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ACESSO DOS MIGRANTES INTERNACIONAIS AO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA AS EMPRESAS Pacto Global Rede Brasil 3 ACESSO DOS MIGRANTES INTERNACIONAIS AO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA AS EMPRESAS 1ª Edição Organização Internacional para as Migrações São Paulo, 2018 Marcelo Torelly Maria Gabriela Eiras de Almeida Marina Dall'Anese Victor Netto Pacto Global Rede Brasil 4 Ficha Técnica As opiniões expressas nas publicações da Organização Internacional para as Migrações (OIM) são dos autores e não refletem necessariamente a opinião da OIM ou de qualquer outra organização a qual os participantes possam estar profissionalmente vinculados. As denominações utilizadas no presente relatório e a maneira pela qual são apresentados os dados não implicam, por parte da OIM, em qualquer opinião sobre a condição jurídica dos países, territórios, cidades ou áreas, ou mesmo de suas autoridades, nem tampouco a respeito à delimitação de suas fronteiras ou limites. A OIM está comprometida pelo princípio de que a migração ordenada e em condições humanas beneficia aos migrantes e a sociedade. Por seu caráter de organização intergovernamental, a OIM atua com seus parceiros da comunidade internacional para ajudar a enfrentar os crescentes desafios da gestão da migração; fomentar a compreensão das questões migratórias, alentar o desenvolvimento social e econômico através da migração, e garantir o respeito pela dignidade humana e bem-estar dos migrantes. Editorial Organização Internacional para as Migrações – Brasil Casa da ONU – SEN 802, Conjunto C, Lote 17 Brasília-DF, Brasil / 70800-400 iombrazil@iom.int Chefe da Missão da OIM no Brasil: Stéphane Rostiaux Prefixo Editorial: 94066 Número ISBN: 978-85-94066-05-3 Organização Internacional para as Migrações. Acesso dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro: desafios e oportunidades para as empresas. São Paulo: OIM, 2018. Expediente técnico Organização Internacional para as Migrações – Brasil Casa da ONU – SEN 802, Conjunto C, Lote 17 Brasília-DF, Brasil / 70800-400 iombrazil@iom.int Esta publicação foi financiada pelo Fundo da OIM para o Desenvolvimento (IDF) e faz parte do projeto “Aprimorando a Assistência Jurídica dos Migrantes no Brasil e Promovendo Sua Inserção no Mercado de Trabalho”. © 2018 Organização Internacional para as Migrações (OIM) Todos os direitos reservados. Esta publicação não poderá ser reproduzida, total ou parcialmente, nem gravada por quaisquer sistemas de registros, nem transmitida por quaisquer meios eletrônicos ou mecânicos, nem sujeita a processos de fotocópia sem a autorização prévia do editor. 5 OIM A OIM é a agência das Nações Unidas para as migrações e a principal organização intergovernamental mundial atuante na temática. Criada em 1951, a organização trabalha de forma estreita com os governos, outras organizações internacionais e a sociedade civil para fazer frente aos desafios da migração. Com 172 Estados membros, oito Estados observadores, 401 escritórios em mais de 100 países e aproximadamente 9.000 funcionários, a OIM dedica-se à promoção de uma migração humana e ordenada para o benefício de todos, fornecendo assistência e assessoramento a governos e migrantes. A OIM conta atualmente com nove escritórios regionais (Bangkok, Bruxelas, Buenos Aires, Cairo, Dakar, Nairóbi, Pretória, San José da Costa Rica e Viena), dois escritórios especiais de ligação (Adis Abeba e Nova York) e dois centros administrativos (Cidade do Panamá e Manila). A OIM teve seu Acordo de Sede com o Brasil estabelecido legalmente em 18 de agosto de 2015, com a publicação do Decreto n. 8.503, que outorgou-lhe privilégios e imunidades, inaugurou um escritório nacional em Brasília e ampliou de forma substantiva suas atividades no país. Pacto Global O Pacto Global é a maior iniciativa de cidadania corporativa do mundo, formada por mais de 13 mil empresas e organizações sem fins lucrativos que discutem boas práticas, têm acesso a ferramentas e conteúdos e desenvolvem projetos alinhados aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. O Brasil possui a terceira maior rede, composta por mais de 770 membros. Lançado em 2000 pelo então secretário-executivo das Nações Unidas, Kofi Annan, o Pacto Global nasceu da necessidade de mobilizar a comunidade empresarial para a adoção de valores fundamentais e internacionalmente aceitos em suas práticas de negócios em quatro frentes: Direitos Humanos, Trabalho Digno, Meio Ambiente e Anticorrupção. A Rede Brasil do Pacto Global conduz projetos nas áreas de Água, Alimentos e Agricultura, Energia e Clima, Direitos Humanos e Trabalho, assim como ações Anticorrupção e voltadas aos ODS. Report O grupo Report tem por propósito transformar o mundo dos negócios por meio da sustentabilidade, entendendo esta como o esforço contínuo de alinhar os negócios ao espírito do tempo. Com experiência de mais de 15 anos de trabalho no suporte a mais de 400 das maiores empresas do país, é formada por 14 sócios, uma equipe fixa e uma extensa rede de parceiros, conectados por escritórios em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Mais recentemente, a Report tem desenvolvido múltiplas interações com o mercado, enriquecidas por aprendizados, experiências e novos conhecimentos junto à sua rede de relacionamentos, atuando especialmente nos temas de comunicação, engajamento, estratégia e planejamento. 6 Equipe técnica COORDENAÇÃO EXECUTIVA OIM Brasil: Marcelo Torelly Coordenador de Projeto da OIM no Brasil. Doutor em direito pela Universidade de Brasília, trabalha há dez anos com cooperação internacional, tendo atuado no governo federal e em organismos internacionais. Foi acadêmico visitante na Faculdade de Direito e no Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Oxford (Reino Unido), pesquisador visitante no Institute for Global Law and Policy da Escola de Direito da Universidade Harvard (Estados Unidos) e professor da Universidade Católica de Brasília. Rede Brasil do Pacto Global: Maria Gabriela Eiras de Almeida Trabalha na Rede Brasil do Pacto Global da ONU há mais de cinco anos e é responsável pela coordenação dos grupos de trabalho anticorrupção e de direitos humanos, sendo responsável pelo engajamento das empresas através de diversas atividades como reuniões, eventos, oficinas, treinamentos, webinars e publicações. É também responsável pela gestão de todos os projetos no âmbito desses grupos temáticos, além da captação de recursos para garantir a execução. É graduada em Relações Internacionais (Facamp), pós-graduada em Estratégia de Negócios (PUC-SP) e possui curso de Extensão em Direitos Humanos (FESPSP). PESQUISA Report: Marina Dall’Anese Consultora em sustentabilidade, atuante na área desde 2012, com experiência em seleção e tratativa de indicadores socioambientais corporativos, elaboração de matriz de materialidade, coordenação de projetos corporativos, como produção de relatórios de sustentabilidade, estratégias de baixo carbono auditora líder em projetos de asseguração de responsabilidade socioambiental (padrão AA1000). Gestora ambiental pela Universidade de São Paulo. Victor Netto Profissional de sustentabilidade com dez anos de experiência em pesquisas e consultoria. É formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina e MBA em Negócios Socioambientais (Inst. IPE/CEATS-USP). Na Report, é responsável pela divisão de negócios ligada à estratégia e planejamento. Já atuou com engajamento de stakeholders (padrões AA1000), estudos de campo, desenvolvimento de comitês e grupos de trabalho, definição de propósito e planejamento estratégico. 7 Agradecimentos A realização da pesquisa Acesso dos migrantes internacionais ao mercado de trabalho brasileiro: desafios e oportunidades para as empresas pela Organização Internacional para as Migrações (OIM) e a Rede Brasil do Pacto Global não teria sido possível sem o apoio de inúmeras organizações e pessoas. Esta pesquisa contou com a participação de 68 empresas e 70 funcionários que contribuíram com seu tempo, conhecimento e experiências durante as entrevistas pessoais realizadas e a consulta online. Agradecemos nominalmente os comentários de Guilherme Prol Arosa Otero, da Organização Internacional para as Migrações (OIM), na elaboração da pauta para consulta online; e a Luís Renato Vedovato, da Unicamp, e Cyntia Sampaio, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pela disponibilidade em colaborar no aprofundamento dos conhecimentos da equipe sobre a temática de migração no Brasil. Diversas pessoas na Rede Brasil do Pacto Global, na OIM e na Report contribuíram em diferentes etapas desse projeto, entre elas Anne Althaus, Margaux Casagrande, Matteo Mandrile, Vanessa Tarantini, Marco Antonio Barbosa, Cleo Hissatugu e Gilberto Longo. Sumário Lista de figuras 9 Lista de anexos 10 Lista de abreviaturas e siglas 10 1 Visão geral do estudo 11 2 Introdução 12 3 Processo 15 4 Metodologia 17 4.1 Panorama geral 17 4.2 Entrevistas com executivos 18 4.3 Consulta online 20 5 Resultados 22 5.1 Estudo da legislação nacional 22 5.2 Entrevistas com executivos 24 5.3 Consulta online 32 6 Análise 51 6.1 Regulamentação 51 6.2 Políticas corporativas para a diversidade 52 6.3 Mulheres migrantes 53 6.4 Presença de migrantes nas empresas 53 6.5 Dificuldades na contratação de migrantes 54 6.6 Impactos da presença de migrantes 57 7 Conclusões 59 7.1 Principais resultados 59 7.2 Considerações finais 61 Referências 64 Anexos 67 Lista de Figuras Fig. 01 Número de empresas participantes da consulta online por setor da economia 32 Fig. 13 Principais formas de contratação de migrantes internacionais mencionadas pelas empresas 38 Fig. 02 Número de respondentes por cargo ocupado 33 Fig. 14 Principais barreiras para a contratação de migrantes internacionais 39 Fig. 03 Número de respondentes por área da empresa 33 Fig. 15 Percentual de respondentes que percebem diferenças entre a contratação de migrantes e migrantes vulneráveis 41 Fig. 04 Percentual de respondentes que afirmam conhecer o conceito de “migrante vulnerável”: 34 Fig. 16 Percentual de respondentes que percebem diferenças entre a contratação de migrantes vulneráveis e refugiados 42 Percentual de respondentes que afirmam que sua empresa possui políticas de responsabilidade social 34 Fig. 17 Percentual de respondentes que entendem que há questões mais críticas na contratação de mulheres migrantes internacionais 43 Fig. 18 Principais impactos da presença de migrantes nas empresas 44 Fig. 19 Percentual de respondentes que concordam com as visões estratégicas apresentadas do ponto de vista organizacional 46 Fig. 05 Fig. 06 Políticas de responsabilidade social abrangendo migrantes 34 Fig. 07 Temas presentes nas políticas de responsabilidade social 35 Fig. 08 Percentual de respondentes que afirmam que sua empresa possui políticas de contratação de mulheres 35 Fig. 09 Percentual de respondentes que afirmam que as políticas de contratação de mulheres levam em consideração mulheres migrantes 36 Fig. 20 Percentual de respondentes que concordam com as visões estratégicas apresentadas do ponto de vista de mercado 46 Fig. 10 Percentual de respondentes que afirmam contar com a presença de migrantes internacionais na empresa 36 Fig. 21 Percentual de respondentes que concordam com as visões estratégicas apresentadas do ponto de vista de marca e reputação 46 Fig. 11 Número de migrantes internacionais por categorias 37 Fig. 22 Priorização de grupos de migrantes em políticas corporativas 47 Fig. 12 Número de migrantes internacionais por funções exercidas nas empresas 37 10 Lista de anexos Anexo I Lista de abreviaturas e siglas ACNUR Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados Anexo II Roteiro de entrevista estruturada com executivos de empresas do Pacto Global IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Anexo III Questionário online OIM Organização Internacional para as Migrações OIT Organização Internacional do Trabalho ONG Organizações Não Governamentais ONU Organização das Nações Unidas PCD Pessoa com Deficiência PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Roteiro de entrevista semiestruturada com especialistas 11 1 Visão geral do estudo O que é? Um diagnóstico da percepção dos profissionais das empresas da Rede Brasil do Pacto Global sobre a temática de trabalhadores migrantes. O que contém? Os resultados da pesquisa realizada e a descrição de dificuldades e oportunidades envolvidas na inclusão de migrantes vulneráveis aos quadros de colaboradores das empresas, além de direcionadores para a construção de políticas corporativas inclusivas. Para que é útil? Para orientar as empresas na compreensão de desafios e oportunidades associados à inclusão de trabalhadores migrantes. Como foi feito? Através de uma pesquisa qualitativa executada em três fases: 1 análise não exaustiva da legislação nacional sobre o tema; 2 entrevistas individuais com executivos de 11 empresas membros da Rede Brasil do Pacto Global; e 3 consulta online com a participação de 72 respondentes de empresas de diversos setores da economia. Os resultados foram compilados e analisados com objetivo de extrair as principais barreiras e oportunidades percebidas na legislação e pelas empresas. Qual a contribuição? Oferecer insumos e orientações para empresas interessadas na inclusão de trabalhadores migrantes, especialmente mulheres e migrantes em situação de vulnerabilidade. 12 2 Introdução Desde seus primórdios a humanidade está em movimento. Algumas pessoas se mudam em busca de novas oportunidades, outras para escapar de conflitos armados, pobreza, insegurança alimentar, perseguição, terrorismo ou violações e abusos dos direitos humanos; alguns se mudam em resposta aos efeitos adversos das mudanças climáticas, em decorrência de desastres naturais ou outros fatores ambientais. A motivação de muitos também é resultado da combinação de diversos desses fatores. Em um mundo cada vez mais interconectado, a migração internacional é uma realidade em quase todos os cantos do planeta, e ocorre atualmente em escala sem precedentes. Os sistemas de transporte modernos facilitaram e tornaram mais baratas a busca por melhores trabalhos, por educação e qualidade de vida; ao mesmo tempo, os conflitos, a pobreza e as desigualdades forçam as pessoas a deixarem suas casas em busca de um futuro melhor para suas famílias. Em 2017, foi estimado que cerca de 258 milhões de pessoas no mundo vivem longe do país onde nasceram. A Ásia é o primeiro continente em número de pessoas que imigraram, seguida por Europa, América Latina & Caribe e África. Do total estimado, as mulheres representam cerca de 48%, percentual ligeiramente menor que o presente nas estimativas do ano 2000 (49%). A média de idade da população imigrante é de 39 anos, mas em algumas regiões essa média caiu com o passar dos anos. É o caso da Ásia, América Latina & Caribe e Oceania. A grande maioria dos imigrantes está em idade produtiva: 74% dos imigrantes possuem entre 20 e 64 anos de idade.1 A migração também está cada vez mais presente na agenda da comunidade internacional, principalmente após a adoção do Programa de Ação na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento de 1994, que resultou em um dos mais completos textos sobre a mi- 1 Nações Unidas, Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais, Divisão de População (2017). Relatório Internacional sobre Migração 2017: Destaques 13 gração internacional e o seu papel no desenvolvimento. Dentro da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, há o reconhecimento da migração internacional como um fator de grande relevância para o desenvolvimento, exigindo respostas coerentes e abrangentes, que assegurem o respeito aos direitos humanos e o tratamento decente dos imigrantes. Uma das respostas a esse chamado do desenvolvimento sustentável é a Declaração de Nova Iorque para Refugiados e Migrantes, de 2016. A Declaração reafirma o compromisso dos países membros em proteger os direitos humanos de todos os migrantes e estabelece diferentes compromissos para imigrantes e também para refugiados. Quando apoiada por políticas apropriadas, a migração pode contribuir para a inclusão e o desenvolvimento econômico dos países de origem e de destino. Nos países de origem, sobretudo devido às remessas de dinheiro aos familiares que lá ficaram, possibilitando o investimento em moradia, educação, saúde, entre outras necessidades básicas; além disso, as diásporas contribuem para o desenvolvimento econômico e a reconstrução de economias locais. Nos países anfitriões, a principal contribuição da migração internacional está no preenchimento de vagas de trabalho, no empreendedorismo e no pagamento de taxas e impostos. A imigração também pode ajudar a minimizar os impactos de tendências demográficas – como o envelhecimento da população em países desenvolvidos, a escassez de mão-de-obra e outros desafios nas sociedades de acolhimento, além de acrescentar novas habilidades e dinamismo às suas economias.2 Apesar dos significativos benefícios da migração, alguns imigrantes estão entre os membros mais vulneráveis da sociedade. São normalmente os primeiros a perderem o emprego em uma situação de dificuldade da empresa, estão entre os que recebem menores salários e trabalham mais, muitas vezes em condições piores que os trabalhadores nativos. Também alvo de discriminação, abuso e violação de direitos humanos. Para os países anfitriões, o fluxo prolongado de migrações também pode levar a custos e impactos socioeconômicos. Por exemplo, serviços públicos já sob pressão para atender a população nativa, mercados de trabalho frágeis e alguns ganhos de desenvolvimento macroeconômico podem ser revertidos. Às vezes, essas pressões se traduzem em tensões políticas e sociais entre as populações nativa e migrante, especialmente em áreas urbanas já mal servidas e superlotadas. O reconhecimento desses desafios está causando uma mudança de paradigma entre os atores humanitários e de desenvolvimento internacional, para que se olhe além da assistência humanitária crítica e se inclua a intervenção precoce de atores do desenvolvimento, com o acesso ao trabalho decente estrategicamente colocado nessa interseção. Ainda que a busca por trabalho não seja o principal motivador para a imigração, ele comumente está associado a esse processo. Considerar o trabalho decente como fator central para a migração é essencial para mitigar o estresse fiscal, limitar choques macroeconômicos, estabilizar e apoiar o desenvolvimento de longo prazo, aliviar as pressões do mercado de trabalho e promover modos de vida sustentáveis, que aproveitem as capacidades produtivas dos migrantes e seus anfitriões. 2 NAÇÕES UNIDAS, 71ª Seção da Assembleia Geral (2016). Declaração de Nova Iorque para Refugiados e Migrantes 14 Neste sentido, governos e empresas possuem papeis essenciais na criação de estratégias que apoiem o desenvolvimento de políticas que permitam a adaptação e/ou formulação de respostas relevantes e planos de ação nacionais sustentados por normas internacionais de trabalho, princípios de trabalho decente, normas humanitárias e de direitos humanos, assegurando a criação de empregos que beneficiem trabalhadores nacionais e internacionais, incluindo medidas para aumentar a capacidade das agências de emprego públicas e privadas para apoiar o acesso desses trabalhadores ao mercado de trabalho. Os trabalhos desenvolvidos durante esta pesquisa e os estudos e análises realizadas não têm como objetivo investigar as razões do aumento do fluxo de imigrações, as políticas direcionadas aos nacionais que estão no exterior e tão pouco fazer revisão histórica das imigrações que ocorreram no país, mas sim compreender o atual cenário brasileiro no que tange a legislações pertinentes ao acesso de imigrantes ao mercado de trabalho e as dificuldades e/ou benefícios que as empresas encontram no processo de contratação de imigrantes. Com este objetivo, a Organização Internacional para as Migrações (OIM) e a Rede Brasil do Pacto Global, com apoio da consultoria Report Sustentabilidade, desenvolveram a pesquisa Desafios e possibilidades de construção de políticas corporativas para o acesso dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro. 15 3 Processo A Organização Internacional para as Migrações (OIM) é a principal organização intergovernamental mundial no tema das migrações e trabalha em parceria com governos, outras organizações e a sociedade civil para enfrentar os desafios da migração no mundo. A experiência de mais de 50 anos no trabalho pelos direitos dos migrantes trouxe ao conhecimento de muitos que a imigração internacional é uma parte integral do processo de desenvolvimento e funcionamento de economias modernas. Em uma das suas iniciativas mais recentes, a OIM, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) financiada pelo Ministério da Justiça, publicou o relatório Visões do Contexto Migratório no Brasil. O trabalho teve por objetivo “fortalecer as capacidades do governo brasileiro e apoiar a consolidação de uma política nacional de migração, refúgio e apatridia”.3 A regulamentação, em 2017, da Lei de Migração é a consolidação do esforço nacional para assegurar os direitos humanos dos migrantes em nosso país. No entanto, a integração dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro não resulta somente da garantia legal de acesso desse grupo a empregos dignos, mas depende diretamente de o setor empresarial oferecer oportunidades a eles, garantindo o respeito aos direitos humanos dos migrantes internacionais e a possibilidade de uma melhor qualidade de vida. Identificada a necessidade de trabalhar junto ao setor empresarial nacional, a OIM e o Pacto Global propuseram esta pesquisa para identificar as melhores formas de estimular a construção de políticas corporativas para o acesso dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro. Para tanto, é importante primeiro conhecer as iniciativas já existentes nas empresas voltadas à diversidade e à integração dos diversos grupos sociais. Para o incentivo à adoção de políticas corporativas de responsabilidade social e de diversidade que especificamente incluam os migrantes internacionais, é primordial também identificar a percepção dessas empresas quanto às possíveis dificuldades na inclusão desse grupo ao corpo de funcionários, assim como apresentar os benefícios advindos da pluralidade. Devido a sua expertise, à OIM coube a coordenação do projeto, contato com especialistas do setor, definição de conceitos, coparticipação na montagem dos questionários utilizados para as entrevistas e a consulta online, além de revisão final das análises realizadas. 3 Organização Internacional para as Migrações. Visões do Contexto Migratório no Brasil. Política de Migração e Refúgio do Brasil Consolidada, Volume 1. Brasília: OIM e Ministério da Justiça, 2017. 16 A Rede Brasil do Pacto Global facilitou o contato da equipe com as empresas signatárias do Pacto, que constituem um relevante recorte da comunidade empresarial e da sociedade civil já engajada em práticas de negócios pautadas pelo respeito aos direitos humanos, às relações de trabalho, meio ambiente e outros valores fundamentais. À Report coube a aplicação de sua experiência como uma organização de conhecimento, capaz de sistematizar e disseminar os aprendizados que circulam pela sua área de influência, para conduzir a consulta aos envolvidos e a consolidação e análise das informações qualitativas coletadas. 17 4 Metodologia Com objetivo de compreender a situação atual das políticas de acesso dos migrantes internacionais no mercado de trabalho brasileiro e orientar as consecutivas atividades de estímulo à integração desse grupo ao corpo de funcionários das empresas, a pesquisa foi estruturada em três diferentes etapas. A primeira etapa consistiu na imersão dos envolvidos no tema da migração internacional, da legislação brasileira ligada ao acesso desse grupo ao mercado de trabalho e na interlocução com especialistas do setor, para identificação dos principais pontos críticos relacionados ao tema. As segunda e terceira etapas ocorreram em paralelo, consistindo na aplicação de questionário online e de entrevistas individuais com empresas da Rede Brasil do Pacto Global, com o objetivo central de identificar possíveis barreiras à contratação de migrantes internacionais, fossem elas burocráticas, de comunicação e culturais, entre outras. 4.1 Panorama geral A imigração internacional é um tema complexo e interconectado, com facetas delicadas do ponto de vista político, regulamentar, empresarial e social. Para assegurar que fossem propostas questões significativas nas pautas das entrevistas e da consulta online e a melhor interpretação dos dados obtidos por meio dessas interações, a equipe da Report, com orientação dos pontos focais da OIM e do Pacto Global, fez uma imersão em materiais e publicações setoriais e realizou entrevistas com especialistas no tema. Aprofundamento A imersão na temática de migração internacional e diversidade iniciou-se a partir de materiais publicados pela Organização das Nações Unidas (ONU) e algumas de suas agências, como a própria OIM, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), entre outros. Além disso, buscou-se também a visão de outras entidades de idoneidade reconhecida, como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD), a McKinsey & Company e o Núcleo de Estudos de População (NEPO), da Universidade Estadual de Campinas, exemplificativamente. O objetivo do aprofundamento realizado foi aumentar a familiaridade com os principais conceitos envolvidos nas temáticas relativas à pesquisa proposta, assim como criar uma maior proximidade com as vantagens identificadas na conquista de maior diversidade dentro de uma organização e as desvantagens e preconceitos percebidos por parte da sociedade. Alguns dos materiais consultados durante esse processo de imersão foram utilizados também para a análise e interpretação dos resultados obtidos e estão listados no capítulo de Referências. 18 Entrevistas com especialistas A convite do ponto focal da OIM, foram propostas entrevistas com especialistas na temática de migração internacional no Brasil. A princípio foram selecionados três respondentes que pudessem apresentar panoramas diversificados dos imigrantes no país: sob o ponto de vista social, do ponto de vista da regulamentação legal e também acadêmico. As conversas com os especialistas entrevistados foram realizadas por telefone e utilizou-se uma pauta base de entrevista semiestruturada, com bastante abertura para as considerações e colocações percebidas como mais relevantes sob os pontos de vista de atuação de cada um deles. Estudo da regulamentação nacional O estudo da legislação nacional relativa ao acesso dos migrantes internacionais ao mercado de trabalho teve como objetivo a identificação de barreiras legais para a contratação desse grupo pelas empresas no Brasil. A intenção desse estudo não foi esgotar a pesquisa sobre o tema, mas sim conhecer a legislação concernente e possíveis dificuldades legais na contratação de imigrantes, para que as empresas interessadas na contratação desse grupo possam receber orientações sobre os procedimentos disponíveis e cabíveis. A base para a compreensão da legislação atual no tema foi a chamada Lei de Migração – Lei nº 13.445 de 24 de maio de 2017, regulamentada pelo Decreto nº 9.199, de 20 de novembro de 2017. Entre as garantias oferecidas aos imigrantes estão a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade; acesso aos serviços públicos de saúde e educação; assim como registro da documentação que permite ingresso no mercado de trabalho e direito à previdência social. 4.2 Entrevistas com executivos Seleção de entrevistados Com o auxílio da Rede Brasil do Pacto Global, foram selecionadas 13 de suas empresas signatárias para a realização de entrevistas com executivos que atuam em áreas afins ao tema de imigração, como gestão de pessoas, responsabilidade social ou sustentabilidade. Esses executivos foram convidados diretamente pelo ponto focal do Pacto Global e o agendamento e condução das entrevistas ficaram sob responsabilidade da equipe da Report. As empresas foram selecionadas de forma a proporcionar um panorama abrangente do cenário nacional. Para tanto, levou-se em consideração o setor de mercado, o engajamento em questões de diversidade e também a proximidade com outras iniciativas do Pacto Global. Como o foco da pesquisa foi conhecer não somente as experiências com a contratação de imigrantes, mas também a percepção das dificuldades e barreiras que as empresas podem encontrar durante esse processo, a seleção abrangeu empresas que possuíam ou não imigrantes internacionais em seu quadro de funcionários. 19 Ao final do processo, foram convidadas mais quatro empresas para participarem dessa etapa, de modo a aprimorar a amostra do estudo. Roteiro de entrevistas O roteiro das entrevistas foi elaborado de forma estruturada, em quatro fases distintas, sendo elas: Questões gerais Com foco no entendimento da atuação do entrevistado na empresa, bem como a impressão geral do entrevistado sobre a migração no Brasil; Questões de contexto Com foco no entendimento/proximidade da empresa com o tema e reforçar a diferenciação de migrantes, refugiados e migrantes vulneráveis, além de conhecer a percepção dos entrevistados sobre o que é mais crítico; Questões específicas Foco na estratégia da empresa sobre a temática de migração; Questões direcionadas Aplicadas somente para as empresas que já possuem ações concretas no tema por meio da iniciativa Empoderando Refugiadas4, com foco nas lições aprendidas com a participação no projeto e como essas podem ser aplicadas à realidade das empresas. Buscou-se registrar também as experiências dos entrevistados e percepções sobre ações a serem tomadas para ampliar o acesso dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro. O procedimento adotado para as entrevistas foi: a. Identificação da pesquisa e do pesquisador; b. Consentimento para gravação da entrevista e publicação dos dados, e asseguração do anonimato da pessoa e da empresa; e c. Formulação das questões do roteiro (conforme Anexo II). As entrevistas foram realizadas por um consultor da Report, por telefone, entre os meses de maio e agosto de 2018. Foram utilizadas principalmente para identificação do cenário atual de políticas de diversidade das organizações e da presença de políticas focadas em migrantes internacionais, além das experiências já vivenciadas com a contratação desses imigrantes, ou de refugiados, e as dificuldades encontradas. Consolidação de resultados A finalidade da realização das entrevistas com executivos de diversas empresas foi recolher informações qualitativas que permitissem conhecer a importância da diversidade do corpo de funcionários para a empresa, os benefícios ou riscos associados a ela e as principais dificuldades para a incorporação de imigrantes no quadro de trabalhadores. 4 O projeto Empoderando Refugiadas é uma das principais ações da Rede Brasil do Pacto Global no tema das migrações, mantida em parceria com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados e a ONU Mulheres. Atualmente o projeto está em sua terceira edição. 20 As respostas obtidas foram analisadas de acordo com os critérios iniciais: políticas de diversidade da empresa e relação com a estratégia de negócios; benefícios ou riscos associados da presença de imigrantes na empresa; e dúvidas ou preocupações específicas na contratação. Devido ao caráter qualitativo da consulta, não se espera obter generalizações a partir das respostas obtidas, não somente devido ao tamanho reduzido da amostra, mas principalmente porque as entrevistas objetivaram uma análise exploratória, visando aprofundar conhecimentos, dos temas relevantes para a imigração do ponto de vista das empresas. 4.3 Consulta online Convocação de participantes A consulta online ocorreu por meio da aplicação de um questionário com perguntas abertas e fechadas e teve como objetivo ampliar o escopo de informações da pesquisa, permitindo que colaboradores de diversas áreas e em diversos cargos dentro das empresas pudessem apresentar suas opiniões sobre a temática da migração. Os participantes foram convocados por meio de e-mail convite enviado diretamente pelo Pacto Global, o que abrangeu toda a rede de signatários, o Comitê Brasileiro do Pacto Global e o Grupo de Trabalho em Direitos Humanos e Trabalho, em uma amostra total de 1.665 mensagens. O comunicado continha uma breve introdução da pesquisa e também o endereço eletrônico para acesso ao questionário. O questionário Os respondentes acessaram o questionário por meio de uma plataforma online da Report. Além das questões propostas, a plataforma trouxe importantes conceitos relativos à pesquisa, como a introdução da distinção entre migrantes internacionais, migrantes vulneráveis e refugiados, para minimizar o risco de confusão entre essas categorias pelos respondentes. A apresentação dessas definições foi elaborada em conjunto entre os envolvidos na condução da pesquisa. Os conceitos apresentados foram: Migrantes internacionais Toda pessoa que muda seu lugar de residência para outro por um tempo indeterminado. Em geral, o migrante busca um novo lugar de residência onde as possibilidades de trabalho e as características sociais sejam mais satisfatórias do que no lugar onde vivia anteriormente. Migrantes internacionais vulneráveis Aquele que tem sua capacidade diminuída para resistir, lidar ou se recuperar de situações de violação de direitos ou de violência. Um exemplo são os migrantes que deixam seu país de forma precária fugindo de crises econômicas ou calamidades ambientais. Nos últimos anos, estima-se que o Brasil tenha recebido mais de 50.000 haitianos e 30.000 venezuelanos em condições de vulnerabilidade. 21 Refugiados Os refugiados são também, por definição, migrantes vulneráveis; porém, nem todo migrante vulnerável é um refugiado. Este último se caracteriza pela perseguição em seu país natal devido à sua etnia, religião, nacionalidade, convicção política ou pertencimento a certo grupo social e, portanto, estão impedidos de retornar ao seu país em segurança. Segundo o Comitê Nacional para os Refugiados, do Ministério da Justiça, os maiores contingentes de refugiados que chegaram ao Brasil em 2016 vieram da Síria (326 casos), do Congo (189 casos) e do Paquistão (98 casos). Mulheres migrantes Mulheres que deixaram seu país de origem e, devido ao gênero, estão sujeitas a vulnerabilidades específicas, pois são expostas a diferentes formas de violação de direitos e violência psicológica, física ou sexual. Estima-se hoje que a metade dos migrantes do mundo seja formada por mulheres e meninas de diferentes idades. Xenofobia Medo ou antipatia ao que vem do estrangeiro. O questionário continha um total de 19 perguntas, entre questões abertas e fechadas (com seleção de alternativas); muitas das questões fechadas eram seguidas por pedidos de justificativa para a resposta selecionada. A estrutura utilizada para a consulta online foi (conforme Anexo I): a. Introdução, contendo a descrição dos objetivos da pesquisa, asseguração da confidencialidade e uma contextualização sobre a migração no Brasil; b. Identificação do respondente e da empresa a que está ligado; c. Contextualização sobre as políticas de diversidade da empresa; d. Seleção de dificuldades ou barreiras encontradas na contratação dos migrantes e na sua presença na empresa; e. Identificação dos impactos da presença de imigrantes internacionais no corpo de funcionários; e f. Encerramento e abertura para considerações finais. A consulta online esteve disponível entre 06 e 14 de junho de 2018 na plataforma digital da Report; um reforço do convite à participação na pesquisa foi encaminhado ao mesmo mailing inicial no dia 11 de junho de 2018. Consolidação de resultados As respostas obtidas via consulta online foram analisadas inicialmente questão a questão, visando destacar os principais padrões dentre as respostas obtidas; as questões abertas, da mesma forma que as entrevistas pessoais, foram analisadas com ênfase em seu conteúdo e não necessariamente no número de repetições dentre os retornos obtidos. 22 5 Resultados 5.1 Estudo da legislação nacional Apesar de uma série de avanços recentes, a regulamentação nacional é considerada pelos respondentes como um entrave para a inclusão de trabalhadores migrantes nas empresas que atuam no Brasil. O estudo da evolução das principais legislações federais brasileiras relativas ao tema teve por objetivo identificar se as mesmas atuam em sentido positivo em relação à inclusão ou se podem ser consideradas barreiras para o acesso dos migrantes ao mercado de trabalho. A chamada política migratória nacional compreende o conjunto de ações do governo para regular a entrada, a permanência e a saída de pessoas do território nacional, bem como as ações destinadas a regular a manutenção dos laços entre Estado e os seus nacionais que residam no exterior.5 A nova Lei de Migração, Lei 13.445, de 2017, prevê em seu artigo 120 que “A Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia terá a finalidade de coordenar e articular ações setoriais implementadas pelo Poder Executivo federal em regime de cooperação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com participação de organizações da sociedade civil, organismos internacionais e entidades privadas, conforme regulamento”, mas até o momento da conclusão dessa pesquisa o governo ainda trabalhava na edição da regulamentação. Para depreender a extensão de suas consequências no que tange ao acesso ao mercado de trabalho, é importante entender quais foram as medidas adotadas pelo governo no que diz respeito à entrada e permanência dos imigrantes no território nacional. É relevante considerar o tratamento do tema na Constituição Federal, já que esta é responsável por nortear o plano jurídico nacional. A Constituição brasileira faz menção a “estrangeiros” em alguns de seus artigos; dentre os mais relevantes está o art. 5º, em que se garante a igualdade entre os brasileiros e os estrangeiros residentes, mencionando a impossibilidade de extradição por crime político ou de opinião e também a proteção do cônjuge e dos filhos brasileiros de estrangeiros ao garantir a aplicação da lei mais favorável. A Constituição, de forma geral, é bastante concisa no tema, por isso sua regulamentação por outros dispositivos normativos foi de fundamental importância. O Estatuto do Estrangeiro, a lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980 – regulamentada pelo Decreto nº 86.715/80, foi um dos instrumentos normativos concernentes ao tema das migrações – é anterior à Constituição Federal e foi criado ainda durante a vigência do regime ditatorial no Brasil, tendo sido revogado pela lei 13.445, de 2017. Seu conteúdo 5 SICILIANO, A.L. A política migratória brasileira: limites e desafios. Tese (Mestrado em Direito Internacional) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2013 23 estava inserido na lógica da segurança nacional, e fazia pouco para assegurar os direitos dos migrantes definidos posteriormente na Constituição. O texto da nova Lei de Migração apresenta uma visão contemporânea e compatível com os fluxos migratórios mundiais e foi considerado inovador, por pautar-se nos direitos humanos e buscar reduzir a discriminação aos migrantes, oferecendo-lhes oportunidades de inserção no mercado de trabalho. Esse novo arcabouço legal representa um grande avanço no trato da questão migratória no Brasil e abre a perspectiva de esperança para os coletivos migrantes que já se encontram por aqui, para aqueles que estão por vir e para os brasileiros que emigraram para o exterior. O país passou a ter uma das legislações mais modernas no trato das políticas migratórias, avançando no tratamento dos pilares que sustentam a integração plena do migrante à sociedade brasileira ao assegurar o pleno acesso aos serviços, garantindo a reunião familiar, reconhecendo a formação acadêmica obtida no exterior, permitindo a associação sindical e política, facilitando a inclusão laboral, repudiando práticas de discriminação e descriminalizando a migração e repudiando práticas de deportações coletivas.6 A Lei de Migração entende a migração como um fenômeno da humanidade e simplifica diversos procedimentos administrativos para o imigrante. Ainda que haja a necessidade de um processo para internalização das novas regulamentações nos órgãos que lidam diretamente com os imigrantes, a expectativa é de grandes avanços nos próximos anos, principalmente no que tange à garantia dos direitos trabalhistas e a melhoria do acesso já garantido aos serviços de proteção social. Entre os princípios e diretrizes que regem a política migratória brasileira está o acesso igualitário e livre do migrante ao trabalho. Para que este acesso seja assegurado é necessário que o migrante tenha entrado regularmente no país e tenha documentação regular, o que deve ser promovido pelo Estado. Entre a documentação regular está a obtenção de visto para o trabalho. A Lei de Migração afirma que o migrante não pode trabalhar no Brasil sem ter visto específico para o trabalho. Ao imigrante que venha ao Brasil com o intuito de estabelecer residência por tempo determinado, a Lei de Migração assegura a concessão de visto de trabalho temporário; esse visto poderá ser concedido ao imigrante que venha exercer atividade laboral, com ou sem vínculo empregatício no Brasil, desde que comprove oferta de trabalho formalizada por pessoa jurídica em atividade no país, dispensada a exigência se o imigrante comprovar titulação em curso de ensino superior ou equivalente. O visto temporário de trabalho autoriza, portanto, o imigrante a exercer qualquer atividade de trabalho legal no país, inclusive na condição de empregado, caso em que será regido pela legislação trabalhista aplicável a qualquer trabalhador brasileiro, enquanto trabalhar no Brasil. Caso a opção seja pelo estabelecimento de residência permanente no Brasil, nas hipóteses previstas na regulamentação específica (como quando o imigrante é cônjuge de cidadão brasileiro, tem filho de na- 6 OLIVEIRA, A.T.R. Nova lei brasileira de migrações: avanços, desafios e ameaças. Revista brasileira de estudos da população, vol.34, n.1 São Paulo, jan-abr 2017 24 cionalidade brasileira, etc.), o migrante é considerado como um brasileiro, e sua contratação como empregado continua sendo regida normalmente pela lei trabalhista brasileira. Além disso, a nova lei facilita o acesso do imigrante à documentação necessária para viabilizar sua permanência legal no país, permitindo seu acesso ao mercado de trabalho formal, situação dificultada pelo antigo Estatuto do Estrangeiro. Isso deverá trazer impactos positivos na regularização e formalização do trabalho de muitos trabalhadores migrantes que estavam na informalidade por ausência da documentação necessária. 5.2 Entrevistas com executivos Caracterização dos participantes Para a etapa de entrevistas com executivos de empresas signatárias da Rede Brasil do Pacto Global foram convidados inicialmente 13 participantes. Após uma primeira rodada de confirmação de disponibilidade, foram convidadas mais quatro empresas para a etapa de entrevistas, totalizando 17 convidadas e 11 entrevistadas. A seleção dos participantes objetivou a obtenção de um panorama amplo de ações já realizadas por essas empresas e das percepções sobre diversidade e migração internacional. Por isso, as empresas convidadas pertenciam a 10 setores diferentes da economia, sendo eles: indústria de bens e serviços, investimentos e serviços imobiliários, óleo e gás, químico, seguro de vida, serviços de suporte, serviços financeiros, software e serviços de informática, tecnologia e varejista. Vale destacar que o setor genérico com mais representantes foi o da prestação de serviço, que compreendeu quase 50% das empresas convidadas. Entre as 11 empresas que participaram das entrevistas, estiveram mais representados os setores de serviços de suporte (3) e serviços financeiros (3). Além disso, tivemos representante dos setores de bens e serviços (1), varejo (1), químico (1), investimentos e serviços imobiliários (1) e softwares e serviços de informática (1). As três empresas que declinaram a participação, seja por conflito de agenda de seus executivos ou por entenderem que não colaborariam de forma significativa para a pesquisa, pertenciam aos setores de tecnologia, óleo e gás e indústria de bens e serviços. Dentre os executivos selecionados para as entrevistas, estavam presentes gerentes, líderes, coordenadores, entre outros de três áreas principais: gestão de pessoas/recursos humanos, diversidade e sustentabilidade. A maioria das empresas entrevistadas já possui migrantes internacionais em seus quadros de funcionários (expatriados, migrantes ou refugiados). Políticas de diversidade Com o objetivo de compreender a atuação das empresas participantes na temática de diversidade e inclusão, os respondentes descreveram 25 as atuais políticas de diversidade e outras políticas correlatas presentes em suas companhias. Somente duas empresas não tinham política de diversidade formalizada, mas ainda assim possuem estrutura interna para a discussão da diversidade, definição dos principais eixos de atuação e conscientização interna. Pode-se afirmar que a diversidade e a inclusão estão na pauta de todas as empresas entrevistadas, sendo os principais temas abordados: gênero, LGBT+, 50+, PCD (pessoas com deficiência) e cor e raça. A estrutura da governança do tema é variada, incluindo a existência de comitês deliberativos, com a presença de vice-presidentes corporativos com foco no desenvolvimento e avaliação dos programas internos; a existência de uma área inteira dedicada à questão; até a gestão do tema via áreas corporativas como sustentabilidade ou gestão de pessoas. As formas citadas de atuação na temática também variaram bastante. Foram descritos programas de engajamento, com promoção de discussões, disseminação de conhecimentos e treinamentos especializados; comemoração de datas significativas para os grupos abordados nas políticas internas, como Dia do Orgulho LGBT, Abolição da Escravatura e Dia da Mulher, entre outros, com foco na promoção de conhecimentos e na luta pela quebra de preconceitos; programas de capacitação e retenção de públicos específicos, como PCDs e transgêneros; e grupos de discussão formados por colaboradores e focados em temas significativos, entre outros. Ficou clara a importância que o desenvolvimento de uma cultura de inclusão tem na acolhida dos diversos públicos abrangidos, pois, conforme apontado por diversos respondentes, criar um ambiente diverso não é a etapa mais complicada deste processo e sim assegurar a perenidade da presença dessas minorias na empresa, de forma humana e responsável. O preparo de um ambiente de trabalho propício à inclusão, portanto, com a presença de colaboradores e líderes capacitados, foi apontado como uma etapa crucial para o avanço da diversidade nas empresas, assim como a necessidade da promoção da aculturação corporativa. “Para (as políticas de diversidade incluírem) a migração, precisaria haver um trabalho mais próximo para o aprimoramento da língua e acompanhamento, porque são públicos mais críticos, que exigem uma necessidade de atenção maior e a criação de uma cultura à parte.” Coordenadora de sustentabilidade corporativa Empresa de serviços financeiros 26 Quanto à inclusão de migrantes internacionais, apenas quatro das empresas participantes afirmaram que suas políticas de diversidade consideram este tema, seja abordando migrantes ou refugiados. Para a maioria das empresas que não incluem os migrantes, é necessário primeiro aprofundar as tratativas de diversidade de forma geral, sem focar em grupos ou minorias, para daí avançar para questões e públicos específicos. Alguns respondentes afirmaram que a empresa busca trabalhar com diversidade de forma ampla, de maneira profunda, mas sem apontar grupos específicos ou sem segregar minorias. Dificuldades na contratação de migrantes internacionais Foram várias as dificuldades percebidas na contratação de migrantes internacionais. Iniciando-se com questões burocráticas enfrentadas por esse grupo, como a dificuldade de abertura de conta bancária e de acesso à documentação necessária para estar em dia com as questões trabalhistas; a documentação é apontada como um fator mais relevante quando se tratam de migrantes vulneráveis. Algumas empresas solucionaram este ponto através de parceiras com organizações não governamentais (ONGs), e outras entidades do terceiro setor, que já auxiliam os migrantes a se preparem para acessarem o mercado de trabalho. Ainda sobre questões burocráticas internas, foi relatada a dificuldade de integrar esses colaboradores à folha de pagamento, sendo necessário que as áreas de gestão de pessoas flexibilizem alguns processos – principalmente relacionados à documentação e à apresentação de certificados e outras comprovações de formação profissional, já que muitos dos profissionais têm dificuldade em validar diplomas e certificados. “Não existe parte prejudicial (na inclusão de migrantes), mas há a necessidade de adaptar o ambiente para a recepção da diversidade. É uma jornada que depende de mudança cultural, o que leva um tempo para conquistar.” Gerente de sustentabilidade Empresa de serviços financeiros 27 A língua foi colocada como uma barreira à comunicação e à integração dos migrantes, mas também como um diferencial do ponto de vista de trocas culturais entre os colaboradores. Foi relatada a necessidade de preparo da empresa para o recebimento de migrantes, com comunicação, treinamento, engajamento e preparo dos gestores – mas também com atuação direta juntos aos colaboradores migrantes para que possam se adaptar a uma realidade corporativa diferente do que viviam em seus países de origem. Esse processo de aculturação deve incluir a criação de um ambiente de respeito, com empatia e acolhimento, para evitar conflitos e mal-estar entre migrantes e nativos. Conflitos que podem ser aprofundados devido ao contexto nacional de desemprego e de competitividade entre nativos e estrangeiros. “Na sociedade brasileira como um todo, há desconhecimento e preconceito. É curioso, porque a migração está na própria formação do país.” Coordenadora Empresa de serviços de suporte Outra dificuldade apontada foi em relação ao conceito de carreira, que pode ser diferente em outros países. Por exemplo, foi relatado que o desenvolvimento do profissional brasileiro está pautado na especialização em uma função ou área, enquanto em alguns países, é focado na formação multidisciplinar e na atuação em diversas áreas enquanto colaborador da empresa. Essa diferenciação faz com que os migrantes não necessariamente possuam o histórico profissional desejado pelas empresas e também gera conflitos de expectativas do desenvolvimento profissional. Quando solicitado um aprofundamento maior na percepção das dificuldades de contratação de migrantes, considerando-se a contratação de migrantes internacionais vulneráveis e mulheres migrantes – grupos que apresentam maiores vulnerabilidades –algumas empresas relataram não haver diferenciação, que a adaptação seria semelhante para homens e mulheres e que estariam mais voltadas para as questões legais e não pessoais. Por outro lado, algumas empresas descreveram a necessidade de um processo de adaptação desses profissionais ainda mais cuidadoso, com implantação de ações afirmativas para a inclusão e mudança de cultura corporativa para garantir a perenidade dos trabalhadores migrantes e impedir a manutenção e a geração de preconceitos. 28 Foi apontada também a maior dificuldade desses grupos em estar com a situação documental regular e a instabilidade dos vistos de permanência temporários. Além da maior probabilidade de ausência de registros e certificações profissionais e maior dificuldade de conseguir as validações devido aos custos envolvidos. As barreiras culturais e sociais podem ser mais acentuadas também. Um exemplo citado foi a limitação da interação das mulheres de determinadas culturas com o público em geral, o que as restringiria no exercício de certas funções nas empresas. Foi relatada também a maior dificuldade em acessar mulheres migrantes em processos de recrutamento tradicionais para vagas que exigem alta capacitação. O entendimento externado foi de que a vulnerabilidade percebida por elas mesmas as fazem buscar vagas abaixo de sua capacidade profissional, pois teriam mais chances de consegui-las. Consequências da diversidade no corpo de funcionários Todas as empresas participantes veem a diversidade no corpo de funcionários como algo positivo, desde que a empresa esteja preparada para gerir essas novas relações. A criação de uma cultura de respeito minimiza as chances de conflitos e de ocorrência de casos de discriminação e racismo entre os colaboradores; e a inclusão deve ser desenvolvida por experiências positivas e não somente por imposição da alta liderança. “Seria mentira dizer que ‘não há dificuldade’. É muito mais cômodo para o gestor contratar pessoas mais parecidas. Mas temos tido surpresas positivas de gestores mais abertos.” Gerente de diversidade Empresa de varejo Dentre os principais benefícios citados estão a maior capacidade de inovação, de solucionar problemas e de atender às demandas do mercado; além da valorização da empresa, aumento da penetração na economia e melhores resultados financeiros. Muitos respondentes relataram o conhecimento de resultados positivos relevantes da diversidade e que não enxergam a possibilidade de uma empresa se manter ativa no mercado sem agir em prol da inclusão e do respeito. Quando se abordou especificamente a presença de migrantes internacionais no quadro de colaboradores, os benefícios relatados incluíram o aumento da motivação da equipe, pois os migrantes são mais engajados; o apoio mútuo entre migrantes e funcionários nativos também 29 em situação de vulnerabilidade; e o enriquecimento cultural devido às múltiplas vivências dos migrantes, sendo esses exemplos positivos de resiliência e adaptação. “O nível de compromisso desses trabalhadores é muito maior porque eles precisam mesmo de uma oportunidade. Então demonstram um nível muito alto de comprometimento, o que contagia os outros funcionários. É um exemplo positivo.” Coordenadora de gestão de pessoas Empresa de serviços de suporte Do ponto de vista de mercado, a empresa apresentaria uma postura diferenciada de exemplo positivo e alinhada ao atual contexto global de migrações e refúgio. Ao mesmo tempo, alguns respondentes relataram que a integração de migrantes internacionais, principalmente os vulneráveis, faz parte da responsabilidade social das empresas, com destaque para aquelas com grande relevância no mercado. Correlação entre migração e a estratégia de negócios das empresas A diversidade é percebida como pertencente a quase todas as estratégias de negócio das empresas, não somente devido aos resultados corporativos financeiros e de performance percebidos, mas também devido à necessidade de atendimento de públicos muito diversos, como é o caso do recorte social brasileiro, que exige inovação e criatividade por parte das empresas, características atingidas com o aumento da diversidade de seus colaboradores. Na maior parte das empresas entrevistadas, não há uma correlação direta entre a presença de migrantes e a estratégia de negócios. Mas de forma indireta foram feitas correlações relacionadas aos objetivos de expansão de negócios e ampliação de mercados de atuação, que seriam facilitadas pela presença de estrangeiros nas empresas, o que agrega novas visões, culturas e estratégias diferenciadas. Aprendizados com projetos especializados Quatro das empresas entrevistadas apoiaram ou ainda apoiam o projeto Empoderando Refugiadas. Esta é uma iniciativa coordenada pela Rede Brasil do Pacto Global, pelo ACNUR e pela ONU Mulheres, com objetivo de capacitar e informar mulheres refugiadas no Brasil para ampliar seu acesso ao mercado de trabalho formal. A iniciativa tem duas principais frentes de atuação: uma diretamente com as mulheres, para conscientização e capacitação e a outra junto a empresas, para engajamento e sensibilização quanto ao tema. 30 Os principais aprendizados relatados estão ligados à importância da comunicação com as migrantes e da necessidade de fornecer informações aparentemente básicas, como comportamentais, de processos e legais, para munir as mulheres de autoconfiança e assegurar o conhecimento de direitos e deveres. São fatores que colaborariam para facilitar o processo de adaptação à convivência corporativa e interpessoal. Da mesma forma, a falta de informação por parte das empresas é uma barreira para a contratação de migrantes vulneráveis (nesse caso, mulheres refugiadas), sendo necessária a divulgação de conhecimentos e o compartilhamento de experiências para estimular as corporações a integrarem migrantes internacionais aos seus corpos de colaboradores. Além disso, os participantes do projeto relataram que puderam abrir o foco de atuação da empresa nas questões de diversidade, passando a incorporar a responsabilidade social empresarial pela oferta de benefícios e de aumento da qualidade de vida para esse público vulnerável. Também ampliaram o olhar da responsabilidade social, pois a inclusão deve passar por uma abertura de oportunidades e não deve ser impedida por barreiras burocráticas internas. Muitos dos respondentes relataram que integrar a questão das migrações internacionais à gestão da empresa é uma necessidade, visto que é uma realidade global que exige posicionamento e pró-atividade de todos os setores da sociedade. Mas para orientação e correta atuação no tema, as empresas precisam estar ligadas a entidades idôneas e representativas, que as possam instruir durante esse processo de inclusão. Comentários finais Após a finalização das questões planejadas, foi aberta a oportunidade de acrescentar temas não abordados durante a entrevista ou de encerrar a conversa com considerações finais. Nesta ocasião, muitos dos respondentes somaram visões às questões levantadas, como a necessidade de focar no trabalho de inclusão das minorias e grupos vulneráveis, visto que todos somos diversos. Além disso, por ser considerado um tema importante para o mundo, em conexão com os interesses globais, a construção de um futuro mais justo e digno passa por considerar que há espaço para todos, sem a necessidade de segregação e divisões. Para parte dos respondentes, a diversidade é considerada como um instrumento para aproveitar o melhor da situação econômica atual (fluxos de migração) e quanto mais pessoas diversas, melhor as empresas conseguirão prestar serviços e atender ao público. A inclusão foi apontada como algo que vai muito além da diversidade, por ser uma questão de responsabilidade social para além dos resultados financeiros da empresa. 31 Para que a diversidade e a inclusão de migrantes possam ser incorporadas à gestão empresarial, foi reforçada a necessidade de desenvolvimento da cultura organizacional, para possibilitar a abertura a novas visões, novas culturas e reduzir os pensamentos e julgamentos preconceituosos, como os xenofóbicos relacionados a disputas de mercado de trabalho. Esse processo de inclusão deve considerar também o ambiente externo às corporações, ou seja, como a sociedade percebe a migração culturalmente, e como as empresas podem abrigar os migrantes de forma ampla, com adaptação de práticas corporativas e advocacy pelo tema, para que haja políticas públicas facilitadoras da inclusão. A necessidade de alterações nos processos tradicionais de recrutamento e seleção foi apontada como ação para permitir a maior inclusão de estrangeiros; assim como a disseminação de informações sobre os processos para contratação e desmitificação da existência de dificuldades e barreiras documentais. Como ponto de atenção, foram apontados os riscos de exploração da mão de obra migrante vulnerável. “...Os caminhos legais (para contratação de migrantes) são ainda tortuosos. Existe a tendência de ‘explorar’ a contratação e subjugar esse público. Pagar salários menores é uma dessas formas de exploração.” Coordenador de sustentabilidade Empresa do setor químico Como exemplo de ação direta de empresas do mercado financeiro para promover a inclusão, foi apontada a necessidade de identificar as barreiras que os migrantes enfrentam para acessar o mercado financeiro. Foi citado um trabalho já iniciado pelo Pacto Global junto aos principais bancos atuando no Brasil para discutir as melhores formas de atender às necessidades básicas de migrantes internacionais, como a abertura de conta bancária e posse de cartão de crédito. Mas a consideração levantada pelo respondente foi a responsabilidade de solidariedade das instituições financeiras em ajudar esse grupo a reconstruir a vida no Brasil, devendo então ser aprofundada a leitura das carências desse mercado para garantir acesso ao crédito imobiliário e ao microcrédito para empreendedores, entre outros. 32 5.3 Consulta online Caracterização dos participantes Durante o período em que a consulta online esteve disponível aos convidados, foram recebidas 72 respostas, todas válidas e completas. As respostas vieram de 57 empresas diferentes, representando ao todo 22 setores da economia – veja distribuição setorial na Figura 01. O setor mais representativo foi o de serviços de utilidade pública, com 22,2% das respostas. Este setor abrange empresas de iluminação, transporte, hospitalar, órgãos públicos, entre outros. As agências de fomento e a indústria de bens e serviços foram as segunda e terceira mais representadas, respectivamente. De maneira abrangente, a categoria de serviços foi responsável pela maior contribuição nas respostas obtidas. Os respondentes ocupam 12 cargos diferentes, dentro de 22 áreas internas das empresas. Os cargos mais representados foram Diretor, Analista e Gerente, respectivamente com 20, 15 e 14 respostas – conforme demonstrado na Figura 02. Já dentre as áreas corporativas, as que mais contribuíram foram Sustentabilidade /Desenvolvimento Sustentável, Administrativos e Responsabilidade Social, - conforme apresentado na Figura 03. Figura 01 NÚMERO DE EMPRESAS PARTICIPANTES DA CONSULTA ONLINE POR SETOR DA ECONOMIA IDENTIFICAÇÃO DO RESPONDENTE, CARGO OCUPADO 7 8 INDÚSTRIA DE BEM E SERVIÇOS AGÊNCIA DE FOMENTO 1 16 VAREJO SERVIÇOS DE UTILIDADE PÚBLICA 2 4 MINERAÇÃO INVESTIMENTO E SERVIÇOS IMOBILIÁRIOS 2 TELECOMUNICAÇÕES 1 3 SEGURADORA QUÍMICO 2 2 SERVIÇOS FINANCEIROS SERVIÇOS DE SUPORTE 2 4 4 ENERGIA COMUNICAÇÃO RECURSOS BÁSICOS 2 2 2 EDUCAÇÃO ADVOCACIA 1 ÓLEO E GÁS 2 LOGÍSTICA 1 1 ALIMENTOS E BEBIDAS SOCIEDADE CIVIL 72 TOTAL DE RESPOSTAS ASSISTÊNCIA MÉDICA 3 TECNOLOGIA 33 72 TOTAL DE RESPOSTAS Figura 03 NÚMERO DE RESPONDENTES POR ÁREA DA EMPRESA IDENTIFICAÇÃO DO RESPONDENTE, ÁREA DE ATUAÇÃO 14 1 SUSTENTABILIDADE/ DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMPLIANCE 13 1 ADMINISTRATIVO CRIAÇÃO & PLANEJAMENTO 10 1 RESPONSABILIDADE SOCIAL EXECUTIVO 9 1 GESTÃO DE PESSOAS/ RECURSOS HUMANOS FARMACÊUTICO 4 1 COMUNICAÇÃO FINANCEIRO 3 1 JURÍDICO GESTÃO DE PROJETOS 2 1 GESTÃO DA QUALIDADE INTELIGÊNCIA ESTRATÉGICA 2 1 SAÚDE E SEGURANÇA REESTRUTURAÇÃO 2 1 TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO RELAÇÕES INSTITUCIONAIS E SOCIOECONOMIA 1 1 AUDITORIA INTERNA RELAÇÕES INTERNACIONAIS 1 1 COMERCIAL SISTEMA INTEGRADO DE GESTÃO 72 TOTAL DE RESPOSTAS 2,8% SUPERVISOR 2,8% CONSULTOR 4,2% ESTAGIÁRIO 6,9% ESPECIALISTA 9,7% COORDENADOR 19,4% GERENTE 20,8% ANALISTA 27,8% DIRETOR 1,4% 1,4% 1,4% 1,4% ALMOXARIFE ASSISTENTE CHEFIA PRESIDENTE Figura 02 NÚMERO DE RESPONDENTES POR CARGO OCUPADO IDENTIFICAÇÃO DO RESPONDENTE, CARGO OCUPADO 34 Conhecimento prévio sobre o tema Dentre os respondentes, 87% afirmaram conhecer o conceito de migrante vulnerável. Para assegurar que todos tivessem a mesma informação acerca do tema, foi apresentado a todos os participantes o conceito definido em conjunto entre os responsáveis pela pesquisa. O conceito foi apresentado logo em seguida à resposta à pergunta. Figura 04 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE AFIRMAM CONHECER O CONCEITO DE “MIGRANTE VULNERÁVEL”: VOCÊ SABE O QUE É UM MIGRANTE VULNERÁVEL? 87,5% SIM 12,5% NÃO 72 TOTAL DE RESPOSTAS Presença de políticas de responsabilidade social Com o objetivo de compreender a extensão da atuação das empresas no tema de diversidade e inclusão, foi questionado aos respondentes se há políticas de responsabilidade social em suas companhias. Mais da metade (53%) afirmou que a empresa possui tais políticas (Figura 05). Desse recorte, somente 10% tratam diretamente de migrantes vulneráveis, enquanto outros 8% tratam de refugiados. Mais de 80% das políticas não abrangem temas ligados diretamente à migração internacional (Figura 06). Figura 05 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE AFIRMAM QUE SUA EMPRESA POSSUI POLÍTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL SUA EMPRESA POSSUI POLÍTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL (COM TEMAS SOBRE DIVERSIDADE E INCLUSÃO)? 52,8% SIM 72 TOTAL DE RESPOSTAS 37,5% NÃO 9,7% NÃO SEI Figura 06 POLÍTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL ABRANGENDO MIGRANTES: ESSAS POLÍTICAS DE DIVERSIDADE E INCLUSÃO TRATAM DIRETAMENTE DE MIGRANTES INTERNACIONAIS VULNERÁVEIS? 7,9% SIM, ESPECIFICAMENTE REFUGIADOS 81,6% NÃO 38 TOTAL DE RESPOSTAS 0,0% NÃO SEI 9,7% SIM, MIGRANTES VULNERÁVEIS EM GERAL 35 Para os 38 respondentes (53%) que confirmaram a existência de políticas de responsabilidade social na empresa, foi ainda questionado sobre os principais temas que as mesmas englobam. Com o objetivo de compreender a sinergia entre tais políticas e a questão da migração internacional, as respostas foram avaliadas considerando-se a presença dos assuntos: migrantes internacionais vulneráveis, vulnerabilidade, diversidade e direitos humanos. Mais da metade das políticas de responsabilidade social incluem a questão da diversidade, enquanto somente cinco não possuíam nenhum dos temas considerados (Figura 07). Cerca de 68% dessas políticas tratam de apenas uma das temáticas analisadas, enquanto 29% abrange mais do uma delas. Figura 07 TEMAS PRESENTES NAS POLÍTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL SUA EMPRESA POSSUI POLÍTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL E QUAIS PRINCIPAIS TEMAS QUE ELAS ENGLOBAM? 5 NENHUM/ OUTROS TEMAS 6 VULNERABILIDADE 24 DIVERSIDADE 11 DIREITOS HUMANOS 38 TOTAL DE RESPOSTAS Presença de políticas internas para a contratação de mulheres Por representarem um recorte mais aprofundado dentro do objeto desta pesquisa, foi questionado a todos os respondentes sobre a presença de políticas internas voltadas especificamente para a contratação de mulheres. Pouco mais de 5% não soube responder à pergunta, enquanto mais da metade dos participantes afirmou não haver tais políticas; apenas 39% respondeu positivamente à questão (Figura 08). Para as respostas afirmativas, foi questionado se tais políticas tratam especificamente da contratação de mulheres migrantes, 75% afirmou que não há tal enfoque, 14% afirmou que há, enquanto 11% não soube responder (Figura 09). Figura 08 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE AFIRMAM QUE SUA EMPRESA POSSUI POLÍTICAS DE CONTRATAÇÃO DE MULHERES EXISTEM POLÍTICAS INTERNAS VOLTADAS PARA CONTRATAÇÃO DE MULHERES? 55,6% NÃO 38,9% SIM 5,6% NÃO SEI 72 TOTAL DE RESPOSTAS 36 Figura 09 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE AFIRMAM QUE AS POLÍTICAS DE CONTRATAÇÃO DE MULHERES LEVAM EM CONSIDERAÇÃO MULHERES MIGRANTES ESSAS POLÍTICAS LEVAM EM CONSIDERAÇÃO QUESTÕES ESPECIFICAMENTE RELACIONADAS ÀS MULHERES MIGRANTES? 75,0% NÃO 14,3% SIM 10,7% NÃO SEI 28 TOTAL DE RESPOSTAS Presença de migrantes internacionais na empresa A todos os respondentes foi questionada a presença de migrantes internacionais em suas empresas. Praticamente metade deles afirmou que não há, enquanto 36% confirmou a presença; 15% dos participantes não soube responder (Figura 10). Figura 10 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE AFIRMAM CONTAR COM A PRESENÇA DE MIGRANTES INTERNACIONAIS NA EMPRESA SUA EMPRESA POSSUI MIGRANTES INTERNACIONAIS EM SEU QUADRO DE FUNCIONÁRIOS? 48,6% NÃO 36,1% SIM 15,3% NÃO SEI 72 TOTAL DE RESPOSTAS Aos que confirmaram a presença de migrantes internacionais em suas empresas, questionou-se quais das opções de origem apresentadas melhor descreviam esses não-nacionais. A categoria de migrantes sul-americanos foi a mais representativa, seguida pela de migrantes europeus e caribenhos (Figura 11). Na categoria “Outros”, foi também descrita a presença de migrantes transferidos entre sedes da companhia e de refugiados acolhidos, sem descrição da nacionalidade dos mesmos. 37 Figura 11 NÚMERO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS POR CATEGORIAS QUAIS DAS OPÇÕES APRESENTADAS MELHOR DESCREVEM O PÚBLICO MIGRANTE INTERNACIONAL NA SUA EMPRESA? (SELECIONAR ATÉ TRÊS) 2 OUTROS 1 6 12 HAITIANOS E OUTROS MIGRANTES DO CARIBE BOLIVIANOS, VENEZUELANOS E OUTROS MIGRANTES DA AMÉRICA DO SUL ESTADUNIDENSES, CANADENSES E OUTROS MIGRANTES DA AMÉRICA DO NORTE 1 SÍRIOS, LIBANESES, PALESTINOS E OUTROS MIGRANTES DO ORIENTE MÉDIO 2 9 ALEMÃES, PORTUGUESES, ESPANHÓIS, ITALIANOS E OUTROS MIGRANTES DA EUROPA 2 SENEGALESES, CONGOLESES E OUTROS MIGRANTES DA ÁFRICA BENGALIS, PAQUISTANESES, CHINESES, COREANOS E OUTROS MIGRANTES DA ÁSIA 26 TOTAL DE RESPOSTAS Foi também questionado aos respondentes que afirmaram haver migrantes internacionais em suas empresas que tipo de funções os mesmos exerciam. As principais funções descritas foram cargos executivos e especialistas e técnicos, com 12 e 11 respostas respectivamente; seguidas por cargos administrativos e funções operacionais, ambas com oito respostas (Figura 12). Figura 12 NÚMERO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS POR FUNÇÕES EXERCIDAS NAS EMPRESAS QUAIS FUNÇÕES OS MIGRANTES INTERNACIONAIS NA SUA EMPRESA EXERCEM? (SELECIONAR ATÉ TRÊS) 12 11 8 8 6 2 CARGOS EXECUTIVOS (DIRETOR, GERENTE) FUNÇÕES DE ESPECIALISTAS E TÉCNICOS FUNÇÕES OPERACIONAIS (ASSISTENTES, AUXILIARES, APRENDIZES) CARGOS ADMINISTRATIVOS (ANALISTAS, FUNÇÕES EM ESCRITÓRIO) POSTOS DE CHEFIA (COORDENADOR, SUPERVISOR) OUTROS (ZELADORIA, LIMPEZA E MANUTENÇÃO, SERVIÇOS GERAIS, SEGURANÇA) 26 TOTAL DE RESPOSTAS 38 Para conhecer a forma de abordagem da empresa no momento da contratação de migrantes internacionais, questionou-se quais foram as formas de contratação mais utilizadas. Cerca de 61% dos respondentes disseram que os migrantes foram contratados através dos processos de seleção tradicionais da empresa, enquanto 35% afirmaram que eles vieram transferidos de unidades internacionais (Figura 13). Figura 13 PRINCIPAIS FORMAS DE CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS MENCIONADAS PELAS EMPRESAS QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS FORMAS DE CONTRATAÇÃO DOS MIGRANTES INTERNACIONAIS PELA SUA EMPRESA? (SELECIONAR ATÉ TRÊS) 16 CANDIDATOS A POSTOS DE TRABALHO NOS PROCESSOS DE SELEÇÃO TRADICIONAIS DA EMPRESA 9 TRANSFERIDOS DE UNIDADES DA EMPRESA FORA DO PAÍS 5 INDICADOS POR ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR E/OU PROGRAMAS SOCIAIS DE APOIO AOS MIGRANTES INTERNACIONAIS 1 PROCURADOS ATIVAMENTE PELA EMPRESA EM ATENDIMENTO AOS PROGRAMAS INTERNOS DE DIVERSIDADE 26 TOTAL DE RESPOSTAS Dificuldades presentes na contratação de migrantes vulneráveis Foi solicitado aos respondentes que apontassem, dentro das opções apresentadas, as maiores dificuldades ou barreiras que envolvem a contratação de migrantes internacionais vulneráveis em suas empresas. As mais apontadas foram o recrutamento, a regularidade migratória, a obtenção de vistos de trabalho e documentação (p.e.: obtenção do visto ou carteira de trabalho pelo migrante) e informação. Enquanto não foi considerado por nenhum respondente que questões religiosas fossem uma barreira, somente três apontaram para o preconceito como uma barreira para a contratação (Figura 14). 39 72 TOTAL DE RESPOSTAS Foram também apontadas como barreiras ou desafios a contratação via concursos públicos e o fato de muitos desses apresentarem como pré-requisito o candidato ser de nacionalidade brasileira. Além disso, foi considerado também a valorização do profissional local, além da ausência de posicionamento formal da organização sobre o tema. Do ponto de vista corporativo, foram apontadas questões ligadas à falta de políticas internas claras em relação à contratação de migrantes e à ausência de cultura organizacional nesse tema, além de barreiras ligadas a questões burocráticas e estruturais, e a falta de interesse do time de gestão de pessoas na contratação de migrantes, algumas vezes traduzida na vontade de otimizar a contratação através da seleção somente de brasileiros. “A inclusão de imigrantes internacionais vulneráveis ainda não é vista como uma questão a ser tratada pela maioria das empresas e pela sociedade brasileira. Com isso, a falta de informação sobre o assunto torna-se a principal barreira para a inclusão, a meu ver.” Consultor de sustentabilidade Empresa de telecomunicações 12 OUTRAS 3 PRECONCEITO 0 RELIGIOSAS 8 CULTURAIS RECONHECIMENTO DE DIPLOMAS E CERTIFICAÇÕES 24 26 DOCUMENTAIS 31 LÍNGUA E COMUNICAÇÃO 35 INFORMAÇÃO 38 REGULARIDADE MIGRATÓRIA 39 RECRUTAMENTO Figura 14 PRINCIPAIS BARREIRAS PARA A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS APONTE TRÊS DIFICULDADES OU BARREIRAS QUE ENVOLVEM A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS VULNERÁVEIS NA SUA EMPRESA 40 O aprofundamento da questão profissional, para além da validação de diplomas, foi caracterizado pela necessidade de certificações específicas nacionais ou de registros de profissão – como no caso das profissões autorregulamentadas. Outros fatores apontados foram a falta de conhecimentos técnicos específicos e o idioma como ferramenta para exercer a profissão. Em relação ao acesso, a principal dificuldade apontada foi a identificação dos trabalhadores migrantes, considerando-se a ausência de canais adequados para acesso à mão de obra disponível ou mesmo o fato dos migrantes não acessarem os processos de seleção e recrutamento disponibilizados. Foi descrita também a falta de interesse desses trabalhadores devido à localização da empresa, quando fora do eixo Rio/São Paulo ou longe dos principais centros de acolhida aos migrantes. Apesar de presente entre as barreiras descritas na questão anterior, os respondentes reforçaram em suas justificativas que a ausência dos documentos necessários para a contratação é um dos grandes empecilhos para a integração dos migrantes aos seus quadros de funcionários, seja pela dificuldade em incluir o trabalhador em seus sistemas de registro ou pela necessidade de assegurar a contratação por vias oficiais, para garantir a não violação de direitos. Além disso, para as empresas públicas, cujos processos de seleção ocorrem via concursos, as dificuldades relativas à documentação em dia são ainda mais relevantes, pois a ela se somam as exigências documentais específicas dos certames seletivos públicos. A ausência de informações sobre o tema, desde a falta de reconhecimento da presença de migrantes vulneráveis no Brasil, passando pela questão do preconceito que a desinformação gera, até a falta de experiência das empresas foram parte das barreiras mais relatadas pelos respondentes. Foram também descritas dificuldades associadas à complexa legislação brasileira e à dificuldade do país em atrair e reter profissionais qualificados, além da presença de grande contingente de brasileiros desempregados. Diferenças na contratação de migrantes em geral e migrantes vulneráveis A apresentação das dificuldades e barreiras envolvidas na contratação de migrantes internacionais vulneráveis também pode ser aprofundada sob o olhar das diferenças existentes entre essas contratações e a de migrantes internacionais que não se encontram em condição de especial vulnerabilidade, como os funcionários expatriados de multinacionais. Na pesquisa, metade (50%) dos respondentes afirmam não haver diferenças entre essas contratações. (Figura 15). 41 Figura 15 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE PERCEBEM DIFERENÇAS ENTRE A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES E MIGRANTES VULNERÁVEIS EXISTEM DIFERENÇAS ENTRE A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS E A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS VULNERÁVEIS? 50% SIM 50% NÃO 72 TOTAL DE RESPOSTAS Dentre as razões apresentadas para a existência de uma distinção entre migrantes vulneráveis e não vulneráveis no processo de recrutamento, foram apresentados: o preconceito existente em relação ao grupo vulnerável, considerando-se a maior instabilidade no emprego, a possibilidade de suas experiências de vida afetarem sua performance profissional e o desconhecimento de seu histórico no mercado de trabalho. “Os migrantes internacionais acabam favorecidos por terem chegado ao país em uma condição que propicia sua entrada no mercado de trabalho, além de terem uma melhor estrutura financeira e emocional. Enquanto o vulnerável é prejudicado pela dificuldade de acesso à documentação, por estar em uma situação de maior sofrimento ou risco.” Diretor comercial Empresa de serviços de utilidade pública Foi citada novamente a questão de regularidade migratória no país e de acesso à documentação necessária, seja pessoal, seja profissional. Os participantes entendem que as condições que esses migrantes saíram de seus países os levam a não terem acesso fácil aos seus diplomas e certificados, ao contrário do que acontece com os migrantes internacionais que se deslocam em condições favoráveis, que têm todo o apoio da empresa para sua transferência e documentação. Destacou-se ainda a maior dificuldade de compreender as qualificações 42 profissionais se a formação está vinculada a escolas de ensino superior não reconhecidas internacionalmente. Foram também novamente apontadas as dificuldades de acesso das empresas a esses trabalhadores e a possível falta de procura dos migrantes vulneráveis às vagas disponíveis, além do fato de esse grupo não cumprir os pré-requisitos das vagas disponibilizadas. Outra questão apontada pelos respondentes foi a necessidade de maior apoio e acolhida da empresa para a inclusão dos migrantes internacionais vulneráveis, o que exige investimentos e preparo em antecedência à integração. Além disso, acredita-se que devido à necessidade de ingressar no mercado de trabalho para melhorar suas condições de vida no país, públicos trabalhadores migrantes podem estar mais suscetíveis à exploração irregular de sua mão de obra. Diferenças na contratação de migrantes internacionais vulneráveis e refugiados Devido às grandes similaridades no que toca as vulnerabilidades, foi questionado aos participantes da pesquisa se são percebidas diferenças nas políticas e procedimentos para a contratação de refugiados e de migrantes vulneráveis; 74% das respostas foram negativas (Figura 16). Às respostas positivas, foram solicitadas justificativas para essa percepção e apontadas, por exemplo, as diferenças das tratativas regulatórias entre refugiados e migrantes vulneráveis. No entendimento dos respondentes, devido ao status legal e ao amparo garantido por lei para os refugiados, esse grupo tem maior reconhecimento da sociedade e maior inserção nos programas de acolhida públicos e do terceiro setor. O mesmo acesso não é oferecido aos migrantes internacionais vulneráveis, o que faz com que sua integração ao mercado de trabalho seja mais difícil. Também foi apontado que os migrantes vulneráveis por vezes têm dificuldades documentais e de regularidade migratória que são mais facilmente superadas no caso dos migrantes que obtém o amparo internacional decorrente da solicitação e obtenção da condição de refugiado. Figura 16 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE PERCEBEM DIFERENÇAS ENTRE A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES VULNERÁVEIS E REFUGIADOS HÁ ALGUMA DIFERENÇA NAS DIFICULDADES ENCONTRADAS PARA A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS VULNERÁVEIS E DE REFUGIADOS? 73,6% SIM 26,4% NÃO 72 TOTAL DE RESPOSTAS 43 Diferenças na contratação de mulheres migrantes internacionais Voltando ao objetivo específico de entender a realidade das mulheres migrantes internacionais, foi perguntado aos respondentes se há questões mais críticas na contratação deste grupo específico. As respostas foram em sua maioria (76%) negativas (Figura 17). Figura 17 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE ENTENDEM QUE HÁ QUESTÕES MAIS CRÍTICAS NA CONTRATAÇÃO DE MULHERES MIGRANTES INTERNACIONAIS VOCÊ ENTENDE QUE EXISTEM QUESTÕES MAIS CRÍTICAS NA CONTRATAÇÃO DE MULHERES MIGRANTES INTERNACIONAIS? 76,4% SIM 23,6% NÃO 72 TOTAL DE RESPOSTAS Os fatores apontados como de maior criticidade na contratação de mulheres migrantes passam principalmente por questões culturais, associadas ao preconceito de gênero ainda presente nas empresas nacionais (como a atribuição de responsabilidade da mulher pela criação dos filhos e cuidados da família) ou a questões mais específicas de certas religiões (por exemplo, de não permitir que a mulher vá em busca de oportunidades de emprego). Segundo os respondentes, esses fatores fazem com que elas tenham, em média, menos experiência e menor formação profissional em comparação aos homens. “Em nosso país existe grande discriminação com as mulheres. Sendo elas migrantes, essa discriminação torna-se maior” Chefe de desenvolvimento sustentável Empresa de serviços de utilidade pública 44 Foi constatada a necessidade de um maior preparo das empresas para enfrentar questões de gênero no ambiente corporativo, através de um processo contínuo de sensibilização organizacional, com apresentação de cases de sucesso, e maior interação com entidades de apoio a mulheres, com foco no aumento da empregabilidade e geração de cultura para valorização das mesmas. Impactos da presença de migrantes internacionais na empresa 4 AUMENTA A OCORRÊNCIA DE CONFLITOS Cada respondente selecionou três dentre as possibilidades apresentadas. Os impactos considerados mais propensos a ocorrer são positivos: enriquecimento do ambiente de trabalho, tornando-o mais criativo e propenso ao desenvolvimento de inovações; intensificação das trocas culturais, melhorando a comunicação e o relacionamento entre os funcionários; e o aumento no engajamento e na disposição dos funcionários (Figura 18). 72 TOTAL DE RESPOSTAS Os impactos negativos mais associados à inclusão de migrantes foram a retirada de oportunidades de trabalho de brasileiros, seguida do aumento da ocorrência de conflitos e da geração de competição desleal, geralmente associada com a exploração irregular da mão de obra migrante sem o pagamento dos devidos direitos sociais. Ainda se considerando os possíveis impactos da inclusão de migrantes no corpo de funcionários, foram apresentadas aos participantes da pesquisa visões estratégicas distintas sob três aspectos diferentes – organizacional, de mercado e de marca e reputação. TIRA OPORTUNIDADES DE TRABALHO DE BRASILEIROS 7 10 PREENCHE LACUNAS NOS PROCESSOS DE SELEÇÃO 11 PREENCHE POSTOS DE TRABALHO 26 NÃO IMPACTA 34 AUMENTA O ENGAJAMENTO E A DISPOSIÇÃO 59 INTENSIFICA AS TROCAS CULTURAIS 60 ENRIQUECE O AMBIENTE DE TRABALHO Figura 18 PRINCIPAIS IMPACTOS DA PRESENÇA DE MIGRANTES NAS EMPRESAS ESCOLHA OS TRÊS PRINCIPAIS IMPACTOS QUE A PRESENÇA DE MIGRANTES INTERNACIONAIS PODE TER NO CORPO DE FUNCIONÁRIOS DA EMPRESA 4 GERA COMPETIÇÃO DESLEAL 1 ATRAPALHA O AMBIENTE DE TRABALHO Foram listados diversos impactos possíveis decorrentes da inclusão de migrantes internacionais no corpo de colaboradores das empresas (tanto positivos como negativos). Essas descrições foram retiradas de estudos setoriais sobre a diversidade e a integração de migrantes e tentavam afastar o respondente de uma resposta politicamente correta. 45 Sob o ponto de vista organizacional, os respondentes tinham que optar pela afirmação que melhor representasse sua visão da inclusão dos migrantes na empresa. As opções apresentadas foram: • Otimismo com a capacidade da organização em construir um ambiente mais diverso, podendo tornar os funcionários mais engajados e dispostos e executarem tarefas além de suas responsabilidades; e • Preocupação com a falta de preparo da organização para integrar os migrantes contratados, podendo gerar um ambiente de trabalho segregado, mais propício à geração de conflitos, manifestação de preconceitos e bullying. Já sob o ponto de vista de mercado, os respondentes optaram pela afirmação que melhor representasse as consequências da inclusão dos migrantes na empresa. As opções apresentadas foram: • Otimismo de clientes e investidores, que acreditam no aumento da capacidade da empresa para atender diferentes segmentos sociais e culturais, abrindo novos mercados consumidores a partir de um corpo de funcionários mais diverso; e • Incerteza para clientes e investidores, que podem levantar dúvidas sobre a capacidade e produtividade da empresa com a presença de migrantes internacionais no corpo de funcionários. Por fim, sob o ponto de vista de marca e reputação da empresa, os respondentes selecionaram a afirmação que melhor representasse as consequências da inclusão dos migrantes na empresa. As opções apresentadas foram: • Fortalecimento da marca, uma vez que a contratação de migrantes internacionais pode contribuir com a imagem socialmente responsável da empresa e estimular positivamente sua reputação; e • Fragilidade da marca, uma vez que experiências negativas de outras empresas em relação à violação de direitos humanos dos migrantes internacionais contratados, ou na sua cadeia, podem gerar dúvidas e questionamentos e afetar negativamente a reputação da empresa, bem como devido ao crescimento de movimentos xenófobos. Para os três aspectos apresentados, foi considerado que os impactos são estrategicamente positivos para as empresas (Figuras 19, 20 e 21). 46 Figura 19 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE CONCORDAM COM AS VISÕES ESTRATÉGICAS APRESENTADAS DO PONTO DE VISTA ORGANIZACIONAL DO PONTO DE VISTA ORGANIZACIONAL, A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS SUGERE: 83,3% OTIMISMO COM A CAPACIDADE DA ORGANIZAÇÃO EM CONSTRUIR UM AMBIENTE MAIS DIVERSO 16,7% PREOCUPAÇÃO COM A FALTA DE PREPARO DA ORGANIZAÇÃO PARA INTEGRAR OS MIGRANTES CONTRATADOS 72 TOTAL DE RESPOSTAS Figura 20 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE CONCORDAM COM AS VISÕES ESTRATÉGICAS APRESENTADAS DO PONTO DE VISTA DE MERCADO DO PONTO DE VISTA DE MERCADO, A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS SUGERE: 84,7% OTIMISMO DE CLIENTES E INVESTIDORES 15,3% INCERTEZA PARA CLIENTES E INVESTIDORES 72 TOTAL DE RESPOSTAS Figura 21 PERCENTUAL DE RESPONDENTES QUE CONCORDAM COM AS VISÕES ESTRATÉGICAS APRESENTADAS DO PONTO DE VISTA DE MARCA E REPUTAÇÃO DO PONTO DE VISTA DE MARCA E REPUTAÇÃO, A CONTRATAÇÃO DE MIGRANTES INTERNACIONAIS SUGERE: 97,2% FORTALECIMENTO DA MARCA 2,8% FRAGILIDADE DA MARCA 72 TOTAL DE RESPOSTAS 47 “É muito claro para a companhia que a diversidade e a inclusão são o caminho certo a ser seguido. São diretrizes que trazem valor para o negócio. Apresentam multiformas de pensar, de resolver questões; para trazer inovação, sentimento de pertencimento, agilidade para entender a demanda do mercado.” Gerente de diversidade Empresa varejista Priorização de grupos migrantes em políticas corporativas Tendo em vista o desenvolvimento de políticas corporativas que contemplem migrantes internacionais e que sejam bem-sucedidas quanto à sua inclusão no corpo de funcionários, foi solicitado aos respondentes que indicassem até três dos grupos apresentados como prioritários no desenho de uma estratégia de engajamento. As três prioridades selecionadas foram migrantes internacionais vulneráveis (ex: haitianos e venezuelanos); migrantes qualificados (ex: com curso superior); e mulheres migrantes vulneráveis (ex: haitianas e venezuelanas), com 44, 39 e 39 menções, respectivamente (Figura 22). Figura 22 PRIORIZAÇÃO DE GRUPOS DE MIGRANTES EM POLÍTICAS CORPORATIVAS UMA POLÍTICA COORPORATIVA BEM-SUCEDIDA QUE CONTEMPLE OS MIGRANTES INTERNACIONAIS DEVE PRIORIZAR QUAIS DOS GRUPOS ABAIXO? (ESCOLHER ATÉ TRÊS OPÇÕES) 44 39 39 34 25 MIGRANTES INTERNACIONAIS VULNERÁVEIS (EX: HAITIANOS E VENEZUELANOS) MIGRANTES QUALIFICADOS (EX: COM CURSO SUPERIOR) MULHERES MIGRANTES VULNERÁVEIS (EX: HAITIANAS E VENEZUELANAS) REFUGIADOS E SOLICITANTES DE REFÚGIO (EX: SÍRIOS E CONGOLESES) MULHERES REFUGIADAS (EX: SÍRIAS) 72 TOTAL DE RESPOSTAS 3 OUTROS 48 Para a categoria “Outros”, foi incluída a opção de abranger migrantes internacionais de forma geral, sem distinção entre grupos, e também migrantes com formação técnica. Benefícios da contratação de migrantes para a estratégia de negócios da empresa Por meio de uma questão aberta, foi solicitado aos respondentes que descrevessem os principais benefícios percebidos na inclusão de migrantes internacionais ao corpo de colaboradores. A troca de cultura e de experiências de vida foi um dos benefícios citados, considerando-se a possibilidade de melhora do ambiente de trabalho – desde que realizado preparo prévio para a inclusão desses trabalhadores, com aprendizado mútuo entre migrantes e nativos e exemplo práticos de responsabilidade, resiliência e produtividade. As experiências diversificadas dos migrantes também foram apontadas como benéficas do ponto de vista da apresentação de novas perspectivas de trabalho, de formas diferentes de abordar e resolver problemas, além das possibilidades de inovação, como na gestão de projetos e processos. Esses fatores agregados, possibilitariam também a penetração da empresa em novos nichos de mercado. Além disso, para alguns respondentes, o engajamento em causas humanitárias – como a contratação de migrantes internacionais vulneráveis – é um exemplo das ações concretas de responsabilidade social da empresa, do ponto de vista humanitário e de inclusão social, fortalecendo a imagem da empresa e agregando valor à marca. “Acreditamos na diversidade e entendemos que a contratação dessas pessoas não apenas está relacionada com a função social da empresa de trabalhar pela inclusão, diversidade e garantia de direitos, mas também enriquece o ambiente de trabalho e as trocas culturais, que estão na base da excelência do trabalho que fazemos.” Especialista Empresa de comunicação A diversidade, apresentada de forma ampla, foi outro dos benefícios apresentados, além do contato próximo com línguas estrangeiras. Também foi apresentada a necessidade de capacitação dos colaboradores para a inclusão dos migrantes e apontado o aumento de custos com essa integração. 49 Riscos da contratação de migrantes para a estratégia de negócios da empresa A seguir, os participantes foram convidados a discorrer sobre os riscos da integração dos migrantes internacionais ao corpo de colaboradores, também através de uma questão aberta. Dentre os riscos relatados estão problemas de comunicação entre funcionários e a adaptação do migrante ao novo emprego, com destaques para as diferenças culturais existentes e a necessidade de adequação a uma nova realidade. No entanto, diversos respondentes apontaram que uma política de inclusão consistente e estruturada, com atuação próximo tanto dos migrantes como dos brasileiros, poderia tornar essa fase de adaptação mais simplificada e reduzir os riscos de conflito. A falta de planejamento na recepção dos trabalhadores migrantes também foi considerada causa para a ocorrência de insatisfação entre os colaboradores e de geração de conflitos internos, que poderiam ocasionar redução de produtividade e prejuízo para a empresa. Da mesma forma, o preconceito dos funcionários brasileiros, a intolerância e a falta de empatia seriam riscos presentes na integração de imigrantes internacionais. “Devido a algumas diferenças culturais e à eventual impossibilidade de apresentar e ou validar documentos do país de origem, pode haver um processo de adaptação mais longo. É necessário ter paciência e flexibilidade.” Analista de responsabilidade social Indústria de bens e serviços O desconhecimento do histórico dos migrantes, profissional principalmente, também foi apontado como risco; assim como a dificuldade de compreender se a formação profissional no exterior se adequa de imediato à cultura, práticas e legislação brasileira. Em paralelo, a necessidade de documentações ou cursos específicos foram apontados como maiores dificuldades para a contratação de trabalhadores migrantes. A situação atual do mercado de trabalho brasileiro também foi apontada como risco para a adaptação dos migrantes, já que colaboradores brasileiros poderiam vê-los como ameaça, dentro de uma realidade nacional de desemprego, e iniciar um processo negativo de competitividade. Outro risco percebido foi a possível alta rotatividade dos trabalhadores migrantes em relação à mão de obra nacional, que faria com que o investimento inicial na adaptação à cultura brasileira e na capacitação das funções dentro da empresa fossem perdidos com o retorno dos migrantes aos seus países de origem, nova migração para outro destino, ou simplesmente com a troca de emprego. Do ponto de vista de empresas estatais, foi colocada a dificuldade de motivar a permanên- 50 cia desses funcionários e de criar planos de carreira que permitam o desenvolvimento de pessoas em situação de vulnerabilidade. Alguns participantes apontaram que não há risco algum na contratação e integração de migrantes internacionais ao quadro de colaboradores, ao menos não maiores do que haveria na adaptação e aculturação de qualquer colaborador, seja ele migrante ou brasileiro. Sugestões para a abordagem do tema na empresa Dentre as ações sugeridas para que as empresas desenvolvam o tema do acesso dos migrantes internacionais ao mercado de trabalho, foi apresentada a criação de um sistema que facilite o acesso a esses trabalhadores em processos de recrutamento e seleção, o que também colaboraria para a maior conscientização sobre a presença e perfil da mão de obra migrante no país. O desenvolvimento de políticas internas para a inclusão de trabalhadores migrantes também foi citado como forma de ampliar o acesso ao mercado de trabalho brasileiro. O incentivo direto à contratação de migrantes por fornecedores e empresas terceirizadas foi apontado como uma forma de as empresas estatais atuarem no tema, já que muitas vezes as mesmas são impedidas de contratar esse público devido aos requisitos apresentados nos concursos públicos. A alteração das legislações pertinentes a esses concursos é outra forma de facilitar o acesso aos empregos públicos. A aproximação das corporações a entidades envolvidas diretamente no tema, como o próprio Pacto Global e o Ministério do Trabalho, entre outras, seria um caminho para que as empresas tivessem acesso a informações que as auxiliem a definir suas políticas de atuação, baseadas em exemplos positivos e melhores práticas. Além do apoio a entidades públicas e do terceiro setor que atuam na qualificação dos migrantes (com informações sobre o país, cultura e valores) e na regularização de sua presença no país, como é o caso de diversas ONGs (qualificação) e da Defensoria Pública da União (regularização). “Creio que seria relevante preparar os migrantes com informações sobre o país, sua cultura e seus valores, bem como os da empresa (...) Propiciar um curso básico de português que facilitasse a sua integração no trabalho de forma mais ágil.” Diretor de gestão de pessoas Empresa de investimento e serviços imobiliários Foi sugerida também a criação de práticas de intercâmbio empresarial, nas quais cada migrante contratado na empresa aqui no Brasil geraria uma oportunidade em outros países para brasileiros que desejam uma experiência internacional. Essa prática amenizaria a visão de reserva de mercado e fortaleceria a troca de experiências e cultura. 51 6 Análise 6.1 Regulamentação A nova Lei de Migração (lei 13.445/2017) estabelece direitos e deveres para migrantes no Brasil. Ela reconhece o migrante, independentemente de sua nacionalidade, como um sujeito de direitos, e promove o combate à xenofobia e a não-discriminação como princípios da política migratória brasileira. Ela também moderniza o sistema de recepção e registro dos migrantes, além de incluir artigos específicos para casos de apatridia (quando a pessoa não possui nacionalidade). Com a nova lei, o Brasil amplia os direitos dos migrantes e facilita o processo para que obtenham seus documentos e regularizem sua situação no país, com condições em acordo com compromissos humanitários firmados pelo país em âmbito internacional. A prática de tratamento humano e digno aos imigrantes que chegam ao país expressa a expectativa de reciprocidade de que brasileiros que emigram para o exterior também tenham sua dignidade e direitos protegidos. Ao desburocratizar e facilitar a inclusão dos migrantes na sociedade brasileira, além de repudiar a discriminação e a xenofobia, a nova lei ajuda a combater a segregação social a que muitos migrantes estão sujeitos. Uma vez integradas à sociedade, essas pessoas possuem melhores condições para contribuir com o crescimento do país. O atual esforço do Estado brasileiro na regulamentação da nova lei, mantido o espírito de simplificação de procedimentos, é avaliado como positivo, reduzindo a sobrecarga burocrática que incide especialmente sobre trabalhadores migrantes em situação de vulnerabilidade. Questionamentos foram levantados a respeito da sobrecarga nos programas sociais. Nesse sentido, vale ressaltar que o trabalhador migrante contribui significativamente para o desenvolvimento econômico, além de pagar impostos diretos e indiretos através do consumo, como qualquer brasileiro. Especificamente quanto à Previdência, cabe destacar que os migrantes, assim como os brasileiros, só têm direitos de aposentadoria e outros benefícios previdenciários após os períodos de contribuição previstos em lei. 52 A Lei de Migração, portanto, atua como agente facilitador da inclusão de migrantes internacionais no mercado de trabalho brasileiro ao facilitar sua integração formal ao tecido produtivo. Ao simplificar o acesso aos documentos necessários para que os migrantes usufruam seus direitos no país, a nova lei dá mais segurança às empresas que contratam trabalhadores migrantes, deixando claras as regras sob as quais essas relações serão regidas. Na medida em que ainda estão pendentes de regulamentação aspectos importantes da nova lei de migração, os entrevistados destacaram a importância de se avançar na simplificação dos processos burocráticos. Também foram destacadas a necessidade de maior disseminação de informações concernentes às etapas desses processos, que tornariam a inclusão dos trabalhadores migrantes internacionais menos complicada, incentivando ainda mais a contratação de trabalhadores migrantes, assim como já ocorre com os refugiados. 6.2 Políticas corporativas para a diversidade O tratamento dos migrantes internacionais pelas empresas pode ser abordado por meio das políticas de diversidade e inclusão. Falar na presença de diferentes perfis de funcionários remete à necessidade de o time da empresa ter representatividade compatível com a diversidade da população nacional. O Brasil é um país diverso e formado historicamente por diferentes fluxos de migrações; apesar da baixa representatividade atual da população de migrantes internacionais no país (menos de 1% da população nacional), esse dado não leva em conta as diversas gerações de descendentes de migrantes que se fixaram no país, e hoje são considerados brasileiros, mas que trazem a multiculturalidade em sua formação. Ter colaboradores com diferentes pensamentos, culturas, etnias e opiniões permite que a empresa se torne mais plural e democrática. A presença cada vez maior de políticas de diversidade e inclusão nas empresas, como refletido nos resultados desta pesquisa, demonstram a relevância do assunto para todos os setores da sociedade e a intenção das organizações em corresponder às expectativas e demandas da atualidade. Em relação aos migrantes internacionais, ainda há muito a ser trabalhado para assegurar sua inclusão no mercado de trabalho brasileiro; a minoria das empresas consultadas apresenta abordagens específicas para esse grupo, demonstrando a necessidade de ampliar a atuação nesta causa. Em contrapartida, muitas das políticas de responsabilidade social descritas pelos respondentes já abordam temas afins à migração, como diversidade, direitos humanos e vulnerabilidade, o que é um ponto positivo no caminho para a inclusão dos migrantes. Alguns respondentes percebem a necessidade de aprofundar a conscientização sobre as questões de diversidade de forma ampla, como a quebra de preconceitos e o estímulo à tolerância, antes de especificar a atuação em grupos e minorias. Isso reflete a realidade da sociedade brasileira, que ainda precisa evoluir muito em direção à inclusão. 53 6.3 Mulheres migrantes Apesar do empoderamento feminino estar tão presente na mídia e na pauta de atuação de muitos ativistas pelo mundo, menos da metade das empresas participantes (39%) informaram possuir políticas específicas para mulheres e uma busca pela equidade de gêneros, o que também demonstra o caminho longo que existe para compreensão desse tema e o espaço para desenvolvimento da cultura de inclusão. Quando perguntadas especificamente sobre políticas para mulheres migrantes, a taxa de retorno positivo é ainda mais baixa: apenas 14% do universo já restrito de empresas com políticas específicas. A pouca proatividade na promoção da equidade de gênero se reflete no fato de que apenas 24% dos respondentes perceberam existir diferenças substancias no processo de contratação de mulheres migrantes. Consideradas as múltiplas exclusões e vulnerabilidades às quais estão expostas as mulheres migrantes, o dado revela a necessidade de uma maior conscientização sobre essa realidade e os mecanismos, existentes e potenciais, para seu enfrentamento. 6.4 Presença de migrantes nas empresas Como foi esclarecido a todos os participantes nas duas modalidades de engajamento na pesquisa, a intenção do trabalho é compreender a atuação das empresas que já incluem migrantes em seus quadros e também apreender dúvidas e possíveis dificuldades identificadas pelas empresas que ainda não trabalham a diversidade sob o aspecto dos migrantes. Cerca de 35% das empresas consultadas afirmaram possuir estrangeiros em seu quadro de colaboradores, sejam eles migrantes tradicionais, migrantes vulneráveis ou refugiados. A maior parte dos estrangeiros é de origem europeia e sul-americana. Apesar de não ser possível afirmar com confiança estatística, percebe-se uma tendência na correlação entre imigrantes europeus e a ocupação de cargos executivos e gerenciais, enquanto tendência similar é percebida entre imigrantes sul-americanos e cargos administrativos e operacionais. Entretanto, a interpretação dos dados é anuviada pela sobreposição de respostas positivas para a presença de ambos os grupos de migrantes nas empresas. Apesar da maior comunidade migrante atualmente residente no Brasil ser a dos portugueses, os principais fluxos de migração percebidos hoje no Brasil não são de europeus, mas migrações Sul-Sul de regiões também em desenvolvimento, como América do Sul e Caribe (a segunda e terceira maior comunidade são os haitianos e os bolivianos, segundo dados da Polícia Federal). A presença destacada de migrantes da Europa provavelmente está atrelada às transferências e expatriações realizadas entre sedes e unidades de empresas multinacionais que atuam no país, o que explicaria a possível correlação entre esse grupo e a presença em cargos gerenciais. Já a presença de migrantes sul-americanos é reflexo das políticas de cooperação internacionais do Mercosul, e também da atual situação política e econômica da Venezuela. Segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), somente nos primeiros seis 54 meses de 2018 cerca de 10 mil venezuelanos entraram no Brasil, o que representa um aumento de 3.000% em apenas três anos. O dado ilustra a necessidade de ampliar a atuação para o amparo dos estrangeiros vulneráveis no país. O terceiro maior grupo de migrantes apontados são os caribenhos, que da mesma forma que os venezuelanos, possuem perfis definidos de migração. A onda de migração do Haiti iniciou-se após o terremoto que devastou o país em 2010 e está refletida na presença nas empresas respondentes. 6.5 Dificuldades na contratação de migrantes Parceiras com entidades especializadas Apesar de demonstrado que muitos migrantes são contratados pelas empresas através de seus processos seletivos tradicionais, uma das grandes dificuldades apontadas na admissão de trabalhadores migrantes é justamente na etapa inicial, o recrutamento. Esta aparente discordância de resultados pode ser justificada pela grande representatividade de empresas do setor de prestação de serviços na amostra desta pesquisa. Como apontado por alguns respondentes, a prestação de serviços muitas vezes requer conhecimentos técnicos específicos, certificações e especializações, ou simplesmente o completo domínio do idioma português, requisitos que os migrantes vulneráveis podem não possuir, em oposição aos migrantes econômicos qualificados. Outras possíveis explicações estão nas diferentes concepções de desenvolvimento de carreira em outros países onde, ao invés de se investir na formação de profissionais especializados – como no Brasil – estimula-se o conhecimento amplo e a rotatividade entre áreas, ocasionando uma menor compatibilidade entre os perfis requerido e disponível. A regularidade da situação migratória foi outra dificuldade muito citada pelos respondentes, ou seja: a necessidade de o candidato ao posto de trabalho possuir a documentação obrigatória para ser contratado nos moldes da legislação trabalhista vigente. Esse é um fator que pode ser mitigado no médio prazo, visto que a recente Lei de Migração previu a facilitação e desburocratização do acesso a essa documentação. Além de assegurar ao imigrante os mesmos direitos do trabalhador nativo. A regulamentação da nova lei dará segurança ao empregador quanto à legalidade da contratação do migrante. O que parece pesar como fator complicador desta questão é o desconhecimento dos gestores de pessoas sobre os tipos e a validade dos documentos apresentados pelo migrante. Por exemplo, mais de um respondente citou que o protocolo de solicitação de visto, emitido pela Polícia Federal quando da entrada do migrante no país, não parece ser suficiente para dar continuidade aos trâmites burocráticos da contratação, devido a sua aparência informal e não oficial. Para ambas as dificuldades levantadas, se apontou que a aproximação junto a entidades especializadas no acolhimento e capacitação de migrantes pode ser útil para aumentar as chances de compatibilidade 55 entre os postos de trabalho disponíveis e os trabalhadores migrantes, e evitar a perda de oportunidades devido à falta de informações concernentes à burocracia do processo. Diversas ONGs e entidades do terceiro setor atuam no acolhimento e integração de migrantes à sociedade brasileira, como a Missão Paz, a Cáritas do Brasil e o Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes (CRAI), para citar apenas algumas daquelas atuantes na cidade de São Paulo. A atuação dessas entidades abrange o apoio à adaptação cultural dos migrantes, não somente em relação ao idioma, mas também aos usos e costumes brasileiros; ao ensino de direitos e responsabilidades do empregado e do empregador; à capacitação através de cursos profissionalizantes; e ao suporte jurídico, entre outras atividades essenciais à acolhida de estrangeiros, ainda mais daqueles em situação de vulnerabilidade. Da mesma forma, foi citado que órgãos da ONU com atuação mais ampla, como a Rede Brasil para o Pacto Global, a OIM e a OIT, são também fundamentais na integração dos temas das migrações nas empresas, visto que possuem informações consolidadas relacionadas ao tema e propõe atividades de sensibilização e disseminação de conhecimentos junto às empresas. Além disso, poderiam viabilizar maior integração entre as demais entidades civis atuantes para proporcionar a melhoria contínua de suas atividades. A proximidade a essas entidades facilitaria a conexão entre candidatos aos empregos e as empresas recrutadoras, e também exerce um papel fundamental na disseminação de conhecimentos relativos aos trâmites burocráticos, direitos e deveres e engajamento na questão das migrações. Além disso, a maior integração entre as políticas públicas concernentes e as demais iniciativas também proporcionaria melhor acolhida e preparo dos migrantes para o acesso ao mercado de trabalho. Uma das sugestões apontadas foi o trabalho conjunto entre iniciativas civis que intermediam questões de emprego e os serviços públicos de acesso ao trabalho, como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) do Ministério do Trabalho. Incentivo pelo exemplo positivo A falta de informações sobre o tema foi destaque em muitas das entrevistas e foi citada também por muitos respondentes da pesquisa online e, portanto, se apresenta como uma das principais barreiras à inclusão dos migrantes nas políticas corporativas de responsabilidade social e diversidade. Os déficits de conhecimento relatados abrangem a presença e a situação dos migrantes no Brasil, o conteúdo da nova Lei de Migração e os direitos e deveres assegurados aos migrantes, as melhores práticas na inclusão de trabalhadores migrantes, entre diversos outros. Considerando-se a necessidade de evoluir nas práticas de inclusão e na conscientização de trabalhadores e da sociedade, foi apontada a maior eficácia de ações de engajamento pautadas no exemplo positivo e não somente pela imposição de uma gerência ou área. Assim, novamente a associação com outras empresas que estão evoluindo seus processos de inclusão e a proximidade com entidades especializadas facilitaria a troca de informações relevantes e de exem- 56 plos práticos de ações de conscientização e sensibilização nas organizações. O maior acesso a informações auxiliaria também as empresas a combaterem reações xenofóbicas relacionadas à busca pela valorização do profissional local em detrimento do migrante e à reserva de mercado aos nativos. É sabido que os migrantes suprem deficiências de determinados perfis de qualificação e déficits de mão de obra em determinadas áreas, não necessariamente concorrendo diretamente com profissionais brasileiros. Em outros casos, a barreira identificada para a contratação de migrantes foi a ausência de uma postura consolidada da empresa para incentivar a inclusão de estrangeiros e desmistificar as dificuldades burocráticas para a integração desse trabalhador. Neste sentido, novamente é a ausência de informações consolidadas que sugere a manutenção de padrões de atuação, sem evoluir para a inclusão de novos grupos de colaboradores. Em relação à comunicação, o idioma foi apontado como uma barreira de menor relevância, mas presente principalmente em setores da economia ou setores internos das empresas em que há menor interação com públicos internacionais. A capacitação antecipada dos migrantes facilitaria sua integração a essas empresas, mas também cabe aos gestores identificarem potenciais intercâmbios culturais entre seus colaboradores, que resultariam em interações positivas para ambas as partes. Mulheres e migrantes vulneráveis As dificuldades acima descritas foram apresentadas para migrantes internacionais de forma geral. Quando aprofundadas para migrantes vulneráveis e mulheres migrantes, algumas diferenças se destacaram. Por exemplo, devido às condições em que os vulneráveis deixaram seus países de origem, há maior probabilidade de eles não terem trazido consigo diplomas e certificações, o que dificulta a comprovação de sua formação profissional e o preenchimento de vagas de nível superior e técnico. Da mesma forma, essas mesmas condições adversas dificultam a validação dessas formações profissionais no Brasil, visto que esses processos envolvem altos custos, que esses migrantes podem não ter condições de cobrir. No caso das mulheres migrantes, elas somam vulnerabilidades de gênero às descritas anteriormente, como a atribuição de responsabilidade pela criação dos filhos e a dificuldade de deixá-los para poder trabalhar; os preconceitos envolvidos com sua formação profissional e capacidade de atuação, sejam próprios ou percebidos pelos recrutadores; e também questões sociais e religiosas que possam restringir suas relações sociais e o preenchimento de vagas que envolvam o contato com o público. 57 Embora tenham necessidades de proteção similares em comparação aos refugiados, os migrantes vulneráveis (especialmente as mulheres) estão sujeitos a maior negligência por parte da sociedade, uma vez que tem menor visibilidade e menor apoio de entidades acolhedoras, além de uma proteção legal mais resumida. A criação de vistos humanitários pela nova Lei de Migração é, nesse sentido, um passo relevante para redução dessa proteção deficiente aos migrantes vulneráveis que não fazem jus a proteção internacional como refugiados. 6.6 Impactos da presença de migrantes Preparação para o acolhimento A grande maioria dos participantes apresenta uma visão muito positiva sobre a presença de migrantes e a diversidade dentro das empresas. É uma percepção global. Uma pesquisa realizada pela Randstad (consul- 7 RANSTAD. Employer toria de recursos humanos) com 13.600 pessoas em 34 países, revelou brand research – Global que 91% dos profissionais valorizam a diversidade no ambiente de tra- Report 2018 balho.7 Os respondentes desta pesquisa descreveram também, entre os benefícios percebidos, melhorias na capacidade de inovação e solução de problemas, enriquecimento cultural e aumento do engajamento e da disposição dos funcionários, entre outros. As vantagens da inclusão e da diversidade para as empresas são cada vez mais claras. Embora justiça social seja o ímpeto inicial por trás dessas iniciativas, as empresas começam a perceber que inclusão e diversidade também são uma fonte de vantagem competitiva e, mais especificamente, uma alavanca essencial de crescimento. Em recente pesquisa divulgada pela McKinsey8, ficam claros os prin8 MACKINSEY & COMPANY. Delivering through cipais benefícios associados à maior diversidade nas empresas, como Diversity. o fato das companhias com maior diversidade de gênero, na amostra, terem 21% mais chances de apresentar resultados acima da média do mercado do que as empresas com menor diversidade. No caso da diversidade cultural e étnica, o desempenho positivo é ainda mais acentuado e esse número sobe para 33%. Além disso, o grupo de empresas com o pior desempenho em ambos os tipos de diversidade tem 29% de chances a mais de ter um desempenho abaixo da média do mercado. Em recorte mais detalhado sobre a diversidade étnica e cultural da equipe de liderança, foi constatado que as equipes executivas de maior diversidade étnica – não só em termos de representação absoluta, mas também de variedade ou mistura de etnias – têm probabilidade 33% maior de superar seus pares em termos de lucratividade. Do ponto de vista estratégico, poucos participantes apontaram impactos negativos e aumento de incertezas em relação às empresas devido à presença de migrantes em seus quadros; principalmente devido ao aumento da capacidade dessas empresas em atender diferentes demandas e segmentos de mercado –pois a equipe refletiria de forma mais fidedigna a realidade de seus mercados consumidores. Além de também ampliar o acesso a diferentes mercados e fortalecer a marca. No entanto, muitos respondentes destacaram que a prevenção de impactos negativos – como conflitos entre colaboradores e reações xenofóbicas e preconceituosas – está diretamente relacionada ao preparo da equipe como um todo para o acolhimento de migrantes. 58 O engajamento de profissionais de diversos níveis e áreas de atuação na inclusão dos estrangeiros nas equipes corporativas é fundamental. Isso passa pelo time de recrutamento e seleção, que deve buscar e incluir migrantes em seus processos seletivos; pelas lideranças, que precisarão estar aptas a gerir e motivar empregados de culturas diferentes; e pelos demais colaboradores, que precisam estar sensibilizados quanto à problemática e conscientes das melhores formas de convivência. Responsabilidade Social Corporativa Para além de resultados benéficos na performance financeira e de convivência entre membros das equipes, foi apontada a responsabilidade social das empresas em atuar em prol da inclusão de migrantes, especificamente os mais vulneráveis. A responsabilidade corporativa estaria diretamente vinculada à promoção de melhores condições de vida dessa população. Faria parte das responsabilidades corporativas, o esclarecimento de informações sobre esses migrantes, de forma a ampliar a sensibilização da sociedade como um todo, porta a fora de suas companhias. Às empresas caberia o importante papel de agente estimulador da tolerância e do ativismo a favor da diversidade e da inclusão de todos os representantes da sociedade brasileira. 59 7 Conclusões 7.1 Principais resultados DESAFIOS Regularização documental: a nova Lei de Migração visou desburocratizar a concessão de vistos e documentos básicos para a contratação dos migrantes. A simplificação desses processos facilita a regularização documental dos migrantes e reduz as barreiras antes percebidas durante a contratação desses trabalhadores. Combate à xenofobia: a valorização do profissional local e a ideia de proteção do mercado nacional não são compatíveis com a integração de trabalhadores migrantes ao mercado de trabalho brasileiro. Os migrantes suprem deficiências de determinados perfis de qualificação e déficits de mão de obra em algumas áreas, não necessariamente concorrendo diretamente com profissionais brasileiros. Conflitos e preconceitos: a falta de políticas internas claras em relação à contratação de migrantes e a ausência de cultura organizacional de inclusão são barreiras ao estabelecimento de um ambiente de trabalho propício à inclusão, que contem com a presença de colaboradores e líderes capacitados a acolher os trabalhadores migrantes de forma humana e responsável. As empresas precisam se preparar para o recebimento de migrantes, com comunicação, treinamento, engajamento e preparo dos gestores – mas também com atuação direta juntos aos colaboradores migrantes para que possam se adaptar a uma realidade corporativa diferente do que viviam em seus países de origem. Recrutamento e seleção: a ausência de canais adequados para acesso à mão de obra disponível, necessidade de certificações específicas nacionais ou de registros de profissão, falta de conhecimentos técnicos específicos e o idioma como ferramenta para exercer a profissão podem ser sanados pela proximidade a entidades especializadas na acolhida dos trabalhadores migrantes, que são importante canal de contato com esses trabalhadores, além de proporcionar capacitação e aprimoramento de conhecimentos. 60 Informação: a falta de conhecimento sobre o tema, desde a falta de reconhecimento da presença de migrantes vulneráveis no Brasil, passando pela questão do preconceito que a desinformação gera, até a falta de experiência das empresas desestimula a integração dos trabalhadores migrantes às empresas. O contato com entidades especializadas e a divulgação de exemplos positivos de outras empresas são fatores importantes para desmistificar as dificuldades percebidas e ampliar o conhecimento sobre os benefícios associados a presença de migrantes nas empresas. OPORTUNIDADES Sistema de recrutamento: aprimoramento e criação de um sistema que facilite o acesso aos trabalhadores migrantes em processos de recrutamento e seleção, o que também colaboraria para a maior conscientização sobre a presença e o perfil da mão de obra migrante no país. Empresas públicas: empresas que contratam através de concursos públicos possuem barreiras legais para aceite dos candidatos estrangeiros, por isso, o incentivo direto à contratação de migrantes por fornecedores e empresas terceirizadas é uma forma dessas organizações incentivarem o desenvolvimento de práticas de inclusão dos migrantes. Práticas de intercâmbio empresarial: a criação de programas de intercâmbio empresarial, nas quais cada migrante contratado na empresa aqui no Brasil geraria uma oportunidade em outros países para brasileiros que desejam uma experiência internacional. Essa prática amenizaria a visão de reserva de mercado e fortaleceria a troca de experiências e cultura. Marca e reputação: a diversidade no corpo de colaboradores traz mais benefícios que prejuízos para as empresas. Dentre os principais benefícios estão os associados à valorização da marca e da reputação, com reconhecimento da maior capacidade de resolver problemas e inovação na gestão e nos processos; o que traz resultados financeiros positivos para às empresas com maior diversidade interna. Responsabilidade social: a inclusão de trabalhadores migrantes, principalmente as mulheres e os vulneráveis, reflete diretamente na responsabilidade social empresarial de acolhida a esse público, mas também de assegurar a esses trabalhadores e suas famílias qualidade de vida e dignidade. 61 7.2 Considerações finais A pergunta embutida na motivação para a realização desta pesquisa era “Quais as barreiras entre as empresas e os imigrantes vulneráveis que dificultam sua contratação?” As respostas antevistas incluíam preconceito, barreiras de comunicação e dificuldades legais, entre outras. No entanto, o que se pôde depreender é que os impeditivos estão mais ligados à questão da informação do que a barreiras legais e de intolerância. Como apontado, a nova Lei de Migração está desenhada para facilitar o acesso a direitos do trabalhador migrante e oferece novas avenidas para a migração segura, ordenada e regular. Já a interpretação da inclusão de migrantes nos quadros de colaboradores das empresas brasileiras é muito positiva, principalmente do ponto de vista de trocas culturais e de experiências. Assim, as dificuldades de acesso dos migrantes internacionais vulneráveis ao mercado de trabalho brasileiro estão associadas à falta de conhecimento da presença e das condições em que trabalhadores migrantes se encontram no Brasil. Uma importante ação é o fortalecimento das vias de acesso aos migrantes pela aproximação junto às entidades que atuam de forma ativa junto as comunidades migrantes, sejam elas de natureza pública ou organizações não-governamentais. Existem muitas iniciativas civis e também estatais já focadas no acolhimento dos migrantes. As empresas interessadas em incluir migrantes internacionais podem se alinhar às atividades já em andamento, a fim de fortalecer essas iniciativas e somar esforços para garantir qualidade de vida para migrantes internacionais que buscam emprego no Brasil. Dar início a novos empreendimentos de acolhida aos migrantes sem buscar sinergia com os projetos em andamento pode representar uma sobreposição de ações e abre margem para que parcelas de migrantes ainda não engajadas continuem distantes dos benefícios oferecidos. Por outro lado, tão importante quanto a integração com atores externos às companhias, são os esforços internos para garantir que a temática da migração seja compreendida como relevante para o setor empresarial brasileiro. A situação dos migrantes sintetiza muitas das mazelas globais de hoje e envolve pessoas que são também representantes da sociedade brasileira, tão diversa desde sua origem. A presença assídua de políticas de diversidade e inclusão é um precedente muito positivo para que a temática de migração passe a fazer parte das políticas corporativas. As empresas já compreendem os benefícios associados à maior diversidade no corpo de trabalhadores e também já agem em consonância com a responsabilidade social que lhes é esperada. 62 A inclusão de migrantes internacionais vulneráveis exige atenção especial tanto as especiais características de cada população migrante, quanto a outras que já são uma preocupação disseminada, como aquela do enfrentamento as desigualdades de gênero. Para isso, as empresas precisam ter acesso a informações sobre os procedimentos adequados de agregação e adaptação. Os esforços dos times de diversidade e gestão de pessoas devem estar na desmitificação das dificuldades associadas à contratação desses não nacionais, passando pelas questões legais facilitadas e os efeitos positivos da presença de representantes de culturas, línguas e experiências diferentes do cotidiano corporativo. A própria empresa deve ser capaz de identificar os potenciais postos de trabalho mais acessíveis ao trabalhador migrante e desburocratizar, dentro dos limites possíveis, a integração dos novos funcionários. A inclusão dos migrantes também depende diretamente da sensibilização dos colaboradores para sua acolhida, e essas atividades não são muito diferentes das ações propostas para a inclusão dos outros grupos já abordados nas políticas de diversidade vigentes. Essas ações podem ser potencializadas pela apresentação de exemplos positivos e engajamento nessa causa global. Finalmente, outra questão de relevo estratégico é a de dar escala para os processos de inclusão. Apesar de exitosas, as experiências positivas registradas pela pesquisa atendem um número muito reduzidos de migrantes e refugiados. Incorporar o tema das migrações ao conjunto mais amplo de políticas de recrutamento e responsabilidade social das empresas é o grande desafio para que as iniciativas de inclusão tenham um tamanho compatível com os fluxos migratórios registrados pelo Brasil. 63 64 Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> BRASIL. Lei nº 13.445 de 24 de maio de 2017. Lei de Migração. Brasília, DF, maio de 2017. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13445.htm> GOOGLE. Dossiê BrandLab - A busca por diversidade no Brasil. Publicado em outubro de 2017. Disponível em < https://www.thinkwithgoogle.com/intl/pt-br/tendencias-de-consumo/dossie-brandlab-diversidade/> HUNT, V; LAYTON, D.; PRINCE, S., Diversity Matters. MacKinsey & Company, 2015 HUNT, V; PRINCE, S., DIXON-FYLE, S.; YEE, L., Delivering through Diversity. MacKinsey & Company, 2018. 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Revista brasileira de estudos da população, vol.34, n.1 São Paulo, jan-abr 2017 65 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL PARA AS MIGRAÇÕES. Visões do Contexto Migratório no Brasil / Marcelo Torelly, coordenador; Aline Khoury, Luís Renato Vedovato, Veronica Korber Gonçalves. – Brasília: Organização Internacional para as Migrações, Agência das Nações Unidas Para as Migrações, Ministério da Justiça, 2017 RANSTAD. Employer brand research – Global Report 2018. Disponível em < https://workforceinsights.randstad.com/global-employer-brand-research-2018 > REIS, R.R. A política do Brasil para as Migrações Internacionais. Contexto Internacional, v.33, n.1, Jan-Jun de 2011 SANTOS, L.F. Política de migração brasileira: o que esperar de uma política respaldada no Estatuto do Estrangeiro de 1980? Paper (Seminário “Migrações Internacionais, Refúgio e Políticas”) – Centro Universitário Curitiba, 2016 SICILIANO, A.L. A política migratória brasileira: limites e desafios. Tese (Mestrado em Direito Internacional) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2013 SILVEIRA, D.T. e CÓRDOVA, F.P., A Pesquisa Científica. Em Métodos de pesquisa [organizado por] GERHARDT, T.E. e SILVEIRA, D.T. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009 VEDOVATO, L.R. Ingresso do estrangeiro no território do estado sob a perspectiva do Direito Internacional Público. Tese (Doutorado em Direito Internacional) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2012 WELLE, D. O que muda com a nova Lei de Migração. Disponível em Carta Capital Online < https://www.cartacapital.com.br/politica/o-que-muda-com-a-nova-lei-de-migracao> 66 67 Anexos 68 ANEXO I Roteiro de entrevista semiestruturada com especialistas INTRODUÇÃO A Report Sustentabilidade é a consultoria que apoia a OIM e o Pacto Global na consulta a especialistas e empresas para entendimento da situação do migrantes vulneráveis no Brasil. Entre as consultas, faremos entrevistas com executivos de empresas membro do Pacto Global, especialistas do setor, além de uma consulta online com outras empresas brasileiras. Nosso objetivo, neste momento, é contar com seu apoio para conceituar migrantes vulneráveis no Brasil e conhecer as impressões sobre o tema e as ações que a empresa realiza ou tem em pauta para realizar. Esta entrevista é confidencial, portanto fique à vontade para colocar seu ponto de vista sem receio. Permissão para gravar. 69 QUESTÕES GERAIS 1. De modo geral, fale um pouco sobre o seu conhecimento sobre a temática migração vulnerável e experiência na área. 2. Segundo a OIM, o conceito de migrante vulnerável é: “Dentro do contexto de migração, a vulnerabilidade pode ser definida como a capacidade diminuída de um indivíduo ou grupo de resistir, lidar ou se recuperar de violência, exploração, abuso e / ou violação de seus direitos. É determinado pela presença, ausência e interação de fatores ou circunstâncias que aumentam o risco e a exposição a, ou protegem contra, violência, exploração, abuso e violações de direitos.” Qual seu entendimento sobre esse conceito e quais são as particularidades de sua aplicação no Brasil? 3. Quais os principais tipos de visto que um imigrante pode obter no Brasil? E quais as atividades permitidas por cada categoria de visto? QUESTÕES DE CONTEXTO 4. Quais são as principais diferenças entre migrantes vulneráveis e refugiados? 5. Na sua opinião, existem questões mais críticas a serem trabalhadas? QUESTÕES ESPECÍFICAS 6. Além das políticas públicas e da agenda global sobre o tema de migrantes vulneráveis, como você acredita que esses temas podem ser trabalhados pelas empresas? ENCERRAMENTO 7. Acessaremos as empresas do Pacto Global para entender como elas tem se engajado. Você teria alguma recomendação/sugestão sobre como aborda-las neste sentido? 8. Para finalizar, há algum tema/assunto que ficou descoberto em nossa conversa, e que você gostaria de mencionar/falar a respeito? 70 ANEXO II Roteiro de entrevista estruturada com executivos de empresas do Pacto Global INTRODUÇÃO A Report Sustentabilidade é a consultoria que apoia a OIM e o Pacto Global na consulta a especialistas e empresas sobre as dificuldades legais de acesso dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro e as possibilidades de construção de políticas corporativas das empresas para os migrantes. Entre as consultas, faremos entrevistas com executivos de empresas membro do Pacto Global, especialistas do setor, além de uma consulta online com outras empresas brasileiras. Nosso objetivo, neste momento, é contar com seu apoio para entender a migração no Brasil e conhecer suas impressões sobre o tema e as ações que a empresa realiza ou tem em pauta para realizar. Esta entrevista é confidencial, portanto, fique à vontade para colocar seu ponto de vista sem receio. Permissão para gravar. Apresentar conceitos de migração e refúgio: Segundo a OIM, a agência da ONU para migrações, o migrante vulnerável é aquele que tem sua capacidade diminuída para resistir, lidar ou se recuperar de situações de violação de direitos ou de violência. Um exemplo são os migrantes que deixam seu país de forma precária fugindo de crises econômicas ou calamidades ambientais. Nos últimos anos, estima-se que o Brasil tenha recebido mais de 50.000 haitianos e 30.000 venezuelanos em condições de vulnerabilidade. Embora compartilhem muitos dos riscos que os refugiados também enfrentam (perigo na jornada até seu destino, dificuldades com a língua, desafios de adaptação, carência de recursos materiais para iniciar uma nova vida, entre outros), os migrantes vulneráveis não são perseguidos em seus países de origem. Segundo o Comitê Nacional para os Refugiados, do Ministério da Justiça, os maiores contingentes de refugiados que chegaram ao Brasil em 2016 vieram da Síria (326 casos), no Congo (189 casos) e no Paquistão (98 casos) 71 QUESTÕES GERAIS 1. De modo geral, fale um pouco sobre o seu relacionamento com a (EMPRESA). 2. Qual seu entendimento sobre migração e qual a relação da (EMPRESA) com esse tema? A (EMPRESA) possui atualmente migrantes em seu quadro de colaboradores? QUESTÕES DE CONTEXTO 3. A (EMPRESA) possui políticas de diversidade/inclusão? Como essas políticas de diversidade e inclusão podem tratar a temática de migração? 4. Na sua opinião, quais as questões mais críticas e as maiores dificuldades que envolvem a contratação de migrantes na (EMPRESA)? Exemplos: legais, documentais, de comunicação, culturais, religiosas, entre outras. 5. Você entende que haja maiores dificuldades na contratação de migrantes vulneráveis e mulheres migrantes? QUESTÕES ESPECÍFICAS 6. Na sua opinião, como a pluralidade no corpo de funcionários beneficia/prejudica a (EMPRESA)? Exemplos: melhoria no ambiente de trabalho, enriquecimento do convívio com diferentes culturas, etc. 7. Especificamente sobre migrantes, quais os principais benefícios que essa inclusão pode trazer? 8. Existe uma correlação entre a contratação de migrantes e a estratégia de negócios da (EMPRESA)? QUESTÕES DIRECIONADAS – INTEGRANTES DO PROJETO EMPODERANDO REFUGIADAS 9. Quais os principais aprendizados decorrentes do projeto? 10. Quais as principais lições internalizadas na gestão da empresa? ENCERRAMENTO 11. Para finalizar, há algum tema/assunto que ficou descoberto em nossa conversa, e que você gostaria de mencionar/falar a respeito? 72 ANEXO III Questionário online INTRODUÇÃO Pesquisa sobre o acesso dos migrantes ao mercado de trabalho no Brasil A Organização Internacional para as Migrações (OIM) e a Rede Brasil do Pacto Global da ONU estão conduzindo uma pesquisa sobre as dificuldades legais de acesso dos migrantes ao mercado de trabalho brasileiro e as possibilidades de construção de políticas corporativas das empresas para os migrantes. A pesquisa procura entender o ambiente e o contexto das empresas brasileiras para inclusão e acesso de migrantes internacionais, seja com práticas e políticas de recursos humanos, responsabilidade social, sustentabilidade ou específicas no tema. As respostas serão tratadas de forma confidencial e não haverá divulgação das respostas apresentadas individualmente (ou por empresa); as respostas devem representar o seu ponto de vista e o da sua área. Queremos saber as diversas opiniões que permeiam as empresas, sem buscar necessariamente uma resposta corporativa unificada. Obrigado pela sua participação! O Brasil é um país formado por migrantes. Nosso histórico de imigrações iniciou-se ainda no período colonial, sendo caracterizado por ondas de imigração motivadas por razões diversas. Esse processo migratório foi de extrema importância para a formação da cultura brasileira e ocorre ainda hoje; estima-se em cerca de 700.000 pessoas a população estrangeira vivendo no Brasil. 73 SEÇÃO 1: identificação 1. Empresa: _______________________________________________ 2. Setor da empresa: óleo e gás químico recursos básicos materiais de construção indústria de bens e serviços automobilístico alimentos e bebidas bens pessoais e domésticos assistência médica varejo mídia viagem e turismo telecomunicação serviços de utilidade pública banco seguradora imobiliária serviços financeiros tecnologia outro: ___________________________________________________ 3. Cargo que ocupa: diretor gerente especialista coordenador supervisor analista assistente trainee estagiário jovem aprendiz outro: ___________________________________________________ 74 4. Área de atuação na empresa: administrativo financeiro jurídico comercial gestão de pessoas/recursos humanos sustentabilidade/desenvolvimento sustentável responsabilidade social relações públicas comunicação saúde e segurança TI outro: __________________________________________________ 5. Você sabe o que é um migrante vulnerável? sim não O migrante vulnerável é aquele que tem sua capacidade diminuída para resistir, lidar ou se recuperar de situações de violação de direitos ou de violência. Um exemplo são os migrantes que deixam seu país de forma precária fugindo de crises econômicas ou calamidades ambientais. Nos últimos anos, estima-se que o Brasil tenha recebido mais de 50.000 haitianos e 30.000 venezuelanos em condições de vulnerabilidade. Os refugiados são também, por definição, migrantes vulneráveis; porém, nem todo migrante vulnerável é um refugiado. Este último se caracteriza pela perseguição em seu país natal devido à sua etnia, religião, nacionalidade, convicção política ou pertencimento a certo grupo social e, portanto, estão impedidos de retornar ao seu país em segurança. Segundo o Comitê Nacional para os Refugiados, do Ministério da Justiça, os maiores contingentes de refugiados que chegaram ao Brasil em 2016 vieram da Síria (326 casos), do Congo (189 casos) e do Paquistão (98 casos). 75 SEÇÃO 2: questões de contexto 6. Sua empresa possui políticas de responsabilidade social (com temas sobre diversidade e inclusão)? sim não não sei 6.1 Se sim, quais são elas e quais principais temas que elas englobam? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 6.2 Essas políticas de diversidade e inclusão tratam diretamente de migrantes internacionais VULNERÁVEIS? sim, migrantes vulneráveis em geral sim, especificamente refugiados não não sei 7. Existem políticas internas voltadas para contratação de mulheres? sim não não sei 76 7.1 Em caso positivo, essas políticas levam em consideração questões especificamente relacionadas às mulheres migrantes? sim não não sei 8. Sua empresa possui migrantes internacionais em seu quadro de funcionários? sim não não sei 8.1 [somente para respostas “sim” na pergunta 8] Na sua percepção, quais das opções abaixo melhor descrevem o público migrante internacional na sua empresa? bolivianos, venezuelanos e outros migrantes da América do Sul haitianos e outros migrantes do Caribe alemães, portugueses, espanhóis, italianos e outros migrantes da Europa senegaleses, congoleses e outros migrantes da África estadunidenses, canadenses e outros migrantes da América do Norte bengalis, paquistaneses, chineses, coreanos e outros migrantes da Ásia sírios, libaneses, palestinos e outros migrantes do Oriente Médio outros: _________________________________________________ 8.2 [somente para respostas “sim” na pergunta 8] Na sua percepção, os migrantes internacionais na sua empresa exercem: cargos executivos (diretor, gerente) postos de chefia (coordenador, supervisor) funções de especialistas e técnicos cargos administrativos (analistas, funções em escritório) funções operacionais (assistentes, auxiliares, aprendizes) outros (zeladoria, limpeza e manutenção, serviços gerais, segurança) 77 8.3 [somente para respostas “sim” na pergunta 8] Qual você acredita ser a principal forma de contratação desses migrantes internacionais pela sua empresa? transferidos de unidades da empresa fora do país procurados ativamente pela empresa em atendimento aos programas internos de diversidade indicados por entidades do terceiro setor e/ou programas sociais de apoio aos migrantes internacionais candidatos a postos de trabalho nos processos de seleção tradicionais da empresa SEÇÃO 3: dificuldades e barreiras 9. Aponte 3 (três) dificuldades ou barreiras que envolvem a contratação de migrantes internacionais VULNERÁVEIS na sua empresa. informação (p.e.: ausência de informações sobre legislação trabalhista aplicada aos migrantes) recrutamento (p.e.: ausência de canais adequados para acesso à mão de obra disponível) reconhecimento de diplomas e certificações profissionais obtidas no exterior (p.e.: títulos universitários, certificados de especialização) regularidade migratória e obtenção de vistos de trabalho (p.e.: obtenção do visto ou carteira de trabalho pelo migrante) documentais (p.e.: falta de documentos necessários para contratação) língua e comunicação (p.e.: falta de conhecimento do idioma local ou intérpretes) preconceito (p.e.: xenofobia, racial) culturais (p.e.: necessidade de adequação do ambiente de trabalho às diferentes práticas culturais) religiosas (p.e.: necessidade de adequação do ambiente de trabalho as diferentes práticas religiosas) outras: _________________________________________________ 78 9.1 Por que você acredita serem estas as principais barreiras ou dificuldades? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 10. Na sua opinião, existem diferenças entre a contratação de migrantes internacionais e a contratação de migrantes internacionais VULNERÁVEIS? sim não 10.1 Se sim, quais são as principais diferenças? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 79 11. Há alguma diferença nas dificuldades encontradas para a contratação de migrantes internacionais VULNERÁVEIS e de refugiados? sim não 11.1 Se sim, quais são as principais dificuldades encontradas? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 12. Você entende que existem questões mais críticas na contratação de mulheres migrantes internacionais? sim não 12.1 Se sim, quais são essas questões mais críticas? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 80 SEÇÃO 4: impactos na organização 13. Escolha os 3 (três) principais impactos que, na sua opinião, a presença de migrantes internacionais pode ter no corpo de funcionários da empresa. atrapalha o ambiente de trabalho e reduz a produtividade aumenta o engajamento e a disposição dos funcionários enriquece o ambiente de trabalho tornando-o mais criativo e propenso ao desenvolvimento de inovações gera competição desleal entre os funcionários brasileiros e estrangeiros intensifica as trocas culturais e melhora a comunicação e o relacionamento entre os funcionários mistura pessoas muito diferentes e aumenta a ocorrência de conflitos políticos, religiosos, raciais e de outras naturezas não impacta, pois os migrantes serão integrados ao corpo de funcionários da mesma forma que os demais colaboradores preenche lacunas nos processos de seleção e melhora a competitividade preenche postos de trabalho com baixa procura/interesse por brasileiros tira oportunidades de trabalho de brasileiros, intensificando o desemprego do país 14. Nos três aspectos apresentados abaixo, escolha a afirmação que mais se aproxima do seu entendimento: 14.1 Do ponto de vista organizacional, a contratação de migrantes internacionais sugere: preocupação com a falta de preparo da organização para integrar os migrantes contratados, podendo gerar um ambiente de trabalho segregado, mais propício à geração de conflitos, manifestação de preconceitos e bullying. otimismo com a capacidade da organização em construir um ambiente mais diverso, podendo tornar os funcionários mais engajados e dispostos e executarem tarefas além de suas responsabilidades. 81 14.2 Do ponto de vista de mercado, a contratação de migrantes internacionais representa: incerteza para clientes e investidores, que podem levantar dúvidas sobre a capacidade e produtividade da empresa com a presença de migrantes internacionais no corpo de funcionários. otimismo de clientes e investidores, que acreditam no aumento da capacidade da empresa para atender diferentes segmentos sociais e culturais, abrindo novos mercados consumidores a partir de um corpo de funcionários mais diverso. 14.3 Do ponto de vista de marca e reputação, a contratação de migrantes internacionais representa: fragilidade da marca, uma vez que experiências negativas de outras empresas em relação à violação de direitos humanos dos migrantes internacionais contratados, ou na sua cadeia, podem gerar dúvidas e questionamentos e afetar negativamente a reputação da empresa, bem como devido ao crescimento de movimentos xenófobos. fortalecimento da marca, uma vez que a contratação de migrantes internacionais pode contribuir com a imagem socialmente responsável da empresa e estimular positivamente sua reputação. 15. Na sua opinião, uma política coorporativa bem-sucedida que contemple os migrantes internacionais deve priorizar quais dos grupos abaixo: migrantes qualificados (ex: com curso superior) migrantes internacionais vulneráveis (ex: haitianos e venezuelanos) refugiados e solicitantes de refúgio (ex: sírios e congoleses) mulheres migrantes vulneráveis (ex: haitianas e venezuelanas) mulheres refugiadas (ex: sírias) outros [campo aberto] 16. Quais você acredita serem os principais benefícios da contratação de migrantes internacionais para a estratégia de negócios da sua empresa? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 82 17. E na sua opinião, quais os principais riscos da contratação de migrantes internacionais para a estratégia de negócios da sua empresa? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ SEÇÃO 4: encerramento 18. Para finalizar, você gostaria de dar alguma sugestão para sua empresa trabalhar o tema de acesso dos migrantes ao mercado de trabalho? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ 19. Gostaria de comentar a pesquisa ou deixar algum feedback? __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ __________________________________________________________ Pacto Global Rede Brasil