deveriam acontecer acontecem. Os resultados de curto prazo podem divergir
das probabilidades de longo prazo, e as ocorrências podem ficar
concentradas. Por exemplo, um duplo seis nos dados deveria aparecer uma
vez a cada 36 lançamentos. Mas ele pode aparecer cinco vezes seguidas e não
voltar a surgir nos 175 lançamentos subsequentes; porém, no longo prazo, os
resultados mantêm sua frequência devida.
Confiar excessivamente que algo “deveria acontecer” pode nos derrubar
quando o evento deixa de ocorrer. Mesmo que compreendamos corretamente
a distribuição de probabilidades subjacentes, não podemos confiar que os
eventos ocorrerão da forma como deveriam. E o sucesso de nossas ações de
investimento não deve depender apenas de resultados que ocorram
normalmente; em vez disso, devemos levar os casos anômalos em conta.
Os investidores só fazem investimentos porque esperam que eles deem
certo; então, suas análises se concentrarão nos cenários mais prováveis. Mas
não devem se concentrar naquilo que deveria supostamente ocorrer em
detrimento das outras possibilidades — e, assim, assumir tantos riscos e
endividamentos que, ao final, serão arruinados se os resultados forem
negativos. A maioria dos colapsos da recente crise de crédito ocorreu porque
algo não aconteceu da forma como deveria ter acontecido.
A crise financeira formou-se, sobretudo, porque certos eventos que nunca
haviam ocorrido se chocaram com estruturas arriscadas e alavancadas que
não haviam sido projetadas para resistir a eles. Por exemplo, os derivativos
hipotecários foram projetados e avaliados sob a hipótese de que os preços dos
imóveis nunca sofreriam uma queda de preços em todo o território
americano, uma vez que isso nunca havia ocorrido no passado (ou, ao menos,
desde que os preços passaram a ser monitorados). No momento seguinte,
houve uma queda gigantesca em todo o território, e as estruturas construídas
sob a hipótese de que isso nunca aconteceria foram dizimadas.
Como um parêntese, vale ressaltar que a suposição de que um evento não
pode acontecer tem o potencial de fazê-lo acontecer, já que as pessoas que
acreditam em sua não ocorrência passam a se envolver em comportamentos
de risco e, assim, alteram o ambiente em que operam. Vinte ou mais anos
atrás, o termo empréstimos hipotecários estava associado inextricavelmente à
palavra conservador. Os compradores de imóveis davam uma entrada de 20%
a 30% do preço da compra; os pagamentos de hipotecas eram
tradicionalmente limitados a 25% da renda mensal; os imóveis eram
cuidadosamente avaliados; e, por fim, a renda e a situação financeira dos
mutuários precisavam ser comprovadas. Entretanto, quando o apetite por
ativos lastreados em hipotecas aumentou na última década — em parte
porque as hipotecas sempre tiveram um desempenho muito confiável e
porque todos acreditavam que nunca ocorreria um aumento nacional da
inadimplência hipotecária —, muitas dessas normas tradicionais foram
abandonadas. As consequências não deveriam ter sido surpreendentes.
Isso traz de volta um dilema que devemos contornar. Quanto tempo e
capital um investidor deve aplicar para se proteger contra algum desastre
improvável? Podemos nos assegurar contra todos os resultados extremos; por
exemplo, contra a deflação e a hiperinflação. Isso, contudo, sai caro e o custo
prejudicará os retornos dos investimentos quando a proteção não se mostrar
necessária, o que se dará na maior parte do tempo. Poderíamos exigir que
nossa carteira se saísse bem, em uma reprise de 2008, mas então contaríamos
apenas com títulos do tesouro, dinheiro e ouro. Será que é uma estratégia
viável? Provavelmente, não. Portanto, como regra geral, é importante
evitarmos as armadilhas, mas é preciso haver um limite. Esse limite é
diferente para cada investidor.
Há outro aspecto importante na falta de imaginação. Todos sabem que os
ativos possuem retornos e riscos esperados e que é possível fazer uma
estimativa de seus valores. Mas poucos entendem a correlação entre ativos,
isto é, compreender como um ativo reagirá a uma mudança em outro ou que
dois ativos reagirão de forma semelhante a uma mudança em um terceiro.
Entender e prever o poder da correlação (portanto, as limitações da
diversificação) é o principal aspecto do controle de riscos e da gestão de
carteiras, no entanto, há muitas dificuldades para executá-los. Não conseguir
antecipar corretamente os comovimentos de uma carteira é uma fonte crítica
de erro.
Os investidores não costumam avaliar os vínculos comuns que ocorrem
em suas carteiras. Todos sabem que, se as ações de um fabricante de
automóveis caírem, é possível que as ações de todos os fabricantes diminuam
simultaneamente devido a fatores que eles têm em comum. Um número ainda
menor de pessoas entende as conexões que poderiam fazer cair todas as ações
dos Estados Unidos, ou todas as ações do mundo desenvolvido, ou todas as
ações em todo o mundo, ou todas as ações e títulos, etc.
Assim, a falta de imaginação consiste, primeiro, em não antecipar as
possíveis extremidades dos eventos futuros, e, segundo, em não entender as
consequências dos eventos extremos. Na recente crise de crédito, alguns
céticos poderiam ter suspeitado que as hipotecas subprime se tornariam
fortemente inadimplentes, mas não necessariamente que a inadimplência teria
consequências que ultrapassariam o mercado hipotecário. Pouca gente previu
o colapso do mercado hipotecário; ainda menos pessoas previram que, como
resultado, os fundos do mercado monetário e notas comerciais (commercial
paper, em inglês) seriam comprometidos; ou que os bancos Lehman
Brothers, Bear Stearns e Merrill Lynch deixariam de existir como empresas
independentes; ou que a General Motors e a Chrysler pediriam falência e
exigiriam socorro financeiro.
Em muitos aspectos, as forças psicológicas são uma das fontes mais
interessantes de equívocos relacionados a investimentos. Podem influenciar
sobremaneira os preços dos ativos. Quando alguns investidores passam a ter
uma visão extrema que não esteja equilibrada por outras pessoas, essas forças
podem fazer os preços subirem ou caírem muito. Essa é a origem das bolhas e
das crises.
Como os investidores são prejudicados por essas forças?
• Sucumbindo a elas.
• Ao participar, sem saber, de mercados que foram distorcidos por outros
investidores que sucumbiram a elas.
• Ao não tirar vantagem dessas distorções quando elas se fazem presentes.
Será que essas três respostas não são idênticas? Creio que não. Vamos
dissecar esses três erros no contexto de uma das forças psicológicas mais
insidiosas: a ganância.
Quando a ganância se torna excessiva, os preços dos ativos tendem a ficar
muito altos. Isso empurra o retorno prospectivo para baixo e aumenta o risco.
Os ativos em questão representam erros desenvolvidos de modo a produzir
perdas ou a serem aproveitados.
Dentre os três erros listados, o primeiro, ou seja, sucumbir às influências
negativas, significa juntar-se à ganância e comprar. Se o desejo de ganhar
dinheiro nos levar a comprar — mesmo que o preço esteja muito alto — com
a esperança de que o ativo continue se valorizando ou que a estratégia
continue funcionando, estaremos trilhando o caminho da decepção. Se
comprarmos quando o preço exceder o valor intrínseco, precisaremos ter
muita sorte — o ativo terá de oscilar de supervalorizado para ainda mais
supervalorizado — para obter ganhos em vez de perdas. Certamente o preço
elevado torna este último mais provável do que o primeiro.
O segundo erro é algo que podemos chamar de “erro por não ter
percebido”. Pode ser que não estejamos motivados pela ganância; por
exemplo, é possível que nosso plano de aposentadoria 401(k) invista no
mercado de ações de forma constante e passiva por meio de um fundo de
índice. No entanto, quando, mesmo sem saber, participamos de um mercado
que se elevou devido à compra indisciplinada de outras pessoas, isso nos traz
sérias implicações.
Cada uma das influências negativas — e cada um dos tipos de mercados
“errados” — apresenta formas de obtermos benefícios em vez de cometermos
erros. Assim, a terceira forma de erro não consiste em fazer a coisa errada,
mas em não fazer a coisa certa. Os investidores médios terão sorte se
conseguirem evitar armadilhas, já os melhores investidores buscam tirar
vantagem delas. A maioria dos investidores espera não comprar, ou talvez até
mesmo vender, quando a ganância carrega o preço de uma ação para o alto.
Já os melhores investidores vendem a descoberto para lucrar quando o preço
cair. Cometer o terceiro erro — por exemplo, não conseguir vender a
descoberto uma ação supervalorizada — é um tipo diferente, pois é um
equívoco de omissão; provavelmente, uma distração com a qual a maioria
dos investidores conseguiria conviver.
Conforme mencionei anteriormente, entre as armadilhas atribuíveis à
psicologia temos a disposição ocasional dos investidores em aceitar as novas
racionalizações que dão origem a bolhas e crises, geralmente por acreditarem
que “desta vez será diferente”. Nos mercados altistas, o ceticismo inadequado
gera frequentemente a ocorrência desse pensamento equivocado, pois os
investidores aceitam os seguintes pontos:
• algum novo acontecimento fará o mundo mudar;
• padrões que têm funcionado como norma (como os altos e baixos dos
ciclos de negócios) não ocorrerão mais;
• as regras foram mudadas (como, por exemplo, as normas que determinam
se as empresas possuem uma boa qualidade creditícia e se vale a pena
manter sua dívida); ou
• as normas tradicionais de avaliação não são mais relevantes (incluindo os
quocientes preço/lucro para as ações, os spreads de rendimento para os
títulos ou as taxas de capitalização para os imóveis).
Graças à forma como o pêndulo oscila (ver capítulo 9), esses erros
costumam ocorrer simultaneamente quando os investidores se tornam muito
crédulos e abandonam o ceticismo.
Há sempre uma explicação racional — talvez até mesmo uma que seja
bastante sofisticada — sobre o motivo pelo qual alguma oitava maravilha do
mundo funcionará a favor do investidor. No entanto, a pessoa que oferece a
explicação geralmente se esquece de mencionar que (a) o novo fenômeno
representa um método sem nenhum histórico e (b) requer que as coisas sigam
um padrão correto, (c) muitas outras coisas podem acontecer em vez do
previsto e (d) muitas delas podem ser desastrosas.
Para não pisar em armadilhas, deve-se dar atenção a elas nos primeiros
passos. A ganância e o otimismo, juntos, impelem o investidor a buscar
estratégias que produzirão altos retornos com baixo risco, a pagar preços
elevados por ativos que estão na moda e a segurá-los mesmo depois de terem
se tornado extremamente caros, esperando que ainda recebam alguma
valorização. Mais tarde, o olhar retrospectivo mostrará a todos o que deu
errado: as expectativas eram irrealistas e os riscos foram ignorados. Mas
aprender sobre armadilhas passando por experiências dolorosas constitui uma
ajuda bastante limitada. A chave é nos anteciparmos a elas. Como exemplo,
recorrerei à recente crise de crédito.
Os mercados são uma sala de aula onde as lições são ensinadas todos os
dias. O segredo para obter êxito nos investimentos reside na observação e no
aprendizado. Em dezembro de 2007, na crise do subprime e bem quando seu
potencial de contágio para outros mercados começava a ficar claro, comecei a
enumerar as lições que imaginava que deveríamos tirar dela. Quando terminei
essa tarefa, percebi que não eram apenas lições tiradas da última crise, mas
importantes lições que valeriam para sempre. Embora as tenha mencionado
em algumas passagens do livro, eu as juntarei aqui.
O que aprendemos — ou deveríamos aprender — com uma crise
• Muita disponibilidade de capital faz o dinheiro fluir para os lugares errados.
Quando o capital está escasso e é muito demandado, os investidores se veem
diante de escolhas de alocação para que deem o melhor uso a seu capital, e
suas decisões podem ser tomadas com paciência e disciplina. Mas quando há
muito capital e poucas ideias sobre como usá-lo, as pessoas fazem
investimentos que não deveriam.
• Quando o capital flui para onde não deveria ir, coisas ruins acontecem. Em
períodos de mercados de capitais mais rigorosos, os mutuários merecedores
são rejeitados. Mas quando há dinheiro de sobra, os mutuários não qualificados
recebem ofertas de empréstimos em uma bandeja de prata. Entre os resultados
inevitáveis temos a inadimplência, as falências e as perdas.
• Quando há oferta de capital em excesso, os investidores brigam por
oportunidades, aceitando retornos baixos e uma margem de erro bastante
minguada. Quando as pessoas querem comprar, competem como se estivessem
em um leilão no qual os preços sobem cada vez mais. Pense bem, leitor,
oferecer mais por algo equivale a aceitar menos por seu dinheiro. Assim, as
•
•
•
•
•
ofertas de compra aos investimentos podem ser vistas como uma demonstração
de quão pequeno é o retorno exigido pelos investidores e quanto risco eles
estão dispostos a aceitar.
O desrespeito generalizado ao risco cria um grande risco. “Nada pode dar
errado.” “Nenhum preço é alto demais.” “Alguém sempre pagará mais por
isso.” “Se não agirmos logo, alguém vai comprar.” Afirmações como essas
indicam a pouca consideração dada ao risco. Nessa versão do ciclo, as pessoas
imaginaram que as aquisições do tipo buyout seriam capazes de suportar
quantias cada vez maiores de alavancagem, porque estavam comprando
empresas melhores ou porque seu financiamento tinha cláusulas mais
benéficas. Isso os levou a ignorar o risco de acontecimentos desfavoráveis e o
perigo inerente às estruturas de capital altamente alavancadas.
Uma diligência prévia inadequada leva a perdas. A melhor defesa contra a
perda é uma análise minuciosa e perspicaz, bem como a insistência no que
Warren Buffett chama de “margem de erro”. Mas, nos mercados aquecidos, as
pessoas se preocupam em perder oportunidades, não em perder dinheiro, e a
análise cética demorada passa a ser região de velhos retrógrados.
Em períodos de efervescência, o capital se destina a investimentos inovadores,
muitos dos quais fracassam no teste do tempo. Os investidores otimistas se
concentram no que poderia funcionar, não no que pode dar errado. O
entusiasmo assume o controle da prudência, levando as pessoas a aceitar novos
produtos de investimento que não entendem. Mais tarde, se questionam sobre o
que estavam pensando naquele momento.
As falhas ocultas das carteiras podem gerar o movimento em conjunto de
preços de ativos aparentemente não relacionados. É mais fácil avaliar o
retorno e o risco de um investimento do que entender como ele se comporta
em relação aos outros. A correlação costuma ser subestimada, especialmente
pela forma como aumenta durante uma crise. Um portfólio pode parecer
diversificado no que diz respeito às classes de ativos, aos setores econômicos e
à localização geográfica, mas, em períodos mais difíceis, os fatores não
fundamentais, como as margin calls, os mercados congelados e o aumento
geral da aversão ao risco, podem se tornar preponderantes e afetar tudo da
mesma forma.
Fatores psicológicos e técnicos podem obstar os fundamentos. A longo prazo,
a criação e a destruição de valor são impulsionadas por certos fundamentos
como, por exemplo, tendências econômicas, lucros das empresas, demanda por
produtos e competência da gestão da empresa. A curto prazo, entretanto, os
mercados são altamente responsivos aos fatores psicológicos e técnicos dos
investidores, que influenciam a oferta e a demanda por ativos. Na verdade,
acredito que, no curto prazo, a confiança é mais importante que qualquer outra
coisa. Tudo pode acontecer nesse sentido, o que pode resultar em situações
imprevisíveis e irracionais.
• Os mercados mudam e invalidam os modelos. Os relatos das dificuldades dos
fundos quant fundamentam-se no fracasso dos modelos computacionais e de
suas suposições subjacentes. Os sistemas informatizados que gerenciam
carteiras tentam lucrar principalmente por meio de padrões que se mantêm
historicamente constantes. Eles não são capazes de prever mudanças nesses
padrões e não conseguem prever períodos que fujam do normal; portanto,
costumam superestimar a fiabilidade das normas passadas.
• Alavancar aumenta os resultados, mas não agrega valor. Talvez faça todo
sentido usar a alavancagem para aumentar nossos investimentos em ativos a
preços de barganha, oferecendo altos retornos esperados ou prêmios de risco
generosos. Mas pode ser perigoso usar a alavancagem para comprar mais
ativos que ofereçam baixos retornos ou spreads de risco estreitos — ou seja,
ativos já com preço máximo ou sobreprecificados. Faz pouco sentido usar a
alavancagem para tentar transformar retornos inadequados em retornos
adequados.
• Os excessos se corrigem. Quando os investidores são extremamente otimistas e
os mercados estão precificados com excesso de otimismo (priced for
perfection, em inglês), o cenário de destruição de capital está posto. Isso pode
ter como causa o otimismo excessivo dos investidores, porque eventos
negativos ocorrem ou simplesmente porque os preços muito altos acabam
caindo por seu próprio peso.
Essas onze lições podem ser reduzidas, se assim preferirmos, a apenas uma:
atenção ao que acontece no entorno, no que diz respeito ao equilíbrio entre a oferta
e a demanda por recursos disponíveis para investir, e esteja alerta com relação à
ânsia por gastá-los. Sabemos como é quando há pouquíssimo capital ao redor e
muita hesitação em nos desfazer dele: os investimentos que valem a pena
imploram por capital, e as atividades podem desacelerar em toda a economia.
Chamamos isso de crise de crédito (credit crunch, em inglês). Mas o contrário
merece a mesma atenção. Não há um termo oficial para isso, então teremos de
aceitar o conceito “muito dinheiro em busca de poucas ideias de como usá-lo”.
Independentemente de seu nome, o excesso de oferta de capital e a escassez de
prudência, conforme a que testemunhamos entre 2004 e 2007 — com seus efeitos
perniciosos —, podem ser perigosos para a saúde de nossos investimentos e devem
ser reconhecidos e administrados.
“NO DIFFERENT THIS TIME” (NÃO É DIFERENTE DESTA VEZ), 17 DE DEZEMBRO DE
2007
A crise global proporcionou uma grande oportunidade para aprendermos,
pois envolveu muitos erros graves e ofereceu as lições enumeradas no meu
memorando de dezembro de 2007. Havia armadilhas por toda parte: os
investidores estavam despreocupados e até mesmo empolgados nos anos que
antecederam a crise. Acreditavam que não havia mais risco e, assim,
precisavam se preocupar apenas com a perda de alguma oportunidade e com
o fato de não conseguirem acompanhar os outros, mas não com a perda de
dinheiro. Investimentos “inovadores”, arriscados e não testados, foram
adotados em hipóteses frouxas. Deu-se um peso indevido a modelos opacos e
“caixas-pretas”, a engenheiros financeiros e quants, e a históricos de
desempenho compilados durante os períodos de calmaria. As alavancagens se
empilhavam umas sobre as outras.
Quase ninguém sabia exatamente quais seriam as consequências, mas era
possível ter a sensação de que cavalgávamos em direção ao abismo. Embora
não fosse possível ter identificado e escapado de certas armadilhas
específicas, este era o momento perfeito para reconhecer que muitas estavam
à espreita e, assim, adotar uma postura mais defensiva. Não o fazer foi o
grande erro da crise.
Tendo chegado a essa conjuntura, o que os investidores poderiam ter
feito? As respostas estavam nos seguintes pontos:
•
•
•
•
•
tomar nota do comportamento despreocupado e incauto dos outros;
preparar-se psicologicamente para uma recessão;
vender ativos, ou pelo menos os mais propensos a riscos;
reduzir a alavancagem;
fazer caixa (e, se você investe para clientes, retornar o dinheiro para eles);
e
• adotar um posicionamento mais defensivo para as carteiras.
Qualquer um desses pontos teria ajudado. Embora quase nada tenha tido
um bom desempenho durante a crise de 2008, foi possível — como resultado
de muita cautela — ter perdido menos do que os outros e sofrido menos.
Embora tenha sido quase impossível evitar totalmente as quedas, o
desempenho relativo, na forma de perdas menores, foi suficiente para termos
suportado melhor a queda e aproveitado mais os benefícios do rebote.
A crise estava repleta de possíveis armadilhas: em primeiro lugar,
oportunidades de sucumbir e perder, e, depois, oportunidades de isolar-se e
perder a retomada. Em períodos de poucas perdas, as pessoas tendem a
pensar no risco como volatilidade e se convencem de que podem conviver
com isso. Se fosse a verdade, elas perceberiam os preços mais baixos,
investiriam mais nos períodos de baixa e tirariam vantagem dos períodos de
recuperação, obtendo benefícios financeiros a longo prazo. Mas se a
capacidade de conviver com a volatilidade e manter a compostura é
superestimada — e isso é o que costuma acontecer —, esse erro tende a vir à
tona quando o mercado está em seu ponto mais baixo. A perda de confiança e
da determinação pode levar os investidores a vender no ponto mais baixo,
transformando as flutuações descendentes em perdas permanentes e
impedindo-os de participar plenamente da subsequente recuperação do
mercado. Esse é o maior erro do investidor — o aspecto mais infeliz do
comportamento pró-cíclico —, devido à sua permanência e porque tende a
afetar grandes parcelas das carteiras.
Uma vez que o comportamento contracíclico foi o elemento essencial para
se evitar o efeito pleno da crise recente, comportar-se de forma pró-cíclica era
fonte potencial de alguma grande armadilha. Os investidores que mantiveram
suas posições altistas (ou as aumentaram) à medida que o mercado subia
estavam menos preparados para a crise e para a subsequente recuperação do
mercado. Desse modo:
• os declínios tiveram impactos psicológicos máximos;
• as margin calls e confiscos de garantias dizimaram os veículos financeiros
alavancados;
• os investimentos problemáticos exigiam ações corretivas que mantinham
seus gestores ocupados;
• como de costume, a perda de confiança evitou que muita gente fizesse, na
hora certa, o que era certo.
Embora seja verdade que não podemos gastar rendimentos relativos, a
natureza humana faz com que os investidores defensivos e seus clientes
menos traumatizados sintam-se confortáveis quando perdem menos do que
outros nos mercados deprimidos. Isso tem dois efeitos muito importantes.
Primeiro, permite que eles mantenham sua calma e resistam às pressões
psicológicas que muitas vezes levam as pessoas a vender nas baixas.
Segundo, tendo melhor estado de espírito e melhor condição financeira, são
mais capazes de lucrar com a carnificina, comprando nas baixas. Assim,
geralmente se saem melhor durante as recuperações.
Certamente foi isso que aconteceu nos últimos anos. Os mercados de
crédito foram particularmente atingidos em 2007-2008, uma vez que tinham
sido o foco da inovação, da assunção de riscos e do uso da alavancagem.
Como consequência, seus lucros em 2009 foram os melhores de sua história.
Sobreviver às quedas e comprar nas baixas foi uma ótima fórmula de obter
êxito — especialmente o êxito relativo —, mas, antes, exigia que o investidor
fugisse das armadilhas.
A fórmula do erro é simples, mas as maneiras como aparece são infinitas —
muitas para que possamos enumerá-las. Aqui estão os ingredientes usuais:
• erros nos dados ou no cálculo durante o processo analítico, levando à
avaliação incorreta do valor;
• subestimar o leque completo de possibilidades ou suas consequências;
• ganância, medo, inveja, ego, suspensão das regras da realidade,
conformismo ou capitulação, ou alguma combinação desses fatores
levados ao extremo;
• como resultado, há uma excessiva assunção ou prevenção de riscos;
• os preços divergem significativamente de seu valor; e
• os investidores não percebem essa divergência e, talvez, contribuam para
o seu incremento.
Geralmente, pensadores astutos e prudentes de segundo nível tomam nota
do erro analítico, bem como da falha de outros investidores, e reagem de
forma adequada. Detectam ativos sobreprecificados ou subprecificados em
mercados aquecidos ou desaquecidos demais. Criam um percurso para evitar
os erros que os outros estão cometendo e, com sorte, tiram vantagem disso. O
desfecho do erro nos investimentos é algo simples de se descrever: preços
que diferem do valor intrínseco. Detectá-los e agir sobre eles são questões
bens menos simples.
O fascinante e desafiador é que o erro circula. Às vezes, os preços estão
muito altos; outras vezes, muito baixos. De vez em quando, a divergência
entre preço e valor afeta ativos individuais; em outras ocasiões, mercados
inteiros — ora um mercado, ora outro. Em alguns momentos, o erro reside
em uma ação, às vezes, em uma omissão, outras ainda em ser otimista ou
pessimista.
E, claro, por definição, a maioria das pessoas aceita e segue o erro, já que
sem sua concordância ele não poderia existir. Agir na direção oposta requer a
adoção de um ponto de vista contrário, que, por longos períodos, nos faz ser
solitários e conviver com a sensação de estarmos errados.
Assim como as outras tarefas discutidas neste livro, evitar armadilhas,
identificar erros e agir são atitudes que não estão sujeitas a regras, algoritmos
ou mapas. Quero encorajar a atenção, a flexibilidade, a adaptabilidade e uma
mente voltada às pistas deixadas pelo ambiente que nos rodeia.
Uma maneira de melhorar os resultados dos investimentos (que buscamos aplicar
na Oaktree) é buscar o “erro do dia de hoje” e tentar evitá-lo.
Há momentos em que o provável erro consiste em:
•
•
•
•
•
•
não comprar;
não comprar o suficiente;
não fazer um último lance em um leilão;
guardar muito dinheiro;
não se alavancar o bastante;
não correr riscos o suficiente.
Não acredito que isso descreva o que ocorreu em 2004. Alguém que está prestes a
passar por uma cirurgia cardíaca nunca dirá que seu maior desejo era ter ido mais
ao escritório. Ora, da mesma forma, acredito que nos próximos anos ninguém vai
dizer em retrospectiva que seu maior desejo era ter investido mais em 2004.
Na verdade, acredito que os erros deste ano foram:
•
•
•
•
•
comprar demais;
comprar de forma muito agressiva;
fazer o último lance quando deveria ter parado;
usar muita alavancagem;
assumir muito risco na busca por retornos extraordinários.
Há momentos em que os erros são de omissão: coisas que deveríamos ter feito,
mas não fizemos. Os erros atuais são provavelmente de comissão: as coisas que
não deveríamos ter feito, mas fizemos. Há momentos para a agressividade.
Acredito que o momento atual seja de cautela.
“RISK AND RETURN TODAY” (RISCO E RETORNO NA ATUALIDADE), 27 DE OUTUBRO
DE 2004
Por fim, é importante ter em mente que, além dos momentos em que os
erros são de comissão (por exemplo, comprar) e momentos em que são de
omissão (não comprar), há momentos em que não há erros evidentes. Quando
a psicologia dos investidores, o medo e a ganância estão equilibrados, os
preços dos ativos provavelmente são justos em relação ao valor. Nesse caso,
talvez não seja necessário fazer algo, e é importante saber isso também.
Quando não há nada particularmente inteligente para se fazer, a armadilha
potencial está em insistir em ser inteligente.
19
O mais importante é… agregar valor
O desempenho dos investidores que agregam valor é
assimétrico. A porcentagem de ganhos que obtêm do mercado é
maior do que a porcentagem de perdas que sofrem… Só
podemos contar com a habilidade para agregar mais valor em
ambientes favoráveis do que para perder em ambientes hostis.
Essa é a assimetria que buscamos.
Não é difícil apresentar um desempenho igual ao do mercado em termos de
risco e retorno. O difícil é apresentar um desempenho melhor do que o do
mercado: agregar valor. Isso exige uma maior habilidade e percepção sobre
os investimentos. Então, neste ponto, quase no final do livro, damos um giro
de 360º e voltamos ao primeiro capítulo e à habilidade excepcional dos
pensadores de segundo nível.
O objetivo deste capítulo é explicar o que significa agregar valor para os
investidores habilidosos. Para isso, vou introduzir dois termos da teoria do
investimento. Um deles é o beta, uma medida da sensibilidade relativa de
uma carteira aos movimentos do mercado. O outro é o alfa, que eu defino
como a habilidade individual de investir ou a capacidade de gerar
desempenho que não está relacionado aos movimentos do mercado.
Conforme mencionei anteriormente, obter os mesmos rendimentos do
mercado é algo fácil. Um fundo de índice passivo produzirá exatamente esse
resultado, posicionando todos os ativos em um determinado índice de
mercado em proporção à sua capitalização. Assim, ele espelha as
características do índice selecionado — por exemplo, potencial de ganho,
risco de perda, beta ou volatilidade, crescimento, preço caro ou barato,
qualidade ou falta de qualidade — e garante esse retorno. É o símbolo do
investimento sem valor agregado.
Digamos, então, que todos os investidores de ações comecem não com
uma folha de papel em branco, mas com a simples possibilidade de emular
algum índice. Esses investidores podem comprar passivamente uma
quantidade ponderada pela capitalização de mercado de cada ação que
compõe o índice, nesse caso, seu desempenho será o mesmo do índice. Ou
podem tentar bater o desempenho do mercado por meio de investimentos
ativos.
Os investidores ativos possuem uma série de opções disponíveis.
Primeiro, podem decidir se sua carteira será mais agressiva ou mais defensiva
do que o índice, seja em uma base permanente ou em uma tentativa de
antecipar-se ao mercado (market timing). Se os investidores optarem pelo
caminho da agressividade, por exemplo, podem aumentar a sensibilidade ao
mercado de suas carteiras, aumentando o peso das ações do índice que
costumam flutuar mais do que as outras ou utilizando alavancagem. Essas
atitudes elevarão o risco “sistemático” da carteira, ou seja, seu beta (no
entanto, a teoria diz que, embora isso possa aumentar o retorno de uma
carteira, o diferencial de retorno será totalmente explicado pelo aumento do
risco sistemático assumido. Assim, essas atitudes não melhorarão o retorno
ajustado ao risco da carteira).
Em segundo lugar, os investidores podem resolver desviar-se do índice
para explorar sua capacidade de selecionar ações — comprando uma maior
quantidade de ações do índice, diminuindo o peso de algumas ou excluindo
outras e adicionando ações que não fazem parte do índice. Ao fazê-lo,
alterarão a exposição de suas carteiras a eventos específicos que ocorrem em
certas empresas e, assim, a movimentos de preços que afetam apenas
determinadas ações, não todo o índice. Como a composição dessas carteiras
diverge do índice por razões “não sistemáticas” (podemos dizer “peculiares”),
seu retorno também se desviará. A longo prazo, no entanto, a menos que os
investidores tenham origem em uma percepção excepcional, esses desvios
serão desfeitos e seu desempenho ajustado ao risco convergirá ao do índice.
Os investidores ativos que não possuem uma percepção excepcional,
descrita no capítulo 1, não são melhores do que os investidores passivos, e o
desempenho de suas carteiras não deverá ser melhor do que o de uma carteira
passiva. Eles podem se esforçar, agarrar-se ao ataque ou à defesa, ou negociar
uma tempestade, mas seu desempenho ajustado ao risco não deverá ser
melhor do que o de uma carteira passiva (e poderia ser pior devido aos riscos
não sistemáticos assumidos e aos custos de transação que são inúteis).
Isso não significa que, se o índice de mercado subir 15%, todos os
investidores ativos que não agregam valor obterão retornos de 15%. Todos
eles possuirão diferentes carteiras ativas, e algumas terão um desempenho
melhor do que outras… mas não de forma consistente ou confiável.
Coletivamente, refletirão a composição do mercado, mas cada uma terá suas
peculiaridades.
Investidores favoráveis ao risco e agressivos, por exemplo, devem ganhar
mais do que o índice nos períodos bons e perder mais nos períodos ruins. É
aqui que entra o beta. Pela palavra beta, a teoria se refere à volatilidade
relativa ou à sensibilidade relativa do retorno da carteira em relação ao
retorno do mercado. Espera-se que uma carteira com beta acima de 1 seja
mais volátil do que o mercado de referência, e outra com beta abaixo de 1
seja menos volátil. Quando multiplicamos o retorno do mercado pelo beta,
obtemos o retorno esperado de uma determinada carteira, excluindo-se as
fontes não sistemáticas de risco. Se o mercado subir 15%, uma carteira com
beta de 1,2 deverá oferecer retornos de 18% (mais ou menos alfa).
A teoria analisa essas informações e diz que o maior retorno é explicado
pelo aumento do beta ou do risco sistemático. Também diz que os retornos
não aumentam para compensar outro risco senão o sistemático. Por que não?
Segundo a teoria, o risco que os mercados compensam é apenas aquele
considerado intrínseco e inescapável em um investimento: o risco sistemático
ou “não diversificável”. O resto do risco vem das decisões de manter certas
ações específicas: o risco não sistemático. Mas se esse risco pode ser
eliminado por meio da diversificação, por que os investidores devem ser
compensados, recebendo maiores retornos, por assumi-los?
De acordo com a teoria, então, a fórmula para explicar o desempenho da
carteira (y) é o seguinte:
y = α + βx
Aqui α é o símbolo para alfa, β significa beta, e x é o retorno do mercado.
O retorno de uma carteira é igual ao seu beta multiplicado pelo retorno de
mercado, e o alfa (retorno relacionado à habilidade) é adicionado para se
obter o retorno total (a teoria, obviamente, diz que o alfa não existe).
Embora eu não aceite a identidade entre risco e volatilidade, insisto em
considerar o retorno de uma carteira à luz de seu risco global, como discutido
anteriormente. Um gestor que ganhou 18% com uma carteira de risco não é
necessariamente melhor do que alguém que tenha obtido 15% com uma
carteira de menor risco. O retorno ajustado ao risco é a chave, mas a única
ferramenta de que dispomos para calibrá-lo é o acompanhamento da
volatilidade; eu creio que a melhor forma de avaliar o risco se desenvolve de
forma subjetiva, não com cálculos científicos.
Claro, também não aceito a ideia de que o termo alfa da equação deva ser
zero. A habilidade de investimento existe, embora nem todos a tenham.
Somente considerando o retorno ajustado ao risco podemos determinar se
um investidor possui uma percepção excepcional, ou habilidade de
investimento, ou alfa; se é capaz de agregar valor.
O modelo alfa/beta é uma excelente maneira de avaliar carteiras, gestores de
carteiras, estratégias de investimento e esquemas de alocação de ativos. É uma
maneira organizada para calcularmos que parte do retorno tem origem no ambiente
e quanto vem do valor agregado do gestor. Por exemplo, é óbvio que este gestor
não possui nenhuma habilidade:
Período
Retorno: Benchmark
Retorno: Carteira
1
10
10
2
6
6
3
0
0
4
–10
–10
5
20
20
Mas nem este gestor (que se move apenas metade do benchmark):
Período
Retorno: Benchmark
Retorno: Carteira
1
10
5
2
6
3
3
0
0
4
–10
–5
5
20
10
Ou este (que se move duas vezes mais):
Período
Retorno: Benchmark
Retorno: Carteira
1
10
20
2
6
12
3
0
0
4
–10
–20
5
20
40
Período
Retorno: Benchmark
Retorno: Carteira
1
10
11
2
6
8
3
0
–1
Este tem um pouco:
4
–10
–9
5
20
21
Período
Retorno: Benchmark
Retorno: Carteira
1
10
12
2
6
10
3
0
3
4
–10
2
5
20
30
Enquanto este tem muito:
Este é extraordinário, caso seja capaz de suportar a volatilidade:
Período
Retorno: Benchmark
Retorno: Carteira
1
10
25
2
6
20
3
0
–5
4
–10
–20
5
20
25
O que está claro nessas tabelas é que “vencer o mercado” e ser “um grande
investidor” não são sinônimos — veja os anos um e dois no terceiro exemplo. Não
é apenas o retorno que importa, mas também o risco que assumimos para obtê-lo.
“RETURNS AND HOW THEY GET THAT WAY” (RENDIMENTOS E COMO SE TORNAM O
QUE SÃO), 11 DE NOVEMBRO DE 2002
É importante termos em mente essas considerações ao avaliarmos a
habilidade de um investidor e ao compararmos o histórico de um investidor
defensivo e o de um investidor agressivo. Podemos chamar esse processo de
ajuste de estilo.
Em um ano ruim, os investidores defensivos perdem menos do que os
agressivos. Eles agregaram valor? Não necessariamente. Num ano bom, os
investidores agressivos ganham mais do que os defensivos. Eles fizeram um
trabalho melhor? Poucas pessoas diriam que sim sem analisar mais
profundamente.
Um único ano não diz quase nada sobre a habilidade do gestor,
especialmente quando os resultados estão alinhados ao que seria esperado
com base no estilo do investidor. Significa relativamente pouco que um
investidor agressivo obtenha rendimentos altos em um mercado em ascensão
ou que um investidor conservador seja capaz de minimizar as perdas em um
mercado em queda. A verdadeira questão é como eles se saem a longo prazo
e em locais em que seu estilo é inadequado.
O seguinte quadro conta essa história.
Investidor agressivo
Investidor defensivo
Ganha muito quando o mercado
Sem
sobe e perde muito quando o
habilidade
mercado cai.
Não perde muito quando o mercado
cai, mas não ganha muito quando o
mercado sobe.
Ganha muito quando o mercado
Com
sobe, mas não perde no mesmo
habilidade
grau quando o mercado cai.
Não perde muito quando o mercado
cai, mas obtém uma boa parte dos
ganhos quando o mercado sobe.
A chave dessa matriz é a simetria ou assimetria do desempenho. Os
investidores que não têm habilidade ganham somente o retorno do mercado
de acordo com os ditames de seu estilo. Sem habilidade, os investidores
agressivos se movem muito em ambas as direções, e os investidores
defensivos se movem pouco em qualquer direção. Esses investidores não
contribuem com nada além de sua escolha de estilo. Eles se saem bem
quando seu estilo os favorece e mal quando não os favorece.
Por outro lado, o desempenho dos investidores que agregam valor é
assimétrico. A porcentagem dos ganhos do mercado que obtêm é maior do
que a porcentagem de perdas que sofrem. Os investidores agressivos com
habilidade se dão bem nos mercados com tendência altista, mas não perdem
tudo o que ganharam nos mercados com tendência de baixa; enquanto os
investidores defensivos com habilidade perdem relativamente pouco nos
mercados com tendência de baixa e participam razoavelmente bem dos
mercados com tendência altista.
Tudo no ramo dos investimentos é uma faca de dois gumes que opera
simetricamente, com exceção da habilidade superior. Só podemos contar com
a habilidade para agregar mais valor em ambientes favoráveis do que para
perder em ambientes hostis. Essa é a assimetria que buscamos. Habilidade
superior é o pré-requisito para isso.
Veja como descrevo as aspirações de desempenho da Oaktree:
Nos anos em que o mercado está bom, basta sermos medianos. Todo
mundo ganha dinheiro nos bons anos; ainda não encontrei ninguém que
pudesse me explicar de forma convincente o motivo pelo qual é importante
bater o mercado quando o mercado está bem. Não, nos anos bons basta
ficarmos na média.
Há períodos, contudo, em que consideramos essencial vencer o mercado:
isso ocorre nos anos em que o mercado está ruim. Nossos clientes não
desejam suportar todo o peso das perdas quando essas ocorrerem, e nós
também não.
Assim, nosso objetivo é ter um desempenho igual ao do mercado quando
ele vai bem e melhor do que o do mercado quando ele vai mal. À primeira
vista, isso pode soar como um objetivo modesto, mas é realmente muito
ambicioso.
Para manter-se alinhada com o mercado quando ele vai bem, uma carteira
precisa incorporar uma boa quantidade de beta e correlação com o mercado.
Ora, se o beta e a correlação nos ajudam nas altas, não seria de se esperar que
eles nos prejudicassem nas baixas?
Quando, de forma consistente, somos capazes de perder menos que o
mercado nas quedas e também participar plenamente quando o mercado sobe,
isso só pode ser atribuído a uma causa: alfa ou habilidade.
Esse é um exemplo de investimento de valor agregado, e quando ocorre ao
longo de décadas, só pode ser explicado pela habilidade do gestor. A
assimetria deve ser o objetivo de todo investidor.
20
O mais importante é… juntar tudo
A melhor base para o êxito de um investimento — ou o êxito de uma carreira
de investimentos — é o valor; ter uma boa ideia do quanto vale aquilo que
queremos comprar. Há muitos componentes e muitas maneiras de analisar o
tema. De forma extremamente simplificada: o caixa do balanço patrimonial e
o valor dos ativos tangíveis, e a capacidade da empresa ou do ativo para gerar
caixa; por fim, a possibilidade de que essas coisas aumentem.
Para obtermos resultados extraordinários nos investimentos, precisamos ter
uma percepção extraordinária do valor. Assim, devemos aprender coisas que
os outros não sabem, ver as coisas de forma diferente ou analisá-las melhor
— idealmente, todas as três.
Nosso entendimento sobre o valor deve basear-se em fundamentos sólidos,
factuais e analíticos, e precisamos mantê-lo firmemente. Somente assim
saberemos quando comprar ou vender. Apenas um forte senso de valor nos
dará a disciplina necessária para obter lucros de um ativo extremamente
sobrevalorizado e cujo preço todos imaginam que continuará aumentando
sem parar ou a coragem para mantermos nossa posição e comprar mais ações
ao preço mais baixo (fazer preço médio) durante uma crise, mesmo que os
preços mantenham uma queda diária. Claro, para que os nossos esforços
nesses aspectos sejam lucrativos, nossa avaliação do valor precisa ser exata.
A relação entre preço e valor detém a chave final para se obter êxito nos
investimentos. Comprar abaixo do valor é a rota mais confiável para se obter
lucro. Pagar acima do valor não costuma funcionar tão bem.
O que faz com que um ativo seja vendido abaixo de seu valor? Existem boas
oportunidades de compra principalmente porque nossa percepção costuma
subestimar a realidade. Diferentemente da alta qualidade, que pode ser
facilmente avaliada, a percepção aguçada é capaz de detectar a
subprecificação. Por essa razão, os investidores costumam confundir o mérito
objetivo de um ativo e uma boa oportunidade de investimento. Os melhores
investidores nunca esquecem que estão atrás de boas compras, não de bons
ativos.
Além de dar origem ao potencial de lucro, comprar quando o preço está
abaixo do valor adiciona um elemento importante para a limitação do risco.
Pagar mais pelo alto crescimento de um ativo e participar de um mercado
aquecido não são capazes de fazer o mesmo.
A relação entre preço e valor é influenciada por fatores psicológicos e
técnicos, forças que podem dominar os fundamentos no curto prazo. As
oscilações extremas no preço devido a esses dois fatores oferecem
oportunidades para grandes lucros ou grandes erros. Para se obter o primeiro
e não o segundo, devemos insistir no conceito de valor e lidar com os fatores
psicológicos e técnicos.
Economias e mercados passam por ciclos de altas e baixas. Seja qual for a
tendência do momento, a maioria das pessoas costuma acreditar que será
mantida da mesma forma para sempre. Esse pensamento induz a grande
perigo, pois envenena os mercados, leva as valorações a pontos extremos e
estimula as bolhas e o pânico, cujo enfrentamento se mostra muito difícil para
a maioria dos investidores.
Da mesma forma, a psicologia de rebanho dos investimentos se move em um
padrão regular, similar à oscilação de um pêndulo — do otimismo ao
pessimismo; da credulidade ao ceticismo; do medo de perder a oportunidade
ao medo de perder dinheiro; e, portanto, do entusiasmo para comprar à
urgência de vender. A oscilação do pêndulo leva o rebanho a comprar a
preços altos e vender a preços baixos. Por isso, fazer parte do rebanho é uma
fórmula para o desastre, enquanto ter um ponto de vista contrário nas
extremidades das oscilações nos ajudará a evitar as perdas e, ao final, nos
trará êxito.
Em particular, a aversão ao risco — a qual, em níveis apropriados, é o
ingrediente essencial em um mercado racional —, às vezes, é pouca e, outras,
excessiva. A flutuação do fator psicológico dos investidores nesse sentido
desempenha um papel muito importante na criação de bolhas e crises
econômicas.
Não devemos nunca subestimar o poder das influências psicológicas.
Ganância, medo, suspensão das regras da realidade, conformismo, inveja, ego
e capitulação fazem parte da natureza humana, e sua capacidade de
influenciar nossas ações atinge profundidades, especialmente quando estão
em pontos extremos e são compartilhadas pelo rebanho. Influenciarão os
outros, e o investidor sensato também vai senti-los. Nenhum de nós deve
achar que é imune ou que está longe de sua influência. Embora os sintamos,
não devemos sucumbir; em vez disso, devemos reconhecê-los pelo que são e
lutar contra eles. A razão deve superar a emoção.
A maioria das tendências — tanto as altistas quanto as de baixa — acaba
passando do ponto, beneficiando aqueles que as reconhecem logo no início e
penalizando os últimos a aderir. Este é o raciocínio por trás do meu lema
número 1 sobre investimentos: “tudo que o sábio faz no início o tolo faz no
final”. A capacidade de resistir aos excessos é rara, mas é um atributo
importante dos investidores de maior êxito.
É impossível saber quando um mercado superaquecido vai declinar, ou
quando uma recessão terminará, dando lugar à retomada da valorização.
Embora seja impossível saber para onde estamos indo, é importante sabermos
em que ponto estamos. Podemos inferir o ponto em que os mercados se
encontram em seu ciclo a partir do comportamento daqueles ao nosso redor.
Quando os outros investidores não estão preocupados, devemos ser
cautelosos; quando os investidores estão em pânico, devemos nos tornar
agressivos.
Nem mesmo o ponto de vista contrário, no entanto, produzirá lucros o tempo
todo. As grandes oportunidades de compra e venda associam-se a extremos
de valorização, e, por definição, não ocorrem todos os dias. Também
compramos e vendemos em pontos menos atraentes do ciclo, já que poucos
de nós podem se contentar em atuar apenas uma vez a cada poucos anos.
Devemos reconhecer quando as chances de êxito são menos favoráveis e
caminhar com mais cautela.
Os melhores resultados são obtidos provavelmente quando se compra com
base em valor sólido, preço baixo em relação ao valor e em um ambiente cuja
disposição psicológica dos investidores está deprimida. Mesmo assim,
entretanto, as coisas podem se manter contrárias a nós por um longo tempo
antes de começarem a se comportar da maneira que, segundo nossa
convicção, deveriam ser. Subprecificado está longe de ser sinônimo de
aumentará em breve. Assim, a importância do meu segundo lema: “Não há
distinção entre estar muito à frente de seu tempo e estar errado”. Será preciso
muita paciência e força para manter as mesmas posições pelo tempo
necessário para que se mostrem corretas.
Além de poder quantificar o valor e adquiri-lo quando estiver precificado
corretamente, os investidores de êxito devem ter uma abordagem sólida sobre
o risco. Precisam ir muito além da definição acadêmica de risco como
volatilidade e entender que o risco que mais importa é o da perda permanente.
Eles precisam rejeitar o aumento da posição de risco como uma fórmula
infalível para se obter êxito nos investimentos e entender que os
investimentos mais arriscados implicam um maior leque de resultados
possíveis e uma maior probabilidade de perda; precisam ter noção do
potencial de perda que está presente em cada investimento e estar dispostos a
assumi-lo apenas quando a recompensa for mais do que adequada.
A maioria dos investidores é simplista, somente se preocupa com a
possibilidade de se obter retornos. Alguns acabam ganhando uma melhor
percepção e aprendem que é tão importante entender o risco quanto o retorno.
Mas é o raro investidor que alcança a sofisticação necessária para apreciar a
correlação, um elemento-chave no controle do risco de uma carteira global.
Devido às diferenças na correlação, certos investimentos individuais que
possuem o mesmo risco absoluto podem ser combinados de diferentes
maneiras, formando carteiras com níveis de risco totais muito diferentes. A
maioria dos investidores acha que a diversificação consiste em deter muitos
ativos diferentes; poucos entendem que a diversificação só é eficaz quando os
componentes de uma carteira respondem diferentemente a um mesmo evento
de seu entorno.
O investimento agressivo pode produzir resultados empolgantes quando dá
certo — especialmente nos períodos bons —, porém, é improvável que gere
ganhos tão confiáveis quanto os do investimento defensivo. Assim, a baixa
incidência e a pouca gravidade das perdas são parte dos melhores históricos
de investimentos. O lema da Oaktree, “Se evitarmos os perdedores, os
vencedores cuidarão de si mesmos”, nos serviu bem ao longo dos anos. Uma
carteira diversificada de investimentos na qual se torna improvável que cada
um dos ativos individuais produza perdas significativas é um bom começo
para o êxito do investimento.
O controle de riscos é o fundamento do investimento defensivo. Em vez de
apenas tentar fazer a coisa certa, a ênfase do investidor defensivo é não fazer
a coisa errada. Como garantir a capacidade de sobrevivência em
circunstâncias adversas é incompatível com a maximização dos retornos nos
períodos bons, os investidores devem escolher qual equilíbrio querem entre
os dois. O investidor defensivo escolhe o primeiro.
Margem de erro é um elemento crítico no investimento defensivo. A maioria
dos investimentos terá êxito se o futuro se desenrolar conforme se espera,
mas, se o futuro não ocorrer da forma esperada, precisamos ter uma margem
de erro para que os resultados sejam toleráveis. Um investidor pode obter
margem de erro ao insistir na existência de um valor tangível e duradouro,
aqui e agora; ao comprar somente quando o preço está bem abaixo de seu
valor; ao evitar alavancagem; por meio da diversificação. Enfatizar esses
elementos amplia a possibilidade de limitar seus ganhos nos períodos bons,
mas também maximizará suas chances de manter-se intacto quando as coisas
não estiverem bem. Meu terceiro lema favorito é: “Nunca se esqueça do
homem de 1,80 metro de altura que se afogou cruzando o córrego cuja
profundidade era, em média, de 1,50 metro!”. A margem de erro nos oferece
o poder de permanência e de sobrevivência nos pontos mais fundos.
O controle de risco e a margem de erro devem estar presentes em nossas
carteiras o tempo todo. Mas devemos nos lembrar de que eles representam
“ativos ocultos”. A maior parte dos anos nos mercados é boa; é apenas nos
anos ruins (quando a maré está baixa) que o valor da defesa se torna evidente.
Assim, durante os anos bons, os investidores defensivos devem se contentar
sabendo que seus ganhos, ainda que sejam inferiores aos máximos, foram
obtidos com proteção de risco em vigor, mesmo que ela não tenha sido
necessária.
Um dos requisitos essenciais para o sucesso do investimento (portanto, parte
da instrumentação psicológica da maioria dos grandes investidores) é a
percepção de que não sabemos o que está por vir em termos de futuro
macroeconômico. Poucas pessoas, ou talvez nenhuma, sabem mais do que o
consenso sobre o que vai acontecer com a economia, com as taxas de juros e
com os agregados do mercado. Por isso, o investidor gastará melhor seu
tempo se tentar usá-lo para obter vantagens em relação aos conhecimentos
possíveis, a saber, sobre setores, empresas e ativos. Quanto mais
especializado for o seu foco, maior será a probabilidade de aprender coisas
que os outros não sabem.
Há muito mais investidores que presumem conhecer os caminhos futuros das
economias e dos mercados — e agem em conformidade — do que
investidores que realmente os conhecem. Eles realizam ações agressivas com
base nesse futuro que dizem conhecer, porém, isso não costuma produzir os
resultados desejados. Investir com base em previsões mantidas de forma
bastante convicta, mas incorretas, é uma fonte potencial de grandes perdas.
Muitos investidores — amadores e profissionais — acreditam que o mundo
funciona por meio de processos ordenados passíveis de compreensão e
previstos. Ignoram a aleatoriedade das coisas e a distribuição de
probabilidades que está por trás dos acontecimentos futuros. Assim, optam
por basear suas ações em um cenário que acreditam que acontecerá. Isso
funciona às vezes — e o investidor ganha elogios —, mas não é algo
consistente e, por isso, não é capaz de produzir êxito a longo prazo. Vale a
pena notar que, tanto na previsão econômica quanto na gestão de
investimentos, há geralmente alguém que acerta exatamente, mas raramente
uma mesma pessoa acerta duas vezes. Os investidores de maior êxito
conseguem acertar “razoavelmente bem” na maioria das vezes, e isso é muito
melhor do que os outros conseguem.
Uma parte importante para fazer a coisa certa consiste em evitar as
armadilhas que costumam ser apresentadas pelas flutuações econômicas,
pelas dificuldades das empresas, pelas oscilações dos mercados causadas por
modismos e pela credulidade de outros investidores. Não há nenhuma
fórmula infalível; porém, a consciência da eventualidade desses possíveis
perigos representa o melhor ponto de partida para que não sejamos vítimas
deles.
Nem os investidores defensivos, que limitam suas perdas em um mercado em
queda, nem os investidores agressivos, com ganhos substanciais em um
mercado em alta, provaram que possuem habilidade. Para que possamos dizer
que os investidores realmente agregam valor, temos de ver como eles se
comportam em ambientes que não se mostram particularmente adequados ao
estilo deles. O investidor agressivo é capaz de minimizar suas perdas em um
mercado com tendência de baixa? O investidor defensivo participará
substancialmente dos aumentos quando o mercado estiver em ascensão? Esse
tipo de assimetria é a verdadeira expressão da habilidade dos investidores. O
investidor tem mais ativos vencedores do que perdedores? Os ganhos dos
vencedores são maiores do que as perdas dos perdedores? Os anos bons são
mais benéficos do que os prejuízos dos anos ruins? Os resultados a longo
prazo são melhores do que poderia sugerir o estilo do investidor? Esses são
os atributos dos melhores investidores. Sem eles, os retornos talvez sejam
resultado de pouco mais do que o movimento do mercado e o beta.
Apenas os investidores com percepção incomum podem predizer com
regularidade a distribuição de probabilidade que rege os eventos futuros e
notar quando os rendimentos potenciais compensam os riscos que se
escondem na extremidade negativa da distribuição. Essa descrição simples
dos requisitos necessários para investir com êxito (baseada no entendimento
do leque de ganhos possíveis e do risco de acontecimentos desfavoráveis)
contém em si os elementos que devem receber nossa atenção. Deixo essa
tarefa para você, leitor. Esses elementos vão levá-lo a uma jornada
desafiadora, emocionante e instigante.
Notas
1. Capital Asset Pricing Model. (N. E.)
1. Em inglês, momentum investing. Investir de acordo com a tendência do momento. Por essa
estratégia, deve-se comprar ativos que tiveram altos rendimentos nos últimos meses e vender os que
tiveram baixos rendimentos. (N. T.)
1. Em inglês, junk bonds. São títulos que, por sua classificação de risco, não são investment-grade. Por
isso, são mais arriscados, podem gerar rendimentos mais elevados e envolvem maior risco de não
cumprimento. (N. T.)
2. Exigência para que sejam oferecidas mais garantias a uma dívida. (N. T.)
3. É um tipo de investimento que financia empresas de médio porte ainda não listadas em bolsa. Em
geral, este negócio possui menor risco e menor potencial de retorno em relação ao venture capital. (N.
R. T.)
1. Oferta de valores mobiliários para investidores superqualificados, sem esforços de vendas. (N. T.)
2. Relativo a “altismo”, tendência constante para a alta de preços; não confundir com “autismo”. (N. E.)
1. No original, não há o nome do autor desta citação. (N. E.)
2. A metáfora do pêndulo será explicada no capítulo 9. (N. T.)
3. Spread do rendimento é a diferença entre o título governamental e a ação empresarial. (N. T.)
4. São títulos de alta qualidade, conforme a avaliação de uma agência de notas de crédito (por exemplo,
Standard & Poor’s, Moody’s e Fitch); já um título especulativo, com classificação de crédito inferior ao
investment-grade, é chamado de título de alto rendimento (em inglês, high yield). (N. T.)
5. É um tipo de aquisição que ocorre quando os investidores compram a maioria do capital social de
uma empresa e assumem seu controle. (N. T.)
6. É um tipo de investimento que financia empresas em fase inicial. Este negócio possui alto risco de
perda, mas também apresenta os altos potenciais de retorno em caso de sucesso. (N. R. T.)
7. Hedge funds são fundos do tipo multimercado em que a gestão tem autonomia para investir em
diferentes mercados. (N. R. T.)
8. Banco de investimentos sediado em Nova York; quebrou em 2008 em razão da crise dos subprimes e
foi comprado pelo J. P. Morgan por 10% de seu valor de mercado. (N. T.)
1. J. K. Galbraith. Uma breve história da euforia financeira. São Paulo: Pioneira, 1992.
2. Algo como indexação de armário ou pseudoativo; é uma estratégia usada para descrever fundos que
dizem comprar investimentos de forma ativa, mas acabam com um portfólio não muito diferente do
benchmark. (N. T.)
3. Em inglês, 401(k) retirement plan. É um fundo de pensão americano com benefícios tributários
especiais. (N. T.)
4. Em inglês, Initial Public Offering (IPO). É a venda de ações em uma oferta pública que, em geral, é
feita em uma bolsa de valores. (N. T.)
5. O múltiplo de vendas ou preço/vendas é um instrumento de avaliação de empresas, obtido pela
divisão do valor de mercado da empresa pelo seu faturamento com vendas. (N. R. T.)
1. D. F. Swensen. Pioneering portfolio management: an unconventional approach to institutional
investment. New York: Free Press, 2000. (N. T.)
2. Em inglês, distresses debt. (N. T.)
1. Federal Reserve System, ou FED, é o banco central dos Estados Unidos, que, na época, era dirigido
por Alan Greenspan. (N. T.)
2. Teoria da barra das saias (em inglês, hemline theory) “é a ideia de que os preços das ações
acompanham o movimento geral do comprimento das saias femininas. As saias curtas nos anos 1920 e
1960 eram consideradas um sinal de que os preços das ações subiriam, enquanto os vestidos mais
compridos dos anos 30 e 40 eram considerados indicadores de que o mercado tenderia à baixa”.
Dicionário de termos financeiros e de investimentos. John Downes e Jordan Elliot Goodman (org.). São
Paulo: Nobel, 1993. (N. T.)
1. Mujo, em japonês, significa impermanência ou mutabilidade. (N. T.)
2. Theodore Samuel Williams (1918-2002) foi um jogador americano de beisebol. (N. T.)
3. Em inglês, strike zone. No beisebol, um retângulo imaginário entre os joelhos e os ombros do
rebatedor. (N. T.)
1. A autoria da frase citada é contestada. (N. T.)
1. “Termo que vem do inglês e significa acordo. Trata-se de uma restrição legal imposta aos contratos
de emissão de títulos, ou financiamento, nos quais o tomador de crédito tem suas atividades restritas e
cujo objetivo é dar mais segurança ao financiador.” E. Gama. Dicionário de finanças empresariais.
Timburi: Cia. do Ebook. (N. T.)
2. Obtenção de lucro pela diferença de taxas ou preços em mercados financeiros ou bolsas de
mercadorias. Long/short é uma operação de arbitragem entre dois ou mais ativos. (N. T.)
3. Selling onward é o processo pelo qual a origem e a posse do crédito são separadas. Depois de
originado, os ativos, tais como empréstimos corporativos e hipotecas, são empacotados e vendidos para
outros investidores. (N. R. T.)
4. Os sócios em nome coletivo respondem pelas dívidas de forma ilimitada. (N. T.)
5. Os sócios limitados respondem pelas dívidas de forma limitada. (N. T.)
Sumário
Capa
Folha de rosto
Dedicatória
Sumário
Prefácio
Introdução
1 O mais importante é… o pensamento de segundo nível
2 O mais importante é… entender a eficiência do mercado (e suas
limitações)
3 O mais importante é… o valor
4 O mais importante é… a relação entre preço e valor
5 O mais importante é… entender o risco
6 O mais importante é… reconhecer o risco
7 O mais importante é… controlar o risco
8 O mais importante é… estar atento aos ciclos
9 O mais importante é… estar ciente do pêndulo
10 O mais importante é… combater as influências negativas
11 O mais importante é… o ponto de vista contrário
12 O mais importante é… encontrar pechinchas
13 O mais importante é… o oportunismo paciente
14 O mais importante é… saber o que não sabemos
15 O mais importante é… entender nossa posição
16 O mais importante é… apreciar o papel da sorte
17 O mais importante é… investir de forma defensiva
18 O mais importante é… evitar armadilhas
19 O mais importante é… agregar valor
20 O mais importante é… juntar tudo
A ciência de ficar rico
Wattles, Wallace D.
9788552101154
96 páginas
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A ciência de ficar rico é a obra que inspirou o best-seller O segredo, da
autora Rhonda Byrne. Com nova tradução, neste livro clássico sobre o
enriquecimento Wallace D. Wattles descreve os passos necessários, por meio
de uma programação mental, para alcançar a prosperidade. Para isso, lança
mão de poderosas ferramentas, como a visualização criativa e a lei da atração,
entre outras regras universais. Obra de referência utilizada por coachs e
empresários em todo o mundo.
Wattles apresenta um manual prático, e não um tratado teórico. Para o autor,
o objetivo da vida é o progresso. O desenvolvimento da mente, da alma e do
corpo depende também de bens materiais, que só podem ser alcançados por
meio da prosperidade financeira.
A ciência de ficar rico é destinado a quem busca ir além do desejo vago da
riqueza. Este livro apresenta um plano concreto, um novo modo de pensar,
em que um objetivo claro, aliado ao planejamento e à ação, certamente o
levará ao sucesso.
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Meditações
Aurélio, Marco
9788552100928
160 páginas
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Estas são anotações pessoais do imperador romano Marco Aurélio escritas
entre os anos de 170 a 180.
Também conhecidas como Meditações a mim mesmo, reúnem aforismos que
orientaram o governante pela perspectiva do estoicismo – o controle das
emoções para que se evitem os erros de julgamento. Suas meditações formam
um manual de comportamento ainda atual sobre como podemos melhorar
nosso comportamento e o relacionamento com o próximo.
Marco Aurélio trava um diálogo interior em busca de verdades fundamentais
por meio da razão sem deixar de lado a sensibilidade. Sem inclinação a
qualquer crença religiosa, Meditações apela para ordens universais nas quais
até mesmo os acontecimentos ruins ocorrem para o bem de todos. O
imperador assume o papel do filósofo que instrui o aluno e dá conselhos ao
amigo.
Por seu caráter íntimo, Meditações tornou-se um dos escritos mais
reveladores e inspiradores a respeito do pensamento de um grande líder.
Apresenta ensinamentos sobre as virtudes, a felicidade, a morte, as paixões e
a harmonia com a natureza e a aceitação de suas leis. Figura ainda entre as
obras fundamentais para os estudiosos da filosofia estoica, mesmo milênios
depois de sua composição.
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Manifesto do Partido Comunista
Marx, Karl
9788552100539
112 páginas
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Este é um dos tratados políticos de maior influência na História. Em 1848,
data de sua publicação, revoluções varriam a Europa. Correntes nacionalistas,
socialistas, liberais e democráticas levantavam-se contra regimes
monárquicos e autocráticos, e foi o Manifesto a expressão máxima do
programa e propósitos da Liga dos Comunistas no período.
Fazem parte do Manifesto importantes bandeiras defendidas pela Liga nas
revoluções, como a diminuição das jornadas de trabalho de doze para dez
horas e o voto universal – mas ainda sem contemplar o sufrágio feminino.
Após a prisão dos membros da Liga dos Comunistas e sua dissolução, o
Manifesto do Partido Comunista manteve-se esquecido por longos anos.
Ainda assim, tornou-se um dos textos mais lidos em todo o mundo. Ao longo
da História, poucos documentos resistiram tanto ao tempo, mantiveram-se tão
atuais e influenciaram tantas pessoas quanto esta obra.
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O mito da caverna
Platão
9788552100850
80 páginas
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Um dos textos filosóficos mais lidos de todos os tempos,este clássico de
Platão – extraído de sua obra A República – que narra um diálogo entre o
irmão de Platão, Gláucon, e Sócrates, seu mentor, é um convite à permanente
reflexão. Sua atualidade e relevância justificam-se por inspirar o resgate de
valores fundamentais para a formulação do senso crítico, despertando a
consciência político-filosófica tão necessária nos dias atuais. Uma obra de
formação intelectual que explica como podemos nos libertar da escuridão que
nos aprisiona através da luz da verdade. Aqui Platão discute sobre teoria do
conhecimento, linguagem e educação na formação do Estado ideal. Sua
leitura contribui para o engrandecimento pessoal dos jovens e inspira todos os
leitores a atuarem como seres sociais conscientes da necessidade de
esclarecimento de todos os demais.
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A Quarta Revolução Industrial
Schwab, Klaus
9788552100461
160 páginas
Compre agora e leia
A Quarta Revolução Industrial é diferente de tudo o que a humanidade já
experimentou.
Novas tecnologias estão fundindo os mundos físico, digital e biológico de
forma a criar grandes promessas e possíveis perigos.
A velocidade, a amplitude e a profundidade desta revolução estão nos
forçando a repensar como os países se desenvolvem, como as organizações
criam valor e o que significa ser humano.
Como fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, Klaus
Schwab esteve no centro dos assuntos globais por mais de 40 anos.
Após observar em primeira mão como os líderes mundiais navegaram pela
revolução digital, Schwab está convencido de que estamos no início de um
período ainda mais emocionante e desafiador.
Esta obra descreve as principais características da nova revolução tecnológica
e destaca as oportunidades e os dilemas que ela representa. E o mais
importante, o autor explica por que a Quarta Revolução Industrial é algo
fabricado por nós mesmos e está sob nosso controle, e como as novas formas
de colaboração e governança, acompanhadas por uma narrativa positiva e
compartilhada, podem dar forma à nova Revolução Industrial para o
benefício de todos.
Se aceitarmos a responsabilidade coletiva para a criação de um futuro em que
a inovação e a tecnologia servem às pessoas, elevaremos a humanidade a
novos níveis de consciência moral.
"[…] uma síntese excelente e oportuna sobre a mais extensa e profunda
transformação da paisagem tecnológica em mais de dois séculos, desde a
(primeira) Revolução Industrial. […] O professor Schwab registra três
objetivos: conscientizar as pessoas sobre o tamanho, a velocidade e os
impactos da revolução; delinear as questões centrais e destacar as possíveis
respostas, bem como oferecer uma plataforma para que as parcerias públicoprivadas enfrentem os desafios e desbloqueiem as oportunidades. […] A
oportuna publicação do livro do professor Schwab destaca uma das partes
mais importantes desse desafio, que irá gerar uma discussão robusta na
reunião anual do Fórum Econômico Mundial em 2016 e além. Deve ser lido
com cuidado por todos que se interessam pelo futuro da humanidade."
– Seán Cleary, Vice-Presidente Executivo, Fundação FutureWorld –
"Schwab não é um evangelizador tecnológico […]; na verdade, ele é um
humanista, tentando fazer que as tecnologias emergentes funcionem e
trabalhem para as pessoas. Ele deseja garantir que as pessoas façam escolhas
explícitas […] e que as tecnologias sejam aproveitadas pelos seres humanos.
Seu livro é uma chamada para definirmos a utilização dessas tecnologias
emergentes."
– Daniel Runde – Foreign Policy
"Jack Welch uma vez afirmou que 'se a mudança no lado de fora de sua
empresa for mais rápida que a do lado de dentro, o fim está próximo'. O livro
do professor Schwab é uma contribuição valiosa na busca de uma melhor
compreensão desse processo [quarta revolução industrial]. Você pode
concordar com seus argumentos ou discordar deles. A única coisa que não
pode fazer é ignorá-los."
– Artur Wichmann, Gestor de Estratégia Internacional da Verde Asset
Management –
Compre agora e leia