Coleção Raiz do Tempo
dirigida por Margarida Sobral Neto
Terra e Conflito. Região de Coimbra. 1700-1834
Margarida Sobral Neto
Violência e Justiça em Terras do Montemuro.
1708-1820
aNabela raMoS
O Município de Alter do Chão nos Finais do
séc. XVIII. Rostos do Poder Concelhio
tereSa CaSquilho ribeiro
Memórias da Alma e do Corpo. A Misericórdia de
Setúbal na Modernidade
lauriNda abreu
Da Monarquia À República
aMadeu Carvalho hoMeM
Os Cantares Tradicionais de Lafões. Sua
preservação enquanto património cultural
JoSé FerNaNdo oliveira
A Beira Alta de 1700 a 1840. Gentes e subsistências
João NuNeS de oliveira
O Museu da Guarda entre o Passado e o Futuro.
Espaços e Colecções
dulCe heleNa PireS borgeS
Turismo em Espaço Rural – Motivações e Práticas.
Holandeses em Ferreira de Aves – Sátão
aCáCio PiNto
A Congregação Beneditina Portuguesa no percurso
para a extinção (1800-1834)
Paulo oliveira
Um Buraco no Inferno
aNtóNio ribeiro
A Quinta da Costa em Canelas – Vila Nova de Gaia
(1766-1816). Família, Património, Casa
SuSaNa guiMarãeS
Crónica dos Ausentes. O Estado e a Sociedade
numa Região do Interior
alCideS SarMeNto
Sarzedas – Vila Condal
João MariNho doS SaNtoS
A Folha – Jornal Diocesano de Viseu (1901-1911)
Paulo bruNo alveS
O Professor do Ensino Liceal: Portalegre (1851-1963). O Caso do Liceu de Portalegre e do
Professor António Raul Galiano Tavares
helder MaNuel guerra heNriqueS
Arte Poética: Dom, Descrença, Desafio. Horácio,
Sá de Miranda, Sophia de Mello Breyner
Maria adeliNa vieira
Através das Beiras – Pré-História e Proto-História
raquel vilaça
O Lugar Feminino no Liceu de Sá de Miranda.
Braga (1930-1947)
adília FerNaNdeS
A Lousã no Século XVIII. Redes de Sociabilidade
e de Poder
Maria do roSário CaStiço de CaMPoS
Viseu de Portugal e Viseu do Brasil. História e
Histórias
FerNaNdo vale
História da Primeira República em Torre de
Moncorvo (1910-1926)
adília FerNaNdeS
O Solar de Santana, Museu Municipal de Tondela e
a Arquitectura Senhorial da Região
iNêS da CoNCeição do CarMo borgeS
O Sagrado e o Profano em Choque no
Confessionário. O delito de solicitação no Tribunal
da Inquisição. Portugal 1551-1700
JaiMe riCardo teixeira gouveia
Sociolinguística Urbana de Contacto.
O Português Falado e Escrito no Reino Unido
João Corrêa-CardoSo
A Anunciação à Virgem Maria na Religiosidade
Popular do Interior da Beira
Maria adelaide Neto Salvado
O Cancioneiro Musical de Penha Garcia
Flávio PiNho
Campos Monteiro – Domus Mea est Orbis Meus
(1876-1933)
JoSé eduardo FirMiNo riCardo
Multiculturalidade, identidades e mestiçagem:
O diálogo intercultural nas ideias, na política,
nas artes e na religião
João Maria aNdré
O Espaço ibero-magrebino durante a presença
árabe em Portugal e Espanha
(Do Al-Garbe à expansão portuguesa em
Marrocos)
Miguel de aragão SoareS
Vínculos quebrantáveis. O Morgadio de Boassas e
suas relações. Séculos XVI-XVIII
NuNo reSeNde
O Cortejo de Oferendas da Santa Casa da
Misericórdia de Tondela – 1952. Património
Iconográfico
iNêS do CarMo borgeS e JoSé MaNuel rodrigieS
CoiMbra
Tocha – Uma História com Futuro
Margarida Sobral Neto
Ladeia e Ladera – Subsídios para o Estudo do
Feito de Ourique
Salvador diaS arNaut
Nos Caminhos de um Reino Matriz
JoaquiM M. PalMa
Problemática do Saber Histórico – Guia de Estudo
Margarida Sobral Neto
O Poder Local em Penela (1640-1834)
CriStóvão Mata
O Poder Local em Penela
(1640-1834)
Coimbra • 2014
Título: O Poder Local em Penela (1640-1834)
Autor: Cristóvão Mata
Capa: Palimage
© 2014 Cristóvão Mata
Direitos reservados por Terra Ocre, Lda.
Edição: Palimage
Apartado 10032
3031-601 Coimbra
palimage@palimage.pt
www.palimage.pt
Data de edição: setembro de 2014
ISBN: 978-989-703-116-8
Depósito Legal n.º 380755/14
Impressão: Artipol – Artes Tipográficas, Lda.
PaliMage é uMa MarCa editorial da terra oCre ediçõeS
Cristóvão Mata
O Poder Local em Penela
(1640-1834)
A Imagem e A Palavra
Nota Introdutória
Identidade com futuro é o lema do Município de Penela. Este entendimento do presente ancora-se na convicção de que o desenvolvimento
de qualquer território passa, obrigatoriamente, pelo reconhecimento e
valorização do património que possui.
O concelho de Penela é marcado por uma forte herança histórica e
cultural, assente em património de elevado valor, quer na riqueza das suas
formas, quer no seu estado de conservação. A Villa romana do Rabaçal;
o Castelo de Penela; os Pelourinhos de Podentes e Penela; as igrejas
de São Miguel, Santa Eufémia, Espinhal, Misericórdia e tantas outras;
os solares da Quinta da Boiça e do Espinhal; o Castelo do Germanelo
ou a aldeia de xisto da Ferraria de S. João evocam passados múltiplos e
de sentidos diversos e que convidam a uma viagem no tempo. Viagem
que se pode fazer, igualmente, através da rede dos Castelos e Muralhas
Medievais, projecto de cooperação que visa potenciar a competitividade
territorial pela valorização do conjunto patrimonial dos castelos medievais
da linha defensiva do Mondego.
Para além do investimento na preservação da materialidade do passado,
o município de Penela tem apostado na construção e da divulgação da
memória histórica. Com esse objectivo acolheu o Centro de Estudos
de Histórica Local e Regional Salvador Dias Arnaut. Esta instituição
fazendo jus ao seu patrono, eminente investigador do passado medievo
nacional e da história da sua pequena pátria, tem como missão divulgar
conhecimento e promover investigação histórica à escala nacional e regional. É neste contexto que se insere a obra que agora se publica, O Poder
local em Penela, 1640-1834, fruto de um projecto de pesquisa histórica
patrocinado pelo município, que desvenda uma parte muito expressiva
-7-
do passado histórico de Penela numa temática de grande actualidade:
os agentes e as práticas da governança local.
Este é um dos propósitos maiores de uma Edilidade que se quer cada
vez mais próxima dos seus Munícipes, na firme convicção de que unidos
e solidários, será possível levar por diante um projecto sempre conjunto
e que a todos nos dignifique, cívica e existencialmente.
Luís Filipe Lourenço Matias
Presidente da Câmara de Penela
-8-
Prefácio
O livro Poder Local em Penela (1640-1834) de autoria de Cristóvão
Mata resulta de uma tese de mestrado apresentada à Faculdade de Letras
da Universidade de Coimbra, no ano de 2012, tendo sido elaborada no
âmbito de uma bolsa de investigação patrocinada pelo município de
Penela. Insere-se num dos objetivos do Centro de Estudos de História
Local e Regional Salvador Dias Arnaut (CEHLR – SDA), em particular
no que concerne à promoção e divulgação do conhecimento sobre a
História da vila de Penela.
O município de Penela é um dos concelhos mais antigos do país,
remontando a sua constituição a 1137, data em que lhe foi concedido
foral medieval. A sua História, sobretudo a época medieval, está intrinsecamente ligada à reconquista cristã, expressa na materialidade dos
castelos do Germanelo e de Penela. O relevante serviço prestado ao reino
por este território valeu-lhe o reconhecimento de D. Afonso Henriques
e dos restantes monarcas medievos que recompensaram a vila com
importantes privilégios usufruídos pela população e sobretudo pelos
senhores de Penela.
O passado medieval da Vila e do território onde se integra (a região da
Ladeia) foi objeto de análise por alguns historiadores nomeadamente por
Salvador Dias Arnaut que a Penela dedicou vários estudos. O essencial
desse conhecimento está vertido nas páginas deste livro por ser incontornável para a compreensão da História de Penela na época moderna.
A carga simbólica acumulada ao longo da época medieval (a associada
à reconquista potenciada pela dignidade do ciclo medievo dos senhores de
Penela, em que se destaca o Infante D. Pedro) explica a doação, pelo rei
D. Manuel I, em 1500, da vila de Penela a D. Jorge de Lencastre, fundador
-9-
Cristóvão Mata
da Casa de Aveiro, uma das casas aristocráticas mais prestigiadas da
monarquia portuguesa moderna até ao reinado de D. José. Devido a
esta mercê régia Penela manteve, na época moderna, o estatuto de vila
senhorial o que, na prática, significou a atribuição à casa de Aveiro da
tutela sobre a governação concelhia bem como o direito à cobrança da
pesada tributação consagrada no foral manuelino.
O estudo O Poder Local em Penela revela-nos a História de um
período importante do passado desta vila indissociável da História de
Portugal. O período cronológico no qual se concentra o principal esforço
de investigação vai de 1640 a 1834. A data inicial reporta-se a um tempo
já avançado da época moderna, justificando-se, neste contexto, a escolha
do ano de 1640 não pelo significado político que carreia na História
Nacional mas por circunstâncias específicas à investigação histórica,
concretamente a inexistência de atas de vereação para o período anterior.
O desaparecimento dos registos das decisões camarárias referentes ao
século XVI e às primeiras décadas do XVII impossibilitou que este livro
aborde, com profundidade, a centúria de quinhentos, tempo assinalado na
arquitetura religiosa de Penela por várias expressões da arte renascentista.
A cronologia desta obra ultrapassa, entretanto, o ciclo de vida da
Casa de Aveiro, extinta em 1759. Escolheu-se para data final 1834,
marco legislativo das reformas emblemáticas que assinalam o fim de
instituições, de cariz económico e social, relevantes no Antigo Regime e
a criação de condições para a construção da sociedade e do estado liberal.
Esta opção permitiu estudar as circunstâncias do exercício do poder local,
em Penela, para além do longo ciclo dos senhores. Com efeito, entre
1759 e 1834 a governação e o povo do município de Penela libertaram-se da tutela senhorial ficando apenas na dependência do poder régio,
um poder pós-pombalino dotado de instrumentos mais eficazes de
controlo do território, ficando, no entanto, neste campo sempre aquém
das casas senhoriais mais próximas das populações e consequentemente
mais asfixiantes das autonomias e das liberdades municipais.
Num panorama historiográfico em que escasseiam os estudos sobre
municípios de tutela senhorial, este livro de Cristóvão da Mata acrescenta
conhecimento reforçando resultados já apresentados por outros autores,
nomeadamente no que concerne ao perfil social das vereações concelhias,
problemática central do estudo. Como já fora provado por Sérgio Soares,
num estudo sobre o município da Lousã, a cessação da tutela da casa de
Aveiro provocou uma mudança qualitativa no estatuto social da vereação
- 10 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
penelense que passou a acolher membros da nobreza e da fidalguia até
aí afastados do poder concelhio.
Este estudo carreia outra evidência empírica dotada de elevado
potencial explicativo para a compreensão do percurso histórico particular
da vila de Penela e que se configura como hipótese relevante para a
História do país. A título de exemplo invocamos a identificação, por parte
dos procuradores de Penela às cortes da Restauração, da fiscalidade e
dos problemas de transportes como causas de “decadência” económica,
expressa, por exemplo, na perda de dinamismo das feiras no século XVII.
Na linha da historiografia municipalista elaborada nas últimas quatro
décadas, o livro Poder Local em Penela (1640-1834), evidencia o papel
desempenhado pelo poder concelhio na governação do quotidiano das
populações (da justiça ao abastecimento local), bem como a sua ação
no governo global do país, nomeadamente em matéria de cobrança
de impostos.
Marc Bloch definiu História Local como “um problema de história
geral colocado a testemunhos que proporcionam um campo de experiências restrito”. A obra que agora se coloca à disposição do leitor situa-se
nesta asserção. Ao desvendar conhecimento sobre os contextos e as
expressões do poder local numa vila da região centro do país lança luz
sobre aspetos muito relevantes da História de Portugal. A perspetiva
de análise da História portuguesa da “periferia” para o “centro” tem
enriquecido o conhecimento da História do país contribuindo para alterar
muitas ideias decorrentes de um olhar unilateral perspetivado do “centro”
para a “periferia”.
O Centro de Estudos de História Local e Regional Salvador Dias
Arnaut, regozija-se com a publicação desta obra por constituir, por um
lado, um importante contributo para o conhecimento e divulgação da
História de Penela enriquecendo, por outro, a História do Poder Local
em Portugal.
Margarida Sobral Neto
Coordenadora Científica do CEHLR – SDA
- 11 -
Introdução
«Encontrei o Antigo Regime vivo, as suas ideias, as suas
paixões, os seus preconceitos, as suas práticas».
Alexis de Tocqueville1
A obra que agora se dá à estampa constitui a nossa dissertação de
mestrado em História Moderna. Contudo, não corresponde na íntegra
à versão original que, no dia 8 de Novembro de 2012, foi apresentada
e submetida à avaliação de um júri académico2. Foram introduzidas
alterações consideráveis que uma derradeira revisão, inevitável e
mais cuidada, identificou como sendo necessárias e que derivam
essencialmente de novas leituras e da consulta de documentação por
nós desconhecida àquela data. Algumas modificações devem-se à
prossecução de determinadas linhas de investigação iniciadas aquando da
elaboração da nossa tese e que mais recentemente constituíram a temática
de algumas comunicações apresentadas em eventos científicos nos quais
recuperámos e discutimos certas questões3, enquanto outras derivam
O Antigo Regime e a Revolução. Lisboa: Fragmentos, 1989, p. 11.
O concelho de Penela durante o Antigo Regime: um olhar sobre o poder local
(1640-1834). Dissertação de Mestrado em História Moderna: Poderes, Ideias e
Instituições, especialidade em História Moderna, apresentada à Faculdade de Letras
da Universidade de Coimbra, sob a orientação da Professora Doutora Margarida
Sobral Neto e co-orientação do Professor Doutor Joaquim Ramos de Carvalho.
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2012.
3
O caso mais recente é a comunicação intitulada “A vereação de Penela: 1640-1834”, apresentada a 26 de Outubro de 2013 no Salão Nobre da Câmara Municipal
1
2
- 13 -
Cristóvão Mata
do desenvolvimento de um novo projecto de investigação, cujo esboço
se encontra publicado4. Conjuntamente, justificam-se pelo desejo de
apresentar um trabalho mais consistente e mais actualizado relativamente
ao momento em que defendemos a primeira versão. Mas também menos
sobrecarregado de informação, porventura exaustivamente apresentada,
tendo em vista uma maior inteligibilidade.
No que diz respeito ao seu conteúdo, mantem-se a abordagem inicialmente tomada, bem como as principais conclusões então apresentadas,
embora a sua estrutura tenha sido alvo de ligeiras alterações: onde na
primeira versão deste estudo pretendemos oferecer uma visão genérica
da sociedade portuguesa do Antigo Regime e realizar uma breve exposição das respectivas concepções teóricas que forneciam coerência
à sociedade corporativa do Portugal Moderno, escrevemos agora um
estado da arte sobre o poder municipal e as principais linhas de orientação
que têm norteado este campo da historiografia nacional. No primeiro
capítulo discutem-se alguns dos temas que têm composto a agenda da
investigação histórica portuguesa dedicada ao estudo dos concelhos na
Época Moderna, enunciando sucintamente os que são parte integrante
deste trabalho.
No segundo capítulo chegaremos a Penela. Aqui, será abordada a
origem do município penelense, o substrato legal da sua autonomia
governativa e a cartografia do termo concelhio enquanto unidade político-administrativa. Mas também as diversas subdivisões que repartiam
o território sujeito ao poder municipal, às quais podiam corresponder
funções e agentes administrativos próprios, e as várias circunscrições
administrativas (não obrigatoriamente territoriais) onde o concelho se
inseria e cujas instâncias jurisdicionais asseguravam a comunicação
entre a periferia, onde se inseria o concelho de Penela, e os centros
de Penela ao abrigo do programa do colóquio comemorativo do centenário do
nascimento do Professor Doutor Salvador Dias Arnaut.
4
Nomeadamente o nosso projecto de doutoramento em Altos Estudos em
História – Época Moderna, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,
intitulado “A Casa de Aveiro na constelação dos poderes senhoriais: redes de poder
e estruturas de domínio”, orientado pela Professora Doutora Margarida Sobral
Neto e co-orientado pelo Professor Doutor Nuno Gonçalo Monteiro. A publicação
referida é o artigo “A Casa de Aveiro: poder e património” in Revista Portuguesa
de História. Tomo 44: A Nobreza. Tempos, Espaços e Poderes (2013).
- 14 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
jurisdicionais aos quais se submetia, tanto régio como senhorial. Trata-se,
em suma, de estabelecer uma relação entre território e poderes.
Este mesmo propósito confere justificação ao capítulo seguinte.
Considerado o peso que as entidades senhoriais detinham no âmbito da
distribuição de poderes e jurisdições no Portugal Moderno, será feita a
apresentação dos diversos senhores que desde a Idade Média a vila de
Penela foi conhecendo, para depois, com mais atenção, nos debruçarmos
sobre aqueles que senhorearam o concelho durante uma boa parte do
período aqui estudado: os duques de Aveiro. Neste momento, após um
breve resumo da história desta Casa senhorial aristocrática, o objectivo
assumido será o de desenvolver algumas considerações sobre os poderes
que estes donatários exerceram nos seus senhorios jurisdicionais,
para melhor conhecermos os instrumentos institucionais de que
dispunham e, por conseguinte, aferirmos a sua real capacidade de intervenção na vila e concelho de Penela.
Seguidamente, a discussão incidirá sobre o governo municipal e a sua
configuração institucional ao longo dos anos. Significa isto que serão
apresentados os oficiais que, dependendo da ocasião, formaram o governo
local e enunciadas, resumidamente, as respectivas competências previstas
pela lei geral do reino. Será igualmente estudado o efectivo funcionamento da Câmara, tanto ao nível da regularidade das reuniões camarárias
como da participação dos seus elementos nestes actos governativos
oficiais, bem como destacadas as áreas sobre as quais incidia o poder
municipal, dentre as quais seleccionaremos as mais constantes.
O penúltimo capítulo retoma o ponto anteriormente deixado em
aberto. Aprofunda a discussão sobre actuação da Câmara nas duas
áreas de governação que, pela sua contínua referência nas actas de
vereação, consideramos mais importantes. Num primeiro momento,
abordaremos o que convencionalmente se apoda de governo económico.
Isto é, a regulamentação camarária da economia local. Em particular, o
controlo exercido sobre a produção, transformação e comercialização
dos principais géneros alimentícios tendo em vista o abastecimento
do concelho; mas também a fiscalização exercida sobre os pesos e
as medidas, o preço dos alimentos, o custo do trabalho e a actividade
mesteiral. Depois, realizaremos uma análise ao papel desempenhado pela
Câmara no âmbito da cobrança de impostos, identificando os tributos,
régios e senhoriais, que constam das actas de vereação e descrevendo os
processos mediante os quais se procedia à sua colecta.
- 15 -
Cristóvão Mata
Por fim, será estabelecido o perfil social do poder concelhio através
da elaboração de uma biografia colectiva dos indivíduos empossados nos
cargos de juiz ordinário, vereador e procurador do concelho. Esta abordagem tomará um sentido evolutivo que nos permita avaliar as mutações
sofridas no decorrer dos anos e demonstre a alteridade da sociologia do
poder dentro dos limites que balizam o período considerado. Para este
efeito, será também analisado o grau de acesso à Câmara e de rotatividade
dos seus membros, contabilizando-se os indivíduos nomeados e os que
efectivamente assumiram o poder e estabelecendo a sua relação com o
número de postos que constituíram os mandatos estudados.
Estes são os cinco grandes tópicos que organizaram tematicamente a
nossa dissertação de mestrado e que agora mantemos na estrutura deste
livro. No entanto, alguns destes capítulos são ampliados, enquanto outros
vêem-se reduzidos. Ambas as modificações devem-se aos motivos acima
apontados: ao desejo de obter um melhor aproveitamento das matérias
discutidas, mas também a uma revisão que pretendeu conferir outra
legibilidade a um trabalho agora acessível a um público mais amplo.
Pelos mesmos motivos, introduzem-se no apêndice documental alguns
diplomas que previamente não havíamos considerado e, embora a grande
maioria permaneça, excluem-se alguns quadros e gráficos então incluídos
em anexo.
A publicação que agora se dá a este estudo não depende unicamente
do mérito que possa ou não ter. Em primeiro lugar, agradecemos ao
Professor Doutor Joaquim Ramos de Carvalho ter-nos informado das
condições que vieram a possibilitar a sua elaboração. De igual modo,
manifestamos o nosso sincero bem-haja à Câmara Municipal de Penela:
ao executivo pela bolsa de investigação que nos atribuiu e pelo patrocínio
a esta edição, e aos funcionários com quem mais de perto convivemos
pela sua permanente disponibilidade e simpatia. A criteriosa arguição da
Professora Doutora Maria do Rosário Castiço de Campos a este trabalho
nas provas que apresentámos contribuiu para o seu melhoramento, pelo
que não podemos deixar de expressar o quão gratos lhe estamos. Pela
orientação com que nos privilegiou, mas sobretudo pelo apoio, estímulo,
continuado acompanhamento e amizade, deve ser aqui declarada uma
sentida palavra de agradecimento à Professora Doutora Margarida Sobral
Neto, a quem esta obra tanto deve. Ao Dr. Jorge Fragoso declaramos a
nossa profunda gratidão pelo interesse que demonstrou neste trabalho
e pela providencial oportunidade que concedeu à presente publicação.
- 16 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Aos nossos amigos, os do Paiol e os de Coimbra, que não nomeamos
com a certeza de que se reconhecerão, o nosso agradecimento pelas
incontáveis horas passadas a ouvir falar de História e pelo entusiasmo com
que acolheram a boa nova deste livro. Naturalmente, a nossa família é a
maior credora. Aos nossos tios e às nossas tias, uma saudação afectuosa e
com a habitual pantomima, merecida pelo inigualável ambiente familiar
com que sempre nos beneficiaram. Aos nossos primos e primas, um
pedido de desculpa pelas promessas não cumpridas. Quanto aos nossos
pais, José e Elisabete, eternamente convictos da valia do investimento
na nossa educação, pouco mais podemos acrescentar ao notório amor
que lhes devotamos. Ao Jorge, cunhado e amigo, um abraço fraterno.
Embora óbvia, é impossível não manifestar à Vanessa, para além da
admiração por quem é, a gratidão pelos ensinamentos de irmã mais velha.
Quem mais de perto acompanhou a feitura deste trabalho merece um
agradecimento que as páginas de um livro não podem suportar – ficará
para dias futuros a justa recompensa à Mariana. À Caetana e à Maria,
as boas-vindas devidas a quem está na iminência de nascer. Pela menina
especial que é, a Beatriz merece a dedicatória deste trabalho. Impensável
seria não oferecer também este livro à memória da avó Custódia, que
tanta saudade tem deixado.
- 17 -
–I–
Os concelhos no Antigo Regime: um balanço geral
Olhar para a história do poder local a partir de uma perspectiva
simplista que a reduza a uma modalidade historiográfica menor,
provinciana, fechada num pequeno reduto populacional com pouco
ou nenhum interesse para a história geral, como se a única justificação
plausível para a sua elaboração fosse uma intenção romântica,
até bucólica, tendo em vista o enternecimento da terra, obrigatoriamente
rotularia de desnecessária a discussão sobre o estudo dos municípios
portugueses. Mas os concelhos portugueses durante o Antigo Regime
não representavam unicamente, como hoje os podemos descrever, um
elemento de aproximação às populações locais – eram uma parte orgânica
da sociedade corporativa. Como expressivamente escreveu João Pinto
Ribeiro, «consta o Reyno [de Portugal] de Republicas menores, das
Cidades, & villas. Elle por si faz huma Republica maior, que consta de
todas estas menores»1.
A concepção existente acerca da organização social assentava no
pressuposto de que havia uma ordem universal aplicável a todos os
homens e a todas as coisas e indispensável à explicação do mundo físico
e do mundo humano, em função da qual cada particularidade operava
diferentemente das demais na concretização de um destino cósmico2.
Ribeiro, João Pinto – Lustre ao Dezembargo do Paço, e as Eleiçoens,
Perdoens, e Pertenças de sua Jurisdicçaõ. Coimbra: Na Officina de Joseph Antunes
da Sylva, 1728, p. 26.
2
Hespanha, António Manuel – Poder e instituições no Antigo Regime. Guia
de Estudo. Lisboa: Edições Cosmos, 1992, p. 28.
1
- 19 -
Cristóvão Mata
Aos homens, enquanto indivíduos, não se concedia existência social
reconhecida. Eram agrupados em colectividades orgânicas que, sob a
forma de corpos e comunidades, constituíam o modelo omnipresente de
organização social e política. A sua natureza era variada mas, conjuntamente, conferiam regulação, conformidade e harmonia à acção humana3.
A esta sociedade de ordens correspondia um sistema de poderes «em que
certas ordens sociais e diversos corpos jurídicos, como as corporações
e os municípios, mantêm determinados direitos» 4. Não obstante,
os municípios estavam integrados numa sociedade política encimada
pelo rei e pela Coroa, não sendo um elemento à parte5. No seio desta
constelação de jurisdições, o poder monárquico constituía tão-só um
«poder preeminente»6.
A definição de absolutismo, na sua acepção clássica e mais tradicional,
a de um poder uno, omnipresente e autocrático corporizado na pessoa
do monarca, por conseguinte, encontra-se actualmente desacreditada.
Aliás, a existência da própria entidade Estado antes do advento do
Liberalismo já foi contestada7. Para esta nova interpretação do modelo
político vigente na Época Moderna contribuíram em muito os vários
estudos sobre os poderes periféricos que têm vindo a certificar que a
presunção de que rei detinha o poder absoluto era mais «um horizonte,
um propósito, um caminho a ser trilhado. Não uma realidade». O monarca
podia deter o monopólio da justiça e da guerra, mas necessitava da
colaboração de terceiros, nomeadamente das câmaras municipais que
Revel, Jacques – «Les corps et communautés» in Baker, Keith Michael –
The French Revolution and the creation of Modern Political Culture. Volume 1:
The Political Culture of the Old Regime. Oxford: Pergamon Press, 1987, p. 225.
4
Torgal, Luís Reis – Ideologia Política e Teoria de Estado na Restauração.
Volume II. Coimbra: Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, 1981, p. 94.
5
Gil Pujol, Xavier – “¿Centralismo y localismo? Sobre las relaciones políticas
y culturales entre capital y territórios en las monarquias europeas del Barroco”
in Tiempo de política. Perspectivas historiográficas sobre la Europa moderna.
Barcelona: Publicacions i Edicions de la Universitat de Barcelona, 2006, p. 116.
6
Hespanha, António Manuel – As Vésperas do Leviathan. Instituições e poder
político: Portugal – séc. XVII. Coimbra: Livraria Almedina, 1994, pp. 471-522.
7
Por todos, vide Cardim, Pedro – “Centralização Política e Estado na Recente
Historiografia sobre o Portugal do Antigo Regime” in Nação e Defesa. N.º 87,
2.ª série (1998).
3
- 20 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
asseguravam o efectivo governo das terras8. Numa nova definição, como
habilmente resumiu Xavier Gil Pujol, o Absolutismo do Antigo Regime
consistiu então numa paradoxal relação entre a progressiva concentração
de poderes num centro político cada vez mais exíguo e a dependência
deste relativamente às forças sociais periféricas9. Daí a importância do
estudo do poder municipal.
O interesse pelas cidades, vilas e localidades portuguesas não é
recente. A partir do século XVI foram surgindo obras de eruditos que
versavam sobre as antiguidades do país, como a pioneira obra de André
de Resende sobre a cidade de Évora10 ou o Livro das Grandezas de Lisboa
de frei Nicolau de Oliveira11. Também se inclui nesta categoria o extenso
rol de corografias e dicionários que apresentavam informações sobre
várias localidades do reino. Mas a atenção concedida aos municípios
portugueses despertou mais recentemente, no século XIX12, apesar de
os resultados se deverem menos a um interesse genuinamente historiográfico do que a uma agenda eminentemente política e ideológica:
inicialmente influenciados pelo Romantismo, os trabalhos tinham em
vista a legitimação dos planos de descentralização que se opunham à
concentração de poderes promovida pelo Liberalismo13.
Magalhães, Joaquim Romero e Coelho, Maria Helena da Cruz – O poder
concelhio: das origens às cortes constituintes. Coimbra: Centro de Estudos de
Formação Autárquica, 1986, pp. 29-30.
9
Gil Pujol, Xavier – “¿Centralismo y localismo? (…)”, op. cit., p. 129.
10
Resende, André de – Historia da Antiguidade da Ciidade de Evora. Évora:
per Andre de Burgos, 1553.
11
Oliveira, frei Nicolau de – Livro das Grandezas de Lisboa. Lisboa: por Jorge
Rodrigues, 1620.
12
Oliveira, António – “Problemática da História Local” in O Faial e a Periferia
Açoriana nos séculos XV a XIX. Horta: Núcleo Cultural, 1995, pp. 12-29; Neto,
Margarida – “Percursos da História Local Portuguesa. Monografias e representações
de identidades locais” in Santos, João Marinho dos e Catana, António Silveira
(coord.) – Memória e História Local. Colóquio Internacional realizado em Idanha-a-Nova. Coimbra: Palimage, 2010, pp. 47-70; Torgal, Luís Reis, Mendes, José
Amado e Catroga, Fernando – História da História em Portugal: séc. XIX-XX.
Lisboa: Círculo de Leitores, 1996, pp. 75-76.
13
Capela, José Viriato – “Administração local e municipal portuguesa do século
XVIII às reformas liberais (Alguns tópicos da sua Historiografia e nova História)”
in Fonseca, Teresa e Cunha, Mafalda Soares da (ed.) – Os Municípios no Portugal
8
- 21 -
Cristóvão Mata
Por oposição à história local académica praticada recentemente,
o século XIX foi também o tempo da história particular das localidades.
Um período de produção de «monografias de comunidades locais
ou urbanas, elaboradas maioritariamente por eruditos locais que se
dedicavam à pesquisa de fontes históricas com objectivo de construir
e preservar a história e memória da sua terra natal»14 – relativamente a
Penela, podem citar-se os estudos de Delfim José de Oliveira15 e de João
Pedro Arnaut16.
Com o Estado Novo, ocorreram «grandes evocações de História
Municipal, com particular incidência no campo doutrinário mais do que
no campo historiográfico»17. Mas no estertor do regime vislumbrou-se a mudança. A partir da década de 1960 foram sendo abertas novas
linhas de investigação e concedeu-se mais atenção às localidades do
país. Deste esforço resultaram vários estudos de demografia histórica
e outros cuja temática não gozava da estima do regime salazarista18,
Moderno. Dos forais manuelinos às reformas liberais. Lisboa: Colibri, 2005,
pp. 40-41.
14
Neto, Margarida Sobral – “Percursos da História Local Portuguesa (…)”,
art. cit., p. 54.
15
Oliveira, Delfim José – Noticias de Penela: Apontamentos Historicos e
Archeologicos. Lisboa: Typ. da Casa Minerva, 1884.
16
Jarnaut – Monografia do Município Penelense ou narração dos factos aqui
decorridos, desde os tempos primitivos até 1910. Lousã: Edição do Autor, 1915.
17
Capela, José Viriato – “Administração local e municipal portuguesa (…)”,
art. cit., pp. 40-41.
18
Neto, Margarida Sobral – “Percursos da História Local Portuguesa (…)”,
art. cit., p. 63. A este título é exemplar a produção das seguintes teses de licenciatura
sobre o concelho de Penela: Alves, José Boaventura – A freguesia da Cumieira na
primeira metade do século XVIII: demografia histórica. Tese de licenciatura em
História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1969; Alves,
José Carlos Governo Mendes – A freguesia do Espinhal do concelho de Penela
na primeira metade do século XVIII. Tese de licenciatura em História. Coimbra:
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1971; Basto, Ana Isabel Proença
de Almeida – A população da freguesia de Podentes no período de 1623 a 1699.
Tese de licenciatura em História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de
Coimbra, 1973; Campos, Cipriano de – A freguesia de Podentes na primeira metade
do século XVIII: estudo de demografia histórica. Tese de licenciatura em História.
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1967; Carvalho, João
Manuel de Almeida Saraiva de – A freguesia do Espinhal do concelho de Penela
de 1812 a 1862: estudo de demografia histórica. Tese de licenciatura em história.
- 22 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
sendo paradigmático o estudo sobre a história económica e social de
Coimbra elaborado por António de Oliveira19. Posteriormente, a abertura
política vivida no país e nas universidades e o desbravamento de novos
campos de investigação propiciaram o surgimento de trabalhos dedicados
ao estudo das instituições de poder municipal20.
António Manuel Hespanha levou a cabo uma primeira crítica à tradicional imagem de centralização política e afirmação estatal ao apresentar uma Coroa institucionalmente incapaz de fazer aplicar os seus
desígnios político-administrativos em todo o território21. Joaquim Romero
Magalhães, por seu turno, aferiu a vitalidade dos poderes periféricos
situados no reino do Algarve e a importância das elites locais no âmbito
de governo autárquico22. Na década de 1980, começaram a surgir as
primeiras monografias e esforços de sintetização sobre as instituições
de poder e administração municipais.
Não é fácil fazer a genealogia completa destes trabalhos, pelo menos
sem se admitir a possibilidade de se cometer inconscientemente a injustiça
de deixar alguma obra meritória fora da discussão. Mas é possível,
em todo o caso, apresentar as principais características deste conjunto
de monografias. Na sua grande maioria, têm sido escritas ao abrigo de
cursos de mestrado e de doutoramento, algumas das quais posteriormente
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1974; Dias, Joaquim
Gomes – A freguesia da Cumieira do concelho de Penela na segunda metade do
século XVIII: estudo demográfico. Tese de licenciatura em História. Coimbra:
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1972; Gama, Ângela Maria
Barcelos da – A população da freguesia de São Miguel de Penela de 1700 a 1799:
contribuição para a história social do concelho de Penela no século XVIII.
Tese de licenciatura em História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade
de Coimbra, 1965.
19
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra de 1537 a 1640.
Tese de Doutoramento em História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade
de Coimbra, 1972.
20
Neto, Margarida Sobral – “Percursos da História Local Portuguesa (…)”,
art. cit., p. 63 e Capela, José Viriato – “Administração local e municipal portuguesa
(…)”, art. cit., pp. 42-43.
21
Hespanha, António Manuel – As Vésperas do Leviathan (…), op. cit.; Poder
e Instituições no Antigo Regime. Guia de Estudo. Lisboa: Edições Cosmos, 1992;
História das Instituições: Épocas medieval e moderna. Coimbra: Almedina, 1982.
22
Magalhães, Joaquim Romero – O Algarve económico, 1600-1773. Lisboa:
Estampa, 1993.
- 23 -
Cristóvão Mata
publicadas, e versado sobre a generalidade das cidades portuguesas23,
assim como sobre um número bastante elevado de concelhos de
menor dimensão24.
Fernandes, Paulo Jorge – As faces de Proteu: Elites urbanas e o poder
municipal em Lisboa de finais do século XVIII a 1851. Lisboa: Lisboa Arte e
História, 1999; Silva, Francisco Ribeiro da – O Porto e o seu termo (1580-1640).
Os homens, as instituições e o poder. Porto: Câmara Municipal do Porto, 1988;
Elites portuenses do século XVII: caracterização social e vias de mobilidade. Porto:
Centro de Estudos de Genealogia, Heráldica e História da Família da Universidade
Moderna, 2001; Nunes, Ana Sílvia Albuquerque Oliveira – História social da
administração do Porto (1700-1753). Porto: Universidade Portucalense, 1999;
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra da Restauração ao Pombalismo.
Coimbra: Centro de História da Sociedade e da Cultura, 2001-2004; Ribeiro, Ana
Isabel – Nobrezas e governanças. Identidades e perfis sociais (Coimbra, 1777-1820). Dissertação de doutoramento em História. Coimbra: Faculdade de Letras
da Universidade de Coimbra, 2012; Capela, José Viriato – “O município de Braga
de 1750 a 1834. O governo e a administração económica e financeira” in Bracara
Augusta, 41 (1988-1989); Pardal, Rute – As elites de Évora ao tempo da dominação
filipina: estratégias de controlo do poder local (1580-1640). Lisboa: Colibri, 2007;
Fonseca, Teresa – Absolutismo e Municipalismo. Évora, 1750-1820. Lisboa: Colibri,
2002; Marinho, José da Silva – Construction d’un gouvernemente municipal: élites,
élections et pouvoir à Guimarães entre Absolutisme et Liberalism (1753-1834).
Braga: Universidade do Minho, 2000; Coelho, Maria Virgínia – Perfil de um
poder concelhio: Santarém durante o reinado de D. José. Tese de doutoramento
de Sociologia e Economia Históricas. Lisboa: Faculdade de Ciências Sociais e
Humanas da Universidade Nova da Lisboa, 1993; Rodrigues, José Damião – Poder
municipal e oligarquias urbanas: Ponta Delgada no século XVII. Ponta Delgada:
Instituto Cultural de Ponta Delgada, 1994.
24
Aqui, o elenco seria quase interminável, pelo que elaboramos somente uma
lista de bibliografia escolhida: Santos, Rui – “Senhores da terra, senhores da vila:
elites e poderes locais em Mértola no século XVIII” in Análise Social. Volume
XXVIII (1993), pp. 345-369; Fonseca, Teresa – Relações de poder no Antigo
Regime: a administração municipal em Montemor-o-Novo (1777-1816). Montemoro-Novo: Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, 1995; Fernandes, Paulo Jorge –
Elites e finanças municipais em Montemor-o-Novo do Antigo Regime à Regeneração
(1816-1851). Montemor-o-Novo: Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, 1999;
Fonseca, Teresa – Administração senhorial e relações de poder no concelho do
Vimioso. Arraiolos: Câmara Municipal de Arraiolos, 1998; Paula, Glória S. – Lagos
(1745-1792). Dinâmicas económicas e elites de poder. Lisboa: Estar, 2001; Soares,
Sérgio Cunha – “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã no século XVIII (1732-1759)”
in Arunce: Revista de Divulgação Cultural. Volume 11/12 (1996-1997); Campos,
Maria do Rosário Castiço de – A Lousã no século XVIII. Redes de Sociabilidade e
23
- 24 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
A consulta de alguns destes títulos revela que a época mais visada tem
sido a que compreende a segunda metade do século XVIII e as primeiras
décadas do XIX, embora também haja trabalhos que fazem um esforço
comparativo entre o município dos finais do Antigo Regime e o do período
liberal, geralmente até à Regeneração, bem como outros, mais raros, que
focaram os finais do século XVI e inícios do seguinte. Em alguns casos,
os autores ultrapassaram os limites dos termos concelhios e elaboraram
trabalhos de índole regional: Joaquim Romero Magalhães, embora não
se tenha debruçado unicamente sobre as instituições municipais, estudou
o Algarve25, José Viriato Capela tem estudado e orientado estudos sobre
vários municípios da região de Entre-Douro-e-Minho26 e José Damião
Rodrigues analisou as elites setecentistas da ilha de São Miguel27.
Superada a necessidade de haver uma «base monográfica satisfatória»,
que alguns autores consideraram ser uma condição indispensável à análise
comparativa e à elaboração de sínteses28, regista-se desde há alguns
anos a existência de obras de carácter generalista sobre os municípios
portugueses. Em 1986, Joaquim Romero Magalhães e Maria Helena
da Cruz Coelho realizaram o primeiro grande esforço de compreensão
dos concelhos desde a Idade Média ao advento do Liberalismo; dez
anos depois, César Oliveira dirigiu uma obra sobre os poderes locais
durante as épocas Moderna e Contemporânea29. Ainda nesta década,
os vários volumes da História de Portugal dirigida por José Mattoso
de Poder. Coimbra: Palimage, 2010; Ribeiro, Maria Teresa Casquilho – O município
de Alter do Chão nos finais do século XVIII. Rostos do poder concelhio. Coimbra:
Palimage, 1998.
25
Magalhães, Joaquim Romero – O Algarve económico (…), op. cit..
26
Capela, José Viriato – O Minho e os seus municípios. Estudos económico-administrativos sobre o município português nos horizontes da reforma liberal.
Braga: Universidade do Minho, 1995.
27
Rodrigues, José Damião – São Miguel no século XVIII: casa, elites e poder.
Ponta Delgada: Instituto Cultural de Ponta Delgada, 2003.
28
Bloch, Marc – “Pour une histoire comparée des sociétés européennes”
in Mélanges historiques. Paris: SEVPEN, 1983, pp. 37-38 e Elliot, John –
“Comparative history” in Barros, Carlos (ed.) – História a Debate: Actas del
Congreso Internacional “Historia a Debate”. Tomo III: Otros enfoques. Santiago
de Compostela: Historia a Debate, 1993, p. 10.
29
Magalhães, Joaquim Romero e Coelho, Maria Helena da Cruz – O poder
concelhio (…), op. cit.; Oliveira, César (dir.) – História dos Municípios e do Poder
Local. Lisboa: Temas e Debates, 1996.
- 25 -
Cristóvão Mata
concederam espaço à elaboração de capítulos dedicados a esta temática30
e, mais recentemente, no seguimento de um colóquio realizado em
Montemor-o-Novo no ano de 2003, foram publicadas as respectivas
actas que compilam uma série de trabalhos sobre os municípios durante a
Época Moderna31.
Conforme demonstram as monografias e as obras de síntese citadas,
têm sido várias as temáticas trabalhadas: a composição institucional das
câmaras, o seu funcionamento regular e respectivas áreas de intervenção,
as finanças municipais, as eleições dos oficiais concelhios e a configuração
social da governança local. Estes trabalhos têm também revelado os
aspectos comuns e particulares que correspondiam aos concelhos.
Em determinadas questões supõe-se haver um modelo uniforme, mas por
vezes revelam-se excepções que não nos permitem falar na existência de
uma norma; noutros casos, registam-se padrões predominantes aos quais
se opõem determinadas características únicas e originais.
A constituição dos órgão de justiça e governo dos concelhos respondia
a um modelo transversal ao reino. Este suportava-se em determinados
códigos legislativos. O Regimento dos Oficiais dos Cidades, Vilas e
Lugares destes Reinos (1504), as Ordenações Manuelinas (1512-1514),
depois as Ordenações Filipinas (1603), e outra legislação extravagante
que foi sendo produzida no decurso dos séculos regulamentaram os ofícios
camarários nas suas competências e no respectivo modo de eleição.
Na sua generalidade, as câmaras eram presididas por juízes ordinários
(ou, em sua substituição, por um juiz de fora) e compostas por um corpo
de vereadores em número variado, mas por norma três, um procurador
do concelho e, ocasionalmente, um tesoureiro32. No entanto, existiram
algumas excepções dignas de realce, como a Câmara de Coimbra, cuja
Refira-se somente os tomos dedicados à Época Moderna: Mattoso, José
(dir.) – História de Portugal. Volume III: Magalhães, Joaquim Romero (coord.) –
No Alvorecer da Modernidade (1480-1620). Lisboa: Editorial Estampa, 1997 e
Volume IV: Hespanha, António Manuel (coord.) – O Antigo Regime (1620-1807).
Lisboa: Editorial Estampa, 1998.
31
Fonseca, Teresa e Cunha, Mafalda Soares – Os Municípios no Portugal
Moderno (…), op. cit..
32
Monteiro, Nuno Gonçalo – “A sociedade local e os seus protagonistas” in
Oliveira, César (dir.) – História dos municípios (…), op. cit., pp. 31-32.
30
- 26 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
edilidade se compunha de três vereadores eleitos localmente e de um
outro nomeado pela Universidade33.
A governação de Lisboa constituiu um exemplo sui generis pela
completa falta de autonomia face ao poder monárquico durante o Antigo
Regime. Em 1572, D. Sebastião derrogou a autonomia do governo
municipal e substituiu o modelo de oficiais eleitos localmente por um
outro constituído por delegados régios: a presidência da Câmara passou
então a destinar-se a um dos principais fidalgos do reino e os três
vereadores, também mandatados pela Coroa, seriam obrigatoriamente
letrados e desembargadores. Entre 1576 e 1585, cada um dos vereadores
assumiu mensalmente a presidência do Tribunal do Senado da Câmara
Municipal de Lisboa, doravante assim chamado, regressando então
a presidência ao sistema anterior. Também nesse ano, o número de
vereadores ascendeu a quatro. Depois de 1591 a seis, e a partir de 1682 os
vereadores passaram a ser nomeados a título vitalício. Em 1778, o número
de vereadores reduziu-se a quatro, mantendo-se assim até ao Liberalismo.
Excepto as alterações que vigoraram por períodos relativamente curtos,
foi este o modelo organizativo que juntamente com os representantes
da Casa dos Vinte e Quatro assegurou o governo municipal lisboeta34.
A omnipresença das instituições municipais no território português
transformava, pois, o poder concelhio num colaborador indispensável
da Coroa em diversas matérias. Do que decorre que, a respeito das
competências de governo das terras, não houvesse disparidades significativas relativamente ao exercício do poder. Na verdade, as câmaras eram
elementos indispensáveis ao recrutamento militar, nomeadamente pelo
papel que desempenhavam na escolha dos capitães das companhias de
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra (…), op. cit. e “Os vereadores
da Universidade na Câmara de Coimbra: 1640-1777” in Revista Portuguesa de
História. Tomo 26 (1991).
34
Entre 1765 e 1778, o carácter vitalício da nomeação foi substituída por
mandatos trienais, e entre 1717 e 1740, após a divisão do arcebispado lisboeta em
duas dioceses distintas, houve dois senados, o de Lisboa Ocidental e o de Lisboa
Oriental, «ambos presididos por fidalgos, completando o elenco municipal três
vereadores, um procurador da cidade e dois mesteres» – cf. Fernandes, Paulo Jorge
– As faces de Proteu (…), op. cit., pp. 20-36.
33
- 27 -
Cristóvão Mata
ordenança do termo concelhio, assim como também o eram no que tocava
à arrecadação de impostos, desde a sisa à décima35.
A respeito deste último aspecto, foram realizados alguns trabalhos
sobre as finanças locais que reforçam não só a importância dos
municípios nesta matéria, como atestam a sua capacidade de resistir ao
crescente reforço dos poderes centrais que marca a segunda metade do
século XVIII. Para as Caldas da Rainha, já foi escrito que o concelho
soube resistir aos avanços perpetrados pelo consulado pombalino,
em parte, mediante a manutenção de uma autonomia financeira assente
na arrecadação de receitas suficientes para a subsistência da instituição
e para o pagamento dos seus encargos fiscais36.
Mas as incumbências camarárias não se esgotavam no campo
financeiro. Com efeito, os concelhos constituíam a primeira instância
judicial e nesta matéria representaram um outro entrave ao processo de
centralização, ao oporem as práticas jurídicas locais à justiça oficial e
escrita do reino37. Por fim, o papel que desempenhavam na regulamentação
dos mercados locais, na imposição de preços e na fixação de salários, na
concessão de licenças para o exercício de ofícios, bem como as diligências
que envidavam no sentido de se assegurar o abastecimento da comunidade
que governavam38, conferiram aos concelhos importantes prerrogativas
no campo económico que podiam ir contra os desígnios da Coroa39.
Um outro aspecto que tem sido atendido pelo estudo dos municípios é
o da composição social das vereações. A sua relevância justifica-se pela
própria importância que estes homens que assumiram o poder concelhio
detinham no seio desta arquitectura institucional. Pelos efectivos poderes
que detinham localmente a nível político, militar, económico e jurídico,
mas também pelo papel de autênticos mediadores que ocupavam entre as
Monteiro, Nuno Gonçalo – “O espaço político e social local” in Oliveira, César
(dir.) – História dos Municípios e do Poder Local (…), op. cit., pp. 121-123.
36
Rodrigues, Luís Nuno – “Um século de finanças municipais: Caldas da Rainha
(1720-1820)” in Penélope. Fazer e Desfazer a História. Número 7 (1992), pp. 49-69.
37
Hespanha, António Manuel – As Vésperas do Leviathan (…), op. cit.,
pp. 439-455.
38
Monteiro, Nuno Gonçalo – “O espaço político e social local” in Oliveira,
César (dir.) – História dos Municípios e do Poder Local (…), op. cit., pp. 127-130.
39
Soares, Sérgio Cunha – “Aspectos da política municipal pombalina. A Câmara
de Viseu no reinado de D. José” in Revista Portuguesa de História. Tomo 21 (1984),
pp. 21-117.
35
- 28 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
comunidades concelhias e o poder central, constituíram «um dos actores
político-administrativos mais importantes na estrutura social e política
portuguesa anterior ao liberalismo»40. Considerada a natureza do meio
social em que eram recrutados assim como o número bastante reduzido
de indivíduos que compunham o grupo, formaram uma autêntica elite
local, termo que certos autores preferem ao de oligarquia camarária por
considerarem que «este tende a conferir uma identidade social a uma
categoria institucional (a dos vereadores camarários) cuja existência
como grupo social carece de demonstração»41.
O termo oligarquia não nos parece inteiramente desadequado, uma
vez que transmite a imagem de «um governo administrado por poucos»42.
Esta é, na realidade, uma das principais características dos municípios
portugueses: indivíduos que, proporcionalmente aos cargos disponíveis,
formavam as governanças locais com um baixo índice de rotatividade e de
renovação dos titulares dos cargos camarários. Este fenómeno assentava
desde logo nos processos de eleição das vereações. Como José da Silva
Marinho aferiu para Guimarães, entre 1753 e 1834, houve um acentuado
fechamento no processo eleitoral no qual as competências pessoais
pouco ou nada contavam: «les interêts oligarchiques d’une minorité
son veritablement à la base de la corporation des equipes annuelles de
vereadores et malgrée la relative ouverture qui se fait jour au sein du
process eléctoral à entrée dans XIX siécle»43.
Para as restantes municipalidades estudadas é também reconhecido
o carácter oligárquico da governança. Embora haja cambiantes vários,
de acordo com o período e com a região onde se situa o concelho considerado, de um modo geral o número de indivíduos que eram nomeados era bastante inferior ao dos ofícios que se proviam. Para determinados concelhos, a combinação de vários estudos oferece uma
imagem correspondente a períodos mais longos, por vezes descontínuos;
Santos, Rui – “Senhores da terra, senhores da vila (…)”, art. cit., p. 345.
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Elites locais e mobilidade social em Portugal nos
finais do Antigo Regime” in Elites e Poder. Entre o Antigo Regime e o Liberalismo.
Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2012, pp. 43-43.
42
Bluteau, Rafael – Vocabulario Portuguez e Latino. Lisboa: Na oficina de
Pascoal da Sylva, 1720, p. 68.
43
Marinho, José da Silva – Construction d’un gouvernement municipal (…),
op. cit., 264.
40
41
- 29 -
Cristóvão Mata
noutros, a perspectiva corresponde a períodos de duração mais curta,
cujos exemplos nos permitimos apresentar.
Em Évora, por exemplo, durante os anos da monarquia de Habsburgo,
serviram no cargo de vereador cinquenta e dois indivíduos para cento
e oitenta e dois postos disponíveis, dos quais 42,2% desempenharam
uma ou duas vezes e 57,5% em três ou mais ocasiões44. No século
seguinte, os elementos de apenas quatro famílias exerceram 59% dos
cargos correspondentes a setenta e um anos compreendidos entre 1750 e
182045, o que revela não apenas o carácter oligárquico, como também a
natureza familiar dos grupos constituídos. Em Montemor-o-Novo, entre
1777 e 1816 foram nomeados apenas trinta e um indivíduos para trinta
e duas vereações estudadas, perfazendo uma média de 3,1 mandatos
de vereador por cada indivíduo46 e depois, entre esta última data e
1834, dezasseis indivíduos foram eleitos para ocupar quarenta e cinco
postos, decrescendo a média ligeiramente para os 2,81 mandatos por
homem47. A análise das vereações destes dois concelhos em três períodos
distintos, nomeadamente o da União Dinástica, do Pombalismo e das
últimas décadas do Antigo Regime, confirma pois a natureza oligárquica
das câmaras.
No entanto, a sugestão de que o termo não transmite a heterogeneidade social que caracteriza os grupos de poder tem pleno acolhimento da
nossa parte. Consideramos que por elite local se designa mais claramente
um estrato social de reduzidas dimensões cuja predisposição natural para
o lugar que ocupam se deve ao elevado poder económico e à influência
e prestígio de que desfrutam na comunidade em que se inserem – em
suma, ao vasto capital material e social de que se revestem. Também as
próprias restrições conceptuais do termo geram uma designação mais
adequada ao grupo estudado: nem todos os que dispunham daquelas
características se inseriam na elite local48.
Pardal, Rute – As elites de Évora (…), op. cit., pp. 54.
Fonseca, Teresa – Absolutismo e Municipalismo (…), op. cit., p. 168.
46
Fonseca, Teresa – Relações de poder no Antigo Regime (…), op. cit., pp. 41-42.
47
Fernandes, Paulo Jorge da Silva – Elites e finanças municipais em Montemor-o-Novo (…), op. cit., p. 45.
48
Molina Puche, Sebastián – “Elite local: análisis de un concepto a través de
las familias de poder del corregimiento de Villena-Chinchilla en el siglo XVII” in
Estudis. Volume 31 (2005), pp. 197-222.
44
45
- 30 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Com efeito, a sociologia do poder municipal «varia muitas vezes de
município para município, resultando esta diversidade de muitos factores,
dos quais se podem destacar a dimensão do concelho, quer em termos
espaciais, quer em termos populacionais, a dinâmica económica e o
próprio contexto regional em que se insere»49. Mesmo no âmbito regional,
as diferenças na composição social das vereações de vários concelhos
eram uma realidade. No século XVIII, os seis municípios que política
e administrativamente cobriam a ilha de São Miguel distinguiam-se
entre si e as nobrezas que assumiram os respectivos governos ocupavam
lugares diferentes numa hierarquia nobiliárquica regional: no topo,
a nobreza de Ponta Delgada, depois, as de Vila Franca do Campo e Ribeira
Grande, seguindo-se as de Lagoa, Água de Pau e, por fim, a do Nordeste.
Além disso, «não apenas foram detectadas diferenças de status, de honra
e de riqueza de câmara para câmara, mas também no interior de cada
grupo de poder local»50.
A própria heterogeneidade social que verticalmente distinguia os
diferentes ofícios camarários da cidade de Ponta Delgada era já um
facto no século XVII: «entre um cavaleiro fidalgo da Casa Real que
seja simultaneamente cavaleiro da Ordem de Cristo e sirva na câmara
três ou quatro vezes e alguém que apenas uma vez, em toda a sua vida,
integra o senado e como procurador do concelho, existia um fosso»51.
Ainda assim, conforme o concelho, podia haver excepções. Na Câmara
de Lagos da segunda metade do século XVIII vigorou, de facto,
uma segregação social entre vereadores e procuradores do concelho,
os primeiros identificados como nobres, os segundos associados ao braço
popular52. Mas no Vimieiro, durante sensivelmente o mesmo período,
verificou-se uma certa comunicação entre os vários ofícios da governança,
havendo indivíduos a ser nomeados juiz ordinário, vereador e procurador
do concelho53, o que certamente decorreria do facto de ser um concelho
Fernandes, Paulo Jorge da Silva – “Elites locais e poder municipal. Do Antigo
Regime ao liberalismo” in Análise Social. Volume XLI (2006), p. 58.
50
Rodrigues, José Damião – São Miguel no século XVIII (…), op. cit., Volume
1, pp. 358-439.
51
Rodrigues, José Damião – Poder municipal e oligarquias urbanas (…),
op. cit., p. 86.
52
Paula, Glória de Santana – Lagos (1745-1792) (…), op. cit., pp. 115-123.
53
Fonseca, Teresa – Administração senhorial e relações de poder (…), op. cit.,
p. 35.
49
- 31 -
Cristóvão Mata
de pequenas dimensões. Como já foi referido para os pequenos concelhos
do Minho, os cargos da governança não eram apetecidos pelos mais
poderosos, que invocavam privilégios e se eximiam ao seu exercício,
sendo antes nomeados gente de condição social inferior: «lavradores e
proprietários»54. Na verdade, as fontes utilizadas no estudo anteriormente
citado não referem a nobreza dos oficiais, antes transmitem a imagem
de um grupo no qual predominaram os lavradores e, em número
mais reduzido, marcaram presença dois bacharéis como vereadores,
um cirurgião nos três cargos e um ferreiro como procurador do concelho55.
São estes aspectos que têm constituído as principais linhas de
investigação dos trabalhos sobre o poder municipal e os concelhos
portugueses do Antigo Regime português e que, de um modo mais ou
menos aprofundado, integram o presente livro. Na senda das tendências
acima apontadas, foi logo de início estabelecido como objecto de
estudo o concelho de Penela e o seu funcionamento entre a Restauração
da Independência e o definitivo estabelecimento do Liberalismo em
Portugal. O que se escreve nas páginas seguintes é, portanto, um estudo
do poder municipal que pretende avaliar as persistências e as mudanças
da sua estrutura institucional mas também social.
54
55
p. 35.
Capela, José Viriato – O Minho e os seus municípios (…), op. cit., p. 146.
Fonseca, Teresa – Administração senhorial e relações de poder (…), op. cit.,
- 32 -
– II –
Território e poderes
Território pode ser apercebido como uma circunscrição mais ou
menos demarcada de um determinado espaço físico e pode, pelos
traços que o caracterizam, distinguir-se dos que se situam para além
dos seus limites. É um conceito associado à disciplina geográfica e,
nesta qualidade, «constitui um local de confronto pela sua apropriação,
interpretação e utilização por parte dos actores sociais». É inseparável
do elemento social e constitui, por isso, a par do elemento temporal,
um factor indissociável do devir histórico. Assim, território é simultaneamente um factor geográfico e sociológico: «um lugar […] não é apenas
um contentor ou ‘ponto no espaço’, mas representa o local de encontro
que providencia aos actores sociais diversos contextos de transacção e
modos de (con)vivência»1.
As relações sociais entre os homens podem assumir diversas feições,
mas uma tem vigorado desde a complexificação das sociedades humanas:
o domínio, a autoridade, o poder. Território pode ser, portanto, o local
onde que se desenrolam estas relações verticais entre indivíduos, grupos
e classes sociais, e assim «é sem dúvida uma noção geográfica, mas é
antes de tudo uma noção jurídico-política: aquilo que é controlado por
um certo tipo de poder»2. Ao poder corresponde, naturalmente, além
da legitimidade de que carece para o bom exercício, uma determinada
Silva, Manuel Carlos – “Espaço e Sociedade: alguns elementos de reflexão”
in Balsa, Casimiro (org.) – Relações Sociais de Espaço – Homenagem a Jean Remy.
Lisboa: Edições Colibri, 2006, pp. 187-188.
2
Foucault, Michel – Microfísica do poder. São Paulo: Graal, 2008, p. 157.
1
- 33 -
Cristóvão Mata
estrutura que se compõe de instituições próprias, de conjuntos de códigos
e de normas mais ou menos formais, e de sujeitos detentores de poder
político cuja actuação pode ser mais ou menos voluntarista. Ao espaço
do reino de Portugal correspondia um determinado tipo de autoridade
institucionalizada, uma monarquia que, longe de encerrar em si todo o
poder, partilhava-o com outras entidades, como é o caso dos concelhos,
entidades políticas a que correspondia um espaço territorial.
É desta relação entre poderes e território que resultam as seguintes
considerações. «Fazer a história da divisão político-administrativa é fazer
a história das relações entre o poder e o espaço. E é também assumir,
desde o início, que, tanto o poder como o espaço, são realidades que têm
uma história»3. Assim o cremos, pois o que aqui se vai concretizando
nestas páginas é o estudo de uma circunscrição político-administrativa,
cuja história se compõe não apenas do elemento geográfico, ou da noção
subjectiva de poder, mas das duas. Importa, por isso, fazer não apenas
a análise isolada de uma ou de outra das «realidades que têm uma
história», mas também observar a dialéctica espaço-poder: o elemento
que determina que o território seja não apenas uma noção geográfica
mas sim o campo onde habitam sujeitos que estão submetidos a
«um certo tipo de poder».
1. A criação de uma rede concelhia iniciou-se antes da própria
fundação de Portugal enquanto reino independente. Este processo
arrancou no século IX, quando se foi desenvolvendo a criação de unidades administrativas que conseguissem actuar localmente sobre as áreas
jurídica e económica, embora somente a partir do século XI estas tenham
adquirido um estatuto oficial4. A outorga ou, em certos casos, o mero
reconhecimento do estatuto autárquico de uma povoação dependiam
de um documento que o validasse, o foral. De acordo com Marcello
Caetano, os forais não podem ser definidos como um todo, embora sejam
compostos por características que lhes são gerais. São um «acto escrito
outorgado unilateralmente pelo rei ou entidade senhorial», um pacto
entre as duas partes, cujo objectivo pretende «conceder, perpetuamente,
a uma colectividade o domínio de uma área que irá povoar e cultivar»,
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 85.
Coelho, Maria Helena da Cruz e Magalhães, Joaquim Romero – O poder
concelhio (…), op. cit., pp. 17.
3
4
- 34 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
no qual ficavam determinadas as obrigações desta para com o outorgante,
de que resultava uma «comunhão de interesses dessa colectividade» e a
criação de um conselho de magistrados responsável pela gestão da vida
em comunidade5.
A questão do primeiro foral de Penela é algo complicada. Não apenas
por haver diversas versões do documento, mas também por alguns autores
contrariarem o que a documentação disponível indicia. Delfim José
de Oliveira, que em 1884 publicou uma monografia sobre a vila
e concelho de Penela6, e o autor da obra que lhe serviu de fonte,
Augusto de Pinho Leal7, referem a existência de um foral redigido em
data incerta, mas admitem a possibilidade de ter sido doado em 1131.
Também o padre António Carvalho da Costa afirma na sua Corografia
Portuguesa ter D. Afonso Henriques conquistado Penela em 1148 e
ordenado o seu povoamento sete anos depois, concedendo-lhe então
«grandes fóros, & privilegios»8.
Os três autores assumem a fundação do concelho de Penela em datas
relativamente próximas a 1137, que é a data do foral que se conhece9,
Coelho, Maria Helena da Cruz e Magalhães, Joaquim Romero – O poder
concelhio (…), op. cit., p. 18, nota 10.
6
Oliveira, Delfim José – Noticias de Penela (…), op. cit., p. 19.
7
Leal, Augusto Soares de Azevedo Barbosa de Pinho – Portugal Antigo e
Moderno. Volume VI. Lisboa: Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, 1975,
p. 611.
8
Costa, António Carvalho da – Corografia Portugueza, e descripçam topografica do famoso Reyno de Portugal, com as noticias das fundaçoens das Cidades
Villas, & Lugares, que contèm; Varoens illustres, Genealogias das Familias nobres,
fundaçoens de Conventos, Catalogos dos Bispos, antiguidades, maravilhas da
natureza, edificios, & outras curiosas observaçoens. Tomo II. Lisboa: Na Officina
de Valentim da Costa Deslandes, 1708, p. 94.
9
Do foral afonsino conhecem-se várias versões, embora nenhuma original.
A confirmação de D. Afonso II contém uma cópia do documento e está localizada
em Arquivo Nacional Torre do Tombo (ANTT) – Registo da Chancelaria de
D. Afonso II, Livro 1, fl. 3; em Feitos da Coroa, Núcleo Antigo 411; e em Livro
de Forais Velhos, fls. 22-23. Uma outra cópia do documento original é citada pelo
tombo do infante D. Pedro realizado em 1420 (ANTT – Forais Antigos. Maço 3,
n.º 1, fls. 1-21v). Encontra-se publicada em Herculano, Alexandre – Portugal
Monumenta Historica. Leges et consuetudines. Volume 1, fasc. 3, p. 374-374,
em Arnaut, Salvador Dias – “O infante D. Pedro, senhor de Penela” in Biblos. LXIX
(1993), pp. 187-213 e, do mesmo autor, Ladeia e Ladera: subsídios para o estudo
do feito de Ourique. Coimbra: s/n, 1939, pp. LXX- LXXIII.
5
- 35 -
Cristóvão Mata
mas no entanto não oferecem uma argumentação credível para esta
suposição que nos parece inválida. Em primeiro lugar, porque autores
como Alexandre Herculano e Salvador Dias Arnaut ignoraram a hipotética
existência de um foral anterior ou posterior a 1137 e tiveram por certa
a outorga do estatuto municipal neste ano. Mas, acima de tudo, porque
Delfim de Oliveira, Pinho Leal e Carvalho da Costa, não apresentam
quaisquer referências à localização física dos documentos supostamente
lavrados em 1131 e em 1155.
Têm sido várias as sugestões de autores que procuram encontrar na
formação dos municípios ibéricos uma causa que a justifique. Para o
emérito historiador português Alexandre Herculano, a raiz desta forma
de autogoverno comunitário entroncava-se na própria Antiguidade
Clássica e teve por modelo o município romano, que seria reproduzido
e trazido até ao fim da Alta Idade Média pelas comunidades moçárabes.
Tomas Muñoz e Romero, por seu turno, replicou que a sua origem era
a cultura germânica. A esta tese acrescentou Eduardo de Hinojosa y
Naveros que os municípios haviam derivado para a Península Ibérica
pela mão dos visigodos. O conjunto destas teorias, e de outras que aqui
não se apresentam10, forma uma problemática bastante interessante,
mas infelizmente estranha ao foro do presente estudo.
Remetem, como se vê, à própria origem do sistema concelhio
português, mas também à sua natureza. Sobre este tema específico,
existe uma teoria que constrói um enquadramento conjuntural passível
de se aplicar ao caso penelense. Claudio Sánchez-Albornoz relacionou
a autonomia política e administrativa adquirida pelas comunidades
territoriais do período compreendido entre os séculos IX e XI, com as
necessidades bélicas resultantes da Reconquista11. Não pretendemos com
a invocação desta tese advogar que a guerra foi o único e principal motor
da criação das unidades concelhias, mas antes sugerir que a outorga do
estatuto concelhio à comunidade penelense ocorreu num contexto preciso,
o da Reconquista. Até porque os concelhos são organismos que surgiram
«em função do próprio condicionalismo da Reconquista, resultando de
Uma apresentação sumária destas e de outras ideias encontra-se arrolada em
Mattoso, José – “Da comunidade primitiva ao município. O exemplo de Alfaiates”
in Obras Completas. Volume 6. Rio de Mouro: Círculo de Leitores, 2001, pp. 28-30.
11
Mattoso, José – “Da comunidade primitiva ao município (…)”, art. cit., p. 30,
10
- 36 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
factores de ordem económica, social, política e até militar»12 – isto é,
de uma panóplia de vários factores e não da força exclusiva de um deles.
Mas a implausibilidade de se afirmar que os concelhos tenham constituído
comunidades unicamente orientadas para a guerra não invalida o argumento de que «as circunstâncias históricas tenham contribuído para
que a guerra fosse uma realidade com que os concelhos se tiveram de
defrontar com frequência»13.
O conteúdo do diploma outorgado por D. Afonso Henriques a Penela
em 1137 confirma-o. O facto de tanto o povoado como o castelo de
Penela serem anteriores ao efectivo reconhecimento do estatuto municipal
sugere que a comunidade aí estabelecida, e aparentemente organizada
em redor da fortificação, desempenhava funções militares14. A concessão
do estatuto municipal visou a partir de vários prismas o aspecto militar,
que apesar de tudo não constitui um tema exaustivamente tratado.
O documento tratou de entregar à comunidade já estabelecida um
território: «homines de Penela cunctisque ibi habitaverit dono atque
concedo vobis meum castellum cum suis termini cum montibus et
sontibus terris et pascuis ruptis et nom ruptis». Todavia, não especifica
por de mais quais os serviços militares devidos pelos habitantes ao rei,
embora às palavras inscritas subjaza a ideia de que aos mesmos cabia a
defesa do território. O serviço militar que pelos moradores era devido a
D. Afonso Henriques resumia-se, em consonância com as obrigações que
acreditamos estarem implícitas no documento, ao serviço nas atalaias
e à vigia dos muros: «de illa atalaia rex mediam et habitatores aliam
mediam. De vigilia de muro rex mediam et habitatores aliam mediam»15.
Não obstante, as obrigações da comunidade local não se encerravam
aqui. Para além destes aspectos, os habitantes estavam obrigados a
contribuir com o fornecimento de víveres para a realização de fossados.
O foral também dá conta, se não do surgimento, pelo menos da confirmação oficial da existência de gente privilegiada em função do serviço
Soares, Torcato de Sousa – “Concelho” in Serrão, Joel – Dicionário de História
de Portugal. Volume 2. Porto: Livraria Figueirinhas, 2002, p. 137.
13
Reis, António Matos – “Os municípios medievais perante a guerra” in Actas
das VI Jornadas Luso-Espanholas de Estudos Medievais: A Sociedade e a Guerra.
Volume 2. Coimbra: Sociedade Portuguesa de Estudos Medievais, 2009, p. 359.
14
ANTT – Registo da Chancelaria de D. Afonso II, fl. 3.
15
ANTT – Registo da Chancelaria de D. Afonso II, fl. 3.
12
- 37 -
Cristóvão Mata
militar: os infanções, por exemplo, estavam isentos de pagar portagem
e aos cavaleiros que caíssem em estado de pobreza escusava-se o
pagamento da jugada, assim como às suas viúvas16.
A limitada dimensão do conjunto das determinações relativas às
funções militares da comunidade não invalida o argumento de que
a guerra era uma constante, e por isso uma realidade com a qual os
habitantes se deparavam quotidianamente. Muitos aspectos consignados
pelo foral à comunidade justificam-se mais no sentido de cativar
gentes e de promover o estabelecimento das mesmas na povoação e,
deste modo, reforçar a capacidade defensiva do território correspondente. Muito do que acima se disse vai, aliás, ao encontro do que outros
autores escreveram:
«a concessão de cartas de foral podia servir este duplo objectivo
– nas terras de fronteira privilegiava-se amplamente a cavalaria
vilã, acentuando a feição aristocrática e militar do lugar; noutras
vilas sancionava-se um governo próprio local e regulamentavam-se os direitos e deveres dos vizinhos para aí atrair, com tais
liberdades, novos povoadores»17.
Sobre o governo local e autárquico faz-se muito poucas referências
e, assim, o que sobressai é a «feição aristocrática e militar», bem como
a intenção de atrair e fixar moradores em torno do castelo, o que se
justifica pelo facto de, no século XII, a fronteira meridional do condado
Portucalense (e depois do reino de Portugal) se situar imediatamente a
sul da cidade de Coimbra.
A instituição do poder municipal acarreta desde logo o estabelecimento
dos limites de um território dentro do qual se exercerá a jurisdição que
lhe corresponde. Implica também uma dicotomia entre a oficialidade do
centro decisório e espaço de governação – uma correlação resultante do
exercício de poder municipal que distingue, por um lado, a localização
oficial das instituições de governação e, por outro, o espaço envolvente
que lhe estava sujeito. O pólo de onde emanava o poder encontra-se
também definido no foral.
ANTT – Registo da Chancelaria de D. Afonso II, fl. 3.
Coelho, Maria Helena da Cruz e Magalhães, Joaquim Romero – O poder
concelhio (…), op. cit., p. 19.
16
17
- 38 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Oficialmente, o centro de tomada de decisão localizou-se sempre na
vila de Penela. Todavia, teve em determinadas ocasiões de concorrer
com as aspirações da população do Espinhal. Os actos de governação,
como as reuniões camarárias, sucediam-se norma geral na casa da
Câmara, mas por vezes, e não foram tão raras quanto isso, as reuniões
tomavam lugar nas casas de residência dos juízes (ordinários ou de fora),
dos vereadores, ou até do procurador do concelho ou do escrivão da
Câmara, o que implicava uma deslocalização oficiosa da sede para onde
quer que os titulares destes cargos residissem. A partir do século XVIII
este dado torna-se mais evidente, pois, como veremos, neste século
iniciou-se a emergência da nobreza residente no Espinhal e, assim,
a deslocação oficiosa da capacidade decisória da vila de Penela para
o Espinhal.
Em 1814 a concorrência entre as nobrezas de Penela e do Espinhal
resultou em efectivas diligências destinadas à fixação simbólica da
sede de concelho no lugar do Espinhal. A 15 de Fevereiro desse ano foi
apresentada em Câmara pelo juiz de fora uma resposta da corregedoria
de Coimbra ao requerimento elaborado pela nobreza e povo do Espinhal
para que o local de residência do vereador que haveria de assumir as
funções de juiz de fora por sua ausência fosse o Espinhal. Foram presentes
as nobrezas e os povos do Espinhal e de Penela e, por mais votos, ficou
determinado que na ausência do juiz de fora o vereador que o substituísse
fosse imediatamente informado pelo escrivão e se deslocasse a Penela
para aí se fixar18.
A população do Espinhal não se resignou e foi mais além. A 25 de
Abril desse ano, chegou outro requerimento à Câmara, desta vez pretendendo que o próprio juiz de fora residisse no Espinhal, que sendo sujeita
a votação resultou num empate que não permitiu nenhuma tomada
de decisão19. Três meses depois, a provedoria de Coimbra informou
da existência de um novo requerimento com o mesmo objectivo, que
todavia foi rejeitado por convir que o juiz de fora assentasse residência
em Penela, um lugar mais central onde passava uma estrada real e militar
Centro de Estudos de História Local Salvador Dias Arnaut (CEHLRSDA)
– Vereação de 15 de Fevereiro de 1814 in Livro de Actas de Sessões da Câmara
(1813-1818), fls. 17-23.
19
CEHLRSDA – Vereação de 25 de Abril de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fls. 34v-44.
18
- 39 -
Cristóvão Mata
pela qual transitavam tropas e passageiros, aonde concorriam todos os
povos do termo e mais próximo de Serpins e da Lousã, vilas sobre as
quais a judicatura também detinha jurisdição20.
O território circundante que estava sujeito à jurisdição municipal da
Câmara de Penela, o termo, encontrou-se definido também desde início.
Este aspecto estava presente na carta de foral, na qual se definiram os
limites do território correspondente ao concelho:
«Cuius vero isti sunt termini. De illa cabeza de Mata Furata et
ferit in Dueza et vadit ad illa cabezam de Albarriol et fert in illa
taliada et vadit per illum lombum rasum et fert in illa via antiqua
de serra et quo modo currit aqua ad illum flumen de Alsie et fert
in directum ad ipsum portum de lagenas et pergit a cabezam de
Ovelia et descendit per illa vallem de Pito et vadit ad Figeiroa et
intrat en illa aqua de Ladeia usque in illo Ulmar et fert in cabeza
da Mata Furada»21.
A descrição dos limites do termo torna-se complicada de entender
devido a estar escrita em latim22, mas também porque muitos dos nomes
dos lugares ali referidos são actualmente desconhecidos. Felizmente,
o autor de uma monografia sobre Penela, publicada em 1910, fez uma
adaptação daquela caracterização do território à toponímia do tempo
em que a obra foi dada ao prelo, tornando possível a identificação de
alguns locais.
A norte, o termo do concelho ficava-se por uma linha que ia desde
Albarrol até um caminho da serra de São João. No topo desta serra
iniciava-se a fronteira oriental que, passando pela ribeira de Campelo
e pelo rio Alge, terminava em São Simão. Era daqui que partia a linha
que a sul delimitava o termo concelhio: passava por Chão de Couce e
CEHLRSDA – Vereação de 22 de Julho de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fls. 62-64.
21
ANTT – Registo da Chancelaria de D. Afonso II, fl. 3.
22
Na versão do documento inserida no diploma pedrista: «daquela cabeça da
Mata Furada e fere em a Dueça e vay aaquela cabeça d’Albarrol e fere em a talhada
e vay per aquelle lonbo raso e fere em aquella carreura antiga da serra como corre a
auga daquele rio dalia e fere em direito em esse meesmo Porto das Lageas e se vay
aa Cabeça d’Ouvelha e descende per aquelle Vale do Pito e vem aa Figeira e entra
naquella auga da Ladea ata aquele ulmar e fere aquela cabeça da Mata Furada» –
cf. Arnaut, Salvador Dias – “O infante D. Pedro (…)”, art. cit..
20
- 40 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
pela Serra do Mouro e encerrava-se em Cabeça de Ovelha (que o autor
considera ser provável que corresponda ao local que se chama Cabeças,
perto das Taliscas). Finalmente, a oeste, o concelho terminava numa linha
estendida entre Cabeça de Ovelha e Albarrol e sobre o Vale do Pito, o
Vale da Figueira (Lagarteira) e a costa ocidental do monte da Ateanha23.
As extremas do concelho aparentam não ter uma definição concreta
e a mera referência às linhas que atravessam determinados espaços
relativamente vastos é por de mais vaga. Portanto, propícia a litígios sobre
o território: a 13 de Abril de 1644, o procurador do concelho de Penela
relatava à Câmara os avanços tomados indevidamente pelo concelho
de Podentes no lugar do Melhorado, sugerindo que se reunissem com
os oficiais da Câmara vizinha de modo a distinguirem a divisão dos
respectivos termos24. Mais de cem anos depois foi a vez da Câmara de
Podentes enviar uma carta à de Penela pedindo que se reunissem no
Melhorado para se levantarem os marcos que dividiam os dois termos25.
Curiosamente, estes dois casos, ambos referentes ao mesmo local, são as
únicas referências a contendas territoriais registadas em actas.
De acordo com a descrição dos limites do território, o termo concelhio
não era integrado pelas regiões a que actualmente correspondem as
freguesias do Rabaçal e de Podentes. O Rabaçal havia recebido foral
entre 1140 (ou 1142) e 1146, e a sua origem e natureza, à semelhança
do que se já disse para Penela, associava-se à fortificação aí já existente,
o castelo do Germanelo26. Viria posteriormente a receber um outro da
mão de D. Manuel I, em 151427. Da existência de um foral que tenha
Jarnaut – Monografia do Município Penelense (…), op. cit., pp. 100-101.
CEHLRSDA – Vereação de 13 de Abril de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fl. 37v. Somente no fim do ano a Câmara terá envidado
esforços no sentido de resolver a situação, quando combinaram os vereadores e
procurador ir ver a tomadia feita no Melhorado e convocaram os homólogos de
Podentes para resolverem a situação – cf. Vereação de 17 de Dezembro de 1644 in
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1644-1645),fls. 102v-105.
25
CEHLRSDA – Vereação de 30 de Julho de 1757 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fl. 168.
26
Jarnaut – Monografia do Município Penelense (…), op. cit., pp. 102-105.
Salvador Dias Arnaut situa-o entre 1142 e 1146 – Cf., do autor, Ladeia e Ladera.
(…), op. cit., p. 6.
27
ANTT – Livro dos Forais Novos da Estremadura, fls. 72v-73v. Sobre o
concelho do Rabaçal, ANTT – Dicionário Geográfico de Portugal. Volume 31,
pp. 9-12.
23
24
- 41 -
Cristóvão Mata
concedido a Podentes a sua autonomia municipal não podemos dar fé
mas, com base nos episódios atrás relatados, nas Memórias Paroquiais
de 175828 e pelo facto de D. Manuel lhe ter concedido foral29, sabemos
que também constituía um concelho separado do de Penela.
Ao longo da História, Penela conheceu outros documentos foralengos.
Os já referidos autores Augusto de Pinho Leal e Delfim José Leão
mencionam um documento lavrado na cidade de Coimbra a 6 de Abril
de 119830. À semelhança do caso atrás discutido, a localização física
deste diploma também não é apresentada, e por conseguinte a assunção
dos autores suscita-nos algumas dúvidas relativamente à sua existência,
embora seja admissível considerar que se tratasse de uma confirmação
de D. Sancho I ao foral outorgado pelo pai.
Certa foi a confirmação de D. Afonso II. Em 1217, este monarca
ratificou todos os foros outorgados pelo seu avô no foral de 1137.
O facto de confirmar este foral e não outro, o suposto de 1131 ou o de
1158, reforça a ideia de que foi efectivamente em 1137 que Penela adquiriu o reconhecimento oficial do seu estatuto municipal. Depois deste
diploma não conhecemos outra confirmação para além de uma datada de
21 de Agosto de 1385, pela qual D. João I assegurava a continuidade de
todos os foros, privilégios, liberdades e bons costumes usufruídos pelos
homens bons e concelho de Penela31.
Ainda na Idade Média, o concelho conheceu novo diploma. Salvador
Dias Arnaut transcreveu-o e publicou-o, considerando que o documento
«em tudo toca, sobre tudo estatui, ora aproveitando ainda um ou outro
ponto do foral, ora (e é quase tudo) apresentando matéria nova».
Considerou-o, por isso, «um novo estatuto municipal de Penela» que
aproveita do primeiro foral «tudo o que ainda pode servir»32. Não se trata
de uma carta de foral propriamente dita, mas de um tombo ordenado
pelo Infante D. Pedro em 1420, cuja elaboração tinha por objectivo dar
a saber ao dito senhor de
ANTT – Dicionário Geográfico (…), op. cit., Volume 42, p. 155.
ANTT – Livro dos Forais Novos da Estremadura, fls. 114-115.
30
Leal, Augusto Soares de Azevedo Barbosa de Pinho – Portugal Antigo
(…), op. cit., Volume VI, p. 611; Oliveira, Delfim José – Noticias de Penela (…),
op. cit., p. 19.
31
Dias, João José Alves – Chancelarias Portuguesas: D. João I. Volume II,
Tomo 1. Lisboa: Centro de Estudos Históricos, 2006, p. 281.
32
Arnaut, Salvador Dias – “O infante D. Pedro (…)”, art. cit., pp. 177 e 179.
28
29
- 42 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
«todos os foros e bens rendas posyssooes que em ella e seu
termho ey e de direito devo daver assy per foraes como per posse
de que os senhores que della foram senpre steveram em posse e
ora eu stou e os meus regeengos e terras per onde partem e com
quaaes confrontaçooes»33.
Em 1514, a vila conheceu o seu derradeiro diploma34. Ao longo da
Idade Média, a institucionalização de um poder político autónomo por
todo o território português foi uma constante e representou uma das
heranças políticas mais relevantes do período. Para o desenrolar deste
processo foi indispensável a actuação da Coroa, bem como a legislação
régia. A intensificação do processo legislador a partir do século XIV
e a elaboração das Ordenações Afonsinas na centúria seguinte não só
contribuíram para a formação de um modelo municipal como também
conseguiram impô-lo a todo o reino. Mas foi sobretudo a elaboração
do Regimento dos Oficiais das Cidades, Vilas e Lugares destes Reinos
(1504) e das Ordenações Manuelinas (1512-1514) e a reforma dos forais
(1497-1520) que fizeram com que o mesmo se mantivesse válido até ao
final do Antigo Regime português35.
Quanto aos forais manuelinos,
«tendo sido elaborados num tempo em que o poder central fazia
um esforço no sentido da uniformização do ordenamento jurídico
que estruturava a vida administrativa e judicial do território
português, perderam esse cariz de “estatuto político-concelhio”
locais para se transformarem no título legitimador da cobrança
de direitos reais, muitos deles em posse de donatários, tendo
funcionado, por este motivo, como principal suporte do regime
senhorial em Portugal»36.
C. o tombo citado em Arnaut, Salvador Dias – “O infante D. Pedro (…)”,
art. cit..
34
ANTT – Livro dos Forais Novos da Estremadura, fls. 98-101.
35
Monteiro, Nuno Gonçalo – “A sociedade local e os seus protagonistas” in
Oliveira, César (dir.) – História dos Municípios e do Poder Local (…), op. cit.,
pp. 30-31.
36
Neto, Margarida Sobral – O Universo da Comunidade Rural – Época Moderna.
Coimbra: Palimage, 2010, p. 72.
33
- 43 -
Cristóvão Mata
Aparentemente podiam ter sido aquilo que Alexis de Tocqueville
escreveu sobre as instituições e legislação do Antigo Regime francês:
«Leis sábias para uso de uma sociedade semi-rude» 37. Contudo
não o foram. Revelaram-se desadequados, tendo até impedido o
desenvolvimento agrícola, não obstante terem perdurado por mais de
trezentos anos sob a forma de instrumento de legitimação da tributação
que incidia no território concelhio38.
2. Falar de territórios e de poder político a nível local evoca naturalmente a existência de instituições municipais no espaço físico correspondente, a sua actuação e as dinâmicas do exercício do poder político
associado. Todavia, é um discurso insuficiente se ignorar a participação de
outras entidades no exercício das jurisdições. A concepção da sociedade
de corpos pressupunha, pois, a correspondência de uma sociedade política
semelhante, no seio da qual o poder central não detinha o monopólio do
poder político; antes o partilhava com as partes constituintes da arquitectura social pretendendo a manutenção do equilíbrio e da harmonia
entre os corpos que, a par dos concelhos, coexistiam em todo o território:
os senhorios. São pois as ramificações institucionais e jurisdicionais destas
estruturas que se entrecruzam e se sobrepõem ao território concelhio.
O Portugal de Antigo Regime constituía, ao nível da relação entre
território e instituições políticas, uma especificidade que resultava do
próprio processo histórico. A inexistência de comunidades provinciais e a
elevação ao trono da única casa senhorial com um senhorio jurisdicional
bastante vasto impediram a constituição de unidades regionais dotadas de
estruturas administrativas e institucionais próprias e garantiram que, após
a Restauração, nunca tivessem existido entidades com expressão territorial
– «Portugal era um reino onde a dicotomia entre a Corte e as províncias
constituía uma realidade inquestionável». Mas, neste espaço existente
entre o centro e a periferia, entre a Coroa e os concelhos, localizavam-se
«corpos intermédios», embora desprovidos de uma feição territorial39.
Tocqueville, Alexis de – O Antigo Regime (…), op. cit., p. 31.
Neto, Margarida Sobral – O Universo da Comunidade Rural (…), op. cit.,
pp. 75-76.
39
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Monarquia, Poderes Locais e Corpos Intermédios
no Portugal Moderno (Século XVII e XVIII)” in Elites e Poder (…), op. cit.,
pp. 19-36.
37
38
- 44 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Durante o Antigo Regime, a noção de província reportava-se a uma
repartição geográfica que tinha em vista um melhor ordenamento do
território e não tanto a constituição de um espaço sujeito a determinada
estrutura administrativa. Perduraram até ao século XIX «como formas
de descrever o território, de organizar o expediente de repartições da
administração central (Desembargo do Paço) ou de circunscrições
militares […]. Mas nunca lhes corresponderam instituições próprias»40.
Em 1758, como referem as Memórias Paroquiais, a província em que se
inseria o concelho de Penela era a da Estremadura41.
Foi no entanto destas repartições geográficas destituídas de um carácter
político-institucional que surgiram as estruturas de controlo por parte do
poder régio. Até ao século XVI as províncias corresponderam a comarcas,
ou corregedorias, que é a denominação atribuída ao território sobre o qual
os corregedores exerciam a sua jurisdição. Este cargo foi até ao reinado
de D. Afonso IV um ofício de carácter extraordinário. A partir de então,
a magistratura adquiriu um carácter regular em função da necessidade
de tutelar os assuntos locais. Neste processo de desenvolvimento das
corregedorias, as comarcas foram-se multiplicando: em 1516 passaram
de seis a catorze, em 1536 ascenderam às vinte e oito, e nos séculos que
se seguiram ocorreram semelhantes divisões42.
Com as comarcas régias competiram as ouvidorias, cujos oficiais
detinham as mesmas prerrogativas jurisdicionais, embora fossem
nomeados pelas entidades senhoriais. Até ao século XVI, Penela inseriuse na província e, por isso, na comarca da Estremadura. Com as reformas
administrativas desenvolvidas por D. Manuel I e D. João III a questão
complexifica-se. A corregedoria (comarca régia) a que pertencia era a
de Tomar, cuja data de fundação não se conhece com precisão43, e a
ela estava anexada ainda em 175844. Mas o exercício da jurisdição do
Monteiro, Nuno Gonçalo – “O central, o local e o inexistente regional”
in Oliveira, César (dir.) – História dos Municípios e do Poder Local (…), op. cit.,
p. 117.
41
ANTT – Dicionário Geográfico de Portugal. Volume 28, p. 777.
42
Hespanha, António Manuel – História das Instituições (…), op. cit. e Dias,
João José Alves – Gentes e Espaços (em torno da população portuguesa na primeira
metade do século XVI). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian/Junta Nacional de
Investigação Científica e Tecnológica, 1996, p. 199.
43
Dias, João José Alves – Gente e Espaços (…), op. cit., p. 229.
44
ANTT – Dicionário Geográfico (…), op. cit., Volume 28, p. 777.
40
- 45 -
Cristóvão Mata
corregedor não foi activo. Em Montemor-o-Velho sediava-se a ouvidoria
dos donatários de Penela, os duques de Aveiro, criada em meados do
século XVI45. Como à frente se verá, foi este oficial que supervisionou
e tutelou os assuntos locais.
Em 1774 a comarca a que pertence é a de Coimbra46. A transferência
para esta circunscrição antecedeu a própria Lei da reforma das comarcas
de 1790 que, tendo a intenção de reformar inteiramente o sistema
institucional, uniformizou a justiça régia e a administração do território,
aboliu as ouvidorias e o privilégio de isenção de correição régia47.
Esta antecipação deveu-se sem dúvida à extinção da Casa de Aveiro,
em 1759, cujos efeitos levaram à transferência de Penela da ouvidoria
de Montemor-o-Velho para a comarca de Coimbra, sem que a de Tomar
tivesse algum relevo no processo48. Esta mudança foi acompanhada por
uma outra – Tomar era também a sede de provedoria e, nesta ocasião,
Penela passou da sua provedoria para a de Coimbra.
As atribuições de um e de outro oficial encontravam-se previstas nas
Ordenações. No século XVII, os corregedores possuíam já um carácter
ordinário e exerciam a sua jurisdição sobre um território específico.
Competia-lhes inquirir os oficiais locais, defender a jurisdição local e a
ordem pública e, talvez mais importante, tutelar o governo dos concelhos
45
p. 40.
Soares, Sérgio Cunha – “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã (…)”, art. cit.,
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Penela. Maço 1041,
Caixa 1140.
47
Silva, Ana Cristina Nogueira da – O Modelo Espacial do Estado Moderno:
reorganização territorial em Portugal nos Finais do Antigo Regime. Lisboa:
Editorial Estampa, 1998, pp. 74 e 78.
48
Oliveira, Delfim José de – Noticias de Penela (…), op. cit., p. 165. Nesta
obra é referida uma provisão régia de 17 de Maio de 1759 que Penela recebera.
Não se pode dar fé da sua existência, pois não se encontra nenhuma referência
no livro de actas correspondente nem, aliás, qualquer visita do corregedor ou do
ouvidor entre 13 de Novembro de 1758 e o ano da última entrada do livro (1761).
Há, todavia, num parágrafo da acta da reunião de 6 de Novembro de 1759, referente
à repartição de uma finta no valor de 10.000 réis pela vila e termo tendo em vista
a realização de obras no concelho, uma referência a 4.000 réis que o corregedor de
Coimbra ordenava que fossem aplicados nas calçadas – cf. CEHLRSDA – Livro
de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fl. 227v.
46
- 46 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
– não era, contudo, um poder hierárquico49. Em Penela, a sua jurisdição
não se fez sentir durante o domínio da Casa de Aveiro – que, como se
verá, dispunha de oficiais próprios –, mas acompanharam o processo
de eleição das justiças locais entre 1774 e 183350. Os provedores,
por seu turno, eram responsáveis por duas áreas diferentes: a da tutela de
indivíduos cujos interesses não pudessem administrar (órfãos e viúvas,
por exemplo) e de entidades colectivas (misericórdias) e a da matéria
financeira. Neste último domínio, fiscalizavam os livros de receitas e
despesas, geriam a arrecadação das terças e das rendas reais51, mas a sua
presença em Penela não foi muito assídua, embora à vila tenha chegado
um ou outro despacho.
Ainda numa escala supralocal, Penela situava-se na diocese de
Coimbra, que por sua vez se subdividia em quatro arcediagados.
Sobre cada um destes arcediagos recaía o «dever de visitar a Diocese,
de pronunciar sentenças em cartas causas, [e] de administrar o governo
temporal». Um deles sediava-se precisamente nesta vila. Existia desde
pelo menos 1116 e o campo de actuação do seu arcediago compunha-se
de noventa e três freguesias52. Internamente, o concelho estava repartido
em seis paróquias, duas sediadas na vila (Santa Eufémia e São Miguel)
e outras quatro distribuídas pelo termo – Chão de Couce, Cumieira,
Espinhal e Lagarteira.
No foral de 1137 é feita referência a uma igreja. Para Salvador Dias
Arnaut, esta era a mesma que em 1320 se denominava igreja de Penela,
correspondendo à de São Miguel. Quanto a Santa Eufémia, a primeira
menção à sua igreja faz-se numa bula de 24 de Abril de 125653. Jarnaut
afirma que foi Santa Eufémia a primeira freguesia do concelho. A sua
igreja havia sido construída pela Ordem de São Bento de Avis, que depois
a abandonou, seguindo-se a sua ruína. Uma segunda fundação deu-se
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit.,
pp. 199-201.
50
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maços 1041, 1042,
1044, 1047, 1049, 1053, 1055, 1058, 1059, 1062, 1067, 1068, 1070, 1072, 1075.
51
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit.,
pp. 206-209.
52
Brásio, António – «Arcediagado de Penela» in Áreas Regionais na Formação
Histórica de Portugal: Actas do Colóquio. Lisboa: Academia Portuguesa de História,
1975.
53
Aranut, Salvador Dias – Penela (…), op. cit., pp. 24-25.
49
- 47 -
Cristóvão Mata
quando já existia a de São Miguel, cuja origem se deve, segundo afirma,
a D. Pedro, filho de D. Sancho I, uma vez mais «em data que não está
bem averiguada, e na epocha em que a ordem d’Aviz descurava aqui os
seus deveres»54.
No entanto, parece mais credível a hipótese de ter sido a paróquia
de São Miguel a primeira a ser criada. Estando rodeada pelas muralhas
do castelo, afigura-se plausível ter acompanhado, se não de início,
pelo menos desde uma fase preliminar a existência do castelo, associando-se a sua origem à da própria vila. As Memórias Paroquiais de 1758
assim o sugerem. Apesar de não especificar nenhuma data, o pároco
António Bernardo Tavares afirmava que, como indicavam uns «papeis
antiquissimos», era muito antiga esta igreja e, segundo rezava a tradição,
havia sido a primeira a ser erigida55. O seu pároco ocupava uma posição
de primazia em relação às restantes cinco, cujos religiosos eram por ele
apresentados56. A sua preeminência sugere, portanto, um estatuto que as
restantes não detinham, possivelmente garantido pela sua antiguidade.
Esta foi a repartição interna do termo do concelho de Penela desde um
tempo que não conseguimos averiguar com exactidão mas certamente
estendido até ao século XIX. A cópia de uma reunião da Câmara datada
de 29 de Novembro 1842 relativa ao reordenamento das freguesias de
Penela demonstra que, por esta altura, Podentes já estava anexada ao
concelho. Em 1852, fez-se a contagem do número de fogos das freguesias
de cada concelho do distrito de Coimbra, na qual se referiam as cinco
freguesias de Penela: Cumieira, Espinhal, Santa Eufémia, São Miguel
e Podentes. O Rabaçal, por seu turno, perdeu o estatuto concelhio e foi
reduzido a freguesia de Penela somente em 1853, quando juntamente
com a do Alvorge passou do termo concelhio de Condeixa e foi inserido
no de Penela57.
Existiu ainda um outro tipo de repartição interna, mas secular.
As vintenas constituíram «formas de organização e regulamentação
da vida local» às quais corresponderam oficiais próprios, os juízes
Jarnaut – Monografia do Município (…), op. cit., pp. 24 e 32.
ANTT – Dicionário Geográfico (…), op. cit., Volume 28, p. 778.
56
ANTT – Dicionário Geográfico (…), op. cit., Volume 10, p. 2027; Volume
11, p. 2502; Volume 14, p. 277; Volume 19, p. 54v; Volume 28, p. 780.
57
Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC) – Governo Civil de Coimbra,
Reforma Administrativa, Caixa 1841-1854.
54
55
- 48 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
pedâneos58, cujas competências eram estipuladas pelas Ordenações
Filipinas (Livro I, Título 65, §73)59: nos locais afastados pelo menos uma
légua da sede do concelho e habitados, no mínimo, por vinte vizinhos,
seria eleito um homem-bom para servir de juiz, tendo este por atribuições
o julgamento de litígios menores.
Penela subdividia-se em treze vintenas60. Segundo nos demonstram
as actas das reuniões da Câmara, as vintenas, mas nem por isso os seus
juízes, serviram outros propósitos não previstos na legislação. É o caso,
por exemplo, do lançamento de impostos: todos os anos a Câmara cobrava
os tributos devidos ou lançava contribuições extraordinárias, sendo o
respectivo montante recolhido a partir de cada vintena. No século XIX,
a existência dos juízes pedâneos deixou de constar das actas, embora
persista a referência às vintenas. Todavia, são mencionadas sobretudo
no âmbito da organização do território relativamente à actuação, como
o lançamento de impostos, e não tanto na qualidade de circunscrição
administrativa sujeita a uma magistratura própria.
A esta organização administrativa interna sucedeu uma outra:
os julgados. A partir de 1813 começam a chegar anualmente à Câmara
pautas com os nomes de indivíduos nomeados para os cargos de juiz,
procurador e escrivão dos chamados «concelhos» da Cumieira, da
Lagarteira e de Chão de Couce, cuja aprovação, e em certos casos
rectificação, dependia dos vereadores e juiz de fora de Penela 61.
Os julgados eram terras que, desfrutando do privilégio municipal, haviam
sido progressivamente aglutinadas por um concelho vizinho de maiores
dimensões, mantendo contudo oficiais próprios eleitos localmente.
Nomeadamente um ouvidor e um meirinho, e por vezes um procurador e
Monteiro, Nuno Gonçalo – “A sociedade local (…)”, op. cit., p. 35.
Almeida, Cândido Mendes de (org.) – Codigo Philippino ou Ordenações e
Leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado d’El-Rey D. Philipe I. Rio de
Janeiro: Typografia do Instituto Filomático, 1870, p. 144.
60
De acordo com o que as actas das reuniões da Câmara indicam a respeito
da eleição dos juízes pedâneos: Chainça, Chão de Couce, Coelhosa, Cumieira,
Espinhal, Freixiosa, Lagarteira, Penela, Ribeira, São Jorge, Serra do Concelho,
Serra do Mouro e Viavai.
61
Veja-se, com mais exactidão, o caso dos oficiais eleitos em 1816 – cf.
CEHLRSDA – Vereação de 19 de Janeiro 1816 in Livro de Actas de Sessões da
Câmara (11813-1818), fls. 113v-114.
58
59
- 49 -
Cristóvão Mata
um almotacé próprio62. No século XVI, coexistiam em Coimbra juizados
(de vintena) e julgados, cujos oficiais eram tendencialmente designados
«juízes». Antes de prevalecer este termo, as subdivisões concelhias distinguiam-se entre julgados e juradias: os respectivos oficiais, os juízes e os
jurados, eram escolhidos pelos membros da Câmara e usavam vara verde,
embora a alçada da jurisdição de cada um fosse diferente e a primeira
judicatura tivesse casa própria para acolher as audiências63.
Assim, pesem embora as diferenças da denominação dos ofícios e
do próprio sentido da evolução do termo concelhio de Penela, parece
que os «concelhos» acima referidos, assim como as pautas e os oficiais
designados, correspondem a julgados criados entre meados do século
XVIII e os primeiros anos do século XIX. Isto é, «terras com uma
autonomia jurisdicional incompleta, nomeadamente por lhes faltar a
jurisdição crime, pelo que estavam parcialmente dependentes de outra»64
e que, pelo menos assim parece, para efeitos administrativos substituíram
as vintenas, embora estas persistissem enquanto formas de organização
espacial, nomeadamente para efeito da cobrança de impostos e de tributos.
Silva, Francisco Ribeiro da – “Escalas do poder local: das cidades aos campos”
in Fonseca, Fernando Taveira da – O poder local em tempo de Globalização (…),
op. cit., p. 90.
63
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra (…), op. cit.,
pp. 47-54.
64
Hespanha, António Manuel – As vésperas (…), op. cit., p. 104.
62
- 50 -
– III –
Municipalismo e senhorialismo: os donatários de Penela
A imbricação de poderes políticos vários, de entidades senhoriais, de
instâncias jurisdicionais, sobre as múltiplas comunidades que compunham
o território português foi, porventura, o aspecto mais idiossincrático da
organização política da Época Moderna. Em termos políticos, significava
a partilha do poder e da autoridade do rei com inúmeras entidades e
tinha como consequência o facto de uma importante parcela do território
português estar alienada em favor de donatários leigos e eclesiásticos,
embora com o decorrer do tempo a jurisdição régia tenha conseguido
impor-se. Em meados do século XVII, apenas 30% das terras estavam
sob o domínio da monarquia (ao que se somavam os 12% de terras
pertencentes às três ordens militares, cujo senhorio jurisdicional ainda não
se encontrava plenamente incorporado na Coroa), face a 58% de senhorios
leigos e eclesiásticos. Mas, nos inícios do século XIX, a distribuição dos
poderes pelos territórios favoreceu claramente a Coroa, cuja jurisdição
passou a cobrir mais de metade dos concelhos portugueses1.
No entanto, tal como em Espanha2, só muito recentemente tem
vindo a despertar o interesse da historiografia portuguesa pelo regime
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Poder senhorial, estatuto nobiliárquico e
aristocracia” in Mattoso, José (dir.) – História de Portugal. Volume IV: Hespanha,
António Manuel (coord.) – O Antigo Regime (1620-1807). Lisboa: Editorial
Estampa, 1998, pp. 308-309.
2
Iglesias Blanco, Anastacio Santos – La Casa de Amarante. Siglos XVI-XIX.
Dissertação de Doutoramento em História. Santiago de Compostela: Facultade de
Xeografía e Historia de la Universidade de Santiago de Compostela, 2008, pp. 1-6.
1
- 51 -
Cristóvão Mata
senhorial da Época Moderna3. Desde então, têm sido desenvolvidos
diversos estudos sobre as entidades senhoriais4 e as suas relações com os
respectivos senhorios territoriais5. Neste âmbito, tem sido reconhecida a
importância simbólica que revestia os senhorios jurisdicionais no âmbito
da modelação do estrato nobiliárquico6, mas sobre a efectiva dimensão
dos poderes senhoriais parece haver o consenso de que ainda pouco
se sabe7.
A nível legal, os poderes jurisdicionais dos donatários localizavam-se nos espaços intermédios, detendo jurisdição de segunda instância,
enquanto localmente se traduziam em direitos expressamente recebidos
no sentido de proverem os ofícios locais de estatuto mediano, com gente
com quem mantinham relações de natureza clientelar, e de poderem
interferir na composição das câmaras8. É neste último ponto que se
levantam mais dúvidas, pois à uniformidade dos poderes jurisdicionais,
originalmente garantida pelas doações genéricas, facilmente se podia
substituir, mediante doações específicas, a heterogeneidade dos mesmos
Nuno Gonçalo Monteiro, “Poder senhorial, estatuto nobiliárquico (…)”,
op. cit., p. 304.
4
A título de exemplo, citam-se as seguintes obras: Fonseca, Fernando Taveira
da – A Universidade de Coimbra (1700-1771). Estudo social e económico. Coimbra:
Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, 1992; Lourenço, Maria Paula Marçal
– A Casa e o Estado do Infantado, 1654-1706: formas e práticas administrativas
de um património senhorial. Lisboa: Junta Nacional de Investigação Científica e
Tecnológica, 1995; Neto, Margarida Sobral – Terra e Conflito. Região de Coimbra
(1700-1834). Viseu: Palimage, 1997; Cunha, Mafalda Soares da – A Casa de
Bragança, 1560-1640. Práticas senhoriais e redes clientelares. Lisboa: Estampa,
2000; Farrica, Fátima – Poder sobre as periferias. A Casa de Bragança e o governo
das terras do Alentejo (1640-1668). Évora: Colibri, 2011.
5
Sobre este assunto, veja-se o interessante conjunto de trabalhos reunidos em
Cunha, Mafalda Soares da e Fonseca, Teresa (ed.) – Os Municípios no Portugal
Moderno (…), op. cit..
6
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Poder senhorial, estatuto nobiliárquico (…)”,
op. cit., p. 305.
7
Cunha, Mafalda Soares da – “Poderes locais nas áreas senhoriais (séculos
XVI-1640)” in Fonseca, Fernando Taveira da (coord.) – O Poder Local em Tempos
de Globalização (…), op. cit., pp. 97-100.
8
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Poder senhorial, estatuto nobiliárquico (…)”,
op. cit., pp. 305-308.
3
- 52 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
poderes dos donatários9. Por outro lado, a proximidade física dos
donatários às suas terras podia significar um controlo apertado sobre as
vereações, ou até uma forte capacidade de interferir nos assuntos locais,
mas «a distância terá condicionado o exercício do poder senhorial»10.
Esta questão dos poderes jurisdicionais parece ter sido o aspecto
do senhorialismo português que motivou menos protestos no final do
Antigo Regime. Em virtude das leis de 1790 e 1792, as faculdades
políticas e administrativas das entidades senhoriais encontravam-se em
fase avançada do seu processo de decomposição. Em 1811, por exemplo,
apenas 18 juízes de fora (num total de 168) eram apresentados por
donatários11. No âmbito dos movimentos anti-senhoriais, para o Mosteiro
de Alcobaça esta perda de poder significava, por exemplo, ter de deparar-se
com uma viva contestação protagonizada pelos próprios governos das
suas terras12. Mas relativamente às causas que inspiravam os protestos,
eram mais os abusos e avanços tomados pelos donatários no sentido de
aumentarem o rendimento das suas terras, e não tanto o extravasamento
dos limites das jurisdições, a origem dos movimentos anti-senhoriais13.
No entanto, falta uma visão de conjunto sobre as entidades senhoriais
do Portugal Moderno que reproduza a dimensão efectiva das jurisdições
senhoriais. Esta consideração é especialmente válida para Casa de Aveiro,
donatária de Penela entre meados do século XVI e 1759, cuja falta de
estudos é bastante sentida. Para além da importante obra de António
Caetano de Sousa, que nos oferece uma abordagem geral à história da
Casa de Aveiro14, dispomos de um conjunto de trabalhos que, infelizmente,
Cunha, Mafalda Soares da – “Relações de poder, patrocínio e conflitualidade.
Senhorios e municípios (século XVI-1640)” in Cunha, Mafalda Soares da e Fonseca,
Teresa (ed.) – Os Municípios no Portugal Moderno (…), op. cit., pp. 90-91.
10
Neto, Margarida Sobral – “Senhorios e concelhos na época moderna: relações
entre dois poderes concorrentes” in Cunha, Mafalda Soares da e Fonseca, Teresa
(ed.) – Os Municípios no Portugal Moderno (…), op. cit., p. 154.
11
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Poder senhorial, estatuto nobiliárquico (…)”,
op. cit., pp. 308-313.
12
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Lavradores, Frades e Forais: Revolução Liberal
e Regime Senhorial na Comarca de Alcobaça (1820-1824)” in Elites e Poder (…),
op. cit., pp. 215-399.
13
Neto, Margarida Sobral – Terra e Conflito (…), op. cit..
14
Sousa, António Caetano de – História Genealógica da Casa Real Portugueza.
Tomo 11. Lisboa: Na Regia Officina Sylviana, 1742, pp. 1-366; ainda do mesmo
autor, as Provas da Historia Genealogica da Casa Real Portugueza. Tomo 6.
9
- 53 -
Cristóvão Mata
se limitam a apresentar as várias gerações dos duques. Todavia, nem todos
os autores merecem descrédito: apesar de Carlos Ary dos Santos15 e de
Montalvão Machado16 terem seguido uma linha meramente descritiva e
denotado ambos um tom visivelmente apologético que pretendia legitimar
a reabilitação da Casa de Aveiro, Francisco Ferreira Neves elaborou um
interessante estudo que nos oferece algumas referências documentais
relativas à intervenção dos duques na vila de Aveiro17, embora pouco
mais acrescente aos trabalhos de António Caetano de Sousa.
Mais recentemente, Sérgio Cunha Soares estudou as relações dos
duques de Aveiro com os municípios de Coimbra e da Lousã, sendo por
isso inteiramente justo considerá-lo o autor que mais contribuiu para o
conhecimento que se tem desta Casa aristocrática. No caso de Coimbra,
cidade de jurisdição régia, demonstrou uma influência permitida pela
instalação no senado de clientelas constituídas por indivíduos que
ocupavam ofícios locais de estatuto mediano, cujo provimento cabia
aos duques, e que competiam com o partido brigantino na corrida pelo
poder municipal18. No estudo sobre as vereações da Lousã, que aqui
tomaremos por principal referência, recuperou o que havia escrito sobre
Coimbra e apresentou a forte capacidade de a Casa de Aveiro interferir na
composição das vereações desta vila19, que entretanto Maria do Rosário
Castiço de Campos confirmou20.
Lisboa: Na Regia Officina Sylviana e da Academia Real, 1742, que contêm uma
interessante colecção de documentos sobre a Casa de Aveiro.
15
Santos, Carlos Ary dos – “Estudos de Direito Nobiliárquico Português –
II. A Sucessão da Casa e Ducado de Aveiro” in Armas e Troféus. Volume VIII (1967).
16
Machado, José Timóteo Montalvão – Casa e Ducado de Aveiro e sua
representação actual. Lisboa: Edição do Autor, 1971.
17
Neves, Francisco Ferreira – “A Casa e o Ducado de Aveiro. Sua origem,
evolução e extinção” in Arquivo do Distrito de Aveiro. Volume XXXVIII (1972).
18
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra da Restauração ao
Pombalismo (…), op. cit., Volume II: Sociologia do Poder Municipal, pp. 283-394
e, do mesmo autor, também “Nobreza conimbricense e modos de governo político.
Um ensaio municipal (1640-1777)” in Revista Portuguesa de História. Tomo XXXI,
Volume I (1996).
19
Soares, Sérgio Cunha – “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã (…)”, art. cit..
20
Campos, Maria do Rosário Castiço de – A Lousã no século XVIII (…),
op. cit..
- 54 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
1. A expressão «ciclo de senhores de Penela», da autoria de Salvador
Dias Arnaut, é extremamente feliz não só por designar um período
durante o qual a vila e o concelho estiveram sob a tutela senhorial,
como também por o substantivo empregue sugerir uma contínua
sucessão de donatários. De facto, ao longo da Baixa Idade Média e
durante uma boa parte da Época Moderna, mais precisamente entre
os séculos XIV e XVIII, o concelho de Penela esteve regularmente
na posse de senhores do mais alto estatuto social, desde membros da
família real portuguesa, como o infante D. Pedro, primeiro duque
de Coimbra, a titulares da mais alta nobreza do reino, cujo expoente
máximo foi a já mencionada Casa de Aveiro.
A 7 de Outubro de 1315, D. Dinis outorgou a vila a Dona Isabel,
filha do infante D. Afonso e sua sobrinha, cuja posse permanceu
na sua descendência ao longo de três gerações, antes de regressar à
Coroa. Em 1368, D. Fernando pretendeu entregá-la à sua filha Dona
Isabel, mas o projecto não se consumou. A vila constituía o dote do
casamento de Dona Isabel com D. João, filho do conde de Barcelos
D. Afonso Teles de Meneses, cujo precoce falecimento motivou o
cancelamento da doação21. Foi ainda D. Fernando quem entregou o
senhorio da vila a novo donatário22: D. João Afonso Teles de Meneses,
conde de Viana do Alentejo e filho do conde de Barcelos23, a quem
depois D. João confiaria a defesa de Penela e de Miranda24 e que,
tendo tomado o partido dos castelhanos, morreu degolado às mãos do
popular Caspirre25. Posteriormente, a 25 de Abril de 1390, em virtude
dos serviços recebidos durante a guerra contra Castela, D. João I doou
Arnaut, Salvador Dias – Penela (…), op. cit., p. 27.
«Esteve el rey aly alguuns dias e partio; ao primeiro dia chegou a Penella,
a qual tinha ja voz por ele, porque temdo ha o Conde de Viana, quando el rey
Dom Fernando morreo» – cf. Lopes, Fernão – Crónica de Dom João I. Volume 2.
Porto: Civilização, 1990, p. 50.
23
Gomes, Rita Costa – A corte dos reis de Portugal no final da Idade Média.
Lisboa: Difel, 1995, p. 69.
24
Lopes, Fernão – Crónica (…), op. cit., Volume 1, p. 328; Volume 2, p. 50.
25
Arnaut, Salvador Dias – Penela (…), op. cit., p. 27.
21
22
- 55 -
Cristóvão Mata
a vila a Diogo Lopes Pacheco, que recebeu os rendimentos, jurisdições
e senhorio de Penela26. Manteve-a, porém, durante apenas três anos27.
Em Outubro de 1408, o mesmo monarca expropriou as rendas que
Gonçalo Lourenço, seu escrivão da puridade, possuía na vila. Foram
entregues ao infante D. Pedro, futuro duque de Coimbra, cujo procurador
as tomou a 7 do mesmo mês28. Inicialmente, D. Pedro possuiu apenas
as rendas localizadas no concelho29, passando depois, a partir de data
incerta, como indicia a doação de Cernache e Tentúgal, a deter o senhorio
jurisdicional: «lhe fazemos a dicta doaçom com todos seus direitos e
pertenças e com toda jurdiçom mera e misto imperio, a qual doaçam lhe
fazemos com todallas clausullas e condiçoões e substituições com que
lhe nos demos as terras e lugares de Penella»30.
Quando comparado com os donatários que o antecederam, D. Pedro
deteve o senhorio de Penela por um tempo excepcionalmente longo
(1408-1449), mas também revelou uma especial dedicação a esta
terra. Depositou na igreja de São Miguel um pedaço do crânio de São
Sebastião que havia adquirido numa das suas partidas e, possivelmente
devido à «singular devoção» que tinha por aquele arcanjo31, mandou
reconstruir aquela igreja32. Procurou ainda dinamizar economicamente
Dias, João José Alves – Chancelarias Portuguesas (…), op. cit., Volume I,
Tomo 2, pp. 197-198.
27
Arnaut, Salvador Dias – Penela (…), op. cit., pp. 28-29.
28
Dias, João José Alves – Chancelarias Portuguesas (…), op. cit, Volume III,
Tomo 1, pp. 219-220.
29
Afonso Peres, procurador enviado por D. Pedro, tomou «posse dos paaços do
dito sennhor rey per terra e pedras e telhas e chaves e erva», acto que nos parece
meramente simbólico e não tanto representativo da assunção de um poder senhorial
na sua plenitude. O que tomou concreta e efectivamente foram «todallas remdas
e ditos e perteemças da dita villa e seu termo assi como os avía o dito Gomçallo
Louremço pera o dito senhor inffamte Dom Pedro assi ditos de pam e vinho e
direitos e todallas outras cousas que aa dita remda perteemçer» – cf. ANTT – Livro
4 de Místicos, fl. 30.
30
Dias, João José Alves – Chancelarias Portuguesas (…),op. cit.,Volume III,
Tomo 2, p. 254.
31
ANTT – Dicionário Geográfico (…), op. cit., Volume 28, fl. 783.
32
ARNAUT, Salvador Dias – “O infante D. Pedro (…)”, art. cit., p. 181.
26
- 56 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
a vila: para além do citado tombo de 1420, fundou duas feiras francas33.
Porque ao rei competia exclusivamente a prerrogativa de criação de feiras34,
a 6 de Dezembro de 1433, D. Duarte autorizou D. Pedro a mandar
«fazer e se faça daquy em diamte em cada huum anno em a sua villa
de Penella huũa feira framqueada a qual se comecara vespera de
Sam Miguel de Setembro durara tres dias segui[dos]»35. Anos depois,
em 1440, durante a menoridade de D. Afonso V, D. Pedro criou uma outra
feira, igualmente franca e com a mesma duração, que deveria iniciar-se
na véspera do dia de São Sebastião36.
Do desfecho da batalha de Alfarrobeira, onde tombou D. Pedro,
resultou o regresso da vila à posse da Coroa. Assim se manteve até 1461,
quando D. Afonso V a doou a D. Pedro, o filho do falecido infante e
futuro rei de Aragão37, que todavia não a deteve durante muito tempo.
A 23 de Julho de 1465, Penela foi doada a D. Afonso de Vasconcelos,
futuro conde de Penela (1471)38, em cuja descendência permaneceu
até meados do século XVI, após o que foi integrada no património do
primeiro duque de Aveiro, D. João de Lencastre.
2. A 28 de Maio de 1500, D. Manuel fez «pura, e irevogavel doacaõ
[…] da villa de Penela com seu termo com todolos bens» a D. Jorge de
Lencastre, filho ilegítimo de D. João II39, então mestre e governador das
ordens de Santiago e de Avis e futuro duque de Coimbra. Deste modo
dava cumprimento à vontade do falecido monarca, cujo testamento
determinava que o seu «muito amado e prezado fiejo» se pudesse
Sobre as feiras de Penela criadas no século XV e a sua evolução, vide Rau,
Virgínia – Feiras Medievais Portuguesas: subsídio para o seu estudo. Lisboa:
Editorial Presença, 1983, p. 145.
34
Rau, Virgínia – Feiras Medievais Portuguesas (…), op. cit., p. 51.
35
ANTT – Livro 1 da Estremadura, fls. 104v-105.
36
ANTT – Chancelaria de D. Afonso V. Livro 23, fl. 47.
37
Gois, Damião de – Chronica do principe Dom Joam, rei que foi destes regnos
segundo do nome, em que summariamene se trattam has cousas sustançiaes que
nelles aconteçerão do dia, de seu nasçimento atte ho em que elRei dom Afonso seu
pai faleçeo. Em Lisboa: Na casa de Francisco Correa, 1567, p. 51.
38
Arnaut, Salvador Dias – Penela (…), op. cit., p. 29.
39
“Doação da Casa de Aveiro delRey D. Manoel ao Senhor D. Jorge, Duque de
Coimbra” in Sousa, António Caetano de – Provas da Historia Genealogica (…),
op. cit., Tomo VI, pp. 1-5.
33
- 57 -
Cristóvão Mata
«manter e governar segundo seu estado». Mais especificamente,
estipulava que, entre várias outras terras, se fizesse doação de «Penella
com seu termo e todos os beens que ElRey D. Joaõ meu visavoõ que Deus
aja […] as deu ao Iffante D. Pedro meu avoõ per suas doações segundo
nellas he conteudo»40. Porém, a transferência do senhorio de Penela para
a Casa de Aveiro não se procedeu de imediato.
Esta situação não foi inédita, pois muitos dos bens concedidos em
1500 tardaram em ingressar no conjunto de terras administradas pelos
duques de Aveiro. Em 1527, excepto as rendas que lhe competiam
enquanto governador e administrador das ordens militares de Avis e de
Santiago, D. Jorge de Lencastre detinha apenas administração de Aveiro,
Montemor-o-Velho, Torres Novas e, possivelmente, Lousã41. Brunhido,
Recardães e Segadães, por seu turno, foram incluídas no património da
Casa de Aveiro somente no período da administração de D. Álvaro e
D. Juliana de Lencastre, terceiros duques de Aveiro, após o falecimento do
neto do segundo conde de Sortelha, D. Diogo da Silveira, que as possuía42.
Foi efectivamente durante este período que Penela ingressou na
Casa de Aveiro; com toda a certeza, após o falecimento do seu anterior
“Testamento delRey D. Joaõ II escrito em papel, e assinado por ElRey,
approvado por Ruy de Pina, e assinado por certos Senhores do Reyno” in Sousa,
António Caetano de – Provas da Historia Genealogica (…), op. cit., Tomo II,
pp. 172-173.
41
Ao enumerar as possessões dos principais senhorios leigos do reino, Armando
Castro contabiliza apenas estas primeiras três terras enquanto, para o mesmo ano,
João Cordeiro Pereira, no arrolamento que fez das fontes de rendimento da Casa
do duque de Coimbra, pai do futuro primeiro duque de Aveiro, incluiu as rendas
da Lousã – cf. Castro, Armando – A estrutura dominial portuguesa dos séculos
XVI a XIX (1834). Lisboa: Caminho, 1992, p. 164 e Pereira, João Cordeiro –
“A renda de uma grande casa senhorial de Quinhentos” in Actas das Primeiras
Jornadas de História Moderna. Volume 2. Lisboa: Centro de História da
Universidade de Lisboa, 1986, p. 792.
42
Sobre D. Luís da Silveira, terceiro conde de Sortelha, é dito que sucedeu
ao seu irmão, D. Diogo da Silveira, na casa de seu avô, também ele D. Diogo da
Silveira, segundo conde de Sortelha, excepto nestas três terras, que então passaram
para a administração da Casa de Aveiro. Dado que D. João da Silveira, pai de
D. Diogo e de D. Luís, faleceu em Alcácer-Quibir e que o terceiro conde faleceu
em 1617, a transferência do senhorio terá, portanto, ocorrido na transição do século
XVI para o XVII, muito possivelmente após a confirmação do título aos referidos
duques (1588) – cf. Sousa, António Caetano – História Genealógica (…), op. cit.,
Tomo XI, pp. 210-212.
40
- 58 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
donatário. Segundo Anselmo Braamcamp Freire, o segundo conde de
Penela faleceu entre 16 de Dezembro de 1539 e 20 de Abril de 154343.
Deste último dia data uma carta de D. Afonso de Meneses, filho do
segundo conde de Penela, que certifica que a vila, enredada num litígio
disputado entre este e D. João de Lencastre, se encontrava em vias
de transferência:
«Eu soube per carta do arcebispo meu tiu que ha mynha petição
que fiz a Vossa Alteza sobre a posse de Penela de que me tirou
o corregedor per seu mandado, respondeo [c]om este pedido a
Vossa Alteza mandasse dar juiz ante quem apresentasse cada
um de nos suas razões e direyto. E craramente pareçe por esta
resposta que o marques quer co a mão de Vossa Alteza que se
ordene e trate demanda sobre a propiedade. E se julguem estando
eu desapossa[d]o e esbulhado como estou, e eu não devo nem ey
de respomder a isso cousa alguma mais de pedir como peço muito
por merçe a Vossa Alteza me mande restituir a minha posse pois
me mandou tirar dela»44.
Embora a 2 de Maio de 1556 D. João III tivesse confirmado a doação
de D. Manuel45 e, no ano seguinte, a fazenda patrimonial localizada
no concelho tivesse sido adquirida pelo duque de Aveiro ao subscritor
do documento acima citado46, o senhorio não foi transmitido até, pelo
menos, 157147. Deste ano data o testamento de D. João de Lencastre, no
qual o primeiro duque de Aveiro instituiu diversos legados pios, entre
os quais vários dotes para distribuir a órfãs naturais dos seus senhorios,
deixando então bem claro que Penela ainda não estava em sua posse: «e
Freire, Anselmo Braamcamp – Brasões da Sala de Sintra. Volume II. Lisboa:
Imprensa da Casa da Moeda, 1973, p. 226. O autor refere a existência de um
documento de 1542 que dá por vivo o conde; porém, não lhe confere grande crédito
por se tratar de uma cópia da cópia do original.
44
ANTT – Corpo Cronológico. Parte I, maço 73, n.º 76.
45
ANTT – Chancelaria de D. João III. Livro 71, fls. 312v-313.
46
ANTT – Viscondes de Vila Nova de Cerveira. Caixa 27, n.º 21.
47
Sobre as noções de senhorio territorial e senhorio jurisdicional, vide Clavero,
Bartolomé – “Senhorio e Fazenda em Castela nos finais do Antigo Regime” in
Hespanha, António Manuel – Poder e instituições na Europa do Antigo Regime.
Colectânea de textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkien, 1982, pp. 155-177.
43
- 59 -
Cristóvão Mata
ora acrescentamos mais hua orphan na vila de Penella depois que a dita
vila vier ter a minha casa e morgado»48.
A Casa de Aveiro49, criada com a doação de 27 de Março de 1500
mas construída ao longo do século XVI, veio a afirmar-se como uma
das casas aristocráticas mais ricas do Portugal Moderno. Por altura do
numeramento de 1527, os 10.963.768 reais auferidos anualmente por
D. Jorge garantiam-lhe o segundo lugar numa lista das rendas recebidas
pelos titulares portugueses, imediatamente atrás do Duque de Bragança50,
e no século XVIII, com base na estimativa feita a partir património de
D. José de Mascarenhas em 1759, era a Casa que tinha rendimentos mais
avultados51. Os duques foram administradores de um vasto património
essencialmente constituído por bens das Ordens Militares (a partir de
meados do século XVI, predominantemente de Santiago), localizados
no Alentejo e na Estremadura e em torno de Azeitão, onde os duques
assentavam residência e se sediava a outra ouvidoria senhorial; e de bens
ANTT – Ordem de Santiago e Convento de Palmela, maço 7, n.º 522A, fl. 5.
O conceito de Casa distingue-se do de linhagem, assim como o de ducado. Casa
é «um conjunto coerente de bens simbólicos e materiais»; «a casa nobiliárquica e,
em particular, e casa de um Grande do reino surge-nos, assim, como uma entidade
institucional e simbolicamente consagrada», enquanto linhagem diz respeito a
«grupos alargados de diferentes ramos de descendentes, organizados numa base
unilinear em função da ascendência paterna» (os Lencastres) e o ducado apenas ao
título nobiliárquico («bem simbólico») com o qual se identificavam – cf. Monteiro,
Nuno Gonçalo – O crepúsculo dos Grandes. A Casa e o Património da Aristocracia
em Portugal (1750-1832). Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2003,
pp. 95-99; veja-se também, do mesmo autor, “Casa e Linhagem: o Vocabulário
Aristocrático em Portugal nos Séculos XVII e XVIII” in Penélope. Fazer e desfazer
a História. N.º 12 (1993), pp. 43-63.
50
Pereira, João Cordeiro – “A Renda de uma grande casa (…)”, op. cit., p. 792.
51
Nesse ano, os bens da Coroa, os bens das Ordens e bens patrimoniais da
Casa de Aveiro rendiam 53.240.400 réis a D. José de Mascarenhas, sétimo e último
duque de Aveiro. A indexação destes valores à deflação de 1800, que serve para
compará-los as outras casas cujos rendimentos estão avaliados para outros anos
desse século, atribui-lhe 116.901.981 réis de rendimento. Nesta lista, é seguido,
à distância, apenas pelos duques do Cadaval (67.939.069 réis); pelos marqueses
de Niza (67.680.464 réis); pelos marqueses de Pombal (58.602.234 rés) e pelos
marqueses de Abrantes (57.659.128 rés); situando-se as restantes quarenta e cinco
casas de Grandes abaixo dos 50.000.000 réis – cf. Monteiro, Nuno Gonçalo –
O Crepúsculo dos Grandes (…), op. cit., pp. 262-263.
48
49
- 60 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
da Coroa, distribuídos por uma zona estendida entre Aveiro, Montemor-o-Velho, Coimbra e Torres Novas (Beira e Estremadura)52.
Ao nível da hierarquização do estado nobiliárquico, foi também uma
das casas com maior importância. O elevado estatuto da descendência
de D. João II evidencia-se evocando os títulos nobiliárquicos com que
os Lencastres foram agraciados: em 1509, pela mesma carta com que
doava a alcaidaria-mor de Coimbra a D. Jorge, D. Manuel recuperou o
ducado de Coimbra53. A D. João de Lencastre, primogénito de D. Jorge e
seu presumível herdeiro, foi inicialmente concedido o título de marquês
de Torres Novas (1520)54; e depois, em 1547, o ducado de Aveiro, com o
assentamento de 750.000 reais55, embora o título viesse a ser oficializado
somente a 30 de Agosto de 155756. Em 1588, foi criado o título de duque
de Torres Novas em favor do herdeiro dos terceiros duques de Aveiro,
Veja-se a caracterização do património dos duques de Aveiro em Mata,
Cristóvão – “A Casa de Aveiro: (…)”, art. cit.. Este segundo núcleo de bens,
conhecido por «terras do Infantado», por haver pertencido ao infante D. Pedro,
detinha igualmente um forte capital simbólico que conferia prestígio social aos
duques e era utilizado como argumento quando se tratava de disputar dignidades.
Nos finais do século XVI, depois de ter sido reservado o tratamento de Excelência
aos infantes reais e aos duques de Bragança, D. Álvaro de Lencastre, terceiro duque
de Aveiro, moveu uma petição ao rei D. Filipe II reclamando a mesma dignidade.
Numa carta enviada para Madrid, argumentava que a sua Casa, embora tivesse
origem na última vontade do rei D. João II, era a continuação natural da Casa e
Estados do infante D. Pedro, primeiro duque de Coimbra, o que, por conseguinte,
fazia com que a Casa de Bragança devesse à de Aveiro a sua existência. Eram
argumentos manifestamente tendenciosos mas, não obstante, o duque obteve o que
pedia ao monarca: em 1606, D. Filipe II houve por bem «que se lhe possa falar e
escrever por Excelencia» – cf. Cunha, Mafalda Soares da – A Casa de Bragança
(…), op. cit., p. 32; Biblioteca Nacional de España (BNE) – MSS/1439, fls. 272v-276; e Sousa, António Caetano de – Provas da Historia Genealogica (…), op. cit.,
Tomo IV, p. 302.
53
“Carta da Alcaidaria môr da Cidade de Coimbra ao Senhor D. Jorge, Mestre
de Santiago” in Sousa, António Caetano de – Provas da Historia Genealogica (…),
op. cit., Tomo VI, pp. 8-9.
54
Sousa, António Caetano de – História Genealógica (…), op. cit., Tomo XI,
p. 42.
55
ANTT – Chancelaria de D. João III. Livro 15, fl. 97v.
56
Neves, Francisco Ferreira – “ A casa e ducado de Aveiro (…)”. art. cit., p. 15.
52
- 61 -
Cristóvão Mata
D. Álvaro e D. Juliana de Lencastre57, que tal como o marquesado
instituído na pessoa do herdeiro do duque de Coimbra se justificava pela
sua posição na linha de sucessão.
Já foi demonstrado noutros trabalhos o quase permanente estado
de conflituosidade entre as casas de Aveiro e de Bragança58 – longe de
atenuar esta tensão, a elevação da Casa de Bragança a dinastia reinante
acentuou os desentendimentos quase crónicos59. Em 1659, D. Raimundo
de Lencastre, quarto duque de Aveiro e filho do duque de Torres Novas,
partiu para Espanha. Em resposta, foi desnaturalizado, degolado em
estátua e a seu património incorporada na Coroa. Sucedeu-lhe em 1668
D. Pedro de Lencastre, filho de D. Álvaro e de D. Juliana, Arcebispo
de Sidónia, Presidente do Desembargo do Paço e futuro Inquisidor
Geral, cujo falecimento em 1673 originou uma longa crise sucessória.
Em 1732, a Casa de Aveiro foi recuperada na pessoa de D. Gabriel de
Lencastre, falecido sem descendência em 1745. Sucedeu-lhe D. José de
Mascarenhas, em 1752, cujo suposto envolvimento no atentado ao rei
D. José motivaria não apenas a sua execução, como também a definitiva
incorporação da Casa de Aveiro na Coroa60.
3. O conjunto de poderes jurisdicionais de que os duques de Aveiro
dispunham não foi outorgado de imediato, mas sim progressivamente
e mediante doação que expressamente os conferisse, como aliás
especificavam as Ordenações Manuelinas – «[as] pessoas que de Nós
[tiverem] Terra com jurisidiçam, usaram della como por suas doações per
“Alvará porque ElRey faz merce a D. Juliana de Lencastre, e D. Alvaro de
Lencastre, dos títulos de Duque de Aveiro, e Torres-Novas, e Marquez de Torres
Novas” in Sousa, António Caetano de – Provas da Historia Genealogica (…),
op. cit., Tomo VI, pp. 77-78.
58
Cunha, Mafalda Soares da – A Casa de Bragança (…), op. cit., pp. 31-32.
59
Valladares, Rafael – A independência de Portugal. Guerra e Restauração:
1640-1680. Lisboa: Esfera dos Livros, 2006, pp. 286-288.
60
Sobre estas gerações da Casa de Aveiro, veja-se Sousa, António Caetano de
– História Genealógica (…), op. cit., Tomo XI, pp. 123-178; uma abordagem mais
resumida pode ser consultada em Neves, Francisco Ferreira – “ A casa e ducado
de Aveiro (…)”, art. cit.. Sobre D. José de Mascarenhas, que entrava na linha de
sucessão por integrar um ramo de descendência mais afastado, mas com origem
nos duques D. Álvaro e D. Juliana, veja-se Sousa, António Caetano de – Memorias
Historicas, e Genealogicas dos Grandes de Portugal, Lisboa, Na Regia Officina
Sylviana e da Academia Real, 1755, pp. 25-135.
57
- 62 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Nós confirmadas expressamente lhe for outorgado» (Livro II, Título 26)61.
De facto, a doação de 1500 apenas concedia «as jurisdiçoins de Civel,
e Crime mero mistico imperio, asi e taõ compridamente como nos todo
avemos e de dereito e de feito devemos aver»62, pelo que os direitos que
permitiram aos duques de Aveiro usufruir de uma maior capacidade de
intervenção na vida local foram sendo outorgados ao longo dos séculos
XVI e XVII.
O primeiro privilégio que a Casa de Aveiro recebeu foi o de isenção
de correição régia63. Um ano depois, em 1502, D. Manuel permitia
«que o ouvidor [de D. Jorge de Lencastre], e ouvidorias das terras que lhe
tem feito doação, possão dar, e dem cartas de segurança ordenadas de justiça,
e assim mesmo possão conhecer, e conhecão as acções novas, assim como
podem fazer e fazem os seus corregedores das comarcas»64 e, em 1556,
D. João III doou a jurisdição crime sobre os roubos e assassinatos65.
Embora se localizasse na comarca régia de Tomar, Penela esteve sempre
sujeita à jurisdição da ouvidoria de Montemor-o-Velho, mesmo durante o
período em que a Casa de Aveiro esteve sob administração régia (1673-1732), sendo nesse período visitada pelo ouvidor de Montemor-o-Velho,
das terras do Infantado da cidade de Coimbra e vila de Torres Novas66.
Somente em 1760, por uma provisão régia datada de 19 de Setembro,
esta ouvidoria foi extinta e Penela anexada à comarca de Coimbra67.
Entre 1640 e 1761, os ouvidores de Montemor-o-Velho mantiveram
uma presença, se não assídua, pelo menos regular. Do Gráfico 1 não
Ordenaçoens do Senhor Rey D. Manuel. Coimbra: Na Real Imprensa da
Universidade, 1797, pp. 110-111. O resumo dos principais privilégios e direitos
jurisdicionais pode ser consultado na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra
(BGUC) – “Memoria dos papeis que vou entregando ao Excelentissimo Senhor
Duque de Aveyro meu senhor, os quais me mandou tirar da Torre do Tombo” in
Manuscritos, 502.
62
Sousa, António Caetano – Provas da Historia Genealógica (…), op. cit.,
Tomo VI, pp. 2-6.
63
ANTT – Chancelaria de D. Manuel, Livro 6, fl. 104.
64
ANTT, Livro 1 de Místicos, fl. 235v-236.
65
ANTT, Corpo Cronológico, Maço 98.
66
CEHLR-SDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696); Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1715-1727); e Livro de Actas de Sessões da Câmara
(1727-1736).
67
Arquivo Histórico Municipal de Coimbra (AHMC) – Cartas e Ordens à
Câmara (1526-1778), fl. 80.
61
- 63 -
Cristóvão Mata
constam os anos correspondentes aos mandatos camarários cujas actas
não registam a presença do ouvidor68. Alguns casos justificar-se-ão
por os respectivos livros estarem interrompidos, pelo que é admissível
considerar que estes oficiais senhoriais tivessem visitado a vila em
meses posteriores ou anteriores ao encerramento ou abertura dos livros
(1641, 1645, 1670, 1673 e 1692); noutros, por causa das referidas crises
vividas pela Casa de Aveiro nos séculos XVII e XVIII (1730-1731 e
1759-1761) – no entanto, existem anos para cuja ausência do ouvidor
não encontramos nenhuma justificação razoável (1644, 1721 e 1722).
Os livros de actas indiciam também que, regra geral, os ouvidores visitaram
a vila uma vez por ano, embora em data variável. As visitas no primeiro
e no último trimestre do ano são raras (16% cada), por oposição aos
segundo e terceiro trimestres (35% e 32%, respectivamente). Junho (19%),
Julho (16%) e Agosto (13%) são os meses em que mais vezes os ouvidores
de Montemor-o-Velho se deslocaram à vila.
Dentre as trinta e uma correições levadas a cabo, não houve o que
prover em dez69. Nas restantes vinte e uma, foram tratados em reunião
com os membros da Câmara assuntos não muito variados. Em primeiro
lugar, o aspecto que os ouvidores mais fiscalizaram foi a preservação
das infra-estruturas locais. Por doze ocasiões, os ouvidores ordenaram
a reparação das calçadas, da casa da Câmara, da torre do relógio, da
cadeia, das pontes do concelho, entre outras construções. Inversamente,
em determinados anos foram os próprios vereadores a tomar a iniciativa70.
A simples tutela do normal funcionamento da Câmara foi o aspecto que de
seguida mais ocupou os ouvidores. Em 1696, foi ordenada a destituição
dos juízes pedâneos irregularmente eleitos. Foi também decretado que,
por causa das infracções cometidas nos julgamentos não presididos pelo
juiz de fora, os vereadores não pudessem julgar sem a presença deste
Cf. Gráfico 1. Correições: presenças dos ouvidores, em Anexos, p. 141.
1715, 1716, 1717, 1719, 1720, 1725, 1727, 1730, 1731, 1732 – cf. CEHLRSDA
– Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727) e Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1726-1736).
70
Em 1693, por exemplo, a Câmara pediu ao Doutor Manuel Rodrigues de
Figueiredo a autorização necessária para lançar um imposto extraordinário cujo
montante arrecadado permitisse a reparação de uma ponte – cf. CEHLRSDA –
Correição que fez o Doutor Manuel Rodrigues de Figueiredo ouvidor deste correição
[a 19 de Agosto de 1693] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696),
fls. 30-30v.
68
69
- 64 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
oficial ou de letrados71. Em 1723, ocorria o contrário: o Doutor José
Gomes Pita considerava que os vereadores em funções e os anteriores não
faziam aplicar as penas dos condenados e obrigou o escrivão da Câmara
a notificá-los para as fazerem tal como estipulava o seu regimento72.
Seis anos depois, o Doutor Simão Figueira de Figueiredo sentenciou os
processos iniciados pelos oficiais, mas que se encontravam por concluir
por mercê da ausência do juiz de fora e dos oficiais letrados73.
Em algumas ocasiões, os ouvidores ultrapassaram as suas competências. No ano de 1730, o ouvidor opôs-se ao provedor de Tomar e às
cobranças realizadas na vila, considerando-as bastante exageradas e
que causavam muita despesa ao concelho74. Noutros casos procuraram
reforçar a capacidade de a Câmara exercer as suas competências, como
a de garantir o abastecimento de géneros alimentares: a 22 de Julho
de 1753, o Doutor António Esteves Coentro, considerou haver muita
abundância de produtos agrícolas, mas que, todavia, os habitantes do
termo sentiam a sua falta devido ao açambarcamento que os rendeiros
faziam e à consequente subida dos preços, pelo que obrigava os rendeiros
do duque, os lavradores e qualquer morador que possuísse um celeiro,
a submeterem-se aos embargos que obrigavam à retenção da terça parte
da produção cerealífera75.
Pelos duques de Aveiro foram também exercidos direitos jurisdicionais
a nível local, designadamente o provimento de ofícios locais de menor
estatuto e a nomeação das vereações. De acordo com as Memórias
Paroquiais, pertencia a D. José de Mascarenhas «a regalia de nomear as
justicas para a mesma villa que constaõ de juis de fora, juis dos orphaos
CEHLRSDA – [Correição que fez o Álvaro Afonso Pereira ouvidor desta
correição a 9 de Março de 1696] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 117-118v.
72
CEHLRSDA – Auto de Provimento do Doutor José Gomes Pita [a 12 de Abril
de 1723] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fls. 216v-217.
73
CEHLRSDA – Auto de Provimento do Doutor Simão Figueira de Figueiredo
[a 30 de Junho de 1729] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736),
fls. 58v-59.
74
CEHLRSDA – Correição do Doutor Ouvidor Simão Figueira de Figueiredo
[a 8 de Junho de 1730] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736),
fls. 33v-34v.
75
CEHLRSDA – Auto de Provimento do Doutor António Esteves Coentro [a 22 de
Julho de 1753] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fls. 3-4.
71
- 65 -
Cristóvão Mata
juiz almoxarife dos direiros reaes e todos os escrivaes para estes juizos,
como taõbem os vereadores e escrivaõ da Camarã»76. Relativamente
aos ofícios de menor importância, a regalia dataria de meados do século
XVI, quando D. João III outorgou ao primeiro duque de Aveiro o direito
«para que os juizes e taballeaes de suas terras se chamem por elle»77 –
um poder aparentemente limitado, mas como se verá útil à criação de
redes clientelares locais a partir das quais se recrutavam as vereações.
O privilégio de nomeação dos ofícios camarários cimeiros datava
de meados do século XVI. Em 1553, D. João III concedeu a D. João de
Lencastre, primeiro duque de Aveiro, o privilégio de indicar os juízes,
vereadores e procuradores a partir das pautas elaboradas localmente pelo
sistema de favas, sem embargo do que então as Ordenações Manuelinas
estipulavam (Livro 1, título 45)78. Segundo indica o documento, o rei
autorizou a D. João que «apure dellas os juizes, vereadores, e officiaes
que em cada hum anno ouverem de servir, porque confio delle que apurara
bem as ditas elleyçoes, e como cumpre a meu servisso dos quaes tirará os
que forem necessarios para servirem os annos, que lhe bem paresser para
se apurarem as justiças dos seus senhorisos»79. Posteriormente, as leis
que regulamentaram a eleição das vereações não alteraram substancial
mente o teor das Ordenações Manuelinas e, tal como no século XVI,
os seus contornos parecem não coincidir exactamente com o teor do
privilégio recebido.
As Ordenações Filipinas (1603) deixavam explícito o processo
segundo o qual se nomeariam os juízes ordinários, vereadores e procuradores do concelho: «os homens bons e povo, chamado a concelho»
elegeriam seis homens para aos pares elaborarem três listas de nomes de
pessoas «necessarias para servirem os ditos Oficios tres annos». Ao juiz
mais velho cabia a responsabilidade de consultar os três róis e de escolher
as pessoas «que mais vozes tiverem», cujos nomes seriam inscritos numa
pauta final da qual seriam eleitos anualmente os juízes, vereadores e
procuradores do concelho. A lei determinava o seguinte: «e esta eleição
farão os juizes, quando o corregedor não for presente na cidade, ou vila,
ANTT – Dicionário Geográfico de Portugal. Volume 28, fl. 777.
ANTT – Chancelaria de D. João III, Livro 46, fls. 171v-172.
78
Ordenaçoens do Senhor Rey (…), op. cit., pp. 314-322.
79
Biblioteca da Ajuda – 54-VIII-52, n.º 98ª, fl. 2.
76
77
- 66 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
em que se houver de fazer: porque sendo presente, a elle pertence fazel-a,
e apurar os juizes e Officiaes per si só» (Livro I, Título 67)80.
Anos depois, em 1611, um alvará destinado às «Villas, e logares deste
Reino, cujas eleições de Juizes, e Officiaes das Camaras» competia aos
respectivos donatários confirmou o método descrito nas Ordenações e
introduzia algumas especificações. Nomeadamente quanto à necessidade
de os ouvidores se informarem sobre os elegíveis para os ofícios da
Câmara, de se acautelarem perante os jogos de interesse dos grupos locais
e de estarem atentos a possíveis práticas de suborno81. Em 1640 um novo
regimento confirmou as mesmas recomendações e obrigou ao registo
das informações biográficas e das capacidades pessoais dos elegíveis
para cada um dos cargos da governança82. Um terceiro documento,
datado de 8 de Janeiro de 1670, embora endereçado ao corregedor do
Porto, estabeleceu definitivamente o processo de eleição das justiças
locais83. Manteve em vigor o título sessenta e sete do primeiro livro das
Ordenações Filipinas e reiterou a imperatividade de os ouvidores se
acautelarem relativamente a práticas menos honestas84.
Não obstante o tom claro da legislação, a modalidade segundo a qual
o donatário nomeava as vereações das suas terras podia variar. Havia uma
diferença jurídica entre a nomeação definitiva das justiças pelo donatário
(dada); a nomeação do donatário sujeita a confirmação do Desembargo
do Paço (apresentação); e a eleição pelas gentes do concelho ratificada
pelo seu senhor (confirmação)85. Não obstante a já referida escassez
de estudos sobre os poderes senhoriais, os indícios apresentados por
Almeida, Cândido Mendes de (org.) – Codigo Philippino (…), op. cit.,
pp. 154-155.
81
“Alvará de 6 de Novembro de 1611. Forma da eleição de Juízes e Vereadores”
in Silva, José Justino de Andrade – Collecção Cronologica da Legislação
Portuguesa. Tomo I. Lisboa: Na Imprensa de José Justino Andrade Silva, 1856,
p. 314-316.
82
“Regimento de como se farão as eleições de Vereadores, Procuradores, e
Officiaes das Camaras destes Reinos [de 10 de Maio de 1640]” in Silva, José Justino
de Andrade – Collecção Cronologica (…), op. cit., Tomo V, pp. 228-230.
83
Fonseca, Teresa – Absolutismo e Municipalismo (…), op. cit., p. 115.
84
“Provisão de 8 de Janeiro de 1670. Instruções sobre as eleições de Vereadores”
in Silva, José Justino de Andrade – Collecção Cronologica (…), op. cit., Tomo VIII,
pp. 176-177.
85
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 398.
80
- 67 -
Cristóvão Mata
algumas monografias que trataram as relações entre o poder senhorial e
as câmaras revelam que havia diferenças significativas entre os direitos
exercidos pelos donatários, que, por vezes, podiam opor-se à lei geral.
Os capitães de São Miguel, depois condes de Vila Franca, que possuíam
a donataria de Ponta Delgada, para além da nomeação de ouvidores e de
outro oficialato local, detinham desde 1576 a prerrogativa de presidirem
às eleições e à cerimónia de abertura das pautas de vereação. No entanto,
ao longo do século XVI, foram vários os episódios nos quais se verifica
a tentativa de os senhores de Ponta Delgada interferirem no processo
eleitoral, chegando inclusive D. Filipe, em 1584, a mandar queimar as
pautas e posteriormente a proibir-lhes a feitura das eleições. Mas, no
século XVII, os condes de Vila Franca alcançaram a prerrogativa de
elaboração das pautas, gozando até de uma ampla aceitação por parte
das nobrezas locais que adoptaram «uma política de não-conflitualidade
com o poder senhorial»86.
Também no concelho do Vimieiro, os respectivos donatários desfrutaram de amplos poderes, mesmo após a derrogação das jurisdições
senhoriais decorrente da lei de 1790. D. João de Faro e Sousa, quinto
conde do Vimieiro, para além de ter preservado a sua ouvidoria senhorial
até 1799 e continuado a nomear o respectivo ouvidor, prosseguiu no
exercício do direito de nomeação de um juiz ordinário e manteve os
direitos adquiridos por via de doações régias, como a dada das justiças
e o provimento dos oficiais camarários87. Estes dois casos ilustram, pois,
a diversidade das modalidades de nomeação de justiças, assim como
exemplificam que a prática corrente podia substituir-se à legislação sobre
a nomeação das justiças senhoriais.
Relativamente a Penela, os duques de Aveiro terão exercido duas
das modalidades: primeiro, apenas a confirmação das justiças e depois,
a partir da década de 1640, começado a exercer o privilégio de dada,
como aliás se detecta nas várias pautas que chegaram a Penela. Logo em
1641, primeiro ano em que se regista a chegada e a abertura das pautas
Rodrigues, José Damião – Poder municipal e oligarquias urbanas (…),
op. cit., pp. 279-293.
87
Fonseca, Teresa – Administração senhorial e relações de poder (…), op. cit.,
pp. 46-49.
86
- 68 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
das justiças, é referida a «carta de Sua Excelência de comfirmaçam dos
oficiais que ham de servir»88. Foi em todo o caso um exemplo único.
Excepto os anos cujas pautas nada especificam relativamente ao
conteúdo das nomeações, o registo das listas enviadas pelos duques
a partir de 1645 demonstra que estes mandavam servir89. No período
durante o qual os oficiais da Câmara foram nomeados pela Coroa
(1673-1732) a fórmula empregue foi a mesma: Sua Majestade mandava,
ordenava ou havia por bem que determinados homens servissem de
vereadores e de procuradores do concelho90. O ano de 1733 marcou a
retoma da constituição dos mandatos por iniciativa ducal e nas pautas
enviadas por D. Gabriel de Lencastre a partir desse ano era declarado
que os indivíduos eram «eleitos»91. Na década de cinquenta, cujas pautas
conhecemos somente a partir de 1754, manteve-se o mesmo princípio:
os oficiais eram «nomeados» por D. José de Mascarenhas92.
Nos primeiros anos as pautas das justiças continham mais especificações. Em 1641, o documento recebido pela Câmara ordenava que se
remetesse a pauta ao ouvidor de Montemor-o-Velho com o objectivo
de se verificar se algum dos eleitos tinha «culpas ou se sam livres para
servirem os ditos cargos»93. Apesar de esta recomendação ser registada
em apenas duas ocasiões (1641 e 1645), terá sido até então uma prática
regular, pois na pauta recebida neste último ano era ordenado à Câmara,
em cessação de funções, que informasse o ouvidor «como he costume»94.
Depois destes anos, não se encontra referência alguma sobre a interferência
CEHLRSDA – Vereação de 11 de Fevereiro de 1641 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fl. 86v.
89
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1644-1645), fl. 121 e
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1670-1673), fls. 26v, 66v e 108.
90
Embora a partir de 1727 não se refira mais o acto pelo qual os vereadores
e procuradores eram designados pelo rei – cf. CEHLRSDA – Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fls. 33, 65v, 91v, 116, 140v, 170, 190, 220, 242,
279 e 31.
91
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736), fls. 131v,
156 e 389.
92
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fls. 16,
60, 105v, 144v e 185v.
93
CEHLRSDA – Vereação de 11 de Fevereiro de 1641 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fl. 86v.
94
CEHLRSDA – Vereação de 16 de Janeiro de 1645 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fl. 116.
88
- 69 -
Cristóvão Mata
do ouvidor nas eleições das justiças locais, pelo que podemos considerar
que a constituição das vereações possa ter sido realizada à distância e
com pouca informação sobre Penela.
A 3 de Janeiro de 1672 chegou à vila a pauta referente ao ano que
então se iniciava, sendo nela inscrito o nome de Miguel de Almeida para
procurador do concelho. De imediato «ordenaram elles officiaes que
[…] se escrevesse a Sua Excelencia sobre não aver nesta villa e termo
[nenhum] Miguel Almeida»95. Embora invulgar, esta situação não foi
inédita. Anos depois, em 1736, a substituição de um primeiro vereador
eleito que não tomara posse do cargo apontava o nome de João Freire
Borracho, pelo que a Câmara informou D. Gabriel de que não havia
ninguém assim chamado na vila e no seu termo96.
Tratou-se de situações pontuais, e em certa medida, como em 1672,
justificáveis: Manuel Almeida sucedeu a Miguel Almeida97, sendo por
isso admissível considerar que a semelhança dos nomes tenha propiciado
a confusão. Não é, todavia, de descurar a hipótese de que, no processo de
nomeação das justiças, a Casa de Aveiro tivesse designado a motu proprio
os vereadores e procuradores do concelho. De facto, o estudo de Sérgio
Soares sobre a Casa de Aveiro e o concelho da Lousã, no século XVIII,
aponta para que, durante as administrações de D. Gabriel de Lencastre
e de D. José de Mascarenhas, não se tenha seguido o modelo definido
pelas Ordenações Filipinas. O que ao longo desta centúria ocorreu
foi, segundo o autor, a feitura das pautas com a presença do ouvidor
de Montemor-o-Velho, cabendo depois ao duque a nomeação a partir
dos róis recebidos ou, em certos momentos, a nomeação de indivíduos
não arrolados98.
CHELRSDA – Vereação de 3 de Janeiro de 1672 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1670-1673), fls. 65v-66.
96
CEHLRSDA – Vereação de 13 de Fevereiro de 1736 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fl. 296-296v.
97
CEHLRSDA – Vereação de 31 de Janeiro de 1672 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1670-1673), fl. 69.
98
Soares, Sérgio Cunha – “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã (…)”, art. cit.,
pp. 45-46.
95
- 70 -
– IV –
Orgânica e modos de funcionamento de um poder local
Na primeira parte deste estudo apresentámos sucintamente o substrato
legal e institucional do poder municipal em Penela. Mais especificamente,
referimos os vários diplomas foralengos pelos quais se outorgou
ou confirmou a autonomia política e administrativa da comunidade
penelense, os canais de comunicação institucional entre o poder local e
as instâncias superiores de jurisdição de segunda instância, os agentes
jurisdicionais enquadrados nestas estruturas de poder régio e senhorial e
a existência de circunscrições administrativas situadas dentro do termo
concelhio. Foram também enunciados os diversos senhores que Penela
conheceu desde a Idade Média até meados do século XVIII, concedendo
maior enfoque à Casa de Aveiro, cujos titulares estavam dotados de
privilégios bastante amplos e detinham poderes efectivamente políticos.
Por conseguinte, extravasámos ocasionalmente os limites do período que
nos propusemos estudar e até da própria temática em debate: o poder
local em Penela.
A abordagem a este assunto, que agora iniciaremos, incide fundamentalmente sobre o funcionamento regular da Câmara Municipal de Penela
– portanto, sobre os processos e as dinâmicas de governação e não tanto
na estrutura legal e institucional que o sustentavam. Ancora-se, por isso,
nos livros de actas de reuniões da Câmara datados entre 1640 e 1761 e
que nos permitem identificar os cargos camarários que compunham o
governo concelhio, os indivíduos nomeados para os ocupar e as matérias
que mais comummente foram discutidas pela vereação.
Os cerca de duzentos anos que nos propomos estudar não correspondem a um período continuamente documentado. No entanto, as fontes
- 71 -
Cristóvão Mata
consultadas, pela sua regular distribuição no decorrer deste tempo,
constituem uma excelente amostra. De 1640 até ao final do século existem
quatro livros de actas que conservam os registos dos actos de governação
nas décadas de quarenta1, setenta2 e noventa3. Para o século XVIII existem
apenas três livros. Porém, reportam-se a períodos bem mais extensos do
que os anteriores e de importância inquestionável, registando os anos
correspondentes à transferência da jurisdição da Coroa para D. Gabriel
de Lencastre e, não obstante a visível censura de que foi alvo, à extinção
da Casa de Aveiro4. Infelizmente, os dois únicos livros do século XIX não
alcançam o ano de 1834, mas registam contínua e quase integralmente a
década de 18105. Todos estes nove livros documentam quarenta e nove
anos correspondentes a quarenta e cinco mandatos de periodicidade
anual, dois dos quais prolongados por mais algum tempo.
1. O exercício do poder político atribuído ao governo municipal
pressupõe a existência de uma estrutura institucional legalmente
consignada que garanta as condições necessárias à sua efectivação.
Por seu turno, o aparelho municipal do concelho de Penela, para além
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1640-1641) e Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1644-1645).
2
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1670-1673).
3
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696).
4
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727); Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1727-1736) e Livro de Actas de Sessões da Câmara
(1753-1761). O título deste último livro indica que se inicia em 1752; todavia a
primeira acta datada corresponde à vereação de 22 de Julho de 1753 (cf. fls. 26-27).
Conforme se verifica pela numeração dos fólios, foram arrancadas dez folhas
correspondentes a um período compreendido entre o mês de Novembro de 1758 e
5 de Fevereiro de 1759. A amputação do livro deveu-se certamente à extinção da Casa
de Aveiro. O processo movido a D. José de Mascarenhas e aos marqueses de Távora
na sequência do atentado a D. José, iniciado em Dezembro de 1758 e concluído em
Janeiro seguinte, determinava a anulação de todas as doações e a cassação de todos
os documentos que mencionassem a existência da Casa de Aveiro, pelo que é de
considerar que estes fólios contivessem algum registo sobre o episódio. Sobre este
assunto, veja-se Azevedo, Pedro de – O Processo dos Távoras. Lisboa: Tipografia
da Biblioteca Nacional, 1921.
5
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1813-1818) e Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1818-1820).
1
- 72 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
da materialização do poder-mando, como já foi designado6 – isto é, das
infra-estruturas associadas a funções diversas, umas de utilidade prática
(a casa da Câmara e a cadeia, por exemplo), outras meramente simbólicas
(o pelourinho) –, compunha-se de agentes próprios que desempenhavam as funções governativas conforme as suas competências legais.
Como se verificou no capítulo anterior, a Casa de Aveiro, donatária da
vila, dispunha da prerrogativa de nomeação quer dos ofícios de estatuto
mediano, quer dos ofícios honorários.
Por ofícios honorários referimo-nos a cargos que foram «desempenhados por titulares eventuais (e não de carreira) escolhidos pelas populações
e, em princípio, não remunerados», cujo interesse derivava do «prestígio
que lhes era inerente»7: os juízes ordinários, os vereadores e os procuradores do concelho. Os primeiros eram oficiais de justiça a quem cabia
atribuições que, todavia, ultrapassavam o campo jurisdicional. Competia-lhes a administração da justiça local, mas ainda a manutenção da ordem
pública, a defesa da jurisdição real e o auxílio aos vereadores no exercício
das suas funções governativas8.
Tanto quanto as fontes nos permitem afirmar, a Câmara de Penela
integrou dois juízes ordinários até 1673: a 6 de Julho, data da última
reunião registada neste livro, ainda marcavam presença no senado os
juízes ordinários D. Manuel Velasques Sarmento e Matias de Lemos
Ferreira9. Esta magistratura foi substituída pela de juiz de fora, um cargo
com as mesmas funções mas de carreira e ocupado obrigatoriamente por
letrados10, com jurisdição nos concelhos de Penela, da Lousã e, depois da
extinção da Casa de Aveiro, no de Serpins11. À semelhança de que ocorria
nas terras da Casa de Bragança12, o privilégio de nomeação de juízes de
Coelho, Maria Helena da Cruz e Magalhães, Joaquim Romero – O poder
concelhio (…), op. cit., p. 36.
7
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 164.
8
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit.,
pp. 170-171.
9
CEHLR-SDA – Vereação de 6 de Julho de 1673 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1670-1673), fl. 138v.
10
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 171.
11
Soares, Sérgio Cunha – “O Ducado de Aveiro e a vila da Lousã (…)”, art. cit.,
p. 68.
12
Bragança, Chaves e Barcelos em 1549; Vila Viçosa em 1551; Monsaraz,
Arraiolos, Borba e Alter do Chão em 1567 e Monforte antes de 1579 – cf. Cunha,
Mafalda Soares da – A Casa de Bragança (…), op. cit., p. 229.
6
- 73 -
Cristóvão Mata
fora podia ser exercido apenas sobre alguns concelhos e a sua introdução
nas orgânicas de governo de cada terra realizada individualmente.
Em 1759, dentre as terras que estavam sujeitas à jurisdição da ouvidoria
de Montemor-o-Velho, apenas as câmaras de Abiul e de Pereira eram
presididas por juízes ordinários13, mas a Câmara de Aveiro incorporava
um juiz de fora desde pelo menos 155514.
A primeira referência documental à presença do juiz de fora em Penela
data de 25 de Abril de 169215: o Doutor Manuel Ferreira da Silva, depois
substituído pelo Doutor António Homem Magalhães de Corte Real na
vereação de 18 de Agosto do ano seguinte16. Considerada a duração de
três anos de cada mandato desta judicatura, o primeiro juiz de fora de
cuja existência a documentação certifica terá sido empossado em 1690.
De facto, um tombo da Lousã, datado de 1691, refere um juiz de fora
nomeado pela Coroa em exercício de funções17, que muito possivelmente
seria o referido Manuel Ferreira da Silva.
No entanto, existem indícios que sugerem que a introdução desta
judicatura em Penela poderá ter datado de um período anterior. Segundo
Delfim José de Oliveira, o primeiro juiz de fora foi empossado em 1686.
A hipótese parece-nos válida pois, embora não tenhamos conhecimento
de nenhum registo desse ano, o autor das Notícias de Penela cita o
auto de posse do magistrado18. Acreditamos contudo na possibilidade
de o primeiro juiz de fora ter sido nomeado alguns anos antes; mais
precisamente, após o falecimento do duque D. Pedro e aquando do início
do período de administração da Casa de Aveiro pela Coroa, que poderá
ter acompanhado uma reconfiguração da orgânica governativa19.
ANTT – Dicionário Geográfico (…), cit., Volume 24, fl. 1466.
Ano de que data uma carta pela qual o duque D. João se dirige «a vos juiz de
fora vereadores e procurador do concelho da dita minha villa d’Aveiro», citada em
Neves, Francisco Ferreira – “A Casa e Ducado (…)”, art. cit., p. 24.
15
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fl. 1.
16
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 29-29v.
17
Campos, Maria do Rosário Castiço de – A Lousã no século XVIII (…),
op. cit., p. 36, n. 21.
18
Oliveira, Delfim José – Noticias de Penela (…), op. cit.., p. 164.
19
Na sequência do falecimento sem descendência de D. Pedro de Lencastre,
a 23 de Abril de 1673, foi nomeado para administrador da Casa de Aveiro Jorge de
Franca, a 22 de Maio do mesmo ano, tendo sido substituído por António Freitas
Branco e este, em 1709, por Manuel Caetano Lopes Lavre. Este último deve ter
13
14
- 74 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Em 1733 foi suspenso o Doutor Manuel Antunes da Fonseca, juiz de
fora nomeado pela Coroa a 20 de Fevereiro do ano anterior20, por não
desejar servir às ordens de D. Gabriel de Lencastre21, que então assumia
a chefia da Casa de Aveiro e tomava a jurisdição de Penela. Os oficiais
mandatados para esse ano prosseguiram no exercício das suas funções
para as quais haviam sido designados e somente no ano seguinte foi
nomeado o primeiro juiz de fora pela Casa de Aveiro, o Doutor José
de Almeida Ramos22. Na sequência da extinção da Casa de Aveiro não
ocorreu a imediata substituição do juiz de fora: o Doutor Roberto António
Xavier de Oliveira França, empossado por D. José de Mascarenhas a
6 de Outubro de 175723, manteve-se em exercício de funções até o Doutor
Salvador Pereira da Silva ser designado para o cargo e assumi-lo a 1 de
Fevereiro de 176024.
Durante todo este período, a Câmara foi composta por três vereadores
e um procurador do concelho. Contrariamente aos juízes ordinários, os
primeiros eram oficiais de governo a quem cabia a defesa das jurisdições
locais, a gestão dos bens do concelho, a administração das despesas e a
cobrança dos impostos, entre outras responsabilidades – enfim, todo um
mantido funções até 1726, dado que nesse ano o seu filho apresenta um relatório
sobre o desempenho do pai enquanto administrador da Casa de Aveiro – cf. Academia
das Ciências de Lisboa – Série Azul, 276; sobre as nomeações dos anteriores, vide
AHMC – Provisões Antigas (1518-1703), fl. 197-198v; Arquivo da Universidade
de Coimbra – Livro do Tombo de Lamas, Vila Verde e Pedaçães (1500-1703),
fl. 160 e Livro Primeiro do Tombo do Amieiro I, Montemor-o-Velho (1451-1711),
fls. 82v-83v.
20
CEHLRSDA – Auto de posse do Doutor Manuel Antunes da Fonseca, juiz
de fora enviado por Sua Majestade, a 20 de Fevereiro de 1732 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fls. 129v-130.
21
CEHLRSDA – Vereação de 16 de Setembro de 1732 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fls. 140v-141.
22
CEHLRSDA – Auto de posse do Doutor José de Almeida Ramos, juiz de fora
enviado pelo Duque de Aveiro, a 7 de Abril de 1734 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fls. 202v-203v.
23
CEHLRSDA – Auto de posse do cargo de juiz de fora desta vila dado ao
Doutor Roberto Antonio Xavier de Oliveira Franca [a 6 de Outubro de 1757] in
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fls. 194-194v.
24
CEHLRSDA – Auto de posse do Doutor Salvador Pereira da Silva, juiz de
fora enviado por Sua Majestade, a 1 de Fevereiro de 1760 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1752-1761), fls. 232-232v.
- 75 -
Cristóvão Mata
conjunto de atributos de natureza económica e financeira, mas sobretudo
política25. Em algumas ocasiões, quando nas reuniões não comparecia
nenhum dos juízes ordinários nem, numa fase posterior, o juiz de
fora, o vereador mais velho assumia provisoriamente a presidência da
Câmara, sendo designado em acta como «vereador mais velho e juiz pela
ordenação»; noutras, quando algum dos mandatados pelo donatário ou
pela Coroa não marcava presença na reunião, a restante Câmara nomeava
um indivíduo para vereador «de barrete», geralmente alguém que já
havia servido como vereador – sessões houve cujo funcionamento foi
inteiramente assegurado por vereadores substitutos. Do mesmo modo,
o procurador do concelho, a quem cabia agir em nome do concelho e,
por falta de oficial próprio, desempenhar as funções de tesoureiro26,
foi ocasionalmente substituído por procuradores de barrete.
Os juízes ordinários, os vereadores e os procuradores do concelho
eram mandatados para um período anual, embora, por duas ocasiões,
os indivíduos nomeados tenham continuado a servir por mais tempo.
A 14 de Abril de 1730 chegou a Penela a pauta pela qual Sua Majestade
nomeava para o cargo de vereador João Pereira Franco, José de Oliveira
Moniz e Sebastião Jorge e para procurador do concelho Augusto Teixeira27.
Apesar de pouco tempo depois Sebastião Jorge, por «segunda pauta», ser
substituído por Cláudio José da Rosa Furtado e de Domingos Silveiro
substituir Augusto Teixeira28, a vereação eleita nesse ano manteve-se em
exercício de funções até 6 de Março de 1732, quando chegou nova pauta e
os indivíduos nomeados tomaram juramento29. Também a última Câmara
eleita pela Casa de Aveiro foi alvo de um prolongamento de mandato30.
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 161.
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 163.
27
CEHLRSDA – Vereação de 14 de Abril de 1730 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fl. 69.
28
A 14 de Abril foi dado juramento a Cláudio José da Rosa, mas recusou-se o
juiz de fora a dá-lo a José de Oliveira Moniz, que só tomou posse a 9 de Setembro,
«nem tambem se deo no mesmo dia ao procurador segundo aos [sic] nomeado
em nova ordem Domingos Silveiro dos Casais e so se lhe deu em des de junho»
– cf. CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736), fl. 72 e 79.
29
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Março de 1732 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fl. 131.
30
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Janeiro de 1758 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1753-1761), fl. 185.
25
26
- 76 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Ao longo dos anos seguintes nunca se verificou a chegada de nenhuma
pauta, nem o juramento de oficiais substitutos, sendo referidos na
acta da última reunião do livro o vereador Pedro José de Salazar
Jordão, o procurador Simão Mendes e os vereadores de barrete José
Marcos Teixeira Evangelho Gomes Colaço Sarmento e António Lopes
da Encarnação31.
Havia ainda uma panóplia de oficiais menores responsáveis por
determinadas tarefas, como o escrivão da Câmara, encarregado de registar
todos os actos camarários, o porteiro, cujas tarefas passavam por servir
de ponte de comunicação entre a Câmara e a população32, e tantos outros
cargos cujo provimento era da competência da Casa de Aveiro, como
comprova o excerto das Memórias Paroquiais atrás citado. Da nomeação
dos juízes ordinários, dos vereadores e dos procuradores do concelho
também se ocuparam os duques de Aveiro, primeiro confirmando as
eleições locais, e, depois da década de 1640, designando-os directamente.
Durante o período em que coube à Coroa a investidura dos ofícios
honorários, que na nossa análise corresponde somente aos finais do
século XVIII e princípios do XIX, foi seguindo o método determinado
pela Ordenações Filipinas e pela legislação elaborada no decorrer do
século XVII que se constituíram as câmaras. Os registos completos das
eleições realizadas a cada três anos ilustram de um modo simples o
processo eleitoral: o corregedor de Coimbra deslocava-se à vila, onde
mandava reunir a gente da governança, a nobreza e o povo. Estes, a mais
votos, escolhiam seis eleitores para, aos pares, elaborarem três listas de
elegíveis. A partir dos nomes mais votados elaborava-se uma lista final
cujos arrolados, depois de confirmados pelo corregedor com base nas
informações prestadas por dois ou três indivíduos, eram anualmente
nomeados pelo Desembargo do Paço.
Conforme se ilustra em anexo, verifica-se que até à década de 1720
as pautas das vereações nomeadas chegaram quase sempre no primeiro
mês do ano; depois, de modo bastante irregular. A relação entre a data da
chegada das pautas e o início do mandato, assim considerado tomando-se
por indicador o mês em que ocorreu a primeira tomada de juramento dos
juízes ordinários ou dos vereadores nomeados, revela que doze vereações
CEHLRSDA – Vereação de 8 de Abril de 1761 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1753-1761), fls. 266-269.
32
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit., p. 168.
31
- 77 -
Cristóvão Mata
iniciaram as suas funções no mesmo mês em que haviam chegado as
nomeações. Nomeadamente, em Janeiro (4), Fevereiro (1), Março (5),
Abril (1) e Maio (1), ao passo que nos restantes casos a diferença entre
os dois actos vai de um a dois meses. Porém, a prontidão com que o
primeiro oficial tomava juramente não significa que as vereações se
constituíssem de imediato, pois o juramento do último oficial podia
demorar bastante tempo desde a chegada das pautas. Com efeito,
em vinte e cinco de quarenta e um mandatos para os quais temos registos,
o empossamento das justiças arrastou-se por algum tempo – um (9),
dois (3), três (5), quatro (2), cinco (4) sete (1) e oito (1) meses –,
sendo a diferença de meses mais acentuada detectada nos anos de 1696,
1716, 1718, 1726, 1728, 1730-1731, 1756 e 1758-176133.
Esta disparidade entre a chegada das pautas, o início do exercício de
funções governativas e a demora em certos oficiais tomarem juramento
justifica-se, do nosso ponto de vista, pela situação instável em que se
encontrava a Casa de Aveiro. Como vimos, D. Gabriel de Lencastre
herdou o título ducal e o património material e jurisdicional somente em
1732. Todavia, o processo que disputava com outros candidatos havia
sido resolvido em seu favor inicialmente a 12 de Fevereiro de 1720.
Foi, no entanto, embargado pelos procuradores régios, sendo posteriormente confirmado no «Juízo da Coroa» a 18 de Novembro de 1724,
ao que se seguiu nova petição, derrogada finalmente em 172934.
Com efeito, as datas-chave deste processo quase coincidem com alguns
daqueles mandatos em que se verifica uma relativa morosidade na
assunção dos cargos. Relativamente ao início do mandato, nos anos
1721 e de 1725 é detectado um atraso de um mês e no de 1730, que se
prolongará pelo ano seguinte, dois meses. Opostamente, entre 1732 e
1736 os meses de chegada das pautas e os meses de investimento do
primeiro oficial coincidem. No mesmo sentido, os anos de 1726, 1728 e
1730-1731 correspondem aos mandatos cujo último oficial a assumir o
cargo para o qual era designado mais tempo demorou a fazê-lo.
Assim, parece-nos admissível considerar que, estando informados do
decorrer deste processo, alguns dos indivíduos nomeados adiariam a sua
Cf. Gráfico 2. Relação entre as datas de chegada das pautas, do início dos
mandatos e do juramento do último oficial, em Anexos, p. 141.
34
Neves, Francisco Ferreira – “A Casa e o Ducado de Aveiro (…)”, art. cit.,
pp. 67-72.
33
- 78 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
tomada de posse em função das fidelidades devidas à Coroa ou à Casa
de Aveiro. Como veremos, o perfil das vereações deste período define-se
fundamentalmente pela sua ligação à Casa de Aveiro, que é o mesmo
que dizer que o seu recrutamento era feito a partir de redes clientelares
da entidade senhorial, e o imediato acatamento de uma ordem vinda da
Coroa podia colocar em causa a fidelidade dos nomeados aos duques
seus senhores. De resto, mas numa lógica inversa, o pedido de escusa
de funções que em 1733 o Doutor Manuel Antunes da Fonseca, juiz de
fora, requereu, e foi deferido, exemplifica o quão importante era a fonte
de legitimação do poder exercido.
A concretização formal do poder municipal, das competências
atribuídas pela Casa de Aveiro ou pela Coroa aos indivíduos que
compunham a Câmara, processava-se mediante a reunião de todos
os oficiais concelhios e, por vezes, com a nobreza da terra, a gente
da governança e o povo dela. São os registos destas sessões que nos
permitem, por um lado, estabelecer algumas conclusões sobre os assuntos
discutidos em Câmara, mas por outro, mediante tratamento estatístico,
avaliar as dinâmicas de governação do poder concelhio. A passagem a
escrito destes actos que correspondem ao funcionamento regular das
câmaras indicam pois, por parágrafo e de um modo mais desenvolvido,
os temas tratados institucionalmente; em preâmbulo, quase sempre,
registam-se o local de reunião, a data da sua ocorrência, os indivíduos
que em função dos cargos que desempenhavam marcavam presença.
A maioria das sessões ocorria na casa da Câmara, mas por motivos vários,
em certas ocasiões os juízes, vereadores e procuradores reuniram-se nas
suas casas de residência, o que, como atrás se viu, podia significar uma
sede informal do poder político.
As Ordenações Filipinas determinavam que as reuniões deveriam
realizar-se duas vezes por semana, às quartas-feiras e aos sábados (Livro I,
Título LXVI, § 1)35. Por duas ocasiões, os vereadores procuraram obrigar-se a cumpri-la36, mas na prática, como indica o número de reuniões por
Almeida, Cândido Mendes de (org.) – Codigo Philippino (…), op. cit., p. 145.
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Abril de 1644 in – Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fl. 35v; e Vereação de 25 de Janeiro de 1645 in – Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1644-1645), fl. 126. De referir que, neste último caso,
a elaboração da postura decorria de um provimento do ouvidor, ao qual, em todo o
caso, não se faz menção. Noutra ocasião, procuraram que em todas as sextas-feiras
35
36
- 79 -
Cristóvão Mata
mandato, a regularidade dos encontros dos oficiais da Câmara de Penela
ficou muito aquém do que legalmente era previsto. De um modo geral,
parece que os actos decisórios foram diminuindo com o decorrer dos anos.
Na década de 1640, o número de reuniões cifra-se acima dos vinte e cinco
e na de 1670 decresce ligeiramente (acima das vinte), estabilizando-se
na última década deste século, e assim se mantendo ao longo do seguinte
(acima das quinze), excepto em casos pontuais, para finalmente sofrerem
um ligeiro decréscimos entre 1814 e 1819. Algumas das excepções à
média das reuniões ocorridas entre 1690 e 1761 ocorreram precisamente
na década de 1720: em 1721 realizaram-se somente doze reuniões;
em 1728 e 1729, respectivamente dez e oito; e no mandato de 1730-1731,
vinte (sete no primeiro ano, treze no segundo)37.
Ao nível das participações colectivas por ofício38, verifica-se que a
actuação dos juízes ordinários caracteriza-se por uma taxa de participação
nos actos camarários inferior em relação às dos restantes membros,
excepto na década de 1670. A adesão dos procuradores é, por seu turno,
bastante inconstante ao longo do tempo: registam-se descidas e subidas
bastante bruscas a partir de 1670. Especialmente acentuada foi a ocorrida
entre 1715 e 1723, quando a média das presenças daquele primeiro ano
desce dos 80% aos 5%, em 1717. Em 1723 recuperam-se os valores de
participação atingidos anteriormente, registando-se uma oscilação entre
90% e os 50%. Uma nova descida, não tão acentuada como a de 1715-1723, mas que todavia se destaca, ocorreu entre 1730-1731 e 1736.
Na primeira metade da década de cinquenta do século XVIII, as assimetrias da curva não foram muito díspares, situando-se entre os 50% e os
78%. Seguiu-se uma subida considerável e as participações atingiram
de tarde se reunisse a Câmara – cf. CEHLRSDA – Vereação de 31 de Julho de 1694
in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fl. 67v.
37
Cf. Gráfico 3. Número de reuniões por mandato, em Anexos, p. 142. Alguns
dos anos ali representados referem-se a mandatos cujo registo está muito longe
de se encontrar completo. Por isso, o desempenho geral da Câmara cifra-se
obrigatoriamente por um número de reuniões inferior ao real (1641, 1645, 1670,
1673, 1692, 1696, 1753, 1813 e 1820). Noutros casos, o respectivo livro não regista
integralmente o mandato, mas as omissões corresponderão a escassas semanas,
ou até dias (1640, 1644, 1715 e 1736).
38
Cf. Gráfico 4. Percentagem média de participações dos oficiais por mandato,
em Anexos, p. 143.
- 80 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
alguma regularidade e até uma elevada taxa de participação (79% e os
100%) que se manterá nos mandatos do século XIX.
No caso dos vereadores, a evolução da curva das suas participações nas
reuniões da Câmara é também bastante irregular. Até 1715, mantiveram
uma assiduidade quase sempre inferior à participação dos procuradores
(entre 88% e 40%); depois desse ano ocorreu uma subida considerável,
que situou os valores entre os 93% e os 76%. No mandato de 1730-1731 deu-se início a uma descida de valores, primeiro até aos 58%,
e, no ano seguinte, aos 35%. Mas os restantes anos da década 1730
caracterizam-se por uma adesão bem mais elevada, entre os 64% e os
77%. As taxas referentes aos primeiros anos da década de cinquenta são
ligeiramente inferiores, mas a descida acentuou-se em especialmente
em 1757 (42%) e mais vincadamente no mandato de 1758-1761 (29%).
O século XIX foi, de resto, mais regular, atingindo-se uma taxa de adesão
consideravelmente elevada, entre 63% e 77%, excepto nos anos de 1819
e 1820 (38% e 50%, respectivamente).
Contudo, os dois casos, dos procuradores e dos vereadores, são
distintos entre si. Enquanto a percentagem dos primeiros é efectivamente
a de cada titular, no caso dos vereadores o que se apresenta é um valor
médio relativo à assiduidade dos três vereadores mandatados para
determinado ano. Assim, a maior ou menor taxa de participação, ou
até a completa ausência, de cada indivíduo no exercício das funções
decorrerá da própria configuração social das vereações. Como à frente
veremos, a evolução do perfil social dos vereadores foi acompanhada
de um progressivo estreitamento do canal de acesso à Câmara e,
por conseguinte, da diminuição do grau de rotatividade de homens pelo
poder, mas também propiciou que determinados indivíduos, em função
do seu estatuto, tenham recusado assumir os postos para os quais eram
nomeados, o que explicará muitas das variações de participação em
determinadas circunstâncias.
2. A 15 de Dezembro de 1640 reuniram-se o vereador mais velho
e juiz pela ordenação Felício de Amorim Leite, os vereadores Filipe
Travassos Cabral e João Pessoa de Figueiredo, o procurador do concelho
António Vaz e todos «os omens nobres e os da governança da dita villa».
Foi então tomado conhecimento da aclamação de D. João IV, em virtude
do que foi pedido aos convocados um parecer para os oficiais da Câmara
«ordenarem o que for em mais serviso de Deos e deste reino e povo».
- 81 -
Cristóvão Mata
Os homens nobres e da governança declararam que «aseitavaõ por seu
rei ao dito Dom Joaõ o quarto e per tal o conhesiaõ e queriaõ obedeser
d’oje em diante e o queriaõ servir como seu rei e senhor». A Câmara,
«em nome desta villa e seu termo», aceitou D. João IV como rei e
permitiu que lhe fosse prestada vassalagem, tendo por fim os dezanove
indivíduos da nobreza e da governança presentes na sessão rubricado o
auto de reconhecimento da soberania39.
O episódio relatado é bastante ilustrativo quanto a alguns aspectos do
funcionamento da Câmara que aqui pretendemos apresentar. Exemplifica
que, embora a Câmara estivesse dotada da autoridade necessária, e até
de autonomia, para gerir a comunidade local, por vezes era necessária
uma legitimidade fundamentada na vontade da população. Naquela
ocasião foi ouvida a voz de uma minoria numericamente inexpressiva
à qual correspondia uma elite social («omens nobres») e política
(«governança»), mas noutros casos, como quando foram convocados
o povo e a gente da governança da vila e do termo para se elaborarem os capítulos de cortes40, recorreu-se a uma base populacional de
maior amplitude.
Também demonstra que ao órgão municipal competia a responsabilidade
de decidir em nome da comunidade que governava. De facto, embora
se tenha escrutinado a nobreza e a governança, foi aos oficiais da
Câmara que coube permitir a prestação de vassalagem. Mas se a eles
competia representar a população local, também ocasiões houve em que
mandataram indivíduos com os poderes necessários para representarem
o concelho: cerca de uma semana depois de se conhecer o ocorrido em
Lisboa, foram eleitos Gaspar do Rego Evangelho e Salvador de Morais
Cabral para assistirem às cortes que se realizaram nesse ano41.
Mas a acta da vereação de 15 de Dezembro de 1640 representa
fundamentalmente o reconhecimento simbólico da soberania régia que,
longe de se resumir a este episódio, ocorreu ao longo do período estudado.
Nomeadamente, por ocasião de acontecimentos vividos pela Casa Real,
CEHLRSDA – Vereação de 25 de Dezembro de 1640 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fls. 70v-71.
40
CEHLRSDA – Vereação de 2 de Janeiro de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fls. 78-78v.
41
CEHLRSDA – Vereação de 1 de Janeiro de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fls. 75-76
39
- 82 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
como nascimentos, casamentos e óbitos reais, ou pelo simples facto de se
querer glorificar a pessoa régia, de que é exemplo a contundente ordem
pombalina que chegou a Penela a 8 de Março de 1758 para se festejar
o dia de São José em honra do monarca42. Naqueles casos de carácter
mais pontual, a Câmara era informada do ocorrido e, aparentemente,
responsabilizada por garantir a celebração do episódio. Em 1695,
por exemplo, uma carta dava notícia de um nascimento real e os oficiais
decidiram lançar pregão para convocar todas as pessoas da vila e do
termo e ordenaram que se repicassem os sinos43. Em 1716, os festejos
foram ligeiramente diferentes: informada do mesmo, a Câmara ordenou
que todas as pessoas, independentemente da sua qualidade, acendessem
luminárias por três dias nas janelas de suas casas44. Em 1816, a notícia foi
menos feliz. A 20 de Julho desse ano, o juiz de fora Agostinho António
Fragoso de Carvalho informou os vereadores e o procurador do concelho
do falecimento da rainha D. Maria, tendo estes ordenado que a vila se
cobrisse de luto rigoroso por um período de um ano e meio seguido de
mais seis meses de luto aliviado45.
Estes são episódios que constatam o reconhecimento da soberania
régia, todavia de carácter mais simbólico do que efectivo, ordenado
pelas instâncias do poder central e executado por um governo autárquico
raramente contestado. De facto, foram extremamente escassas as
ocasiões em que se verificaram altercações populares que afrontaram
o poder municipal. Não se adequam ao conceito de economia moral da
população, pois não revelam enquadrar-se «[n]um consenso popular
a respeito do que eram práticas legitimas e ilegítimas na actividade
do mercado», nem aos motins da fome de carácter espasmódico a que
se opõe aquele primeiro conceito46. Antes parecem ser manifestações
individuais de indignação provocadas por uma decisão da Câmara que
CEHLRSDA – Vereação de 8 de Março de 1758 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fl. 210.
43
CEHLRSDA – Vereação de 26 de Março de 1695 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1692-1696), fls. 89v-90.
44
CEHLRSDA – Vereação de 12 de Maio de 1715 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 48v.
45
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Julho de 1816 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fls. 166v-167.
46
Thompson, Edward Palmer – A Economia Moral da Multidão na Inglaterra
do Século XVIII. Lisboa: Antígona, 2008, p. 23.
42
- 83 -
Cristóvão Mata
agravava a situação financeira de alguém. Ou mais claramente, o reflexo
de um sentimento de aversão à excessiva carga tributária que se fez
sentir durante a Guerra da Restauração, período durante o qual, aliás,
se registam as únicas ocorrências de contestação a decisões camarárias.
Logo em 1644 foi lançado o rol da sisa da vintena da Ribeira a
António Fernandes, da Ponte do Espinhal, «o qual como sobrebo
e pouco temente as justicas […] disse com muita arogancia contra
elles officiaes […] que por lhe lancarem o dito rol os avia de meter
na devassa e lho aviam de paguar muito bem». Nesta circunstância, o
procurador do concelho requereu que o condenassem ao pagamento
das coimas previstas47. A trinta do mesmo mês, a Câmara foi informada
pelo procurador Simão Teixeira de que alguns dos condenados em
penas previstas nas posturas andavam a ameaçar os oficiais da Câmara
com uma devassa dos ouvidores e a descompô-los, chamando-os
«viloens muito ruis e infames erderios dos cargos que tinham e de
hum dos vereadores que hera homen de dous vintens com outras
mais palavras»48 que, muito possivelmente, a decência não permitiu
ao escrivão registar. Um dos acusados de desrespeito à autoridade,
Fernando Catarino, era almocreve residente no Espinhal e havia sido
condenado por não garantir o abastecimento de peixe como lhe havia
sido ordenado, e o outro, Simão Fernades Pinheiro, contestava o
lançamento do rol da sisa da vintena de Penela que lhe haviam feito.
Em ambos os casos o que motivava a contestação dos dois homens
era novamente a indignação perante os encargos financeiros que lhes
haviam sido atribuídos e que cada um deles considerava injustos.
Menos de dois meses depois, Simão Teixeira requeria a elaboração de
um auto do qual constasse que o rendeiro do duque de Aveiro, Francisco
Monteiro Colaço, que estava obrigado a reservar três quartos do cereal
para o povo da vila e do termo do concelho, ameaçara e proferira algumas
palavras contra os oficiais, especialmente o procurador, por este lhe
querer embargar o cereal que vendia para fora do termo concelhio49.
CEHLRSDA – Vereação em data não referida in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fls. 22-22v
48
CEHLRSDA – Vereação de 30 de Março de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fls. 31-31v.
49
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Maio de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fls. 56.
47
- 84 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
O motivo da indignação com a Câmara era uma vez mais do mesmo
teor: as decisões da Câmara prejudicavam de algum modo a situação
financeira do rendeiro da Casa de Aveiro.
No caso de Fernando Catarino e de Simão Fernandes Pinheiro, há
apenas uma referência na vereação de 6 de Abril a uma indicação para que
se procedesse na forma como era ordenado contra as pessoas que haviam
proferido «algumas palavras contra elles officiais»50. Mas, por sua vez,
Francisco Monteiro Colaço foi chamado à Câmara e informado de que
estava notificado para ter disponível três quartos do cereal. Respondeu
que possuía somente seis moios de trigo e que o resto compraria para
cumprir com a sua obrigação. No entanto, a vereação não considerou que
os seis moios correspondendessem ao montante a que estava obrigado
e, por isso, declarou que seria presente à justiça51.
O desfecho de cada um dos três episódios não foi registado, mas é
de crer que possam ter sido aplicadas coimas hipoteticamente previstas.
No caso do incumprimento da reserva dos três quartos pela parte do
rendeiro do duque de Aveiro, o cereal terá sido embargado. Disto queixava-se, aliás, Francisco Monteiro Colaço a respeito da actuação do
procurador e, de resto, foi o que se verificou noutras ocasiões semelhantes52. Relativamente à cobrança da sisa, a derrama do imposto nunca
indica um valor a ser pago por incumprimento de funções, mas sobre as
obrigações dos almocreves existem referências que sugerem a estipulação
de multas por incumprimento da obrigação. A 27 de Abril de 1641 foi
ordenado que Simão Pinheiro e Tomé Monteiro abastecessem de peixe
na semana que decorria e Domingos Rodrigues e Domingos Fernandes
na seguinte; todos eles eram almocreves destacados para aquele serviço
e os quatro, declarava o auto de obrigação, sujeitavam-se a uma pena
de quinhentos réis53.
Embora esta delegação de tarefas aos almocreves fosse menos comum
e na maioria das vezes se devesse aos preceitos religiosos da Quaresma,
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Abril de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fl. 35v.
51
CEHLRSDA – Vereação de 24 de Maio de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fls. 57-57v.
52
CEHLRSDA – Termo de embargo no seleiro [dos beneficiados a 9 de Janeiro
de 1753] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1753-1761), fls. 17-18.
53
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Abril de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fl. 106.
50
- 85 -
Cristóvão Mata
foi habitual a delegação de tarefas de carácter pontual em determinados
indivíduos ou a nomeação de gente para ofícios de âmbito municipal
mas de menor estatuto. No primeiro caso, é ilustrativa a nomeação de
Gaspar do Rego Evangelho e de Salvador de Morais Cabral para irem a
Lisboa, na qualidade de procuradores, assistir às cortes que se reuniram
em 164154. Inversamente, foi regular a nomeação de juízes pedâneos para
as treze vintenas que internamente repartiam o termo do concelho. Todos
os mandatos registados demonstram que uma das primeiras diligências
camarárias correspondia à nomeação destes oficiais e ocorria quase
sempre nas primeiras semanas de exercício de funções das vereações.
Periódicas eram também as nomeações dos oficiais responsáveis
pelo abastecimento do concelho. Segundo as Ordenações Filipinas,
os almotacés eram eleitos trimestralmente e aos pares a partir dos ofíciais
do mandato anterior: no primeiro trimestre, os dois juízes ordinários;
no segundo, os dois vereadores mais velhos; depois, um vereador e o
procurador do concelho (ou, caso a vereação fosse composta de quatro
vereadores, um vereador); por fim, o procurador e um homem eleito para
esse fim (Livro I, Título LXVII, §13)55. O levantamento dos almotacés
e das suas nomeação registadas nos livros de actas revela que são
relativamente raras as eleições e as tomadas de juramento. Somente em
1728 e 1754 são nomeados almotacés para os quatro trimestres e naquele
primeiro ano os últimos dois trimestres conhecem apenas dois almotacés.
De certo modo, isto podia decorrer do cumprimento do que a
legislação previa. No entanto, verifica-se que em boa parte dos casos
não se cumpriu as determinações legais, pelo que é de crer que, para
além de um certo desleixo por parte da Câmara nas nomeações para este
cargo, as irregularidades se devessem a outros factores, nomeadamente
a favorecimento pessoal. Em Coimbra, a partir de 1685 uma nomeação
para almotacé garantia o ingresso na governança e a obtenção do estatuto
de cidadão. Como atrás vimos, a pertença à gente da governança podia
traduzir-se no direito de participação nos actos decisórios da Câmara.
Assim, para além de simbolizar poder político, ser almotacé podia
corresponder a um estatuto elevado, como aliás ocorria em Coimbra,
onde a «governança adiciona uma honra de raiz institucional ao conceito
CEHLRSDA – Vereação de 1 de Janeiro de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fls. 75-75v.
55
Almeida, Cândido Mendes de (org.) – Codigo Philippino (…), op. cit., p. 156.
54
- 86 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
estamental de nobreza da terra que se vai esbatendo ao longo de
Setecentos»56. Deste modo, é de crer que alguns destes almotacés fossem
nomeados por via das relações pessoais que tinham com os indivíduos
que integravam a Câmara tendo em vista a sua inclusão no grupo da
governança e a promoção social.
A Câmara desfrutava também da prerrogativa de nomeação de muitos
outros agentes, segundo estatuíam as Ordenações Filipinas. A categoria
e o prestígio social advindo de cada um destes ofícios era, no entanto,
variável. De um lado, ofícios menores, como por exemplo, os alcaides
«pequenos», que por vezes coincidiam com o cargo de carcereiro57,
os porteiros e os quadrilheiros; do outro, ofícios de maior prestígio, como
o alcaide-mor, o capitão-mor do concelho e os oficiais subalternos destes,
os capitães de ordenança ou sargentos-mores. As áreas de intervenção
municipal eram, pois, bastantes diversas e, no tocante ao aspecto militar,
as funções da Câmara podiam ultrapassar a interferência no processo
de nomeação dos oficiais militares. De facto, as responsabilidades
municipais podiam ir da preparação dos caminhos para o trânsito das
tropas58 ao abastecimento das mesmas59, passando as suas atribuições
pelo recrutamento de homens de infantaria e cavalaria 60 ou até
mesmo pela requisição de cavalgaduras61, em todo o caso apenas em
casos esporádicos, como durante a Guerra da Restauração ou após as
Invasões Francesas.
Mais constantes foram os esforços da Câmara para cuidar do
património concelhio. São exemplo destas diligências as ordens para se
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra (…), op. cit., Volume II, p. 13.
CEHLRSDA – Auto de nomeação de alcaide de 16 de Dezembro de 1718 in
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 114.
58
CEHLRSDA – Vereação de 23 de Março de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fls. 97v.
59
Aqui, segundo parece, a responsabilidade não era directa, mas somente de
nomear alguém para o fazer, muito possivelmente um negociante – cf. CEHLRSDA –
Vereação de 10 de Maio de 18114 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1640-1641), fls. 48-48v.
60
CEHLRSDA – Vereação de 4 de Maio de 1640 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fl. 33.
61
Os termos não são explícitos, mas ao longo de 1640 são vários os autos de
alerta e de obrigação para alguns dos homens de concelho estarem prontos com os
seus cavalos, éguas e outras montadas – cf. CEHLRSDA – Vereação de 4 de Maio
de 1640 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1640-1641), fls. 1v e seguintes.
56
57
- 87 -
Cristóvão Mata
restaurarem os edifícios públicos (a casa da Câmara62, a torre do relógio63
e a cadeia64) ou se consertarem outras infra-estruturas de utilidade
pública, como as pontes e os chafarizes65. Neste âmbito, o meio mais
vulgar de o fazer era o lançamento de um pregão para a arrematação da
obra, e por vezes, aquando da escassez de recursos financeiros, podiam
ser lançadas contribuições extraordinárias para se alcançar o objectivo
desejado. Para além destas intervenções, a actuação da Câmara podia
limitar-se a simples vistorias pelo território concelhio («corridas» ou
«correições»), tanto para averiguar as condições em que, por exemplo,
as estradas e os caminhos se encontravam66, como para verificar se não
havia nenhum apropriação indevida dos espaços públicos por parte de
privados («tomadias»).
Também se verificam esforços por parte da Câmara para se protegerem
os terrenos agrícolas. É vulgar a elaboração de posturas que ordenam
a prisão dos cães e dos gados (em particular, o suíno) que andassem
soltos pela vila e termo e cujo incumprimento implicava o pagamento de
multas ou até mesmo a prisão do proprietário destes animais, de modo a
prevenir qualquer dano que os mesmos pudessem infligir às fazendas do
concelho. O roubo de produtos agrícolas – especialmente o da azeitona,
mas também o da lenha – foi bastante regulamentado, sendo habitual
a elaboração de posturas preventivas durantes os meses de Setembro e
Outubro cujo teor estipulava igualmente o pagamento de multas e dias
de prisão. Este último aspecto é, contudo, parte de um outro assunto de
maior dimensão que procuraremos aprofundar no capítulo que se segue.
CEHLRSDA – Vereação de 2 de Abril de 1756 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fl. 112.
63
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Maio de 1719 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 123.
64
CEHLRSDA – Vereação de 25 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fl. 44v.
65
CEHLRSDA – Vereação de 2 de Março de 1640 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fl. 20.
66
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Fevereiro de 1734 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fl. 198v-199.
62
- 88 -
–V–
O governo económico de Penela
Na Idade Média, as feiras constituíram «um dos aspectos mais
importantes da organização económica»1. Como vimos, no século XV
foram criadas por iniciativa do infante D. Pedro duas feiras francas,
a de São Miguel (1433)2 e de São Sebastião (1440)3, que em 1455
obtiveram de D. Afonso V o reconhecimento dos respectivos privilégios
e o alargamento do período de duração por mais três dias4. Em 1497,
D. Manuel confirmou-lhes os privilégios5 e um ano depois outorgou-lhe
novo estatuto6. No século XVI, a de São Sebastião foi reduzida para
cinco dias7 e nesse mesmo período surgiu uma outra especializada no
comércio de couros8. Nas cortes de 1642, o procurador de Penela, Gaspar
do Rego Evangelho, apresentou um requerimento para que se pudesse
fazer uma feira «livre de siza por tempo de dez anos» no rossio da vila,
onde os moradores da vila haviam erguido uma ermida de invocação
Rau, Virgínia – Feiras Medievais Portuguesas (…), op. cit., p. 33.
ANTT – Livro 1 da Estremadura, fls. 104v-105.
3
ANTT – Chancelaria de D. Afonso V. Livro 23, fl. 47.
4
ANTT – Chancelaria de D. Afonso V. Livro 15, fls. 139v-140.
5
ANTT – Livro 1 da Estremadura, fls. 103v.
6
ANTT – Livro 1 da Estremadura, fl. 132.
7
Braga, Isabel Drummond – “A circulação e a distribuição dos produtos” in
Serrão, Joel e Marques, António Oliveira (dir.) – Nova História de Portugal. Volume
V: Dias, João José Alves (coord.) – Portugal do Renascimento à Crise Dinástica.
Lisboa: Editorial Presença, 1998, p. 212.
8
Braga, Isabel Drummond – “A circulação e a distribuição (…)”, op. cit.,
p. 214
1
2
- 89 -
Cristóvão Mata
a São João Baptista, que segundo Delfim José de Oliveira deu como
existente, apesar de a resposta à petição considerasse que nada havia a
deferir9. Tanto quanto a caracterização da economia coimbrã do século
XVI nos permite afirmar10, Penela e as suas feiras integraram uma rede
comercial de âmbito regional localizada em torno da cidade de Coimbra
e cujo alcance se estendia até Viseu.
Nas cortes realizadas em Lisboa no ano de 1641, a Câmara de Penela
obteve «hũas provisoens dos privilegios das feiras desta villa». Na acta
camarária cujo excerto citámos não é feita mais nenhuma referência
às feiras de São Miguel e de São Sebastião (nem à de São João que,
porventura, terá sido criada após 1642)11. O que não foi inédito, pois quase
não se encontra nenhuma referência a qualquer uma destas feira nas actas
das reuniões ocorridas ao longo do período de que nos ocupamos. Apenas
em 1814 a Câmara se refere em acta à feira de São Miguel, que estava
«quase extinta»12, corroborando a imagem de decadência apresentada
pelos capítulos especiais das cortes de 1642: ambas «estaõ perdidas e não
se fazem hoje» devido ao «aperto de direitos» que sofriam. Para a sua
reanimação, o procurador Gaspar do Rego Evangelho pediu ao monarca a
isenção do pagamento da sisa que recaía sobre as transacções comerciais
operadas naqueles dias e que não se realizasse mais nenhum mercado
numa área de vinte léguas em torno da vila, tendo tão-só obtido para a
de São Miguel o estatuto de feira franca por um período de apenas cinco
anos 13. Na segunda metade do século XIX, Delfim José de Oliveira tinha
conhecimento das três feiras somente por via da tradição14.
Torna-se, portanto, bastante difícil avançar algumas hipóteses relativamente à economia local a partir deste elemento ou, no caso que mais nos
interessa, sobre a sua relação com a intervenção camarária na economia
local. Todavia, as actas de vereação contêm numerosas e valiosas inforANTT – Aclamações e Cortes, Cortes, Maço 9, número 12, fl. 446; Oliveira,
Delfim José de – Noticias de Penela (…), op. cit., p. 182
10
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra (…), op. cit.,
Volume II, pp. 565-566.
11
CEHLRSDA – Vereação de 23 de Março de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fl. 98v.
12
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fl. 55.
13
ANTT – Aclamações e Cortes, Cortes, Maço 9, número 12, pp. 445-448v.
14
Oliveira, Delfim José de – Noticias de Penela (…), op. cit., p. 182.
9
- 90 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
mações sobre alguns aspectos da economia concelhia. Registam as
diligências da Câmara no âmbito do governo económico, que focam,
essencialmente, a protecção do mercado local e o abastecimento das
necessidades do concelho15. Mas também a regulamentação exercida
sobre os ofícios mecânicos, o estabelecimento do valor do trabalho e,
a respeito das funções delegadas ao poder municipal, a cobrança de
tributos e direitos devidos à Coroa ou à Casa de Aveiro.
1. Nas Memórias Paroquiais de 1758, as informações prestadas pelos
párocos acerca dos produtos agrícolas produzidos em maior abundância
nas respectivas paróquias são bastantes escassas. Mas coincidem na
menção de cereais, trigo e azeite, sendo a excepção duas paróquias, onde
havia ainda boa produção de legumes, de lenha (Lagarteira) e de frutos
(Espinhal)16. Mais ricos são os documentos disponíveis nos livros de
actas de reuniões da Câmara. Em 1814, o juiz de fora Agostinho António
Fragoso de Carvalho, os vereadores João de Mesquita Peixoto da Costa
Freire e João de Alarcão Velasques Sarmento, o vereador de barrete João
Leal da Gama Nobre Jacome Faria, o procurador do concelho Francisco
José Teixeira e «dois homens dos mais inteligientes», Manuel Antunes
dos Santos e Manuel Joaquim Arnaut, que serviam de informadores,
responderam a um total de dezoito questões contidas num inquérito vindo
da provedoria de Coimbra relativo à vida agrícola de Penela17.
Segundo as respostas, três quintos do território concelhio estavam
por semear. Esta parcela correspondia a terrenos situados em montes e,
por isso, adequada ao cultivo de castanheiros, oliveiras, carvalhos,
pinheiros e outras árvores. A causa apontada pelos inquiridos era a
sentida falta de braços e de gado para o cultivo, tendo os terrenos vindo
a ser abandonados desde há trinta anos atrás e, mais intensamente,
a partir de 181018. O cereal que mais se colhia no concelho era o milho,
embora também se semeasse trigo, cevada e centeio. A vinha e o olival
Monteiro, Nuno Gonçalo –“O espaço político e social local” in Oliveira, César
(dir.) – História dos Municípios (…), op. cit., p. 128.
16
ANTT – Dicionário Geográfico (…), op. cit., Vol. 10, fl. 2028; Vol. 11,
fl. 2502; Vol. 14, fl. 477; Vol. 19, fl. 54v; e Vol. 28, fls. 782-783.
17
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fls. 53v-57v.
18
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmaa (1813-1818), fls. 55-55v.
15
- 91 -
Cristóvão Mata
davam-se «bem» nos terrenos do termo, mas apenas parcialmente,
pois «grande parte deste não é capaz por ser frio e demasiado agreste».
O milho era insuficiente. O trigo, o feijão e o azeite, por seu turno,
chegavam para as necessidades locais, ao passo que o vinho tinha de ser
importado de Miranda do Corvo e «das bandas de Coimbra»19. Quanto
ao gado, a espécie que mais prosperava era a caprina. O ovino também,
mas com «muito melindre e pouca duração», o suíno «sofrivelmente»
e o bovino nunca fora abundante. A nível quantitativo, naquele ano
as cabras rondavam as trezentas ou quatrocentas cabeças de gado,
as ovelhas quinhentas ou seiscentas, os bois, vacas e bezerros mais de
quatrocentas, mas sem ultrapassar as quatrocentas e setenta, e os porcos
mil e seiscentas cabeças20.
Esta descrição da economia rural de Penela, que se estende a outras
matérias para além das referidas21, faz a evocação de dois sectores
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões da
Câmaa (1813-1818), fl. 54. Mais à frente especificam a quantidade habitual de «uma
semeadeira, fazendo diferença de campo e monte e [especificando] a quantidade de
grão». Em campo plano, o trigo e a cevada davam cada um seis a oito alqueires e
o milho entre quinze e dezoito; em monte, o trigo três a quatro alqueires, o milho
oito a dez, o feijão e o centeio três a cinco. (cf. fls. 55-55v).
20
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fls. 54-54v.
21
Como as formas de arrendamento da terra, se existe ou não foral, as condições
das estradas, a existência de arvoredos e de lagos no termo do concelho, entre outros
aspectos. Um dado curioso deste inquérito é que ele dá permissão aos inquiridos para
expressarem a sua opinião sobre o fomento da agricultura do concelho. Segundo
os referidos, «os maiores embaraços que se encontram para melhor aumento da
agricultura são a falta de meios porque corre muito pouco dinheiro, bois e gado
miudo em grande carestia; falta e diminuição na população pelos muitos que
têm morrido, desertado e outros chegando a ausentar-se familias inteiras porque
amanhando fazendas de que pagavam foros como não tiveram meios de as cultivar
ficaram alcançados nas pensões e julgaram melhor perder tudo, e irem-se embora.
O estarem os povos muito carregados de tributos, sem que se tenha perdoado
cousa alguma a este termo, apesar de ter sido dos que mais sofreram na invasão.
Para o melhor aumento da agricultura seria melhor aliviar os tributos e conceder
alguns privilégios aos lavradores e respectivos gados e ajude o Estado a muntos
que não podem comprá-los, isto sem prejuizo do mesmo Estado pois o pode fazer
de emprestimo. Seria também interessante se não consentisse tantos negociantes
pequenos pois que entretidos com os primeiros lucros que as circunstâncias lhes
tem oferecido se desviam do trato e se acostumam no ócio; cujo vicio se encontra
19
- 92 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
fundamentais das áreas sobre as quais intervinha a Câmara, a agricultura e
a pecuária. Em relação a este último sector, embora se registem proibições
à venda de gado para fora do concelho22, a actuação da Câmara não se
processava tanto sobre a criação de gado como sobre o comércio da carne.
Sobre a Câmara recaía a responsabilidade de assegurar o abastecimento
deste género alimentício, o que se efectuava através de açougues públicos
onde, em determinados dias da semana, a carne era cortada e distribuída23.
No caso de Penela, terá existido apenas um açougue. Este detinha
o monopólio de venda da carne, como deixa claro um acórdão de
1671 que proíbe o corte e venda de carne fora do açougue da vila24.
Não obstante, a Câmara não era responsável por realizar a venda da
carne. À semelhança de outras áreas sujeitas à intervenção camarária,
este serviço era anualmente lançado em pregão para conhecimento de
quem o quisesse desempenhar25 e arrematado por quem se propusesse
fazê-lo em melhores condições relativamente ao preço das carnes26.
geralmente em ambos os sexos que so cogitam de ideias de luxo, e por isso muito
parte da tal gente proverá meios de ganhar muito em pouco tempo […]» – cf.
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões da
Câmara (1813-1818), fls. 57-57v. Nas sugestões dos oficiais da câmara e dos dois
informadores está, portanto, implícito que este inquérito surgia na sequência das
Invasões Francesas e da destruição deixada pela guerra.
22
CEHLRSDA – Vereação de 16 de Maio de 1718 e Vereação de 27 de Julho
de 1723 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fls. 123v e 223.
23
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra (…), op. cit.,
Volume II, pp. 199 e 209.
24
CEHLRSDA – Vereação de 5 de Julho de 1671 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1670-1673), fl. 43v.
25
Embora se trate de um único caso registado, o pregão de 1673 sugere que a
arrematação do serviço podia não circunscrever-se a apenas aos habitantes do termo,
já que o deste ano foi alargado às vilas circunvizinhas – cf. CEHLRSDA – Vereação
de 1 de Fevereiro de 1673 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1670-1673),
fl. 111v-112.
26
O registo dos autos de arrematação do açougue deixou entretanto de ser feito
nos livros de actas das reuniões da câmara, sendo a última arrematação registada
a de 1695, e passou, segundo indica um auto interrompido em 1758, a ser feito
em livro próprio: «Nao teve efeito o termo atras por nao pertencer a fazerse neste
livro» – cf. CEHLRSDA – Auto de arematação feita no asougue desta desta [sic]
villa [a 28 de Março de 1759] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1762),
fls. 212-212v. No entanto, em alguns anos do século XIX, as arrematações foram
registadas nos respectivos livros de actas.
- 93 -
Cristóvão Mata
Em virtude do seu carácter monopolista, a açougagem terá sido,
de um modo geral, um negócio bastante apetecido, como revela o episódio
em que os candidatos à arrematação da carniçaria efectuaram manobras
menos honestas para o alcançar. Em 1758, uma primeira arrematação foi
anulada por se ter verificado que os três candidatos estavam «comluados
para arematar o dito asougue hum e que seria para todos tres» 27.
Embora não haja o registo das propostas, a indicação deixa implícito que
estas eram artificiais de modo a que um arrematasse o serviço, sendo este
posteriomente partilhado por todos. Por se tratar de um sector económico
vantajoso, a intervenção da Câmara não se encerrava na concessão do
serviço a privados, continuando a supervisionar as operações comerciais,
como indica a ordem para os almotacés vigiarem a venda da carne
no açougue28. Daí que, em certas ocasiões, se registem punições aos
açougueiros pelo não pagamento da caução29 ou por incumprimento do
acordo30, mas também proibições relativas à venda da carne para fora do
concelho31 e fixações de preços dos diversos tipos de carne32.
Se neste sector os oficiais municipais apenas controlavam o comércio
da carne, noutros casos, como na agricultura, a esfera de actuação
camarária era mais alargada. É o caso das vindimas, cujo início se dava
por ordem da Câmara. Em 1725 foi decretado que ninguém vindimasse
sem a devida licença, sob pena de seis mil réis pagos da cadeia e de
CEHLRSDA – Vereação de 4 de Abril de 1758 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fl. 194.
28
Neste caso, a presença dos almotacés justificava-se por haver muitas
perturbações provocadas pelos padres de Penela, sendo que por isso estes oficiais
deviam acompanhar a divisão da carne – CEHLRSDA – Vereação de 29 de Outubro
de 1715 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 28v.
29
CEHLRSDA – Vereação de 15 de Setembro de 1693 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 34-36v.
30
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Dezembro de 1640 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fls. 73v.
31
CEHLRSDA – Vereação de 30 de Abril de 1728 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fl. 30.
32
CEHLRSDA – Vereação de 18 de Maio de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fls. 110v-111; Vereação de data não referida in Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fl. 1. Neste último caso, a pedido do
açougueiro e com a anuência da nobreza e povo.
27
- 94 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
dez dias de prisão33. Regularmente, a colheita das uvas só podia ser
iniciada após o dia de São Miguel ou, mais ocasionalmente, numa data
posterior34. Os acórdãos da Câmara, possivelmente justificadas pelas
condições climatéricas de cada ano, previam o pagamento de multas
pelos infractores, mas podiam em todo o caso ser objecto de abertura
de excepção pelos mesmos motivos que justificavam o estabelecimento
daquelas datas. Em 1644, por exemplo, os oficiais ordenaram que não
se vindimasse antes do dia de São Miguel porque «assim convinha
ao bem comum deste povo»35, mas passado um mês, «per que sertos
apartados que corrião risco e perda e per estarem desemparados e serem
mais temperados ordenaram e mandaram que somente se entendesse a
dita postura no sitio das ortas vallouro e cabeza e as mais se pudesem
vindimar pella resões que se diz»36.
Eram posturas que visavam proteger a produção vitivinícola e que se
podiam alargar à própria defesa das propriedades. Mais especificamente,
em 1725 havia no concelho muitas queixas sobre os «bois cabras e
ovelhas andarem passando nas vinhas pello damno que nellas faziaõ».
Ficou, por isso, decretado que por cada boi ou vaca que andasse solto o
seu dono pagasse de coima quinhentos réis, por cada cabra ou ovelha cem
réis e por cada porco duzentos réis37. Igualmente respeitante à defesa da
produção vitivinícola foi uma postura expedida no ano seguinte, presente
CEHLRSDA – Vereação de 14 de Setembro de 1725 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 292.
34
Geralmente, como em 1695, a 15 de Outubro – cf. CEHLRSDA – Vereação
de 4 de Outubro de 1695 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696),
fl. 100v.
35
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Agosto de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fl. 73.
36
CEHLRSDA – Vereação de 21 de Setembro de 1644 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1644-1645), fls. 82-82v. Em 1724 foi elaborada uma postura
inédita. A câmara ordenou que não se misturassem sargaços («sargagos») nas vinhas
entre Janeiro e o final do mês de Outubro (CEHLRSDA – Vereação de 19 de Abril
de 1724 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 244v). Tal como
o estrume e outras matérias orgânicas, os sargaços (algas marítimas) serviam o
propósito de adubar das terras, e por isso cremos que esta determinação visava
igualmente o fomento da produção vitivinícola em resposta a hipotéticas falhas
dos produtores.
37
CEHLRSDA – Vereação de 12 de Outubro de 1725 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fls. 293v-294.
33
- 95 -
Cristóvão Mata
nas actas de todos os mandatos consultados, que ordenava a prisão de
todos os cães e porcos até 8 de Outubro, incorrendo os infractores, neste
ano, numa pena de trezentos réis38. De facto, a soltura dos gados seria uma
prática bastante desfavorável à população e à agriculta. Daí todos estes
condicionamentos, que se podiam estender às práticas de transumância.
Em 1733, João Fernando entregou à Câmara uma petição requerendo que
esta lhe autorizasse o trânsito das suas ovelhas de um curral que tinha
em Vale de Custos para um outro situado na Fonte de Cima, sendo então
concedida permissão para passar uma vez no Inverno e outra no Verão39.
A protecção dada às culturas agrícolas não se limitava ao sector
vitivinícola. Em 1726 iniciou-se uma prática que se repetiu em outros
anos do século XVIII: a 30 de Maio do referido ano, foi decidido que
toda a pessoa da vila e do termo se apresentasse até ao final do mês de
Abril na casa de Bernardo de Azevedo Morato, escrivão da Câmara,
com doze cabeças de pássaros40. O registo da ordem não refere o
propósito, mas os animais em causa assim como o mês em que se deu
sugerem que esta postura visava a conservação das searas do concelho,
bem como das árvores de fruto. Recorrentes foram também as posturas
que, visando a defesa dos bens agrícolas, não tiveram por alvo os animais
mas sim os homens e estabeleceram penas pecuniárias para os roubos
de bens primários, como a azeitona ou a lenha.
Tal como o negócio da carne, o comércio destes produtos foi igualmente regulado. Porventura devido às flutuações da produção anual dos
cereais, de vinho e de azeite, foram recorrentes os impedimentos legais
à sua venda para fora do concelho. No já referido inquérito enviado pela
provedoria de Coimbra à vereação de Penela, em 1814, afirmava-se
que quando o trigo, o feijão e o azeite excediam as necessidades locais,
eram vendidos para fora do concelho, e que a produção local de vinho
era completada mediante a compra ao concelho de Miranda do Corvo e
à região em torno da cidade de Coimbra41. O intercâmbio comercial era,
CEHLRSDA – Vereação de 29 de Agosto de 1726 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 329.
39
CEHLRSDA – Vereação de 3 de Julho de 1733 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fl. 173v.
40
CEHLRSDA – Vereação de 30 de Maio de 1726 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 35v.
41
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1814 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), fl. 54.
38
- 96 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
pois, permitido, mas em anos de escassez o concelho adoptou medidas
que podiam ir contra a lei geral.
Em 1757, o ouvidor de Montemor-o-Velho apresentou uma carta do
Secretário de Estado relativa ao incumprimento das Ordenações Filipinas
e de outras normas por parte de alguns concelhos do reino. Ordenou
que fossem apresentados os livros de posturas municipais, ao que o
escrivão da Câmara retorquiu que não havia postura ou acórdão algum
que proibisse a venda de pão de trigo ou de cevada para a Corte, para a
cidade de Lisboa ou para qualquer parte do reino, e que por isso devesse
ser anulada. O episódio encerrou-se com uma simples admoestação para
que futuramente não se impedisse a venda do pão42.
Com efeito, os oficiais desse mandato, todos empossados a 25 de
Janeiro anterior43, assim como os do anterior44, não haviam decretado
nada nesse sentido, mas nem por isso as proibições eram raras; antes
foram uma prática habitual durante todo este período. Logo em 1640
o procurador do concelho, António Vaz, requereu «a elles officiaes
que este ano ouvera pouquo vinho e se levava pera fora e ficava a terra
sem elle [e por isso] mandassem apregoar que nenhum[a] pessoa desta
villa e termo que venda vinho pera fora […] com pena de mil reis»45.
Quatro anos depois, a Câmara elaborou um novo acórdão com o objectivo
de controlar não apenas a venda do vinho, mas também a do azeite.
Neste caso, a proibição devia-se não tanto à quantidade realmente
existente, mas antes à especulação praticada por certos produtores locais,
os quais, segundo parece, vendiam azeite e vinho para fora do termo,
encarecendo assim o que ficava no concelho:
«na dita camara se praticou que desta villa hia pera fora o azeite
contra o bem comum e que seria ocasiam de valer muito dinheiro
neste povo e asim [o] vinho pella mesma maneira pello [que]
requereo o dito procurador mandassem noteficar diguo apregoar
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Maio de 1757 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fls. 160v-162v.
43
CEHLRSDA – Vereação de 25 de Janeiro de 1757 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fl. 146.
44
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761),
fls. 105v-147v.
45
CEHLRSDA – Vereação de 18 de Fevereiro de 1640 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fl. 12v.
42
- 97 -
Cristóvão Mata
geralmente que nenhuma pesoa vendesse azeite pera fora desta
villa nem vinho com pena de dous mil reis»46.
O registo em causa não deixa explícito que o propósito dos produtores
de vinho e de azeite era efectivamente o de inflacionar os preços destes
produtos através da redução da oferta dos mesmos, mas também não
refere, como na postura de 1640 relativa ao vinho, que o objectivo era
assegurar a abundância do vinho e do azeite.
A especulação dos preços foi uma realidade na economia local e
sobre produtos vários. Em 1692, por exemplo, os vereadores decretaram
que por haver muitas queixas quanto à recusa dos lavradores em vender
o fardo de palha por menos de cem réis, preço que aliás nem estava
tabelado, estes não pudessem vendê-lo para fora do termo do concelho47.
Aqui o princípio da postura de 1644 mantinha-se: interditavam a venda
do produto para fora do termo de modo a que a oferta se mantivesse
elevada. Evitavam assim flutuações de preços induzidas, garantindo a
estabilização dos preços e que o custo dos produtos não fosse fixado a
bel-prazer dos produtores e vendedores.
Outro género que pela sua importância na dieta alimentar foi bastante
controlado foi o cereal panificável. Em 1692 houve, uma vez mais, muitas
queixas sobre certas pessoas que andavam «atravesando quanto paõ para
o levarem para fora do termo de que resultava grande dano aos moradores
desta villa e seu termo», sendo a reacção da Câmara semelhante às
anteriores: que, sob a pena de trinta mil réis e trinta dias de cadeia,
«não abarquasem nem comprasem nem mandasem para fora desta villa e
seo termo»48. Neste caso não foi referida a escassez nem o elevado custo
dos cereais, como anteriormente, mas os verbos utilizados pelo escrivão
para descrever as operações comerciais praticadas deixam claro que se
tratava de manobras de açambarcamento das farinhas para uma posterior
venda mais vantajosa. Noutras ocasiões, a interdição dever-se-ia somente
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Agosto de 1644 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1644-1645), fl. 73v.
47
CEHLRSDA – Vereação de 9 de Agosto de 1692 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1692-1696), fl. 9v.
48
CEHLRSDA – Vereação de 5 de Setembro de 1692 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 12v-13.
46
- 98 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
à escassez de cereais, como nos anos de 1695, em que «havia falta de
pão»49, e de 1758, pela «carestia» que havia de milho50.
Nestas ocasiões era o concelho que importava estes géneros, mas ao
contrário do que procurava fazer com a proibição da saída dos cereais,
não há informação de que a Câmara tivesse regulado o influxo de cereal.
Em 1814, deu-se conta numa certidão enviada para o corregedor de
Coimbra que nesse ano se colhera trinta mil e cem alqueires de milho,
dois mil e seiscentos de trigo («por ser ano falto deste género»), oitocentos
de cevada e duzentos de centeio, entre outros géneros (feijão, vinho e
azeite). Segundo o que o escrivão deixou escrito, «estes frutos quando
faltam vem de Coimbra Miranda Gois Condeixa»51.
As trocas comerciais internas estiveram igualmente sujeitas a uma
permanente regulação camarária. Manifesta-se primeiramente a intervenção do poder concelhio com a obrigação de os comerciantes obterem
uma licença da Câmara para poderem dedicar-se ao comércio. O que foi
descrito por António de Oliveira relativamente ao governo económico da
cidade de Coimbra durante o período de 1537-1640 aplica-se ao concelho
de Penela do período imediatamente seguinte. A concessão de licença
implicava um compromisso, pelo menos no que dizia respeito aos bens
«essenciais», pois o vendedor estava obrigado a detê-los em abundância,
podendo ser punido se não cumprisse com o acordado. Essa licença
obtinha-se mediante uma «obrigação» firmada em auto de juramento e,
dependendo dos casos, por uma fiança prometida por terceiros52.
Com base nesta obrigação, a Câmara lançava convocatórias como a
seguinte: «acordaram [os oficiais] se lancase preguam nesta vila e seo termo
que nenhuma padeira venda pam sem se vir obriguar na Camera com pena
de seiscentos reis paguos da cadeira e que as obriguadas debaixo da mesma
pena tenham sempre pam de des reis»53; ao que se seguiu, naturalmente,
CEHLRSDA – Vereação de 23 de Março de 1695 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1692-1696), fls. 88v-89.
50
CEHLRSDA – Vereação de 18 de Março de 1758 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1752-1761), fl. 191.
51
CEHLRSDA – Vereação de 7 de Fevereiro de 1814 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1813-1818), fl. 81.
52
OLIVEIRA, António de – A vida económica e social de Coimbra (…).
Vol. 1. op. cit., pp. 533-534.
53
CEHLRSDA – Vereação de 10 de Fevereiro de 1716 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 37.
49
- 99 -
Cristóvão Mata
a realização dos autos de obrigação nos quais as convocadas «se obriguam
a cozer e vender pam athe o Natal de mil e sete sentos e dezasete annos»54.
Nesta ocasião, o pregão para a concessão de licenças dizia respeito ao
negócio do pão, mas noutros casos as obrigações podiam reportar-se à
venda de produtos diferentes, como palha e cevada55, pólvora56, sabão57
e tabaco58.
Contudo, o mais usual seria a concessão de licenças para a venda de
pão, vinho e de azeite, como de resto ilustra a seguinte passagem:
«acordarão logo sem demora se lansasem pergois para que
toda a pesoa que venda vinho e azeite e pam publicamente e como
atavernado se viesem obrigar a camara dentro do termo de 8 dias
depois do dito pergam e na mesma forma aferisem todos suas
medidas e pesos pellos padrois da camara»59.
O exemplo citado vai ao encontro do que já foi dito noutros estudos.
Nomeadamente, que a compra e venda de produtos implicava a utilização
de pesos e medidas oficiais, os quais se aferiam pelos padrões do
concelho. À Câmara competia a tarefa de uniformizar os pesos e as
medidas comerciais, mas a função era desempenhada por terceiros60 – ou,
CEHLRSDA – Termo de obriguasam de padeiras que fizeram Maria da
Conseisam e Maria de Ouliveira ambas desta villa e Luiza Rodrigues do Espinhal
e Izabel de Sam Francisco desta villa [a 2 de Março de 1716] in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fls. 39-39v.
55
CEHLRSDA – Pena e obrigasam que fes Manuel Simois das Vendas das
Figueiras a vender palha e sevada [a 6 de Fevereiro de 1640] in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fl. 5.
56
CEHLRSDA – Vereação de 12 de Novembro de 1754 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1752-1761), fl. 51v.
57
De autos de obrigação para a venda de sabão não temos conhecimento,
mas há o registo de uma condenação feita a um tal de João Rodrigues Namorado,
o qual foi multado em quinhentos réis por andar a vender sabão na vila sem licença
da Câmara – cf. CEHLRSDA – Vereação de 30 de Junho de 1721 in Livro de Actas
de Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 203.
58
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Setembro de 1735 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fl. 371.
59
CEHLRSDA – Vereação de 30 de Março de 1726 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fls. 314v-315.
60
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra (…). Vol. 1.
op. cit., pp. 544-545.
54
- 100 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
mais precisamente, por homens eleitos pela Câmara para o referido efeito,
como indicia a nomeação de Francisco Neto para «aferidor das medidas
em esta villa e seo termo por ser falecido António Simois Carnoto»61.
A partir de, pelo menos, 1814 as aferições passaram a ser arrematadas
por quem quisesse desempenhar as funções. A 6 de Fevereiro desse ano,
por exemplo, lançou-se pregão para «quem quizer arematar as rendas dos
foros do conselho desta ditta villa laudemios e aferimentos venha com
ella pera lha tomar seo lance». No mesmo dia, «pareceo Manuel Pires
moço da dita villa e dice que dava de lanço pella renda dos aferimentos
quatro mil e duzentos reis tudo pago a metade e a toda a hora», tendo o
mesmo arrematado o serviço62. As aferições terão, portanto, sido num
primeiro momento (séculos XVII e XVIII) responsabilidade da Câmara
e realizadas por um oficial próprio, previamente eleito pelos juízes,
vereadores e procuradores; depois, como indica este auto e os dos anos
posteriores, mantiveram-se sob a tutela municipal, mas foram entregues
a privados que, nelas vendo uma oportunidade de negócio, arrematavam
o serviço pela melhor oferta.
Deste facto decorrem as ocasiões registadas relativas aos pesos dos
cereais63. Para além da responsabilidade de regular os padrões dos pesos e
medidas, a Câmara detinha o poder de fixar pesagens oficiais, como ilustra
o acórdão que obriga as padeiras a manterem os pesos determinados
por lei64. Mas também o de indexar um preço ao peso oficial. Em 1715,
foi ordenado que as padeiras cozessem pães de meio arrátel e de um
arrátel, devendo vendê-los por dez e vinte réis, respectivamente.
Na mesma reunião, era ainda decretado que quem vendesse azeite a
quartilhos não o fizesse a mais de sessenta réis65. Quatro anos depois,
CEHLRSDA – Vereação de 28 de Fevereiro de 1758 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1752-1761), fl. 188.
62
CEHLRSDA – Auto de aremataçaõ da renda dos foros do conselho desta vila
por – 21010 [réis] laudemios – 4000 [réis] aferimentos – 4200 [réis] in Livro de
Actas de Sessões da Câmara (1813-1818), fl. 14v-16.
63
Veja-se, a título de exemplo, uma série de aferições ocorridas em 1726 –
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fls. 379-387v.
64
CEHLRSDA – Vereação de 9 de Março de 1641 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fl. 91.
65
CEHLRSDA – Vereação de 14 de Maio de 1715 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 12.
61
- 101 -
Cristóvão Mata
todos os vendedores de vinho e azeite a quartilho eram obrigados a ir à
Câmara para se lhes tabelar os preços66.
As operações de regulação económica, segundo indicam alguns
registos, podiam ser feitas a pedido da população, que as acompanhava,
como quando
«foi chamado o povo desta villa e termo e assim por noteficacam
como a son de campa tamgida pera arbitrarem o preço do pam
do anno de mil e setecentos e dezasete por requerimentos do dito
povo que se ajuntou e por todos foi dito que o justo e comum preço
que teve o trigo do dito anno fora a duzentos e quarenta reis e o
milho meudo a sem reis e toda a mais sevada a sento e quarenta
reis e visto o pareser e voto de todos os que na dita camara se
ajuntarão ouve o dito senado por liquidado na dita forma o preço
asima com pena de seis mil reis toda a pesoa que cobrar o dito
pam do dito anno»67.
Na sessão em causa, o que se realizou foi, portanto, uma correcção
às arbitrariedades dos produtores de cereais, que haviam subido os
preços ao sobejo dos cereais da colheita anterior e cujo custo havia,
por isso, de se manter. Foi também tomada uma resolução sobre o
preço do trabalho: que os lavradores não recebessem de jorna mais do
que duzentos e quarenta réis e que, para os merecerem, trabalhassem
de sol a sol; aos carpinteiros e pedreiros era fixada a jorna máxima de
cem réis diários e aos alfaiates, sapateiros e trabalhadores de enxada
sessenta réis68.
CEHLRSDA – Vereação de 27 de Novembro de 1719 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 137.
67
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Agosto de 1718 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 105v.
68
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Agosto de 1718 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 105v. Em 1813 a regulamentação laboral foi
mais específica ao estabelecer a remuneração dos mesmos trabalhadores em função
das épocas do ano e em dois regimes. Os trabalhadores de enxada e os sapateiros
receberiam de jorna sessenta réis nos meses de Inverno (Setembro a Fevereiro) e cem
réis nos de Verão (Março e Agosto); se trabalhassem a «seco», isto é, sem alimentação, duzentos réis no Inverno e duzentos e quarenta no Verão, e as mulheres pela
metade. Os pedreiros e carpinteiros não receberiam mais do que cento e quarenta
réis no Inverno e ainda a alimentação, ao passo que se trabalhassem a «seco» a jorna
66
- 102 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
A regulamentação camarária, como se vê, não incidia unicamente
sobre a agricultura, mas também sobre o sector manufactureiro e o
restante trabalho braçal. Ao contrário dos casos acima discutidos,
a Câmara não concedia directamente as licenças aos diversos ofícios
mecânicos, nomeando antes juízes responsáveis pelas diversas profissões.
O melhor exemplo de que dispomos ocorreu em 1736, quando foram
nomeados os juízes dos pedreiros, carpinteiros, alfaiates, sapateiros,
ferreiros, moleiros, e a juíza das tecelãs69, cujos juramentos se seguiram70.
Neste caso, porém, não são especificadas as atribuições dos designados,
mas no juramento de um outro juiz, tomado nove anos antes,
«apareceo presente Lourenco Faria de Souza do lugar do
Espinhal e juiz que foi eleito do officio dos sapateiros a quem
o doutor juiz de fora deo juramento dos Santos Evangelhos sob
cargo delle lhes emcarregou que elle bem e verdadeiramente
service a dita ocupacam exeminando os offeciais que se quezerem
exeminar bem e verdadeiramente aprovando os que souberem
e reprovando os que não souberem de que lhe pasara escrito de
exame da forma que o fizerem pera por ele requererem suas cartas
de exeminacam»71.
Aos juízes das diversas profissões mecânicas cabia, como se constata,
a avaliação das capacidades dos candidatos aos oficios. Mas, segundo
tudo indica, a concessão final da licença continuava a ser responsabilidade
da Câmara, que daria juramento de ofício após receber as cartas de exame
passadas pelos juízes de cada ofício. Neste casos, como exemplifica a
licença de José Felix de Sousa para o ofício de sapateiro, surgia um
terceiro elemento atrás mencionado, o fiador, responsável por assegurar o
fixar-se-ia nos trezentos réis; durante o Verão, a jorna subia vinte réis em ambas as
situações. Qualquer deles que recebesse acima do fixado, pagaria de multa seis mil
réis – cf. CEHLRSDA – Vereação de 22 de Dezembro de 1813 in Livro de Actas
de Sessões da Câmara (1813-1818), fls. 6-6v.
69
CEHLRSDA – Vereação de 17 de Abril de 1736 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fls. 408-408v.
70
Entre 9 de Junho e 13 de Julho – cf. CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fls. 411-415v.
71
CEHLRSDA –Termo de juramento dado ao juis do officio dos sapateiros
[a 8 de Agosto de 1727] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727),
fl. 353v.
- 103 -
Cristóvão Mata
pagamento de todos os prejuízos causados pelo referido sapateiro ao povo
do concelho72. Deste modo o campo de intervenção camarária alargava-se não apenas à regulamentação do trabalho (mecânico, agrícola ou de
outra ordem), mas também ao mercado de bens não alimentares, que de
resto não andavam dissociados: «a distinção entre produção e comércio
generalizou-se somente no século XIX. Antes, produtor corresponde
a vendedor»73.
2. Falar da economia local ou, como atrás se disse, do papel desempenhado pelo senado penelense no campo económico, implica que se
tenha em conta uma vertente inalienável da actividade económica:
os impostos. Com efeito, muita da actividade camarária registada nos
livros de actas reporta-se aos processos de cobrança de tributos e direitos
devidos à Coroa ou, com base na doação de D. Manuel de 1500 e no
foral de 1514, à Casa de Aveiro. É exemplo do que falamos a colheita.
Tratava-se de um foro devido pelos habitantes do concelho à entidade
senhorial que apesar de tudo não detinha uma dimensão exclusivamente
económica, revestindo-se também de um «forte significado simbólico».
O montante era fixo e podia ser pago em géneros ou em dinheiro como
reconhecimento da jurisdição do donatário nos seus senhorios74.
Em relação a Penela, este direito encontrava-se consignado no
foral manuelino. Neste diploma declarava-se que o concelho pagaria
anualmente ao rei ou «ao senhorio dos ditos direitos no tempo em que sam
pera isso conçertados» sessenta libras. Todavia, as instruções foralengas
previam a flutuação do valor real a ser pago, pois era declarado que,
numa relação de trinta e seis réis por libra, se pagassem dois mil cento
e sessenta réis75. O valor em réis estava, portanto, indexado ao valor da
libra, pelo que qualquer valorização ou desvalorização desta unidade
CEHLRSDA – Termo de juramento dado a Jose Felis de Souza para o seo
officio de sapateiro [a 19 de Agosto 1818] e Termo de fiansa que da Jose Felis de
Souza do seo officio de sapateiro, e he seo fiador António Rodrigues sapateiro
assistente no Espinhal [a 19 de Agosto de 1818] in Livro de Actas de Sessões da
Câmara (1818-1820), fls. 23v e 24.
73
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra (…), op. cit.,
Volume II, p. 524.
74
Neto, Margarida Sobral – O Universo da Comunidade Rural (…), op. cit., p. 67.
75
ANTT – Livro dos Forais Novos da Estremadura, fl. 100.
72
- 104 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
monetária provocaria alterações no valor real. Deste facto decorre que,
por vezes, a Câmara não tivesse conhecimento do montante a recolher.
Na década de 1690, por duas vezes os vereadores ordenaram que se
continuasse a lançar a colheita pelo modo como até então se fizera76,
mas na década de 1730 são declarados valores exactos, todavia muito
acima do montante relativo discriminado no foral. Em 1734, cobraram-se
oitenta e seis mil réis77 e dois anos depois a cobrança perfez um valor
semelhante – oitenta e seis mil e cento e dez réis. Nesta mesma ocasião foi
ordenado que se repartisse o montante mencionado pelas treze vintenas
do concelho e que os fintadores de cada uma delas repartissem o valor
com igualdade pelo povo, atendendo à fazenda de cada um e incluíndo
nas listas as pessoas de fora do termo mas que possuíssem fazendas e
gozassem de rendimentos dentro do termo78.
Com efeito, a cobrança não se processava por acção directa da
Câmara. A esta cabia a nomeação de fintadores responsáveis por arrolar
os pagadores do direito e de arrecadar as quantias correspondentes em
cada uma das treze vintenas. A cobrança estava também sujeita a muitas
falhas. Foi regular a anulação das nomeações dos fintadores em virtude de
os designados serem privilegiados ou de impedimentos de outra natureza,
o que provocava o atraso das cobranças. Em 1735, compareceu na Câmara
António Freire de Perada, procurador da Casa de Aveiro, que declarou
estar por fintar a colheita de Sua Excelência, seu senhor, requerendo por
isso que se procedesse à eleição de louvados responsáveis por avaliar
os «especiais de que se contem a dita colheita para que se lhe pague
conforme o valor». Nessa ocasião foi eleito o mesmo procurador do
duque e os oficiais da Câmara para procederem à avaliação dos bens79.
Porém, a prática que posteriormente se generalizou, a partir da década de
1759, e foi recorrente até 1820, consistia na nomeação de dois louvados,
um eleito pela Câmara, outro pelo rendeiro. No século XIX, porém,
a Casa de Aveiro já havia sido extinta, mas como se referia no foral de
CEHLRSDA – Vereação de 17 de Junho de 1692 e Vereação de 19 de Novembro de 1694 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 6v e 75v.
77
CEHLRSDA – Vereação de 13 de Novembro de 1734 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1727-1736), fl. 232.
78
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Abril de 1736 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fls. 407-407v.
79
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Agosto de 1735 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1727-1736), fl. 368.
76
- 105 -
Cristóvão Mata
1514, a colheita era um direito régio cujo usufruto se transferia para o
senhor da terra – extinta a Casa, o direito retornava à Coroa.
Segundo o mesmo diploma manuelino80, existiram muitos outros
direitos que, primeiramente, reverteram em favor dos duques de Aveiro
e, depois de 1579, para os cofres da Coroa. No foral de 1514 são, pois,
entre outras prestações, enunciados a jugada, a teiga de Abraão, o relego
do vinho ou a portagem segundo declarado no foral de Leiria. A cobrança
destes direitos, no entanto, não surge declarada nas folhas dos livros de
actas de vereação, dado trataram-se de tributos sujeitos à actuação de
outras entidades: a colecta estaria a cargo de um rendeiro que contratava
com a Casa de Aveiro e com a Coroa os seus termos e supervisionada
pelos juízes dos direitos reais e, porventura, por procuradores da fazenda
nomeados pela entidade senhorial. Por outro lado, o foral também declara
a existência de terrenos comunitários, os montados e os maninhos,
cuja pertença ao concelho atribuía às vereações a responsabilidade de
fiscalizar as tomadias que indevidamente se efectuassem e que, como
acima vimos, são ocasionalmente discutidas em câmara, nomeadamente
quanto às corridas a fazer e às coimas a aplicar.
Do mesmo modo que a colheita, surgem referências aos laudémios,
mas somente num período posterior a 1759. Este tributo reportava-se ao
regime de propriedade bem distinto da concepção liberal de propriedade:
a enfiteuse, «uma forma de apropriação de bens e de rendas [que]
configurava um regime de desdobramento de direitos e propriedades,
com a consequente possibilidade de partilha de rendimentos, provenientes
do mesmo bem, por diversos indivíduos e instituições»81. Tratava-se de
uma modalidade contratual firmada perpetuamente ou por vidas que
dividia os direitos de propriedade entre domínio directo, que garantia
uma fonte de rendimentos em géneros ou em dinheiro ao senhor,
e domínio útil, que se traduzia na efectiva posse e usufruto do património
aforado enquanto vigorasse o contrato. O titular deste último direito podia
transmitir o bem que detinha através de herança, de venda ou de troca,
tendo no entanto que obter a autorização necessária da parte do senhor,
80
81
ANTT – Livro de forais novos da Estremadura, fls. 98-101.
Neto, Margarida Sobral – O Universo da Comunidade Rural (…), op. cit., p. 56.
- 106 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
a quem, por conseguinte, devia pagar uma parte dos proventos gerados
pela venda: o laudémio82.
Como atrás se viu, D. João de Lencastre, primeiro Duque de Aveiro e
segundo administrador da Casa de Aveiro, comprou em 1557 a fazenda
patrimonial detida por D. Afonso de Menses, filho do segundo conde
de Penela, no termo do concelho83. O documento não especifica as
dimensões dos bens adquiridos, mas nela fica implícito que o objecto
em causa nesta transacção eram bens fundiários. Tendo sido a enfiteuse
«a modalidade contratual mais praticada nos espaços rurais, sobretudo
a norte do Tejo»84, é de crer que em Penela os bens patrimoniais da
Casa de Aveiro e os bens da Coroa por si administrados se tenham desdobrado pelos habitantes locais no regime enfitêutico atrás referido.
Das cobranças do laudémio pela Câmara há poucas informações, até
porque se tratava de um imposto sobre a transferência de domínios sobre
propriedades e, portanto, de carácter pontual. Daí um memorando da
Câmara, em 1720, para que todo aquele que tivesse comprado fazendas
dentro do termo do concelho e não tivesse pago o laudémio o fosse
pagar ao procurador do concelho, sob pena de confisco e de três mil réis
de multa85. É, de facto, o único episódio em que a prestação enfitêutica
é referida em todo este período, excepto nos mandatos do século XIX.
Nessa primeira década, como atrás referimos no caso das aferições,
a arrecadação dos laudémios não se processava por acção directa dos
oficiais da Câmara ou por outros agentes por estes mandatados, sendo
antes cobrados pelos indivíduos que arrematavam o serviço86.
O enfiteuta, por seu turno, podia alienar a exploração da propriedade
através de outras modalidades contratuais, como o arrendamento (menos de dez
anos), ou procedendo a um novo desdobramento dos direitos sobre a propriedade
(subenfiteuse), levando a que entre o efectivo explorador da propriedade e a
entidade senhorial proprietária pudessem existir muitos intermediários a usufruir dos
rendimentos da mesma terra – Neto, Margarida Sobral – O Universo da Comunidade
Rural (…), op. cit., pp. 60-61.
83
ANTT – Viscondes de Vila Nova de Cerveira. Caixa 27.
84
Neto, Margarida Sobral – O Universo da Comunidade Rural (…), op. cit.,
p. 60.
85
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Dezembro de 1720 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 166.
86
Conforme demonstram a contratação destas rendas, os valores totais dos
laudémios pagos no concelho não seriam muito elevados: em 1814 foram arrematadas por 4000 réis; em 1816 por 13.000 réis; em 1817 por 14.500 réis; e finalmente
82
- 107 -
Cristóvão Mata
Entre si, as formas de cobrança dos diversos tributos régios, igualmente
distintos uns dos outros, também variavam. Em primeiro lugar, a sisa,
um imposto existente desde o século XIV cujo critério de cobrança foi
sendo modificado até ao reinado de D. Sebastião87. Tratava-se de um
tributo que incidia sobre quase todos os produtos comercializados, móveis
e imóveis, exceptuando-se alguns artigos (ouro, prata e pão cozido).
Com aquele monarca, as sisas são definitivamente encabeçadas, ou seja,
passa haver um valor global cobrado em cada concelho, cabendo
às autoridades municipais reparti-lo pelos habitantes do seu termo
e arrecadá-lo88. A cobrança não podia ser arrendada e seguia uma
regulamentação própria, formalizada nas Ordenações Filipinas e nos
Regimentos das Sisas, que previa a existência para o dito efeito de um
juiz, cargo assumido por um juiz ordinário; de um depositário, eleito
anualmente entre as «pessoas abonadas»; um escrivão, de «carácter
patrimonial»; e seis repartidores, também eleitos anualmente89.
Em Penela, contudo, o processo de arrecadação foi diferente, mas
apesar de tudo bastante inconstante. Não se faz nenhuma menção ao juiz
das sisas, do que se pode depreender que um dos juízes ordinários ou o
em 1818 por 3.200 réis. O custo real deste imposto sobre as vendas dos bens de
raiz haveria, no entanto, de ser superior a estes valores, pois o arrematante fazia
um lanço inferior ao valor efectivo do laudémio de modo a lucrar com o negócio –
CEHLRSDA – Auto de arematação da renda dos laudemios do conselho desta villa
para o ano de 1816 por – 13:000 [a 31 de Dezembro de 1815] e Auto de arematação
da renda dos foros do conselho desta villa por 216:500, laudemios por 14:500
aferimentos por 10000 a Francisco Custodio de Almeida do lugar do Espinhal
[a 9 de Fevereiro de 1817] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1813-1818),
fls. 14v-16 e 110v; (fls. 179v-180v); Auto de arematação das rendas dos foros do
conselho laudemios e aferimentos desta villa do prezente anno [ a 29 de Abril de
1818] in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1818-1820), fls. 8-9.
87
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra (…), op. cit.,
Volume I, pp. 298-303.
88
Hespanha, António Manuel – As vésperas do Leviathan (…), op. cit.,
pp. 56-57.
89
Ribeiro, Ana Isabel – A Comunidade de Eiras nos finais do século XVIII:
estruturas, redes e dinâmicas sociais. Dissertação de mestrado em História Moderna.
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2003, pp. 100-101.
Em 1754, refere-se que o valor do cabeção é de dez mil réis. Todavia, este valor
há-de ter sofrido oscilações várias no decorrer do tempo, fruto de actualizações
que acompanhassem a inflação – CEHLRSDA – Vereação de 4 de Julho de 1754
in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fl. 35v.
- 108 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
juiz de fora assumiria o cargo, nem tão-pouco dos escrivães das sisas,
que por se tratar, como se disse, de um cargo patrimonial, não seria referido
nos autos de elaboração dos rois da sisa. O que ocorreu anualmente foram
nomeações para a cobrança do imposto, nomeadamente, um fintador ou,
noutras designações mencionadas, um contador90 por cada vintena, sendo
ainda chamados um recebedor por cada trimestre e um depositário geral
do dinheiro da sisa91.
Não obstante, esta prática não se manteve inalterada até 1820.
Imediatamente em 1672, por haver grande opressão sobre o povo devido
à eleição anual de quatro folheiros designados para levar o dinheiro dos
quatro trimestres da sisa a Tomar, foi eleito um depositário «dos bens
de raiz» responsável por conduzir à sede da provedoria a soma recolhida92.
A partir de, pelo menos, 1693, a nobreza deixa de estar isenta do
pagamento deste imposto, já que são escolhidos, a par dos fintadores
das vintentas, fintadores da nobreza. Na mesma ocasião, passam a ser
eleitos fintadores dos mecânicos93. Dois anos depois, os cobradores da
nobreza e dos mecânicos deixam de ser referidos nos autos de elaboração
dos rois da sisa94, mas em 1718 retoma-se a sua nomeação95, ocorrendo
irregularmente esta prática nos restantes mandatos.
A inconstância dos estados e grupos sociais visados pelos tributos não
é justificada em actas, mas dever-se-ia, muito possivelmente, a ordens
vindas das instâncias superiores, expedidas em virtude de necessidades
fiscais extraordinárias. A partir de 1716 passam a ser nomeados, conforme
parece, informadores para em cada vintena auxiliarem os fintadores96
CEHLRSDA – Vereação de 13 de Março de 1716 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1640-1641), fls. 42-43.
91
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Dezembro de 1640 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fls. 73-73v.
92
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Dezembro de 1672 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1670-1673), fls. 102v-103.
93
CEHLRSDA – Vereação de7 de Fevereiro de 1693 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1692-1696), fls. 17v-18.
94
CEHLRSDA – Vereação de 15 de Julho de 1695 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1692-1696), fls. 97-97v.
95
CEHLRSDA – Vereação de 14 de Agosto de 1718 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 52.
96
CEHLRSDA – Vereação de 14 de Janeiro de 1716 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 31.
90
- 109 -
Cristóvão Mata
mas, do mesmo modo que os fintadores da nobreza e dos mecânicos,
não são referidos em todas as cobranças da sisa.
A cobrança de impostos sobre a classe privilegiada, a nobreza (local),
embora irregular, não foi exclusiva da sisa. Para além dos fintadores por
vintena e do depositário geral, a décima (ou os 4.5% cobrados em tempos
de paz) foi cobrada à nobreza por fintadores próprios nomeados entre os
seus pares97. Este imposto, apesar de constar apenas das actas referentes
aos mandatos do séculos XVIII e XIX, teve a sua origem na Guerra da
Restauração, mas a sua exacção manteve-se em Penela até, conforme o
disposto nas actas, 181998.
Nas cortes reunidas em 1641, convocadas para se jurar a realeza de
D. João IV e o princípe herdeiro, D. Teodósio, mas também realizadas
com a intenção de decidir o financiamento da guerra que se avistava,
depois de se levantarem os tributos impostos pelos Habsurgos, foi discutido pelos três estados aí reunidos o meio de se angariar anualmente
dois milhões de cruzados. Os montante estimado ficou-se, afinal,
pelo milhão e oitocentos mil cruzados, que devia sustentar um exército
de vinte e dois mil homens de infantaria e cavalaria. Este montante,
assim se esperava, havia de ser reunido a partir da recolha da décima parte
dos rendimentos da fazenda de todo e de qualquer um, independentemente
da sua condição e estado social, deixando de parte apenas os que vivessem
de esmola – portanto, «um tributo geral que incidia sobre todos os
vassalos e tendencialmente proporcional aos rendimentos de cada um».
O meio de cobrança e a percentagem devida vieram, no entanto, a sofrer
alterações no decorrer dos anos99.
Os registos da cobrança das décimas em Penela iniciaram-se apenas
em 1715100. Com efeito, não há qualquer menção à cobrança da décima
nas actas dos quatro mandatos coincidentes com a Guerra da Restauração
e, apesar de o fim da guerra ter resultado no levantamento de todos os
impostos de guerra, os registos referentes à décima datam de depois de
CEHLRSDA – Vereação de 20 de Novembro de 1715 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 29.
98
CEHLRSDA – Vereação de 19 de Maio de 1819 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1818-1820), fl. 60v.
99
Magalhães, Joaquim Romero – “Dinheiro para a Guerra: as Décimas da
Restauração” in Hispania. LXIV/1, n.º 216 (2004), pp. 159-162.
100
CEHLRSDA – Vereação de 26 de Março de 1715 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fls. 3v-4.
97
- 110 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
1668101. Na verdade, a crise económica vivida na Europa e em Portugal
nos finais do século XVII obrigou a Coroa a lançar novamente a décima102
e a abertura de um novo conflito com a Espanha em 1704, no âmbito
da Guerra da Sucessão Espanhola (1702-1714), exigiu a manutenção
do tributo. Findo o conflito, o imposto continou a ser cobrado, mas não
integralmente, reduzindo-se a décima aos 4.5%, o valor habitual em
tempos de paz: «na dita camera se abrio huma carta de Sua Magestade
que Deos guarde de porque manda sesar o novo emposto acabado o anno
e a desima ficando a quarto e meio porcento na forma que se costumava
no tempo da pas»103.
O chamado usual também não foi cobrado durante todo o período
aqui estudado. Os registos da cobrança reportam-se a um período
situado entre 1692, quando se elegeu o depositário geral e os treze
fintadores («roleiros») das vintenas104, e 1715105. Tratou-se, pois, de um
tributo sobre o consumo, de curta duração. Foi, muito provavelmente,
lançado para suprir as necessidades fiscais de uma crise «que se fez
sentir tanto nas economias nacionais como nas cobranças de receitas
governamentais». De facto, «os tesouros públicos foram fortemente
pressionados, para fazer face às despesas fixas, para não mencionar os
gastos extradordinários», do que resultaram ocasionais pedidos de um
esforço financeiro adicional aos três estados, lançando-se várias taxas,
um novo regimento sobre a sisa e o real d’água106. Ambos os tributos,
a décima e o usual, foram de facto impostos de carácter extraordinário,
e efectivamente contribuições para o esforço de guerra, alterados na
sequência dos acordos de paz firmados em Utreque. Comprova-o
uma carta régia registada num livro de actas que ordenava «se não
Magalhães, Joaquim Romero – “Dinheiro para a Guerra (…)”, art. cit.,
p. 182.
102
Hanson, Carl A. – Economia e Sociedade no Portugal Barroco (1668-1703).
Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1986, pp. 165-167.
103
CEHLRSDA – Vereação de 14 de Dezembro de 1715 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 30.
104
CEHLRSDA – Vereação de 9 de Agosto de 1692 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1692-1696), fls. 7-8.
105
CEHLRSDA – Vereação de 5 de Abril de 1715 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 4v.
106
Hanson, Carl A. – Economia e Sociedade (…), op. cit., pp. 161-167.
101
- 111 -
lanse o uzual por ser huma contribuisam de que os povos sempre se
queixaram e tambem a desima senam a quatro e meio porsento»107.
107
CHELRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fl. 346v.
– VI –
Um perfil social do poder concelhio
Por oposição à excessiva institucionalização da história política,
a abordagem prosopográfica desenvolvida nos últimos anos tem focado
os «canais informais» do poder: patronato e clientelismo, grupos de elite
e redes de influência, constituem elementos que caracterizam o conjunto
de interesses e de relações pessoais entre governantes e governados,
entre centro e periferia, cuja análise tem reavaliado a importância
tradicionalmente atribuída aos organismos oficiais1. Privilegia o que já
foi designado por «espaço social» do poder, um elemento considerado
indispensável à compreensão do funcionamento das estruturas institucionais2 e que, no nosso caso, se adequa ao estudo do poder municipal.
Foi Jaime Vicens Vives quem, destacando a insuficiência de uma história
das instituições que se resuma à análise das respectivas estruturas,
propôs a elaboração da história social do poder. Na senda deste autor,
Pedro Molas Ribalta apresentou a directiva teórica da história social da
administração: «se trata de identificar y analizar la base económica,
social, cultural, religiosa, etc. de los individuos que han integrado una
institución determinada o que han formado parte de grupos politicos y
sociales com poder efectivo a nivel estatal, regional, o local»3.
Gil Pujol, Xavier – “La historia política de la Edad Moderna europea, hoy:
progresos y minimalismo” in Tiempo de Politica (…), op. cit., pp. 194-195.
2
Pro Ruiz, Juan – “Sobre el âmbito territorial de los estudios de la historia” in
Barros, Carlos (ed.) – Historia a Debate (…), op. cit., Tomo III: Otros Enfoques,
p. 65.
3
Molas Ribalta, Pedro – “La Historia Social de la Administracion” in Molas
Ribata, Pedro (org.) – Historia Social de la Administracion Española. Estudios sobre
1
- 113 -
Cristóvão Mata
Em Portugal, a renovação da historiografia dos poderes municipais
tem seguido as linhas metodológicas apresentadas e, mediante a
exposição do perfil social dos agentes políticos, fez delas uma das suas
principais características4. Esta linha de investigação foi seguida por
alguns dos autores de obras dedicadas ao estudo do poder senhorial e
das suas relações com os senhorios territoriais, nomeadamente a Casa
de Bragança5, mas também no âmbito dos estudos sobre o poder local
cujos objectivos passaram pela apresentação da configuração social das
vereações. Salvas raras excepções, não têm abundado os estudos de
longa duração sobre as elites locais e, a respeito destas, embora se tenha
alguma noção do seu perfil social na fase final do século XVII e no século
XVIII, o rosto do poder municipal do século XVI e do período seguinte
permanece ainda obscuro6.
Infelizmente, as fontes disponíveis permitiram-nos iniciar a nossa
análise somente no ano de 1640. Embora tenhamos pretendido conferir-lhe um lastro de longa duração, as já mencionadas lacunas documentais
traduziram-se em espaços em branco no perfil social do poder municipal
em Penela. Com efeito, a sociologia das vereações reporta-se aos sessenta
anos documentados em actas e nas pautas de vereação do Desembargo do
Paço que, por força do prolongamento dos mandatos de 1730 e de 1758,
correspondem a cinquenta e seis mandatos. Estes eram potencialmente
constituídos por dezasseis juízes ordinários, cento e noventa e oito
vereadores e sessenta e seis procuradores do concelho. No entanto,
a progressiva diminuição do grau de rotatividade dos indivíduos pelos
cargos municipais, que demonstraremos de seguida, significou um
número real de indivíduos bem inferior ao dos que o número de mandatos
los siglos XVII y XVIII. Barcelona: Consejo Superior de Investigaciones Científicas/
/Institut Milá i Fontanals-Departamento de Historia Moderna, 1980, pp. 9-18.
4
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Elites locais e mobilidade social (…)”, op. cit.,
p. 39 e Neto, Margarida Sobral – “Percursos da História Local Portuguesa (…)”,
art. cit., pp. 47-90. Veja-se atrás, capítulo 1, uma breve relação destes trabalhos e
das suas principais características.
5
Cunha, Mafalda Soares da – A Casa de Bragança (…), op. cit. e Farrica,
Fátima – Poder sobre as periferias (…), op. cit..
6
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Sociologia das elites locais (…)”, op. cit., p. 60.
Veja-se atrás, capítulo 1, uma breve relação destes trabalhos e das suas principais
características.
- 114 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
suporia: catorze juízes ordinários, cento e dezoito vereadores e cinquenta
e um procuradores correspondentes a cento e setenta e nove indivíduos.
Para alcançar o efeito desejado, foi tomada uma abordagem
nominalista7: depois da reconstituição das cinquenta e seis vereações e
do levantamento dos nomes dos seus integrantes, elaboraram-se fichas
biográficas individuais com base na informação disponível nas actas
das reuniões, nas pautas do Desembargo do Paço e noutra bibliografia
que citaremos8. Porém, o perfil social das vereações não correspondeu
a um modelo rígido e imutável; antes tomou um determinado rumo,
foi-se alterando no decorrer dos anos, e os elementos que caracterizaram
sociologicamente os três ofícios dependeram da conjuntura em que cada
indivíduo se inseriu. Por isso, o discurso adoptado tem necessariamente
que ter em consideração a progressividade do perfil das vereações, sendo
também ele progressivo e organizado de acordo com conjunturas cujos
critérios estabelecemos: um primeiro momento iniciado em 1640 e
concluído em 1673, em função da orgânica institucional da Câmara mas
também da jurisdição da Casa de Aveiro à qual o concelho estava sujeito;
depois entre 1692 e 1761, quando a Câmara é presidida por um juiz de
fora e se relaciona com as sucessivas transferências de jurisdição entre
a Coroa e os duques de Aveiro; por último, entre 1796 e 1833, quando
as vereações são unicamente mandatadas pela Coroa e assumem, enfim,
um perfil bastante nítido.
1. A nomeação dos juízes e dos vereadores estava condicionada por
determinações legais que, logo à partida, moldavam o perfil social dos
oficiais camarários. Até ao desaparecimento da distinção entre cristão-novo e cristão-velho, estava previamente excluído qualquer indivíduo de ascendência judaica, moura ou mulata («sem raça alguma»).
Simultaneamente, os cargos de governo local dos diversos concelhos
Ginzburg, Carlo – “O nome e o como: troca desigual e mercado historiográfico”
in A micro-história e outros ensaios. Lisboa: Difel, 1991; Carvalho, Joaquim Ramos
de – Comportamentos morais e estruturas sociais numa paróquia de Antigo
Regime: Soure 1680-1720. Reconstituições, interpretações e metodologias. Tese de
doutoramento em História Moderna. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade
de Coimbra, 1997, p. 293.
8
Cf. Quadro 1. Juízes ordinários; Quadro 2. Vereadores; e Quadro 3. Procuradores do Concelho, em Anexos, p. 144-164.
7
- 115 -
Cristóvão Mata
portugueses foram sendo reservados aos principais da terra9. Todos estes
condicionamentos significavam, pois, o recrutamento dos oficiais da
Câmara a partir de um grupo social bastante restrito10.
Para o cargo de juiz ordinário, que em número de dois presidiram à
Câmara até 1673, foram eleitos catorze indíviduos. Francisco Pimentel
da Costa (1641 e 1645) e Vicente de Abreu Bacelar (1670 e 1672)
foram eleitos em duas ocasiões, mas um outro, Diogo Correia de Sá,
nomeado em 1640, nunca chegou a assumir o cargo por haver um
precatório do ouvidor para o prenderem11. Neste período que vai de
1640 a 1673, a diferença entre o número potencial de vereadores e o
número real de indivíduos nomeados foi também bastante reduzida:
vinte e dois indivíduos para vinte e quatro postos, aos quais se subtrai
Lourenço Cabral, nomeado para os mandatos de 1640 e 1641 e em
ambos casos substituído por haver culpas na justiça12. Quanto aos
procuradores, o número de nomeações excede ligeiramente o de
mandatos: nove indivíduos eleitos para oito postos. Esta diferença
deve-se essencialmente a falhas ocorridas no processo de eleição.
Em 1672, à nomeação de Miguel Almeida seguiu-se a de Manuel
Almeida, que por nunca ter tomado juramento foi substituído por
Miguel Simões13.
Os oficios honorários da Câmara foram, pois, exercidos por um
número inferior de indivíduos. A disparidade mais acentuada nas eleições
dos juízes ordinários e vereadores traduz-se numa maior rotatividade
no ofício de procurador do concelho e sugere-nos uma diferença de
estatuto entre os primeiros e estes. Uma das funções (informais) dos
municípios era, de facto, a manutenção da diferença entre os estados
9
p. 42.
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Elites locais e mobilidade social (…)”, op. cit.,
Veja-se Quadro 4. Relação entre nomeações e ofícios e Quadro 5. Distribuição
dos atributos dos vereadores activos por períodos, em Anexos, p. 165.
11
CEHLRSDA – Vereação de 18 de Fevereiro de 1640 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1640-1641), fl. 10v.
12
CEHRSDA – Vereação de 18 de Fevereiro de 1640 e Vereação de 16 de
Fevereiro de 1641 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1640-1641), fl. 10v
e 87-87v.
13
CHELRSDA – Vereação de 3 de Janeiro de 1672; Vereação de 31 de Janeiro
de 1672 e Vereação de 26 de Março e 1672 in Livro de Actas de Sessões da Câmara
(1670-1673), fls. 65v-66, 69 e 79v.
10
- 116 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
sociais e, «num conjunto de actos camarários cuja regra é a selectividade
e a discriminação», a nomeação dos homens para os ofícios consumava
a distinção14. Para este primeiro período rareia a informação biográfica
dos indivíduos empossados nos três ofícios, mas verifica-se que houve
homens nomeados juízes ordinários e vereadores: António de Mascarenhas
foi nomeado juiz ordinário em 1644 e vereador em 167115, e Manuel
Velasques Sarmento entrou na governança em 1673, quando foi eleito
juiz ordinário, sendo depois nomeado vereador em 169216. No entanto,
nenhum procurador foi eleito para qualquer outro ofício honorário.
Três dos juízes ordinários eram de Penela e um da Ponte. Onze sabiam
assinar, o que releva um nível de alfabetização mínimo no universo dos
treze indivíduos que assumiram o juízo ordinário, e um deles, Sebastião
de Miranda Ribeiro, possuía o título académico de Doutor. Diogo Correia
de Sá, o já referido juiz que não assumiu o cargo em 1640, e Manuel
Velasques Sarmento eram familiares do Santo Ofício. Este último usava
a forma de tratamento «Dom». Quanto a outros atributos sociais, apenas
se contabiliza um capitão das companhias de ordenança, Francisco
Pimentel da Costa. Por sua vez, a residência dos vereadores também foi
escassamente registada. Três do Espinhal, dois de Penela e, em número
de um, os vereadores residentes na Ponte, Ribeira e Covão do Porco.
De resto, não diferem muito do perfil dos juízes: a quase totalidade dos
vereadores sabia assinar (19) e três haviam frequentado a Universidade
de Coimbra.
O perfil social do conjunto dos vereadores destas primeiras décadas
é bastante difícil de estabelecer, pois o único indicador de um estatuto
social com algum relevo resume-se a dois capitães de ordenança. Familiar
do Santo Ofício houve apenas um, embora este indicador servisse mais
o propósito de atestar a limpeza de sangue e menos a concessão de
14
p. 13.
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra (…), op. cit., Volume II,
CEHLRSDA – Termo de Juramento [de 5 de Abril de 1644] in Livro de Actas
de Sessões da Câmara (1644-1645), fl. 34 e Vereação de 1 de Janeiro de 1671 in
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1670-1673), fl. 26v.
16
CEHLRSDA – Vereação de 23 de Janeiro de 1673 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1670-1673), fl. 108 e Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 1-18v.
15
- 117 -
Cristóvão Mata
nobreza17. Sobre cavaleiros da Ordem de Cristo ou fidalgos da Casa Real
não se faz menção alguma.
Neste período, a principal característica consiste na hipotética
ligação de alguns indivíduos nomeados à Casa de Aveiro. É o caso
dos tabeliães João da Costa Barbosa, Simão Pessanha da Cruz e
Mateus Cabral de Faria, providos pelos duques de Aveiro para aqueles
cargos; de António Correia de Magalhães, procurador do duque no
concelho de Penela; e de André Luís, rendeiro das jugadas. Sobre este
último informa-nos uma acta de 1644 que era um homem «rico» 18.
Não havendo nenhuma outra referência sobre a sua pessoa, somos levados
a crer que o factor que lhe garantiu o acesso à Câmara possa ter sido a
sua riqueza pessoal, assim como a sua ligação à Casa de Aveiro, cujas
rendas contratava. Diferente era o perfil do vereador Felício de Amorim
Leite, de quem temos notícia de ter sido um «homem […] dos honrados»
do concelho19, pelo que o critério que justificava a sua eleição seria outro.
Com base nestas informações parece-nos admissível considerar
que a inclusão dos vereadores nas redes clientelares da Casa de Aveiro
foi, enquanto critério de recrutamento, o aspecto mais marcante e que,
a respeito do estatuto, os indivíduos eleitos ocupavam uma posição
mediana e algo indefinida na escala social. A sua principalidade podia
ser sinónimo de nobreza, mas não de fidalguia. De facto, «o fidalgo era
nobre. Nem todo o nobre era fidalgo». Esta proposição que nos oferece
Joaquim Romero de Magalhães significa que nobreza era um ideal de
vida e nobre aquele cujo comportamento correspondia à idealização
de uma categoria social. Quem era apenas considerado nobre «ficava
numa zona indefinida e difusa entre o plebeu e o fidalgo»20. Por isso, os
vereadores não se ajustavam à noção de fidalguia, pelo menos na acepção
que nos apresenta Sérgio Cunha Soares: fidalgo significava ser «filho de
algo», aquele que herdou um património não estritamente material que
Sobre esta questão veja-se Olivar, Fernanda – “Rigor e interesses: os estatutos
de limpeza de sangue em Portugal” in Cadernos de Estudos Sefarditas. N.º 4 (2004),
pp. 151-182.
18
CEHLRSDA – Vereação de 11 de Outubro de 1644 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1644-1645), fl. 87v-90.
19
Olival, Fernanda – “Rigor e interesses (…)”, art. cit., p. 172.
20
Magalhães, Joaquim Romero – “A Sociedade” in Mattoso, José (dir.) – História
de Portugal. Volume 3: Magalhães, Joaquim Romero (coord.) – No Alvorecer da
Modernidade (1480-1620). Lisboa: Editorial Estampa, 1997, p. 416.
17
- 118 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
lhe confere orgulho, estima e estatuto social elevado, enquanto fidalguia
era um «arquétipo, construído sobre diversos conteúdos que indicam
uma determinada modelação social»21. O estatuto social dos vereadores
das décadas de 1640 e 1673, a ter sido considerado como critério de
nomeação, certamente estaria associado à noção de principalidade e,
possivelmente, de nobreza, mas este atributo era definido por factores
como a riqueza, o prestígio social e a honradez, e não correspondia a
uma identidade social rigorosamente definida como posteriormente seria
a dos vereadores detentores do foro de fidalgo da Casa Real.
Mais reduzida ainda é a informação sobre os procuradores do concelho.
Para estas duas décadas sabemos apenas que quase todos sabiam assinar
e que Francisco Jorge e Francisco Lima residiam em Penela. No entanto,
ao contrário dos vereadores, parecem corresponder a um estatuto social
bastante modesto, como sugere a informação disposta nos autos de
delegação das funções a desempenhar nas procissões, eventos nos
quais «o lugar de cada um está fixado conforme e representação mental
colectiva de estratificação social»22. À Câmara competia nomear os
homens responsáveis pelo transporte das varas do pálio e das tochas
na procissão do Corpo de Cristo. Não podemos garantir que, na sua
totalidade, os primeiros tenham servido como vereadores mas, com base
nas informações existentes para vereadores com o mesmo apelido, seriam
invariavelmente homens de estatuto social superior ao dos procuradores,
enquanto o transporte das tochas era efectuado por homens que supomos
gozarem de um estatuto social inferior, alguns dos quais haviam servido,
ou haveriam de servir, como procuradores.
No período seguinte, não só permanece esta diferenciação, como
também surgem indicadores que propõem uma associação dos procuradores a determinada ocupação profissional. Em 1695, Pedro Moreira,
caldeireiro, era o procurador do concelho23 e para a Câmara de 1758 foi
nomeado procurador o alfaiate Simão Mendes24. Em 1715, cumpriu-se
Soares, Sérgio Cunha – “Nobreza e Arquétipo Fidalgo. A propósito de um
Livro de Matrículas de Filhamentos (1641-1724)” in Revista de História das Ideias.
Volume 19 (1997), pp. 410-413.
22
Coelho, Maria Helena da Cruz e Magalhães, Joaquim Romero – O poder
concelhio (…), op. cit., p. 36.
23
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1692-1696), fls. 1-18v.
24
CEHLRSDA – Livro de Actas de Sessões da Câmara (1752-1761), fls. 185-269v.
21
- 119 -
Cristóvão Mata
a norma de nomeação de homens para transportar as varas do pálio,
mas relativamente às tochas não foram apontados nomes de indivíduos,
tendo antes sido ordenado que comparecessem todos os oficiais
sapateiros, alfaiates, picheleiros, carpinteiros e caldeireiros25. Com efeito,
esta associação entre o perfil social de oficiais mecânicos e o cargo de
procurador do concelho poderia corresponder a um mecanismo informal
pelo qual o Terceiro Estado se fazia representar na instituição municipal,
dado que, ao contrário de outros concelhos, como Lisboa e a Casa dos
Vinte e Quatro, não dispunham de organizações corporativas no seio da
instituição municipal26.
Naturalmente, o episódio não evidencia que todos os procuradores
proviessem do grupo da gente mecânica, pois houve de facto procuradores
com perfis distintos do acima apresentado. Roque Damião, procurador
em 1735, era alcaide menor, carcereiro e escrivão do judicial27 e um outro
procurador, João dos Santos, mamposteiro-mor dos cativos e capitão de
ordenança – muito provavelmente por isso foi eleito por quatro ocasiões.
De facto, neste período o que se detecta é, à semelhança do já escrito
atrás, que o estatuto social dos procuradores do concelho era bastante
modesto e relativamente diversificado, o que explica a elevada taxa
de rotatividade. Entre 1692 e 1761 estão documentados trinta e dois
mandatos correspondentes a trinta e um procuradores eleitos, mas dois
destes indivíduos nunca tomaram juramento e outros tantos, tendo-o
feito, jamais assumiram funções.
Os vereadores, por sua vez, parecem ter diminuído o seu grau
de rotatividade em comparação ao período imediatamente anterior.
Aos noventa e seis potenciais vereadores corresponderam apenas sessenta
e três nomeações e, dentre estes, treze indivíduos nunca chegaram a tomar
juramento para o exercício do cargo, um dos nomeados não existia e
outro assinou mas nunca marcou presença nas reuniões – ou seja, 71%
CEHLRSDA – Vereação de 18 de Junho de 1715 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fl. 15v.
26
Agradecemos à Prof.ª Dr.ª Guilhermina Mota esta observação que partilhou
connosco aquando da comunicação intitulada “A vereação de Penela no século
XVIII: perfil social do poder concelhio” que, no âmbito do Seminário Permanente
de História Local, apresentámos a 23 de Fevereiro de 2013 no Centro de Estudos
de História Local e Regional Salvador Dias Arnaut.
27
Cf. a sua nomeação em CEHLRSDA – Vereação de 1 de Abril de 1735 in
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736), fls. 281 e seguintes.
25
- 120 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
dos cargos foram ocupados por 26% dos indivíduos que teoricamente
lhes correspondiam e, em média, cada vereador exerceu funções em dois
mandatos. Neste universo de quarenta e oito vereadores, temos referência
ao local de residência de quarenta homens: Penela (19), Espinhal (12),
quintas de habitação própria (4), Venda das Figueiras (2) e Chainça,
Cumieira e Venda dos Moinhos (1). Todos eles assinaram pelo seu próprio
punho as actas das reuniões a que assistiram e quinze indivíduos detinham
um título académico – cerca de um terço dos vereadores.
«A rotatividade e a relativa alternância, bem como o suporte no
oficialato local, tinham sido, sobretudo no século XVII, aspectos salientes
do grupo afecto ao ducado de Aveiro na Câmara coimbrã, e, para a
Lousã, tal significa a conservação dessa estrutura, e sua hegemonia local,
até meados do século XVIII»28 – esta é a definição do perfil social dos
vereadores lousanenses que podemos adaptar às vereações de Penela,
embora estes traços se adeqúem a um primeiro período encerrado em
1736. Até este ano, a presença na vereação de indivíduos ligados à
Casa de Aveiro manteve-se: o Doutor António Freire de Perada,
procurador dos duques, foi nomeado vereador por cinco vezes nas
décadas de 1720 e 1730; e os almoxarifes e juízes dos direitos reais,
João de Salazar Jordão, João Freire de Salazar Machado Jordão e João
Pereira Franco, ambos cargos de designação senhorial, foram igualmente
nomeados por diversas ocasiões nas décadas de 1690, 1720 e 1730.
Diferente é o caso de José Neto Arnaut Salazar Sarmento, apresentado
como cavaleiro da Ordem de Cristo e agora, no que concerne à Casa de
Aveiro, identificado como ouvidor de Montemor-o-Velho, pois reportase a um período em que começa a despontar a faceta aristocrática das
vereações. Com efeito, o número de vereadores a gozar da forma de
trato «Dom» aumentou consideravelmente, embora os quatro homens
fossem da família Velasques Sarmento. Um deles, D. Francisco Velasques
Sarmento e Vasconcelos Alarcão, vereador em 1753 e 175729, era fidalgo
28
p. 59.
Soares, Sérgio Cunha – “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã (…)”, art. cit.,
CEHLRSDA – Vereação de 22 de Janeiro de 1757 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1753-1761), fl. 145; para o mandato de 1753, veja-se as actas
(fls. 1-16v).
29
- 121 -
Cristóvão Mata
da Casa Real, assim como José de Melo Coutinho Garrido (1758-1761)30.
Ambos gozavam de um estatuto social bastante elevado, conotado com
o arquétipo fidalgo, mas serviram na governança somente na década de
1750. Da mesma maneira, os únicos quatro vereadores que envergaram
o hábito de cavaleiro da Ordem de Cristo foram nomeados na mesma
década: Bartolomeu de Quintanilha (1754)31, João Neto Arnaut Salazar
Sarmento (1755)32, o já referido José de Melo Coutinho Garrido e
Lourenço Xavier Garrido, pai do anterior (1753 e 1757)33.
Um dos indicadores que na primeira fase deste período mais se
vulgarizou foi a referência a cargos militares detidos por alguns
vereadores: sete capitães de ordenança34 e um sargento-mor35 que,
contrariamente ao único capitão-mor nomeado, o já referido Lourenço
Xavier Garrido, foram eleitos entre 1715 e 1736. Considerando os dados
globais dos fidalgos e dos cavaleiros da Ordem de Cristo, parece pois que
inicialmente se mantém um perfil de estatuto médio e relacionado com
a Casa de Aveiro e que o processo de aristocratização das vereações se
detecta a partir de meados do século XVIII. De facto, como se disse, os
únicos fidalgos da Casa Real a que se faz menção, bem como os quatro
cavaleiros da Ordem de Cristo, serviram exclusivamente na década de
1750, quando também foi eleito o único capitão-mor e, ao serviço da
Casa de Aveiro, o referido ouvidor de Montemor-o-Velho.
É certo que as nomeações dos Velasques Sarmentos, que gozavam
de uma distinta forma de trato, encontram-se igualmente repartidas pela
CEHLRSDA – Vereação de 6 de Janeiro de 1758 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1753-1761), fl. 185.
31
CEHLRSDA – Vereação de 31 de Dezembro 1753 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1753-1761), fl. 14v.
32
CEHLRSDA – Vereação de 30 de Dezembro de 1754 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1753-1761), fl. 56v.
33
CEHLRSDA – Vereação de 22 de Janeiro de 1757 in Livro de Actas de
Sessões da Câmara (1753-1761), fl. 145; para o mandato de 1753, veja-se as actas
(fls. 1-16v).
34
António da Costa Pimentel (1715 e 1719); Bartolomeu de Almeida Mexia
(1717 e 1724); João Alves de Faria (1722); João Quaresma de Matos (1693 e 1715);
Manuel da Silva e Sousa (1673, 1692 e 1696); e Francisco Esteves, que também era
alcaide-mor (1695, 1719 e 1727). Um oitavo capitão, Lopo de Sousa Mascarenhas,
foi designado vereador em 1721, mas não chegou a tomar juramento para o exercício
do cargo.
35
Miguel de Sousa Melo Freire (1717 e 1755).
30
- 122 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
década de cinquenta e pelas anteriores. Todavia, neste primeiro momento,
outros quatro membros da mesma família, igualmente com atributo de
«Dom», foram nomeados e nunca assumiram o cargo36. À semelhança do
que ocorreu na cidade de Coimbra, onde desde o início do século XVIII
se foi desenhando um «pacto fidalgo» oposto às nomeações de gente de
menor qualidade, declaradamente indisponível para servir na Câmara na
década de 1720 e triunfante a partir de 1739, ano em que se firmou a sua
«total hegemonia e exclusividade na direcção dos negócios municipais» e
se estabeleceu um poder concelhio independente da influência de titulares
e mais submissa à Coroa37, a nobreza de primeira linha do concelho de
Penela poderá ter recusado aceder às vereações por considerar gravoso
para o seu estatuto a partilha do poder com gente de menor qualidade,
o que de facto ajuda a explicar a instabilidade governativa vivida na
década de 1720, que num capítulo anterior expusemos.
Existe, portanto, uma efectiva diferença entre o perfil dos vereadores
da viragem do século XVII para o XVIII e o dos mandatados na década de
1750, que anuncia a elevação do estatuto social dos vereadores do período
seguinte. O hiato documental existente entre estas duas épocas não nos
permite apresentar o perfil social dos vereadores entre 1736 e 1753 nem,
por conseguinte, averiguar como se processou a evolução da composição
social das vereações, embora seja de crer que o falecimento de D. Gabriel
de Lencastre em 1745, após um breve período de administração da Casa
de Aveiro, tenha precipitado a tendência aristocratizante cujo início se
detecta na década seguinte. Na Lousã, aliás, a morte do sexto duque de
Aveiro fragilizou o equilíbrio de forças que existia e fazia coexistir na
Câmara grupos sociais distintos e heterogéneos, provocando consequentemente «um realinhamento das elites da terra em novos fulcros, com
D. António Velasques Sarmento (1729); D. João Velasques Sarmento (1694);
D. Manuel Velasques Sarmento (1718) – homónimo do vereador de 1692 e juiz
de 1773, mas que acreditamos tratar-se de um outro não apenas por este mandato
distar cronologicamente dos mandatos daquele, mas sobretudo devido aos locais de
residência. Como se verá, a família Velasques Sarmento fixou-se inicialmente no
Espinhal e aí se manteve um dos troncos da família, residindo os membros de um
outro em Penela, mas este Manuel Velasques Sarmento era da Venda dos Moinhos
– e D. Martinho Velasques Sarmento (1718).
37
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra (…), op. cit., Volume II,
pp. 41-47.
36
- 123 -
Cristóvão Mata
uma política mais centralizante e veiculada pela ascensão de fortes
poderios locais»38.
Com a extinção da Casa de Aveiro, este processo poderá ter-se acentuado. A ausência de um poder que, controlando as nomeações para a
Câmara, elegia gente de estatuto intermédio, assim como a suspensão do
processo eleitoral, que como vimos se manteve num impasse até 1762,
poderão ter provocado a definitiva ascensão da nobreza de primeira linha.
Nos concelhos de Santarém e de Lagos da segunda metade do século
XVIII houve, de facto, longos períodos em que se registam problemas
na renovação das vereações que acabaram por resultar no desinteresse
das nobrezas locais pelos cargos39. Só que, contrariamente ao que temos
vindo a demonstrar, a nobreza de primeira linha estava já instalada
nas respectivas Câmara destes dois concelhos, pelo que em Penela
poderá ter ocorrido o contrário: o desaparecimento de um donatário
que nomeava homens de estatuto intermédio e inseridos nas suas redes
clientelares e uma certa negligência por parte do poder central poderão
ter criado o espaço necessário à monopolização da Câmara pela parte da
fidalguia local.
Na transição do século XVIII para o XIX, a monopolização da
Câmara pelos «poderios locais» encontrava-se já plenamente consolidada
e evidencia-se pela quase completa ausência de rotatividade dos
homens pela Câmara. Embora os registos das vereações nomeadas pelo
Desembargo do Paço se reportem a um período posterior a 1796, desde
1772 que estão documentados, embora descontinuamente, os processos
eleitorais que nos sugerem haver já então o predomínio da família
Velasques Sarmento e de ramos colaterais40. Para o triénio de 1793-1795,
numa pauta final de doze nomes, inscrevem-se os nomes de Francisco
Velasques Sarmento e Vasconcelos Alarcão, João Casimiro Mascarenhas
Velasques Sarmento Alarcão, José Mascarenhas Coelho Velasques
Sarmento Alarcão e José Velasques Sarmento e Vasconcelos Alarcão, para
Soares, Sérgio Cunha – “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã (…)”, art. cit.,
pp. 58-60.
39
Coelho, Maria Virgínio – Perfil de um poder concelhio (…), op. cit., p. 65 e
Paula, Glória de Santana – Lagos (1745-1792) (…), op. cit., pp. 118-130.
40
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1042, Caixa
1141; Maço 1044, Caixa 1143.
38
- 124 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
além de Jerónimo Colaço de Magalhães Teixeira Sarmento, João Colaço
de Magalhães Sarmento e José de Melo Arnaut Salazar Sarmento41.
Mas a hegemonia do grupo fidalgo é mais visível na relação do
número de eleitos com o potencial número de cargos. Entre 1796
e 1834, registam-se vinte e seis câmaras às quais corresponderiam
setenta e oito vereadores; no entanto, foram nomeados apenas trinta
e sete indivíduos, aos quais se subtrai José Simões Gomes Cordeiro,
eleito em 1827 e que não tomou juramento42. No âmbito das eleições,
existem doze processos cujos informadores, em número de dois ou de
três, correspondem a somente dezasseis indivíduos. Mas sob a (relativa)
rotatividade, escondia-se o predomínio fidalgo e da gente da governança
que antecedeu a renovação do poder concelhio. Até 1817, serviram de
informadores somente dez indivíduos, dos quais cinco detinham o foro
de fidalgo da Casa Real e dentre os quais oito foram regularmente eleitos
vereadores – a elite social e política local não só monopolizava os cargos
municipais, como também dominava os mecanismos de acesso ao poder.
De facto, os eleitores foram invariavelmente gente da governança.
Dos treze processos que denunciam setenta e oito eleitores, constam os
nomes de apenas quarenta e três homens – pouco mais de metade do
conjunto das possibilidades. Vinte e cinco homens foram eleitores uma
só vez, dez em duas ocasiões, quatro por três vezes, dois em quatro e em
número de um os que o foram em cinco e sete vezes. Portanto, dezoito
homens a servir de eleitor em cinquenta ocasiões das setenta e oito
possíveis. E nas treze pautas que contêm a lista final dos elegíveis, são
arrolados cinquenta e nove indivíduos. Sete destas foram elaboradas antes
de 1817 e nelas se regista o nome de vinte e oito sujeitos: onze homens
nomeados uma vez apenas, dois em duas, quatro em três, dois em quatro,
três em cinco e seis em seis. Depois, operou-se a renovação da Câmara.
Uma carta datada 18 de Janeiro de 1818, redigida pelo capitão
José António de Carvalho e subscrita por «outros que tem sido por si,
e por seus pais e maiores da governança», expressava a indignação que
provocara a vinda do corregedor de Coimbra no ano anterior. Segundo se
41
1146.
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1047, Caixa
É o único caso de que temos certeza. A natureza das fontes deste período é
diferente da dos dois anteriores, o que leva a que não tenhamos informação acerca
de hipotéticas nomeações cujas funções não foram exercidas.
42
- 125 -
Cristóvão Mata
queixavam, o oficial, «sem a concorrencia da mesma nobreza, procedeu á
nomeação dos eleitores, e a factura das pautas; e talvez mesmo incluindo
nas mesmas o curador dos orfãos, e outros empregados em officios de
justiça, e fazenda»43. As consequências deste episódio são desde logo
evidenciadas pelo aumento do grau da rotatividade dos eleitos para a
Câmara. Nas pautas do Desembargo do Paço elaboradas a partir desse ano,
surgem trinta e um novos nomes. Entre 1796 e 1834, foram empossados
vereadores trinta e seis indivíduos, mas para os quinze mandatos datados
até 1817, foram nomeados somente dezanove homens; enquanto a partir
desse ano, vinte seis vereadores exerceram as funções em onze mandatos
e no meio destes contabilizam-se dezassete novos nomes.
A abertura da Câmara é bastante evidente, mas a renovação das
vereações não se procedeu em termos meramente numéricos. Efectuou-se mediante o aparecimento de novos protagonistas, de gente com
um estatuto social diferente e mais diversificado, de menor qualidade,
que se sucede ao afastamento dos que até então haviam dominado as
vereações. Dos treze fidalgos que serviram a partir de 1796, sete foram
vereadores somente até 1817 e os restantes em todo o período, não se
registando nenhum que tenha exercido estas funções exclusivamente
a partir daquela eleição. O episódio protagonizado pelo corregedor de
Coimbra não afastou de imediato a fidalguia da Câmara, mas na verdade
a média de participações de três destes seis vereadores caiu abruptamente
após a abertura do acesso à Câmara44.
Os vereadores com hábito de cavaleiro da Ordem de Cristo surgem
neste período em número bastante reduzido, mas no alvorecer do
século XIX este indicador já não assume a relevância de outrora, pois
os cavaleiros «tanto podiam pertencer à “antiga nobreza” das terras
como ter uma ascensão bem recente»45. Será esta situação que justifica o
43
1165.
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1068, Caixa
Jerónimo Colaço de Magalhães Teixeira Sarmento, vereador em 1816 (90%),
1817 (85%), 1819 (35%) e 1820 (20%); João Leal da Gama Nobre Jácome Faria,
em 1815 (83%) e 1819 (0); José Guedes Coutinho Garrido em 1813 (71%), 1816
(90%), 1818 (32%) e 1819 (40%). Todos eles foram eleitos vereadores depois de
1820, mas a média de presenças não é quantificada nesses casos, uma vez que não
correspondem a mandatos registados em acta.
45
Monteiro, Nuno Gonçalo – “Elites locais e mobilidade social (…)”, op. cit.,
p. 60.
44
- 126 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
facto de os dois vereadores cavaleiros da Ordem de Cristo que serviram
até 1817, José de Melo Coutinho Garrido e José Leal da Gama Nobre
Jácome Faria, serem fidalgos da Casa Real – portanto, de uma nobreza
mais antiga – enquanto um outro, Manuel Joaquim Xavier, de origens
mais obscuras, tenha servido predominantemente na década de 1820.
A mesma tendência verifica-se no último dos indicadores de nobreza.
Os membros da família Velasques Sarmento continuaram a ser os únicos
a gozar da forma de trato «Dom» e embora seis membros desta família
tenham sido eleitos vereadores, só um deles, D. João de Alarcão Velasques
Sarmento, foi nomeado e assumiu funções depois de 1817.
Vinte destes vereadores sabiam pelo menos assinar o seu nome, mas
este número, acreditamos, está bastante subvalorizado, pois dispomos das
actas de somente nove mandatos (1813-1820). No que respeita aos graus
académicos, os oito vereadores que haviam frequentado a Universidade
– até 1817 são 21% do conjunto dos vereadores e, depois, 27%. Decerto,
é uma característica com algum relevo, mas todavia concorrente com
outras na definição do perfil social dos vereadores. Entre o conjunto
dos trinta e seis homens que exerceram funções, conhece-se o local de
residência de trinta e dois vereadores: dezasseis do Espinhal, oito em
quinta de que eram proprietários, cinco de Penela, dois da Lagarteira
e um da Venda das Figueiras. Verifica-se pois que, paralelamente à
monopolização das vereações pela aristocracia local, ocorreu um
fenómeno de progressiva deslocalização do poder para o lugar do
Espinhal, que aliás não se dissocia do perfil social dos vereadores: dos
treze fidalgos da Casa Real que foram nomeados, somente dois eram
residentes em Penela46, quatro viviam em quinta própria47 e sete eram
do Espinhal48.
José de Melo Coutinho Garrido e Sebastião Mascarenhas Velasques Sarmento
e Alarcão.
47
Jerónimo Colaço de Magalhães Teixeira Sarmento (Quinta das Pontes);
João Casimiro Mascarenhas Velasques Sarmento Alarcão (Quinta de São Bernardo);
José Guedes Coutinho Garrido (Quinta da Boiça); José Mascarenhas Coelho
Velasques Sarmento Alarcão (Quinta de Vale de Arinto).
48
João de Alarcão Velasques Sarmento; João Leal da Gama Araújo e Vasconcelos;
João Leal da Gama Jácome Nobre Faria; José Bernardo de Melo Salazar Sarmento;
José de Melo Arnaut Salazar Sarmento; José Leal da Gama Nobre Jácome Faria;
José Velasques Sarmento e Vasconcelos Alarcão.
46
- 127 -
Cristóvão Mata
O serviço a Sua Majestade na própria localidade e numa esfera
supralocal caracteriza as vereações posteriores a 1796. Houve dois
capitães-mores: José de Melo Coutinho Garrido exerceu funções antes
de 1817 e outro, Aires Guedes Coutinho Garrido, juntamente com três
capitães de ordenança49, depois do referido processo eleitoral. Dois alferes
foram feitos vereadores, mas somente depois da famigerada eleição50,
que parece não ter influenciado as nomeações do coronel de cavalaria da
Lousã, José Bernardo de Melo Salazar Sarmento (1816, 1823 e 1827).
O monteiro-mor de Penela na comarca de Coimbra, José Guedes Coutinho
Garrido, também juiz de fora em Penela e superintendente das alfândegas
das comarcas de Aveiro, Coimbra e Leiria, foi vereador antes e depois
de 1817, mas, como se viu, com uma média de participações bastante
inferior à de antes desse ano. A um nível superior na administração
régia, regista-se somente um desembargador, Joaquim Manuel Morais de
Mesquita Pimentel (1803, 1815 e 1832), e um corregedor, o já referido
José de Melo Coutinho Garrido, cujo último mandato data de 1810.
Houve ainda outros vereadores que serviram a Coroa, mas num
escalão inferior ao destes homens, como o almoxarife e escrivão dos
órfãos, Henrique Carlos de Sousa Azevedo (1827 e 1833). De resto,
foram inéditas as nomeações de três indivíduos que haviam servido
como procuradores do concelho: Francisco José Teixeira (1825), Luís
Guilherme Pires Furtado Galvão (1826) e Luís Pires de Almeida Freire
(1828), estes últimos dois também advogados. A profissão dos vereadores
é referida somente em três outros casos, dando-se conta de um médico
do partido, João Pires de Almeida (1818); de um lavrador, José Joaquim
dos Pombais (1828); e de um boticário, José Pires de Almeida Freire
(1827) – todos eles, conforme se constata, vereadores depois de 1817.
O perfil dos procuradores do concelho foi bastante distinto dos do
período anterior e, tal como se verificou para os vereadores, ocorreu
um primeiro momento em que o posto foi monopolizado por poucos
indivíduos, abrindo-se depois a novos nomes. Nas treze pautas de que
dispomos foram considerados elegíveis para o posto de procurador vinte
e oito indivíduos, e se a grande maioria (17) foi assim considerada apenas
uma vez, os cinco indivíduos arrolados cinco ou mais vezes foram os que
Francisco José Teixeira (1825), Francisco Xavier Gomes (1827) e José António
de Carvalho (1825 e 1833).
50
Bernardo de Almeida Craveiro (1827) e José Joaquim dos Pombais (1828).
49
- 128 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
acabaram por dominar o posto de procurador: António Dias Custódio
(1805) e António Pires de Almeida Freire (1803, 1807, 1811, 1819 e
1824) foram arrolados cinco vezes, Francisco da Costa Mesquita de
Campos (1808, 1816 e 1829) sete vezes, José de Campos e Oliveira
(1806, 1810, 1815) em oito ocasiões e Luís José Pires de Almeida Freire
(1796, 1804, 1809, 1813, 1817, 1818 e 1827) elegível por dez vezes.
Para vinte e seis potenciais cargos foram nomeados dez indivíduos,
mas até 1717 exerceram funções somente seis homens e, depois deste
ano, oito, metade dos quais pela primeira vez.
O número dos procuradores que exerceram funções foi, com efeito,
bastante inferior ao número potencial dos cargos, e tal como se verificou
nos vereadores deste período, as nomeações do Desembargo do Paço
recaíram predominantemente sobre homens do Espinhal (4), seguindo-se os de Penela (2), da Venda das Figueiras e do Pastor (1). A grande
maioria dos titulares conotou-se com um perfil específico: pelo menos
sete assinavam, revelando um nível mínimo de alfabetização, e seis
detinham um título académico. Estes últimos associavam-se, de facto, às
chamadas profissões liberais, sendo todos eles advogados51. Como vimos,
deste conjunto de homens saíram três futuros vereadores. Tal como os
vereadores, o seu perfil definia-se também pelo serviço prestado à Coroa,
nomeadamente no campo militar, embora em patentes inferiores às dos
vereadores: os alferes António Dias da Silva (1825) e Manuel Lourenço
de Jesus (1828 e 1833), o sargento Francisco dos Santos Arnaut (1832)
e o capitão Francisco José Teixeira (1814 e 1826).
Este fenómeno certamente que se poderia relacionar com a primeira
experiência liberal não fora o facto de iniciar-se precocemente e de as
implicações da revolução terem tido um alcance diminuto. De facto,
as normas do decreto de 27 de Julho de 1822 impuseram critérios
censitários à eleição dos vereadores, mas rapidamente a Vila Francada
colocou termo à experiência liberal52. Em Penela, na verdade, o início
António Dias Custódio (1805); António Pires de Almeida Freire (1803, 1807,
1811, 1819 e 1824); Francisco da Costa Mesquita de Campos (1808, 1816 e 1829);
José de Campos Oliveira (1806, 1810 e 1815); Luís Guilherme Pires Furtado Galvão
(1821); Luís José Pires de Almeida Freire (1796, 1804, 1809, 1813, 1817, 1818
e 1827).
52
Fernandes, Paulo Jorge da Silva – “Elites locais e poder municipal (…)”,
art. cit., p. 62.
51
- 129 -
Cristóvão Mata
do fenómeno de renovação da elite dirigente antecipou em alguns anos
aquela lei e manteve-se até à instauração definitiva do Liberalismo, pelo
que cremos dever-se a outros factores. Nomeadamente ao desinteresse
que a fidalguia foi demonstrando relativamente à partilha do poder com
elementos de estatuto social bastante inferior e que derivava de um
episódio aparentemente fortuito.
Os elementos de que dispomos não nos permitem afirmar com
propriedade que a correição de 1817 e as profundas alterações ocorridas
posteriormente se trataram de fenómenos directamente relacionados com
o espírito liberal que veio a desembocar nas experiências revolucionárias
das décadas seguintes. Mas a profunda alteração no perfil social dos
procuradores, claramente identificados com profissões tipicamente
associadas a uma classe social emergente e alguns manifestamente
partidários do liberalismo53, assim como a evidente ruptura do processo de
aristocratização das vereações, constituem efectivos abalos na estrutura
municipal de Penela, até então dominada por uma elite social claramente
identificada com o foro de fidalgo da Casa Real.
2. A progressiva aristocratização das vereações, acompanhada de um
igual estreitamento do acesso à Câmara, visível desde meados do século
XVIII e plenamente consumada nos anos de 1796-1817, significou não
apenas a conotação do poder municipal com o «arquétipo fidalgo», como
também propiciou a promoção social dos titulares dos ofícios camarários.
Neste processo, e a par da interferência da parte da Casa de Aveiro em
favor de alguns indivíduos que presumimos terem constituído as suas
Há indícios de que um procurador e vereador esteve associado à mudança
política ocorrida na década de vinte, como sugere a lista de condenados em que
figura o nome de Luís José Pires de Almeida Freire (bem como o de José Simões
Gomes Cordeiro, vereador eleito em 1827 mas que nunca tomou juramento, muito
provavelmente na sequência desta contra-revolta), mas assumir que os indivíduos
emergentes neste século eram adeptos dos liberalismo seria demasiado arriscado –
cf. Velozo, Pedro da Fonseca Serrão – Collecção de Listas, que contem os nomes
das pessoas, que ficarão pronunciadas nas devassas, e summarios, a que mandou
proceder o Governo Usurpador depois da heroica contra-revolução, que arrebentou
na mui nobre, e leal cidade Cidade do Porto em 16 de Maio de 1828, nas quaes se
faz menção do destino, que a Alçada, creada pelo mesmo Governo para as julgar,
deu a cada uma dellas. Porto: Typ. De viuva Alvares Ribeiro & Filho, 1833, p. 84
e 216.
53
- 130 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
clientelas a nível local, o estatuto era condição primordial para se aceder
à Câmara. Mas a inclusão na governança da terra era igualmente factor
de valorização pessoal e de acréscimo de dignidade54 – representou parte
importante de um cursus honorum que a nível institucional, nas estruturas
jurisdicionais da Coroa e da Casa de Aveiro, podia conduzir a esferas mais
elevadas, todavia percorrido não tanto a nível individual como familiar.
O caso da família Garrido exemplifica o que pretendemos afirmar.
O primeiro membro desta família a ser mencionado foi Pedro Álvares
Garrido, eleito capitão-mor em 172055. O auto de eleição feito pelo
Desembargo do Paço dava conta de ser cavaleiro da Ordem de Cristo e que
havia sido escolhido entre os seus concorrentes para o posto em questão
pela «boa enformação que se ouve da sua nobreza e procedimento»56.
A crer em Delfim José de Oliveira, a família era originária de Castelo de
Vide e pertencia à governança desse concelho. Pedro Alvares Garrido
havia servido a Coroa na Guerra da Sucessão Espanhola, na sequência
da qual adquiriu o hábito daquela ordem57. Abdicou do comando
das companhias de ordenança de Penela de que era proprietário em
173458. Nele lhe sucedeu o filho, Lourenço Xavier Garrido, que então
comandava uma companhia de ordenança e era «pessoa da principal
nobreza», cavaleiro da Ordem de Cristo, familiar do Santo Ofício e
formado na Universidade de Coimbra59. Em 1772 gozava do foro de
Soares, Sérgio Cunha – O Município de Coimbra (…), op. cit., Volume II, p. 13.
Nomeado entre outros três nomes para o dito posto, sendo depois escolhido
pelo Desembargo do Paço – CHELRSDA – Vereação de 20 de Maio de 1720 in
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727), fls. 152v-153v.
56
CEHLRSDA – Vereação de 16 de Junho de 1720 in Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1715-1727), fls. 155v-157v.
57
Oliveira, Delfim José de – Noticias de Penella (…), op. cit., pp. 93-94.
58
Oliveira, Delfim José de – Noticias de Penella (…), op. cit., p. 95. O autor
menciona uma provisão do Marquês de Cascais no sentido de lhe outorgar a
escusa, datada de 28 de Setembro de 1734, presumivelmente registada no «archivo
municipal». Não há, contudo, qualquer traslado do referido documento no livro de
actas correspondente.
59
CEHLRSDA – Conferencia que o Doutor Provedor desta Comarqua fes com
os officiais da Camara desta villa das pessoas que se ham de porpor para o posto
de Capitam mor desta villa e seu termo na forma da lei de dezanove de Outubro
de mil e setecentos e nove [a 13 de Outubro de 1734] e Termo de apresentacam da
patente e ordem juramento que thomou o Capitam mor Lourenco Xavier Garrido
in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736), fls. 224-228.
54
55
- 131 -
Cristóvão Mata
fidalgo60 e, contrariamente ao pai, serviu como vereador da Câmara pelo
menos em dois mandatos, nomeadamente em 1753 e em 1757.
O seu filho, José de Melo Coutinho Garrido, também foi capitão-mor da vila, familiar do Santo Ofício, cavaleiro da Ordem de Cristo,
doutor pela Universidade de Coimbra e gozou do foro de fidalgo da
Casa Real61. Ao serviço da Coroa, ascendeu a uma escala superior
da estrutura jurisdicional régia, tendo sido corregedor da comarca
de Coimbra62. Foi vereador em quatro ocasiões (1755, 1758-1761,
1806 e 1810). Na quarta geração desta família, José Guedes Coutinho
Garrido já não enverga o hábito que fora outorgado a seu bisavô nem
é familiar do Santo Ofício, mas mantém o foro de fidalgo. Para além
do seu estatuto, a formação académica ter-lhe-á garantido vários
postos ao serviço da Coroa: juiz de fora em Penela, monteiro-mor da
mesma vila na comarca de Coimbra e superintendente alfandegário das
comarcas de Aveiro, Coimbra e Leiria63, para além dos cinco mandatos
como vereador na Câmara de Penela (1809, 1813, 1816, 1818 e 1819).
Os últimos membros da família Garrido a marcar presença na Câmara de
Penela foram os irmãos Aires Guedes Coutinho Garrido (1832), também
capitão-mor de Penela, e Júlio Guedes Coutinho Garrido (1833), ao que
parece desprovidos do título de fidalgo, mas ambos detentores de um
título universitário64.
Como se vê, a nobreza desta família datava desde pelo menos a
primeira geração conhecida, como revela o auto de nomeação de Pedro
Álvares Garrido. Por mais de cem anos monopolizaram o cargo de
capitão-mor, mas somente a partir da década de cinquenta de Setecentos
entraram na governança da terra, apesar de estarem instalados na vila
desde o primeiro quartel do mesmo século. Com Lourenço Xavier
Garrido obtiveram o foro de fidalgo, mantendo-o por apenas três
gerações. Aparentemente, sendo de uma condição social superior,
60
1140.
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1041, Caixa
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1044, Caixa
1143; Maço 1053, Caixa 1052.
62
Foi o corregedor que elaborou as pautas para o triénio de 1793-1795 – cf.
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1049, Caixa 1148.
63
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1062, Caixa
1161; Maço 1067.
64
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1075.
61
- 132 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
os esforços de valorização social desta família não foram interrompidos.
Mediante o serviço a Sua Majestade, quer na governança quer em postos
militares, assim também pela formação académica de quase todos os
membros da família, foram capazes de ascender a uma esfera superior
da administração. O conjunto das características sociais da família é
pois mutável, vindo a sua nobreza a corresponder ao arquétipo fidalgo,
mas todo o seu percurso foi acompanhado pelo constante serviço na
Câmara, nas milícias concelhias e, em certos momentos, em ofícios
jurisdicionais de mais importância, bem como por uma estratégia de
acumulação de bens de raiz65.
Indiscutível é também a nobreza da família Velasques Sarmento,
natural de Espanha. O primeiro membro desta família, D. João Velasques
Sarmento, era natural de Toledo e veio desterrado para Portugal,
segundo Delfim de Oliveira, durante o reinado de D. Sebastião 66.
O seu primogénito, D. Tomás Velasques Sarmento, foi governador da
ilha da Madeira e obteve a comenda da Ordem de Avis da igreja de Santa
Eufémia, vindo a família a fixar-se no concelho: o seu segundo filho,
D. Manuel Velasques Sarmento, estabeleceu domicílio no Espinhal e o
terceiro, D. Pedro Velasques Sarmento, que herdou a comenda de Santa
Eufémia, em Penela, onde casou com Ana de Mascarenhas, filha do já
referido Gaspar Coelho67. Aqui parece haver a formação de dois troncos
da família Velasques Sarmento, que no século XIX se torna bastante
visível, os Vasconcelos e os Mascarenhas Coelho.
Foi nesta geração que os Velasques Sarmento ingressaram na
governança da vila. Mais precisamente na década de setenta do século
XVII, quando D. Manuel Velasques Sarmento foi eleito almotacé em duas
ocasiões68 e, depois, juiz ordinário (1673). Vinte anos depois surgem em
cena mais dois elementos da família, D. António Velasques Sarmento e
Ribeiro, Ana Isabel – “O património da fidalguia provincial da região de
Coimbra – o caso da família Garrido (século XVIII)” in Revista Portuguesa de
História. Tomo 44: A Nobreza. Tempos, Espaços e Poderes (2013), pp. 327-358..
66
Oliveira, Delfim José de – Noticias de Penella (…), op. cit., p. 90.
67
Morais, Cristóvão Alão de – Pedatura Lusitana (Nobiliário de famílias de
Portugal). Tomo 5, Volume 1. Porto: Livraria Fernando Machado, s.d., pp. 165-167.
68
CEHLRSDA – Vereação de 12 de Dezembro de 1670 e Vereação de 23 de
Dezembro de 1671 in Livro de Actas de Sessões da Câmara (1670-1673), fls. 21v
e 64-64v.
65
- 133 -
Cristóvão Mata
D. Tomás Velasques Sarmento69, quando são também eleitos almotacés.
Na primeira metade de Setecentos, sete homens foram nomeados para
integrar a vereação, mas somente dois assumiram os cargos, D. Tomás
Velasques Sarmento de Vasconcelos (1718 e 1723) e D. Pedro Velasques
Sarmento (1728), cujo ramo não conseguimos distinguir. Nos anos
cinquenta, um outro indivíduo foi nomeado vereador, D. Francisco
Velasques Sarmento e Vasconcelos Alarcão (1753 e 1757), que continuou
a marcar presença nas pautas do Desembargo do Paço até 179370.
A família continuou a integrar as vereações até ao século XIX,
sendo neste tempo certa a presença dos dois ramos: os Vasconcelos
nas pessoas de D. José Velasques Sarmento e Vasconcelos Alarcão
(1796 e 1808), irmão do referido D. Francisco Velasques Sarmento e
Vasconcelos Alarcão, e de seus filhos D. Manuel de Alarcão Velasques
Sarmento e D. João de Alarcão Velasques Sarmento (1814, 1819 e 1823).
Os Mascarenhas Coelho, por sua vez, foram representados por D. José
de Mascarenhas Coelho Velasques Sarmento e Alarcão (1804 e 1808),
ainda referido como comendador de Santa Eufémia71, e pelos respectivos
filhos, João Casimiro de Mascarenhas Velasques Sarmento e Alarcão
(1814) e Sebastião de Mascarenhas Velasques Sarmento Alarcão (1813,
1815 e 1817).
Com efeito, somente estes sete últimos homens foram fidalgos da Casa
Real, mas todos eles, desde D. Manuel Velasques Sarmento, gozaram da
forma de trato de «Dom», que segundo uma lei de 1611 estava reservada
aos bispos, condes, mulheres e filhos de fidalgos assentes em livros reais,
desembargadores e bastardos de titulares72, sendo por isso provável que
detivessem o foro desde o século XVII. Eis que, por isso, o estatuto social
da família se manteve praticamente inalterado ao longo de quase todo
Tanto D. Manuel Velasques Sarmento como D. António tiveram filhos
chamados António e Tomás, mas no entanto o ramo da família de D. António
aparenta ter estado afastado da governança por muitos anos, pelo que é de crer que
estes dois almotacés fossem os filhos de D. Manuel – cf. Morais, Cristóvão Alão
de – Pedatura Lusitana (…), op. cit., Tomo 4, Volume 1, fls. 167-168.
70
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1044 Caixa
1143.
71
ANTT – Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maço 1047, Caixa
1146.
72
Godinho, Vitorino Magalhães – A Estrutura da Antiga Sociedade Portuguesa.
Lisboa. Editora Arcádia, 1975, pp. 73-74.
69
- 134 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
este período, porventura justificando a falta de referências ao serviço
dos Velasques Sarmentos em outros ofícios locais, as pontuais recusas
em servir na governança da vila na primeira metade do século XVIII e a
ausência de outros indicadores, como o de cavaleiro da Ordem de Cristo,
no perfil biográfico destes homens.
O acesso aos cargos municipais estava pois reservado aos principais
da terra. Neste período à «gente nobre e da governança». Mas o
desempenho das funções associadas ao ofício de vereador não havia de
se dever somente à noblesse oblige, embora este talvez tenha sido um
factor determinante no caso de alguns membros da família Velasques
Sarmento, que se encontrava numa posição confortável. Noutros casos,
a governança da vila representava parte da estratégia de ascensão social
adoptada pelos indivíduos e famílias, na qual o serviço à Coroa era um
elemento preponderante73. E realizava-se em campos diversos, como nos
postos militares, por vezes reservados a algumas famílias, como o caso
da família Garrido, que monopolizou a capitania-mor. Destes serviços
haviam de vir mercês engrandecedoras, que não somente garantiam a
permanência na governança local, cujo acesso ia sendo restringido, mas
também a promoção a outras escalas da administração do Estado e da
jurisdição senhorial. O ano de 1817 assinalou a abertura da Câmara a
outros protagonistas, mas não terá obrigatoriamente resultado na cessação
da promoção desta elite local. Possivelmente permitiu que os indivíduos
dos estratos sociais inferiores tenham iniciado um percurso de ascensão
social semelhante ao da «gente nobre e da governança» penelense, mas
se a sua promoção se efectivou e a elite local penelense renovou com a
queda do Antigo Regime é uma questão que fica de fora do âmbito de
presente estudo.
Veja-se a noção de serviço e de Casa em Monteiro, Nuno Gonçalo – O Crepúsculo dos Grandes (…), op. cit., p. 95-99; “O ethos da aristocracia portuguesa sob a
dinastia de Bragança. Algumas notas sobre casa e serviço ao rei” in Elites e Poder
(…), op. cit., pp. 83-103. A nível local, da nobreza provincial, vide o caso da Lousã
em Campos, Maria do Rosário Castiço de – A Lousã no século XVIII (…), op. cit.,
p. 221.
73
- 135 -
Conclusão
A consideração de que, enquanto unidade territorial e instituição
política, o concelho de Penela não constituía uma entidade totalmente
alienada da estrutura política de Portugal, mas um elemento constituinte,
levou-nos a ultrapassar ocasionalmente os limites geográficos, cronológicos e, até, temáticos estabelecidos desde início. Pretendeu-se assim
elaborar uma narrativa que partisse do geral e se dirigisse a uma dimensão particular dos poderes periféricos. A abordagem tomada procurou
apresentar a organização espacial em que o concelho se inseria,
reflectindo a importância dos documentos legitimadores da sua autonomia.
Deste modo se explica a durabilidade dos limites do termo concelhio
distinguidos no foral de 1137 e que foram alvo de alteração somente em
meados do século XIX, quando foram excluídas do território as freguesias
da Lagarteira e de Chão de Couce e incluídas as de Podentes e do Rabaçal,
até então unidades político-administrativas autónomas. Também a divisão
administrativa interna parece ter sofrido uma reconfiguração tardia,
no período de transição do século XVIII para o XIX, mediante a substituição das vintenas e dos seus juízes pelos julgados e respectivos ofícios,
embora possivelmente esta alteração se devesse a uma necessidade de
se ajustar a capacidade política municipal às características do território.
Numa outra perspectiva, revela-se a inserção da dimensão local
na actuação de instâncias jurisdicionais superiores, «intermédias»,
mas não instaladas territorialmente, que tutelavam os assuntos locais
dos municípios que constituíam uma rede institucional onde se inseria
o concelho de Penela: primeiro a ouvidoria de Montemor-o-Velho,
e depois da extinção da Casa de Aveiro a comarca de Coimbra.
Mas o esbatimento dos contornos do local não se resume à actuação dos
- 137 -
Cristóvão Mata
ouvidores e dos corregedores no concelho. Embora primordialmente
focado no abastecimento do termo concelhio, o governo económico,
assim como a própria economia local, como é o caso das feiras penelenses
e a sua relação com os mercados vizinhos no século XVI, articulava-se numa rede de dimensão regional. Os pregões para a arrematação de
determinadas sectores económicos e o próprio intercâmbio comercial
entre concelhos, umas vezes proibido pela Câmara, outras utilizado pela
mesma como meio de suprir a escassez local, reforçam a imagem de
uma actividade económica presumivelmente local, mas em todo o caso
transcendendo os limites do termo municipal.
O mesmo se pode dizer dos efectivos agentes de governação. O perfil
social dos indivíduos que exerceram ofícios municipais entre 1640 e 1834
variou, de facto, mas um elemento parece ter sido constante ao longo de
todo este período. Os postos de governo estavam reservados aos principais
da terra, mas a noção desta principalidade não era imutável. Como se viu,
o perfil dos vereadores era diverso e foi variando ao longo dos tempos,
seguindo uma lógica de aristocratização das vereações, compostas
por uma elite social cada vez mais conotada com o arquétipo fidalgo.
A efectiva cristalização de uma classe social nos postos de governação
local, algures na transição do século XVIII para o XIX, deveu-se
sobretudo pelo serviço prestado à Coroa – e em certos casos, à Casa de
Aveiro –, entre os quais se contava o governo municipal. Este parece ter
sido o elemento mais presente no perfil social dos vereadores ao longo
de todo este tempo, derivado de uma igualmente constante e desejada
promoção social. Mas o percurso de ascensão social, permitido em
primeiro lugar por um posicionamento confortável na hierarquia social,
podia conduzir a cargos de responsabilidade administrativa situados fora
dos limites do termo, numa esfera supralocal.
A vertente política de uma comunidade local, por conseguinte,
não se encerra nos limites que confinam a sua espacialidade. Mas também
não se resume a um certo aspecto que defina toda a sua dimensão.
O substrato legal que legitima o exercício do poder e ao mesmo
tempo formaliza a existência da instituição é um elemento de suma
importância, na medida em que forma o sustentáculo da estrutura política
local. De facto, é o princípio, o acto gerador desta construção, cujos
particularismos estabelece. Na Época Moderna, estes particularismos
tendem a esbater-se por via da tentativa de uniformização legal
das instituições municipais – todavia incompleta. Como se referiu,
- 138 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
não se pode falar de um perfil único transversal a todos os municípios
portugueses, do mesmo modo que impera internamente, até uma fase
bastante avançada, a diversidade social dos agentes do poder municipal.
Há, no entanto, a concretização da política, o exercício da autoridade
consignada por lei efectivado colectiva e individualmente, o desempenho
do colectivo de oficiais que compunham a Câmara no qual se desenha um
processo em que se cruzam os interesses, as estratégias e as participações
individuais (e familiares) e as diligências próprias da instituição,
onde política e sociedade se tocam.
Este ponto de intersecção localiza-se, por um lado, nos campos de
dimensão bastante vasta sobre os quais a actividade camarária actuava
invocando simultaneamente o bem comum das gentes da terra e o
interesse do rei ou do donatário. O governo económico do concelho,
apresentado em linhas gerais no capítulo 5, acabou por exemplificar o
que dizemos: a par da regulamentação do comércio e, em determinados
sectores, da produção que tinha em vista o abastecimento da comunidade,
a responsabilidade de arrecadar os impostos régios e senhoriais era
também acometida à Câmara. Mas muitos outros acórdãos da Câmara
visaram o proteger os interesses da Coroa. O papel fundamental que
desempenhavam, por exemplo, no campo da guerra deixa evidente a sua
subordinação ao poder central, por vezes relembrada simbolicamente.
Afinal, a guerra era do interesse geral.
Por outro lado, a linha de comunicação entre sociedade e política
desenhava-se no interior da própria instituição concelhia; porém,
a partir de uma parcela bastante reduzida do conjunto da sociedade local,
como bem ilustra a totalidade dos indivíduos que, numa progressiva
redução do universo dos eleitos, ocuparam os cargos de vereador e
procurador do concelho. Com efeito, a nomeação dos indivíduos que
haveriam de tomar a seu cargo a responsabilidade da governança local
era feita in loco, no seio da comunidade penelense, num processo ligado
às próprias dinâmicas que organizavam e estruturavam a sociedade do
Antigo Regime (embora num primeiro momento os duques de Aveiro
pareçam dominar os mecanismos de eleição das câmaras). Foi, por isso,
que no crepúsculo da Época Moderna se avistou a abertura do canal de
acesso à Câmara, em contraciclo a cerca de um século e meio durante o
qual a acessibilidade foi sendo progressivamente estreitada e os postos
de governação reservados a uma elite cada vez mais associada a uma
determinada noção de nobreza.
- 139 -
Cristóvão Mata
A organização política da comunidade local, portanto, operava-se não
apenas enquanto concretização do direito de governo próprio gozado por
uma amostra microscópica da sociedade, mas também como extensão
da própria estrutura política, social e ideológica do Portugal Moderno
– reproduzia fielmente as ideias e as práticas da sociedade corporativa
do Antigo Regime português. Era algo que se incorporava dentro da
arquitectura institucional e jurisdicional a partir da qual se exercia o
poder político, não se situando fora dela. E assim os oficiais da Câmara
actuaram na qualidade de representantes políticos da comunidade local
e igualmente enquanto mandatários do poder central – como já foi dito,
enquanto mediadores da população que integravam e do seu rei. A prática
ia, de facto, ao encontro da concepção idealizada de organização política,
e neste sentido, vista a pluralidade e harmonia dos órgãos constituintes
da sociedade de corpos, o poder local deve ser entendido enquanto
elemento coadjuvante da entidade política central e não como um poder
político concorrente.
- 140 -
Anexos
Gráfico 1. Correições: presença dos ouvidores
Gráfico 2. Relação entre as datas de chegada das pautas, do início dos mandatos
e do juramento do último oficial
- 141 -
Cristóvão Mata
Gráfico 3. Número de reuniões por mandato
- 142 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Gráfico 4. Percentagem média de participações dos oficiais por mandato
- 143 -
Quadro 1. Juízes Ordinários
Mandato/
participação
António Mascarenhas
Bartolomeu de
Almeida Momperes
Cristóvão Antunes
Ponte
1644 (2%)
- 144 -
Domingos Jorge Esteves
1640 (71%)
X
1644 (98%)
X
1640 (n.a.)
Penela
João Peixoto da Silveira
1670 (59%)
X
Manuel de Miranda
1641 (65%)
X
Manuel Velasques Sarmento
1673 (68%)
X
Matias de Lemos Ferreira
Miguel Teixeira de Carvalho
Gomes Colaço
Sebastião de Miranda Ribeiro
1673 (75%)
X
1671 (21%)
X
1672 (69%)
X
1670 (54%)
1672 (59%)
X
Francisco Pimentel da Costa
Penela
Penela
Outro ofício, ocupação
e dignidade
X
X
Vicente de Abreu
D.
Vereador (1671)
1645 (92%)
1641 (65%)
1645 (38%)
1671 (90%)
Gaspar Coelho
Tít.
Acad.
X
Capitão de Ordenança
X
X
Vereador (1692, 1718)
Cristóvão Mata
Diogo Correia de Sá
Ass.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
Ordem de
Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Quadro 2. Vereadores
Literacia
Atributos
Quinta da
Boiça
1832 (s.r.)
X
Capitão-mor
André Luís
Espinhal
1645 (38%)
N
Rendeiro das jugadas
1672 (86%)
X
1670 (33%)
1715(100%)
1719 (95%)
X
António de Abreu Castelo Branco
1694 (88%)
X
António Freire Perada
Penela
1723 (100%)
1727 (90%)
1728 (80%)
1732 (41%)
1736 (100%)
X
António Mascarenhas
Pontes
1671 (93%)
X
1729 (n.a.)
s.r.
António Correia de Magalhães
António da Costa Pimentel
António Velasques Sarmento
Penela
Tít.
Acad.
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Aires Guedes Coutinho Garrido
Ass.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Mandato/
participação
Fidalgo da
Casa Real
Res.
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Procurador do donatário
Capitão de ordenança
X
X
X
Procurador do donatário
Juiz ordinário (1644)
X
O Poder Local em Penela (1640-1834)
- 145 -
Nome
Mandato/
participação
Ass.
1728 (20%)
X
1717 (94%)
1724 (100%)
X
Bartolomeu de Quintanilha
Espinhal
1754 (94%)
X
Bartolomeu José da
Costa Mesquita
Espinhal
Bartolomeu de Almeida Mexia
- 146 -
1758-61 (12%)
1671 (69%)
1672 (3%)
X
Bernardo de Almeida Craveiro
1827 (s.r.)
s.r.
1730-31 (50%)
1736 (52%)
X
1641 (82%)
X
Espinhal
1695 (n.a.)
s.r.
Penela
1716 (90%)
1721 (91%)
1725 (95%)
1729 (100%)
X
Penela
Damião de Abreu Borges
Damião de Abreu Corte Real
Domingos Gomes de Miranda
Outro ofício, ocupação
e dignidade
X
Capitão de ordenança
X
X
Bernardo Arnaut
Cláudio José da Rosa Furtado
D.
Cristóvão Mata
Venda das
Figueiras
Quinta de
Vouzela
Atanásio da Silva
Tít.
Acad.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
X
Alferes
X
Mandato/
participação
Ass.
Tít.
Acad.
X
1672 (48%)
X
Felício de Amorim Leite
1640 (93%)
1670 (92%)
X
Filipe Travassos Couceiro
1640 (67%)
X
1734 (76%)
1753 (75%)
1754 (n.a.)
1756 (71%)
X
1757 (44%)
X
Quinta de S.
Francisco Cabral de Abreu e Melo
Francisco
Francisco de Abreu Castelo
Branco Cabral de Melo
Francisco de Azevedo Mourato
Penela
Francisco Esteves
Chaínça
Francisco José Teixeira
Espinhal
Francisco Manuel
1728 (100%)
1735 (97%)
1695 (88%)
1719 (91%)
1727 (81%)
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
O Poder Local em Penela (1640-1834)
- 147 -
Domingos Mendes da Fonseca
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
X
X
Alcaide-mor
Capitão de ordenança
1825 (100%)
X
Capitão de ordenança
Procurador do concelho
(1814, 1826)
1645 (100%)
X
Literacia
Atributos
Espinhal
1753 (50%)
1757 (44%)
X
Francisco Xavier Gomes
1827 (s.r.)
s.r.
Capitão de ordenança
Henrique Carlos de
Sousa Azevedo
1827 (s.r.)
1833 (s.r.)
1827 (s.r.)
1824 (s.r.)
1796 (s.r.)
1809 (s.r.)
1816 (90%)
1817 (75%)
1819 (35%)
1820 (20%)
X
Almoxarife Escrivão dos
órfãos.
Inácio Pedro Xavier das Neves
Tít.
Acad.
D.
X
X
Familiar
do Santo
Ofício
Francisco Velasques Sarmento e
Vasconcelos Alarcão
Ass.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Mandato/
participação
Fidalgo da
Casa Real
Res.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
s.r.
Jerónimo Colaço de Magalhães
Teixeira Sarmento
Quintas das
Pontes
João Alves de Faria
Espinhal
1722 (48%)
X
João Casimiro Mascarenhas
Velasques Sarmento Alarcão
João Colaço de
Magalhães Sarmento
Quinta de
São Bernardo
1814 (74%)
X
Penela
1805 (s.r.)
1810 (s.r.)
s.r.
João da Costa Barbosa
Penela
1673 (94%)
X
X
X
X
Cadete do regimento do
príncipe
Coronel de cavalaria na
Lousã
Capitão de ordenança
X
X
Tabelião
Cristóvão Mata
- 148 -
Nome
Penela
João de Alarcão
Velasques Sarmento
Espinhal
João de França Cordeiro
Espinhal
1726 (15%)
X
João de Mendonça Mexia
Espinhal
1755 (56%)
X
João de Mesquita Peixoto da
Costa Freire
Quinta do
Engenho
1805 (s.r.)
1809 (s.r.)
1814 (82%)
1818 (32%)
X
João de Salazar Jordão
Penela
1692 (54%)
1696 (100%)
X
João Freire Borracho
-
1737 (-)
-
João Freire de Salazar e Eça
Penela
1756 (47%)
X
1715 (57%)
1720 (86%)
1727 (33%)
1814 (32%)
1819 (35%)
1823 (s.r.)
Tít.
Acad.
D.
Familiar
do Santo
Ofício
João de Abreu Castelo Branco
Ass.
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Juiz dos órfãos
X
X
X
Almoxarife
Juiz dos direitos reais
Provedor da
Misericórdia
-
-
-
-
-
-
O Poder Local em Penela (1640-1834)
- 149 -
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Mandato/
participação
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Penela
João Leal
Espinhal
João Leal da Gama Araújo
e Vasconcelos
Espinhal
João Leal da Gama Nobre
Jacome Faria
Espinhal
João Mendes
Espinhal
1720 (77%)
1726 (100%)
1730 (41%)
1732 (69%)
1819 (0)
1820 (s.r.)
1817 (69%)
1827 (s.r.)
1804 (s.r.)
1806 (s.r.)
1808 (s.r.)
1810 (s.r.)
1811 (s.r.)
1815 (83%)
1819 (0)
1824 (s.r.)
Ass.
D.
X
X
X
X
X
X
X
João Neto Arnaut
Salazar Sarmento
1755 (72%)
X
João Pereira Franco
1722 (93%)
1726 (95%)
1730-31 (65%)
1735 (93%)
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Almoxarife
X
1724 (67%)
Penela
Tít.
Acad.
X
Cristóvão Mata
- 150 -
João Freire de Salazar
Machado Jordão
Mandato/
participação
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
X
Desembargador
Ouvidor
Almoxarife
Mandato/
participação
Ass.
Tít.
Acad.
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Outro ofício, ocupação
e dignidade
1640 (92%)
1671 (38%)
X
João Pires de Almeida Freire
1818 (100%)
X
Médico do partido
Capitão de ordenança
- 151 -
João Quaresma de Matos
Penela
1693 (94%)
1715 (100%)
X
João Sarinho de Morais
Penela
1695 (96%)
X
João Tomás de Abreu
Castelo Branco
Espinhal
1803 (s.r.)
1807 (s.r.)
s.r.
João Velasques Sarmento
(Comarca de)
Guimarães
1694 (n.a.)
s.r.
Joaquim Manuel Morais de
Mesquita Pimentel
Quinta de
Valouro
Jordão Freire de Salazar e Eça
Penela
José António Abreu*
José António de Abreu
Castelo Branco*
Penela
1803 (s.r.)
1815 (n.a.)
1832 (s.r.)
1796 (s.r.)
1805 (s.r.)
[X]
s.r.
1724 (n.a.)
s.r.
1717 (n.a.)
s.r.
X
X
X
Desembargador
O Poder Local em Penela (1640-1834)
João Pessoa de Figueiredo
Lagarteira
José Bernardo de Melo
Salazar Sarmento
Espinhal
José de Abreu Bacelar
Espinhal
José de Melo Arnaut
Salazar Sarmento
Espinhal
José de Melo Coutinho Garrido
Penela
José de Oliveira Moniz
Penela
José de Sousa
Cumieira
1825 (s.r.)
1833 (s.r.)
1816 (50%)
1823 (s.r.)
1827 (s.r.)
1694 (33%)
1718 (73%)
1725 (n.a.)
1804 (s.r.)
1808 (s.r.)
1811 (s.r.)
1755 (n.a.)
1758-61 (12%)
1806 (s.r.)
1810 (s.r.)
1723 (94%)
1730-31 (50%)
1716 (71%)
1720 (59%)
Ass.
Tít.
Acad.
D.
Familiar
do Santo
Ofício
José António de Carvalho
Mandato/
participação
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Res.
s.r.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Capitão de ordenança
X
Coronel de cavalaria da
Lousã
X
X
s.r.
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
Capitão-mor
Corregedor
Cristóvão Mata
- 152 -
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
- 153 -
Quinta da
Boiça
1809 (s.r.)
1813 (71%)
1816 (90%)
1818 (32%)
1819 (40%)
X
1828 (s.r.)
s.r.
José Joaquim dos Pombais
Ass.
José Leal da Gama Nobre
Jacome Faria
Espinhal
1806 (s.r.)
s.r.
José Luís Arnaut Salazar
Espinhal
1755 (n.a.)
[X]
1755 (n.a.)
1756 (82%)
X
José Marcos Teixeira Evangelho
Gomes Colaço Sarmento
José Mascarenhas Coelho
Velasques Sarmento Alarcão
Quinta de
Vale de
Arinto
1804 (s.r.)
1808 (s.r.)
s.r.
José Mendes Feio
Lagarteira
1832 (s.r.)
s.r.
José Pires de Almeida Freire
Penela
1827 (s.r.)
s.r.
Tít.
Acad.
D.
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Juiz de fora
Monteiro-mor de Penela
na comarca de Coimbra
Superintendente das
alfândegas das comarcas
de Aveiro, Coimbra
e Leiria
Alferes
Lavrador
X
X
Familiar
do Santo
Ofício
Mandato/
participação
X
X
X
X
Comendador da igreja de
Santa Eufémia de Penela
Boticário
O Poder Local em Penela (1640-1834)
José Guedes Coutinho Garrido
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
José Simões Gomes Cordeiro
Pastor
José Velasques Sarmento e
Vasconcelos Alarcão
Júlio Guedes Coutinho Garrido
- 154 -
Ass.
Tít.
Acad.
1827 (n.a.)
X
X
Espinhal
1796 (s.r.)
1808 (s.r.)
s.r.
Quinta da
Boiça
1833 (s.r.)
X
Lopo de Almeida Bacelar
Quinta das
Pontes
1719 (n.a.)
1723 (6%)
1729 (50%)
1732 (23%)
1734 (76%)
X
Lopo de Sousa Mascarenhas
Penela
1721 (n.a.)
s.r.
Lourenço Cabral
1640 (n.a.)
1641 (n.a.)
s.r.
Lourenço José Xavier
1728 (n.a.)
[X]
Lourenço Machado da Cunha
1733 (n.a.)
s.r.
1753 (63%)
1757 (38%)
X
Lourenço Xavier Garrido
Quinta da
Boiça
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Mandato/
participação
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Res.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Advogado Provedor da
Misericórdia
X
X
X
Cristóvão Mata
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Capitão de ordenança
X
X
X
X
Capitão de ordenança
Capitão-mor
Mestre-de-campo
Ass.
Tít.
Acad.
1818 (89%)
X
1826 (s.r.)
X
X
Luís José Pires de Almeida Freire
1828 (s.r.)
X
X
Manuel Antunes da Fonseca
1721 (n.a.)
X
X
1725 (90%)
X
X
Luís Guilherme Pires
Furtado Galvão
Venda das
Figueiras
- 155 -
Manuel da Costa Duarte
Venda das
Figueiras
Manuel da Silva e Sousa
Espinhal
Manuel de Alarcão
Velasques Sarmento
1673 (81%)
1692 (54%)
1696 (80%)
1803 (s.r.)
1807 (s.r.)
D.
Advogado
Procurador do concelho
(1821)
Advogado
Procurador do concelho
(1796, 1804, 1809, 1813,
1817, 1818, 1827)
X
s.r.
Manuel de Miranda Freire
Espinhal
1693 (6%)
X
Manuel de Miranda Velho
Espinhal
1696 (0)
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Capitão de ordenança
X
X
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Luís António Teixeira
Mandato/
participação
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Mandato/
participação
Ass.
Tít.
Acad.
X
1737 (39%)
X
Manuel Esteves
1644 (86%)
X
Chaínça
1732 (n.a.)
s.r.
Penela
1807 (s.r.)
1815 (75%)
1820 (80%)
1824(s.r.)
1827 (s.r.)
1828 (s.r.)
X
Manuel Leitão
1644 (95%)
X
Manuel Mendes Feio
1825 (s.r.)
s.r.
Manuel Pires de Azevedo
1735 (41%)
X
1644 (81%)
X
Manuel Esteves de Carvalho
- 156 -
Manuel Joaquim Xavier
Manuel Simões
Ribeira
X
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Provedor da
Misericórdia
Cristóvão Mata
Manuel Dias da Silva
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Ass.
Tít.
Acad.
D.
1692 (15%)
1718 (n.a.)
X
X
X
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Juiz ordinário (1673)
- 157 -
Manuel Velasques Sarmento
Venda dos
Moinhos
1718 (n.a.)
s.r.
Manuel Viegas Peres
Espinhal
1673 (62%)
X
Martinho Velasques Sarmento
Penela
1718 (n.a.)
s.r.
1670 (67%)
X
Tabelião do judicial
Sargento-mor
Mateus Cabral de Faria
Miguel de Sousa Melo Freire
Espinhal
1717 (47%)
1755 (22%)
X
Miguel Freire Machado
Penela
1694 (83%)
X
Pedro José de Salazar Jordão
Penela
1758-61 (62%)
X
Pedro Velasques Sarmento
Penela
1728 (50%)
X
Rafael Leitão
Penela
1693 (94%)
X
X
X
X
X
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Manuel Velasques Sarmento
Mandato/
participação
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Sebastião Gameiro da Cruz
Penela
1716 (76%)
Sebastião Jorge
Venda dos
Moinhos
Sebastião Mascarenhas Velasques
Sarmento Alarcão
Penela
1722 (63%)
1730-31 (10%)
1813 (71%)
1815 (50%)
1817 (69%)
Simão Pessanha da Cruz
Ass.
Tít.
Acad.
X
X
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Mandato/
participação
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Res.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Alcaide pequeno
Médico do partido
X
X
1641 (94%)
X
Simão Pires
Curral do
Porco
1645 (77%)
N
Tomás Velasques Sarmento
de Vasconcelos
Espinhal
1695 (0)
1718 (91%)
1733 (81%)
X
X
X
Tabelião
X
Cristóvão Mata
- 158 -
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Quadro 3. Procuradores do concelho
António Dias Custódio
Espinhal
António Dias da Silva
Ass.
Tít.
Acad.
1805 (s.r.)
X
X
1825 (s.r.)
s.r.
- 159 -
António Dias Gago
Penela
1719 (n.a.)
s.r.
António Peres
Penela
1695 (0)
X
António Pires
Covão do
Porco
1726 (60%)
N
Penela
1803 (s.r.)
1807 (s.r.)
1811 (s.r.)
1819 (95%)
1824 (s.r.)
X
1671 (72%)
X
1724 (67%)
X
António Pires de Almeida Freire
António Rodrigues
António Rodrigues Patarata
Espinhal
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Mandato/
participação
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Res.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Advogado
Alferes
X
Advogado
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
António Vaz
Mandato/
participação
Ass.
1640 (96%)
X
Espinhal
1730-31 (0)
s.r.
Bernardo Simões de Oliveira
Espinhal
1755 (22%)
X
Diogo de França
Penela
1754 (78%)
X
Diogo Simões
Penela
1717 (n.a.)
s.r.
1756 (82%)
X
Domingos Antunes
Domingos Fernandes Serra
Espinhal
1727 (67%)
X
Domingos João
Carvalhais
1723 (78%)
N
1730-31 (45%)
1736 (9%)
N
1717 (5%)
N
Domingos Silveiro
Felício Rodrigues
Penela
D.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Cristóvão Mata
- 160 -
Augusto Teixeira
Tít.
Acad.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Francisco da Costa Mesquita de
Campos
Espinhal
Francisco de Lima
- 161 -
Ass.
Tít.
Acad.
1808 (s.r.)
1816 (90%)
1829 (20%)
X
X
Penela
1673 (68%)
N
Francisco dos Santos Arnaut
Pastor
1832 (s.r.)
s.r.
Francisco Gomes de Bastos
Pastor
1728 (50%)
1735 (0)
X
Francisco Jorge
Penela
1645 (77%)
X
Francisco José Teixeira
Espinhal
1814 (100%)
1826 (s.r.)
X
1670 (88%)
X
Gregório Carvalho
João da Fonseca
João dos Santos
Casais de
Cabra
1725 (90%)
1753 (100%)
1721 (67%)
1725 (90%)
1729 (88%)
1734 (71%)
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Mandato/
participação
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Res.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Advogado
Sargento
Capitão de ordenança
Vereador (1825)
X
X
Mamposteiro-mor dos
cativos
Capitão de ordenança
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Mandato/
participação
João Gomes
Penela
1716 (38%)
1718 (n.a.)
X
1720 (45%)
X
João Rodrigues Patarata
Tít.
Acad.
D.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
João Rodrigues Raposo
Outeiro
José de Campos e Oliveira
Espinhal
José Vaz
Penela
1718 (9%)
X
Luís Guilherme Pires
Furtado Galvão
Venda das
Figueiras
1821 (s.r.)
X
X
Advogado Vereador
(1826)
Penela
1796 (s.r.)
1804 (s.r.)
1809 (s.r.)
1813 (100%)
1817 (81%)
1818 (95%)
1827 (s.r.)
X
X
Advogado Vereador
(1828)
Luís José Pires de Almeida Freire
X
X
X
Advogado
X
Cristóvão Mata
- 162 -
1719
(14%)1733
(56%)
1806 (s.r.)
1810 (s.r.)
1815 (92%)
Ass.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Manuel da Silva de Azevedo
Espinhal
1696 (80%)
X
Manuel de Almeida
Manuel dos Santos
Espinhal
1672 (n.a.)
1732 (27%)
s.r.
N
Manuel Gomes
Outeiro
1694 (88%)
N
Manuel Lopes
Penela
1693 (67%)
X
1828 (s.r.)
1833 (s.r.)
s.r.
Manuel Lourenço de Jesus
Ass.
Manuel Rodrigues Duarte
Penela
1757 (88%)
X
Manuel Zuzarte
Taliscas
1715 (52%)
N
1672 (n.a.)
s.r.
Miguel de Almeida
Miguel Simões*
Penela
1672 (59%)
N
Miguel Simões*
Penela
1722 (85%)
N
Pedro Moreira
Penela
1695 (88%)
X
Tít.
Acad.
D.
Familiar
do Santo
Ofício
Mandato/
participação
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Res.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Contador
X
Alferes
Lavrador
Caldeireiro
O Poder Local em Penela (1640-1834)
- 163 -
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
Mandato/
participação
Ass.
1735 (76%)
X
Simão Mendes
1692 (46%)
X
1758-61 (79%)
X
Simão Rodrigues do Cubo
1641 (94%)
X
Simão Teixeira
1644 (98%)
X
Simão Mendes
Penela
D.
Outro ofício, ocupação
e dignidade
Alcaide
Carcereiro
Escrivão do judicial
Alfaiate
Cristóvão Mata
- 164 -
Roque Damião
Tít.
Acad.
Familiar
do Santo
Ofício
Res.
Cavaleiro
da Ordem
de Cristo
Nome
Atributos
Fidalgo da
Casa Real
Literacia
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Quadro 4. Relação entre nomeações e ofícios
Períodos
Juízes
Postos
Procuradores
do Concelho
Postos
Vereadores
Postos
1640-1673
13
16
7
8
21
24
1692-1761
–
–
27
32
48
96
1796-1834
–
–
10
26
36
78
Total
13
16
44
66
105
198
Quadro 5. Distribuição dos atributos dos vereadores activos por períodos
Períodos
1640-1673
1692-1761
1796-1834
Capitão de Ordenança
2
7
3
Capitão-mor
0
1
2
Cavaleiro da Ordem de Cristo
0
4
3
Dom
1
4
6
Familiar do Santo Ofício
1
4
1
Fidalgo da Casa Real
0
2
13
Outros ofícios locais ou regionais
5
6
5
Vereadores
21
48
36
- 165 -
Apêndice Documental
Reúnem-se nesta colectânea de documentos dezassete diplomas
relativos à história do concelho de Penela que foram recorrentemente
citados no presente trabalho. Foram transcritos a partir das suas versões
originais, de traslados manuscritos e de transcrições já publicadas. Para
este efeito, seguimos as normas fixadas pelo padre Avelino Jesus da
Costa1, uniformizando as letras maiúsculas e minúsculas, desdobrando as
abreviaturas e convertendo as vogais em consoantes quando necessário
(i por j, u por v, entre outros), inclusive no caso de textos já editados.
Cada transcrição é antecedida pelo respectivo sumário e pela fonte
utilizada, tanto manuscrita como impressa. Os documentos são apresentados segundo uma ordem temática e, após esta, cronológica: forais e
outros documentos legitimadores do estatuto concelhio (confirmações
e o tombo mandado realizar pelo infante D. Pedro); doações régias a
donatários e registos da actividade que estes desenvolveram no concelho,
nomeadamente a criação da feira de São Sebastião; a confirmação
dos privilégios do concelho e das suas feiras; e, por fim, as Memórias
Paroquiais compostas pelos párocos das cinco freguesias que em 1758
compunham o seu termo concelhio.
Costa, Avelino Jesus da – Normas de transcrição e publicação de documentos
e textos medievais e modernos. [3.ª Edição] Coimbra: Instituto de Paleografia e
Diplomática, 1993.
1
- 167 -
Cristóvão Mata
1
[Coimbra] – 1217, Julho de: Confirmação de D. Afonso II ao foral de
Penela outorgado por D. Afonso Henriques em 1137.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Registo da Chancelaria de
D. Afonso II, Livro 1, fl. 3. (Vide, no presente estudo, página 19,
nota 9.)
In Dei nomine. Ego Alfonsus Infans comitis Henrici filius et Regine
Tharasie facio cartam donationis et firmitudinis vobis homines de Penela
cunctisque ibi habitaverit dono atque concedo vobis meum castellum
cum suis termini cum montibus et sontibus terris et pascuis ruptis et nom
ruptis. Cuius vero isti sunt termini. De illa cabeza de Mata Furata et ferit
in Dueza et vadit ad illa cabezam de Albarriol et fert in illa taliada et
vadit per illum lombum rasum et fert in illa via antiqua de serra et quo
modo currit aqua ad illum flumen de Alsie et fert in directum ad ipsum
portum de lagenas et pergit a cabezam de Ovelia et descendit per illa
vallem de Pito et vadit ad Figeiroa et intrat en illa aqua de Ladeia usque
in illo Ulmar et fert in cabeza da Mata Furada. Dono atque concedo vobis
ipsum castrum cum suis abstimos foros. De uno iugo de boum ii quartarios
medium tritici et medium ordei. Et quantum habeat uno homo plures
boues, nom det plus de ii quartarios. Et illi qui si habiataverit vineas et
habitaverit quinque quinales deinde dent inde duos puzales et nunquam
plus et non vadat maiordomus ad suum lagar. De cervo unum lombum.
De porco duas costas. Monteiro que non dedirit iugadam, et fuerit ad
montem desquando habuerit va monte viii dies det alqueire de mel vel
aratal de cera. Et conilarius unu conelium cum sua pelle. Et miles quantos
homines potuiret habere in sua hereditate sint libri. Mulier si vir eius
miles mortuus fuerit inquantum fuerit vidua nom det iugadam. Miles si
forte evenerit in miseria et in paupertate non det iugadam. Omnes qui
ibi habitaverint habuerint que duo iuga boum et x oves et duas vaccas et
unum lectum de pannis illum de quod habuerit plus emat in de caballum.
De homicidio et de rauso intus perfectum xxx solidos et foras xv solidos.
De latrone v solidos et percuciant illum ante et retro. De illa atalaia rex
mediam et habitatores aliam mediam. De vigilia de muro rex mediam
et habitatores aliam mediam. De prova cum scuto et cum lancea ille qie
ceciderit donet ii solidos. Et de porrina i solido. De iudice percusso x
solidos. De sagione percusso v solidos. Et omnias alias calumpnias que
ibi fuerint facte nom pariant aliquam rem sed faciant iudicium inter se et
- 168 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
conveniant se bene. Et si aliquis homo non volverit intrare in iudicium
vicinorum suorum vendat illud quod habuerit totum ibi et exeat de nostro
castello. Homo qui fuerit ad domum vicinorum suorum sine alcaide vel
sine iudice det rx solidos xxx a rei xxx a concilio. Et si ibi adduxerit
arma det V solidos et perdar illa. Quando fuerimus in fossado regis
demos mediatatem quo modo sua creiatione. Homo de Penela inquantum
fuerit de infante non det portaticum. Homo de Penela non faciant nullum
iudicium ni in suo castello. Et illud cautum quod vobis mandastis sit per
suos terminos, et si nullus homo illud irrumpere volverit illum det dc
solidos ad regem. Et omnes qui ibi venerit ad populandum sue hereditates
ubicumque fuerint sint libres. Et ad illum alcaide suas quintas et suas
alcaidarias et suos foros habeat. Clericus qui ibi fuerit in ecclesia donet
ad episcopum qui ibi fuerit unna pellem de janeta et i alqueire de mel.
Et si aliquis homo venerit vel volverit hoc meum scriptum corrumpere,
sit maledictus et excomunicatus et cum iuda traditorem in inferno
comdempnatus. Facta karta donationis et firmitudinis mense Julii era
Ma Ca LXXa Va ego Infans Aldefonsus qui hanc cartam iussi fieri cum
manu mea roboravi et signa hec feci +. [Assinados] Bernaldus episcopus
confirmat. Martinus Grailvifiz testis. Egas Moniz testis. Lourina testis.
Didacus Trastimiriz testis. Petrus Martinis testis. Garsias Maurus testis.
Pelagius Trastamiriz testis. Rodericus Pelagii testis. Alcaide Egas Moniz
testis. Fernandus Captivus testis. Sancho Nuniz testis.
Ego Alfonsus Dei gratia Portugalex Rex una cum uxore mea regina
domna Urraca et filiis nostris infantibus domno Sancio et domno Alfonso
et domna Alianor concedo et confirmo vobis moratoribus de Penela istam
cartam et istud forum quod vobis dedit avus meus rex domnus Alfonsus.
Et ut hoc meum factum in perpetuum firmum robur optineat precepi fieri
istam carta meo plumbeo sigillo munitam. Facta fuit hec carta mense
Novembri era Ma CCa Ra Va nos supranominati reges qui hanc cartam
fieri precepimus coram subscripitis eam roboravimus et in ea hec signa
fecimus +++++. Qui affuerunt.
[Assinaturas]
Domnus Martinus Johannis signifer domini regis confirmat; Domnus
Petrus Johannis maiordomus curie confirmat; Domnus Laurencius
Suarii confirmat; Domnus Johaniz Fernandiz confirmat; Domnus
Fernandus Fernandiz confirmat; Domnus Gomecius Suariis; Domnus
Gil Valasquiz confirmat; Domnus Rodericus Mendiz confirmat; Domuns
Poncius Alfonsi confirmat; Domnus Lopus Alfonsi confirmat; Vicencius
- 169 -
Cristóvão Mata
Mendiz testis; Petrus Garsie testis; Jhoanninus testis; Domnus Stephanus
bracarensis archiepiscopus confirmar; Domnus Martinus Portugalensis
episcopus confirmat; Domnus Petrus Colimbricensis episcopus confirmat;
Domnus Suarius Ulixbonensis episcopus confirmat; Domnus Suarius
Elborensis episcopus confirmat; Domnus Pelagius Lamacensis episcopus
confirmat; Domnus Bartolomeus Visensis episcopus confirmat; Domnus
Martinus Egitanensis episcopus confirmat; Magister Pelagius cantor
portucalensis (?) testis; Martinus Petriz testis; Petrus Petriz testis;
Gunsalvus Menedi cancellarius; Fernandus Suarii scripsit.
2
Penela – 1420, 2 de Dezembro: Tombo ordenado pelo infante D. Pedro
sobre todas as propriedades e rendimentos de Penela.
[Arnaut, Salvador Dias – “O infante D. Pedro, senhor de Penela”.
Separata de Biblos. LXIX (1993), pp. 187-213.]
Tombo2 de todos os cazaes, e mais propriedades com seu rendimentos,
que o infante D. Pedro duque de Coimbra e senhor de Monte Mor mandou
fazer na sua villa de Penella. Feito a 2 de Dezembro de 1458.
Sabham todos os que este estormento scprito em este livro virem
como era na era de mill quatro centos cinquenta oyto anos dous dias do
mes de Dezenbro na vylla de Penella terra do senhor ifante Dom Pedro
duque de Coinbra e senhor de Monte moor dentro do paaço do concelho
sendo hii Goncallo Anes juiz da dicta vylla e procurador e vereadores
e homeens boons da dicta vylla Vasco Anes contador do dicto senhor
ifante presentou huum alvara signado per sua maão de que o theor de
verbo a verbo tal he.
Eu o ifante Dom Pedro duque de Coinbra e senhor de Monte moor
faço saber a vos juizes da mynha vylla de Penella e aos moradores della
que eu entendo por meu serviço de saber todos os foros e bens rendas
posyssooes que em ella e seu termho ey e de direito devo daver assy
per foraes como per posse de que os senhores que della foram senpre
steveram em posse e ora eu stou e os meus regeengos e terras per onde
No documento está redigido “e foral”, menção que o Doutor Salvador Dias
Arnaut omite por considerar “um acrescentamento infeliz” – cf., na referida
transcrição, p. 187, nota 1.
2
- 170 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
partem e com quaaes confrontaçooes e pera esto dou poder a Vasco Anes
meu contador que por mynha parte desto tenha encarrego e por se esto
fazer verdadeyramente e como deve a maneira que se ello deve ateer seja
esta vos juizes com o procurador e vereadores tomarees quatro homees
boos os dous de dentro do lugar e os outros dous de fora del quaes el e
vos entenderdes que esto mylhor posam saber e huum tabaliam e com
o dicto Vaasque Anes prooveerom as scprituras e foraaes que teverdes
as quaaes lhe vos mostrarees e leerom per elles o que dicto he e hirom
a demarcar todos regeengos e terra que eu3 hy ey e outros casaaes e
bees que ouve per conpra e per outras heranças e as medições e direitos
que em que em todo devo aver e a que tempos ham de ser pagadas e os
ofeciaaes como devem ser fecto e per quem e a que tenpos e o que assy
achado for per elles çertamente e em comcordaçam do dicto Vaasque
Anes scprivao assy o dicto tabaliam e o dicto Vaasque Anes faça dello
huum livro de tonbo e concordado com a escpritura do dicto tabaliam
e elle tabaliam scpreva4 [// fl. 1v] nas laudas do dicto livro seu nome e
signal com as dictas testemunhas que asy com elles andarem e das cousas
<em> que forem em duvyda seam razoadas peranto vos juizes o dicto
Vaasque Anes por mynha parte e as outras por sy façam fim a ellas como
aas sobre dictas e das que o nim forem façam mo saber pera as eu veer e
dar juizes a prazimento de partes que as livrarem como acharem que he
direito fecto em Cantanhede quatorze dias de Novembro Vasco Perez o
fez de mil IIIIc çinquoenta oyto annos.
E leudo o dicto alvara como dicto he o dicto Vaasque Anes requereo
que se conprisse como em el he contheudo e aos sobre dictos aproogue
Riscada a palavra “ey”.
No fim de cada fólio, excepto os 1 verso e 6 verso, o tabelião Afonso Anes
afirma a veracidade de tudo o que escreveu. Esta afirmação manifesta-se sempre
mediante a imposição do seu sinal de validação e por uma fórmula, nem sempre igual,
que o autor da transcrição enumerou desde logo numa única nota, nomeadamente:
fl. 1, “ –– que tal (?) (sinal) he o mater dey memento mey”; fl. 2, “E eu Afomso
Anes tabaliam sobre dicto que a esto presente fuy com as ditas testemunhas e juiz
e procurador e vereadores e aqui meu signal fiz que tal he (sinal) he”; fls. 2v-5 e
7-12 e 15, embora com pequenas particularidades, “E eu Afomso Anes tabaliam
sobre dicto que com as dictas testemunhas e ofeçiaees a esto presente fuy e aqui fiz
meu signal que tall (sinal) he”; fl. 15v e seguintes, sofrendo também ela algumas
especificidades, “E eu Afomso Anes tabaliam que com o caseeiro do dicto casal a
esto presente fuy e so scripy em que fiz meu signal que tal (sinal) he”.
3
4
- 171 -
Cristóvão Mata
dello e disserom que asy o entendiam por prooveyto da terra e em presença
de elles ordenarom e derom juramento aos Santos Evangelhos pera o que
dicto he quanto perteence aas cousas da vylla e lugares darredor della a
Gil Gonçallvez que foy vogado e Vaasco Martinz que foy almoxarife e
Gil Vaasquez Louçaao avendo os por boons homeens onrrados e verdadeiros que sabyam as dictas [cousas] e que bem e direitamente fariam
o que no dicto alvara era contheudo e o dicto Vaasque Anes por parte
do senhor [ifante]5 e pedio o trellado de todo esto e que fose scprito no
livro do tonbo que sobrello ha de seer fecto o qual se adeante segue so
meu signal e testemunhas e eu Afomso Anes tabaliam do dicto senhor
ifante Dom Pedro que a esto presente fuy e aqui meu signal fiz que tall.
[// fl. 2] Em Penella ha o dicto senhor os direitos que se adeante segem
pellos termos confrontaçoes adeante scpritos per foraaes e costumes de
que o<s> senhorios6 dos dictos lugares senpre steverom en pose.
7
Primeiramente foral que o dicto lugar tem do qual o teor de verbo
a verbo he in nomyny domyny amen eu Afomso ifante filho do conde
Dom Henrique e da reynha Dona Tarreija faço cartaa de doacom e
firmidom aos homeens [// fl. 2v] de Penella e a todos os que hy morarem
dou e outorgo a vos o meu castello com seus termos e fontes8 e terras e
pacigoos rotos e nom rotos d qual verdadeiramente estes som os termos
daquela cabeça da mata furada e fere em adueça e vay aaquela cabeça
dalbarrol e fere em na talhada e vay per aquelle lonbo raso e fere em
aquella carreura antiga da serra como corre a auga daquele rio Dalia e
fere em direito em esse meesmo Porto das Lageas e se vay aa Cabeça
dOuvelha e descende per aquelle vale do Pito e vem aa figeira e entra
naquella auga da ladea ata aquele ulmar e fere aquela cabeça da mata
furada dou e outorgo a vos esse castello com seus muy boos [sic] foros.
De huum jugo de bois dous quarteiros meyo triigo e meya cevada e
aimda huum homem aja muytos bois nom de mais de ii quarteiros.
E daquelle que hi chantarem vinhas e ouverem çinque quinales de
ende dous pucaes e nunca mais e nom vaa mordomo a seu lagar.
Monteiro que nom der jugada e for ao monte des quando ouver em
monte viii dias de alqueire de mel ou arratel de cera.
5
6
7
8
Palavra “entregou” riscada.
Imperceptível.
Na margem “foral”.
Na margem “confinja”.
- 172 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Do cervo huum lonbo.
Do porco duas costas.
E o coelheiro huum coelho com sua pelle.
E o cavaleiro quantos homeens poder aver em sua herdade sejam livres.
Molher se o seu marido cavaleiro for morto enquanto for veuva nom
pague jugada.
O cavaleiro se veer em perda ou em pobreza nom de jugada.
Todos os que hi morarem e ouverem duas jugadas de bois e dez
[// fl. 3] ovelhas e duas vacas e huum leito de roupa aquelle que mais
ouver merque ende cav<a>llo.
Domeçido e de rouso dentro fecto triinta soldos e de fora quinze soldos.
Do ladrom çinque soldos e friramno deante e detras da qual contia
aja o rey a meetade e os moradores a outra metade.
Da vegia do muro o rey a meetade e os moradores a outra meetade.
Da prova com scudo e lança aquelle que matar de dez soldos.
E da porrada huum soldo.
Do juiz ferido dez soldos.
Do sayam ferido cinque soldos.
E todas outras emjurias que hi forem fectas nom obedeçam outra rem
mas façam juizo antresy e avenhamse bem.
E se alguum homem nom quiser entrar em juizo com os vezinhos
venda aquello que hi ouver todo hi e saiase do nosso castello.
Homem que for a casa de seus vezinhos sem alcaide e sem juiz de
sasseenta soldos triinta ao rey e triinta ao concelho.
E se aduser arme de çinque soldos e perca a arma.
Quando formos em fossada delrey demos a meeta<de> como
sua criaçom.
9
Homem de Penella enquanto for d’ifante nom de portajem.
Homem de Penella nom faca alguum juizo senom em seu castello.
E aquele couto a que vos mandastes seja per seus termos.
E se nem huum homem nom o quiser ronper peite seiscentos soldos
a elrey.
E todos os que veerem povoar as suas herdades onde que que forem
sejam livres e o alcaide aja suas quintas e alcaidaryas e seus foros.
O creligo que hi for na igreja de ao bispo que hi for hũa pelle de gineta
e huum alqueire de mel.
9
À margem “portagem”.
- 173 -
Cristóvão Mata
[// fl. 3v] Se alguum homem veer ou quiser conrronper este noso
scprito seja maldito e scomungado e condapnado no Inferno com Judas
o treedor feita a carta de doaçom e firmidom no mes de Julho era de
mil cento sateenta cinque annos eu ifante Afomso que esta carta fazer
encomendey e com minha maão a roborey e este signal fige.
(Sinal)
[O dicto] senhor esta em posse que todo aquelle que lavrar continuadamente com bois hũa somana ou sejam seus ou alheos e a lavra seja
pera sy page jugada com tanto nom seja daquellas pessoas que o foral
esenta a jugada.
Os juizes do lugar devem seer feitos en cada huum anno por Sam
Joham per pelouros e confirmados pello senhorio del e dadas cartas a
elles per que obrem dos ofiçios asseladas com o seello do Senhor be das
cartas pagam chancellaria scilicet cinque livras de moeda antiga.
O moordomo e sayam que he o porteiro devem seer apresentados e
dados pello senhorio e confirmados pellos juizes e scpritos em livros da
veereaçom e dado juramento per elles que bem e dereitamente usem de
seus oficios.
[// fl. 4] PORTAJEM. MOORDOOMADO. CALAJO.
Todo o homem que citar outro por divida que diga que lhe devem de
todo o que vençer o senhorio deve daver a dizima ora seja julgado no
lugar ou perante o corregedor ou na corte e posto que nom seja apellada
deve pagar a dizima.
Cada vez da çitaçom na villa seis dinheiros antigos e de fora da villa
dous soldos aa legoa e se mais pesoas çitar que hũa que leve de cada hũa
das outras que mais çitar seis dinheiros e mais nom daquelle caminho e
esto se entenda asy os que citarem perante o juiz ordenario como perante
juiz alvidro.
Item de todo linho e alhos de fora que ao lugar veer pera vender page
dizinha.
De todas cebollas page carrega cavalar huum soldo.
E da carrga asnar seis dinheiros.
Todo homem de fora parte que trouxer pescado de dez peixes açima
de tres peixes10 se descarregar e se for vend[e]ndo andando a besta
À margem “nom he direito comum nem da terra iddeo (?) a amencya (?)
jeral per caajão (?)”. O autor não exclui a hipótese de “per caajão” ser “portagem”
redigida em grafia antiga.
10
- 174 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
caminho e nom descarregar e no caminho se detenha tamanho spaco per
que posam lancar hũa pera aa besta page o dicto foro e nom lha peando
nom page nada nem page outra portajem e deste iii d’aver o moordomo
dous e o alcaide huum11.
Todo homem de fora parte12 que na dita villa e termo conprar besta
de cabresto13 page cinque soldos.
E de besta de sela page sete soldos.
E d’asno ou d’asna page huum soldo14.
E de boy ou de vaca huum soldo.
[// fl. 4v] Do porco huum dinheiro.
Todo aquelle de fora da terra que conprar paaos e os levar a zorro por
cada huum paao page huum soldo.
E por carregar cavalar de toda madeira page huum soldo.
E por carrega asnar seis dinheiros.
E por carrega de coiros que for conprada e levada pera fora parte se
for cavalar page huum soldo.
E por carrega sobre dicta arnas page seis dinheiros.
E de carrega de cera mel azeite se no[m] page portajem.
Item as bestas e gaados que som achados sem donos som chamados de
vento e a qualquer tenpo que forem achados deveos tomar o moordomo e
tragelos em guarda a façe da villa ata tres nove dias aalem do Sam Joham
e se ataa o dicto tenpo for achado dono per juramento ou prova leveos
seu dono e page a guarda ao moordomo e se nom for achado dono ata o
dicto tenpo seja do senhorio.
Todas paadeiras que amasarem pam na dicta villa e termo dem cada
hũa cada mes huum pam ao senhorio de çalayo.
Todo homem de fora da terra que comprar vinho no dicto lugar e
termo page portajem scilicet de carrega cavalar huum soldo e da carrega
asnar seis dinheiros.
ACOUGAGEM.
Todo carniceiro de todo rexello que talhar e cabroeiros das cabras e
cabroes que talharem pagem de cada huum huum dinheiro e do boi e
Tem acrescentado “e destes iii”.
Riscado e sopontado “de fora parte”.
13
Na margem “esta letera foi adiçam doutra tynta”.
14
Na margem “e nam se da neste tombo direito ao homem da terra porque asy
he ley jeral da portagem e agora levamna do pescado ideo ley”.
11
12
- 175 -
Cristóvão Mata
da vaca dous dinheiros do qual foro leva Sam Lourenço a meetade e a
all-[// fl. 5]caidarya a outra metade.
O alcaide leva mais de cada porco o lonbo assy di qye se talha no
acouge como do que se vende aa exerca.
Leva mays de cada carrega de pescad d’escama dos çinque peixes
era cima huum peixe dos milhores que hi veerem e esto adaver assy dos
da villa como dos de fora salvo se for peix[e]s eiro ou semelhantes de
conhoçimento15.
A mais d’aver a alcaidarya pello que for alcaide as forcas e cooimas
contheudas no foral pera o senhorio.
A mais d’aver o senhorio cooymas e penas que elrrey ordenar per seu
senhorio em suas ordenacoes.
COLEITA.
O senhorio <a> colheita em a dicta villa de que pagam os morador[e]s
dela en cada huum ano ata iii dias andados de Mayo esto que se adeante
segem ou preço a dinheiros aa mayor vallia que no dicto tempo vallerem
qual antes quiser o senhor.
De triigo huum moyo quatorze alqueires quarta de triigo.
De cevadas tres moyos.
De milho oito alqueires.
De vinho viinte seis almudes meyo.
De vacas hũa.
De porcos dous.
De carneiros çinque.
De galinhas quareenta.
D’ovos çento.
De cabritos dous.
De leitoes dous.
[// fl. 5v] De mel huum alqueire.
De manteiga huum alqueire.
De vinhagre huum almude.
De sal huum alqueire.
Dam por adubos dinheiros antigos quareenta soldos.
Dam por lenhas quareenta soldos.
De bragal hũa vara.
D’alhos duas restes.
15
Acrescentado a tinta diferente “salvo se for”.
- 176 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
De cebollas duas restes.
De linho hũa maão.
De cera hũa livra.
SOPAS.
16
A o senhor huum direito que os moradores da dicta villa e termo
pagam en cada huum anno por o dicto primeiro dia de Mayo por o
qual pagam.
De dinheiros antigos dez sete livras.
A qual colheita e dinheiros de sopas que assy am de pagar ata os dictos
tres dias pasante o Mayo nom pagando ao dicto tenpo o almuxarife ou
rendeiro que for17 lhes faz tomada nos fornos e moynhos do dicto lugar
que nom cozam nem moam ata fazerem conprimento de paga.
O almuxarife scprivam do senhor am d’estar aata usaçom da dicta
colheita pera aver paga das cousas em dinheiros ou em ellas quall o senhor
antes quiser presentes procuradores vareadores da dicta villa am d’aver os
sobre dictos almuxarife scprivam huum jantar do dicto concelho ou por
elle quareenta soldos d’antiga moeda per posse de que o senhorio esta.
Os jugadeiros am de trager suas jugadas de triigo e cevada boo e
reçebondo aa dicta villa em salvo dentro no celeiro do senhor e medido
pello sayom que he o seu porteiro ata primeiro dia de Janeiro en cada
huum anno e ata o dicto som sem custo e pena a elles e passando o dicto
dia s que entregar nom quiserom am de ser penhorados e se pagar nom
quiserem seus penhores vendidos por ella ao tenpo acostumado e o
porteiro seu solairo razoado per o dicto almuxarife scprivam.
O dicto porteiro estara presente pera medir as dictas jugadas no dicto
paaço e medilas presente o almuxarife scprivam cada huum tevesse sua
pera viir todo a boa recadaçom.
E dei ai dicto medidor novamente que ouvesse oera seu solairo duas
jugadas enteiras en cada huum anno scilicet hua de pam e outra de vinho.
[// fl. 6v] Jurdiçom alcaidarya he do senhor e o alcaide seu e ade seer
dado aa terra per elle apresentado per seu almuxarife.
[// fl. 7] RELEGO.
O senhor a relego no dicto lugar no qual relego ad’aver apanhado
pera sy o direito das vinhas contheudas no foral scilicet de todos aquelles
À margem, com letra diferente, “se esta sopa he outro direito afora o gentar
que detras figua”.
17
Correcção de “fog”.
16
- 177 -
Cristóvão Mata
que chatarem vinhas e ouverem18 cinque quinales de vinho que som tres
moyos dez almudes meio pella nova paga dous pucaes de vinho pella
nova por jugada e este que assy for jugadeiro sem duvyda faça seu vinho
onde quiser e leve a dicta jugada a adega do senhor aa sua custa em salvo.
Todo aquelle que for dovidoso se a vinho per que page a dicta jugada
ou nom nom [sic]19 ade vendimar sem autoridade do senhorio per seu
almuxarife e deve de fazer o vinho no lagar e o medidor que for pollo
senhor tenha a chave do lagar ata que todo o vinho desse dovidoso seja
medido pera se veer se he jugadeiro ou nom.
E se este dovidoso quiser fazer mosto per sua despesa ao de fazer saber
ao dicto senhorio pello seu almuxarife e per elle lhe deve seer alvidrado
quanto he e se contar com o outro quando o assy fezer pera se veer se
he jugadeiro ou nom.
E o dovidoso que o contrario fezer page toda a dicta jugada em cheo
como se ouvese todos os dictos tres moyos dez almudes meo ou mays.
E se conprir e ouver mester o senhorio tinta pera tingir e correger
seos vinhos em sua adega deveo d’aver de conpra onde a quiser aver.
E posto este vinho na adega do senhorio o dicto senhor ad’aver relego
scilicet des dia de Santa Marya de Março ata Sam Joham seginte que
som tres meses e em quanto o dicto tenpo durar outro nem huum no dicto
tenpo na dicta villa e termo nom deve de vender vinho sem licença do
senhorio e por sua licença e aveença e o que o contrairo fezer desto polla
primeeira vez page cinque soldos e polla segunda vez dez soldos e polla
terceira vez talhar os arcos aa vasilha que o vinho tever.
E se aconteçer que alguum morador da dicta villa for por vinho ao
termo ou fora dell que o traga conprado que tal como este perca o vinho
e a [// fl. 7v] vasilha em que o trouxer e sejam pera o senhorio do qual
costume o senhorio esta em posse per20 sentença delrey.
À margem, com letra diferente, “o quinal de vinho aqui de xxi almudes e em
Sintra de cxxb almudes e v quinaes sam cbj almudes” (“xxi” está escrito com uma
outra letra).
19
Reparo nosso.
20
Na margem superior da folha, em letra diferente, “a sentença nam afrenta (?)
e a rezam nam ajuda e a ley do reyno he contraira scilicet que page almude por
carga / ideo lho fazer por ley”.
18
- 178 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
E se alguum morador na villa e termo quiser vender vinho e carregas
pera fora da terra podeo vender. E se conprador pagar o direito ao senhorio
scilicet portajem.
Da carrega cavalar dous soldos.
Da carrega asnar huum soldo.
Per meudo nom o deve vernder salvo aos juizes do lugar a cada huum
dus meas e ao alcaide quatro meas e a cada huum tabaliom hũa mea.
Daquella cuba que se assy vender e mays nom e se a outrem ou a estes
mays vender aja a dicta pena. E a procurador vareadores duas meas a
cada huum polo preco dos almocreves.
21
E se alguum grande cavaleiro de pendom e caldeira veer pello dicto
lugar em tenpo que hi aja o dicto relego entom lhe devem d’abrir hũua
cubeta pequena em que aja huum moyo de vinho e tome esse senhor dell o
que lhe conprir e o mays se venda sem pagar o dono da cuba a relegajem
ao senhorio s [sic] scilicet22 d’oito huum que he do almude hũa mea.
23
O senhorio nem relegeiro nom deve trager outro vinho ao relego e
se o trover que o perca.
TABALIAES.
Os tabaliaes da dicta villa da dicta villa [sic] am de seer dado pello
senhor do lugar e em suas scprituras chamaremsse seus e confirmados
pello rey en sua chancelarya.
E que sejam muytos que poucos am de pagar de pensom em cada
huum anno.
De moeda antiga sassenta livras.
E devem fazer paga por Sam Joham Bautista e darem fiadores aas
pagas em começo do anno ao senhorio e doutra gisa nom usarem delles
e usando ajam a[s] pena[s] conteudas nas cartas de seus oficios que he
so pena dos corpos.
[// fl. 8] ERDAMENTOS DA VILA.
[N]o castelo da dicta villa a o senhor huuns paacos sobradados que
partem do aurego com adega de Santa Cruz e de todos outros cabos com
muros do dicto castello en que soya estar caleiro das jugadas.
Na margem “este era boom juizo”.
Na transcrição consultada encontra-se redigido “s.s.”. Por julgarmos tratar-se de um “s” a anteceder a abreviatura da expressão “scilicet”, eliminamo-lo e
desdobramos a referida abreviatura.
23
Na margem “e se o senhorio o perder pera quem sera ideo ao do reyno”.
21
22
- 179 -
Cristóvão Mata
Outra casa pequena junto com o adro de Sam Migeel e he daneficada
sem portas e da parte do agiom parte com muro e da travesia com rua
que vay pera o postigoo e do soaão com adro da igreja e do aurego com
Gil Vaasquez jenro do Loução e foy da conpra de Lourenco Anes.
[H]uuns pardeeiro[s] junto[s] com o postigo que parte do agiom
com o muro e do aurego com Goncalo Torrom e da travessya com casas
de Joham Perez e de Vaasco Casado e ao soaão com casas de Gonçalo
Borralho e forom do dicto Lourenco Anes.
[H]ũas casas grandes aa porta do castello sobradadas sobre huum
sotom grande e dentro hũa casa terrea aa parte do agiom que partem aa
dicta parte com a cisterna e do aurego com ereeos de Joham Vicente e
da travessia com rua puplica e do soaão cim Martim Afonso crelligo.
[O]utras casas da outra parte da dicta rua hũa terrea e outra sobradada.
Junto hũa com a outra e partem do soaao e agiom com rua puplica e das
outras partes com muro e servidom delle.
[N]o arravalde do dicto logo na rua direita hũas casas acerca da
praça scilicet tres casas em fondo hũa adefa e dous sotoons e en çima a
casa deanteira de sobreados sobre os dictos sotoons e contra cima hũa
cozinha terrea que parte do agiom com pardeeiros d’Afomso Perez creligo
e do aurego com Diego Stevez e da travessia com a dicta rua direita
e na dicta adega estam estas cubas do senhorrio de que o almuxariffe
que for do lugar a de dar recado com outras segintes que estam na casa
do relego:
[// fl. 8v] [O]utras casas em fronte das sobre dictas em que o dicto
senhor mandou fazer celeiro de pam pera as jugadas sotom e sobrado que
partem do soaao com a dicta rua direita e do agiom com terreo d’Afomso
Perez creligo e do aure[go] com azinhagaa e da travesia com adega de
Gonçalo Perez as quaaes forom do dicto Vasco Gil.
[O]utra casa pequena a fondo das casas de Gonçalo Abade terreas que
forom de Loureco Anes e partem da travesia com casas de Joham Perez
da Ferretosa e de todas outras partes com ruas puplicas.
A o dicto senhos huuns paacos que ora no<va>mente mandou fazer
em lugar que chamam Chaqueda scilicet hũa gram sala com seu alpender
da parte do agiom e antecamara terreas e camara alt[a] da parte do
aurego com eirado de longo delas no soaao terreo em erancas que ouve
per conpras.
- 180 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Outra casa no arravalde que foy adega de que a terça parte he d senhor
que parte com Joham Perez da Ferretorsa e da travesya24 e soaao com
azinhagaa. E foy de Lourenço Anes25.
MOINHOS.
Item huum moinho que jaz junto com os pumares do Spinhal que jaz
em herdamento de Lourenco Anes do Spinhal de que o senhor a d’aver
das maquis a meetade jaz agora derribado.
Outro moinho a fondo sobre o dicto que foy de palos jaz hermo que
lhe nom sabem dono e tambem he do dicto foro.
Trres moinhos derribados que stam no dicto logo onde se ajuntom as
augas de Cabra e Cabrella e jazem em herdamento dhũa quintãa da Se
que ora traz Gonçalo Abade jazem derribados e am de fazer o dicto foro.
[// fl. 9] [O]utro moinho que jaz a fondo na dicta ribeira de Cabra que
chamam dea Bodeira o qual traz Afomso Anes o Velho e Goncalo Abade
e jaz em herdamento delles e dam der [sic] en cada huum anno per Sam
Joham e[m] moeda antiga oito libras.
[O]utro moinho que som duas moendas em hũa casa que jazem
em herdamento da capeella que ora tragem os dictos Gonçalo Abade
e Afomso Anes e dam elles das maquias a meetade anda em adobio e
moente e rendera huuns annos per outros.
[O]utro moinho a fondo dos sobre dicto que jaz em herdamento de
Vasco Martinz e Goncalo Martinz e dam ao senhorio das maquiaas a
meetade anda em adobio e moente e rendera huum anos por outros.
[O]utro moynho a so o sobre dicto que som duas moendas em hũa
casa em herdamento dos sobre dictos e dam das maquias a meetade.
[D]ous moynhos em huũa casa em herdamento de Sam Jorge dos
quaaes o senhorio a d’aver a meetade das maquias estes nom som ora
moentes e quando o som rendem [sic].
[O]utro moynho a fondo dos sobre dictos a que chamam do Garamaxo
e jaz em herdamento que foy de Vasco Martinz d’Augua o qual faz o
dicto foro e he destroido.
[A]o olho da fonte de Dueca esta huum moynho derribado que jaz
em herdamento d’Amfonso Anes scprivam e paga en cada huum anno
por Sam Joham Hautista de moeda antiga quatro livras.
24
25
Riscado “com”.
“E foy de Lourenço Anes” foi escrito posteriormente.
- 181 -
Cristóvão Mata
[O]utro moynho a fondo dos sobre dictos que he chamado de Fode
Velhas o qual jaz em herdamento de Santa Anna e trageo Afonso Lourenço
da Casada. E paga moeda antiga por Sam Joham çinque livras.
[O]utro moynho a fondo do sobre dicto que chamam de Pallos o qual
jaz em herdamento de [sic].
[// fl. 9v] [O]utro moynho em herdamento de Gil Vaasquez crelligo o
qual jaz derribado de que o senhorio a d’aver das maquias [sic].
[O]utro moynho junto com o sobre dicto e em seu herdamento e jaz
derribado e ade pagar en cada huum anno de moeda antiga por Sam
Joham Bautista seis livras.
[A] fondo do dicto moynho estam dous moinhos em hũa casa em
herdamento do senhor ifante e de Joham Dominguez crelligo os quaaes
ouve o dicto senhor per conpra com bees [sic]26 que forom de Ruy de Sousa:
e ad’aver o senhor as tres partes das maquias scilicet a meetade como
de senhorio e da outra a quarta parte per bem d’erança da dicta conpra.
[O]utra moenda de dous moynhos em hũa casa em huum herdamento
da Se a que chamam do Alcaide.
[O]utro moynho a so a ponte do Spinhal o qual he derribado o qual
dizem que jaz em herdamento de Santa Cruz e ad’aver o senhorio das
maquias a meetade.
[D]ous moinhos a so os sobre dictos em hũa casa em herdamento da
capeela a que chamam d’Estevam Casado de que o senhorio ad’aver en
cada huum anno de moeda antiga dez e seis livras.
[O]utros dous moynhos a fondo dos sobre dicto en herdamento de
Sam jorge de que o senhorio ad’aver en cada huum anno por o dicto dia
de moeda antiga oito livras.
[// fl. 10] [O]utros dous moynhos a que chamam da Varzea que som
em herdamento de Santa Crara [sic]27 de que dam en cada huum ano de
moeda antiga por o dicto dia dezoito livras.
[O]utro moynho derribado que jaz a fondo do sobre dicto herdamento
de Semide do qual o senhorio ad’aver en cada huum anno da moeda
antiga por o dicto dia de quareenta soldos.
AUGOAS.
[A]s auguas som do senhorio em esta gisa qual quer artefiçio que se
em ellas fezer ad’aver delle a meetade resalvand se hũa fonte naçe en
26
27
Reparo nosso.
Reparo nosso.
- 182 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
terra d’alguum cuja terra for en que assy naçe em ella alguum artefiçio
fezer seja seu sem pagar o dicto28 trebuto. E como de seu herdamento
saae fica trebutarya ao senhorio como dicto he per quaes quer per onde
for e o fezerem page o dicto trebuto.
[// fl. 10v]29 [H]uũa coirela d’almoinha en Valouro da qual a meetade
descontra o ribeiro foy de Maria Anes e a outra meetade foy de
Joham Perez de Ferretosa e parte desta parte do agiom com erreeos do
sobre dicto.
[H]uum olival nas calçadas nas calcadas [sic] que parte d’agiom com
o carrado de Semidee e de soaao com Domingos Apariço e d’aalem do
rio com Affomso Fernandiz e de soaao com strada puplica e a em elle
[sic] oliveiras.
[H]ũa herdade na porta da vinha de pam que parte do aurego com
Santa Ofemea em olival seu e da travesia com Joham Perez da bacorinha
e d’agiom com Gil Vasquez priol de Bellas e levara em semeadura [sic].
Esta he[r]dade he encabecada ao casal do Carvalhal que he aforado
a Johane Anes morador no dicto logo.
[O]utra herdade junto com o barco de Vallouro que parte com rego
d’aagua do dicto barco e d’agiom com rio puplico e de soaao com Symom
Dominguez e levara em semeadura [sic] a qual he encabecada ao dicto
casal do Carvalhal que trage a foro o dicto Johane Anes.
[O]utra coirela d’erdade junto a sobre dicta que parte do soaão com
erreeos de fude polinho e da parte da travesya com Symom Dominguez
e d«agiom com ribeiro puplico e levar<a> em semeadura [sic] a qual he
encabecada ao dicto casal do Carvalhal que trage o foro o dicto Johane
Anes.
[// fl. 11] [H]ũa vinha nas Coimbraas que parte da travesya com o
rego da auga e do soaao com a vinha da Candea e do aurego com strada
puplica e leva cavadura de [sic] homees.
Esta vinha dada a meas.
[O]utra vinha na Bouça que som duas coirellas com seus matos e
herdades e salgeiraaes e hũa parte do aurego com Afomso Lourenço e
do agiom com Joham dos Feetaes e do soaao com strada puplica e leva
[sic] homees en cavadura.
28
29
Na margem “boa rezam que nam sei se he direito”.
À margem “eranças”.
- 183 -
Cristóvão Mata
A outra hu chamam a Venda Velha que parte d’agiom com ribeiro
de Podentinhos e d’aurego com Joham de Pinhel e leva [sic] homeens
em cavadura.
Estas duas coirellas da Bouça com seus salgeiraes dam o secto do
vinho aa See de Bragaa.
[H]uum chaao nas Bajancas que parte d’agiom com Afomso Garcia
e da travesia com rego da villa e do soaao com Symom Quinteiro.
[H]uum olival na [sic] que parte do soaão com Jorge Perez e do aurego
com Martim dos Feetaes e da travesya com Joham Afomso Lagareiro e
tem [sic] oliveiras.
[H]uum olival na Pipa que foy de Maria Anes e de Gil Salem que
parte com Lourenço Gonçallvez da Ferretosa em que a [sic] oliveiras.
[H]ũa almoinha aas pontes que esta antre a auga de Valouro e a auga
que vem de Val d’Arinto.
[H]ũa figeira com seu chaão aa fonte de çima que parte com duas
partes com Joham Perez da Ferretosa e da outra com auga que vem da
dicta fonte.
[H]uum chaao com figeiras no dicto logo que parte com strada puplica
e da parte d’auga com Maria Martinz da parte da auga da dicta fonte.
[H]uum chaão na Havosa em que esta hũa macieira canacal e huum
pereiro em ella.
[H]ũa herdade em Canpors de pam que parte d’agiom com Joham
Apariço e d’aurego com Pero Pirez e levara em semeadura [sic].
[H]uum baçelo em Val d’Arinto que parte da travesia com o filho
de Joham de Viseu e d’agiom com Johane Anes Porteiro e leva huum
homem em cavadura.
[H]ũa vinha em Val de Touro que parte do soaão com Stevam
Dominguez de Gorgulho e d’aurego com Gil Perez Salem que levara
en cavadura [sic].
[H]uum talho de chaao aa fonte de Çima que parte de travesya com
Johane Anes Chancas e d’aurego com Joham Steves filho de Gorgulho.
[N]o Arresayo huum talho de mato em duas partes com Maria Martinz a
Fradesa que a as outras duas partes e assy som dous talhos em esta eranca.
[H]ũa coirella de çeiçal na Varzea apar de Vaasco Queryde.
[N]l Fanico huum chaao que tem huum pereiro e hũa macieira que
parte do soão com Joham Ramalho e d’agiom com a ribeira.
[N]os Ruyvaes hũa coirella com ameixieiras e com duas maçieiras
que parte d’agiom com Joham do Rabacal.
- 184 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
[E]m Val d’Ariinto hũa coirella d’olival com oito oliveiras que parte
de todos [// fl. 12] ventos com Gonçallo Viga<i>raão e com o ribeeiro.
[H]uum mato em Val Louro que parte da travesia com Joham de Pinhel
e d’aurego com Pedro Afomso.
[O]utro mato no dicto lugar onde chama a Cova ante Diego e Joham
de Pinhel.
[A] meetade doutro mato e a outra meetade he de Maryanes.
[O]utro mato no dicto lugar que parte com Fernam Afomso da Franca
em que esta hũa oliveira.
[O]utra coirela com sete oliveiras que partem da travesya com Joham
de Pinhel e de soaão com Fernam Gonçallvez da Franca.
[O]utra coirela com quatro oliveiras no dicto lugar e hũa maceira que
parte do aurego com Joham de Pinhel e d’agiom com Domyngos Aparico.
[D]uas moutas de figeiras negraaes no dicto lugar que parte do aurego
com Joham de Pinhel e d’agiom com Afomso Anes.
[O]utro mato pequeno no dicto lugar que parte com Domingos Aparico.
[H]ũa maceira cobronbal sem erança que parte com Joham de Pinhel.
[H]ũa coirela com quatro oliveiras e dous pereiros que parte da travesia
com Domingos Aparico e de soaao com Vaasco Sequeira.
[H]uum baçelo no dicto lugar que parte do aurego e d’agiom com
Joham de Pinhel e leva en cavadura [sic].
[// fl. 12v] [H]uum olival no Arresayo que foy de Carquelhos em que
a [sic] oliveiras que parte do agiom com Gill Vicente e d’aurego com
Gill Vasquez e de soaao com caminho, puplico.
[H]ũa vinha no Val do Spinhal que foy do Betallo que parte com Jorge
Perez e com Gil Martinz tragea Vasco Gil a meas e levara em cavadura [sic].
[H]uum olival que jaz no Val de Zorro que foy do Betallo em que a
[sic] oliveiras que parte do aurego com Jorge Perez.
[H]uum souto em logo onde chamam os Talheiros que parte com mato
e souto dos ereos de Joham d’Amarante.
[H]ũa herdade no Val d’Ooliveira que parte com Maria Martinz e
Joham de Pinhel e leva de Seme[a]dura [sic] a qual he encabeçada ao
casal do Carvalhal que trage Johane Anes aforado30.
Parte desta linha, mais precisamente desde “a qual he encabeçada”, trata-se
de um acrescento posterior pela mesma mão e tinta.
30
- 185 -
Cristóvão Mata
[O]utra herdade no dicto lugar que parte co herdades de Sam Lourenço
e com outras de capeela de Gil Vicente e levara de semeadura [sic] a qual
he encabecada ao casal suso dicto que traz o dicto Joham Anes.
[H]uum olival no Arresayo que foy do Boroeiro e que a [sic] oliveiras
que parte do agiom com o cano e aurego com Vasco Martinz e do soao
caminho puplico.
[O]utro olival no dicto lugar em que a viiiº pees d’oliveiras que parte
da travesia com Gil Vasquez priol de Bellas.
Estes beens ouve o senhor per conpra que elrey seu padre <fez> a
Lourenço Anes criado de Gonçalo Lourenço scprivam da sua poridade
com çertas casas contheudas no titolo das casas as quaaes em ell faz
a mençom.
[// fl. 13] [E]m Albarrol a o senhor hũa leira de souto de madeira que
foy de Vasco Gil de Pedroso e parte d’agiom com vinha da Albergarya
per o vale açima e de soaao com souto da dicta Albergarya e de travesya
com Gonçalo Abade.
[E] no Almeco hua vinha que parte com ryo de Dueça e com vinha
dos hereos do Boroeiro e com outras erancas e con souto do dicto senhor
e com vinha d’Afomso Anes o Velho tragea arrendada a meas por nove
annos Vasco Gill da Velha e começou o arrendamento.
Huum souto no dicto logo que parte com a dicta vinha e com Joham
Scudeiro per mato e per vinha e com souto de Sam Jorge e com monte
d’ereeos de Vasco Thagaz e per serra do Almeco e com reg que vem
per Val da da [sic] Grila este souto recadase pol senhor e tem dentro ata
sasenta pees de boas oliveiras.
[O]utro chaão no dicto Almeco pequeno que parte com rio de Dueça
e com rio de Val Louro e com vinha de Joham Scudeiro e com chaao de
Gonçalo Abade.
Huum olival a so a Ponte da Pipa. grande que parte com chaão e olival
e Sam Jorge e de fondo com olival de Gil Gonçallvez e com caminho
puplico e de cima com olival de Sam Migel e trageo [sic].
Hũa vinha aas Carrasqueiras junto com a villa que parte com caminhos
puplicos e com herdade do senhor e com figeiredo de Joham Ferrnandez
Andeiro.
Esta vinha trage Vasco Gil a meas por nove anos31.
“Por nove anos” parece ter sido acrescentado posteriormente, dado que a tinta
da anotação é mais clara do que a da restante linha.
31
- 186 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
[O]utra vinha a so o Penedo do Arressayo que foy de Fernam Lopez
que parte com resyo de Valouro e de todas outras partes com caminhos
puplicos a qual [// fl. 13v] trage Lourenço o Preto rendada a meas por
nove annos e acabaronse.
[E]m Valouro huum olival que foy de Fernam Lopez que parte com
rio do dicto logo e com vinha e olival de Ruy Vasquez e com olival e
mato d’Afomso Vasquez emprazado a Goncalo Abade pera senpre.
Hũa herdade de pam aas Carrasqueiras d’apar da vila que parte co[m]
caminhos puplicos esta de senpre andou com a alcaidarya. E o que alcaide
he ou a tem arrendada a della o proveito e esto he porque praz ao senhor.
[N]o prazo de de [sic] Valouro huma herdade de pam que parte com
Gonçalo Vasquez de Santarem e com Johane Anes do Covom do Porco
e com o ribeiro do dicto logo e com Joham Perez do Carvalhal e leva
em semeadura [sic]32.
Encabecada ao casal do senhor ifante que traz Pedro Afomso do
Carv[a]lhal.
[N]as Eiras hũa vinha que parte com Gonçalo Vasquez per vinha com
Santa Cruz33 per herdade e com caminho puplico e com Maria Lourenço
tragia Lourenço Preto por nove anos e sayolhe o prazo na era iiiic Lviiiº
annos e ora [sic].
[N]o dicto logo outra vinha com oliveiras que parte com a vinha de
Gonçalo Abade e com resyo do concelho e com auga que vay pera a
foopa tragea de renda Vasco Gil a meas por nove anos.
[N]a Varzea da parte aalem da Dueça hua herdade pequena que foy
de sempre do senhorio que parte com herdade do ermitam e com a dicta
auga. E com herdade da See de Braga que he na Bouça emprazada com
as figeiras da Pipa a Gonçalo Gonçallvez que foy tabaliam e as figeiras
som tres en cada huum ano.
[D]e dinheiros: ––––– : ––––– çento e çinque livras e de galinhas:
––––– : ––––– hũa [// fl. 14] meetade d’hũa casa que o senhor a na rua
da Portela que parte do aurego com Gil Martinz e dos outros ventos com
rua puplicas arendada a Afomso Lourenco testa en cada huum ano por
nove anos ade pagar em moeda velha de tres libras mea çincoenta livras
e pagar por Som joham os quaes annos se comecarom por Sam Joham
iiiic Liii annos.
32
33
“E leva em semeadura” parece ter sido acrescentado.
Na transcrição por nós consultada, foi mantido o sinal cruciforme.
- 187 -
Cristóvão Mata
[H]ũa vinha no Pereiro que parte do soaão com strada puplica e do
aurego com rua da Meestra e da travesya com Gyl Lourenço e com o
Negro e levara em cavadura vi homeens.
[O]utra coirella de vinha no dicto lugar que parte d’aurego com a
Crespina e d’Agiom com a dicta strada e da travesya com a carreira de
Reeos e levara em cavadura xvii homeens e estas vinhas dadas ao terco
em salvo ao senhor ao dicto Afomso Lourenço que as adube segundo
costume scilicet podas enpaar e escavar e cavar e arendar e se nom fezer
que posam estimar contra ell. E aas de teer os nove anos suso contheudos
e daram hingualmente deste terco ao senhor en salvo cada huum anno
huum moyo de vinho.
[H]ũa casa em Fondo da Portella que parte do agiom com casas da
Candea de Santa Maria e das outras partes com ruas puplicas as quaaes
andom d’aluger en cada huum anno e daram dellas [sic].
Estes bee[n]s forom todos do dicto Afomso Lourenço Testa. E ouveos
o senhor per conpra que lhe delles foy fecta.
[N]a Marvana hũa herdade que foy senpre do senhorio e anda com a
renda da alcaidarya e parte com caminho puplico e com olival de Joham
Lourenço Canilhas e com olivaes de Marvana.
[N]a Fonte da Pipa huum chouso o qual anda com a alcaidarya e
parte com Afomso Anes o Moco e com o Gago e com caminho puplico.
[// fl. 14v] [N]a Foopa hũa vinha com huum pedaco de mato que foy
vinha que parte com vinha dos filhos de Martim do rego e com vinha de
Joham Perez da Bacorinho e com rio da Foopa e com vinha de Joham
Scudeiro e com caminho puplico e leva en cavadura [sic].
[O]utra coirella de vinha no dicto logo da Foopa que parte com vinha
da Albergarya e com chaão de Gil Gonçallvez e com vinha de Joham de
Prestar e com caminho puplico desta vinha o quinto dela anda en adobio
e o mais em mortorio e o adubado leva em cavadura [sic].
[N]o dicto logo huum mato com souto pera paaos de vinha que parte
com olival de Tome Johanes e com souto delle e com ryo e Monte
Maninho.
[H]uum pedaço de mato pera linhar junto com o dicto souto e vinha
que parte com chaão de Gil Gonçallvez e com vinha de Joohoam de
Prestar e com rio.
[N]o Val do Zorro hũa vinha e olival que parte com Vaasco Pregiça
per vinha e olival e com vinha d’Afomso Martinz do Aljazede e com
caminho e com olivaaes de Fernam Vasquez.
- 188 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Açima do Val da Grila huum mato de castinheiros novos com hũas
poucas oliveiras mortoryas que parte com olival que foy de Matim Teirom
e com olival de Vicente Martinz do Aljazede e com mato de Gil Eanes
e de cima com strada.
[// fl. 15] [J]unto com a quintaa do Cabido da See da çidade de coimbra
que tra [sic] Gonçalo Abade que he en Cabra foy achado que o senhor
ifante a huum souto marcado per marcos de pedra que parte com a dicta
quintãa e com coirela de souto d’Afomso Anes o Moço.
[N]o arresayo huum mato d’Almoynha que parte com vinha d’Afomso
Martinz do Aljazede e com olival de Gil Gonçallvez e com vinha dos
filhos do ermitom.
[E]m Monte Aragom hũa herdade grande que parte com herdade do
dicto Afonso34 Martinz e com herdade de Jorge Perez e com a sogra
d’Afomso Anes o Moço a qual herdade tem huum chouso em sy carrado
de pedra.
[N]a Foopa junto com a dicta villa huas figeiras.
[H]uum casal e Sam Jeens hermo e Monte Manynho do qual as
confrontacoes nom mostra por quanto a comarca toda d’arredor ha
Lta anos e mays que he despobrada.
[// fl. 15v] [O] senhor a huum casal em logo que chamam as Çereigeiras
com saas casas e asssentamento de moradas em o qual casal andom
encabeçadas estas herdades que se adeante seguem scilicet.
[N]o Seixal hũa coirella d’erdade que parte com herdades do casal
que foy de Vasco Martinz da auga e com huum rybeeiro e levara em
semeadura [sic].
[O]utra coirella no dicto logo do Seixal que parte com vinha do dicto
casal que foy do dicto Vasco Martinz e com herdades d dicto casal e
levara em semeadura [sic].
[O]utra coirella d’erdade junto com as casas do casal que parte
com herdades do casal de Vasco Martinz e com herdades doutro casal
despoboado que foy de Maria Diaz e leva em semeadura [sic].
[O]utros dous talhos d’erdade junto com a sobre dicta que partem de
todas partes com herdades dos dictos casaes de Vasco Martinz e Marya
Diaz e levam em semeadura [sic].
34
Segue-se um “n” riscado.
- 189 -
Cristóvão Mata
[N]a Ribeira outra folha quatro coirellas d’erdade que parte de todas
partes com herdades do dicto casal de Vasco Martinz da auga. E Levam
em semeadura [sic].
[O]utra herdade ao Forno da Cal que parte com herdades do dicto
Vasco Martinz e com herdades do casal de Joham Bras e leva em
semeadura [sic].
[O]utra herdade que jaz apar do Pisom de Zorrom q[ue] parte com
herdade do dicto casal de Maria Diaz e com herdade do dicto Pisom e
com Monte Maninho e com herdade do dicto Vasco Martinz e leva em
semeadura [sic].
Esta herdade foy de Fernam Lopez e foy encabecada novamente a
este casal:
[// fl. 16] Este casal foy de Vasco Gil de Pedroso e trageo emprazado
Joham Mansso lavrador en vida sua e de sua molher Costança Vicente e
d’hua pessoa qual o postumeiro delles nomear per carta dada x dias do
mes de Julho iiiic Lta i annos.
E ade dar en cada huum anno o quinto do pam que Deus der no
dicto casal.
E d’ofrecam quatro alqueires de triigo do seu propio.
E de foro hũa marraa anal por Sam Martinho.
E huum par de capoes
E viinte ovos: ––––––– na eira35
E dous frangoos: –––––
E huum cabrito por Natal.
[N] Monte Doves huum casal com suas casas perfeitamente o qual
foy de Fernam Lopez em o qual andom encabeçadas estas herdades que
se seguem scilicet.
Herdades juntas çarradas d’arredor do aseentamento do dicto casal
que que [sic] partem do soaao com herdades do Casal de Cabra que traz
o criado que he do senhor ifante e com herdades de Santa Cruz36 e da
travesia com herdade de Sam Jorge e com Casal d’Acellas e d’aurego
com o dicto Monte Doves e levaram em semeadura [sic].
Antecede “na eira” um chavão a indicar que, para além da linha em que está
inserida, a nota se reporta à linha que a predece e à que a segue.
36
Tal como atrás aconteceu, “Cruz” foi inscrita no documento através de um
sinal cruciforme, o qual o autor preferiu manter e que aqui é desdobrado.
35
- 190 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Aas sete fontes hũa coirella de terra que parte com rio Doves e com
herdade de Symom Quinteiro e com herdade de Gil Lourenço e leva em
semeadura [sic].
[// fl. 16v] [O] qual casal traz Afomso Anes em sua vida e da delle
en cada huum anno de raçom a quarta parte do que Deus em elle der e
d’ofrrecom cada huum anno huum moyo de pam pella velha que som
pella nova quareenta dous alqueires tres partes de triigo mourisco e hũa
parte cevada.
E ade dar de comer cada huum anno na eira aos que forem partir.
E huum porco de dous anos e vaa per tres cada anno por Natal.
E dous frangoos: –––––
E dez ovos: –––––
E hũa fogaca em que aja dous alqueires de triigo por Pascoa.
E hũa galinha
E huum capom –37 por Natal.
E dez ovos.
E dous alqueires de farinha peneirada pella ante maão.
E huum cabrito pollo Entruido.
E o dicto casal foy enprazado a Joham Stevez e Marga[r]ida Lourenco
padre e madre do dicto Afomso Anes per Lourenco Stevez padre de
Joham Lourenço a x38 d’Outubro iiic LRi anos.
[N]a ribeira Doves hũa coirella grande de mato que foy de Fernam
Lopez que foy vinha e anda fora do dicto casal que parte com vinha
de Joham Lourenço moleiro e com mato do dicto Afomso Anes e com
caminho puplico.
[N]a ribeira Dueça açima de Cabra hũa coirella d’erdade que jaz em
bravio que foy do dicto Fernam Lopez e parte com herdade de de [sic]
Santa Anna de Coimbra e com herdades dos filhos de Martim Salvadorez
e com carreeira puplica.
[// fl. 17] [A] o dicto senhor cinque casaes encabecados no dicto logo
da Cainca.
Primeiramente huum casal que trage Afomso Dominguez morador no
dicto lugar com suas casas de celeiro cozinha cortes e curraes de gaados
que parte do aurego com Joham Ventre e do agiom com Symon Afomso
37
38
Esta nota estende-se até à linha imediatamente antes e à que se segue.
Riscada a letra “d”.
- 191 -
Cristóvão Mata
seus filhos o qual casal tem estas herdades que se adeante seguem de
duas folhas scilicet.
[H]ũa coirella no val de Martim Gago que parte d’agiom com Symom
Afomso e d’aurego com Casal do Spinheiro.
Outra no dicto logo que parte das dictas partes com Joham Ventre.
Huum talho no Sabugeiro que parte dos dictos ventos com Simom
Afomso e com Joham Ventre.
Outro talho no mato coutado que parte da travesya com Bertolameu
e soaao com Joham Ventre.
Outro talho no val de Paay Galego que parte d’agiom e aurego com
Simom Afomso e dos outros com Montes Maninhos.
Outro talho no dicto valle que parte d’agiom e aurego com o dicto
Bertolameu.
Tres coirellas no Barreiro a hũa que parte de travesya com Bertolameu
e soão com Joham Ventre.
Outro açima d’auga do Barreiro que parte de soaao com Joham Ventre
e travesia com Simom Afomso.
A outra que parte travesia com Lucas ã Joham Ventre e soao com resio.
Hũa coirella aa lagoa que parte que parte [sic] travesia com Bertolameu
e soaão com Simom Afomso.
Huum chouso na lagoa que parte travesia e soaao com Joham Ventre
e Bertolameu.
Hũa coirella no comeca [sic] da revolta da Varzea que parte de todos
ventos com Joham Ventre.
[// fl. 17v] [H]uum talho na revolta que parte da travesya com Symom
Afomso da travesia com Simom Affomso [sic] e soaao com Joham Ventre.
[H] a coirella junto com o dicto talho que parte da travesia com
Joham Ventre e soaao com39 Bertolameu.
Hũa coirella no caminho do gaado que parte dos dictos ventos com
Bertolameu e Simom Afomso.
[O]utra coirella na revolta que parte d’agiom com Bertolameu e aurego
com Joham Ventre.
[O]utra coirella junto com a sobre dicta que parte d’agiom com Joham
Ventre e d’aurego com Symom Afomso.
Huum talho aos sovereiros que parte soaao e travesya com Simom
Afomso.
39
Escrito e riscado “Simom Afomso”.
- 192 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Outra coirella no chaao de Maria Martinz que parte travesya com
Simom Afomso e Joham Ventre e soaao com Lucas.
Outra coirella açima da sobre dicta que parte se soaão com Bertolameu
e travesia com Simom Afomso.
Huum talho na ladeira do Carvalhal que parte travesia com Joham
Ventre e soaao com Symom Afomso e com o sobre dicto.
Huum talho no dicto logo que parte de travesia com Simom Afomso
e Joham Ventre e aurego com casal de Joham Perez.
Hũa coirella na strada que parte d’agiom e aurego com Pedro Afomso.
Huum talho aa cabeca de Maria Anes que parte aa travesia e soaao
com Bertolameu.
Hũa coirella na carreira de Podentes que parte do aurego com Simom
Afomso e d’agiom com Joham Ventre.
Outra coirella no chaão de Maria Martinz que parte d’agiom com
Bertolameu e d’aurego com Joham Ventre.
Hua coirella no comeco do chaão de Camarinha que parte d’aurego
com Simom Afomso e d’agiom com Joham Ventre.
Outra coirella nas fontes da Camarinha que parte d’aurego com Simom
Afomso e d’agiom com Lucas.
Outra coirella acerca della que parte d’aurego com Symom Afomso
e d’agiom com Joham Ventre.
Outra acerca della que parte dos dictos ventos com Simom Afomso.
Huum talho ao caminho de Podentes apar da revolta que parte d’aurego
com Simom Afomso e d’agiom com Joham Ventre.
Nove coirellas e talhos pequenos des<d>o mato coutado ataa as
Fontainhas da Tojeira que partem com todas eranças dos outros caseiros.
[// fl. 18] [E]stas coirellas som som [sic] todas regeengas do regeengo
do Rabaçal e o senhor ifante ad’aver en cada huum anno dellas do que
Deus der de dez quinhoes huum come regeengas.
E como senhorio a novea de nove quinhoes huum.
Á mais huũa coirella franquida na Goutena que parte travesya com
herdades de Joham Perez da Bacorinha e de soam com vinhas de Gonçalo
Afomso e de Joham Anes do Covom Porco e desta franquida ad’aver o
senhor o quarto do que hi Deus der.
Outra coirella franquida em Podentinhos que parte travesia com
Boroeiro e das outras Monte Maninho.
Ad’aver mays do dicto casal estes foros en cada huum alqueire de
farinha peneirada pella peneira ante maão e per medida velha.
- 193 -
Cristóvão Mata
Por Sam Migel de Setenbro dous capoes recebondo com vinte ovos.
E quatro alqueires de trigo linpo de fogaça pella velha.
Por Sam Martinho hũa marraa ou por ella vinte soldos antigos.
Por dia de Natal huum porco cevado ou quarenta soldos antigos
por elle.
Por dia de Pascoa huum boo[m]40 carneiro recebondo ou viinte soldos
por elles com tres queijos.
E as cousas assy aprecadas a dinheiros he escolha no senhor qual
antes quiser se as cousas se os dinheiros por ellas.
[O] qual casal o dicto Afomso Dominguez trage a foro d’antigo e per
carta do senhor novamente feita pera senpre dada quatro dias de Julho
era iiiic çincoenta quatro annos.
[// fl. 18v] [O]utro casal apar do sobre dicto com casas de comer e
celeiro e cozinha41 e cortes e curraes pera gaados que parte com o dicto
Afomso Dominguez da parte do [sic] encabeçado e trageo Joham Ventre
e a no dicto casal estas herdades que se adeante seguem scilicet.
A feeteira hũa coirella d’erdade que parte do soaao com Joham Perez
do Carvalhal e Simom Afomso e da travesia com o dicto Simom Afomso.
Outra coirella no val de Martim Gago que parte d’agiom com Afomso
Dominguez e do aurego com Symom Afomso.
Quatro talhos no mato coutado que jazem em partiçom danbos os
ventos com o dicto Symom Afomso.
Huum talho no val de Paay Gallego que parte d’agiom e aurego com
Bertolameu.
Outro talho no dicto logo que parte d’agiom com Bertolameu e
d’aurego com Symom Afomso.
Hũa coirella a auga do barreiro que parte do soao com Simom Afomso
e d’aurego com Bertolameu.
Outra coirella a so a sobre dicta que parte que parte dos dictos ventos
com Symom Afomso.
Outra no dicto logo que parte do soao com Bertolameu e travesya
com Symom Afomso.
Outra acima d’auga do barreiro que parte aa travesya com Afomso
Dominguez e de soaao com Lucas.
40
41
Reparo nosso.
Corrigido de “cozinhas”.
- 194 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Quatro talhos na Romeadeira que de todos ventos partem com Symom
Afomso.
Hũa coirella no Linho do Corvo que parte do soaao e travesya com
Lucas.
Outra coirella ao Carvalho Landeiro que parte travesya com Afomso
Dominguez.
E soao com Symom Afomso.
Outra coirella ao Chouso das Vacas que parte soaao com Bertolameu
e travesya com42 Simom Afomso.
Outra coirella aas eiras que parte dos dictos ventos com os sobre dictos.
Outra coirella açima das Eiras que parte a travesia com Lucas e aurego
com Simom Afomso.
Outra coirella em o dicto logo que parte ao aurego com Afomso
Dominguez e d’agiom com Simom Afomso.
Outra coirella aa Cabeça Gorda que parte d’aurego com Simom
Afomso e agiom com Afomso Dominguez.
[// fl. 19] Outra coirella no dicto logo que parte d’agiom com
Bertolameu e d’aurego com Lucas.
Outra coirella aas fontes da Tojeira que partem d’agiom com Afomso
Dominguez e do aurego com herdades do filho do ovelheiro.
Hũa coirella na Varzea fundeira que parte d’agiom com chouso de
Bertolameu e d’aurego com Simom Afomso.
Outra coirella acima da sobre dicta que parte d’aurego com Afomso
Dominguez e d’agiom com Bertolameu.
Outra coirella no dicto logo que parte d’anbolos vento com os
sobre dictos.
Outra coirella no dicto logo que parte de todolos ventos com dicto
Simom Afomso.
Outra coirella acima da sobre dicta que parte d’aurego com Lucas e
d’agiom com Bertolameu.
Huum talho apar da dicta coirela que parte com os sobre dictos.
Hũa coirella aa de choca sisos que parte do aurego com Simos Afomso
e d’agiom com Lucas.
Na transcrição consultada encontra-e redigido “oom”. Julgo tratar-se de um
erro de dactilografia, pois não se encontra anotado o respectivo erro. Fazemos nós,
pois, esse pequeno reparo à redacção.
42
- 195 -
Cristóvão Mata
Huum talho na Varzea a so o chouso de Lucas que parte de soaao com
Simom Afomso e travesya com Lucas.
Hũa coirella na Camarinha que parte d’agiom com Afomso Dominguez
e d’aurego com Lucas.
Outra coirella no dicto logo que parte d’agiom com Lucas e dagiom
[sic]43 com Simom Afomso.
Outra coirella no dicto logo que parte d’anbos ventos com Afomso
Dominguez.
Outra coirella no dicto logo que parte d’anbos ventos com Symom
Afomso.
Outra coirella acerca della que parte d’aurego com Afonso Dominguez
e d’agiom com Lucas.
Outra apar della qe parte d’aurego com Bertalomeu e d’agiom com
Afomso Dominguez.
Outra coirella aa carreira de Podentes que parte d’agiom com
Bertolameu e d’aurego com Afomso Dominguez.
Outra ao chao de Maria Martinz que parte d’aurego com Lucas e
d’agiom com Afomso Dominguez.
[// fl. 19v] Outra coirella no dicto lugar que parte de soaa [sic] com
Symom Afomso e d’aurego com elle.
Outra coirella em esse lugar que parte a travesya com Lucas e soaao
com Simom Afomso.
Huum talho na Firmelga que parte d’anbolos ventos com Simom
Afomso.
Dous talhos ao Covom do Carvalhal que partem anbos com Simom
Afomso e Afomso Dominguez.
Huua talho aa carreira de Podentes que parte d’agiom com Afomso
Dominguez e d’aurego com Simom Afomso.
Hũa coirella aos caminhos do gaado que partem d’anbolos ventos
com Simom Afomso.
Hũa coirela aas Figeiras d’Alperrim que partem d’anbolos ventos
com Afomso Dominguez.
Quatro talhos aos sovereiros que som mesturados com outros quatro
de Simom Afomso e parte todos juntos.
43
Substitua-se por “de aurego”.
- 196 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Estas herdades e coirellas talhos som todas regeengas do regengo
do Rabaçal e o senhor ifante ad’aver do que em ellas Deus der em cada
huum anno de dez quinhoes huum como regeengas44 e teiga d’abrão.
45
E como senhorio a novea que som de nove quinhoes o huum.
[A] o senhor mais no dicto casal estas herdades franquidas scilicet.
[H]ũa coirela no Val do Poco que parte d’agiom com Simom Afomso
e d’aurego com caminho puplico.
Outra aos curraes do pexº que parte d’agiom com Joham Perez da
Ferretosa e d’aurego com Gonçalo Martinz carniçeiro.
Hũa coirella aa Goutena que parte de soao com Joham Perez da
Bacorinha e travesya com Afomso Dominguez.
Huum talho d’erdade no Val da Figeira que parte do soaao com penalvo
e da travesya com Joham Perez da Ferretosa.
A mays d’aver o dicto senhor estes foros que se adeante segem e aos
t[en]pos segintes scilicet.
[P]or Sam Joham Bautista dous frangoos com huum alqueire de
farinha peneirada per peneira ante maão e per medida velha.
[// fl. 20] Por Sam Migel de Setenbro dous capoes recenbondos com
viinte ovos e quatro alqueires de triigo pella velha linpo de fogaça.
Por Sam Martinho hũa marrãa ou viinte soldos antigos por ella.
Por dia de Natal huum porco ou quareenta soldos por elle.
Por dia de Pascoa huum boo carneiro reçebondo ou viinte soldos por
elle e tres queijos.
E as cousas assy aprecadas a dinheiros he escolha no senhor qual
antes quiser se as cousas se os dinheiros.
[O] qual casal o dicto Joham Ventre trage a foro per carta do senhor
a ell fecta dada.
[O]utro casal encabecado com suas casas de comer cozinha celeiro
cortes e curraaes de gaados que partem [sic].
Em o qual casal á estas herdades que se adeante seguem scilicet.
[H]uum talho d’erdade no mato coutado que parte da travesia com
herdades de boy velho e do soaao com Joham Ventre.
Hũa coirella no Val da Menanca que parte d’agiom e d’aurego com
Bertolameu.
44
45
Daqui ao fim da frase trata-se de um acrescentamento posterior.
À margem “teiga d’Abraão”.
- 197 -
Cristóvão Mata
Outra coirella ao Val d’Alperrim que parte dos dictos ventos com o
sobre dicto.
Huum talho no ficto logo que parte de todas partes com o dicto
Bertolameu.
[// fl. 20v] Huum talho aa lagoa que parte dos ventos com o dicto
Bertolameu.
Huum chouso na Varzea que parte do soaao com Bertolameu e d’agiom
com Afomso Dominguez.
Hũa coirella nos caminhos aa Varzea que partem d’agiom com Afomso
Dominguez e do aurego com Bertolameu.
Hũa coirella na revolta que parte dos dictos ventos d’aurego com
Joham Ventre e d’agiom com Bertolameu.
[H]ũa coirella aa de Joham Rodriguez que parte d’aurego com Joham
Ovelheiro e d’agiom com Joham Perez.
Hũa coirella nas Fontes da Famelga que parte d’agiom com Bertolameu
e d’aurego com Joham Perez.
Hũa coirella no chaão de Maria Martinz que parte da travesya com
Afomso Dominguez e de soaao com Joham Ventre.
Hũa coirella no começo da Camarinha que parte d’aurego com Joham
Ventre e d’agiom com Symom Afomso.
Outra coirella ao sovereiro da Camarinha que parte d’aurego com
Afomso Dominguez e d’agiom com Symom Afomso.
46
Outra coirella no dicto logo que parte a todos os ventos com
Joham Ventre.
Estas coirellas e talhos d’erdade som todas regeengas do regeengo
do Rabaçal e o senhor ifante ad’aver do que Deus em ellas der en cada
huum anno de dez huum com regeengas e a teeyga d’Abraão.
E como senhorio a novea que som de nove o huum.
À mays o dicto senhor estas herdades franquidas que se seguem scilicet.
[H]uum talho en que avera duas jeeiras e dizem que he espaado e
nom se pode lavrar que parte de soaao com Pedro Afomso e d’aurego
com o sobre dicto.
[// fl. 21] E destas franquidas ad’aver o senhor o quarto do que Deus
em ellas der47.
46
47
À margem “teiga d’Abraão”.
Na margem “4.º”.
- 198 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
E mays estes foros que seguem plla guisa que dam estes outros
casaaes scilicet.
[D]ous frangos por Sam Joham: –––– : ––––.
Huum alqueire de farinha peneirada pella ante maão per medida
velha48.
Dous capoes reçebondos:
Viinte ovos: – : –:.
E quantro alqueries de trigo de fogaça linpo pella velha por
Sam Miguel.
Hũa marraa ou viinte soldos antigos por ella por Sam Martinho.
Huum boo[m] carneiro ou vinte soldos por elle.
Tres queijos por Pascoa.
Huum porco boo[m] ou quarenta soldos por elle por Natal.
E as cousas assy aprecadas a dinheiros he escolha no senhor qual
antes quiser.
[O] qual casal assy encabeçado com suas casas e herdades trage a foro
Lucas morador no dicto logo a foro pera senpre per carta do senhor dada.
[O]utro casal encabecado com suas casas de comer celeiro cozinha
cortes pera gaados que partem [sic].
[E]ncabecado em estas herdades que se adeante segem o qual trage
Bertolameu scilicet hũa herdade em Santa Christina que parte d’aurego
com Lucas e agiom com termo da cidade de Coimbra49.
Na margem “quod sepissime audivi nunc vidi scilicet peneira dante maaão”
e, noutra linha, “he peneyra vella (?)”
49
O Doutor Salvador Dias Arnaut observa que o texto se estende por todo o
fólio 21, o qual acaba por ser rematado com a habitual validação do tabelião. No fólio
21 verso, encontra-se registada a epígrafe do diploma, mas com a particularidade
de ter sido escrita posteriormente. Afirma ainda que, tal como é constatável, o texto
devesse continuar, não obstante ausência de pistas que indiquem o desaparecimento
de folhas, assinalando também a existência de muitos espaços em branco, como
acima se pode comprovar, “que ficaram à espera de total ou parcial preenchimento”
(cf., no artigo, p. 213, n. 4). As considerações finalizam com a sugestão de se concluir
o estudo do manuscrito em questão.
48
- 199 -
Cristóvão Mata
3
Lisboa – 1514, 1 de Junho: Foral novo concedido por D. Manuel à vila
e concelho de Penela.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Livro de Forais Novos da
Estremadura, fls. 98-101.
Foral da villa de Penella per el rey Dom Affomso Anrriquez em
semdo ifante.
Dom Manuel etc.
Mostrasse pollo dito foral ser a terra aforada a foro de jugada scilicet
por jugada de bois se pagassem dous quarteiros de pam, a metade de
trigo e a outra metade de çevada.
E posto que huum lavrador com mais bois lavrasse nom pagasse mais
que os dictos dous quarteiros.
E foram intrepetados [//fl. 98v] os dictos dous quarteiros e vinte e seis
alqueires desta medida. De pam meado scilicet a metade do dicto triguo
e a outra de çevada ou çenteo ou milho se nom lavrar çevada.
E ho seareiro que com bois alheos lavrar de graça ou por dinheiro nom
pagara nenhũa jugada por quanto asy foy justificado que antigamente se
guardava e nos asy ho mandamos que ao diante se faça.
E isso mesmo os que com enxadan ou enxada colherem pam em
qualquer cantidade nom pagarão delle nada.
E posto que açima digamos que paguarão os que lavrarem com bois
dous quarteiros decraramos que isso sera quando per menos nom fezerem
avença com os almoxarifes moordomos ou rendeyros, a qual poderiom
fazer qual quer cantidade sem embarguo do dito foral.
E o pam somente da dicta jugada e nam ho do reguenguo seram
obrigados os lavradores levarem ao çelley<ro>.
Outrosy foy imposto pollo dicto foral que se pagasse per quaaes quer
pessoas que lavrassem hy vinhas e colhesem çinquo quinaaes de vinho,
dessem dous puçaes delle sem mordomo hir por isso ao lagar.
Os quaes çinquo quinaes foram imtrepetados e justificados nos
tempos passados com os senhorios e moradores da terra e determinado
que os çinquo quinaes faziam da medida da terra corrente tres moios e
dez almudes e meyo que fazem dalmudes, çemto e seis almudes e meyo
levando ho moyo corrente em trinta e dous almudes.
E per esse respeito se pagam ora dezaseis almudes correntes pollos
dous puçaaes contheudos no foral. E posto que mais ajam nom hãaode
- 200 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
pagar mais. E se nom chegarem aos çento e seis almudes e meo nom ham
de pagar nenhuum direito do dicto vinho em qual quer outra cantidade
que ho ajam segundo forma do dicto foral.
Vinho50.
E se ho que lavra entemder que tem tamto vinho de que deva pagar os
dictos dous puçaaes nom he nem sera obrigado a requerer ao moordomo
nem rendeiro. E levara ho dicto direito a adegua do senhorio sem mais
outra notificaçam nem dilligençia. E se emtender que nom chegara a tal
numero de vinho pera dever de pagar ho dicto direito, neste caso nom
tirara nenhuum vinho do lagar sem ho primeiro notificar aos ofiçiaaes a
que pertençe sob pena de pagar por aquella vez os dictos dois puçaaes de
vinho sem poder alegar que nom tevera tamto vinho pera os dever de pagar.
E qual quer pessoa que lavrar vinho podera fazer mosto com tamto
que requeira ho mordomo que ho va medir pera justificaçam do mais
vinho que avera e com elle conta pera ho dicto pagamento.
Reguengo de Campores.
E aalem dos direitos de pam e vinho atras declarados, tem a Coroa
Real hy ho Reguengo do Campores sobre os tributos do qual ouve
[//fl. 99] contenda em nossa Corte se deviam de pagar jugada os que
nelle lavrassem pois pagavam delle outro foro scilicet ho dizimo, sobre
a qual cousa vistas as ordenações de nossos regnos e prinçipalmente a
posse immemorial que se prova aver na dicta terra de sempre se levar
e pagar a dicta juguada as pessoas que a ella sam obrigadas pollo dicto
foral sem embarguo de pagarem ho foro do dito reguengo.
Declaramos deversse assy de pagar segundo ho uso e costume em
que sempre esteveram. E isto quando as pessoas a isso obrigadas nom
fezerem avença por menos ho que poderem asy do foro da dicta jugada
como do dicto reguengo.
Teiga dAbraão.
No qual reguengo das novidades que colherem se pagam os direitos desta guisa primeiramente como ho que lavra pam chega a quatorze
alqueires desta medida pagara loguo polla teiga dAbrãao que antigamente
se hy paga, dous alqueires e tres quartas desta medida corrente. Que se
monta per verdadeyra conta e istiva (?) na dicta teigua dAbrãao.
O qual direito se mandou sempre paguar de toda semente que ho
lavrador ouvesse. A qual pallavra foy imtrepetada contra rezam e
50
Na margem direita.
- 201 -
Cristóvão Mata
justiça de a quererem levar de quantas deferenças de triguo ho lavrador
colhesse, dizendo que era cada huũa semente de triguo mourisco
ou galleguo, ou tremes diferente do outro. A qual cousa com nossos
leterados acordamos que se nom deve mais de levar de tal maneira.
Mas determinamos e mandamos que a dicta teigua dAbrãao e os
dictos dous alqueires e tres quartas por ella se pague soomente de hũa
soo semente de triguo, posto que ho lavrador muitas deferenças de
triguo colha e aja. E neste caso ficara em escolha do senhorio reçeber e
aver a dicta teiga em qual quer dos trigos que ho lavrador aquelle
anno ouver.
E per esse respeito se pagara a dicta teiga dAbrãao de cevada,
çenteo, milho painço ou avea. E nom se pagara de legumes quantos quer
quer sejam.
E depois de tirada a dicta teiga dAbrãao de cada huũa das dictas
sementes se recadara e tomara pera nos do monte moor ho dizimo scilicet
de dez huum ante de seer dizimado pera Deus. E nos pagaremos ho dizimo
da parte que ouvermos de cada huũa das dictas sementes.
E nom seram obrigados os lavradores levares ho ho [sic] pam deste
reguengo como dos das jugadas ao çelleiro do senhorio.
Estimos.
E por que somos em forma do que as terras do dicto reguengo sam
estimadas em perjuizo dos lavradores, declaramos que os dictos estimos
nom se deverem de fazer cada vez que algũa terra do dito reguengo se
levar de semear.
Salvo quando a terra que assy leixarem de semear ficar antre a outra
que aquelle anno foy semeada e for tal pera dar proveito como as outras
da folha onde assy ficou por semear e doutra maneira nam.
Salvo se seu dono [// fl. 99v] da tal terra tevesse tal causa de neçessidade ou proveza por onde aquelle anno aleixasse de semear sendo pera
isso requerido por que em tal caso nom lhe sera estimada
E ho senhorio quando tal neçesidade souber a pode dar em nome de
seu dono por aquelle anno na maneira que as semelhantes se costumam
hy de dar pera nom se perder nosso direito. E ho senhorio da propriedade
aver ho mais interesse da vallia.
E os herdeiros e sobçessores desdte reguengo poderão livremente
vender a propriedade e sobçessam que hy teverem a quaes quer pessoas
nam semdo das defesas em direito posto que vivam em outra jurdiçam
sem alguum impedimento que lhe seja posto.
- 202 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Rellego.
Foy reservado ho relego pera ho nosso vinho sobredito. Que se
começara per dia de Nossa Senhora de Março, e durara atee vespora
de Sam Joham Bautista, no qual tempo nenhuũa pessoa da dicta villa
ou termo nom vendera nenhuum vinho na dicta villa sem liçença do
almoxarife nosso ou nosso ofiçial ou rendeiro delle sob pena de polla
primeira vez ou segunda que for achado fazendo ho contrario pagara por
cada huũa vez nove reais pera o relleguo.
E se a terçeira vez vender sem a dicta liçença ser lhe ha emtornado
ho vinho e quebrada a vasilha em que ho tiver.
E as pessoas que no tempo do relleguo quiserem trazer vinho aa dicta
villa a vender de fora do termo della podello ham fazer pagando ao rellego
huum almude de cada huũa carga.
E se venderem ho dicto vinho de fora do termo sem a dicta paga ou
liçença perderão ho dicto vinho. E os ditos nossos oficiaaes nom meterão
no tempo do relleguo nem venderão nenhum outro vinho.
Assy da villa como de fora della, salvo ho que na dicta villa e termo
se ouver dos nossos oytavos ou reguengos, com tal entendimento que
se ho dicto vinho nosso nom abastar os dictos tres meses do relleguo
que loguo em qual quer tempo que se acabar fique em liberdade da dita
villa poder vender seus vinhos quem quiser sem nenhũa pena nem paga.
E se per ventura ho nosso vinho for tanto que se nom possa vender
nos ditos tres meses do relleguo, queremos e mandamos que passados
os ditos tres meses nom se possa mais vender atavernado na dita villa
nem no termo.
E porque somos çertificado que com a venda do nosso vinho se mete
por alguuns ofiçiaaes do relleguo e rendeiros delle outro muito vinho de
que nosos povos sempre agravaram,51 avemos por bem per se isto evitar
que tamto que nossos vinhos forem recolhidos, ajam a vista delles os
ofiçiaaes da camara da dita villa, os quaaes escreverão passado dia dos
Santos em cada huum anno a cantidade e qualidade do dicto vinho e as
vasilhas em que este ver pera se nom poder mais [//fl. 100] outro vinho
com elle meter nem vender.
Acougagem.
E ho direito daçouguagem que se hy levara na dicta villa sera somente
de çervo bravo que matarem hum lombo e de porco montes duas costas.
51
Abertura de parágrafo.
- 203 -
Cristóvão Mata
Celayo.
E pagasse mais na dicta villa per quaaes quer pesoas que na dicta villa
venderem pam amassado posto que de fora sejam pagara cada huũa, huum
pam por cada mes que ho amassar daquelle que comummente fezer pera
vender nam semdo pãao de poyas ou ofertas, ou quando se manda cozer
per constrangimento por que nom pagarão ho dito direito.
Montados52.
Os montados sam do conçelho em toda a terra do termo e limite da
villa, salvo na terra do reguengo.
Na qual por nossa parte se nom levara mayor coyma nem pena aos que
nelle emtrarem sem avença ou liçença da que ho conçelho tever posta nas
suas cousas por suas posturas pollas quaaes isso mesmo ho dicto concelho
usara no montado com seus comarcãaos nos outros limites de seu termo.
Maninho.
E os maninhos isso mesmo sam do conçelho e darseham sem nenhuum
foro pello sesmeiro ordenada, segundo a ley das sesmarias. E no reguengo
se guardara a mesma ley sem se poder acreçentar mais foro, ouvidos
os herdeiros e vizinhos da terra do dicto reguengo quando semelhantes
maninhos no reguenguo se ouverem de pedir e dar pello senhorio do
dicto reguengo a que pertençe a dada delles.
A pena darma se levara per nossa ordenação scilicet dozentos reais e
arma perdida, com as declaraçõoes atras no foral de Mirandaa no mesmo
capitollo.
Dizima das sentenças.
E a dizima das sentenças pella dada dellas se nom levara mais na
dicta villa por que asy foy determinado per nos em nosa Rellaçam com
os desembargadores della.
E levarsse ha a dizima das dictas sentenças quando soomente se derem
aa execuçam e nam doutra maneira.
E de tamta parte se levara a dicta dizima de quanta se fizer a execuçam
della posto que a dicta sentença de mor conthia seja. A qual se nom levara
seja se levou a dizima polla dada della em outra parte.
Tabaliaães53.
E os taballiaães da dicta villa ora sejam muitos ou poucos, ham
somente de pagar em cada huum anno sesenta livras que sam dous mil
52
53
Na margem esquerda.
Na margem direita.
- 204 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
e çemto e sesenta reais contando a trinta e seis reais por livra de seis
çeptys ho real.
Colheita.
E pagasse isso mesmo na dita villa huũa colheita em cada huum anno
a nos por direito real. Segundo particularmente estam asentadas as cousas
della no tombo da dita villa, as quaaes se nom pagam ora hy por quanto
aa custa do conçelho sam feitas huũas tendas pera a feira.
As quaaes sam dadas em pagamento ao senhorio dos dictos direitos
no tempo em que sam pera isso conçertados.
Porem desdagora declaramos que em qual quer tempo que a dicta
colheita se ouver [// fl. 100v] de recadar por nossa parte se pagara
como esta no dito tombo declarada. Com limitaçam que os moinhos
e fornos da dicta villa nom sejam tomados nem inpedidos quando se
nom pagar ao tempo ordenado segundo esta escrito no dicto tombo em
lugar da qual pena ho ordenayro que hy pollo tempo for pague pera a
dita colheita por cada dia em que for negligente nom recadamento della
trinta reais.
E em quanto durar a dicta convença[m] declaramos daverem de pagar
na dita colheita as pessoas de fora do termo ao dicto conçelho a paga em
que eram postas senam ajudaram na despesa das dictas tendas.
Propriedades.
E alem dos ditos direitos e tributos atras declarados sam tambem nossos
e da Coroa Real de nossos regnos as propriedades, terras, herdamentos e
cousas foreiras na dicta villa e termo segundo que particullarmente estam
marcadas e limitadas no dicto tombo com as pagas dellas.
E assy as moendas e aguoas dellas, con as limitaçõoes e pagas no dito
tombo declaradas, segundo ho qual mandamos que ao diante se paguem
como em cada huũa dellas se conthem, salvo se por prazer do senhorio
e das partes em outra maneira sam ou forem conçertados.
Do recadar dos direitos.
E declaramos que os foros sobre dictos de pam vinho e carnes se
emtreguem e recebam desde Sancta Maria de Setembro de cada huum
anno ate ho Natal seguinte, durando ho qual tempo os foreiros nom serão
penhorados nem requeridos pellas dictas pagas. E nom pagamdo atee ho
dicto Natal pagalas ham ao senhorio dos dictos direitos aa mayor vallia
segundo a declaraçam que em taes casos temos feita.
E se os mordomos ou rendeiros dos dictos direitos os nom quiserem
reçeber dentro do dicto espaço em qual quer tempo que lhos levarem
- 205 -
Cristóvão Mata
ficara em escolha do pagador de lhos levar la outra vez. E se lhos nam
quiserem ainda reçeber entregallo ha a huum homem boom per mandado
da justiça a quem mandamos que lho faça emtregar per ho dar ao
mordomo ou rendeiro ou nam os levarem la mais. E as cousas que lhe assy
nom quiserem reçeber pagarem a dinheiro como valliam comuummente
na terra quando da primeira vez lhas nom quiseram reçeber qual mais
antes quiserem sem ficarem obrigados a outra cousa nem emcorrerem
por isso em alguũa pena.
A portagem he tal como ho foral de Leyria atras esta escrito e os
dous capitollos derradeiros scilicet e as pessoas dos dictos lugares e qual
quer pessoa nom se escrevem aquy por que sam jeraaes a todos e taaes
como esta escrito no mesmo de Leyria. Dada em a nossa muy nobre
e sempre leal çidade de Lixboa primeyro dia de Junho do nasçimento
de Nosso Senhor Jhesu Christo de mil e qui-[// fl. 101]-nhentos
e quatorze.
Fernam de Pina ho sob escrevy e conçertey em vinte e huũa folha
menos nove regras com a sob escriçam.
4
Coimbra – 1390, 25 de Abril: D. João I doa a Diogo Lopes Pacheco e seus
descendentes a vila e o castelo de Penela, os respectivos rendimentos,
jurisdição e senhorio.
Dias, João José Alves (Organização e Revisão Geral) – Chancelarias
Portuguesas: D. João I. Volume I, Tomo 2. Lisboa: Centro de Estudos
Históricos, 2006, pp. 197-198.
Doaçoam da villa de Penella e portageens della a Diego Lopez Pacheco.
Dom Joham etc a quantos esta carta virem fazemos saber que nos
olhando e considerando os muitos e stremados serviços que el rey
Dom Afomso nosso avoo e el rey Dom Pedro nosso padre e el rey
Dom Fernando nosso irmaão a que Deus perdoe e nos e os dictos regnos
avemos recebido e recebemos de Diego Lopes Pacheco do nosso conselho
specialmente no tempo em que estes regnos stavam em grandes periigos
e eram corridos e stroydos per el rey de Castella, se ves a estes regnos
donde he natural leixando perder todo aquello que avia pera nos dar
boom conselho pera avermos de reger estes regnos o qual nos sempre
delle ouvemos e querendo lho nos conhecer e gualardoar e remunerar e
- 206 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
fazer graça e mercee o que cada huum rey he theudo de fazer aquel que
bem e verdadeiramente nos serve temos por bem e damos lhe a elle e a
todos seus descendentes de jur d’erdade a nossa villa e castello de Penella
com todos os seus termos reguengos rendas e fructos novos e colheitas
e com todas suas entradas e saidas perteenças e portagens e com outros
quaãesquer direitos e com toda a jurdiçam civel e crime e mero e misto
império e senhorio que nos hi avemos e de direito devemos de aver
reservado pera nos as alcadas das apellacões e agravos que mandamos
que venham aa nossa corte.
E porem mandamos aos morados e pobradores da dicta villa e termo
que o recebam por seu senhor e lhe obedeçam e ho acolham no dicto
logar no alto e no baixo irado e pagado e lhe respondam com todallas
rendas e direitos e rendas per nos colhesem e queremos e outorgamos
que esta doaçom seja firme e stavel e valedoira pera todo o sempre e
pormetemos em nossa fe real a aguardar e nom revogar nem hir contra ella
per nos nem per outrem em nemhũa guisa que seja posto que per direito o
posamos fazer e se o fizermos nom valha e esta doaçom fazemos ao dicto
Diego Lopes e a todos seus descendentes de nossa livre vontade e poder
absoluto e de nossa certa sciencia nom embargando quaãesquer direitos
e leis de emperadores ou dos reis nossos antecesores foros hordenações
husos e outros quaães <todos> anullamos e revogamos e queremos que
nom valham posto que aqui nom sejam expresos is quaães avemos aqui
por nomeados e mandamos que nom ajam lugar em esta doaçam.
E em testimunho desto lhe mandamos dar esta nossa carta.
Dada na cidade de Coimbra XV dias d’Abril el rey o mandou Lourenço
Vasquez a fez era de mil IIIIc XXIII annos.
5
Penela – 1408, 7 de Outubro: Auto da tomada de posse das rendas da vila
de Penela por Afonso Peres em nome do infante D. Pedro.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Livro 4 de Místicos, fls. 30-30v.
Ao inffante Dom Pedro filho del rey estormemto da posse que lhe foi
dada das remdas da villa de Penella per vertude de huũa carta do dito
senhor per que lhe dellas fez doaçam e firmidam.
Saibam quamtos este estormemto vírem como sete dias do mes
d’Outubro era de mill e quatroçemtos e quarenta e seis annos em Penella
- 207 -
Cristóvão Mata
jumto com os paaços del rey estamdo no dito logo Affomsso Vaasquez
juiz da dita villa em presemça de mim Affomss’Eannes o Moço taballiam
pubrico por meu sennhor el rey na dita villa e presemte as testemunhas
que ao diamte sam escpritos.
Peramte o dito juiz pareçeo Afonso Perez escudeiro e criado do dito
senhor rey e escprivam de sua despemssaria e amostrou ao dito juiz e per
mym sobredito tabelião leer fez huũa carta do dito senhor rey signada
per sua maão e seellada do seu seello segumdo per ella pareçia da quall
carta o theor he.
Dom Jolham pella graça de Deus rey de Portugall e do Alguarve a
vos juizes de Pennella e a outros quaaesquer que esto ouverem de veer
a que esta carta for mostrada saude. Sabede que nos demos a Gomçallo
Louremço nosso escprivam da poridade as remdas desse lugar emquamto
nossa merçee fosse e ora he nossa merçee de as nom teer mais e de as
darmos ao inffamte Dom Pedro meu filho.
E porem emviamos alloo [sic] Affomsso Perez nosso críado e escprivam da nossa despensaría pera tomar a posse destas remdas e as fazer
arremdar e recadar pera o dito inffamte segumdo lhe mandamos perque
vos mamdamos que lhe leixedes assi fazer e o ajudedes a ello se comprir e
lhe nom ponhades nem comssemtades sobre ello poer nenhuum embarguo
em nenhuũa maneira. Unde all nom façaades. Dante em Lixboa primeiro
dia d’Outubro el rey o mamdou Martím Vaasquez a fez era de mill e
quatrocemtos e quaremta e seis annos.
A quall carta assy mostrada e lida per mim sobre dito tabaliam como
dito he, o dito Affomsso Perez per poder da dita carta e em nome do dito
senhor inffamte Dom Pedro tomou posse dos paaços do dito sennhor rey
per terra e pedras e telhas e chaves e ervas e de todallas remdas e ditos e
perteemças da dita villa e seu termo assi como os avía o dito Gomçallo
Louremço pera o dito senhor inffamte Dom Pedro assi ditos de pam e
vinho e direitos e todallas outras cousas que aa dita remda perteemçer.
E outrossi requeiro a Vaasquo Martyz allmoxarife da dita villa que
no presemte estava que fezesse poer guarda em todallas cubas e outras
quaaesquer cousas que perteemçam aa dita villa e direitos e remdas dellas
e que as fezesse escprever auum [sic] sobre dito taballíam e escprevam
do dito allmoxarifado e poer em meu livro em tall guisa que o dito senhor
inffamte Dom Pedro aja recadaçam do seu quamdo lhe compryr.
- 208 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
E das quaaes cousas ho dito Affomsso Perez em nome do dito sennhor
Dom Pedro pedio este estormento54 que foi feito na dita villa no sobredito
logo dia e mez e era sobreditas testemunhas que foram Gill Vaasquez
[//fl. 30v] prior de Beellas e Jorge Perez e Affomsso Vaasquez escudeyros
moradores na dita villa e outros e eu Affomss’Eannes o Moço tabaliam
que este estormemto escprevi em que fiz meu sinall que tall he.
6
Lisboa – 1500, 27 de Maio: Carta de doação de D. Manuel I a D. Jorge de
Lencastre, duque de Coimbra, concedendo-lhe as terras do Infantado
de Coimbra, entre as quais a vila e o concelho de Penela.
Sousa, António Caetano de – Provas da História Genealogica da Casa
Real Portugueza. Tomo VI. Lisboa: Na Regia Officina Sylviana, e da
Academia Real, 1748, pp. 1-5.
Dom Manoel per graça de Deos rey de Portugal, e dos Algarves
daquem, e dalém mar em Africa, senhor de Guine, e da conquista,
e navegação de comercio, Etyopia Arábia, Persia, e da Índia. A quantos
esta nossa carta virem, fazemos saber que considerando nos o amor,
e afeição, com que ElRey D. Joam meu primo que santa gloria aja,
nos criou, e como asi nisto, como em todas as cousas nos tratou como
próprio filho, e as mercês, e acrecentamentos que delle recebemos pello
qual somos em muita obrigação de as suas cousas sempre o conhecermos,
e lembrandonos, como delle naõ ficou outro filho senaõ D. Jorge duque
de Coimbra meu muito amado, e prezado sobrinho, o qual nos elle deixou
muito encomendado. E por satisfazermos a obrigação que por todos estes
respeitos temos, folgamos sempre de criarmos, e tratarmos, e honrrarmos
o dito D. Jorge, seu filho meu sobrinho com muito amor, e affeiçaõ como
era razaõ. E agora porque elle he já de idade pera lhe devermos de dar
caza, e fazenda em que elle se possa manter, e servirnos como quem he.
E porque nelle, e nos que delle descenderem dure a memoria de cujo
filho he, e como por respeito das suas muitas virtudes, e grandes merecimentos, e pelas mercês, que delle temos recebidas, e pela divida em que
estes reinos lhe sao polla maneira em que os governou, e defendeo,
asy em lhes adminiftrar justiça, como em todas as outras cousas, que a
54
À direita: “Inffamte”.
- 209 -
Cristóvão Mata
bem destes Reinos pertenciaõ, polas quaes cousas he muita rezaõ
acrecentarmos o dito seu filho, e dotarmos em maneira que a todos pareça,
que satisfazemos a divida que per respeito das sobreditas cousas lhe
temos. E crendo elle he tal que sempre no lo conhecerá, e servira em
tais, e tam liais serviços, como os tais como elle costumaõ fazer a seus
reys, e senhores de que tanta criação, honrra, e mercê recebem, e com a
graça de nosso senhor sempre receberá. E porque elle milhor, e mais
honrradamente possa sofrer, soster, e manter seu estado, e por lhe
fazermos graça, e mercê, nos de nosso moto próprio, certa sciencia,
livre vontade, poder real, e absoluto, temos por bem, e lhe fazemos pura,
e irrevogável doação antre vivos valedoira deste dia pera todo sempre
da villa de Monte môr o Velho com todo seu senhorio, e com a renda do
paõ, e cousas do campo que com as rendas da dita villa andaõ em
arrendamento e da villa de Penella com seu termo com todos os bens
que ElRey D. Joam meu bisavo comprou a Vasco Gil de Pedroso, e a
LourencEanes Caldeira, e a Ruy de Sousa. E o reguengo de Campores,
e o lugar de Pereira com seu reguengo, e a terra, e celeiro de Cegadais,
e a terra e celeiro de Recardais, e a terra de Crastovais e da Ponte
dAlmeara, e o lugar dAbiul com seu termo, e Condeixa com seu limite,
e o castello e terra da Lousã, e o Casal dAlvaro, e a terra dAlbostar que
saõ em Riba dAgueda, e a villa dAveiro com suas leziras, e ilhas de
dentro da foz, e as terras do couto dAvelans de Cima e de Ferreiros,
e do reguengo de Coartella e dArcos, e os lugares de Ilhavo e villa do
Milho e os casais de Saá, e o padroado de Sam Salvador de Miranda da
par de Coimbra: resalvando os padroados de Sam Miguel e da Magdanella
de Monte mòr o Velho e a igreja de Pereira: as quais cousas todas lhe asi
damos pera todo sempre pera elle e seus filhos, e filhas e netos e netas e
todolos outros herdeiros que delle descenderem per linha direita, ou
transversal na forma que abaixo nesta doação sera declarado. A qual naõ
poderá ser entendida mais largo do que nella he conteúdo, nem do que
aquy he declarado: que nos filhos ou filhas netos, ou netas e todos outros
descendentcs do dito duque se aja de entender. As quais villas, terras
julgados e lugares lhe damos, e doamos com todos seus castellos e
reguengos, padroados de igrejas dadas de officios: resalvando os ditos
padroados das igrejas de Sam Miguel e da Magdanella de Monte mòr o
Velho e a igreja da Pereira, e com todas as rendas e direitos, foros, censos,
e emprazamentos tributos, pensoens, fruitos novos que nos em ellas
avemos, e de direito devemos aver pera sempre, por qualquer guisa que
- 210 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
seja. Com todas suas entradas, e saidas, e pertenças, valles, montes, fontes
campos, termos, limites matos, soutos, resios, pacigos, e lugares e montados e portagens e passagens e ribeiros e rios, e pescarias delles, e de mar,
e com todos os reguengos e tabaliados, e pensoens delles, fiquando a
nos, e a nossos soccessores a confirmação dos ditos tabaliados, e serem
scriptos em os livros da nossa chancelaria segundo he de costume, e com
todas as jurisdiçoins de civel, e crime mero mistico império, asi e taõ
compridamente como nos todo avemos e de direito e de feito devemos
aver, asim como elle todo milhor, e mais compridamente pode, e deve
aver. Resalvando pera nos a correição e alçadas, e que o dito duque meu
sobrinho, e seus soccessores abaixo scriptos, ajao as ditas villas, terras,
e lugares, e padroados de igrejas, e todas as outras cousas suso scriptas
e direitos dellas daqui em diante livremente asi na propriedade, como na
posse pela maneira, que se a diante dirá, sicilicet O dito duque em sua
vida, com tanto que as naõ possa dar, nem doar, vender, nem empenhar,
nem em testamento deixar em todo, nem em parte. E falecendo o dito
duque, avendo filhos lídimos, que o filho barão lidimo que for mayor
antre os barões aja, e herde só e pera si todas as ditas villas, terras e
lugares, heranças, cousas, e direitos suso scriptos, pella guifa, e condiçoins
que per nos saõ dadas ao dito duque, e que outro ninhum filho, nem filha,
posto que os hy aja, naõ herdem nem ajao delles parte, e avendo hy outros
filhos ou filhas do dito duque, e netos, e bisnetos, ou outros descendentes
lidimos per linha direita, e masculina do dito filho maior lidimo:
e morrendo o dito filho lidimo maior baraõ em vida do dito duque,
ou depois, que o dito neto barão maior lidimo, herde toda a herança,
villas, terras, e lugares e cousas, e direitos suso scriptos pella guisa que
o herdaria seu padre, se vivo fosse, e outro algum naõ aja parte na dita
herança, villas, terras, e lugares, rendas, cousas, e direitos. E asi descendendo pela dita linha direita lidima masculina do dito filho baraõ maior
descendente e fiquando outros filhos baroins lidimos e filhas do dito
duque, que por semelhavelmente as aja o outro filho baraõ lidimo maior
e sua linha masculina direita segundo que dito he e naõ avendo hy filho
lidimo baraõ do dito duque, nem netos e descendentes pela guisa suso
scripta, que antão as aja a filha maior lidima do dito duque pela maneira,
e condiçoins que dito he. E esta mesma ordenança se guarde nas filhas
do dito duque, e seus descendentes que se guarda nos descendentes dos
baroins com tanto que avendo filhos baroins, ou netos dos filhos do dito
duque, como dito he depois da morte dos que os possuir, herde o maior
- 211 -
Cristóvão Mata
baraõ dos mais chegados ao dito duque e asi vaõ successive pela guisa
e condição susu scripta, e naõ fucceda ninhuã fêmea descendente das
filhas do dito duque em quanto y ouver baroins, e fiquando netas,
ou bisnetas dos ditos filhos ou filhas do dito duque entaõ o aja a mayor
das mais chegadas ao dito duque, e asi entre as fêmeas sempre aja a
successaõ a mayor das mais chegadas ao dito duque com as condiçoins
susu scriptas. E morrendo o dito duque sem descendentes lidimos baroins,
ou fêmeas como dito he: e fendo a sua linha direita extincta asi de baroins,
como de fêmeas, entaõ se tornem as ditas villas, e lugares terras, rendas,
e bens herdados e cousas suso ditas que seus descendentes ouveraõ daver
a Coroa destes nossos reinos. E queremos, e outorgamos, e mandamos,
que daqui em diante sem mais outra autoridade o dito duque e seus
successores per sy e per quem lhe aprouver possaõ filhar e filhem a posse
real e corporal das ditas villas, terras, lugares, e padroados de igrejas,
cousas, e todos os direitos, suso scriptos, e usar delles e dos direitos e
propriedades e jurisdiçoins delles sem nenhum embargo que lhe sobre
ello seja posto. E porem mandamos aos nossos contadores, almoxarifes
escrivains das ditas terras, e comarquas que ora saõ, e forem daquy em
diante, e quaisquer outros corregedores, juizes, meirinhos, e justiças,
e officiais que por nos isso ouverem de ver, que lhe deixem aver, e lograr,
e possuir as ditas villas, terras, e lugares, e direitos e cousas com todas
as rendas, fruitos, novos, e direitos e pertenças delles, e de cada hua
dellas sem ninhum embargo segundo que dito he. E porque alguãs cousas
das sobreditas saõ dadas a alguãs pessoas por cartas e doaçoins dos reys
pasados e nossas ate a feitura desta carta pelos merecimentos das pessoas
que as ouveraõ: estas queremos que se guardem e sejaõ gardadas
inteiramente como nas ditas cartas, e doaçoins se contem. Pero queremos
que quando quer que vagarem, e as tais cartas, e doaçoins, que ate aqui
saõ feitas espirarem que logo por este mesmo effeito fiquem ao dito
duque segundo forma dessa doação, e por virtude della possa tomar,
e tome logo dellas a posse e as aja, e tenha pera si, e seus herdeiros como
dito he. A qual doação lhe asim fazemos naõ embargando quaisquer leis,
direitos civeis ou canónicos nossos, ou de nossos antecessores, e sem
embargo da ley mental, e de quaisquer opinioins de doutores, foros
costumes, statutos, fassanhas ordenaçoins, capítulos de cortes, cartas
sentenças, gerais ou especiais, e determinaçoins que em contrario sejaõ:
porque todas as aquy avemos por expressas, e declaradas, e especialmente
renunciadas posto que em si aja alguã clausula, ou clausulas derogatorias
- 212 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
porque se esta doação em parte, ou em todo possa quebrar, ou em algua
guisa embargar. Porque nos de nossa certa sciencia, e moto próprio,
livre vontade, poder real, e absoluto, revogamos, cassamos, hirritamos,
e annichilamos, e annullamos, e queremos, que naõ valhaõ posto que
aqui naõ sejaõ escriptas. As quais nos de nossa certa sciencia, e poder
absoluto aqui avemos por expressas, e especificadas, e mandamos que
naõ ajaõ lugar nessa doação: nem lhe possaõ empecer em parte, ou em
todo, antes queremos que a dita doação seja firme, e valiosa pera sempre
sem ninhum mingoamento como dito he. E em testemunho de todo
mandamos fazer esta carta por nos assinada e assellada do nosso sello
do chumbo. Dada em a nossa cidade de Lixboa a 27 do mes de Mayo.
António Carneiro a fes. Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesu
Christo de mil e quinhentos annos. Nos ElRey fazemos saber que nos
mandamos riscar nesta doação a palavra que nella esta riscada onde se
lia passagens, e riscoua por nosso mandado o chanceller mor. Porem sem
embargo de assi estar riscado, praznos que fe de direito as ditas passagens
fe ouverem, e deverem de levar nas villas, e lugares na dita doação
conteúdos, ou em cada hum delles, elle dito duque as leve, e mande
arrecadar, como se nella naõ fosse riscado, e estivess viva a dita palavra.
E mandamos que assi fosse aqui asentado e declarado em esta doação
ao pe della, por este nosso alvará. Feito em Lisboa a vinte de Março.
António Carneiro a fez anno de mil e quinhentos e hum.
7
Santarém – 1442, 20 de Novembro: Criação da feira franca de São Sebastião na vila de Penela pelo seu senhor, o infante D. Pedro55.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Chancelaria de D. Afonso V.
Livro 23, fl. 47.
Dom Afonso a aquantos esta carta virem fazemos saber que nos avendo
por nosso serviço e bem da nossa terra damos poder e lugar ao ifante
As alterções inseridas entre parêntesis rectos são adaptações feitas a partir da
consulta da cópia do documento inserta na confirmação dos privilégios da feira por
D. Manuel I em 1497 (vide abaixo documento 10). Tal comparação permitiu-nos
corrigir determinados erros, como é o o caso da data da fundação da feira, tradicionalmente situada em 1440, e que agora se corrige. De resto, outras alterações foram
feitas após a consulta daquela versão, mas que, tendo-nos servido de auxiliar de
leitura e não de complemento às partes ilegíveis, não foram distinguidas deste modo.
55
- 213 -
Cristóvão Mata
Dom Pedro meu mui prezado e amado tio e padre nosso tutor e regedor
e com ajuda de Deus defensor por nos de nossos regnos e senhorio que
elle mande fazer e se facaa daqui em diante em cada huum anno em a
sua villa de Penella hũa feira franqueada a qual se comece vespora de
San Sabastiom e durara tres dias seguintes e acabarsea no dia seguinte
depois do dia de Sam Sabastiom. A que nos mandamos que todos aquelles
que a dicta feira vierem conprar e vender quaeesquer cousas que sejam
os que as que as hy trouverem avender e se hy avenderem asy os que
as avenderem como os que coonpram nom paguem mais que a meetade
da syssa posto que os que as ditas coussas conprarem ou venderem
sejam moradores na dicta villa de Penella ou em seu termo ou em outras
quaeesquer partes que sejam. E esto se nom emtemda em vinhos que se
vendam [atabernados nem em carne que se] venda atallo que mandamos
que destas duas cousas se pague syssa em cheeo. Outrosy mandamos
que [os que que as ditas feiras vierem] que lhes nom sejam tomadas suas
bestas de sella nem d’albarda pera nemhũas carregas que sejam nem
elles nom sejam [costragidos] per nemhuum servidor enquanto a dicta
feira verem e em ella andarem e pera suas cassas tornarem. E outrosy
mandamos que nemhuuns dos que as feiras [vierem] no sejam pressos
nem acusados nem demandados pera nemhuuns malaficios em que sejam
culpados se os malaficios [forem daqueles] em que nos mandamos que se
guardem os coutos dos estremos salvo se esses malaficios forem fectos
no dicto lugar e seu termo [ou feitos novamente] <na> dicta feira que
por taees malaficios como estos mandamos que sejam pressos e se livrem
per seu direito. Outrosy mandamos que os [que a dita feira vierem] nom
sejam çitados nem demandados pera nemhũas dividas que devam nem
por erancas nem per outra nenhũa cousa a que seja [theudos] e obrigados
salvo se forem divudas d[e] cousas que hy conprarem ou venderem na
dicta feira. Outrosy mandamos que os que a dicta feira veerem enquanto
a dicta feira durar elles possam trazer suas armas. Outrosy posam andar
em a d[ict]a feira em quaeesquer bestas que lhes prouger [sic] nom
embargando nossa defessa e hordenaçom que em contrrario desto he
fecta. Outrosy mandamos e defendemos aos nossos correrradores [sic]
meirinhos asi da nossa [corte] como dos nossos [regnos] que nam vaam
a dicta feira pera fazerem correicom nem a facam em ella e se elles
quiserem hiir que vaão por comprar e vender se [lhes aprouver] e nom
pera outra nenhũa cousa. E em testimunho dello mandamos ser fecta
esta carta synada per nos e sellada de nosso seelo pendente. Dada em
- 214 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Santarem xx dias de Novembro per autoridade do dicto senhor ifante
Pedro [Affomso] Annes a fez ano de [mil iiiic] Rii.
[Assinado] Ifante Dom Pedro.
8
Lisboa – 1455, 24 de Maio: Capítulos apresentados por Dinis Afonso e
Pedro Anes Cão, procuradores da vila de Penela, às cortes reunidas em
Lisboa no ano de 1455 e seguidamente aprovados pelo rei D. Afonso V.
ANTT – Chancelaria de D. Afonso V. Livro 15, fls. 139v-140.
Capitollos especiaaes de Penella.
Dom Afomso per graça de Deus rey de Portuguall e do Algarve e
senhor de Cepta aquantos esta carta virem fazemos saber que os juizes
vereadores procurador e os homeens bons da villa de Penella nos
envyarom certos capitullos per Denis Afonso e Pedro Annes Cam seos
procuradores das cousas que aa dicta villa perteençam e vistas per nos
ao pee de cada huum lhes mandamos poor nossas repostas das quaes o
theor he este que se segue. Rei.
Primeiramente senhor veemdo o iffante Dom Pedro que Deus aja ao
tempo que della foy senhor como se ha dito do apredaçom (?) ordenou
fazersse em ella em cada huum anno duas feiras scilicet hũa por dia de
Sam Miguell de Setembro e a outra por dia de Sam Sebastiam avendo
pera ello privillegios de elrey nosso padre cuja alma Deus tem e nossos
por tres dias scilicet vespera e dia e ho seguinte dia e porque senhor este
tempo he pouquo porque aa vespera veem e nom vemdem cousa algũa
e ao dia nom vemdem por ordenamça atee sairem de missa e procissom
e purgaçom assy que nom faca mais dias em dia e iiiº pera vemderem
pidimos aa Vossa Alteza que nos outorgue que sejam bi dias __ avemdo
avemdo [sic] estes meesmos privilegios em elles.
Respondemos que nos praz estemder os dictos privilegios pera outros
tres dias e assy sejam per todos seis dias e esto enquanto nossa merçee for.
Outrossy senhor em a dicta villa ha ___ beesteiros de numero treze,
o qual numero foy fecto no tempo em que em ella vyvia muita gente e
agora ha tres ou quatros beesteiros e nom mais e avemdosse agora de fazer
as que migua seraa aazo de se despovrar pidimos vos senhor por merçee
que mandees que vista a necesidade sobre dicta que da que aviste a vos
se nom façam beesteiros de conto e quamdo senhor a vosso serviço for
- 215 -
Cristóvão Mata
compridoiro todos seram beesteiros e prestes pera vosso serviço como
cada huum milhor puder. Rei.
A esto respomdemos que nos praz que o dicto numero de treze se
torne ora a seis e esto enquanto nossa merçee for.
Outrossy senhor em a dicta villa ha mui pequenas rendas e a milhor
cousa que tem assy he quanto ou trage casaaes na serra do Spinhall que
com outros boons remdem em cada huum ano dous mill e quinhemtos
reais e por estes casaaes seeram milhor pobrados e aproveitados e
arremda mais molltipllicas pidimos vos senhor por merçee que taa dous
que ajam em todo e per todo tamanho privilegio como ham os casseeiros
encabeçados dos vossos vassallos. Rei.
Respondemos que vollo outorgamos segundo pedis quaes por vos
fazer mercee. Rei.
[// fl. 140] Outrossy senhor a dicta cidade he muito minguada de boom
regimento e a prinçipall rezom he por quanto de cotesom em elles juizes
vereadores procurador e almotacees os offiçiaaes sobre que se devem
poher vereaçoões e almotaçaria scilicet alfayates tecelaães ferreiros
jornalleiros e outros semelhantes e leixam os estados e homeens que sem
semelhantes offiçios vivem honestamente per seos beens os quaes por
bem dos offiçios vossos e do conçelho que teem nom querem consentir
que se sobre seos offiçios vereaçoões nom se ponha almotaçarias,
e posto que se ponha nom a quem comprir nem executem do que ao nosso
poboo he gramde trabalho, pidimos vos senhor por merçee que allguem
que tever offiçio sobre que se deva poor vereaçom e almotaçaria por
boom regimento da terra, nom aja offiçio vosso nem do conçelho scilicet
juiz nem vereador nem procurador e almotaçell e os dem aos estados e
homeens que sem offiçyos semelhantes e vivem honestamente per seos
beens e sera vosso serviço e homrra da terra.
Respondemos que requeiraaes esto ao procurador da comarca
quando fezer os pellouros dos offiçiaaes ao qual mamdamos que ponha
nos dicto offiçios aquellas perssoas que vir que sam pera ello pertencentes
e os de vos de guisa que a terra seja bem regida e esto dos estados assy
como dos offiçiaaes segundo elle sentir por mais nosso serviço e bem
da terra. Rei.
Outrossy senhor sabera vossa merçee que o iffante vosso tyo que
Deus aja pos relliquias de Sam Sebastiam na igreja de Sam Miguell da
dicta villa, e des que aly forom postaas ataa o tempo da sua morte sempre
continuadamente de dia e de noite estava hũa alampada açesa aa sua custa,
- 216 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
aa quall todo o anno abastava vi alqueires d’azeite que pode valler iiº ou
iiiº reais. Seja vossa merçee que aa omrra do virtuoso santo que assy ho
mandees fazer ao vosso almoxariffe per vossas remdas que em a dicta
villa aveis. Respomdemos que nos praz que a dicta alampada seja açesa
aa nossa custa e mandamos ao almoxariffe que de pera ello azeite atee
os dictos vi alqueires segundo requeres e mandamos aos comradores que
lhos levem em despesa. Rei.
Dos quaes capitullos os dictos procuradores nos pidirom por merçee
que lhe mandassemos dar o trellado com nossas repostas porque se
emtediam dellas d’ajuda, e vysto per nos seu regimento mandamos
lhes dar em este caderno de duas folhas scpritas. E porem mandamos
a todollos corregedores juizes e justiças a que esto pertencer que lhes
comprem e guardem e façam bem comprir e guardar em todo os dictos
capitullos segundo he contheudo em nossas repostas sem outro embargo
que huuns e outros a ello ponhaaes. Dada na cidade de Lixboa xxiiii dias
de Mayo Gonçalo Gill a fez ano do nacimento de Nosso Senhor Jhesu
Christo de mill iiiic Lb annos.
[Assinado] Rei.
9
Lisboa – 1455, 24 de Maio: D. Afonso V confirma o privilégio concedido
pelo infante D. Pedro ao concelho da sua vila de Penela.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Chancelaria de D. Afonso V.
Livro 15, fl. 140.
Dom Afonso etc. a quantos esta carta virem fazemos saber que por
parte do concelho e homees boons da nossa villa de Penella nos foy
apresentada hũa carta que lhes foy dada per o iffante Dom Pedro meu
tyo que Deus aja sobre allguns agravos que os moradores da dita villa
recebiam do comcelho da cidade de Coimbra. Daquella carta o theor
de verbo a verbo he este que se segue. Juizes e homeens boons da villa
de Penella o iffante Dom Pedro vos envyo saudar façovos saber que eu
falley a elrey meu senhor sobre os agravos que reçebeis do concelho de
Coimbra em vos envyarem presos e degrredados e outras cousas nom
embargadas que per hi nom seja caminho direito pera omde ham d’hir
e o dicto senhor manda que quando elles ouverem d’emvyar cada hũa
destas cousas, se elle estever em Lixboa ou em Santarem que hũa ho
- 217 -
Cristóvão Mata
envyem per hi e a outra pello Rabaçall e se o dicto senhor estever em
Leirea ou em Obidos ou em Torres Vedras, ou em outro luguar contra
aquella parte que os envyem caminho de Leirea e nom per essa villa e
porem eu vos mando que se o dicto senhor estever em Lixboa, ou em
Santarem que se lhes reçeberdes hũa vez que lhes nom reçebaaõ a outra
ataa que envyem outra vez per o Rabaçall. E se o dicto senhor estever
em cada huum dos outros luguares que amda que os hi mandem que
os nom reçebaaõ e os que reçeberdes he forçado que os entreguees em
Tomar porque a raynha minha senhora tem deste liberdade o comcelho
d’Alvayazere e no caminho nom ha outro luguar que seja abastante
pera receber presos nem degrredados empero se vos teendes scprituras
ou liberdades que sejam contra esto emvyaaras que mostrar. Scprita em
Torres Novas xbi de Setembro Joham de Lyxboa a fez. Pidindonos por
mercee o dicto concelho e homeens boons que lhes comfirmassemos
a dicta carta, a qual vista per nos querendolhe fazer graça e mercee
teemos por bem e comfirmamoslhe segundo ella he contheudo. E porem
mandamos a todollos corregedores e juizes e justiças dos nossos regnos,
e a quaes outros oficiaes e perssoas a que este pretecto esta carta for
mostrada que a comprem e guardem e façam bem comprir e guardar
em todo compridamente como em ella he contheudo e lhe nom vaão
nem consentam lhe contra ella em maneira allgũa. E all nom façades.
Dada na cidade de Lixboa xxiiiiº dias de Mayo Gonçalo Gill a fez anno
do Senhor Christo de mill iiiic Lb.
[Assinado] Rei.
10
Estremoz – 1497, 8 de Fevereiro: Confirmação dos privilégios da feira
franca de São Miguel.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Livro 1 da Estremadura,
fls. 104v-105.
Ho concelho da dita villa de Penella outra carta da feira que se começa
vespera de Sam Miguel de Setembro que dura iii dias seguimtes com
[a limitação das liberdades] (?) que tem que lhe a ella vem:
Dom Manuel etc. aquantos esta nossa carta virem fazemos saber que
por parte da villa de Penella nos foi apressentada huũa carta del rey Dom
Eduarte que tal he:
- 218 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Dom Eduarte polla graça de Deus rei de Portuguall e do Alguarve
e senhor de Cepta auantos esta carta virem fazemos saber que avemdo
por nosso serviço e __ da nossa __ damos poder e __ e luguar ao iffamte
Dom Pedro me<u> irmaão que sobre todos amo e prezo que elle mamde
fazer e se faça daquy em diamte em cada huum anno em a sua villa de
Penella huũa feira framqueada a qual se comecara vespera de Sam Miguel
de Setembro durara tres dias segui[dos] ___ ao dia seguimte depois do
dia de Sam Miguel a que nos mamdamos que todos aquelles que ha dita
feira vierem comprar e vemder quaesquer coussas que sejam hos que ahii
trouverem a vemder e se hii vemderem asy hos que as vemderem como
os que as comprarem nom paguem mais que a metade da sissa posto que
hos que as ditas coussas comprarem ou vemderem seja moradores na
dita villa de Penella ou em seu termo ou em outras quaesquer partes que
sejam. E esto se nom entemdam em vinhos que se vemdam emtabernados
nem em carne que se vemda atalho, que mamdamdos que desta duas
coussas se paguasse em cheo sisa,
Outrosi mamdamos que os que ha dita feira vierem que lhes nom sejam
tomadas suas beestas de seella nem d’albarda pera nenhuuũas carregas
que sejam nem elles nom sejam costrangidos pera nenhuũa __ emquanto
a dita feira vierem e em ella amdarem e pera suas cassas tornarem.
Outrosy mandamos que nenhuns que aa dita feira vierem sejam presos
nem acusados nem demandados por nenhuuns mallefiçios em que sejam
culpados se hos mallefiçios forem daquelles em que nos mandamos que
se guardem hos coutos estremos salvo se esses mallefiçios forem feitos
em o dito lugar e seu termo ou feito novamente na dita feira que por taes
mallefiçios comoe stes mandamos que seja pressos de sairem por seu dito.
Outrosy mandamos que hos que a dita [feira vierem] nom sejam
citados nem demandados por nenhuũas dividas __ por eramça nem ___
[//fl. 105] nenhuũa coussa a que sejam theudos e obriguados salv se
forem dividas que devam de coussas que hii comprarem ou vemderem
em a dita feira.
Outrosy mamdamos que os que ha dita feira vierem emquamto ha dita
feria durar elles possam trazer suas armas emquamto ha dita feira durar.
Outrosy possam amdar em a dita feira em quaaesquer bestas que
lhes prouver nom embarguamdo nossa defesa e hordenaçoom que em
comtroo desto he feita.
Outrosy mandamos e defemdemos aos nossos corregedores meirinhos
assy da nossa corte como dos nossos regnos que nom vaão aa dita feira
- 219 -
Cristóvão Mata
por fazer correiçam nem a facam em a dita feira. E se elles quiserem hyr
vaão comprar ou vemder se lher prouver e nom por outra nenhuũa cousa.
E em testemunho desto mamdamos dello seer feita esta carta assynada
per nos e asseellada do nosso sello pemdemte. Dante em Samtarem a vi de
Dezembro el rei o mamdou Martim Gonçallvez a fez era do nasçimento
de nosso senhor Jhesuu Christo de mil e iiiic e xxxiii annos.
Pidimdonos a dita villa de Penella que lhe comfirmassemos ha dita
carta e visto per nos seu requerimento e queremdo lhe fazer graca e
merçee temos por bem e lha comffirmamos asy com declaraçom que nom
amdarom em mullas nem facas aquelles que a dita feira vierem. E assy
mandamos que se cumpra e guarde imteiramente. Dada em Estremoz a
viii dias de Fevereiro Vicente Pirez a fez anno do nasçimento de nosso
senhor Jhesuu Christo de mil iiii noventa e vii.
11
Estremoz – 1497, 13 de Fevereiro: Confirmação por D. Manuel I dos
privilégios da feira franca de São Sebastião, realizada anualmente
na vila de Penela.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Livro 1 da Estremadura, fls.
103v-104v.
Ho dito concelho da villa de Penella outra carta de feira que se comeca
vespera de Sam Sebastiam e dura tres dias seguintes a limitaçam das
liberdades que ham ___ aquelles que a ella vierem.
Dom Manuel etc. aquantos esta nossa carta virem fazemos saber que
por parte da nossa villa de Penella nos foy apressemtada huũa carta del
rey Dom Affomsso meu tyo, cuja alma Deus aja da qua ho theor tal he
como se adiamte segue.
Dom Affomso per graça de Deos rey de Purtugual e do Algarve senhor
de Cepta aquantos esta carta virem fazemos saber que nos avemdo por
nosso serviço e bem da nossa __ damos poder e licemça e luguar aho
ifamte Dom Pedro meu muito prezado e amado tyo e padre nosso tutor
e regedor e com ajuda de Deus deffemssor por nos de nossos regnos e
senhorio que elle mamde fazer e se faça daqui em diamte em cada huum
anno em a nossa villa de Penella hũa feira framqueda.
Ha qual se começara vespera de Sam Sebastiam e durara tres dias
seguimtes e acabar-[//fl. 104]-seha no dia seguimte depois do dia de Sam
- 220 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Sebastiam. A que nos mamdamos que todos aquelles que ha dita feira
vierem comprar ou vemder quaaesquer coussas que sejam hos que hy
trouverem a vemder e se hy vemderem assy hos que os vemderem como
hos que hos comprarem nom paguem mais que a metade da sissa posto
que hos que has ditas coussas comprarem ou vemderem sejam moradores
na dita villa de Penella ou em seu termo ou em outras quaaesquer partes
que sejam.
E esto se nom emtemda em vinhos que se vemdam atabernados nem
em carne que se vemda atalho que mamdamos que destas duas coussas
se pague sissa em cheo.
Outrosi mamdamos que hos que has ditas feiras vierem que lhe nom
seja, tomadas suas bestas de seella nem d’albarda pera nenhuũas carregas
que sejam nem elles nom sejam costrangidos e em ella amdarem e pera
suas cassas tornarem.
Outrosy mamdamos que nenhuuns dos quaaes aas ditas feiras vierem
nom sejam pressos nem acussadoas nem demamdados por nenhuuns
mallefiçios em que sejam culpados se hos mallefiçios forem daquelles
em que nos mandamos que se guardem hos coutros do estremo salvo se
esses mallefiçios56 mallefiçios [sic] forem feitos no dito lugar e seu termo
ou feito novamente na dita feira que por taaes mallefiçios como estes
mamdamos que sejam pressoas e se livrem per seu direito.
Outrosy mamdamos que hos que ha dita feira vierem nom sejam
çytados nem demamdamos por nenhuuas dividas que devam nem por
eramças nem por nenhuua outra coussa a que sejam theudos e obrigados
salv se forem dividas de cousas que hu comprarem ou vemderem na
dita feria.
Outrosy mamdamos que hos que ha dita feira vierem emquanto a dita
feira durar elles possam trazer suas armas.
Outrossy possam amdar em ha dita feira em quaaesquer bestas que
lhe prouver nom embarguamdo nossa deffesa e hordenaçom que me
comtrairo desta he feita.
Outrossy mandamos e deffemdemos aos nossos corregedores
merinhos assy de nossa corte como dos nossos regnos que nom vaam ha
dta feira por fazer correiçam nem a façam em ella. E se elles quiserem
hyr que vaão por comprar e vemder se lhes aprouver e nom por nenhuũa
outra coussa.
56
Tem um traço por cima.
- 221 -
Cristóvão Mata
E em testemunho dello mamdamos ser feita esta nossa carta assynada
per nos e assellada deo nosso sello pemdente. Dada em Samtarem a
vymte dias do mes de Novembro per autoridade do dito senhor iffamte
Affomso Annes a fez anno de mil iiiic Rii.
Pidimdonos ha dita villa de Penella que lhe comffirmassemos
[//fl. 104v.º] ha dita carta e visto per nos seu requerimento e queremdolhe
fazer graça e mercee teemos por bem e lha comffirmamos asy e pella
guisa e maneira que se em ella comtem e assy mamdamos que se cumpra
imteiramente sem outra duvida. Dada em Estremoz a xiii dias de Fevreiro
Vicemte Piriz a fez de mil e iiiic e novemta e sete.
12
Lisboa – 1498, 6 de Janeiro: Outorga de novos privilégios às feiras de
São Miguel e de São Sebastião da vila de Penela pelo rei D. Manuel I
a pedido do conde de Penela.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Livro 1 da Estremadura,
fl. 132.
A villa de Penella carta perque as duas feiras feiras que se em cada
huum anno fazem em a dita villa tenham vimte dias de framqueza scilicet
dez de cada huũa com os seis que lhe ora sam acresçemtados:
Dom Manuel etc. a quantos esta nossa carta virem fazemos saber que
per nos assy pareccer nosso servimco e nobreza da villa de Penella ha
qual desejamos em alguũa maneira acreçemtar e bem assi por fazermos
mercee ao comde da dita villa meu muito amado sobrinho que nollo por
ella emviou requerer temos por bem e nos praz que homde a feira que
se na dita villa faz duas vezes no anno tem por privillegio doze dias de
framqueza scilicet seis dias em cada huũa feira que aguora daqui em
diamte tenham ambas as ditas feiras quatro dias a que lhes ora novamente
mais acreçemtamos pera maneira que seja agora oito duas em cada huũa
das duas feiras.
Esto assi com aquelles privillegios, liberdades framquezas que foram
dadas e apropiadas aos que vemdessem e comprassem demtro nos seis
dias que assi a cada huũa das ditas feiras foram apropiadas.
E porem mamdamos ao nosso comtador em a dita comarca e a
quaaesquer outros nossos officiaaes e pessoas a que esta nossa carta
for mostrada e o conhecimento dello pertemceer que assi ho compram
- 222 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
e ho dito comtador mande esto loguo assi preguoar pera que a todos
seja notoreo a refformaçam destes mais dous dias em cada huũa feira
ha maneira que dito he. Dada em nossa cidade de Lixboa a seys dias de
Janeiro Framcisco de Matos a fez anno do nasçimemto de nosso senhor
Jhesu Christo de mil iiiic LRviii anos.
13
Lisboa – 1642: Capítulos especiais do concelho de Penela apresentados
às cortes de 1642 reunidas em Lisboa.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Aclamações e Cortes, Cortes,
Maço 9, número 12, fls. 445-447v.
Anno 1642.
Cortes de Lisboa
Capitulos especiaes da villa de Penella offerecidos nas ditas Cortes
ao Senhor Rey Dom Joaõ 4º.
Apontamentos que faz a villa de Penella nestas Cortes de seiscentos
quarenta e dois.
1. Primeiramente pede a Camera que se lhe defira aos capitulos
particulares das Cortes passadas porque pois elles tratam do do [sic] real
serviço de Vossa Magestade e sua perpetuaçaõ a aumento justo, hé muy
conveniente que Vossa Magestade com o mesmo cudado trate delles
considerando que com o aumento dos vassalos se perpetuam os reynos.
2. Tambem pede a villa de Penella que na [// fl. 445v] dita villa avia
duas feiras que se faziam por dia de Saõ Miguel de Setembro e dia de
Saõ Sebastiaõ em Janeiro estas estaõ perdidas e se naõ fazem hoje.
Pedem a Vossa Magestade que as franquee por tempo de vinte annos livres
de siza e que nos dias que se fezerem naõ aja mercado sete legoas ao redor
e passados os vinte annos fiquem rendendo para a Coroa considerando
que isto que pedem hé em notorio proveito da Coroa porque hoje naõ vem
gente às feiras nem emportaõ couza alguã à Coroa pello descustume de
muitos annos cauzado com os apertos de direitos e com esta franqueza e
liberdade acodirá muita gente e muitos mercadores e tornaraõ as feiras a
ser como dantes que no tempo antigo andaram já arrendadas em seiscentos
mil reiz para a Corôa e hoje naõ rendem cousa alguã.
3. Tem a dita villa huãs seras que criaõ muitos paos de carvalho e
outras boas madeiras que saõ do conselho e de particulares e com notavel
- 223 -
Cristóvão Mata
perda e dano as cortam e furtam de noute. Pedem a Vossa Magestade
ordene que os juizes ordinarios em cada hũ anno tirem devassa geral
quando tiram as devaças gerais e perguntem [// fl. 446] nellas tambem
contra os que cortam, furtam, vendem e levam para fora e se proceda à
prizaõ e condenaçaõ contra elles como ladroez que saõ.
4. Os moradores da dita villa fizeram hermida no rocio della da
invocaçaõ de Saõ Joaõ Baptista. Pedem a Vossa Magestade que no
dito dia se possa fazer feira no dito lugar livre de siza por tempo de
dez annos.
5. A villa de Penella tem hũ lugar e aldêa sua a que chamaõ Hespinhal
e os mecanicos do dito lugar contribuiam sempre para a procissaõ do
Corpo de Deos da dita villa como fazem todaz as aldeias da dita villa e
suas cabeças. Todavia agora de proximo ouveraõ provizaõ com a qual se
eximira[õ] desta contribuiçaõ com fundamento dizer que tem lá confraria
do Santissimo Sacramento e que fazem sua procissaõ no mesmo dia. Pede
a Camera que esta provizaõ se naõ guarde porque foy avida com poder
de valia contra o direito publico e comum que naõ premite que a parte
degenere do seu todo e que a sua procissaõ e festa a facam em diferente
dia e que acudaõ com sua obrigaçaõ e contribuiçaõ pessoal à villa sua
cabeça como [// fl. 446v] o fazem em todo o reyno.
6. Que tem a villa de Penella duas estradaz publicas e gerais para
esta corte e todo o reyno pellas quais passaõ duas ribeiras e porque naõ
tem pontes ha nellas muitos perigos principalmente no Inverno e para
remedio hé necessario que no lugar do Hespinhal se fação duas pontes
e nas Vendas dos Moinhos dous arcos e ao lugar do Duque outro arco.
Pedem a Vossa Magestade assim o ordene e lhe mande passar para isso
provizaõ considerando que hé negocio este de grande importancia e
utilidade publica e serviço de Vossa Magestade por quanto por aly se
provem as fronteiraz.
7. Que a Camara e villa de Penella anda muy carregada de cabeçaõ e
igualada às mayorez da comarca sendo que a dita hé mui pobre e naõ te[m]
trato algum e depois do dito lancamento foi sempre cahido em grande
pejoramento por falta das ditas duas feiras que assima pede na primeira
addiçaõ, razaõ por onde se lhe deve defirir a dita primeira addiçaõ ou
abater a metade do dito cabeçaõ.
8. Pedem a Vossa Magestade ordene que os [// fl. 447] officios da dita
villa sirvam os proprietarios e naõ andem de serventia porque hé grande
o dano que o povo nisso padesse.
- 224 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
9. Ultimamente tem a villa pella ribeira ao lagar da Mizericordia hum
atalho por onde os pasageiros deixaõ a estrada da villa em grande dano
della. Pedem a Vossa Magestade ordene que o dito atalho seja coimeiro
para que os pasageiros passem pella villa.
Em tudo receberaõ mercê.
Procurador da villa de Penella, Gaspar do Rego Evangelho.
Resposta aos ditos capitulos.
1. Atté gora se naõ acharaõ os capituloz do anno passado reformando
os, vos mandarei defirir.
2. Hey por bem de vos conceder a feira franca que pedis por dia de
Saõ Miguel por tempo de sinco annos de que se vos passará provisaõ.
3. Sobre as arvores dos particulares tem provido a Ordenaçaõ dando
lhes faculdade para das suas querelas e sobre as do concelho hey por
bem [// fl. 447v] que na devassa de Janeiro perguntem os juisez pelos
que cortaõ arvores do conçelho pelo pé alem das penas, das posturas e
acordos do concelho.
4. Naõ há que defirir a este capitulo.
5. Naõ avendo provisaõ assinada pela maõ real hey por bem que se naõ
guarde e que se cumpra o que neste cazo está disposto pela Ordenaçaõ.
6. Precedendo às diligencias ordenadaz pela ley do anno de seiscentos
sobre as pontes vos mandarei defirir no Desembargo do Paço
7. Sobre as feiras está defirido no capitulo dois e sobre o encabecamento
das sisas naõ há por hora que defirir emquanto em geral se naõ tratar de
redusir a igoaldade à repartiçaõ do reino.
8. Alem do que está disposto pela Ordenação neste caso assi o tenho
mandado de novo por minhas provisões.
14
Chão de Couce – 1759, 15 de Abril: Memórias paroquiais da fregueias
de Chão de Couce.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Dicionário Geográfico de
Portugal. Tomo 10, pp. 2027-2030.
Chão de Couce.
Senhor.
Na provincia da Beyra Baixa bispado de Coimbra comarca da notavél
villa de Thomár termo das Sinco Villa de Sua Alteza e Serenissimo Infante
- 225 -
Cristóvão Mata
o Senhor D. Pedro fica e pertence esta freguezia de Chão de Couce, cabua
das Sinco Villas de Chão de Couce.
E sendo, como he, senhor desta villa o Serenissimo Senhor Infante;
como a igreja se acha edificáda no termo da villa de Penélla comarcaã a
esta de Chão de Couce, o apprezentante hé o reverendo prior da igraja
colegiada de São Miguel da dita vila de Penélla por ser huma das annexas
à dita igreja; e o donatário do dito priorado he o Duque de Aveyro.
E supposto he villa, tem em si quarenta vezinhos com os seus familiares e filhos são duzentas pessoas, e toda a freguezia te duzentos,
e dezouto fogos, e pessoas de ambos os sexos e de toda a qualidade,
são novecentas, outenta, e duas.
Esta villa está situada em campina, da qual se descobrem tres
freguezias, Maçaãns de Dona Maria; Ajuda e Avellar; quê cada huma
destas e de huma a outra dista meya legoa.
Esta freguezia tem termo se, que em si comprehende a villa com
seu pelourinho, casa da camara, e mais tres lugares, ou aldeas, que são
Villa Pouca, que tem dés vezinho, Relvas que tem outo, Cabecinho,
que tem doze.
A parochia esta fora desta villa junto á mesma, e no termo de Penella;
em si comprehende tres termos, como hé o de Penella com quinze aldeas,
e só hum lugar chamado Serra do Mouro, como são Fonte, Lameyrão,
Figeira; Camaros; Lameyras, Casál de Bayxo, Pedra do Ouro parte do
Cabecinho, parte da Ameixieyra e Alqueidão; Pouza Flores com o casál
do Soeiro, e a outra parte da Ameixieyra; Chão de Couce alem dos lugares
supraditos conthem em sy quatro quintas como são a do Serenissimo
Senhor o Infante, a da Amieyra, a Chama da Monta do Lobo, e a de
Mouta Bélla.
A igreja parochial desta freguezia tem por orago[// fl. 2028] Maria
Santissima com o singullar titulo da Consolasão, tem em sy quarto
altáres, no principál se venera a mesma senhora com imagem, e quadro,
e se ácha o sacrario, onde existe o augustino sacramento eucharistico.
Em os dous colatraes o da parte do Evangelho se venera a imagem
de Christo Senhor Nosso em hum corcifixo e no mesmo altár da parte da
espistolla se venerão em suas imagens de vulto o senhor São Luis Rey
de França, e o senhor São Sebastião; e na parte do evangelho se venérão
em suas imagéns de vulto a Senhora Santa Castarina e São Remualdo e
da parte da epistolla o altár em que se venera o Devino Espirito Sancto
e na mesma parte da epistolla o senhor São Brâs na sua imagem de
- 226 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
vulto, e do Evangelho o senhor Caetano da mesma sorte, e no simo se
acha hum painel das almas. E desta mesma parte está o quarto altar,
em que se venera Maria Santissima com o prodegiozo titulo das Nives
em huma venerada imagem de vulto. Nesta freguezia há trés irmandades,
a do Santissimo Sacramento, a do Divino Espirito Sancto, e a de
Nossa Senhora da Consolasão.
O parocho desta freguezia he vigario collado por apprezentação do
reverendo prior de São Miguel da villa de Penella; o seu rendimento se
acha lotado em sessenta mil réis.
Esta freguezia tem em sy seis ermidas: a saber quatro no termo de
Penélla como hé São Jorge no lugar das Rélvas, Santo Antonio no lugar
da Serra do Mouro, Nossa Senhora da Nazareth do lugar do Alqueidão
e Nossa Senhora do Rozario no lugar da Ameixieyra; no termo de
Pouza Flores a de São Francisco no Cazal do Soeyro; e neste termo
de Chão de Couce Nossa Senhora do Rozario na quinta de Sua Alteza;
a administração destas capellas pertence aos povos que das tais se
costumão sacramentár, excepto a de Nossa Senhora do Rozario desta
villa, que pertence a administração della ao Serenissimo Senhor Infante
D. Pedro aonde costuma concorrer muita gente nos sabbados das
Quaresmas, como tambem a de São Jorge no seu proprio dia, e a de
Nossa Senhora de Nazareth em quatorze de Agosto.
A mayor abundancia de frutos que se produzem nesta tera são trigos,
azeites e vinhos.
Esta villa tem juis ordinario posto por Sua Alteza [// fl. 2029] com
pelourinho, e caza de camara, e he cabeca de camara das Sinco Villas
de Chão de Couce do Serenissimo Infante Senhor D. Pedro, e por isto
tem o juis privilegio de levantar vara de ouvidor em todas estas sinco
villas em auzencia do proprietário, que tem rezidencia no paco do
mesmo senhor.
Esta terra floreceo no tempo que nella vivia o Excellentissimo Duque
de Caminha, que faleceu na aclamação do memoravél rey o senhor
D. João o quarto, que Santa Gloria hája. Não tem correio costumão
recorrer ao de Figueiro dos Vinhos, que dista legoa, e meya tãobem esta
terra dista à cidade capital de bispado, que he Coimbra, seis legoas, e a
de Lysboa capital deste reyno, vinte e outo.
No terramoto do primeyro de Outubro de mil setecentos sincoenta,
e sinco nãosucedeo nesta freguezia ruina digna de memoria, e menos,
que necesitase de repáro.
- 227 -
Cristóvão Mata
Nos maes interrogatorios não ha cousa de que se posa ou se dev fazer
menção que haja nesta freguezia. E por verdade me asignei. Chão de
Couce Abril 15 dias 1759.
[Assinado] O vigario António Bottelho Negro.
15
Cumeeira – 1758, 20 de Maio: Memória paroquiais da freguesia da
Cumeeira.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Dicionário Geográfico de
Portugal. Vol. 11, pp. 2501-2503.
1 Satisfazendo ao que se me ordena, eu o padre Cypriano Ferreira
vigario na ygreyja da Comieyra, digo ao primeiro interrogatorio do
folheto junto que este lugar da Comieyra fica na provincia da Beyra
Bayra, he do bispado da cidade de Coimbra comarcha da notavel villa
de Thomar, e termo da villa de Penella, hé cabeça desta freguesia a que
pertencem os lugares que abayxo iraõ declarados.
2 Hé este lugar, e os mais da sua freguesia do excellentissimo duque
de Aveyro, que ao presente hé Dom Jozé Mascarenhas, exceto hum
amoito que tem dentro em sy, os lugares da Venda das Figueyras, Caneve,
Louriceyra, a metade do Pé da Ladeyra, que se chama a Ordem de
São Jorge, que hé do colégio do Espirito Santo da cidade de Evora.
3 Tem este lugar quarenta, e nove moradores, e cento e quarenta e
quatro pessoas, e os mais lugares todos da freguezia tem duzentos e vinte,
e nove moradores e outocentas, e outo pessoas.
4 Está cituado em húm alto de que se descobre meia legoa em
redondeza, e mais em algumas partes, com outros menos, e avistace para
a a Poente, parte do lugar de Figueyras Podres, a metade que hé desta
freguezia entre o Sul Nascente e o lugar do Castello que esta no simo da
villa do Avelar, huma das sinco de Cham de Couçe, terras de Sua Alteza;
para o Nascente o lugar da Venda das Figueyras, Caneve e Louriceira,
Favacal, ente o Nascente o Norte o Cazazal [sic] Novo, Azanha, Gagos,
e Sam Paullo todos desta freguezia.
5 Nam tem termo seu, porque hé do termo da villa de Penella.
57
No topo da folha encontra-se anotado e riscado “N. 117”, emendado abaixo
por “364”. Tem ainda escrito, na mesma zona, “Comieyra termo Penella comarca
Thomar BC”.
57
- 228 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
6 A parochia esta junto ao lugar para a parte norte delle tem a freguesia
este lugar da Comeyra a metade do de Figueyras Podres que fica ao
Poente o da Cabeça Redonda que fica hindo do Poente para o Sul, o do
Pé da Ladeyra, Venda das Figueyras, Caneve, Louriceyra que ficam aos
Nascente, o Favacal, Bouçaõ, Grocinas, Gagos Sam Paullo, que ficam
alguma couza do Nascente para o Norte e Venda dos Moinhos, Azanha,
e Cazal Novo, de Viavay que ficam mais para o Norte ainda que naõ
chegaõ bem a elle, junto do qual para a banda do Norte.
[// fl. 2502] 7 O orago da igreja hé o martir Saõ Sebastiam tem exceto
o altar mor sinco altares, hum das Almas, outro de Santo Antonio,
outro de Nossa Senhora que ficam na parte esquerda, hum do Senhor
Jezus, outro do sacramento que ficam ao lado direyto, tem hũa só nave,
e duas irmandades huma das Almas, outra do Senhor Jezus.
8 O parocho desta igreja hé vigario aprezentado pello prior de Saõ
Miguel da villa de Penella, a que está anexa, e a renda que tem sam
outenta alqueyres de trigo, e vinte e sinco almudes de vinho, o pé de
altar hé incerto.
9 Nam tem beneficiados.
10 Nam tem convento algum de frades, nem de freiras.
11 Nam tem hospital.
12 Nam [tem] Caza de Mezericordia.
13 Tem as ermidas seguintes huma de Nossa Senhora da Encarnaçam
entre Figueyras Podres, e Cabeça Redonda fora dos ditos lugares que
que [sic] pertençe aos povos delles; tem a de Santo Antonio da Venda
das Figueiras que está dentro dos lugar, e hé do povo delle, a de Nossa
Senhora do Ó que pertence aos moradores do lugar da Caneve esta fora
delle para a parte do Norte: a de Sam Marcos do lugar de Venda dos
Moinhos que está dentro delle pertençe aos moradores do mesmo a de
Sam Bernardo da Azenha que hé particular do senhor da quinta aonde
está: a de Santo Aleyxo que pertence ao povo do lugar das Gorceiras está
fora delle para a parte do Poente, a da Senhora do Socorro que pertence
aos moradores de Bouçaa está junto ao dito lugar para a parte do Norte:
a de Sam Romam que está no lugar da Louriceyra, hé de hum letrado
que ahi mora que a mandou fazer junto das suas cazas.
14 Nam vem romagem às ditas ermidas em parte alguma do anno só
se hé nos dias dos santos algum pouco vezinho.
15 Os fructos que recebem, digo recolhem em mais abundancia os
moradores desta freguezia, sam trigo, os da Comieyra, Figueiras Podres,
- 229 -
Cristóvão Mata
e Cabeça Redonda, que sam terras mouriscas, e fogozas, digo fragozas
que de Inverno criam; os dos mais lugares, o mais que recolhem hé trigo,
por sem as terras delles mais frescas, ou maçaas, porque sam galegas,
e em huma, e outra parte recolhe mediano azeite e vinho.
16 Nam tem juis ordinario, nem Camara, porque hé sugeyto o povo
desta freguesia ao juis de fora, e Camara da villa de Penella.
[// fl. 2503] 17 Nam hé couto, nem o mais que se dis neste interrogatorio.
18 Nam há memoria que della houvesse homens que floreçessem
nem de que se fassa assinallada lembrança, ainda que tem sahido muitos
religiozos, clerigos, e letrados.
19 Nam há feiras.
20 Nam tem correyo, e se servem do de Alvayazere, ou Figueiró dos
Vi [sic] Vinhos que dista duas legoas, ou de Coimbra que dista sinco.
21 Dista esta freguezia de Coimbra sinco legoas, que hé cabeça do
bispado, e de Lisboa cabeça do reyno, trinta legoas.
22 Nam consta tenha privilegios, nem o mais que se dis neste
interrogatorio.
23 Nam há fonte celebre na terra, nem o mais que se dis neste
interrogatorio.
24 Nam há porto de mar.
25 Nam há terra murada, nem há nella o mais que no interrogatorio
se dis.
26 Nam padeçeo ruina no terramoto de 1755 pella bondade [de]
Deos nam tendo que dizer aos mais interrogarios, e o que tenho dito hé
verdade que afirmo eu o padre Cypriano Ferreira vigario na igreja de
Sam Sebastiaõ da Cumieira que esta fiz escrever, e asniey [sic] aos 20
de Mayo de 1758.
[Assinado] O vigário Cypriano Ferreira.
16
Lagarteira – 1758, 21 de Maio: Memórias paroquiais da freguesia da
Lagarteira compostas pelo vigário Caetano Rodrigues.
ANTT – Dicionário Geográfico de Portugal. Tomo 19, fl. 53-54v.
Senhor58.
58
No canto superior direito: “Lagarteira. Termo de Penella e Thomar”.
- 230 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Esta freguezia da Lagarteira cita na provincia da Beira comarca de
Thomar termo de Penella da qual vila vam as cauzas apuradas, para a
villa de Montemor o Velho, das quaes vilas he donatario o Escelentissimo
Duque de Aveiro o senhor Dom Joze Mascarenhas. Tem esta frequezia os
lugares seguintes; os dos Casaes da Povoa tem quinze fogos, nos quaes
ha quarenta, e nove pessoas entrando neste numero os de menor idade.
Outeiro dos Cazaes huns 15 fogos e pessoas outo. Coelhoza desesseis com
secenta e seis pessoas. Val da Figueira hum fogo pessoas duas. Portela
fogos honze nos quaes ha pessoas quarenta. Carrascos fogos nove pessoas
quarenta e seis. Mouta, e Igreija fogos outo, pessoas trinta. Lagarteira
de Sima fogos nove, pessoas trinta e nove. Lagarteira de Baixo fogos
sete, pessoas vinte e tres. Vale fogos quatro, pessoas desasete. Posso
Manchinho hum fogo, pessoas seis. Estalagens fogos dois, pessoas honze.
Pião fogos treze, pessoas sincoenta e sinco. Cazal dos Barrozos fogos
tres, pesoas des; Machial fogos seis pessoas nove. Todos os sobreditos
lugares estam em linha dereita de norte a sul. Tem mais esta freguezia
outro lugar que chamão Cursial de Sam Bemto este he da jurisdicaõ
do couto de Vale de Todos termo, e comarca da cidade de Coimbra.
Tem fogos vinte e dois, pessoas setenta e duas.
Estam os ditos lugares em altura mediana as agoas que chovem nesta
freguezia correm as que nacem digo as que chovem a parte do nascente
para o rio Duêca o qual se mete no Mondego; hũa lago asima de Coimbra
no citio que chamão Cea; e as que chovem na parte de poente correm a
hum ribeiro que chamão das Mattas, o qual corre de norte ao sul e se vai
metter na ribeira de [// fl. 53v] de Ancião; a qual se vay a vila de Thomar
ao rio chamado Nabam o qual tem seu principio nas agoas que chovem
nesta freguezia por serem as mais distantes que correm para o dito rio.
Neste freguezia da Lagarteira não naçe agoa algũa de Verão ou Inverno
so quando o Inverno he grande naçem algũas fontanheiras que en fazendo
sol outo dias fevecem e os povos della dabem de possos e fontes de fora.
Desta freguezia se descobrem a serra de Sam João da Chouchada,
o monte do Ves, a serra de Sicó e a de Alvaazer do adro da igreja nos
dias claro[s] se descobre a vila de Ourem, e a serra de Minda.
O orago da igreja desta freguezia he o patriarcha Sam Domingos
colocado na capela mor, na pate direira que he a parte do Evangelho,
e na parte esquerda que he da Epistola esta colocada Nossa Senhora
do Rosario, entre as sobre ditas imagens está colocado o Santissimo
Sacramento no seu sacrario. Do arco cruzeiro para baixo estam outras
- 231 -
Cristóvão Mata
duas capellas huma do senhor Jesus Crucificado, imagem mui oznerada
na qual tem, nam so esta freguezia, mas en todas arendondar as de
tres legoas, e mais posto a confianca de conseguir agoa, quando se la
tem necessidade para o que se fás huma solegne, devota, e penitente
procissam, na qual vau a sobredita imagem desta capela, á Aljaza aonde
esta nove dias na capela da Senhora do Rosario, o qual lugar, e capela
he da freguezia do Alvorgue do mesmo bispado; e he tal a devocam,
nam so desta freguezia da Lagarteira, mas tambem das circunvizinhas,
que em todo o tempo dos nove dias esta a dita capela de [// fl. 54] Nossa
Senhora cheia de gente, de todo se tal ser la que ___ as mulheres a hora
que podiam, e tambem os homens desocupados, e os que sam ocupados
van de noute cantando tersos, e com quaes penitencias, nos caminhos
desta freguezia, e de outras se bem por muntas vezes tapado homens,
as rastos da noute, no caminho desta grande porsicam se para por huma
vargea a que chama de Aljazede e he tradicam antigua, que no anno que
se das a porsicam a tal vargea produz abundantes frutos no anno de mil e
setecentos e sincoenta e tres quando esta imagem com sua porsicam vinha
da capela de Nossa Senhora ao sahir da dita capela foi tanta a agoa que
choveo que inundou a sobredita vargea, e ao passar de la sabado ajuntar ce
grande quantidade de andorinhas, que voando acompanharam a porsicam
por hum, e outro lado, fazendo seo curso encostado a dita porsicom com
grande armonia, cazo que nam so cauzou __ mas tambem devocam, e
grande __ a todo o povo, que passiava __ pessoas. Tem sucedido muntas
vezes que apenas se publica esta porsicom, logo se tinham os astros __ a
chover pera munta devocam, que ha a esta imagem em Malinas, e Alicois
grandes se tem munta gente se tem offerecido a ella e esperimentado
logo o seo remedeo. A outra capela e mediata a sobredita ainda nam tem
imagem alguma, por se terem feito todas as quatro capelas de novo todas
pela mesma medida, e arquitetura, os mais dos votos e que se consagra
esta a sagrada fami[lia] Jesus Maria Joze. Nam ha nesta igreja mais do
que huma irmandade do Divino Spirito Santo de [// fl. 54v] de trinta
irmaõns, na capela da Santissima Trindade. Esta igreja he vigayraria, que
apresenta o prior da colegiada matris de Sam Miguel de Penella e tem
de congrua outenta alqueires de trigo, e vinte e sinco almudes de vinho.
Tem esta freguezia dentro no lugar da Coelhoza huma irmandade de
Santo Antonio.
Tem outra no lugar do Piam junto ao logar na parte do norte esta ha
da Senhora dos Remedio.
- 232 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
No lugar do Cursial tem outra de Sam Bento esta está junta ao moinho
lugar na parte do nascente.
A porducam desta freguezia he bastante azeite, trigo, legumes, e bom
rendimento de landa por ter bastantes carvalhos.
Vinho maduro.
Esta sogeita as justicas de Penela por ser do seo termo.
Dista da cidade de Coimbra sinco legoas no sul.
Dista esta __ de Lisboa trinta legoas.
E por verdade me asinei hoje 21 de Mayo de 1758 anos.
[Assinado] O vigário Caetano Rodrigues.
17
Espinhal – 1758, 5 de Junho: Memórias paroquiais do lugar e freguesia
do Espinhal.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Dicionário Geográfico de
Portugal. Volume 14, pp. 475-488.
Relaçam da freguesia do Espinhal59.
Em comprimento do que por parte de Suma Magestade Fidillissima
se me ordena, respondo aos interrogatorios incertos no extracto junto,
entendo o que dis respeito á este lugar e freguesia do Espinhal com a
individuação seguinte que he constantemente notoria, e me contou por
informaçoẽns verìdicas.
O lugar do Espinhal fica nos confins da provincia da Estremadra
deste reyno de Portugal pertençe ao bispado de Coimbra, he comarqua
de Tomar, e termo da villa de Penella.
E como esteja dentro dos estados da caza de Aveyro de que <he>
donatario o excelentíssimo duque mordomo mor á este he que pertençe.
Tem esta freguezia trezentos e quarenta e sinco fogos, nos quais
comprehende mil cento e vinte almas de sacramento, e só o lugar se
compoem de cento e sessenta e quatro fogos e seis centas almas, e os
mais estam espalhados pellos lugares de que se compoem a dita freguezia.
Está situado em hum piqueno valle sobre lage firme que a todo o
lugar serve de pavimento e isto junto a rais de uma alta serra, chamada
À volta desta linha tem, por cima, anotado “N. 70” e, por baixo, “termo
Penela comarca Thomar”. Tem mais uma pequena anotação entre esta informação
e a primeira linha do documento, todavia, imperceptível.
59
- 233 -
Cristóvão Mata
do Amparo, e dos Milagres, cercando-a pella parte do Sul ao Nascente
em continuaçam the fixar na formosa serra da Estrela.
Descobrem-se deste lugar humas povoaçoẽns pouco numarozas
pertencentes a outra freguezia que lhe ficam nas margens de huma ribeira
em pouca distancia, como tambem seis quintas particulares a qual ribeira
discorre pella parte do Nascente como em seo lugar se dira, e a villa de
Penella que fica eminente em hum monte para [// fl. 576] o Poente em
distancia de mea legua.
A parochia esta dentro do mesmo Espinhal e a freguezia comprehende
vinte e sette lugares, e aldeias chamados o Ryo do Alexandre, Ribeira
de Asenha Valle do Gago, Carvalhal, Asenha do Raynho, Pumar, Pouza
Folles Concelhos, Faio, Fetais, Louçainha, Atalhada Velha, Baiantes
de Sima, Baiantes de Baixo, Rolicas, Traquinas, Sylveira, Pardieiros
de Sima, Pardieiros de Baixo, Torna Leites, Esguio, Pedigueiro, Fonte
Pedinte, Pizam, Pé do Esquio, Ribeira do Trilho, e Trilho, os quais
lugares só tres chamados o Cabo d’Aldeia, Rio do Alexandre, e Ribeira
da Azenha e sam situados junto do dito Espinhal, e os mais espalhados
pellas serras de que fis mençam.
O orago da parochia he o invicto martir Sam Sebastiam, o templo
em que esta colocado tem duas naves levantadas com quatro arcos por
banda de pedra de cantaria, e outras tantas columnas bastantemente
groças em que os mesmos se sustentam de boa pedra perfeitamente
obrada.
Tem sete altares os quais descorrendo pella parte direita he o primeiro
da invocassam de Nossa Senhora do Rozario, o segundo do Devino
Espirito Santo, o terceiro do Santissimo Sacramento, o quarto que he a
capella maior de Sam Sebastiam, o quinto de Nossa Senhora das Neves,
o sexto do Senhor Jesus, o septimo de Sam Pedro, Santo Andre e Sam
Paullo, que he particullar, e pertençe ao vincollo que adi-[// fl. 277] [sic]
que admenistra Joam Thomaz de Abreu Corte Real das quais so dous
sam o do Devino Espirito Santo e do Senhor Jesus se acham em nichos
a fronte da parede do dito templo ornados com fronte espicios de pedra
lavrada, e com caixilhos de talha de madeira dourada com vidraças, e os
mais em cappellas de abobada, e arcos de pedra ornados tanto pella parte
de dentro como nos fronte espicios da mesma pedra excepto digo espicios
com feguras de santos em vulto e bustos feitos da mesma pedra; excepto
o tecto da cappella maior que he fabricado de madeira e painelado com
pinturas e floroens de ouro.
- 234 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Tem esta parochia duas irmandades huma do Santissimo Sacramento,
e outra da Senhora do Rozario, as quais se acham unidas, e foram erectas,
e confirmadas pello ordinaro com statuttos que observam.
Tem mais outra irmandade de Nossa Senhora do Terço com statuttos,
e confirmaçaõ do ordinario cuja festa se soneliza em outo de Sepptembro.
E suposto que esta freguezia tivesse seo principio por curato, com tudo
há mais de outenta annos a esta parte que esta na posse de ser vigairaria
collada, cuja aprezentaçam toca ao prior de Sam Miguel da villa de
Penella, e rende hum anno por outro cem mil reis.
Tem este lugar tres cappellas publicas suposto sejam de pessoas
particulares, das quais huma chamada de Senhora da Guia que [// fl. 478]
esta nas cazas do dezembargador Manoel Pereira da Silva lente de leis e
colegial do Colegio Real de Coimbra, sita na rua da Graça, he pertencente
ao vincollo que o mesmo admenistra.
Outro de Saõ Joam Evangelista sita na rua chamada de Saõ Joam
defronte das cazas que foram de Francisco Barreto de Menezes,
pertencente a outros erdeiros.
A terceira que he de Nossa Senhora de Nazare sita ahonde chamam
a quinta do Engenho he de Bartholomeu Jozé da Costa e da Mesquita e
se acha contigua a sua caza.
E álem destas cappellas particullares hé mais tres publicas huma
do Santo Christo, outra de Santa Luzia e a terceira sobre hum aconte
na parte do Nascente para a qual se sobe por mais asetenta degraos
de pedras com seus patins, chamada de Santo Antonio do Calvario,
lugar em que esta a acçam se executa quando se fas a procissam dos
Santos Passos cujas capellas ficam no principio das ruas mais principais
por que se entra para este lugar.
Os moradores desta terra os frutos que com mais abundancia se
colhem sam azeite, e vinho, e dos mais generos nam he tam abundante
por falta de largueza, por ser piquena a circumferencia da mesma. E alem
do referido he abundantissimo de frutos espiciais de toda a qualidade,
tanto em pumares que tem nas margens do rio que se fartelizam com as
agoas do mesmo como seco.
E como este lugar he termo de Penella esta sugeito ao governo das
justicas da mesma villa.
[// fl. 478] A memoria indubitavel que ha dos homens que desta terra
sahiram, e neste reyno e suas conquistas foram egregios em letras e
vertudes sam os seguintes.
- 235 -
Cristóvão Mata
Dom frey Fellis de Faria relegiozo de Santo Antonio que foi bispo
nos estados da America, a cuja dignidade foi promovido pella sua grande
vertude e literatura e nam me foi pocivel indagar o nome do bispado
pella antiguidade.
O reverendo doutor Francisco de Quintanilha promotor que foi
do tribunal da Legacia nesta corte, cuja literatura foi conhecida
de muntos pontifices da Igreja da qual se conservam memorias no
sobre colegio.
O reverendo doutor Jozé Frerei de Faria vigario capitullar e governador
do bispado de Coimbra á qual ocupaçam foi promovido pella sua grande
literatura, e boa intençam exercendo este governo muntos annos, e nelle
fes turno a sua vida.
Os reverendos padres mestres Estanislao de Faria, e seo irmam Marçal
de Faria religiozos jezuitas que tanto no seo tempo floreceram naquella
sagrada religiam em letras e virtudes que os veneravam como oracollos
das sciencias promovendo os as maiores dignidades della.
O reverendo doutor Antonio Vaz conego magistral da Cathedral de
Faro no reino do Algarve, de cuja dignidade se fes merecer pella sua
virtude e literatura.
O dezembargador [// fl. 480] Luis Matozo Pastana em cuja ocupaçam
falleceo em hum lugar de Agravos na Relaçam de Lisboa.
O reverendo doutor Joam Rodrigues Nello de Carvalho graduado
na sagrada religia[õ] que por molestias deixou a vida laburioza da
Universidade de Coimbra deixando ao mesmo tempo a todos hum pleno
conhecimento da sua vertude e sciencia pella qual ainda se venera o
seo nome.
Os reverendos doutores Joam de Quintanilha e Marçal de Faria que
foram douctos nas sagradas letras, e na predica os homens mais egregios
do seo tempo dos quais ha viva lembranca nesta e mais provincias.
Os doutores Simam de Campos, Joham Rodrigues Costodio, e
Francisco dos Reis graduados na arte de Medicina em que occupavam os
primeiros lugares na fama e fortuna, e entre elles o ultimo com ventagem
que se numera apelidando o por Ealeno do seo tempo muntos lentes da
Universidade de Coimbra nas consultas que lhe faziam.
Manuel Pereira da Sylva lente de Leis na Universidade de Coimbra,
dezembargador da Relaçam do Porto, e colegial do Collegio Real em
quem attenta a vertude, sciencia, e [// fl. 481] e circunstancias de que
se reveste, espera esta terra que he sua patria ter hum grande professor.
- 236 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
E alem dos referidos muntos religiosos de vertude e letras nas
religioens monachaes, e mendicantes deste reyno.
E ultimamente muntos menistros que serviram e servem actualmente
a Sua Magestade Fedelissima nos lugares.
Tem esta terra hum mercado em todos os Domingos do anno excepto
no da Paschoa que dura poucas horas, ao qual acodem as gentes das
serranias e lugares com vezinhos, e ainda da mesma villa de Penella, a
proverem-se de generos, e viveres para seo sustento; he franco e tam antigo
que nam ha noticia do seo principio, e supoem se que por ser por este
lugar estrada real, e ferquentada aos soldados da goarniçam das praças da
Beira e da mesma provincia e Tras os Montes para a cidade de Lisboa e
provincia do Alentejo se introduzio para estes se proverem, e as estalagens.
A distancia que desta feira há a cidade de Coimbra capital deste
bispado sam quatro legoas piquenas e a corte de Lisboa capital do reyno
trinta legoas.
Entre as fontes que há nesta [terra] e freguezia nam há mais que huma
memoravel junto do lugar do Carvalhal que bem lançando em todo o
Inverno agoa, logo que se apropincoa o Veram a faz com tanta abon[sic] [// fl. 482] abondancia perenemente em toda aquella estaçam que
com esta se regam muntas terras, e da mesma se vallem os habitadores
para beberem por ser excellente, e nos fins do Outono suspende a sua
corrente the ficar no estado antigo. O terremoto que nesta terra se sentio
naquelle memoravel dia de Todos os Santos do anno de mil setecentos e
sincoenta e sinco, suposto teve a duraçam de sinco minutos, e com a sua
intençam abalava fortemente os edeficios, com tudo como este aballo e
comossam foi por equilibrio sem desigualdade pella bondade de Deos
foi das terras e freguezias mais bem livradas porque nam lhe causou
ruina consideravel, pois so a parede direita da cappella maior do templo
tem huma fractura da qual se pode seguir damno nam a reparando e a
huma pedra do arco da nave esquerda lhe estalou hum pedaço que nam
cauza defeito; e a torre por ser mais antiga que o templo padeceo ruina
consideravel ficando com aberturas irremediaveis, rezam por que se
cuide na sua reedificassam.
Os nomes principais das serras junto das quais esta situado este
lugar chamamçe dos Milagres, do Amparo, do Esquio, de Torna Leites,
dos Malhadizes, e da Sylveira, as quais estam emlaçadas humas com
outras tendo por davixas seis grandes [// fl. 483] grandes [sic] valles,
alem de outros mont[e]s extensos, e todos munto fragozos.
- 237 -
Cristóvão Mata
A principal serra de que estas dimanam he a alta serra chamada de
Sam Joam no60 dezerto do Conxello, em que se devide a freguezia sem
que a ella pertença, e asseveram ser continuada com a serra Morena de
Espanha em linha recta the a chamada da Gata que fexa no mesmo reyno
pella parte do Norte.
Na rais deste grande monte e serra do Conxello esta colocada naquelle
dezerto junto a rais do monte huma ermida de Sam Joam Baptista,
que nam ha noticia de quem a mandasse fazer, e suposto esteja na freguezia
de Santa Euphemia de Penella, como tudo os moradores deste lugar tem
posse imemorial de hirem buscar aquelle santo para na igreja do mesmo
lhe fazerem preçes pedindolhe sol ou agoa quando dela nascessitam,
e ainda para aplacar quais quer doensas de contagio, ou eppidemicas no
que tudo recebem grandes favores daquelle santo obrando prodigios e
milagres evidentes e de nenhuma outra parte, nem da freguezia em que
esta o procuram, ou tem posse de o tirarem daquella cappella em que
esta para o louvarem.
No seo dia que he ha vinta e quatro de Junho acode aquelle dezerto
em romagem munta gente, e vam ao mesmo algumas freguezias
em procissam.
O ryo que passa junto deste lugar [// fl. 484] lugar [sic] <chamaõ
Louçainha>, descorrendo pella parte do Nascente ao Sul, tem o seo
nascimento aonde chamam o Covam dos Ovilheiros no termo da villa de
Miranda do Corvo huma legoa distante deste lugarm e toma o seo maior
incremento no valle chamado do Conduzendo, e em outras funtanheiras
porque passa.
Princepia outra ribeira chamada do Trilho a que serve de devisa do
primeiro ryo a serra do Amparo, na rais da alta serra dos Malhadizes
junto ao lugar de Torna Leites correndo direita do Nascente ao Sul,
a qual se incorpora com o primeiro no fim deste lugar no sitio chamado
das Pontes, onde tomam o nomeda Cabrella, e da hi descorrendo para o
Norte com outra que topa fora da freguezia chamado o ryo Dueça, entram
no ryo Seira e todos no Mondego de Coimbra.
Os lugares que estam situados na serra sam os de que ja fiz mençam.
Os valles e meias costas daquellas serra, cultivam se pellos seos
habitadores semiando nellas milho groso, painço, centeio, fajoens que lhe
Na margem direita da folha encontram-se anotadas as iniciais que parecem
ser “SB3” e ainda “Serra”.
60
- 238 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
perduzem com abundancia princippalmente sendo a estaçam do Veram
calmoza por serem as terras sumamente frias, e terem abundantes agoas
com que regam ás novidades.
As arvores que nellas se criam fructiferas sam muntas serangeiras,
e castanheiros e algumas ginjas gallegas pellas asperidoens [// fl. 485]
asperidoens [sic] dos valles e costas do qual tudo colhem bastante
fructo.
Na serra dos Milagres ha huma capella chamada da Senhora do Fectal
cujo nome diriva do lugar em que esta chamado dos Fetais, porem como a
imagem da Senhora he devotissima, e milagroza pellos muntos prodigios
que tem obrado se chama hoje a Senhora do Milagres; foi em outro tempo
ferquentada por copioza gente em romaria, e hoje tem decadencia grande
nesta parte menos da freguezia.
A serra do Amparo tambem diriva o seo nome de outra imagem de
Nossa Senhora do Amparo tambem devotissima que se acha collocada
em huma capella no alto da mesma serra, e no simo do lugar das Bajancas
de Sima.
Na serra da Sylveira que he a ultima desta freguezia tambem esta huma
capella de invocassam de Nossa Senhora de Agoadalupe muito devota.
O temperamento daquellas serras por ficar munto descoberto ao Norte
he summamente frio, porem salutifero.
Os habitadores daquellas serranias criam muntos gados miudos e
alguns boes e muntas colmeias, das quais tirambastante mel e cera que
vendem para assim passarem milhor a vida.
Todo o ambito destas serras pellas suas asparidoens que em partes há
quazi invensivel he munto natural de perdizes [// fl. 486] perdizes [sic]
em que se criam com abundancia, e tambem tem coelhos, e lebres porem
desta qualidade de casa ha menos quantidade.
Nas mesmas asparidoens e serras se encontram muntos lobos que he
o maior flagello que os habitantes exprimenttam por lhe devorarem os
seos gados, porque ha tempo em que tudo a vegelancia he pouca para
evadirem aquelles insultos, ainda nos proprios curraes do gado.
Tambem há alguns porcos javalizes que lhe destroem as searas,
e munta quantidade de rapozas, e gattos monteses61.
61
Antes está escrito “mont[eses]” e parcialmente riscado.
- 239 -
Cristóvão Mata
O ryo de que fis mençaõ corre junto deste lugar cujo nascimento
pornosei chamasse ryo da Louçainha, e o citio em que nasçe o Covam
dos Ovilheiros.
Nam nasce arebatado porem tanto que chega a hum sitio chamado a
Pedra da Ferida logo se percepita por hum fraguedo de mais altura que
sincoenta covados, cuja corrente se fas tam rapida principalmente no
Inverno que se fas caudelozo.
Este rio em pouca distancia do seo nascimento the este lugar nam cria
mais que truttas, e hirozes, e da hy para baixo barbos, bogas, ruivados,
e inguias.
As pescarias sam publicas em todo o anno, e so vedadas em os mezes
prohibidos pella ley.
As margens deste ryo onde ha lugar cultivam se, e o arvoredo do que
cria sam castanheiros [// fl. 487] e serageiras, e poucas arvores silvestres.
Tem algumas pontes de pao, e no fim deste lugar duas da mesma
qualidade, e por estas passa a estrada real.
O ryo chamado Louçainha tem em todo o seu curso trinta e seis
asenhas e alvinhas, e hum lagar de azeite, e neste logar trabalha com
a sua agoa, hum grande engenho e fundiçam de cobre, no qual se obra
por mestres que no mesmo trabalham tudo o que se pode fabricar deste
genero de metal.
E na outra ribeira chamada do Trilho junto deste lugar ha outro lagar
de azeite e hum engenho de cobre da mesma qualidade e em todo o seo
curso tem dezasete asenhas e moinhos que todos trabalham ao mesmo
tempo com a mesma agoa.
Das agoas de hum, e outro ryo uzam livremente os habitadores das
terras porque pasa menos os donos dos engenhos e asenhas que pagam
de cada huma tirada de agoa para os mesmos cem reis aos rendeiros da
excelentíssima caza de Aveyro em cada hum anno.
O ryo da Louçainha the aonde se incorpora com a ribeira do Trilho
tera de distancia ao nascimento legoa e meia, e a ribeira do Trilho do
seo nascimento the este lugar tera meia legoa de curso; e este nam cria
mais qualidade de peixe que inguias, e bordalos.
Estas [// fl. 488] estas [sic] sam as noticias que pude vereficar
deste lugar e freguezia pertencentes aos interrogatorios que me foram
aprezentados e para assim constar me signei. Espinhal de Junho 5 de 1758.
O vigario do Espinhal.
[Assinado] Manuel Leal da Gama.
- 240 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
18
[Penela] – 1758, 7 de Setembro: Memórias paroquiais da freguesia matriz
de São Miguel da vila de Penela.
Arquivo Nacional Torre do Tombo – Dicionário Geográfico de
Portugal. Volume 28, pp. 777-785.
Rellaçaõ da igreja collegiada, e freguezia matriz de São Miguel da
villa de Penella62.
Satisfazendo ao que se me ordena por parte de Sua Magestade
Fidelissima direy sobre os interrogatorios do extrato junto o que pude
alcançar a respeito desta igreja collegiada, e freguesia de São Miguel
da villa de Penella.
Foi esta villa conquistada pello senhor rey Dom Afonsso Henriques
e depois edificada por seo filho o senhor rey Dom Sancho primeiro o
que consta das cronicas deste reyno. Fica nos confins da provincia da
Extremadura distante vinte e oitto legoas da cidade de Lisboa, e quatro
da cidade de Coimbra a cujo bispado pertence e a comarca de Thomar.
He dos estados da Caza de Aveiro de que hè donatario o excelentíssimo
duque mordomo mór e a este lhe pertence por lei a regalia de nome[aç]
aõ as justicas para a mesma villa que constaõ de juis de fora, juis dos
orphaos juiz almoxarife dos direitos reaes e todos os escrivaes para estes
juizos, como taõbem os vereadores e escrivaõ da Camarã.
Compoimsse esta ___ villa de tresentos e tantos fogos, e achasse
cituada em hum monte; e no mais eminente tem hum castello cercado
de doze torres tudo obra do segundo rey o senhor Dom Sancho primeiro
mas em os jelos do Inverno se [// fl. 778] tem arruinado as muralhas e
torres de forma que em poucos annos cahiraõ inteiras <tem>.
Dentro deste castello se acha fundada a igreja de São Miguel de cuja
fundação naõ posso informar individualmente porque revendo alguns
papeis antiquissimos nelles ja se faz memoria de ser muito antiga esta
igreja, e segundo a mais certa tradição foi a primeira desta terra.
Tem sette altares digo seis altares; a capella mór com aa imagem de
São Miguel orago da mesma igreja, e de São Sebastião e neste mesmo
altar está depositada a reliquia de São Sebastiaõ que dotou a esta igreja
Acima do texto encontra-se a numeração do documento com tinta muito ténue
e que parece ser “N. 114”. Encontra-se seguidamente escrito uma anotação da qual
apenas é perceptível “Thomar”.
62
- 241 -
Cristóvão Mata
no anno de mil quatro centos trinta e oitto o senhor infante Dom Pedro
filho do senhor rey Dom João primeiro sendo duque de Coimbra e senhor
desta villa, como se deicha ver da copia que remeto da mesma doaçaõ.
O senhor rey Dom Sebastiaõ consignou seis alqueires de azeite por
anno pagos no almoxarifado da vila de Thomar para se alumiar a mesma
reliquia e manda que seja hum dos veriadores da Camara obrigado a
tractar e achar a __ de a vendersse o vidro. O cofre da reliquia tem tres
chaves da forma que Sua Alteza o recomenda.
[// fl. 779] Os collacteraes são de Nossa Senhora do Rozario com as
imagens de Nossa Senhora do Carmo, e de Santa Luzia, o centro he de
São Bráz, e tem as imagens de São Vicente Ferreyra e de São Domingos.
O quarto altar tem a imagem de hum Santo Christo; o quinto ha da
Senhora da Nazareth e tem mais as imagens do Senhor da Ma Sentença,
e de Santo Antonio de Lisboa. O sexto he de São Caetano e tem à imagem
da Senhora Santa Anna e de São Francisco de Xavier. Todas as imagas
[sic] nomeadas estaõ reformadas com o melhor corte; os altares com
retabolos de talhe primorosamente ferrados. A igreja se compõem de
tres naves com columnas de pedra e todos os arcos e tectos forrados de
talhe enjassade, e a nave do meyo se acha acabada63 da talha que vestte
o tectoo dourado e por isso fazem mui vistosa a igreja concorrendo para
isto hum grande, e magnifico cordãao de [sic]64 d’amida pendente do
tecto no meyo da igreja.
Tem esta parochia a irmandade do Santíssimo Sacramento em
estatutos aprovados pello ordinário por da _: e tem mais a confraria de
Nossa Senhora da Porificaçaõ; e segundo havia promessa deste povo,
saõ obrigados os moradores destte fazer ca festa nesta igreja em o dia
dez de Agosto e Senhora de Nazareth e hir a fa-[//fl. 780]zer lhe segunda
festa no dia 15 do mesmo mez na sua igreja da Jedimeira.
Este priorado he do padroado da Caza de Aveyro, e ao excelentíssimo
duque pertence aprezentação; rendem os fructos do dicto priorado
annualmente sette centos mil reis; toca a este prior de São Miguel
in solidum a nomeaçaõ collaçaõ e investimento de posse dos beneficiados
para quatro beneficios de que compoem a collegiada, e cada hum dos
beneficios rende aos beneficiados que os servem cento e cincoenta
mil reis.
63
64
Riscado.
Segue-se algo riscado.
- 242 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Tem mais o prior desta igreja de São Miguel de apresentar os vigarios
das igrejas de São Sebastiaõ do lugar do Espinhal da de São Sebastiaõ
do lugar da Comieyra, da de São Domingos do lugar da Lagarteira, e ha
de Santa Maria de Chão de Couce.
Tem o prior da matriz de São Miguel as regalias de nomear os
priastes, escrivaõ do celeiro e oitto cartelleiros e outros mais officiaes
para arrecadação das dizimas deste termo que chegaõ a render nove,
ou dez mil cruzados: pertencendo á eleição do prior o provimento e ___
vinte e seis pessoas, tendo a maior parte dellas de rendimentos reaes que
chegaõ para ___ dos que os exercitaõ.
[// fl. 781] O prior reside dentro do castello junto da igreja em cazas
da mesma e no citio em que foi o paço do senhor da villa o serenissimo
infante senhor Dom Pedro.
Os lugares deste termo mais nomeados pertencem as igrejas filiaes;
e delles se faz mençaõ nas informacoins dos parochos dos mesmos.
E a esta freguesia pertence o lugar da Chainssa com a capella do Espirito
Santo e naõ muito distante deste esta a capella de Santo Amaro.
No lugar da Povoa esta a capella do Appostollo São Pedro. No de Chaõ
de Pereyros a de Nossa Senhora da Purificaçaõ. No dos Moynhos está a
capella de Santo Antonio. No lugar de Torres está a capella do Appostollo
São Bartholomeu65: na Quinta dos Freyxos a capella de Nossa Senhora
da Esperança, e outra capella de Nossa Senhora na Quinta da Xaqueda.
Alem destas oitto capellas tem mais a capella de Nossa Senhora da
Piedade dentro da grande quinta da Bouca que hoje administra e as mais
da sua opulenta càza o mestre de campo capitaõ mór desta villa Lourenco
Xavier Garrido fidalgo da Caza Real, irmaõ do inquizidor presidente no
Tribunal da Santa Inquisiçaõ de Coimbra o reverendo doutor Antonio
Gonçalvez Garrido, o qual foi beneficiado desta collegiada por alguns
annos lhe que renuncia o beneficio em seo irmaõ o reverendo Joze Pedro
Garrido [// fl. 782] conigo na cathedral da cidade da Guarda todos
desta freguezia.
Tem dentro da villa a capella de Nossa Senhora da Conceiçaõ.
Contasse nesta villa trezentos e tantos fogos; e mil e trezentas almas.
O nome do apóstolo não é perceptível na íntegra. Todavia, dado que parte da
palavra (“-tholomeu”) é legível, redigimos o nome por inteiro sem qualquer adição
de informação, excepto esta pequena nota de rodapé.
65
- 243 -
Cristóvão Mata
Há nesta villa outra collegiada cujo orago he a Senhora Santa
Euphemia; Sua Magestade apresenta 3 beneficios; que são da Ordem de
São Bento de Aviz o priorado se reduzio a comenda e he comendador o
visconde de Mesquitella. E este paga à comend[a] ao parocho que serve
na dita igreja. Disputaõ estas collegiadas a anteguidade mas como <naõ>
mais se pode indagar estaõ confraternizadas, e atha que a procissaõ do
Corpo de Deus sahe alternativamente de ambas as igrejas.
Nesta villa naõ ha correyo. Tem feira em o dia de São Miguel e
concedida com tres regalias que a ter de outras era huma a de naõ poder
ser prezo qual quer [um] inda que criminozo vindo ou tornando para a
sua terra e por conta destes privillegios foi grande feira mas hoje se acha
quasi desfeita.
Os fructos que com mais abundancia colhem os moradores saõ
milho, azeite, vinho, e algum [// fl. 783] trigo, colhendo porem alem
destes generos outros muitos inda que com menos abundancia: por
esta freguesia passa o rio Doecca que tem o seo nascimento no mesmo
termo; e na freguezia de Santa Euphemia: em cuja informaçaõ se dará
informaçaõ tanto a este verso como de tudo o mais que se acha dentro
da dita freguesia; e do que podia dizer sobre esta tenho informado e so
falta a copia da doaçaõ que prometi.
Copia da carta ou provizaõ do senhor infante Dom Pedro pella qual
alem de outras reliquias que trouxe de Roma deu taõbem a da cabeça de
São Sebastaõ para a igreja de São Miguel da villa de Penella.
Nosso Senhor Deus, o qual he galardoador muito alem do que requeiro,
nem o merecem os serviços que saõ feitos a elle nem as bondades
e virtudes que saõ em quaesquer razoaveis creaturas nam somente
honrrou e deu emfinda bemaventurança as almas dos seus santos nos
ceus; mas ainda os seus ossos, e as suas cinzas por muitos milagres,
e maravilhas fez gloriozos na terra, e isto obrou mui discretamente
nosso remidor, movido com grande desejo de nossa salvaçaõ, por tal
que honrrando nos segundo obrassem nossas fraquezas, os seos santos,
nossa vontade se desperte a dezejar ser semelhantes a elles em nossas
vidas para sermos seos companheiros na gloria celestial e por a honrra
que aos santos fazemos entre os homens elles seram rogadores por nos
em presença de Deos. E por que entre os santos de que faz festa nossa
madre a Santa Igreja, he mui [// fl. 784] gloriozo o martir São Sebastiaõ;
o qual sendo de grande linagem e de grande estado, e cavalheirozo e de
grandes vertudes no mundo de todo uzou a serviço de Deos, deixando os
- 244 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
prazeres, e delleites da carne, passando forte, e aspera cida, e sofrendo
mui crueis, e espantozos tormentos, houve por galardaõ, gloria infinita
na corte celestial, e ganhou de Deos muitas graças, e merces para todos
aquelles que em elle haõ verdaderia devoçaõ; porem de onde quer que
(imperceptível) estem as suas relliquias, com grande devoçaõ devem
de ser guardadas, e honrradas. E porque ao tempo que eu o infante
Dom Pedro duque de Coimbra, e senhor de Montemor filho do mui alto
e mui poderozo, e bem-aventurado em sua vida elrey Dom Joaõ, e da
mui alta, mui excelente, e mui honesta, e devota raynha Dona Felipa
fui vizitar sepulchros des mui gloriozos princepes da Christandade São
Pedro, e São Paulo appostolos, e fazer filial reverencia ao nosso padre,
e geral pastor da Igreja militante Martinho quinto, que então era papa,
querendo me Sua Santidade honrrar como a seo amado filho, por doem
de grande preço entre outras reliquias me deo parte da cabeça do mui
gloriozo martir São Sebastiaõ já nomeada; e porque hey singular devoçaõ
na igreja do archanjo São Miguel que he na minha villa de Penella,
a qual igreja he de meo padroado, eu puz em ella a maior parte das dittas
reliquias santas, entendendo que ali saõ guardadas, e honrradas segundo
abrangem as fraquezas dos homens, e por ficar sempre lembrança,
e certidaõ donde vieraõ as ditas reliquias e por quem foraõ dadas na
igrejas mandei fazer esta minha carta na qual todo he recontado segundo
em sima he escripto, as quaes reliquias mandei por em hũa arca de tres
chaves, as quaes mando que huma tenha o prior que agora he ou ao
diante for da dita igreja, e outra o beneficiado mais velho [// fl. 785] e
a outra tenha hum dos vereadores da ditta villa; e mando que as dittas
reliquias naõ sejaõ mostradas, salvo a vespora e dia de São Sebastiaõ,
e vespora e dia de São Miguel de Setembro, e se vier algum grande
senhor, ou grande prellado que demandem que lhas mostrem; e quando
quer que lhas houverem de mostrar o sacerdote que as tirar da arca seja
vestido em manto de dizer missa, ou em capa das milhores que houver
na igreja, e com tochas, e cirios accezos, e com incenço para incensar
a arca, e as relliquias: e por tal que recebendo este mui gloriozo, e mui
virtuozo martir esta honra, ainda que segundo os seos merecimentos
he mui pequena, por a sua benignidade muito grande seja rogador por
todos os da dita villa, e seo termo, e guardador della, e meo, e de todas
as provincias e terras que a mim pertencem. Escrita na dita minha villa
a dezoito de Janeyro. Alvaro Dias a fez anno do Senhor de mil e quatro
cento e trinta, e oitto.
- 245 -
Cristóvão Mata
Infante.
Fielmente a trasladei de hum treslado, ou copia que se acha no cartorio
da Camara desta villa de Penella aos 7 de Setembro de 1758.
[Assinado] O prior de São Miguel Antonio Bernardo Tavares.
- 246 -
Fontes e bibliografia
Fontes manuscritas
Arquivo Histórico Municipal de Coimbra
Cartas e Ordens à Câmara (1526-1778).
Provisões Antigas (1518-1703).
Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Aclamações e Cortes, Cortes, Maço 9, número 12.
Chancelaria de D. Afonso V. Livros 15 e 23.
Chancelaria de D. João III. Livros 15, 46 e 71.
Chancelaria de D. Manuel, Livro 6.
Corpo Cronológico. Maços 73 e 98.
Desembargo do Paço, Repartição das Beiras, Maços 1041, 1042,
1044, 1047, 1049, 1053, 1055, 1058, 1059, 1062, 1067, 1068,
1070, 1072, 1075.
Dicionário Geográfico de Portugal. Volumes 10, 11, 14, 19, 28, 31, 42.
Feitos da Coroa, Núcleo Antigo 411.
Livro 1 da Estremadura.
Livro 4 de Místicos.
Livro de Forais Novos da Estremadura.
Livro de Forais Novos da Beira.
Livro de Forais Velhos.
Mercês de D. João V, Livro 23.
Ordem de Santiago e Convento de Palmela, Maço 7, número 522.
Registo da Chancelaria de D. Afonso II.
Viscondes de Vila Nova de Cerveira. Caixa 27.
- 247 -
Cristóvão Mata
Arquivo da Universidade de Coimbra
Governo Civil de Coimbra, Reforma Administrativa, Caixa 1841-1854.
Livro do Tombo de Lamas, Vila Verde e Pedaçães (1500-1703).
Livro Primeiro do Tombo do Amieiro I, Montemor-o-Velho (1541-1711).
Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra
Manuscritos. N.º 502.
Biblioteca Nacional de España
Manuscrito 1439.
Centro de Estudos de História Local e Regional Salvador Dias Arnaut
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1640-1641); Livro de Actas
de Sessões da Câmara (1644-1645), Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1670-1673), Livro de Actas de Sessões da Câmara
(1692-1696), Livro de Actas de Sessões da Câmara (1715-1727),
Livro de Actas de Sessões da Câmara (1727-1736), Livro de Actas
de Sessões da Câmara (1752-1761), Livro de Actas de Sessões
da Câmara (1813-1818), Livro de Actas de Sessões da Câmara
(1818-1820).
Fontes impressas
Almeida, Cândido Mendes de (org.) – Codigo Philippino ou Ordenações
e Leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado d’El-Rey
D. Philipe I. Rio de Janeiro: Typografia do Instituto Filomático, 1870.
Azevedo, Pedro de – O Processo dos Távoras. Lisboa: Tipografia da
Biblioteca Nacional, 1921.
Bluteau, Rafael – Vocabulario Portuguez e Latino. Lisboa: Na oficina
de Pascoal da Sylva, 1720.
Costa, António Carvalho da – Corografia Portugueza, e descripçam
topografica do famoso Reyno de Portugal, com as noticias das
fundaçoens das Cidades Villas, & Lugares, que contèm; Varoens
illustres, Genealogias das Familias nobres, fundaçoens de Conventos,
- 248 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Catalogos dos Bispos, antiguidades, maravilhas da natureza, edificios,
& outras curiosas observaçoens. Tomo II. Lisboa: Na Officina de
Valentim da Costa Deslandes, 1708.
Dias, João José Alves – Chancelarias Portuguesas: D. João I. Lisboa:
Centro de Estudos Históricos, 2006.
Gois, Damião de – Chronica do principe Dom Joam, rei que foi destes
regnos segundo do nome, em que summariamente se trattam has
cousas sustançiaes que nelles aconteçerão do dia, de seu nasçimento
atte ho em que elRei dom Afonso seu pai faleçeo. Em Lisboa: Na casa
de Francisco Correa, 1567.
Herculano, Alexandre – Portugaliae Monumenta Historica. Leges et consuetudines. Volume 1, Fascículo 3. Lisboa: Typis Academicis, 1863.
Lopes, Fernão – Crónica de D. João I. Porto: Civilização, 1990.
Ordenaçoens do Senhor Rey D. Manuel. Coimbra: Na Real Imprensa
da Universidade, 1797.
Silva, José Justino de Andrade – Collecção Chronologica da Legislação
Portugueza. Tomos I, V e VIII. Lisboa: Na imprensa de José Justino
Andrade Silva, 1856.
Sousa, António Caetano de – Provas da Historia Genealogica da Casa
Real Portugueza. Tomos II e VI. Lisboa: Na Regia Officina Sylviana,
e da Academia Real, 1742.
Velozo, Pedro da Fonseca Serrão – Collecção de Listas, que contem
os nomes das pessoas, que ficarão pronunciadas nas devassas,
e summarios, a que mandou proceder o Governo Usurpador depois
da heroica contra-revolução, que arrebentou na mui nobe, e leal
cidade Cidade do Porto em 16 de Maio de 1828, nas quaes se faz
menção do destino, que a Alçada, creada pelo mesmo Governo para
as julgar, deu a cada uma dellas. Porto: Typ. da viuva Alvares Ribeiro
& Filho, 1833.
Bibliografia
Alves, José Boaventura – A freguesia da Cumieira na primeira metade do
século XVIII: demografia histórica. Tese de licenciatura em História.
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1969.
Alves, José Carlos Governo Mendes – A freguesia do Espinhal do
concelho de Penela na primeira metade do século XVIII. Tese de
- 249 -
Cristóvão Mata
licenciatura em História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1971.
Amaral, Luís; Gil, Rui; Tavares, Hugo Sousa – Índices dos Processos
de Habilitações para familiar do Santo Ofício da Inquisição. Lisboa:
Guarda-Mor, 2008.
Arnaut, Salvador Dias – Ladeia e Ladera: subsídios para o estudo do
feito de Ourique. Coimbra: s/n, 1939.
— Penela: notas acêrca dum centenário. Coimbra: Atlântida, 1937.
— “O infante D. Pedro, senhor de Penela” in Biblos. Volume LXIX
(1993), pp. 187-213.
Arnaut, Salvador Dias e Dias, Pedro – Penela – História e Arte, Penela:
Município de Penela, 2.ª ed., 2009.
Basto, Ana Isabel Proença de Almeida – A população da freguesia de
Podentes no período de 1623 a 1699. Tese de licenciatura em História.
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 1973.
Bloch, Marc – “Pour une histoire comparée des sociétés européennes”
in Mélanges historiques. Paris: SEVPEN, 1983, pp. 37-38
Borrego, Nuno – Habilitações nas Ordens Militares: Ordem de Cristo
– Séculos XVII-XIX. Lisboa: Guarda-Mor, 2008.
— Mordomia-Mor da Casa Real: foros e ofícios (1755-1910). Lisboa:
Tribuna da História, 2007.
Braga, Isabel Drummond – “A circulação e a distribuição dos produtos”
in Serrão, Joel e Marques, António Oliveira (dir.) – Nova História
de Portugal. Volume V: Dias, João José Alves (coord.) – Portugal
do Renascimento à Crise Dinástica. Lisboa: Editorial Presença,
1998.
Brásio, António – “Arcediagado de Penela” in Actas do Colóquio: papel
das áreas regionais na formação histórica de Portugal. Lisboa:
Academia Portuguesa da História, 1975.
Campos, Cipriano de – A freguesia de Podentes na primeira metade do
século XVIII: estudo de demografia histórica. Tese de licenciatura em
História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,
1967.
Campos, Maria do Rosário Castiço de – A Lousã no século XVIII. Redes
de Sociabilidade e de Poder. Coimbra: Palimage, 2010.
Capela, José Viriato – “Administração local e municipal portuguesa do
século XVIII às reformas liberais (Alguns tópicos da sua Historiografia
e nova História)” in Fonseca, Teresa e Cunha, Mafalda Soares da (ed.)
- 250 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
– Os Municípios no Portugal Moderno. Dos forais manuelinos às
reformas liberais. Lisboa: Colibri, 2005, pp. 40-41.
— O Minho e os seus municípios. Estudos económico-administrativos
sobre o município português nos horizontes da reforma liberal. Braga:
Universidade do Minho, 1995.
— “O município de Braga de 1750 a 1834. O governo e a administração
económica e financeira” in Bracara Augusta, 41 (1988-1989).
Cardim, Pedro – “Centralização Política e Estado na Recente
Historiografia sobre o Portugal do Antigo Regime” in Nação e Defesa.
N.º 87, 2.ª série (1998).
Carvalho, João Manuel de Almeida Saraiva de – A freguesia do Espinhal
do concelho de Penela de 1812 a 1862: estudo de demografia
histórica. Tese de licenciatura em história. Coimbra: Faculdade de
Letras da Universidade de Coimbra, 1974.
Carvalho, Joaquim Ramos de – Comportamentos morais e estruturas
sociais numa paróquia de Antigo Regime: Soure 1680-1720.
Reconstituições, interpretações e metodologias. Tese de doutoramento
em História Moderna. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade
de Coimbra, 1997.
Castro, Armando – A estrutura dominial portuguesa dos séculos XVI a
XIX (1834). Lisboa: Caminho, 1992.
Clavero, Bartolomé – “Senhorio e Fazenda em Castela nos finais do
Antigo Regime” in Hespanha, António Manuel – Poder e instituições
na Europa do Antigo Regime. Colectânea de textos. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkien, 1982.
Coelho, Maria Helena da Cruz e Magalhães, Joaquim Romero – O poder
concelhio: das origens às Cortes Constituintes. Coimbra: Centro de
Estudos de Formação Autárquica, 2008.
Coelho, Maria Virgínia – Perfil de um poder concelhio: Santarém durante
o reinado de D. José. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, 1993;
Cunha, Mafalda Soares da – A Casa de Bragança, 1560-1640. Práticas
senhoriais e redes clientelares. Lisboa: Estampa, 2000.
— “Poderes locais nas áreas senhoriais (séculos XVI-1640)” in Fonseca,
Fernando Taveira da (org.) – O poder local em tempo de Globalização:
uma história e um futuro. Coimbra: Imprensa da Universidade de
Coimbra, 2005.
— “Relações de poder, patrocínio e conflitualidade. Senhorios e municípios (século XVI-1640)” in Cunha, Mafalda Soares da e Fonseca,
- 251 -
Cristóvão Mata
Teresa (ed.) – Os Municípios no Portugal Moderno. Dos forais
manuelinos às reformas liberais. Évora: Colibri, 2005.
Cunha, Mafalda Soares da e Fonseca, Teresa (ed.) – Os Municípios
no Portugal Moderno. Dos forais manuelinos às reformas liberais.
Évora: Colibri, 2005.
Dias, João José Alves – Gentes e Espaços (em torno da população
portuguesa na primeira metade do século XVI). Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian/Junta Nacional de Investigação Científica e
Tecnológica, 1996.
Dias, Joaquim Gomes – A freguesia da Cumieira do concelho de
Penela na segunda metade do século XVIII: estudo demográfico.
Tese de licenciatura em História. Coimbra: Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra, 1972.
Elliot, John – “Comparative history” in Barros, Carlos (ed.) – História a
Debate: Actas del Congreso Internacional “Historia a Debate”. Tomo
III: Otros enfoques. Santiago de Compostela: Historia a Debate, 1993.
Farrica, Fátima – Poder sobre as periferias. A Casa de Bragança e o
governo das terras do Alentejo (1640-1668). Évora: Colibri, 2011.
Fernandes, Paulo Jorge – As faces de Proteu: Elites urbanas e o poder
municipal em Lisboa de finais do século XVIII a 1851. Lisboa: Lisboa
Arte e História, 1999.
— Elites e finanças municipais em Montemor-o-Novo do Antigo
Regime à Regeneração (1816-1851). Montemor-o-Novo: Câmara
Municipal de Montemor-o-Velho, 1999.
— “Elites locais e poder municipal. Do Antigo Regime ao liberalismo”
in Análise Social. Volume XLI (2006).
Fonseca, Fernando Taveira da (org.) – O poder local em tempo de
Globalização: uma história e um futuro. Coimbra: Imprensa da
Universidade de Coimbra, 2005.
— A Universidade de Coimbra (1700-1771). Estudo social e económico.
Coimbra: Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, 1992.
Fonseca, Teresa – Absolutismo e Municipalismo. Évora, 1750-1820.
Lisboa: Colibri, 2002.
— Administração senhorial e relações de poder no concelho do Vimioso.
Arraiolos: Câmara Municipal de Arraiolos, 1998.
— Relações de poder no Antigo Regime: a administração municipal em
Montemor-o-Novo (1777-1816). Montemor-o-Novo: Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, 1995.
- 252 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Foucault, Michel – Microfísica do poder. São Paulo: Graal, 2008.
Freire, Anselmo Braamcamp – Brasões da Sala de Sintra. Lisboa:
Imprensa da Casa da Moeda, 1973.
Gama, Ângela Maria Barcelos da – A população da freguesia de
São Miguel de Penela de 1700 a 1799: contribuição para a história
social do concelho de Penela no século XVIII. Tese de licenciatura
em História. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de
Coimbra, 1965.
Gil Pujol, Xavier –Tiempo de política. Perspectivas historiográficas
sobre la Europa moderna. Barcelona: Publicacions i Edicions de la
Universitat de Barcelona, 2006.
Ginzburg, Carlo – “O nome e o como: troca desigual e mercado historiográfico” in A micro-história e outros ensaios. Lisboa: Difel, 1991.
Godinho, Vitorino Magalhães – A Estrutura da Antiga Sociedade
Portuguesa. Lisboa. Editora Arcádia, 1975.
Gomes, Rita Costa – A corte dos reis de Portugal no final da Idade
Média. Lisboa: Difel, 1995.
Hanson, Carl A. – Economia e Sociedade no Portugal Barroco (1668-1703). Lisboa: Publicações D. Quixote, 1986.
Hespanha, António Manuel – As Vésperas do Leviathan. Instituições e
poder político: Portugal – séc. XVII. Coimbra: Livraria Almedina,
1994.
— História das Instituições: Épocas medieval e moderna. Coimbra:
Almedina, 1982.
— Poder e instituições na Europa do Antigo Regime. Colectânea de
textos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkien, 1982.
— Poder e Instituições no Antigo Regime. Guia de Estudo. Lisboa:
Edições Cosmos, 1992.
Iglesias Blanco, Anastacio Santos – La Casa de Amarante. Siglos
XVI-XIX. Dissertação de Doutoramento em História. Santiago de
Compostela: Facultade de Xeografía e Historia de la Universidade
de Santiago de Compostela, 2008.
Jarnaut – Monografia do Município Penelense ou narração dos factos
aqui decorridos, desde os tempos primitivos até 1910. Lousã: Edição
do Autor, 1915.
Leal, Augusto Soares de Azevedo Barbosa de Pinho – Portugal Antigo
e Moderno. Volume VI. Lisboa: Livraria Editora Tavares Cardoso &
Irmão, 1975.
- 253 -
Cristóvão Mata
Lourenço, Maria Paula Marçal – A Casa e o Estado do Infantado, 1654-1706: formas e práticas administrativas de um património senhorial.
Lisboa: Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, 1995.
Machado, José Timóteo Montalvão – Casa e Ducado de Aveiro e sua
representação actual. Lisboa: Edição do Autor, 1971.
Magalhães, Joaquim Romero – “A Sociedade” in Mattoso, José (dir.)
– História de Portugal. Volume 3: Magalhães, Joaquim Romero
(coord.) – No Alvorecer da Modernidade (1480-1620). Lisboa:
Editorial Estampa, 1997.
— “Dinheiro para a Guerra: as Décimas da Restauração” in Hispania.
LXIV/1, n.º 216 (2004).
— O Algarve económico, 1600-1773. Lisboa: Estampa, 1993.
Magalhães, Joaquim Romero e Coelho, Maria Helena da Cruz – O poder
concelhio: das origens às cortes constituintes. Coimbra: Centro de
Estudos de Formação Autárquica, 1986, pp. 29-30.
Marinho, José da Silva – Construction d’un gouvernement municipal.
Élites, élections et pouvoir à Guimarães entre absolutisme et
libéralisme (1735-1834). Braga: Universidade do Minho, 2000.
Mata, Cristóvão – “A Casa de Aveiro: poder e património” in Revista
Portuguesa de História. Tomo 44: A Nobreza. Tempos, Espaços e
Poderes (2013).
— O concelho de Penela durante o Antigo Regime: um olhar sobre o
poder local (1640-1834). Dissertação de Mestrado em História Moderna: Poderes, Ideias e Instituições, especialidade em História Moderna,
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,
sob a orientação da Professora Doutora Margarida Sobral Neto e
co-orientação do Professor Doutor Joaquim Ramos de Carvalho.
Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2012.
Mattoso, José – “Da comunidade primitiva ao município. O exemplo de
Alfaiates” in Obras Completas. Volume 6. Rio de Mouro: Círculo de
Leitores, 2001, pp. 28-40.
Mattoso, José (dir.) – História de Portugal. Volume 3: Magalhães,
Joaquim Romero (coord.) – No Alvorecer da Modernidade (1480-1620). Lisboa: Editorial Estampa, 1997.
— História de Portugal. Volume 4: Hespanha, António Manuel (coord.)
– O Antigo Regime (1620-1807). Lisboa: Editorial Estampa, 1998.
Mendes, José Amado – “Para uma nova história local: reflexões e
perspectivas” in Beira Alta. Volume XLIX, Fascículo I/II (1990).
- 254 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Molas Ribalta, Pedro – “La Historia Social de la Administracion” in
Historia Social de la Administración Española. Estudios sobre los
siglos XVII y XVIII. Barcelona: Consejo Superior de Investigaciones
Científicas/Institut Milá i Fontanals-Departamento de Historia
Moderna, 1980.
Molina Puche, Sebastián – “Elite local: análisis de un concepto a través
de las familias de poder del corregimiento de Villena-Chinchilla en
el siglo XVII” in Estudis. Volume 31 (2005), pp. 197-222.
Monteiro, Nuno Gonçalo – Elites e Poder: Entre o Antigo Regime e o
Liberalismo. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2012.
— “Casa e Linhagem: o Vocabulário Aristocrático em Portugal nos
Séculos XVII e XVIII” in Penélope. Fazer e desfazer a História.
N.º 12 (1993), pp. 43-63.
— O Crepúsculo dos Grandes. A Casa e o Património da Aristocracia em
Portugal (1750-1832). Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2003.
— “Poder local e corpos intermédios: especificidades do Portugal
moderno numa perspectiva histórica comparada” in Silveira, Luís
Espinha da (coord.) – Poder Central, Poder Regional, Poder Local:
uma perspectiva histórica. Lisboa: Edições Cosmos, 1997.
— “Poder senhorial, estatuto nobiliárquico e aristocracia” in Mattoso,
José (dir.) – História de Portugal. Volume 4: Hespanha, António
Manuel (coord.) – O Antigo Regime (1620-1807). Lisboa: Editorial
Estampa, 1998.
— “Sociologia das Elites Locais (séculos XVII-XVIII). Uma breve
reflexão histórica” in Cunha Mafalda Soares da e Fonseca, Teresa
(ed.) – Os municípios portugueses no Portugal Moderno: dos forais
manuelinos às reformas liberais. Lisboa: Edições Colibri, 2005.
Morais, Cristóvão Alão de – Pedatura Lusitana (Nobiliário de famílias
de Portugal). Porto: Livraria Fernando Machado, s.d..
Moreno, Humberto Baquero Moreno – “O Infante D. Pedro e o Ducado
de Coimbra” in Revista de História. Volume 5 (1983-1984).
Neto, Margarida Sobral – “A História uma Ciência em Mudança: Novos
e Velhos Temas na Investigação Histórica” in Revista Portuguesa de
História. Tomo XXXIX (2007).
— O Universo da Comunidade Rural. Época Moderna. Coimbra:
Palimage, 2010.
— “Percursos da História Local Portuguesa. Monografias e representações de identidades locais” in Santos, João Marinho dos e Catana,
- 255 -
Cristóvão Mata
António Silveira (coord.) – Memória e História Local. Colóquio
Internacional realizado em Idanha-a-Nova. Coimbra: Palimage, 2010.
— “Senhorios e concelhos na época moderna: relação entre dois poderes
concorrentes” in Cunha Mafalda Soares da e Fonseca, Teresa (Ed.)
– Os municípios portugueses no Portugal Moderno: dos forais
manuelinos às reformas liberais. Lisboa: Edições Colibri, 2005.
— Terra e Conflito. Região de Coimbra (1700-1834). Viseu: Palimage,
1997.
Neves, Francisco Ferreira – “A casa e ducado de Aveiro. Sua origem,
evolução e extinção” in Arquivo do Distrito de Aveiro. Volume
XXXVIII (1972).
Nunes, Ana Sílvia Albuquerque Oliveira – História social da administração do Porto (1700-1753). Porto: Universidade Portucalense, 1999.
Olival, Fernanda – “Rigor e interesses: os estatutos de limpeza de sangue
em Portugal” in Cadernos de Estudos Sefarditas. N.º 4 (2004).
Oliveira, António de – A vida económica e social de Coimbra de 1537
a 1640. Tese de Doutoramento em História. Coimbra: Faculdade de
Letras da Universidade de Coimbra, 1972.
— “Problemática da História Local” in O Faial e a Periferia Açoriana
nos séculos XV a XIX. Horta: Núcleo Cultural, 1995
Oliveira, César (dir.) – História dos Municípios e do Poder Local. Lisboa:
Temas e Debates, 1996.
Oliveira, Delfim José – Noticias de Penela: Apontamentos Historicos e
Archeologicos. Lisboa: Typ. da Casa Minerva, 1884.
Oliveira, frei Nicolau de – Livro das Grandezas de Lisboa. Lisboa: por
Jorge Rodrigues, 1620.
Pardal, Rute – As elites de Évora ao tempo da dominação filipina.
Estratégias de controlo do poder local (1580-1640), Lisboa: Edições
Colibri, 2007.
Paula, Glória S. – Lagos (1745-1792). Dinâmicas económicas e elites
de poder. Lisboa: Estar, 2001.
Pereira, João Cordeiro – “A Renda de um Grande Casa Senhorial de
Quinhentos” in Primeiras Jornadas de História Moderna. Volume II.
Lisboa: Centro de História da Universidade de Lisboa, 1986.
Pro Ruiz, Juan – “Sobre el ámbito territorial de los estudios de historia”
in Barros, Carlos (ed.) – Historia a Debate: Actas del Congreso
Internacional. Tomo III: Otros Enfoques. Santiago de Compostela:
Historia a Debate, 1993
- 256 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
Rau, Virgínia – Feiras Medievais Portuguesas: subsídio para o seu
estudo. Lisboa: Editorial Presença, 1983.
Reis, António Matos – “Os municípios medievais perante a guerra”
in Actas das VI Jornadas Luso-Espanholas de Estudos Medievais:
A Sociedade e a Guerra. Volume 2. Coimbra: Sociedade Portuguesa
de Estudos Medievais, 2009.
Resende, André de – Historia da Antiguidade da Ciidade de Evora.
Évora: per Andre de Burgos, 1553.
Revel, Jacques – “Les corps et communautés” in Baker, Keith Michael –
The French Revolution and the Creation of Modern Political Culture.
Volume 1: The Political Culture of the Old Regime. Oxford: Pergamon
Press, 1987.
Ribeiro, Ana Isabel – A Comunidade de Eiras nos finais do século XVIII:
estruturas, redes e dinâmicas sociais. Dissertação de Mestrado em
História Moderna. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade
de Coimbra, 2003.
— Nobrezas e governanças. Identidades e perfis sociais (Coimbra,
1777-1820). Dissertação de doutoramento em História. Coimbra:
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2012.
— “O património da fidalguia provincial da região de Coimbra – o caso
da família Garrido (século XVIII)” in Revista Portuguesa de História.
Tomo 44: A Nobreza. Tempos, Espaços e Poderes (2013), pp. 327-358.
Ribeiro, João Pinto – Lustre ao Dezembargo do Paço, e as Eleiçoens,
Perdoens, e Pertenças de sua Jurisdicçaõ. Coimbra: Na Officina de
Joseph Antunes da Sylva, 1728, p. 26.
Ribeiro, Maria Teresa Casquilho – O município de Alter do Chão nos
finais do século XVIII. Rostos do poder concelhio. Coimbra: Palimage,
1998.
Rodrigues, José Damião – Poder municipal e oligarquias urbanas: Ponta
Delgada no século XVII. Ponta Delgada: Instituto Cultural de Ponta
Delgada, 1994.
— São Miguel no século XVIII: casa, elites e poder. Ponta Delgada:
Instituto Cultural de Ponta Delgada, 2003.
Rodrigues, Luís Nuno – “Um século de finanças municipais: Caldas da
Rainha (1720-1820)” in Penélpe. Fazer e Desfazer a História. Número
7 (1992), pp. 49-69.
- 257 -
Cristóvão Mata
Santos, Carlos Ary dos – “Estudos de Direito Nobiliárquico Português
– II. A Sucessão da Casa e Ducado de Aveiro” in Armas e Troféus.
Volume VIII (1967).
Santos, Rui – “Senhores da terra, senhores da vila: elites e poderes locais
em Mértola no século XVIII” in Análise Social. Volume XXVIII
(1993).
Serrão, Joel e Marques, António Oliveira – Nova História de Portugal.
Volume V: Dias, João José Alves (coord.) – Portugal do Renascimento
à Crise Dinástica. Lisboa: Editorial Presença, 1998.
Silva, Ana Cristina Nogueira da – O Modelo Espacial do Estado
Moderno: reorganização territorial em Portugal nos Finais do Antigo
Regime. Lisboa: Editorial Estampa, 1998.
Silva, Francisco Ribeiro da – Elites portuenses do século XVII:
caracterização social e vias de mobilidade. Porto: Centro de Estudos
de Genealogia, Heráldica e História da Família da Universidade
Moderna, 2001.
— “Escalas do poder local: das cidades aos campos” in Fonseca,
Fernando Taveira da (org.) – O poder local em tempo de Globalização:
uma história e um futuro. Coimbra: Imprensa da Universidade de
Coimbra, 2005, pp. 75-95.
— O Porto e o seu termo (1580-1640). Os homens, as instituições e o
poder. Porto: Câmara Municipal do Porto, 1988.
Silva, Manuel Carlos – “Espaço e Sociedade: alguns elementos de
reflexão” in Balsa, Casimiro (org.) – Relações Sociais de Espaço.
Homenagem a Jean Remy. Lisboa, Edições Colibri, 2006.
Silveira, Luís Espinha da (coord.) – Poder Central, Poder Regional,
Poder Local: uma perspectiva histórica. Lisboa: Edições Cosmos, 1997.
Soares, Sérgio Cunha – “Aspectos da política municipal pombalina.
A Câmara de Viseu no reinado de D. José” in Revista Portuguesa de
História. Tomo 21 (1984).
— “Nobreza conimbricense e modos de governo político. Um ensaio
municipal (1640-1777)” in Revista Portuguesa de História. Tomo
XXXI, Volume I (1996).
— “Nobreza e Arquétipo Fidalgo. A propósito de um Livro de Matrículas
de Filhamentos (1641-1724)” in Revista de História das Ideias.
Volume 19 (1997).
— “O ducado de Aveiro e a vila da Lousã no século XVIII (1732-1759)”
in Arunce: Revista de Divulgação Cultural. Volume 11/12 (1996-1997).
- 258 -
O Poder Local em Penela (1640-1834)
— O Município de Coimbra da Restauração ao Pombalismo. Poder
e poderosos na Idade Moderna. Coimbra: Centro de História da
Sociedade e da Cultura, 2004.
— “Os vereadores da Universidade na Câmara de Coimbra: 1640-1777”
in Revista Portuguesa de História. Tomo 26 (1991).
Soares, Torcato de Sousa – “Concelhos” in Serrão, Joel – Dicionário de
História de Portugal. Volume 2. Porto: Livraria Figueirinhas, 2002.
Sousa, António Caetano de – História Genealógica da Casa Real
Portugueza. Tomo 11. Lisboa: Na Regia Officina Sylviana, 1742.
— Memorias Historicas, e Genealogicas dos Grandes de Portugal.
Lisboa: Na Regia Officina Sylviana e da Academia Real, 1755.
Thompson, Edward Palmer – A Economia Moral da Multidão na Inglaterra do Século XVIII. Lisboa: Antígona, 2008.
Tocqueville, Alexis de – O Antigo Regime e a Revolução. Lisboa:
Fragmentos, 1989.
Torgal, Luís Reis – Ideologia Política e Teoria do Estado na Restauração.
Coimbra: Biblioteca da Universidade de Coimbra, 1982.
Torgal, Luís Reis, Mendes, José Amado e Catroga, Fernando – História da
História em Portugal: séc. XIX-XX. Lisboa: Círculo de Leitores, 1996.
Valladares, Rafael – A independência de Portugal. Guerra e Restauração:
1640-1680. Lisboa: Esfera dos Livros, 2006.
- 259 -
Índice
Nota Introdutória, Luís Filipe Lourenço Matias ..........................................................7
Prefácio, Margarida Sobral Neto................................................................................................9
Introdução ...................................................................................................................................................... 13
I – Os concelhos no Antigo Regime: um balanço geral .................................... 19
II – Território e poderes .................................................................................................................... 33
III – Municipalismo e senhorialismo: os donatários de Penela ................. 51
IV – Orgânica e modos de funcionamento de um poder local.................... 71
V – O governo económico de Penela .................................................................................. 89
VI – Um perfil social do poder concelhio.................................................................... 113
Conclusão .................................................................................................................................................... 137
Anexos ........................................................................................................................................................... 141
Apêndice Documental..................................................................................................................... 167
Fontes e bibliografia.......................................................................................................................... 247