Associação Brasileira de Professores de
Literatura Portuguesa
Anais do XXVI Congresso
Internacional da ABRAPLIP
Ensino e pesquisa da literatura portuguesa
no Brasil e no mundo
Universidade Federal do Paraná
02 a 05 de outubro de 2017
Curitiba
2017
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Reitor: Prof. Dr. Ricardo Marcelo Fonseca
Setor de Ciências Humanas (SCH – UFPR)
Diretora: Profa. Dra. Ligia Negri
Departamento de Literatura e Linguística (DELLIN – UFPR)
Chefe: Profa. Dra. Adelaide Hercília Pescatori Silva
Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGLET – UFPR)
Coordenadora: Profa. Dra. Maria Cristina Figueiredo Silva
Associação Brasileira de Professores de Literatura Portuguesa (ABRAPLIP)
Diretoria Executiva - Gestão 2016/2017
Presidente: Profª. Drª. Patrícia da Silva Cardoso (UFPR)
Vice-Presidente: Prof. Dr. Jorge Vicente Valentim (UFSCAR)
Secretário-Executivo: Prof. Dr. Antonio Augusto Nery (UFPR)
Secretário Adjunto: Profª. Drª. Rosana Apolonia Harmuch (UEPG)
Tesoureiro: Prof. Dr. Luís Gonçales Bueno de Camargo (UFPR)
Tesoureiro Adjunto: Prof. Dr. Marcelo Corrêa Sandmann (UFPR)
Assessora de Comunicação: Profª. Drª. Luciene Marie Pavanelo (UNESP)
Zonas regionais de representatividade:
Regional 1 – RJ e ES: Profª. Drª. Ida Maria Santos Ferreira Alves (UFF) e Profª.
Drª. Mônica Figueiredo (UFRJ)
Regional 2 – SP e MS: Prof. Dr. Paulo Motta Oliveira (USP) e Profª. Drª. Renata
Soares Junqueira (UNESP)
Regional 3 – BA, SE e AL: Prof. Dr. Márcio Ricardo Coelho Muniz (UFBA) e Prof.
Dr. Flávio Reis (UESB)
Regional 4 – PE, PB, RN, CE, MA e PI: Profª. Drª. Ana Márcia Alves Siqueira
(UFC) e Profª. Drª. Márcia Manir Miguel Feitosa (UFMA)
Regional 5 – RS, SC e PR: Profª. Drª. Simone Schmidt (UFSC) e Profª. Drª. Tatiana Prevedello (IFFAR)
Regional 6 – MG, GO, TO e OF: Profª. Drª. Raquel Madanelo Sousa (UFMG) e
Daviane Moreira (UFG)
Regional 7 – AM, AP, AC, PA, RO, RR e MT: Prof. Dr. Otávio Rios Portela (UEA) e
Prof. Dr. Sílvio Augusto de Oliveira Holanda (UFPA)
XXVI Congresso Internacional da Associação Brasileira de Professores de
Literatura Portuguesa (ABRAPLIP)
Comissão organizadora:
Prof. Dr. Antonio Augusto Nery (UFPR)
Profª. Drª. Luciene Marie Pavanelo (UNESP)
Prof. Dr. Luís Gonçales Bueno de Camargo (UFPR)
Prof. Dr. Marcelo Corrêa Sandmann (UFPR)
Profª. Drª. Patrícia da Silva Cardoso (UFPR)
Promoção:
Centro de Estudos Portugueses da Universidade Federal do Paraná (CEP –
UFPR)
Endereço: Rua General Carneiro, 460, 11º andar, sala 1108. Centro. 80060150 – Curitiba, PR – Brasil. E-mail: cep.ufpr@gmail.com. Telefones: +55
(41) 3360 5303/ +55 (41) 3360 5097
Composição e Diagramação: Prof. Dr. Giuliano Lellis Ito Santos (USP)
Apoio:
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Setor de Ciências Humanas (CH – UFPR)
Departamento de Literatura e Linguística (DELLIN – UFPR)
Programa de Pós-graduação em Letras (PPGLET – UFPR)
Associação Internacional de Lusitanistas (AIL)
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
Editora Oficina Raquel
Sumário
APRESENTAÇÃO
19
O ENTRECRUZAMENTO ENTRE O EU E O OUTRO DIANTE DA ESFERA PÚBLICA E PRIVADA CONSTRUÍDA EM O HOMEM DUPLICADO,
DE JOSÉ SARAMAGO
21
Aline Santos Pereira
BLIMUNDA SETE-LUAS: RELAÇÕES DE PODER E RESISTÊNCIA EM
MEMORIAL DO CONVENTO, DE JOSÉ SARAMAGO
31
Amanda Gomes de Matos Ramos
SOBRE OS ESPELHOS NOS POEMAS DE FLORBELA ESPANCA: INDÍCIOS REPRESENTATIVOS
45
Amanda Moury Fernandes Bioni
CONVERGÊNCIAS VERGILIANAS: ARTE, PALAVRA, VIDA
Ana Cristina Fernandes Pereira Wolff
60
A COMPOSIÇÃO DO UNIVERSO ZOOLÓGICO DE OS CUS DE JUDAS.
78
Ana Cristina Pinto Bezerra
A CRISE IDENTITÁRIA DO SUJEITO PÓS-MODERNO NA CRÔNICA A
CONSEQUÊNCIA DOS SEMÁFOROS, DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
102
Ana Lucia Jesus da Silva
CAOS POR ORDENAR: OS DUPLOS EM O HOMEM DUPLICADO
114
Andrea Bittencourt
O ANIMAL QUE TAMBÉM SOU: UM ESTUDO DO CONTO “UM CASACO DE RAPOSA VERMELHA” DE TEOLINDA GERSÃO
122
Antonia Marly Moura da Silva
“AQUELE SHE ERA EU”: A (IM)POSSIBILIDADE DE NARRAR, EM OS
MEMORÁVEIS (2014), DE LÍDIA JORGE.
132
Ariane de Andrade da Silva
REVOLTA ÀS ORIGENS DE UMA “TRADIÇÃO INVISÍVEL”: UMA LEITURA DE ESSE CABELO, DE DJAIMILIA PEREIRA DE ALMEIDA
142
Bianca Mafra Gonçalves
JOSÉ SARAMAGO PÓS-NOBEL E SEU ÚLTIMO ROMANCE: O ESCRITOR E SUA MISSÃO
151
Bianca Rosina Mattia
“O SÉCULO XIX CONCEBEU A DEMOCRACIA”: ASPECTOS ESTÉTICO-POLÍTICOS DA DESCRIÇÃO EM OS MAIAS
159
Breno Góes
FACES DA RELIGIOSIDADE EM A PÉCORA E AUTO DA COMPADECIDA
169
Bruno Vinicius Kutelak Dias
JOAQUIM SASSA: O HOMEM EM VIAGEM. UMA ANÁLISE ÀS VIAGENS DE A JANGADA DE PEDRA, DE JOSÉ SARAMAGO
186
Caio Henrique da Silva Reis
O DISCURSO SIMBOLISTA NOS CAMPOS LITERÁRIO BRASILEIRO E
PORTUGUÊS
193
Camila Paiva da Silva¹
DO RIZOMA À FICÇÃO DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
Camila Savegnago
215
ANTERO DE QUENTAL ONTEM E HOJE: A EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA
ESCRITA E DO DEBATE
224
Carolina Lopes Batista
A REPRESENTAÇÃO DA LOUCURA EM CAMILO CASTELO BRANCO
232
Caroline Aparecida de Vargas
O GROTESCO EM “LOUCURA”, DE MÁRIO DE SÁ CARNEIRO: UM
OLHAR SOBRE O CARÁTER DE RAUL
261
Cássia Alves da Silva
VICENTE GUEDES E O DEVIR
Cesar Marcos Casaroto Filho
269
O ESTUDO DA PERSONAGEM EM SUA RELAÇÃO TRANSLITERÁRIA
275
Clarice Gomes Clarindo Rodrigues
A FORMAÇÃO DE UMA TRILOGIA EM: ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA,
A CAVERNA E ENSAIO SOBRE A LUCIDEZ
285
Claudia Carla Martins
EÇA DE QUEIRÓS REVISITADO NO SUPLEMENTO LITERÁRIO DE MINAS GERAIS
301
Cristiane Navarrete Tolomei
O TEMA DA CENSURA NO PERÍODO FORMATIVO EM SARAMAGO
(CONSTÂNCIA DA CIRCUNSTÂNCIA)
324
Cybele Regina Melo dos Santos
O OLHAR DE AMARO
Daiane Cristina Pereira
334
GOLGONA ANGHEL. DO REALISMO SATÍRICO À POÉTICA VADIA.
343
Daniel de Oliveira Gomes
NO SONHO DE XAVIER: A CONSTRUÇÃO DE UM ETHOS JESUÍTICO
EM UM SERMÃO PANEGÍRICO DE PADRE ANTÔNIO VIEIRA
363
Dario T. de Almeida Filho
“QUE SOFRÊNCIA, ‘FESSORA”: REFLEXÕES E EXPERIÊNCIAS SOBRE
O ENSINO DE LITERATURA PORTUGUESA
375
Daviane Moreira e Silva
A ESCRITA CRONÍSTICA AUTORREFLEXIVA DE INÊS PEDROSA: CONSIDERAÇÕES SOBRE A LITERATURA E O FAZER LITERÁRIO
382
Diana Navas
LUIZA DE MESQUITA: O MAR INALCANÇÁVEL
Diogo Ballestero Fernandes de Oliveira
396
PARA (O) ALÉM DA ADAPTAÇÃO: AS REMISSÕES LITERÁRIAS DO
FILME O ESTRANHO CASO DE ANGÉLICA DE MANOEL DE OLIVEIRA
401
Edimara Lisboa
MULHER DE BIGODE NEM O CÃO PODE: MACHISMO EM CAMILO
CASTELO BRANCO
409
Edson Santos Silva
THEATRUM MUNDI: A ESPETACULARIDADE BARROCA EM ANTÔNIO JOSÉ DA SILVA
426
Eduardo Neves da Silva
PARALELOS NA OBRA DE JANE AUSTEN (1775-1817) E MARIA PEREGRINA DE SOUSA (1809-1894)
444
Elen Biguelini
FEITICEIRAS: O CRIME DA IGREJA CATÓLICA EVOCADO ATRAVÉS
DAS CONVERGÊNCIAS ENTRE MARIA TERESA HORTA E JULES MICHELET
457
Elisa Moraes Garcia
OS SERMÕES DE SANTO ANTÔNIO DE LISBOA/ DE PÁDUA: ELEMENTOS RETÓRICOS, TEOLÓGICOS E CONTEXTUAIS
468
Émili Feitosa Olenchuk
MATÉRIA, MEMÓRIA E AUSÊNCIA EM A MANTA DO SOLDADO DE
LÍDIA JORGE
484
Evanir Pavloski
A SELVA DE FERREIRA DE CASTRO NAS ILUSTRAÇÕES DE POTY
493
Fabricio Vaz Nunes
A CEGUEIRA BRANCA COMO DOENÇA: MECANISMO DE SUSPENSÃO DA DEMOCRACIA NO ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, DE JOSÉ
SARAMAGO
518
Fabrizio Uechi
DO TEXTO À TELA. O DELFIM: DE CARDOSO PIRES A FERNANDO
LOPES
524
Fernanda de Aquino Araújo Monteiro
O QUE A POESIA ENSINA? – APONTAMENTOS SOBRE LUIZA
NETO JORGE, FIAMA HASSE PAIS BRANDÃO E SOPHIA DE MELLO
BREYNER
535
Fernanda Drummond
VIAGENS NA TERRA DE LUSO: PORTUGAL NOS CAMINHOS DE
GARRETT E SARAMAGO
543
Fernanda Lacombe
“OGIVA ENTRE O MISTÉRIO E O MAR”: MITO E HISTÓRIA EM MAIS
ALTO, DE ALFREDO GUISADO
557
Fernando de Moraes Gebra
UMA IDEIA DE CRISE: MANUEL DE FREITAS E A FINITUDE
578
Fernando Ulisses Mendonça Serafim
O ADVOGADO DO DIABO: O NARRADOR QUE CONTRARIA AS TRADIÇÕES CRISTÃS PORTUGUESAS EM O EVANGELHO SEGUNDO JESUS CRISTO, DE JOSÉ SARAMAGO
585
Filipe Marchioro Pfützenreuter
O ENSINO-APRENDIZAGEM DA LITERATURA E HISTÓRIA PORTUGUESAS À LUZ DO TEATRO
609
Flavia Maria Corradin
RUY BELO E FERNANDO PESSOA: MAR E FINGIMENTO
Flávio França
620
O ENGAJAMENTO DO VENTO
Gabriel Rachwal
630
MORTE EM JERUSALÉM, DE GONÇALO M. TAVARES
Gabriela Fujimori da Silva
638
A CONSTRUÇÃO DO INTERLOCUTOR AMOROSO EM AS NOVAS
CARTAS PORTUGUESAS
647
Gabriela Silva
O GRANDE MAIA: TOMÁS DE ALENCAR E A POLÊMICA ENTRE EÇA
DE QUEIRÓS E BULHÃO PATO.
659
Gisele de Carvalho Lacerda
OS VISCOS DA (AUTO)BIOGRAFIA NAS CARTAS DA GUERRA, DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
668
Graziele Maria Valim
PREDESTINADO E PRECITO: O USO DE PERSONAGENS ALEGÓRICAS A FAVOR DA CATEQUIZAÇÃO JESUÍTICA
674
Isabel Scremin da Silva
OROBORO NA LITERATURA DE GARRETT E MACHADO
Iuguslávia Jales Dutra
685
JOSÉ LUÍS PEIXOTO – AMOR, LUTO E LUTA
Ivanete França Galvão de Carvalho
697
DO LUGAR DA MULHER NA POESIA PORTUGUESA – UM OLHAR
ATEMPORAL
709
Vecina Abib
LITERATURA E ENSINO: UMA LEITURA EM MEIO DIGITAL DE DISPERSÃO, DE MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO
724
Jair Zandoná
UM AMOR FELIZ: MOURÃO-FERREIRA E SEUS JOGOS DE ESPELHO
740
Janaina de Souza Silva
PRESENÇA DE EÇA DE QUEIRÓS E FRADIQUE MENDES NO JORNAL
PAULISTANO O PIRRALHO (1911-1918) SOB A PERSPECTIVA DE JUÓ
BANANÉRE E DE MONTEIRO LOBATO.
749
Jaqueline de Oliveira Brandão
ENTRE MÚSICOS, PINTORES E SALTIMBANCOS: OS ARTISTAS DAS
PROSAS BÁRBARAS, DE EÇA DE QUEIRÓS
765
Jean Carlos Carniel
A VERDADE BESUNTADA
Jeanine Geraldo Javarez
773
O USO DA BREUITAS COMO JUSTIFICATIVA RETÓRICA DO ESQUECIMENTO NARRATIVO NAS CRÔNICAS DE GOMES EANES DE ZURARA
789
Jerry Santos Guimarães
Marcello Moreira
AS MEMÓRIAS DA COLONIZAÇÃO EM COMISSÃO DE LÁGRIMAS,
DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
798
Jéssica Baia Moretti da Silva
O VERBO SE FEZ ARTE: A RETÓRICA ANTIGA NA ORATÓRIA DE ANTÔNIO VIEIRA E DE DOM AQUINO CORRÊA
810
Jildonei Lazzaretti
A MAÇÃ QUE É SÓ DE EVA: LISBOA NAS CANTIGAS TROVADORESCAS, OU, MULHERES SEM ROSTO NO ROSTO DA CIDADE
838
João Felipe Barbosa Borges
EROS, IRONIA E FLUIDEZ NAS CRÔNICAS AS COISAS DA VIDA E ESPERO POR TI NO MEIO DAS GAIVOTAS, DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
857
Joelma Lôbo Junqueira Trajano
“A MESMA HISTÓRIA TANTAS VEZES LIDA”: AS MI(S)TIFICAÇÕES DE
FLORBELA ESPANCA
875
Jonas Jefferson de Souza Leite
RELAÇÕES ENTRE MEMÓRIA E HISTÓRIA: UMA LEITURA DO TESTEMUNHO E DO TRAUMA NOS ROMANCES DE JORGE REIS-SÁ E DE
FRANCISCO CAMACHO
889
José Luís Giovanoni Fornos
LUZ E SOMBRAS: METONÍMIA(S) DO DESEJO EM A CURA, DE PEDRO EIRAS
898
José Luiz Foureaux de Souza Júnior
AS CONFIGURAÇÕES DO FEMININO EM O PRIMO BASÍLIO: DIÁLOGOS ENTRE O ROMANCE PORTUGUÊS E O CINEMA NACIONAL
911
Danielle Machado Fontes
José Roberto de Andrade
ENSAIANDO A PRÓPRIA ESCRITA: MANUAL DE PINTURA E CALIGRAFIA, DE JOSÉ SARAMAGO
929
Juliana Morais Belo
MARIA PEREGRINA DE SOUSA NA IMPRENSA PORTUGUESA DO
SÉCULO XIX
936
Juliana de Souza Mariano
TÁVOLA REDONDA: A BUSCA PELO GRAAL DA POESIA
Karla Renata Mendes
947
DIGRESSIVIDADE E FRAGMENTAÇÃO EM CAMILO CASTELO BRANCO
967
Katrym Aline Bordinhão dos Santos
GRACILIANO RAMOS, BRANQUINHO DA FONSECA E LUÍS BERNARDO HONWANA: UM EXERCÍCIO COMPARATIVO EM LITERATURAS
DE LÍNGUA PORTUGUESA
984
Keli Cristina Pacheco
AS VOZES MORALIZADORAS EM CLARABOIA
Kelly Gomes Cavalcante
996
VIOLÊNCIA E MEDO DA SOLIDÃO EM TEXTOS ESCOLHIDOS DE MIA
COUTO E LOBO ANTUNES
1009
Francisca Kellyane Cunha Pereira
A LITERATURA CONTEMPORÂNEA À DERIVA LANÇA ÂNCORA NA
TRADIÇÃO: UMA VIAGEM À ÍNDIA E OS LUSÍADAS
1019
Kim Amaral Bueno
O HERÓI PORTUGUÊS: DA ASCENSÃO HISTÓRICA AO FIRMAMENTO DO MITO COMO PRODUTOR DE IDENTIDADE NACIONAL
1028
Letícia de Oliveira Galvão
SOBRE RASTOS E RUÍNAS: UMA LEITURA COMPARADA DE OS CUS
DE JUDAS, DE ANTONIO LOBO ANTUNES, E TRISTANO MUORE, DE
ANTONIO TABUCCHI
1042
Luca Fazzini
A PRESENÇA E A NATUREZA DO FANTÁSTICO NO CONTO ‘O DEFUNTO’, DE EÇA DE QUEIROZ
1055
Lucas do Prado Freitas
Silvio Cesar dos Santos Alves
CARTILHA DO MARIALVA E LEITURAS AFINS
Lucia Moutinho
1075
A HISTÓRIA DA AMÉRICA PORTUGUESA, DE ROCHA PITA: (DES)CONEXÕES (PÓS)COLONIAIS EM ROTAS ALTERADAS
1084
Manoel Barreto Júnior
AS PEQUENAS MEMÓRIAS: NOTAS SOBRE A ESCRITA AUTOBIOGRÁFICA DE JOSÉ SARAMAGO
1092
Marcelo Brito da Silva
Vinícius Carvalho Pereira
A MELANCOLIA EM UM CONTO DE MARIA JOÃO CANTINHO
1109
Marcelo Pacheco Soares
LITERATURA E HISTÓRIA EM O ANO E A MORTE DE RICARDO REIS
DE JOSÉ SARAMAGO
1122
Márcia Neide dos Santos Costa
FLAGRANTE SOCIAL E EXPERIÊNCIA ESTÉTICA NA NARRATIVA MEMORIALÍSTICA LUSO-BRASILEIRA
1128
Marcio Jean Fialho de Sousa
INTERFACES ENTRE CETICISMO E FICÇÃO EM CONTOS DE ANTÓNIO VIEIRA.
1139
Marcos Rogério Heck Dorneles
O “PARAÍSO” DE EVA, FIGURAÇÕES DE EROS EM A COSTA DOS
MURMÚRIOS
1160
Maria Aparecida da Costa
Alyne Isabele Duarte da Silva
OS POBRES: A NARRATIVA LÍRICA DE RAUL BRANDÃO
Maria Betânia da Rocha de Oliveira
1171
CAMILO CASTELO BRANCO: AS ‘LEIS DA ALMA’ E OS ‘IMPERATIVOS
DO ESTÔMAGO’ COMO ELEMENTOS DE FIGURAÇÃO DA PERSONAGEM
1188
Maria Eduarda Borges dos Santos
O DIÁLOGO NA LITERATURA PORTUGUESA DO SÉC. XIX: IDENTIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DO CORPUS
1208
Maria Teresa Nascimento
HERÓIS LENDÁRIOS E FIGURAS HISTÓRICAS DO IMAGINÁRIO PORTUGUÊS NA OBRA DE ARIANO SUASSUNA
1219
Mariângela Monsores Furtado Capuano
VOZ E POLIFONIA: TRANSCENDENDO A CEGUEIRA EM “ENSAIO
SOBRE A CEGUEIRA” DE JOSÉ SARAMAGO.
1233
Marilani Soares Vanalli
Rubens Pereira dos Santos
AUTOR E PERSONAGEM: O PAPEL DE AQUILINO RIBEIRO NA CONSTRUÇÃO DE SEUS SERES FICCIONAIS
1250
Marília Angélica Braga do Nascimento
A REPRESENTAÇÃO DA PERSONAGEM-TIPO DO NEGRO NA DRAMATURGIA PORTUGUESA QUINHENTISTA.
1265
Matheus Nogueira Bacellar
Márcio Ricardo Coelho Muniz
RECEPÇÃO DE CAMÕES COMO HIPÓTESE INTERPRETATIVA
1273
Matheus de Brito
GRACILIANO RAMOS, CONTEMPORÂNEO DE EÇA
Miguel Sanches Neto
1285
AS PREMÊNCIAS DE NOSSO TEMPO DESVELADAS NA LITERATURA
PORTUGUESA CONTEMPORÂNEA: INDICATIVOS PARA O ENSINO
NOS CURSOS DE LETRAS BRASILEIROS
1296
Miriam Denise Kelm
A HISTÓRIA DO CONTRAMESTRE E O ANARQUISMO NO ROMANCE
AMANHÃ, DE ABEL BOTELHO
1303
Moisés Baldissera da Silva
O CÓNEGO, DE A.M. PIRES CABRAL E A VINHA DOS ESQUECIDOS,
JOÃO CLÍMACO BEZERRA: UMA LEITURA INTERTEXTUAL.
1310
Mônica Maria Feitosa Braga Gentil
DOMINANDO O CORPO FEMININO NA IDADE MÉDIA: A SOLDADEIRA E O CAVALEIRO
1326
Monique Pereira da Silva
O LUGAR DA LITERATURA PORTUGUESA NA POLÔNIA
Natalia Klidzio
1333
O JOGO DENTRO DA MÁQUINA: A INTERTEXTUALIDADE EM A MÁQUINA DE FAZER ESPANHÓIS
1346
Natasha Gonçalves Otsuka
OS PAPEIS FEMININOS EM O RETRATO DE RICARDINA DE CAMILO
CASTELO BRANCO
1355
Nayara Helenn Carvalho dos Santos
LISBOA, MANAUS: CIDADES COMO CENÁRIOS NAS OBRAS DE GERSÃO E HATOUM
1362
Orivaldo Rocha da Silva
ESCRITA DISCRÔNICA EM MANUEL ANTÓNIO PINA
Paloma Roriz
1369
MEMÓRIA, TRAUMA E INFÂNCIA EM TRÊS ROMANCES DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
1376
Paula Collares Ramis
O NARRADOR ERRANTE E PARÓDICO EM CAIM, DE JOSÉ SARAMAGO
1389
Paula Karina Verago Petersen
REDES DE ESTEREÓTIPO: UM BRASIL DE TELENOVELA NA LITERATURA PORTUGUESA DO SÉCULO XXI.
1437
Paulo Ricardo Kralik Angelini
ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA, UM ROMANCE-SÍNTESE SOBRE A TEMÁTICA DO OLHAR NA OBRA DE JOSÉ SARAMAGO
1453
Pedro Fernandes de Oliveira Neto
HEROÍSMOS À BEIRA-MAR: CESÁRIO VERDE E AUGUSTO DOS
ANJOS
1471
Rafael Iatzaki Rigoni
HÚMUS, DE RAUL BRANDÃO: MUDANÇA DE PARADIGMA NA FIGURAÇÃO DA PERSONAGEM
1480
Raquel Trentin Oliveira
TODO O ESTADO DE ALMA É UMA PAISAGEM: PAÙLISMO, INTERSECCIONISMO E LÚCIO CARDOSO
1490
Regina Márcia de Souza
SE VÃO DA LEI DA MORTE LIBERTANDO: O ARGUMENTO HISTÓRICO ÉPICO NA COMÉDIA DE DIU
1501
Renata Brito dos Reis
CONFIGURAÇÕES DO HOMOEROTISMO MASCULINO NAS CANÇÕES DE ANTÓNIO BOTTO
1511
Ricardo Freitas
LONGE DO BAIRRO, PERTO DOS HOMENS: O ESTADO DE EXÍLIO EM
“O SENHOR WALSER”, DE GONÇALO M. TAVARES
1521
Robson José Custódio
A NARRATIVA TRANSGRESSORA DE TEOLINDA GERSÃO: UMA LEITURA DO ESPAÇO PELA PERSPECTIVA DA EXPERIÊNCIA
1543
Rosângela Guedêlha da Silva
A ESCRITA COLETIVA DE LIVRO, DE JOSÉ LUÍS PEIXOTO
Rosemary Gonçalo Afonso
1553
A LITERATURA GÓTICA EM LÍNGUA PORTUGUESA: A PROPOSTA
DE UMA HISTÓRIA
1562
Sérgio Luiz Ferreira de Freitas
OS PARADOXOS DO NIILISMO EM ANTERO DE QUENTAL, EÇA DE
QUEIRÓS E CESÁRIO VERDE
1570
Silvio Cesar dos Santos Alves
ENSINO DE LITERATURA PORTUGUESA NA GRADUAÇÃO: EXPERIÊNCIAS NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES POR MEIO DAS NOVAS
TECNOLOGIAS
1585
Lígia R M C Menna
Simone de Almeida e Silva
ÀS MARGENS DE UMA SOCIEDADE: OS DILEMAS DOS RETORNADOS PORTUGUESES NAS OBRAS O RETORNO DE DULCE MARIA
CARDOSO E AS NAUS, DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES
1598
Suzana Costa da Silva
A PRESENÇA DE ALBERTO CAEIRO NA POESIA DE MANOEL DE BARROS
1609
Suzel Domini dos Santos
METODOLOGIA DE ENSINO-APRENDIZAGEM: UMA ABORDAGEM
DIFERENCIADA NO ENSINO DA LITERATURA
1617
Tailani Azevedo Taverna
Mayara Cristina Pereira
DA METÁFORA AO SILÊNCIO DO MUNDO NA POESIA DE MANUEL
ANTÓNIO PINA
1629
Thiago Bittencourt de Queiroz
O PRIMO BASÍLIO DE EÇA DE QUEIRÓS EM DIÁLOGO COM A CRÍTICA LITERÁRIA BRASILEIRA
1639
Thiago Bittencourt
POESIA E HAGIOGRAFIA: S. FRANCISCO DE ASSIS EM VERSOS PORTUGUESES DO PERÍDODO MODERNO (SÉC. XVI-XVIII)
1654
Thiago Maerki
“ATÉ QUE”: VIEIRA E O FUTURO (DES)COBERTO
Thomaz H. S. Pereira
1678
POÉTICA DO ENCONTRO
1689
Tiago Correia de Jesus
AS METÁFORAS DAS RECORDAÇÕES DE INFÂNCIA NA ESCRITA POÉTICA DE SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
1702
Vanessa Correia de Araujo Silva
ENTRE DOIS MUNDOS: JÚLIA LOPES DE ALMEIDA E O ENSINO
PARA CRIANÇAS EM CONTOS INFANTIS E TRAÇOS E ILLUMINURAS.
1715
Viviane Arena Figueiredo
A IMPORTÂNCIA DE OS LUSÍADAS NA ESPANHA DO SÉCULO DE
OURO
1728
Wagner Monteiro
RESSONÂNCIAS DO GÓTICO NA PROSA DE EÇA DE QUEIRÓS
1733
Xênia Amaral Matos
Anais do XXVI Congresso Internacional da ABRAPLIP
INTERFACES ENTRE CETICISMO E FICÇÃO EM
CONTOS DE ANTÓNIO VIEIRA.
Marcos Rogério Heck Dorneles1
1. INTRODUÇÃO
A criação literária está disposta em bases bastante específicas
de composição artística e conceitual, pois, movimenta-se em atos
de captação e interpretação do mundo e da realidade, e, simultaneamente, de elaboração e exteriorização fônica de um sistema
de signos que exprime e plurissignifica. De maneira idêntica e
diversa de outras áreas das artes e dos saberes, a criação literária se
dimensiona em alicerces que instigam várias hipóteses de condução produtiva. Assim, a atividade literária pode adotar perspectivas
de elaboração que mantêm, aprofundam, transformam, negam ou
confrontam paradigmas correntes e passados. Em função do seu
caráter sistêmico e sucessivo, a criação literária se retroalimenta
quer seja pela recursividade formal, quer seja pelo inauditismo; e,
na figura do escritor e da escritora, expõe-se e se faz conhecer na
determinação e mediação de um mundo assente e cambiante.
No ponto onde se cruzam as atividades de composição literária e os trabalhos de teoria e crítica literária, vários fatores são
lançados como fundamentadores da compreensão do funcionamento das formas artísticas em prosa ou verso. Como exemplo
ilustrativo, apontamos a proposta de Antoine Compagnon (2012)
em estabelecer sete questões / elementos para tal entendimento: a
literatura, o estilo, o autor, o leitor, o mundo, a história e o valor.
Nesse caminho, o estudioso estipula delimitações que possibilitam
o trânsito por diferentes elementos da criação literária, e, paralelamente, favorecem procedimentos de indagação crítica ao contrastar princípios díspares.
Tomando como base a relação entre o processo de criação literária e a visão de mundo (Weltanschauung) de um autor de um texto,
1
Mestre em Letras (Estudos Literários) e Doutorando em Letras (Estudos
Literários). Professor junto à Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
1139
Anais do XXVI Congresso Internacional da ABRAPLIP
este trabalho busca encontrar formas analógicas de semelhança e
de modificação em suas respectivas totalidades (literária e filosófica). Isto é, deparar-se com alguns procedimentos recorrentes e
expedientes narrativos que reforçam as propostas de cosmovisão
de um escritor (MOISÉS, 1982). Para isso, estabeleceu-se como
âmbito de análise e interpretação a literatura de ficção, mais especificamente, os contos. De sorte que apontamos a imbricação
entre as escolhas estéticas e as atitudes críticas provenientes da
mundividência do ficcionista António Manuel Bracinha Vieira, na
sua criação literária de contos, em especial, a interface entre a elaboração literária e o pendor investigativo proveniente de algumas
proposições da filosofia cética.
2. ASPECTOS BIOBIBLIOGRÁFICOS
António Manuel Bracinha Vieira, médico psiquiatra, é professor da Universidade Nova de Lisboa e pesquisador do Centro de
Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa; fazendo parte
das áreas de investigação de “Filosofia da Biologia” e “História e
Filosofia da Medicina”, e das linhas de investigação de “Filosofia
das Ciências da Vida” e “Filosofia das Ciências Humanas” (CFCUL, 2014). Além disso, sua produção bibliográfica se reparte em
duas grandes divisões. No universo da antropologia, da psiquiatria
e da etologia a autoria de sua obra é identificada pelo nome de António Bracinha Vieira; já no âmbito da produção de ensaios sobre
história e artes e da criação de obras ficcionais a identificação se dá
por António Vieira.
Na esfera das atividades docentes de António Bracinha Vieira,
destacam-se os estudos realizados acerca das áreas de Etologia,
Antropologia Biológica, Filosofia das Ciências Humanas e Filosofia da Medicina. Desses trabalhos resultou a publicação de algumas
obras, dentre as quais mencionamos A evolução do darwinismo, Ensaios sobre a evolução do homem e da linguagem, Etologia e ciências humanas
(CFCUL, 2014). Já no domínio da produção de ensaios críticos,
António Vieira publicou algumas obras sobre tópicos relacionados
aos universos de Filosofia, História, Artes e Literatura. Do meio
delas, salientamos o livro Ensaio sobre o termo da História - Trezentos e
cinquenta e três aforismos contra o Incaracterístico (1994). Nesse trabalho,
1140
Anais do XXVI Congresso Internacional da ABRAPLIP
Vieira adota a modalidade escrita do aforismo, muito utilizada por
Hipócrates, Bacon e Nietzsche, e expõe parte de sua cética visão
de mundo. São destaques desse livro a discussão acerca da perda
de força da linguagem; a crítica à sociedade ocidental contemporânea, caracterizada como sociedade do simulacro, sociedade da Idade Absurda ou da Absurdidade; e a denúncia da situação informe
do homem contemporâneo, denominado Incaracterístico.
Na ambiência da criação literária, Vieira deu a lume obras de
narrativas longas, como os romances O regresso de Penélope, Doutor
Fausto e Fim de império e a novela Tunturi, e, também, publicações
de narrativas curtas, como Sete contos de fúria e Contos com monstros,
lançados no Brasil. Em Portugal, porém, versões diferentes das
narrativas curtas foram publicadas, dentre elas Dissonâncias: contos,
A undécima praga e Olhares de Orfeu: contos órficos; além do lançamento
da peça O oráculo (MONTE, 2014). Destarte, são mais de quarenta
anos de publicações científicas, ensaísticas e literárias em que realiza essa alternância de campos de atuação, conforme pontua Vieira
em entrevista:
O escritor alimenta-se do saber do antropólogo, e este beneficia dos textos do escritor, da eventual concisão e abrangência
da sua escrita. Há conhecimentos fantásticos sobre os seres
e as sociedades humanas que são um maná para a ficção, ao
proporem problemas e ângulos de incidência que ilustram os
tais limites das possibilidades humanas e sugerem situações
ficcionais exemplares. Tudo isso forma uma galáxia em movimento, na qual cada ponto pode sofrer a influência de todos
os outros. O espelho ilumina e deforma, às vezes ilumina porque deforma. (VIEIRA, 2013, p.316)
Assim, segundo António Vieira, esse movimento de alternância gera um fortalecimento recíproco às atividades científicas, ensaísticas e literárias, pois, a interação de temáticas, proposições,
procedimentos e processos distintos podem apontar reconfigurações sígnicas e avanços epistemológicos.
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3. VOLUME DE CONTOS
Como dito anteriormente, selecionamos para este estudo a
apreciação da obra Sete contos de fúria, de António Vieira (2002).
Nessa coletânea de contos destacam-se alguns pontos recorrentes
na conformação do livro, do meio deles, salientamos: o cruzamento de uma tessitura textual irônica com uma ambiência nostálgica
e/ou melancólica; o abatimento dos desígnios das personagens; a
preponderância da participação do narrador na feitura dos contos;
o panorama dubitativo das narrativas; a recorrência da temática
do aniquilamento das expectativas na fatura textual; o contínuo
diálogo intertextual; a adoção de epígrafes no início de cada conto; a escrita alegórica; e o transporte e a transformação de mitos
ancestrais. Somados a esses pontos recorrentes, distinguimos algumas proposições de Paulo Franchetti sobre essa coletânea quanto
à temática:
Do ponto de vista temático, os contos são ensaios sobre o
divino. Melhor dizendo, sobre formas de ocupação, na geografia mental, do lugar reservado à divindade. Esse lugar,
subitamente vazio, indignamente preenchido ou em transformação, é o fio que os une. [...] O nome do primeiro conto
é ‘O Grande Luto’. O do último, ‘A Restituição’. Entre esses dois extremos, estendem-se as modulações do tema da
perda e da impossibilidade de substituição do bem perdido.
(FRANCHETTI, 2002).
Nesse caminho, Franchetti seleciona três esferas temáticas que
atravessam o livro desempenhando uma força catalisadora no processo de condução das narrativas: o plano mitológico das divindades reconfigurado em nova situação; a instabilidade das imagens
psíquicas do inconsciente coletivo corporificadas pelo mito; e a
inevitabilidade da perda. Por outro lado, o ensaísta Júlio Conrado
assevera acerca de alguns procedimentos formais:
[...] há uma dinâmica de digressão e uma arquitectura de
transgressão com base em instantes prodigiosos de revelação
individual e de desassossego universal. O movimento é estrutural à narrativa, o estremecimento subversivo percorre-a de
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lés a lés. O A., com efeito, esmera-se na inscrição, no nexo
alusivo, de traços difusos de sentido que rompem com os
equilíbrios historicamente naturalizados de certos ritos que
comandam a vida quotidiana, [...] (CONRADO, 2002)
Sob esse prisma, Conrado pontua a instauração dos atos de
digressão e de transgressão como recursos fundadores de princípios regedores do livro. De uma parte, o expediente da digressão
medeia e expõe novas camadas de ligação entre as ações das personagens e o “desconcerto do mundo” ao acentuar a irrisão inexorável dos seus destinos. De outra parte, o recurso da transgressão
semântica de códigos, convenções e textos antepassados promove
uma inquietação paralela à condução da narrativa.
Nessa coletânea não há uma fronteira definida quanto à predominância clara de uma grande vertente narrativa da tradição
contística. Isto é, há uma mistura dos componentes do conto de
enredo ou episódio com os componentes do conto de atmosfera,
conforme os estudos e designações propostos por Massaud Moisés (2004), Herman Lima (1952) e Nádia Gotlib (1985) para essas
vertentes. Em relação à tradição literária, os textos de António
Vieira dialogam predominantemente com a produção contística
de Jorge Luis Borges e Franz Kafka, pois, muitas vezes, tornam a
referencialidade opaca ao particularizar fatos insólitos no desenvolvimento das narrativas. E, de outra parte, os contos de Vieira
se aproximam dos chamados contos de idéia ou contos filosóficos (MOISÉS, 2006) ao desdobrar determinados postulados de
correntes filosóficas e pressupor uma compreensão específica da
existência.
O texto que abre o volume de contos é “O grande luto”. Essa
narrativa relata o pesar, o infortúnio e a ruína de um astrônomo
judeu, Efraïm, que, com os providenciais recursos tecnológicos de
um supertelescópio, descobre o cadáver de Yhwh, isto é, o corpo
de Deus. Não obstante essa pequena inserção, esse conto será
retomado no decorrer deste trabalho.
O segundo conto do livro se chama “Névoa sobre as origens”.
Trata-se de uma narrativa que flui ao sabor das memórias de Hapax, ser único da sua espécie, feito cativo, criado e aculturado por
uma família de humanos:
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Não me lembro de pai ou mãe, nem de nenhum dos da minha raça. A memória, mesmo a de um animal estranho, é um
fenômeno que perturba: esquece o fundamental, guarda o
supérfluo, distorce o real, mistura o que vivemos com o que
nos contam, junta razão e emoções, palavra e mundo, cede ao
esquecimento que chega a encobrir de nós o nosso passado:
e ainda assim forma o pilar da identidade e da possibilidade
de conseguirmos algum saber a partir das coisas em redor.
(VIEIRA, 2002, p.29)
O vocábulo Hapax, segundo o Dicionário Aurélio, provém do
grego hápax legómenon (άπάξ λεγόμενον), e designa (FERREIRA,
2004): “Palavra, termo, locução, etc., que ocorre apenas uma vez
em documento, obra literária ou científica, etc., i. e., que pode ser
abonada com apenas uma citação”. No conto o narrador-personagem transmite as etapas de convívio com Robert e seus dois
filhos, Felix e Flori. Desde o momento em que fora pego no laço
duma armadilha na floresta, passando pela adaptação à família até
a puberdade; é dimensionada a rápida absorção dos costumes, hábitos, o aprendizado de línguas e o cultivo da escrita. Assim, único
ser de sua espécie e dotado de um grande poder de mimetismo,
Hapax insere-se num contexto familiar em que são propiciadas
reflexões acerca das características inerentes ao ser humano, como,
por exemplo, neste diálogo:
‘Qual é a qualidade para se ser humano?’
‘É dançar’, declarou Flori. Ouvindo-a pensei que afinal dançara com ela várias vezes.
‘É dominar o fogo’, aventou Félix. Ora, acender e avivar o
fogo era a minha tarefa predilecta, que executava a cada fim
de tarde com renovada impressão de mistério.
‘É escrever literatura’, ousou dizer Hans, o amigo de Félix.
Eu começava a congeminar literatura (ou talvez que fosse
algo semelhante à literatura...) como uma seiva a circular entre mim e o mundo, que se iria em breve tornar escrita. Ser
plenamente humano, pensei, era talvez partir à procura das
raízes-razões mais finas do Mundo, como fizera o filósofo
Kant, ir interrogar o que havia sob as aparências, por sob as
cintilações sombrias do mar e coruscantes do fogo, no reino
da opacidade. [...]
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Foi quando Robert, falando lá de trás e quando supúnhamos
que nem sequer nos ouvia, comentou: ‘É saber que somos
sorvidos pela morte, mas não acreditar’. (VIEIRA, 2002,
p.39-40)
Assim, ao realizar ponderações acerca da complexidade e dos
atributos do ser humano, a produção dessa narrativa transita pela
tendência dos contos de pendor filosófico. Não obstante, a predominância dos momentos de imersão indagativa, ao final da história, Hapax se vê perplexo diante da exuberância feminina de Flori
que principia:
Mas eis que Flori desabrochou de súbito em formas, cores
e cheiro de mulher, vestiu-se em novas vestes, pôs pulseiras,
colares, um diadema e brincos tilintantes; e eu, de outra espécie, vindo de outro sítio, senti que os risos e os mimos se
mudavam e que em metamorfose a desejava como se pudesse
esperar ser entendido. (VIEIRA, 2002, p.48)
Nessa dimensão final, externa-se para Hapax o dilema duma
inversão de um processo cultural em que o represamento ou a
libertação dos instintos são o recomeçar do laço de um novo aprisionamento.
Em seguida, no volume de contos, tem-se a narrativa “Eôs”.
Esse texto caracteriza-se por ser uma releitura dos mitos da deusa
Eôs, do jovem Títonos e do pai dos deuses, Zeus; transposta para
o período de tempo do final do século XIX até o final do século
XX. No conto, em tempos recentes, Títonos sofre as consequências da insaciabilidade de sua amada, da tirania de um poderoso
industrial e do seu próprio processo de contínuo envelhecimento.
O quarto conto do livro é “O mosteiro”, narrativa que envolve
a situação de solitude da octogenária Ana de Mataplana, última
monja de um mosteiro cristão medieval em terras ibéricas, após a
morte da monja Beatriz. A conjuntura de solidão de Ana se extrema também pelo desacordo temporal de estilos de vida, normas
sociais e visão de mundo dessa fundação românica. O conto se
inicia pelo enterro de Beatriz e se distingue pela participação mínima de personagens, circunscritos a referências breves como “estranhos com suas ferramentas” (funcionários) e “fiéis bondosos”.
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Nessas condições, a narrativa evidencia o estado de cabal solidão
de Ana, principalmente, quando são assinalados os espaços que
cingem a sua vida (VIEIRA, 2002, p.74-76): “De resto, o universo
a preto e branco resumia a própria essência do mosteiro. [...] E o
cipreste, único ser vivo ali em permanência além dela, mudo e firme, altivo e austero, disposto a sobreviver-lhe. Era também relógio
solar da sua própria vida [...]”. Desse modo, a tessitura do conto
mantém um clima que perpassa todo o desenvolvimento da narrativa, no qual Ana dedica o seu tempo à leitura de textos sagrados
e à escrita do seu diário (VIEIRA, 2002, p.79): “[...] Ana ousava
compreender que a sua vida longa no mosteiro fora quase nada, e
o pensamento excessivo e a escrita densa a que se dava eram quase
tudo, traziam-lhe o essencial, o inadiável, traziam-lhe a verdadeira
expiação.”. Portanto, sob esses parâmetros, “O mosteiro” aproxima-se dos chamados contos de atmosfera, nos quais não há uma
alteração substancial do estado da personagem.
No texto posterior, “A undécima praga”, o título da narrativa
é uma alusão ao texto bíblico do “Êxodo” (1966) relativo às dez
pragas do Egito, que afligiram animais, seres humanos e deuses.
No entanto, na narrativa de Vieira, o infortúnio, embora análogo,
dá-se em sinal trocado: no lugar dos politeístas e pagãos são afetadas as populações de práticas monoteístas. Nesse conto é possível
estabelecer contato com outros aspectos relacionados ao conjunto
de idéias da cosmovisão de António Vieira, além da percepção
cética em relação à sociedade contemporânea apontada anteriormente. Abre-se a possibilidade de se detectar a perspectiva de conexão com a filosofia nietzschiana e de afinidade com características e componentes da mitologia greco-romana, em específico,
e do paganismo, em geral, conforme salienta Bracinha Vieira em
entrevista:
Num outro conto nietzscheano, ‘A undécima praga’, surge
um vírus ideológico, um vírus deicida de efeitos fulminantes, especializado em contaminar o cérebro dos monoteístas,
poupando os demais. A pandemia começa no deserto, mas
acaba por varrer toda a Terra, alterando os rumos da aventura
humana e abrindo o futuro ao regresso do grande deus Pã,
que se julgava morto. (VIEIRA, 2013, p.322)
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Com efeito, em “A undécima praga”, ocorre uma grande jornada de profissionais da medicina, pesquisadores e cientistas em busca de elementos que propiciem o desvendar das particularidades
de uma epidemia que assola o planeta. Com grande deslocamento
espacial e temporal, o conto se aproxima das características da novela quando à unidade de lugar, e sua a ação se insere, inicialmente,
junto às dunas do deserto arábico e junto a uma pequena aldeia
arrasada pela praga:
No silêncio de cada casa encontramos cadáveres em posições crispadas, por entre lençóis revolvidos, bolhas de baba
solidificadas pelo calor seco em cachos sobre as bocas e as
narinas. Nalguns, os olhos tinham-se fixado revirados para
um canto. Em tão tétricos cenários os indícios designavam
uma doença terrivelmente aguda e devastadora que eclodira
alguns dias, senão mesmo algumas horas, antes [...] (VIEIRA,
2002, p.89-90).
Depois de ser exposto o foco inicial do flagelo, na narrativa
são realizadas mudanças sucessivas de espaços, destinadas tanto
para expressar a propagação da calamidade quanto para exprimir
as tentativas de solução o problema. Assim, no texto, o grupo se
desloca da aldeia para a capital saudita, Riad, passando por Cairo,
Paris, Roma, Cambridge, até chegar à resolução do enigma na Universidade do Novo México, nos Estados Unidos. Já, ao final do
conto, cessados os efeitos da praga, o grupo realiza uma expedição
à Índia, na qual se proporciona uma inflexão pagã à narrativa com
referências a divindades como Vixnu e Pã. Assim, destoando da
predominância cética da composição do livro, nessa narrativa dá-se ensejo à inserção do não-lugar das pulsões naturais, à inserção
da utopia não-abraâmica.
O conto “Vida e morte de Argos” é uma narrativa de natureza
futurista, na qual a ação distribuída na trama fica restringida ao espaço dos corredores e da cela em que se encontram Marina, Ossip
e o narrador-personagem. Presos por denunciarem os abusos de
uma época governada pela maquinalidade, os três personagens são
sistematicamente vigiados pelo robô Argos, vivendo uma rotina de
nulificação e afrontas:
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Argos manipulava a divisão dos nossos dias. Para isso, quando queria interromper-nos o dormir, importunava-nos com
sequências de sons crescentes até ululações de intensidade
insuportável que não feriam os seus ouvidos electrónicos.
Outras vezes, aproximava-se de um de nós no sono mais profundo, e, do bico de um dos seus pés metálicos, descarregava
sobre a vítima – escolhia quase sempre as mãos, os pés ou os
joelhos – um choque eléctrico fino e doloroso que rasgava o
bálsamo do sono com o aguilhão da realidade e nos deixava
alerta e incapazes de adormecer de novo. (VIEIRA, 2002, p.
140)
O nome do robô fora dado por Ossip como uma menção à
vigilância implacável que o gigante Argos Panoptes, servo fiel da
deusa Hera, realizava em seus trabalhos. A narrativa busca esteticamente trazer a recorrência de um clima sufocante, e, tematicamente, tem como mote principal a denúncia das condições de
impotência humana diante das máquinas.
O último conto do livro, “A restituição”, transcorre principalmente no sítio arqueológico de Saqqara, no Egito, e versa sobre a
descoberta feita por geólogos do colossal falo do Deus Osíris, decepado e perdido nas areias do deserto. A presença da gigantesca
peça desse remoto deus pagão não teve espaço para controvérsias
de parte dos governantes locais: “[...] aquele despojo de um deus
pagão, saído do solo em parada tão provocativa, indócil amuleto, mereceria ser destruído e reduzido ao estado de poeira.”. No
entanto, apesar de várias tentativas de destruição do falo divino
serem feitas não se obtém êxito na destruição, e é ordenado o seu
reenterro no deserto. Passado o tumulto da situação, o grupo de
geólogos resolve levar clandestinamente a peça para Abydos, junto
ao templo de Osíris. Porém, a tentativa resulta inútil e o gigantesco
pênis de Osíris perde-se no rio Nilo. Assim, diferentemente de
“A undécima praga”, não há em “A restituição” a possibilidade de
reconexão com o passado ancestral.
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4. SOB O SIGNO DA DESVENTURA.
Como enunciado anteriormente, o conto “O grande luto” introduz as narrativas curtas do livro. O texto contempla a inquietação dos últimos momentos de trabalho do astrônomo judeu,
Efraïm, no observatório de Palomar, em San Diego, Estados Unidos. Efraïm constata uma singular descoberta numa película das
fotografias realizadas no telescópio-réptil, o Hale: o cadáver de
Deus encontrado num quadrilátero remoto do céu. O sentimento
de pesar despertado por essa descoberta abala inexoravelmente
o astrônomo, exaurindo todas as suas forças, pois, tal revelação
põe em xeque o âmago do seu ser. Em função da perplexidade suscitada por meio da oposição entre a profissão e a devoção
no personagem Efraïm, destacamos a consternação ocasionada
pelo sentimento de luto como rudimento para reflexão e crítica.
Para tal, levantamos alguns expedientes narrativos – espaço, tempo, personagem, narrador, nó, clímax, desfecho – e alguns procedimentos recorrentes encontradas no conto, que propiciam de
modo articulado uma percepção de unidade do texto (POE, 1997).
O conto “O grande luto” delimita-se a duas áreas de espaços
principais: a primeira, o observatório astronômico e o laboratório
de Efraïm; a segunda, o quarto de hotel e a estrada da costa na
cidade de Escondido. No primeiro campo de ação se repercute o
clima de inquietação e perplexidade que toma conta de Efraïm; já
na segunda extensão se suscita o processo de liberação do seu fardo individual e coletivo. Destarte, esse processo de realimentação
de sentimentos e sensações via recorrência espacial é fundamental
na constituição das atmosferas a serem reiteradas na elaboração
narrativa (LINS, 1976).
A notação do tempo cronológico no conto é designada predominantemente pelo declínio e/ou pelo avanço da luminosidade,
como nos seguintes trechos (VIEIRA, 2002, p.9-11-26-27): “No
fim de cada tarde, [...] Desceu um novo crepúsculo, [...] Antes da
aurora, [...] Na primeira claridade de um novo dia, [...]”. Podendo,
assim, expressar o intenso labor intelectual e espiritual a que estava submetido Efraïm. De outra parte, o tempo psicológico está
disposto pelo destaque dado aos pensamentos de Efraïm, principalmente, àqueles que se voltam a sua consciência moral e a sua
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inserção coletiva. No entanto, numa camada latente, aflora-se num
pesadelo uma “explicação” para sua descoberta astronômica:
Na luta entre a excitação e o torpor que o disputaram, o astrônomo sucumbiu ao sono, pesadelos revolveram-no: olhava o
firmamento por uma luneta da sua invenção, ouvia-o crepitar
no silêncio sideral e via-o fragmentar-se, os blocos confluíam
perigosamente sobre a sua cabeça, um deles, diferente, tornava-se negro, e sobre ele surgia um réptil possante, de pescoço
erguida na sua direcção, que o observava até à minúcia, corpo
e ânimo; e então uma voz blasfema descia do céu e nomeava-o: ‘Efraïm...Efraïm... O apocalipse foi no começo! Deus
morreu e tu deves tomar o Seu lugar... tu, pequeno profeta,
profeta destes tempos.’(VIEIRA, 2002, p.18) Grifos nossos.
Essa relevância dada à dimensão psicológica do tempo se
instaura pela necessidade do mergulho no infortúnio pessoal de
Efraïm, sob a perspectiva do confronto de idéias ou de doutrinas,
e por intermédio da criação de um clima de prostração e de abatimento de forças. Não obstante, soma-se a essas dimensões a intersecção do tempo e do mito, conforme pontua Benedito Nunes
(2013, p.65): “Esse enquadramento alegórico, colocando a existência humana, situada historicamente, no horizonte de um passado
inesgotável que cada instante da ação reflete, enfeixa uma imagem
temporal de caráter cíclico do cosmos e da cultura [...]”. Desse
modo, o tempo ancestral do mito continua a ressoar, porém, sob o
influxo de uma espécie de viés crítico e reflexivo, propiciado pelas
mudanças históricas de constituição social e de formas de consciência. Em consequência, o paradigma da configuração de Efraïm
se altera, de caráter emblemático de fertilidade e de fundação genealógica passa para uma modalidade de composição de personagem
de pendor irresoluto e dilacerado.
Com exceção de Efraïm, as personagens do conto são mencionadas em alusões breves tanto para os responsáveis pela cartografia do cosmos (os colegas astrônomos e os técnicos da câmara
escura) como àqueles voltados para o seu âmbito pessoal e familiar
(os teólogos, a concubina, a mulher e os filhos), sendo, portanto,
configuradas por meio de um baixo grau de complexidade (CANDIDO, 1972), ao passo que a figura do protagonista se desdobra
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por intermédio dos impasses que assolam a sua tomada de decisão.
A adoção do nome Efraïm pode ser considerada uma assimilação
e transformação do texto “Livro de Gênesis” (1997) à medida que
há referências “aos da sua tribo” e à precedência de como ele é
tratado. Porém, no conto a intertextualidade aponta para o movimento de fim de uma configuração de uma célula familiar. A
recorrência ao intertexto e à paródia na nomenclatura das personagens se associa ao binômio transporte e transformação, de pendor recursivo nos procedimentos comuns adotados por António
Vieira. Essa polarização pode ser vista no pêndulo proposto por
Massaud Moisés para o discurso literário:
Documento e transcendência, o discurso literário, sendo o lugar onde o Cosmos aparece em sua multiplicidade, é também
o lugar onde mais aberta se instaura. O modo como se opera
esse trânsito/transfiguração nos situa de pronto no cerne do
universo em que se realiza: o estilo. (MOISÉS, 1982, p. 223)
Juntamente às personagens está a utilização do narrador heterodiegético adotado no conto (GENETTE, 1979). Na narrativa
“O grande luto” a participação dessa modalidade de narrador amplia-se por meio da ciência e da exposição dos meandros da vida
do protagonista, e por intermédio da apresentação de uma perplexidade contínua, evidenciada nos pensamentos e ações e instalada
no conflito inerente das situações expostas no conto.
De feição formalista, estão dispostos associados à noção de
conflito dramático os elementos de nó, clímax e desfecho. A sua
interligação pode representar a coesão da fatura da narrativa quanto à realização de um percurso narrativo, como discorre Edgar
Allan Poe:
Eis algo evidente: um plano qualquer que seja digno desse
nome só pode ser traçado visando o desenlace antes que a
pena ataque o papel. Só quando se tem continuamente presente a idéia do desenlace é que podemos conferir a um plano
a sua indispensável aparência lógica e de causalidade, procurando fazer com que todas as incidências e, especialmente,
o tom geral tendam a desenvolver a intenção estabelecida.
(POE, 1997, p. 911)
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Anais do XXVI Congresso Internacional da ABRAPLIP
Em “O grande luto” a interligação desses elementos constitutivos realiza um encadeamento dos conflitos dramáticos que se
estabelecem entre Efraïm e o mundo, e Efraïm e a ciência, como
vemos inicialmente no nó da narrativa:
Passeava o olhar pelas películas quando topou com um real
cadáver camaleonicamente acantoado em céu! Como impelido por mola provinda da alma, do mais fundo de si, Efraïm
ergueu-se: O que tinha nas mãos, maravilha fatal, era o achado que traria a fractura à civilização e convulsionaria todos
os saberes – ontologia, teoria do conhecimento, ciência, teologia. Por momentos permaneceu siderado: saía de si para
a imagem, que não desfitava, bebendo-lhe o sentido, medindo-lhe o alcance. Tinha ali, explícito na forma, com pormenores tais, tal nitidez que o fazia pasmar, o cadáver de Deus.
(VIEIRA, 2002, p. 12)
Nesse nó deflagra-se o conflito de forças opostas que passam
a dilacerar Efraïm, conduzindo a narrativa a soluções definitivas.
Isto é, direcionando o protagonista a dois caminhos opostos: à
aceitação e acolhimento da descoberta ou à interdição da experiência. Porém, o astrônomo prefere o embargo à problematização,
como vemos no clímax do conto:
Efraïm abriu o estojo e colheu seu conteúdo. Com as mãos
trémulas acendeu um fósforo e fez incandescer numa faúlha o corpo de delito, a ominosa prova. A cinza caiu sobre a
concavidade branca do cinzeiro; ele esmagou-a e reduziu-a a
fino pó, assomou à janela e dispersou-o aos ventos. Alívio,
cansaço e funda mágoa o possuíam, mas a angústia ainda o
corroia. (VIEIRA, 2002, p. 27)
A decisão tomada leva ao declínio da personagem, pois, para
Efraïm, suportar a sobreposição violenta do âmbito profissional
sobre a esfera religiosa estava além das suas forças, e já havia incidido a inquietude ao seu ser, assim expressos no desfecho:
Entendeu como aquele mar repetia o céu profundo de enigmas onde pulsava o inaudito. E ao entrever a sua sombra
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inscrita na pele tremulante da água, recortada sobre o sorvedouro entre laivos de luz emergindo da banda de negrume,
sentiu o terror e a atração daquela silhueta, que por instantes
não soube distinguir da que o levara à fuga e não lograva expulsar da consciência. Era como se tudo ali se repetisse. Posto
em fascinação e em pavor, inclinou-se das rochas tentando
ver mais claro, distinguir contornos mais nítidos. Foi quando,
desamparado, se precipitou e com o seu segredo se sumiu,
sugado pelo vórtice implacável. (VIEIRA, 2002, p. 28)
Com a morte de Efraïm junto ao mar, dá-se a analogia dos
fatos anteriormente narrados no conto: morte secreta da experiência diante do infinito. A inter-relação desses três elementos dos
conflitos dramáticos nos leva a um dos temas da narrativa: o luto.
Julio Cortázar discorre acerca da importância do tema para o estabelecimento de uma gama de intercâmbios conceituais e semânticos num conto:
[...] um bom tema atrai todo um sistema de relações conexas,
coagula no autor, e mais tarde no leitor, uma imensa quantidade de noções, entrevisões, sentimentos e até idéias que lhe
flutuavam virtualmente na memória e na sensibilidade: um
bom tema é como um sol, um astro em torno do qual gira um
sistema planetário de que muitas vezes não se tinha consciência até que o contista, astrônomo de palavras, nos revela sua
existência. (CORTÁZAR, 1974, p.154)
No conto, o luto é uma força desagregadora implacável, que
não permitiu a Efraïm a visualização de etapas futuras desse pesar (VIEIRA, 2002, p. 25): “Terrível era a opção. Sentia-se assim
lançado ao desespero, e derrelicto. Um luto inexpiável assaltava-o,
rondavam-no forças de dissolução, cósmica culpa o vergava.”. O
luto é o sentimento que leva à sobreposição antinômica de esferas de atuação distintas. O choque entre os âmbitos profissional e
religioso conduz a uma ironia do destino tal que os componentes
de aflição, desamparo e implicação involuntária imobilizam a personagem.
Problematizar o flagrante desses momentos de crise é um dos
propósitos da literatura, isto é, alçar as fendas propiciadas pelos
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comportamentos conflitantes das personagens, conforme discorre
Massaud Moisés (1973, p.20): “A Literatura opera exatamente no
plano em que o homem encara a vida como luta, tomada a consciência da morte e da precariedade do destino humano: não se
acomoda, não se torna feliz; e quanto mais indaga, mais se inquieta
[...]”. Assim, na dimensão viva de realidades conflitantes a mesquinhez da personagem que nega o acesso de um conhecimento
para um planeta inteiro está dinamizada à problematização do seu
colapso individual, à tensão entre irrisão e desolação.
Além dos expedientes narrativos, alguns procedimentos recorrentes incidem na escrita de António Vieira, como vimos no
decorrer desse estudo: o intuito da paródia, a circulação dos intertextos, a justaposição alegórica, a transmutação de valores e a
crítica ao incaracterístico. Com isso, chegamos à ação mútua entre
visão de mundo e discurso literário. Conforme o Dicionário Aurélio
(FERREIRA, 2004) sinaliza uma: “Compreensão geral do universo e da posição nele ocupada pelo homem que se expressa por
um conjunto mais ou menos integrado de representações e que
deve determinar, em última instância, a vontade e os atos de seu
portador.” Nessa perspectiva interagem a percepção, o juízo e
a concretude linguística. Por conseguinte, nos contos de Vieira
constata-se a oscilação de uma mundividência cética a uma utopia
pagã, expressas na variação semântica de sua escrita; e, por outro
lado, uma cosmovisão de fluxo crítico propiciado pelo viés dubitativo de suas apreciações.
5. INDAGAÇÃO.
Neste momento do artigo destacamos fragmentos do conto
“O grande luto” pelos quais é possível detectar determinadas diretrizes e certos procedimentos característicos da filosofia cética, em
particular, de propostas advindas de Enesidemo, Agripa e Sexto
Empírico, em consonância com a elaboração do tecido narrativo
de Vieira. Das propostas acentuamos, respectivamente, os modos
de argumentação (a ênfase da precedência da valorização da agudeza dos sentidos na representação dos objetos, o destaque da variabilidade das circunstâncias na percepção do objeto, e a constatação da inevitabilidade da discordância entre doutrinas) e os pilares
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da obtenção da ataraxia (ser guiado pela natureza; ser constrangido
pelas paixões; na observância das leis e costumes da cidade; instrução nas artes) examinados por Rodrigo Pinto de Brito (2016).
No entanto, este conjunto de ações se dá de forma provisória e
delimitada, pois, como realização de prática interdisciplinar, diante
de algumas de alternativas, optou-se previamente pelo desenvolvimento do estudo de elementos integradores entre os universos
da literatura e da filosofia, em conformidade com o horizonte da
relação transacional sugerida por Benedito Nunes (2010). Nesse
caminho, selecionamos trechos narrativos ligados à construção
literária que realcem: a importância dos sentidos (enquanto capacidade de apreciar de uma maneira imediata e intuitiva) no processo
de aprofundamento da inter-relação entre tempo e espaço; a relevância da variabilidade das formas de construção frasal (por meio
da utilização diferenciada dos sinais de pontuação,
através do
uso de formas flexionadas de tempo e aspecto em que se conjugam os verbos, e por intermédio do emprego de figuras retóricas
em seus horizontes opositivos e/ou reforçativos).
Em relação à consideração dada aos sentidos considerados
como forma de apreensão real e proporcionadora de graus de
senso destacamos a importância da ampliação executada pelo instrumento astronômico do telescópio na ultrapassagem de determinados limites da compreensão humana, disposta nos trechos a
seguir:
No fim de cada tarde, ao entrar no observatório, Efraïm experimentava sempre a visão do grande telescópio como a
de um ser deslumbrante de perigos latentes. Admirava o seu
porte de colosso: lembrava-lhe um réptil gigantesco couraçado de metal [...]
Uma visão de profundidade insuspeitada conduzia ao começo do tempo e aos confins do espaço: o poder do telescópio
perfurava espessas camadas de tempo-espaço e revelava formas. (VIEIRA, 2002, p.9-10). Grifos nossos.
No entanto, a valorização desse recurso tecnológico não neutraliza as distintas ambiências em que a divergência de doutrinas
dilacera Efraïm. Nessa direção, a diaphonía conduz o prosseguimento do percurso narrativo do conto, e a aflição decorrente dessa
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situação permanece, de moto próprio, regedora do destino do protagonista. Pois, está em jogo o fim da possibilidade de conciliação
entre as esferas devocional e científica de Efraïm:
No projecto em que era partícipe infiltrava-se – sentia –
algo de impiedoso e até mesmo de sacrílego, qual desafio excessivo: era essa a fonte do seu desejo e do seu medo, que
o levava a prosseguir com febril mas contido entusiasmo.O
trabalho em que se enredara não era uma atividade comum:
indiciava o começo de um tempo moderno e ousado, um
tempo novo da ciência e da história [...] Um grego teria dito:
hybris! e, no cúmulo da excitação, seria compelido à ímpia
pesquisa. (VIEIRA, 2002, p.9-10). Grifos nossos.
Nos fragmentos orbitam alguns recursos linguísticos amplamente empregados por Vieira na condução da escrita dos contos,
que permitem a caracterização de nuances interpretativas da situação evocada. Dentre eles, salientamos a utilização de travessões e de dois pontos com intuitos explicativos e especificativos,
e a variação do tempo e do aspecto verbal (pretérito imperfeito,
pretérito mais-que-perfeito e futuro do pretérito) com propósitos
situacionais. Cativo da sua condição, Efraïm experimenta entranhadamente o trágico da inevitabilidade das consequências de sua
descoberta:
Assim se fechou, qual ostra em espessa concha com sua
negra pérola. [...]
‘Não é fácil a um homem, sendo embora diminuto, escapar despercebido – murmurou –, enquanto o corpo
divino, vastíssimo, permaneceu oculto durante toda a
História. ’ [...]
O temor, logo a certeza de não-perdão, pôs-se a pairar sobre ele como as silhuetas de cem abutres planando lentos
num céu em fogo: às vezes subiam alto e quase se perdiam,
outras vezes adejavam baixo em círculos sobre a sua cabeça; e, mesmo que recusasse a olhá-los, as sombras cruzavam
vertiginosas o chão de sua alma. (VIEIRA, 2002, p.23, 25).
Grifos nossos. p.25.
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Nos excertos apontados distinguimos o emprego de figuras
retóricas com o desígnio de possibilitar uma transformação semântica e de conferir mais vivacidade nas perspectivas de desenvolvimento da dilaceração do protagonista. Nesse veio, a instituição do cotejamento retórico (“ostra”, “silhuetas de cem abutres”)
como forma de configuração da personagem, e o estabelecimento
do dito absurdo como construção paradoxal do impasse imposto
pela situação são formas de oscilação da linguagem adotadas por
Vieira, que ora reforçam, ora contrastam os elementos internos
das frases.
Desabilitado para realizar uma suspensão do juízo (epoché:),
Efraïm não encontra forças para aprofundar a sua descoberta
(continuar a sua investigação – skepsis), ou, então, para relativizar
as consequências do seu achado, por exemplo, numa incursão retórica de tipo barroco como a teoria do desamparo.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Neste trabalho escrito procurou-se situar algumas particularidades das narrativas do livro Sete contos de fúria, de António Manuel
Bracinha Vieira, sob a luz de teorias narrativas voltadas para contos, de proposições da recepção crítica, de elementos constitutivos
da narrativa e de tópicos da filosofia cética. Com isso, chegou-se a
alguns denominadores comuns quanto a procedimentos formais,
levantamentos críticos e tópicos conceituais acerca dessa obra,
como o desígnio da paródia, a movimentação dos intertextos, a
aposição alegórica, a transmutação de valores, a crítica ao incaracterístico, a cosmovisão cética. Mais especificamente, este estudo
se ateve ao exame do conto “O grande luto”, em que foi destacado
o papel problematização e do viés dubitativo na composição da
narrativa.
Além disso, podemos agora destacar a metáfora da fúria como
expressão parâmetros de engenho, inspiração, ânimo em diálogo
com a série literária portuguesa; e, principalmente, a metáfora do
luto como manifestação do surgimento de equações improváveis
quando se está sob o signo da desventura. Ou seja, nessas circunstâncias, uma suspensão temporária das críticas aos comportamentos contraditórios propicia uma visualização mais cautelosa, po1157
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rém, mais complexa das inerências do ser humano em momentos
de tensão e crise na escrita literária.
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