Brathair 15 (1), 2015
ISSN 1519-9053
Ritos de passagem na Ọrvar-Odds Saga – o caso do Homem-Casca
André Szczawlinska Muceniecks
Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo.
Professor das cadeiras de História da Igreja e do Cristianismo
na Faculdade Teológica Batista de São Paulo.
NEVE - Núcleo de Estudos Vikings e Escandinavos
muceniecks@yahoo.com
Enviado em: 18/07/2015
Aceito em: 06/11/2015
Resumo:
Este artigo estuda a Ọrvar-Odds Saga sob um ponto de vista Histórico-Antropológico. De
início, localizamos a fonte primária em meio ao gênero histórico-literário no qual a mesma se
enquadra, as Foọnaldaọsöguọ. A seguir, a carreira de seu personagem principal é analisada de
acordo com os conceitos antropológicos de Van Gennep e Turner de espaço liminar. Por fim,
observamos o emprego feito do leste no geral, e de Bjarmaland especificamente, enquanto
constituição de cenário e materialização de regiões míticas. No caso em questão, o leste assume
a forma de espaço liminar, no qual se dá a iniciação e os ritos de passagem do herói.
Palavras-chave: Europa Setentrional; Antropologia Histórica; estudos
Medievais
Abstract
In this article the Ọrvar-Odds Saga shall be studied according with a HistoricalAnthropological approach. At the beginning, the primary source will be located in the
historical-literary genre of the Foọnaldaọsöguọ. Subsequently, its main character career will
suffer scrutiny with the aid of Anthropological theory of Liminal Spaces, as defined by Van
Gennep and Turner. Finally, we shall observe the uses made of the concept of East, as a generic
idea, and the region of Bjarmaland, as a specific application of the same. Such areas assumed
the role of scenario constitution and materialization place of the mythical regions. In the
specific case study, the East assumes the role of liminal space in which the initiation process
and Passage Rites of the hero are given.
Keywords: Northern Europe; Historical Anthropology; Medieval studies.
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A relação entre o leste e o norte da Europa no medievo é temática pouco trabalhada
e explorada, tanto no meio acadêmico brasileiro quanto internacional. A dinâmica entre
tais regiões, no entanto, apresenta elementos ímpares para a reflexão histórica e para a
historiografia medieval com um todo que incluem a relação entre a História e outras
disciplinas acadêmicas como Antropologia e Estudos Literários.
Este artigo baseia-se em capítulo de nossa tese de doutoramento, defendida em
2014, na qual analisamos as diversas visões de leste encontradas nas fontes primárias
escandinavas da Baixa Idade Média. Pretendemos aqui apresentar não uma série completa
de fontes primárias, mas efetuar um recorte transversal em uma saga caracterizada como
fantástica, que oferece campo fértil para a análise mista histórico-antropológica.
Pretendemos demonstrar aqui como o enredo de uma saga apresenta-se
estruturado de formas afins a ritos de passagens, e o papel em que as regiões de leste
assumem em tais ritos de passagem. Para isto, detemo-nos na análise da Ọrvar-Odds Saga.
1. As Fornaldarsögur
É possível encontrar relativa abundância de referências às regiões e nações de
leste nas fontes escandinavas em documentos que podem ser caracterizados desde
produções de intuito geográfico, histórico e instrucional até sagas de caráter
marcadamente lúdico, voltadas para o entretenimento dos que escutam sua recitação.
O maior conjunto de fontes a lidar com tal área geográfica é formado por uma
série bastante distinta de produção literária, uma série na qual elementos como
entretenimento, performance e o lúdico assumem papel tão ou mais importante em alguns
casos do que a própria narrativa histórica.
Em tais obras o passado provê, antes de tudo, o contexto narrativo, o cenário, a
ambientação adequada a tal gênero. De certa forma desenvolve-se uma associação entre
maior plausibilidade de execução de feitos fantásticos com a maior antiguidade ou
distanciamento temporal em relação ao seu autor.
O propósito específico de escrita – no caso, o entreter – não exclui o
entrelaçamento dessa produção com aquela destinada à instrução. Como veremos em
breve, há uma conexão orgânica entre agrupamentos de fontes que à primeira vista não
possuem nada em comum à parte de serem produções escritas do medievo escandinavo.
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O gênero que enquadra as sagas a lidar com o fantástico e o maravilhoso foi
chamado de Foọnaldaọsöguọ noọðuọlanda, o que significa literalmente “sagas antigas das
terras do norte”. Normalmente citadas apenas como Foọnaldaọsöguọ, são traduzidas com
frequência como “sagas legendárias” ou “Sagas dos tempos antigos”. Essa caracterização
é posterior à escrita das mesmas, datando do século XIX, e não fecha de forma absoluta
a série.
Carl Christian Rafn, em sua coletânea “Fornaldar Sögur Nordrlanda”, publicada
em três volumes em Copenhague, em 1829 e 1830, efetuou a seleção de trinta e uma sagas
que considerava enquadrarem-se no critério recém-criado. Posteriormente mais cinco
foram adicionadas à lista, mas há uma série de manuscritos que ainda carecem de maior
análise e que poderiam ser enquadradas em tal categoria. Tulinius, por sua vez, considera
uma lista de vinte e cinco Foọnaldaọsöguọ, o que já deixa claro que há dissenso e o critério
de gênero não é tão fechado (DRISCOLL, 2009: 01).
Além da narrativa de eventos anteriores à colonização da Islândia (com algumas
exceções, das quais a principal é a Yngvaọ Saga viðfoọla), as Foọnaldaọsöguọ são
caracterizadas por uma forma narrativa centralizada no fantástico, na aventura e no
exótico, com um grande uso de temáticas míticas e lendárias. O cenário básico dos
acontecimentos é a Escandinávia, e não a Islândia.
Não há consenso em relação à sua datação; a Yngvaọ Saga viðfoọla, datada do
século XIII, é a mais antiga da série, que, em sua maior parte, situa-se entre os séculos
XIV-XV (PALSSON & EDWARDS, 1990: 02) – o que faz as Foọnaldaọsöguọ formas de
saga bastante recentes.
Dessa forma, apesar de narrarem eventos anteriores à colonização da Islândia,
possuem uma distância temporal mais significativa dos eventos que narram e consistem
em fontes tardias.
O contraste com as Íslendigasöguọ é marcante. Escritas em tom sóbrio e
comedido, narradas de forma marcadamente realística, com poucas intervenções do
sobrenatural e com muitas informações de cunho histórico e mesmo cronístico, as
Íslendigasöguọ são consideradas pela tradição historicista como o ápice da produção
literária islandesa medieval, e como tal serviram de parâmetro de comparação para outras
séries de saga.
Nesta breve caracterização já fica evidente ao leitor a preferência e valorização
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que foi dada no decorrer dos estudos sobre Escandinávia medieval às Íslendigasöguọ e a
depreciação a que as Foọnaldaọsöguọ foram submetidas. Como parte desse fenômeno
pode-se citar não apenas as propensões historicistas, uma divisão estrita entre “história”
e “mito”, mas também a criação de uma tradição que definiu que o tom narrativo
escandinavo, em sua forma mais pura, em seu período mais “clássico” e notável, seria
aquele passado pela narrativa das Íslendigasaga; enfim, um critério acerca da própria
qualidade artística das sagas, também empregado em outras situações díspares como, por
exemplo, a datação das mesmas (MUNDAL, 2013: 46).
Um dos argumentos mais predominante e recorrente na justificativa de tais
critérios de valor é construído baseado no contexto de escrita das Foọnaldaọsöguọ,
alegando que as mesmas teriam sido produzidas em período de decadência literária, por
sua vez causado pelos processos políticos envolvendo a Islândia e a Noruega
(DRISCOLL, 2007: 196). Em contrapartida as Íslendigasöguọ, escritas em sua maior
parte até o século XIII, refletiriam ainda o período áureo literário islandês medieval, em
conjunto com as obras de Snorri Sturlusson.
O fortalecimento da monarquia norueguesa e a subsequente submissão da
Islândia em 1262 ao monarca da Noruega foi situação traumática e verdadeira ruptura em
uma sociedade desde o seu início fundamentada, ainda que de forma relativa, na igualdade
entre seus pares (BYOCK, 2001: 351-354).
Tais argumentos são datados, coerentes com o historicismo, suas questões e
questionamentos metodológicos, estéticos e formais. As gerações mais recentes de
acadêmicos, dentre os quais se pode citar Mathew Driscoll, Torfi Tulinius, Margaret Ross,
têm levantado novas questões relativas à pertinência do estudo das Foọnaldaọsöguọ. Não
enquanto produto de decadência literária – antes, enquanto respostas artísticas, literárias
e históricas específicas de uma sociedade em processo de profunda transformação (ROSS,
2000: 03).
Há linhas diversas de argumentação a se empregar ao se levar em consideração o
valor intrínseco das Foọnaldaọsöguọ enquanto vislumbres de uma época. A própria
linguagem de escrita das mesmas, em tom mais leve e muitas vezes bem-humorado,
contrasta com as Islendigasöguọ. O gênero, desta forma, tornou-se popular na Islândia,
desde a data de sua escrita até o próprio século XIX; o número de cópias e manuscritos
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efetuados nesses quatro séculos atesta particularmente bem a situação (LESLIE, 2012:
232). Destarte, as Foọnaldaọsöguọ consistem também formas específicas literárias
voltadas para o próprio entọetenimento.
Em adição, as Foọnaldaọsöguọ preservam, a despeito de sua estrutura em prosa,
grande quantidade de inserções poéticas antigas. Uma das métricas mais frequentemente
empregadas é a foọnyọðislag, mais ligada à tradição édica do que à escáldica, como no
caso das Islendigasöguọ (TULINIUS, 2007: 448). O gênero veicula, dessa forma,
conhecimento e fontes primárias sobre os tempos antigos de forma mais abundante e
qualificada do que as próprias Islendigasöguọ.
O cenário e o âmbito geográfico básico das Foọnaldaọsöguọ são a Escandinávia
antes da colonização da Islândia. Porém, seu escopo é muito mais amplo. Em conjunto
com tais regiões factuais do mundo nórdico, a narrativa se dá em localidades do fantástico
escandinavo, como Jotunheimọ (a terra dos gigantes), as Planícies de Glasiọ, Geiọọodland
e mesmo regiões das tradições greco-romana e cristã ressignificadas, como a Palestina e
o Rio Jordão. Parte dessas localizações e definições geográficas se sustenta em
conhecimento acumulado e pensado por autores anteriores.
1.1 Datações e subdivisões
Torfi Tulinius defende em diversas obras uma datação mais recuada para as
Foọnaldaọsöguọ, como a primeira metade do século XIII. Argumenta que há temáticas
tratadas em comum com as Íslendigasöguọ, como preocupações com herança e linhagem,
porém em forma deliberadamente ficcionalizada. Ele as chama de primeira manifestação
de “ficção consciente” na prosa islandesa (TULINIUS, 2002: 48-55).
LÖNNROTH (2003: 44) considera o grupo das Foọnaldaọsöguọ um gênero
híbrido de tradição heroica, mito, folclore e romance do continente, e que não seria
recomendável se efetuar distinções de categoria dentro das mesmas.
A linha interpretativa de Pálsson e Tulinius (TULINIUS, 2007: 448s) diferencia
dois polos temáticos nas Foọnaldaọsöguọ: o primeiro, de temática trágico-heróica,
includiria dentre outras a Ragnaọs saga loðbọoka, a Volsunga Saga e a Heọvaọaọ saga ok
Heiðọeks (PÁLSSON & EDWARDS, 1970: 36ss). Esse grupo se vincularia à antiga
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tradição heroica transmitida principalmente em forma poética, e tende a apresentar um
final trágico, com uma narrativa que estende-se frequentemente por várias gerações
(TULINIUS, 2007: 448s ). Um ponto de transição da temática para uma aventureira seria
exemplificado pela
ọvaọ-Odds Saga e a Họólfs saga Gautọekssonaọ, as quais data nos
finais do século XIII.
Por fim, o período final das Foọnaldaọsöguọ caracterizar-se-ia por uma temática
“aventureira-cômica”, exemplificado pela Bosa Saga e a Gongu-Họolf saga (PÁLSSON
& EDWARDS, 1970: 69ss). Nesse grupo, chamado genérica e mesmo coloquialmente
por Pálsson como “viking romances” (PÁLSSON & EDWARDS, 1985: 14), a ação toma
parte no mundo do período viking, seus heróis não são necessariamente de linhagem real
ou aristocrática, e a história normalmente possui um “final feliz“ (TULINIUS, 2007:
449).
Ainda conforme TULINIUS (2002: 44-65), o ponto de transição de temáticas
coincidiria com o surgimento das Riddaọasöguọ e com a transformação da Islândia de
região livre para subordinada. Um sintoma dessa transição seria o interesse mostrado nas
narrativas na questão referente ao poder real e sua expansão – conceito remodelado em
um contexto pseudo-cavaleiresco nas Riddaọasöguọ, para os recém-vassalos islandeses
da Noruega.
É importante notar que as opiniões de Tulinius, em particular a questão da datação,
estão longe de obter um consenso, não obstante sua qualidade. Entretanto, seja sua
datação aceita ou não, pode se citar um consenso, exemplificado por MITCHELL (1991:
1332-136), entre a erudição mais recente acerca da característica das Foọnaldaọsöguọ
enquanto formas narrativas de revitalização cultural do norte legendário. Tal circunstância
é válida tenham sido as Foọnaldaọsöguọ escritas seja no ápice do período de perda de
independência islandesa, como argumenta Tulinius, seja nos séculos XIV e XV, como
defende a opinião mais corrente – em ambas as circunstâncias, ocorrem adaptações à nova
situação política, que insere a Islândia num quadro mais amplo europeu.
Um ponto da argumentação de Tulinius é de particular interesse ao se considerar
o próprio valor estético e literário das Foọnaldaọsöguọ: Como Tulinius demonstra, elas
contêm quantidade consideravél de poesia tradicional, édica e característica da
literalidade oral, “pré” escrita e cristã. Ele considera que, de acordo com sua
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argumentação para uma data mais recuada para as mesmas, as Foọnaldaọsöguọ
provavelmente consistiriam em uma forma de continuidade dessa mesma tradição.
Se nos mantivermos firmes ao critério mais difundido para a datação posterior das
Foọnaldaọsöguọ, entretanto, esta quantidade de poesia édica que as mesmas veiculam
deve ser considerada sob outro prisma. Certamente uma linha contínua de permanência,
uma continuidade inalterada entre as duas tradições literárias, não pode ser sustentada.
Entretanto, este uso de tal poesia implica em um resgate nesta modalidade de saga de uma
tradição literária mais antiga, falando contrariamente aos critérios que denigrem tal
tradição mais recente.
Tal resgate de tradições antigas é bastante coerente com a argumentação de Ross
e Driscoll, e demonstra um intuito consciente de preservação da tradição édica. Podemos
argumentar mais além: o uso da poesia édica nas Foọnaldaọsöguọ é um uso muito coerente
de fontes literárias para uma modalidade que pretende escrever sobre os tempos recuados,
pois emprega e readapta a forma literária em voga nesses tempos passados.
Aa Íslendigasöguọ e as Foọnaldaọsöguọ, possuidoras de formas e estéticas muito
diversas, lidam com a mesma matéria-prima, o passado, em contextos diferentes e
subsequentes. Ambos os usos são igualmente válidos, e a menor factualidade das
Foọnaldaọsöguọ não deprecia o seu valor enquanto fonte histórica, sendo anacrônico
depreciá-las em relação às Íslendigasöguọ.
2 A Ọrvar-Odds Saga
2.1 Manuscọitos e ọedações
As Foọnaldaọsögur, e a
ọvaọ-Odds Saga especificamente, na qual
centralizaremos nossa atenção, possuem um número muito grande de cópias e
manuscritos que atestam sua popularidade e difusão.
Dado o descrédito que receberam no século XIX, há, em contraste, uma pequena
quantia de edições e traduções, número que vem aumentando nas últimas décadas.
Segue uma lista dos manuscritos que contém o texto completo, ou partes da
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ọvaọ-Odds Saga, com seus respectivos locais de depósito:
* Advocates Libọaọy, Edinbuọgh: MS 21.5.2 (1755-1758, Dinamarca;
contém extratos);
* Stofnun Áọna Magnússonaọ í íslenskum fọæðum, Reykjavík: AM 172
b fol.; AM 173 fol.; AM 340 4to; AM 342 I-II 4to; AM 343 a 4to; AM
344 a 4to; AM 344 b 4to; AM 471 4to; AM 552 q 4to; AM 567 IV 4to;
AM 591 i 4to; AM 738 4to; AM 109 a 8vo; AM 109 a 8vo;
* BibliothèỌue Sainte-Geneviève, Paọis: MS. 3713; MS. 3724;
* Bọitish Libọaọy, London: BL Add. 11108; BL Add. 11161; BL Add.
11174; BL Add. 11174; BL Add. 11174; BL Add. 6121; BL Add. 6121;
BL Add. 6121;
* Bodleian Libọaọy, Oxfoọd: Ms Boreal 116;
* Det Kongelige Bibliotek, Copenhagen: GKS 1006 fol.; Kall 243 fol.;
Kall 611 4to; NKS 1689 4to; NKS 1707 4to; NKS 1709 4to; NKS 1791
4to; NKS 1792 4to; NKS 1793 4to; NKS 1793 4to;
* Kungliga biblioteket, Stockholm: Papp. 4to nr 32; Papp. 4to nr 56;
Papp. 4to nr 80; Papp. fol. nr 102; Papp. fol. nr 103; Papp. fol. nr 17;
Papp. fol. nr 73; Papp. fol. nr 89; Papp. fol. nr 98; Perg. 4to nr 7;
* Landsbókasafn Íslands, Reykjavík: ÍB 51 fol.; ÍB 384 4to; ÍBR 58 4to;
JS 627 4to; JS 634 4to; JS 635 4to; Lbs 221 fol.; Lbs 221 fol.; Lbs 325
fol.; Lbs 381 fol.; Lbs 633 fol.; Lbs 152 4to; Lbs 677 4to; Lbs 942 4to;
Lbs 999 4to; Lbs 1172 4to; Lbs 1492 4to; Lbs 1540 4to; Lbs 1582 4to;
Lbs 1626 4to; Lbs 1971 4to; Lbs 5158 4to; Lbs 893 8vo; Lbs 1010 8vo;
Lbs 1366 8vo; Lbs 2146 8vo; Lbs 4460 8vo;
* Riksantikvaọieämbetet, Stockholm: Forn Sagor om Ketill Häng, Grim
Ludenkind och Pile Odder;
* Riksaọkivet, Stockholm: Säfstaholmssamlingen I Papp. 11;
* Héọaðsskjalasafn Skagfiọðinga, Akuọeyọi: HSk 2 4to;
* Tọinity College Libọaọy and Royal Iọish Academy, Dublin: MS 994;
* Univeọsitetsbiblioteket, Oslo: UB 255 fol.; UB 303 4to;
* Univeọsitetsbibliotek, Uppsala: Westin 86;
* The Icelandic Collection, Elizabeth Dafoe Libọaọy, Winnipeg,
Canada: Winnipeg MS 8vo 1
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Tal lista, compilada pelo projeto “Stories for all time: The Icelandic
Fornaldarsögur”, mantido pela “Velux foundation” e coordenado por Mathew Driscoll,
exemplifica bem a complexidade da situação. A
ọvaọ-Odds Saga possui um número
grande de manuscritos, 81 conhecidos até o momento; copiados em um período de quatro
séculos, possuem um grande número de redações.
A erudição do século XIX separa três grupos de redações principais, a “curta”, a
“intermediária” e a “longa” (FERRARI, 2009: 368). Em termos de manuscritos, existem
quatro mais relevantes e representativos, que as tais: redação S (de “short”; Perg. 4tpo nr
7; 43v-57r:20; 1300-1324) mais antiga redação e manuscrito; redação M (de “middle”;
AM 344 a, 4to; 1r-24v; 1350-1400); redação “A” (AM 343, 4° membr; 59v-81v; 14501475) e redação “B” (AM 471, 4° membr.; 61r-96v; 1450-1500).
Entre S e A/B há uma distância temporal de mais de um século, no qual a saga
sofreu consideráveis alterações (BANDLE, 1990: 60). As edições são escassas; há duas
edições críticas principais: de Boer, de S, datada de 18922, e Guðni Jónsson, de A/B, de
19433. A tradução de Pálsson foi feita com base em A/B. Há ainda a chamada versão “E”
(AM 173 fol.4), considerada uma variante de A/B, mas não editada, e que tem sido
negligenciada pelos eruditos (FERRARI, 2009: 368).
A tabela a seguir enumera de forma mais clara as redações e manuscritos mais
significativos da saga:
S
Ọrvar-Odds Saga, redação curta - Perg. 4tpo nr 7; 43v-57r:20
M
Ọrvar-Odds Saga, redação média - AM 344 a, 4to; 1r-24v
A
Ọrvar-Odds Saga, redação longa variante A - AM 343, 4° membr; 59v-81v
B
Ọrvar-Odds Saga, redação longa variante B - AM 471, 4° membr.; 61r-96v
E
Ọrvar-Odds Saga, redação longa variante E - AM 173, 4° membr.;
Tabela 01: As ọedações e pọincipais manuscọitos da ọvaọ-Odds Saga. Do autoọ.
A edições da Foọnaldaọsöguọ Noọðọlanda de Rafn, de 1829, utiliza como
manuscrito primário o GKS 2845 4to., e variantes dos manuscritos GKS 1005 fol., AM
309 4to, AM 62 fol. e AM 202 i fol.
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Ao citarmos trechos da saga, empregaremos trechos de S, da edição de Boer, de
A/B de Guðni Jónsson, e da tradução de Pálsson e Edwards5; a redação A/B será o textobase para nossa análise, com as complementações e comparações necessárias sendo feitas
ao longo da discussão .
2.2 A pọofecia e as conexões da ọvaọ-Odds Saga com a pọodução históọico-geogọáfica
O autor da redação S baseou-se em alguma tradição pré-existente; Saxo
Grammaticus já escreveria anteriormente sobre um “Arvaraddus” no início do século
XIII. É possível que esta primeira redação tenha sido escrita sob a influência de narrativas
hagiográficas, incluindo a Saga de S. Ólafr.
O personagem principal, Ọrvar-Oddr (Odd “das flechas”), possui uma atitude
negativa em relação à religião pagã. Recebe, em sua juventude, a profecia de uma
adivinhadora (v lva) sobre o seu futuro, segundo a qual viveria uma vida extremamente
longa, mas seria morto por seu cavalo na casa onde passara sua juventude.
Oddr mata seu cavalo, enterra-o profundamente e abandona o lugar, tendo uma
vida de viagens e lutas em meio à qual se converte ao Cristianismo e torna-se rei de
Húnaland, na redação S, e de Garðaríki, nas redações A/B/E. Nostálgico, retorna ao seu
antigo lar para descobrir, surpreso, que as modificações no solo trouxeram a caveira do
cavalo à superfície. Uma serpente sai de dentro dela e pica Odd, que morre em decorrência
de seu veneno.
Archer TAYLOR (1921-1922: 93-106), Adolf STENDER-PETERSEN (1934),
Nora CHADWICK (1946: 157) e Fulvio FERRARI (2009: 368) enfatizaram a
similaridade de enredos encontrados na Ọrvar-Odds Saga e a história de Oleg, encontrada
na Póviest vọemenikh lét6 nas entradas concernentes aos anos 911-912 a.D.
Segundo a PVL, Oleg foi filho de Rurik, tendo subido ao governo de Kiev entre
os anos de 870 a 879. Em 912, após ter unificado e tomado tributo de diversas tribos
eslávicas e fino-úgricas e finalmente atacado Constantinopla, bem como obtido um
tratado com os Bizantinos, a crônica conta o seguinte:
“Assim Oleg governou em Kiev, e viveu em paz com todas as nações.
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Veio o outono, e Oleg pensava sobre seu cavalo, que ele fez com que
fosse bem alimentado, ainda que nunca tivesse sido montado até o momento.
Pois em certa ocasião ele inquiriu aos mágicos e adivinhos sobre qual seria a
causa de sua morte. Um dos mágicos respondeu: ‘Oh, príncipe, é por meio de
seu garanhão que você ama e cavalga que você encontrará sua morte’.
Oleg então refletiu e decidiu que nunca mais montaria seu cavalo ou
sequer olharia para ele novamente. Dessa forma, deu ordens que o cavalo
deveria ser alimentado apropriadamente, mas nunca levado em sua presença.
Assim, ele permitiu que se passassem anos até que atacasse os gregos
(bizantinos). Depois que ele retornou à Kiev se passaram quatro anos, mas no
quinto ele pensou sobre seu cavalo, através do qual os mágicos haviam
antevisto que ele encontraria sua morte.
Convocou, assim, seu escudeiro sênior e perguntou sobre o destino do
cavalo sobre o qual ele ordenara que fosse bem alimentado e cuidado. O
escudeiro respondeu que ele estava morto.
Oleg riu e escarneceu do mágico, exclamando: ‘Adivinhadores cnam
inverdades, e suas palavras são desprezíveis e falsas. Este cavalo está morto,
mas eu ainda estou vivo’.
Assim ele ordenou que um cavalo fosse selado. ´Deixe-me ver seus
ossos´, disse. Ele cavalgou até o local aonde os ossos descarnados e a caveira
estavam. Desmontando de seu cavalo, ele riu e enfatizou: ´Então, eu
supostamente deveria receber minha morte dessa caveira?´. E ele pisou a
caveira com seu pé. Mas uma serpente rastejou dela e mordeu-o no pé, e em
consequência disto ele adoeceu e morreu”.
(Cọônica Pọimáọia ọussa; 911: Capítulos 38 e 39. Veọsão nossa)
De fato, a semelhança é por demais forte para ser casual. Como lidar com a
mesma, no entanto, tem dividido os supracitados pesquisadores. Ferrari alega que o autor
empregou um motivo difundido – no caso, o da “profecia impossível”, que acaba se
cumprindo - adaptando-o aos seus propósitos e revestindo-o de significados específicos
(FERRARI, 2009: 368).
Um mero reemprego de motivo folclórico nos parece por demais tênue nesta
circunstância, especialmente se levarmos em conta as proximidades contextuais. A PVL
fala nesta passagem de um governante varegue, ou seja, de um viking no leste. Oddr é um
viking que terá parte relevante de sua carreira no leste, a ponto de um de seus epítetos “é
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você o Oddr que foi para Bjarmaland?” e o seu governo de Húnaland darem-se no
contexto.
Consista em um motivo folclórico ou não, é um motivo que está ligado em pelo
menos três narrativas no mesmo contexto: a PVL, a Ọrvar-Odds Saga e a Gesta Danorum.
2.3 Bjaọmaland e o leste enỌuanto espaço liminaọ
Um número considerável das Foọnaldaọsöguọ tem parcela elevada de seu enredo
ocorrendo em Austrvegr, Garðaríki e Bjarmaland7. É comum a ação dar-se nos três locais,
conterem estruturas narrativas esquemáticas, próprias de contos folclóricos, incluindo
sistemas de iniciação de seus personagens. Dentre algumas sagas que incorporam estas
características, destacamos a Bósa saga og Heọọauðs, a Egils saga einhenda og Ásmundaọ
beọseọkjabana, a Hálfdanaọ saga Eysteinssonaọ, a Þoọsteins saga Víkingssonaọ, a
Yngvaọs saga víðföọla e a
ọvaọ-Odds Saga, que continuará a nos prover do estudo de
caso em nossas análises subsequentes.
Há um uso disseminado de recursos humorísticos e do que chamamos de
fantástico e maravilhoso, transpondo os limites afixados por Jacques LeGoff no Ocidente
Medieval. Não nos é possível compreender de todo o efeito que estas sagas produziam
em suas audiências. Ao leitor contemporâneo, elas provocam, muitas vezes, estranheza,
distanciamento e estupefação.
Diante de tais características, afigura-nos como recurso necessário para análise
dessa série de fontes, e da
ọvaọ-Odds Saga (A/B) especificamente enquanto
representativa do gênero, o cabedal de ferramentas fornecido pela Antropologia, mais
especificamente o que podemos depreender de sistemas e ritos de passagem.
Nesse aspecto, as ideias de Von Gennep sobre ritos de passagem tiveram
influência duradoura não apenas na Antropologia, mas também nas interpretações
históricas e inclusive de outras formas de sagas escandinavas, seja diretamente ou através
dos desenvolvimentos pelos quais passaram através dos trabalhos de Vitor Turner.
Arnold Van Gennep explica os processos envolvidos em ritos de passagem com o
desenvolvimento da ideia de liminaridade e de estados liminais, nos quais o indivíduo
que passa pelo rito de iniciação sai de uma situação anterior, mas ainda não se encontra
na situação na qual se dará sua reinserção social.
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As dimensões iniciais de tais ideias foram ampliadas, e vêm sido aplicadas em
áreas diversas que incluem campos tradicionais da etnologia, como o estudo de povos
ditos “primitivos”, mas também têm sido úteis na explicação de fenômenos da
Antiguidade Oriental, Antiguidade Clássica e até mesmo o Ocidente Medieval e a
Escandinávia Medieval8, como as situações de peregrinação (TURNER & TURNER,
1978) e nos desenvolvimentos da Ordem Franciscana.
Detectamos na
ọvaọ-Odds Saga uma infinidade de situações que podem ser
descritas e interpretadas como liminares, e as discutiremos mais profundamente a seguir.
Podemos centralizá-las em torno do personagem principal, Oddr.
De início, pretendemos refletir sobre o sistema que Van Gennep chama de
“Passagem Material”. Determinados espaços prestam-se bem para situação liminares,
consistindo em limites, delimitações e demarcações (Van GENNEP, 2013[1977]: 33).
Portas, soleiras e pórticos são elementos recorrentes na delimitação de espaços
distintos e constituem-se em elementos limiares por excelência. Da mesma forma se dá
com as fronteiras. Nesse último caso, pode haver objetos que especifiquem a interdição e
a proibição de passagem. Em outros casos, fronteiras naturais representam os limites que
não devem ser transpostos, sob a pena de sanções no campo do sobrenatural (Van
GENNEP, 2013[1977]: 34).
Em alguns casos, como na Europa Medieval, onde haviam zonas cristianizadas
separadas por vezes por faixas inabitadas, ou habitadas por povos de outros grupos
religiosos, determinados espaços como mercados, campos de batalha, florestas e pântanos
podiam assumir o papel de espaços liminares (Van GENNEP, 2013[1977]: 34).
Observando-se a forma que Bjarmaland é retratada nas Foọnaldaọsöguọ em geral,
e na
ọvaọ-Odds Saga em particular, propomos aqui que a região assume um papel
específico de espaço liminar e transitório. No caso em questão, não entre regiões
materializadas no sentido habitual; antes, entre o mundo conhecido, natural e explorado,
e as regiões marcadas pelo fantástico, pelos fenômenos mítico-religiosos e pelo
inexplicado.
Na ọvaọ-Odds Saga, Bjarmaland assume o papel de zona liminar no processo de
iniciação do próprio Oddr, por imprimir em sua trajetória características que o
acompanharão por toda a saga, até que ocorra outro processo liminar, em um outro espaço
específico.
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A jornada de Oddr à Bjarmaland possui contrapartes em outras fontes: a Óláfs
saga ins Helga e a Gesta Danorum. Em algumas circunstâncias específicas, é difícil de
discernir se a jornada para Bjarmaland consiste em simplesmente um tema ou motivo, ou
se os relatos que a contém possuem conexões entre si.
O capítulo 133 da Óláfs saga ins Helga conta sobre uma expedição efetuada por
Karli, que representaria o rei Óláfr, e certo Þórir Hundr. Fica acertado que cada um levará
consigo 25 homens, mas Þórir leva 80, o que gera constante tensão entre Karli e os seus
homens, sempre no receio de que venham a sofrer por causa de seu menor número – como
de fato, acontece posteriormente.
A descrição da jornada toda é bastante gráfica e precisa, explicitando elementos
práticos sobre a navegação bem como a natureza das mercadorias e procedimentos. Após
o período de mercado, quando o acordo de paz com os nativos é encerrado, Karli e Þórir
partem para saquear a área com seus homens. Þórir fala um pouco sobre os costumes
locais:
“(...) quando um homem rico morria, todos os seus bens móveis eram
divididos entre o homem morto e seus herdeiros. Ele pegava a metade, ou a
terça parte, ou as vezes menos, e esta parte era carregada para as florestas e
enterrada, algumas vezes sob um montículo, às vezes na terra, e ás vezes até
uma casa era construída sobre ela9.”
(Heimskọingla, Óláfs saga ins Helga, 133. Veọsão nossa)10.
Os vikings chegam a um lugar cercado e com guardas. Matam-nos, atravessam a
cerca e chegam a um montículo no qual há terra, prata e ouro misturados, mas também
uma imagem do deus Jómáli. Þórir ordena que ninguém roube ao ídolo, mas ele mesmo
acaba por fazê-lo.
Karli fará o mesmo e tenta retirar um ornamento de ouro do pescoço do ídolo.
Bate muito forte com o machado e acaba decapitando a imagem. O barulho atrai aos
Bjarmar, que partem em perseguição. No final, os vikings retornam aos seus barcos e, na
viagem de retorno, Þórir acaba matando a Karli e ataca os seus homens.
Parece-nos clara alguma ligação do relato apresentado, não apenas com a
ọvaọ-
Odds Saga, mas com outras Foọnaldaọsöguọ. Se o relato era conhecido oralmente, ou se
a ọvaọ-Odds saga inspirou-se em certo grau na Ólafs saga helga, como já foi sugerido,
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permanece questão não resolvida, mas pela extensão em que viagens a Bjarmaland serão
empregadas por outras Foọnaldaọsöguọ, e pelo número de elementos encontrados nelas
que se concentram na Óláfs saga ins Helga, é bastante razoável que esta tenha provido
uma base narrativa e informativa para muitas composições posteriores.
Vejamos como se dá o mesmo relato na ọvaọ-Odds saga:
Oddr nunca esteve em alguma expedição viking antes. Após sair de Berurjod,
aonde crescera e enterrara seu cavalo Faxi a fim de enganar as profecias, parte para
Hrafnista, aonde reside sua família de sangue. Seu irmão Gudmunðr e seu primo Sigurðr
estão de partida para Bjarmaland no dia seguinte e, como os preparativos estão feitos, não
permitem que Oddr os acompanhe. Após sonhos premonitórios, concordam com que
Oddr vá.
Oddr recebe de seu pai as Gusisnautaọ – “dádivas de Gusir”, flechas mágicas
feitas por Sáami11 que acompanharão Oddr até sua próxima iniciação, e que serão vitais
em muitas de suas batalhas.
Os parentes viajam e passam por Finnmark. Otom da narrativa é cômico por vezes,
e os vikings divertem-se ao verem as mulheres sáami gritarem após serem roubadas.
Todos chegam à Bjarmaland. O primeiro acontecimento está delimitado em um
espaço liminal: os Bjarmar estão dentro de um salão, perfeitamente iluminado em todos
os seus cantos. Os vikings, fora dele, na escuridão da noite. Para acentuar a distância que
os separa, tanto espacialmente como em outras categorias, a narrativa enfatiza a
alteridade, a principiar pela língua:
Você sabe algo da linguagem dessas pessoas? perguntou Oddr; não mais que
o barulho dos pássaros, disse Asmund; você consegue entender algo dela?12.
( ọvaọ-Odds saga, Capítulo 04. Veọsão nossa)
É uma circunstância singular que em uma miríade de narrativas e sagas, a ênfase
da diferença linguística seja tão pouco explorada. Mas o é. A própria saga de Oddr,
posteriormente, trará eventos que ocorrem nas mais distantes partes do mundo, que
incluem a Terra Santa, Francia, Garðaríki e terras do sobrenatural. Em nenhuma situação
há constrangimento linguístico (PÁLSSON & EDWARDS, 1970: 31s). Parece um
consenso entre os autores de saga que o mundo inteiro fala o Antigo Nórdico13.
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A referência à ”linguagem dos pássaros” não é isolada. Ela aparece também na
Heimskọingla, no capítulo 10 da Saga de Óláfr Kyrre, e também na lenda sobre Sigurðr e
o dragão Fafnir. Em ambas evoca situações de mistério e do sobrenatural.
Oddr, olhando pelas janelas, vê um homem servindo aos demais, que imagina que
fale o nórdico. Transpassa o espaço liminal, e entra em uma área escura do salão, próxima
ao pórtico. Quando o homem passa por ele, Oddr agarra-o pela cabeça e foge com o
restante dos vikings.
Oddr está correto em sua suposição linguística, e dá-se o seguinte diálogo:
“O que você me fala”, disse Oddr, “que seria a pior peça que nós
podemos pregar nos bjarmar?”
“Esta é uma boa questão”, ele disse. “Há um montículo mais adiante
nos bancos do Vína. Ele é feito de duas partes, de prata e terra. Um punhado
de prata tem que ser deixado ali por cada homem assim que deixa este mundo,
e a mesma quantia de terra para cada um que vem a ele. Você não pode pregar
nos bjarmar um truque mais sujo do que ir até o montículo e carregar toda a
prata14”.
( ọvaọ Odds saga, capítulo 04. Veọsão nossa)
A passagem é outra marca de alteridade, de desconhecimento e de falta de
compreensão. Oddr faz perguntas sobre os nativos e seus costumes, ainda que com
intenções negativas; tenta entendê-los e, de sua forma própria, obter informações sobre
um grupo que se lhe afigura como totalmente desconhecido. Em todos os sentidos, o
narrador enfatiza como o bjarmar é o outọo.
O montículo com terra e metais misturados de imediato evoca a narrativa da Óláfs
saga Helga. Ambas explicações são feitas em detalhe, com cuidado, apesar de divergirem
grandemente nas razões apresentadas. Pela tradição que se conhece de montículos
funerários e paralelos na região, parece mais plausível que a explicação da
ọvaọ Odds
Saga consista numa invenção do seu autor.
O restante da expedição resume-se em altercações e lutas com os nativos, nas
quais estes sempre empregam recursos mágicos e, posteriormente, associar-se-ão aos
Sáami. O único outro detalhe digno de maior nota, além do recurso ao mágico, é uma
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referência fortuita a “armas de prata”. Somada ao montículo, somos tentados a sugerir
que os ecos das antigas rotas comerciais em busca de prata islâmica façam-se sentir tardia
e desfiguradamente nestas narrativas, mas trata-se de uma conjectura de nossa lavra.
Algumas características de Oddr são definidas nesta expedição à Bjarmaland:
- A clava: Oddr esquece as Gusisnautaọ no barco e necessita improvisar uma arma.
Usa um machado para fazer uma clava; juntamente com as Gusisnautaọ, a clava será uma
característica marcante de Oddr. Por ocasião de sua segunda iniciação, as Gusisnautaọ
perderão seu poder e serão substituídas por outro jogo de flechas mágicas, mas a clava
perdurará como sua arma contra seu último inimigo em Bjalkaland. Enfatizamos a
característica da clava como um aspecto que o autor deseja enfatizar; ora, se Oddr possuía
um machado para construí-la na primeira ocasião, ele não se encontra de todo desarmado
como explicado no texto; de fato, o machado consistirá em uma das armas de maior uso
entre os vikings.
- Seu nome, fama e pọofissão: é a partir da expedição dela que Oddr será conhecido
como um viking que adquirirá fama que perpassará a de outro vikings. O qualificador
dessa fama é Bjarmaland, e Oddr será conhecido como “Oddr, que foi para Bjarmaland
um longo tempo atrás”.
Os indivíduos de maior significado para Oddr empregarão este epíteto.
A começar por Ögmundr , seu inimigo mortal:
És tu Odd , disse Ög u d ,
at ás?
ue viajou pa a Bja
ala d u
lo go te po
15
Sírnir, único indivíduo que sobreviverá às lutas com Ögmundr, e com quem Oddr fez
pacto de irmandade de sangue:
“í i pe gu tou: É este Odd
ue foi pa a Bja
ala d?
16
Vignir, seu filho com a giganta Hildigunn:
Ele disse que se chamava Vignir, -
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as és Odd , ue foi pa a Bja
ala d?
17
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O rei Herrauðr, de Gardaríki, a quem Oddr substituirá como rei:
Não és tu Odd , ue foi pa a Bja
ala d u
lo go te po at ás?
18
- Seu nêmesis, Ögmundr “Eyþjófsbani” ou Ögmundr “flóki” (Ögmundr “matador
de Eyþjófr” ou Ögmundr “tufo de cabelo/pêlo emaranhado”).
Em S e M, Ögmundr Eyþjófsbani é um dos muitos seres sobrenaturais com os
quais Oddr se depara. Após uma violenta batalha, na qual Oddr e Ögmundr concordam
em deixar de lutar, Ögmundr mata traiçoeiramente a Þórðr, irmão de sangue de Oddr, e
os restantes da irmandade, Oddr e Hjálmarr, não conseguem encontrá-lo mais. Para
Ferrari, a função de Ögmundr nestas redações é efetuar um contraponto à invencibilidade
de Oddr, mostrando alguém que pôde derrotá-lo (FERRARI, 2009: 372).
Em A/B/E, no entanto, Ögmundr assume uma dimensão totalmente nova,
tornando-se o maior antagonista de Oddr e transformando o enredo da saga, à medida em
que a maior parte de seus eventos acaba se entrelaçando entre a luta infindável entre os
dois.
Há um personagem novo inserido em A/B/E, que está conectado com este
aumento de papel de Ögmundr, e é quem traz informações precisas sobre quem ele é:
Rauðgrani, “Barba-vermelha”. Um tipo de figura comum nas sagas, é um homem que
aparece e aconselha ao herói nas batalhas. Ele evoca ao leitor as inúmeras aparições de
Óðinn disfarçado, sendo de fato associado com ele no capítulo 23, ao não mais retornar.
Há um Barba-Vermelha na Báọðaọ saga Snæfelsáss, também associado com Óðinn, mas
de construção mais maléfica, algo entre uma divindade pagã e um ser maléfico que
procura desviar aos cristãos da saga – evidentemente, escrita sob um ponto de vista
cristianizado.
O Barba-Vermelha da ọvaọ-Odds Saga é benevolente; misto curioso e divertido
de sábio e covarde, dá conselhos e muita informação útil para Oddr sobre Ögmundr.
Aparentemente, esta é sua única função, pois sempre desaparece em batalha - fato que o
narrador não deixa de notar, e que confere tom de comicidade em alguns pontos da saga
(FERRARI, 2009: 373). É ele quem provê a seguinte explicação:
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“Você quer que eu lhe diga”, disse Barba-Vermelha, “como Ögmundr
veio a nascer, e espero eu que você perceba que não há maneira de que ele seja
vencido por homens mortais, se você se enveredar por sua origem.
Mas o que primeiro eu devo lhe dizer é Harek foi o rei que governava
Bjarmaland na época que você esteve ali em sua expedição, depois do que,
como você se lembra, você fez um grande mal aos Bjarmar. Mal você tinha ido
embora, os bjarmar pensaram ter sofrido as piores coisas, e quiseram, se
possível, se vingar, e é dessa forma que eles agiram.
Eles pegaram uma giganta que vivia debaixo de uma grande queda
d´água, encheram-na de mágica e feitiçaria e colocaram-na na cama ao lado do
rei Harek, de modo que ele teve um filho por meio dela; ele foi borrifado com
água e chamado Ögmundr. Ainda criança pequena, ele não era como os mortais
ordinários, como você pode esperar do tipo de mãe que teve - e, de qualquer
forma, seu pai era um grande feiticeiro (blótmaðọ) também.
Quando Ögmundr era da idade de três anos ele foi enviado para
Finnmark, onde aprendeu toda sorte de mágica e feitiçaria, e tão logo ele
dominou estas artes, retornou para Bjarmaland. Nesta época ele tinha sete anos
e já estava tão grande quanto um homem adulto, imensamente forte e muito
difícil de se lidar.
Sua aparência não melhorara durante sua estadia com os finnar. Ele era
tanto preto quanto azul, com longo cabelo preto, e tinha uns toscos tufos de
pelo pendurados sobre os olhos, no lugar aonde sua testa devia estar. É por isto
que ele se chama Ögmundr Flóki.
Os bjarmar mandaram-no para matar você, ainda que eles tenham
percebido que precisavam preparar o terreno com cuidado antes de lhe mandar
para hell. O próximo passo que eles tomaram foi fortalecê-lo com bruxaria, de
forma que ferro não possa mordê-lo, então levaram a cabo seus rituais e
transformaram-no em um verdadeiro troll, não havendo nenhum mortal
semelhante a ele”19.
( ọvaọ-Odds Saga, Capítulo 19. Veọsão nossa)
A narração segue por algum tempo ainda, contando sobre como Ögmundr ganhara
seu outro apelido, mas o trecho nos é suficiente. Em A/B/E, Bjarmaland é central para
todo o desenrolar do enredo da
ọvaọ-Odds Saga, à medida em que o conflito que é
central por toda a saga, isto é, as lutas entre Oddr e Ögmundr, são consequências diretas
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da expedição feita por Oddr ali.
Ögmundr, ainda que tenha ganhado destaque tardiamente, harmoniza alguns
elementos da saga: a profecia em relação a Oddr, que não permita que ele morra mas que
implica em que ele perderá os seus queridos, encontra um bom balanceamento com a
figura de Ögmundr que, além de ser instrumental na morte dos preciosos para Oddr, é o
lembrete de que ele não e totalmente invulnerável.
A ênfase de A/B/E na disputa entre os dois substitui aspectos de inspiração/origem
possivelmente hagiográficas de S por um enredo aparentemente mais banal e simples;
menos instrutivo, mas altamente entretenedor, o desenrolar da saga narra uma luta entre
dois seres que, por si só, encontram-se em situações liminares entre a mortalidade e o
banal e o maravilhoso e sobrenatural. A mudança de ênfase entre as redações incorporou
outro sistema de significações, que dão aspecto central à Bjarmaland.
Destarte, a expedição de Oddr à Bjarmaland marca a primeira fase de sua vida,
quando ele torna-se viking de renome. É um espaço liminal ampliado entre o mundo
conhecido e as terras do imaginário, e é por este espaço que Oddr sofrerá sua primeira
iniciação.
2.4 O Homem-Casca
Há ainda outro ponto na redação A/B da ọvaọ-Odds Saga em que reconhecemos
um momento específico de transição, acompanhado por sinais e elementos que o
diferenciam de outros momentos da narrativa.
Após a iniciação de Oddr em Bjarmaland é perfeitamente possível resumir a saga
enquanto alterações sucessivas entre estados de luta e paz, distúrbio e descanso. Nestas
lutas Oddr perde amigos e familiares, mortos em batalhas contra vários vikings, contra
Angantyr e seus irmãos, mas principalmente contra Ögmundr. Nos momentos de
descanso ele adquire novos aliados, passa por aventuras distintas, ganha equipamentos e
até gera Vignir com uma giganta.
Após a perda de seu filho no capítulo 22 e a morte de Gardar, no capítulo 23, Oddr
volta para Gautland com seu irmão de sangue Sirnir. Barba-Vermelha/Óðinn
desaparecera, e Oddr entra em um período totalmente distinto em sua vida:
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“Então Oddr veio para Gautland para com seu irmão de sangue, Sirnir,
que o convidou para passar o inverno. Oddr aceitou. Assim que o inverno
passou, ele ficou muito desgostoso pelas misérias que Ogmunðr flóki trouxera
sobre ele. Ele estava determinado a nunca mais arriscar a vida de seu irmão de
sangue em luta com Ogmunðr, pois as perdas que ele sofrera já eram amargas
demais, então ele decidiu-se e partiu por conta própria certa noite.
Conseguiu arrumar transporte para onde precisava, viajando pelas
florestas e regiões selvagens e errando por longas trilhas de montanhas, com
sua aljava de flechas nas costas, atravessando um país após outro. Chegou o
tempo em que ele foi forçado a atirar em pássaros para sobreviver.
Ele prendeu casca de bétula em volta de seu corpo e em seus pés, e fez
para si um grande chapéu com a casca. Ele se destacava bastante dos outros
homens pois, além de ser muito maior que todos os demais, estava todo coberto
de casca.
Não há nada para se contar sobre ele até que emergiu da floresta, e
encontrou povoados à vista. Viu uma grande fazenda ali, e outra menor, não
muito longe. Veio à sua mente de ir à fazenda menor, ainda que ele nunca
tivesse feito nada como aquilo antes, e assim ele foi para a porta.
Do lado de fora um homem estava cortando lenha, um pequeno homem
de cabelo branco. O velho homem cumprimentou amigavelmente o estrangeiro
e perguntou seu nome.
´Eu me chamo Homem-Casca´, disse ele” 20
( ọvaọ-Odds Saga, capítulo 24. Veọsão nossa)
Victor Turner analisa uma forma específica de liminaridade enquanto fase e
estado. Nesse sentido, podem ser distintas duas modalidades de ritos: ritos de elevação de
status e ritos de reversão de status.
Nos ritos de elevação de status o noviço atingirá um status que é definitiva e
irreversivelmente superior ao anterior (TURNER, 2013[1974]: 156). Para chegar a este
status superior, entretanto, o aspirante precisa antes se humilhar e ser “generalizado”; ele
separa-se da vida comum e submete-se a ritos liminares que o rebaixam rudemente antes
de, após cerimônias de readmissão, ser instalado em sua posição de glória aumentada
(TURNER, 2013[1974]: 160).
Quanto aos ritos de reversão de status, são ritos que normalmente seguem
prescrições temporais, ligadas ao calendário. Uma característica comumente encontrada
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em ritos desse tipo é o mascaramento (TURNER, 2013[1974]: 160). Aquele que se
rebaixa é feito estruturalmente inferior; a máscara, que pode representar seres ctônicos,
demônios ou outras entidades e forças, oculta sua fraqueza e o protege enquanto símbolo
de força contra aqueles que estão estruturalmente superiores (TURNER, 2013[1974]:
162).
Discernimos nesse episódio da ọvaọ-Odds Saga basicamente um rito de elevação
de status, havendo algumas características secundárias similares às encontradas em ritos
de reversão.
O ciclo “guerra e paz” característico da vida de Oddr após sua primeira iniciação
em Bjarmaland passa por um momento de interrupção. Esta pausa deve ser distinguida
dos outros momentos de descanso após a guerra – como o tempo com os gigantes, e
mesmo o tempo de sua conversão - exatamente pelos elementos que associam os
acontecimentos posteriores a formas rituais.
Há elementos textuais claros nesse sentido, que lidam com declarações absolutas;
primeiramente, Oddr decide “nunca mais” arriscar a vida dos que ele ama, de forma
contrária ao seu discurso anterior de obstinada procura e perseguição a Ögmundr, não
importando o que custasse. Ao escolher entrar na pequena fazenda, Oddr decide fazê-lo
“ainda que ele nunca tivesse feito nada como aquilo antes”; contraste a sua atitude altiva
de até então.
Mais característico, no entanto, é que Oddr muda de aparência e, principalmente,
de nome. Ele cobre-se de cascas de bétula – em narrativa na qual é impossível não notar
a comicidade da situação, tenta ocultar sua aparência anterior, mascara-se e muda
inclusive de nome. Ele agora é o “Homem-casca”.
À parte novamente o fator humorístico e entretenimento da saga nesse ponto, o
próprio narrador continua a chamar Oddr não mais de Oddr, mas de “Homem-Casca”.
Ele é recebido pelo fazendeiro Jólfr, que o recebe bem e indicará quais os
caminhos a serem seguidos por Oddr nesta nova fase. Simbolicamente, mas de forma que
afetará a narrativa posterior de forma prática, ele dá ao Homem-casca três novas flechas.
Dessa feita, flechas de pedra. Jólfr revela que conhece a identidade de Oddr, bem como
que ele possui as dádivas de Gusir, e que elas serão insuficientes em certo momento.
A comparação das flechas é representativa dessa nova fase da vida de Oddr; após
Bjarmaland e até então, as dádivas de Gusir salvaram-no nas situações de maior perigo.
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No seu status posterior, serão insuficientes, e substitutas mais apropriadas devem ser
providenciadas.
O outro passo é informação: Jólfr fala a Oddr sobre a localidade, o rei Herrauðr,
pessoas do salão, e sobre quem será o alvo de Oddr: Silkisif, filha do rei, sobre a qual
Jólfr fala que “não há moça mais bela em toda a Garðaríki e além21”.
Nesse ponto da narração, há um entrelaçamento de temáticas próprias das
narrativas folclóricas, nas quais é expediente comum que um rapaz, normalmente pobre,
irmão mais novo e de menos oportunidades procure conquistar a mão de uma princesa
inatingível.
Esta temática não é o núcleo da narrativa, e a saga não pode ser reduzida a uma
forma tão simples e estruturalizada, ainda mais se levando em conta as reestruturações e
elaborações pelas quais passou em suas diferentes redações. O tema da princesa ajudará
na composição do quadro narrativo, fornecerá elementos úteis ao contar da história, mas
não é seu objetivo. Ele colabora na construção dos eventos de passagem.
Também pela referência aos atributos da beldade somos informados da terra aonde
Oddr se encontra, que é Garðaríki – em S, o reino é Húnaland.
Jólfr leva o Homem-Casca ao salão do rei Herrauðr, e dá-se início o processo de
rebaixamento de Oddr:
- “Eu me chamo o Homem-Casca”, disse Oddr
- “Quem é você, companheiro?” Disse o rei.
- “Isto eu sei, disse ele, “Eu sou mais velho que qualquer coisa que você
possa pensar, mas não tenho esperteza nem memória em minha cabeça. O que
pede sempre quer escolher. Eu te peço, rei, abrigo pelo inverno”.
O rei respondeu: “Você é hábil em algo?”
- “Longe disso”, ele respondeu, “eu sou mais atrapalhado que qualquer
outro homem”.
- “Você é disposto a fazer qualquer coisa?” Disse o rei.
- “Eu não sei como trabalhar, e sou muito preguiçoso para trabalhar”,
ele disse.
- “Isto não parece promissor”, disse o rei, “pois eu fiz um voto de só
pegar homens hábeis”.
- “Nada que eu fizer será do menor uso para qualquer um”, disse o
Homem-casca.
- “Você deve saber como coletar a caça, se outros atirarem”, disse o rei.
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“Talvez eu vá [caçar] alguma vez”.
- “Onde devo me assentar?” Disse o Homem-casca.
- “Deves se assentar no banco baixo perto da porta, entre os escravos e
os homens livres”.22
Não há razão aparente para Oddr responder como responde às questões; pede
abrigo, mas a cada questão efetuada pelo rei, responde de forma negativa. O ato possui
características de rito, de interpretação e rebaixamento - é um esvaziamento total. Ele é
velho, mas não sabe de nada; pede ajuda, mas não sabe fazer nada; quer trabalho, mas
tem preguiça de trabalhar.
Por fim, o rei coloca-o em uma posição liminar em todos os aspectos; Oddr deve
assentar-se “entre os escravos e os homens livres”, não sendo enquadrado em nenhuma
categoria, e “perto da porta”. Ora, como já discutido a pouco, portas, assim como
fronteiras, são espaços liminares por excelência.
Oddr é convidado pelos irmãos Óttar e Ingjaldr a sentar-se entre eles. Perguntamlhe sobre outros países, reclamam de sua bolsa (que contém a aljava das flechas); por fim,
oferecem dinheiro e roupas novas para que ele tire a casca. Sua resposta é sugestiva e
simbólica: “eu não posso fazê-lo”, ele disse. “eu nunca vesti outras roupas, e enquanto
viver, nunca o farei”.
De fato, o Homem-casca nunca o fez e nunca o fará. Assim que trocá-las, ele
deixará de sê-lo.
Através dos dois irmãos, desajeitados e desprovidos de habilidades, Oddr –
melhor, o Homem-Casca - passará por várias provas: de caçada (25), de arco-e-flecha
(26), de natação e, finalmente, de bebida – este último, entremeado com o compor poemas
(27) – o competidor esvazia um chifre cheio de bebida e profere um poema. Supera aos
dois melhores homens do rei, Sigurðr e Sjolfr, que também aspiram pela mão de Silkisif.
Após cada prova, há uma breve troca de perguntas com o rei, por meio das quais
o Homem-casca vai cedendo seu lugar a Oddr, “aquele que esteve em Bjarmaland”:
Após a caça:
O rei olhou para ele e disse: “És um grande arqueiro”.
“Sim, senhor”, disse ele. “Porque estou acostumado a atirar em pássaros e
animais para me alimentar”23
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Após as flechas:
“O primeiro tiro pode ter sido bom”, disse o rei, “mas este é muito melhor e eu
lhes digo, nunca vi um tiro como este.”24
Após a natação (Oddr nada com as cascas, mas prevalece sobre os demais):
E agora o rei inquiriu: “E não é que não há outro esportista igual em tiro e
natação?”
“Viste todas as habilidades que tenho”, disse o Homem-casca. “Me chamo
Oddr, se você quiser saber, mas eu não posso lhe falar nada sobre a minha
família[kyn]”25.
Finalmente, na competição de poemas Oddr conta todas suas aventuras até então.
Na manhã seguinte está a lavar-se, e a casca em suas mangas apresenta-se gasta, deixando
antever uma veste vermelha por baixo. Os irmãos tiram-na, mas Oddr não reclama, e
levam a Oddr até o assento do rei, dizendo: “Parece que nós não temos apreciado
totalmente quem nós entretemos nesse inverno26”.
“Assim me parece”, disse o rei. “Mas quem é este homem que tem escondido
sua identidade de nós?”
“Eu ainda me chamo Oddr, como lhe disse um tempo atrás, filho de Grim
Bochechas-Peludas de Hrafnista, no norte da Noruega”.
“É você o Oddọ Ọue foi paọa Bjaọmaland um tempo atọás?”
“Sou eu o homem que foi para lá”27 (itálico nosso)
A prova e as recompensas finais de conclusão desse processo ritual dar-se-ão nos
capítulos seguintes, 28 e 29, nos quais Oddr parte para Bjalkaland, coletar impostos. Em
caso de vitória, receberia a mão de Silkifif.
A narrativa que se segue retoma temas elaborados na viagem à Bjarmaland e por
vezes reproduzidos em pontos isolados da narração. Bjalkaland significa “terra das
peles”. Seu governante, Álfr Bjálki, segundo S pagava tributo ao rei de Húnaland.
Poderoso feiticeiro, Álfr Bjálki só pôde ser vencido com as flechas de pedra de
Jölfr, que desaparecem após serem usadas. As dádivas de Gusir não foram capazes de
vencê-lo, e desaparecem igualmente.
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Resta a Oddr derrotar a feiticeira que, de forma semelhante a Ogmunðr no capítulo
seguinte atira flechas por todos os seus dedos. Seu templo é queimado e ela é morta com
uma clava por Oddr.
Oddr retorna para “Grikkjaríki” – claramente, um erro do redator, já que
anteriormente é citada Garðaríki, assim como no capítulo 32, por ocasião da morte de
Oddr. Em S, como já afirmamos, em ambas ocasiões o reino é Húnaland. Finalmente, ele
ascende a uma posição maior do que a que possuía anteriormente: o rei Herrauðr falece e
que sobe ao trono em seu lugar é o próprio Oddr.
Já falamos sobre Ogmunðr nas seções anteriores, e aqui cabe o encerramento de
sua participação no enredo. No capítulo conseguinte à subida de Oddr ao trono, ambos
travam sua última batalha. Ogmunðr – agora chamado Kvillanus, e governante em
Novgorod, reúne todos os reis de Austrvegr, em uma lista geográfica muito detalhada que
inclui “Kirjálalandi, Rafestalandi, Refalandi, Virlandi, Eistlandi, Líflandi, Vitlandi,
Cúrlandi, Lánlandi, Ermlandi”, e “Púlinalandi”28.
Após grande mortandade ambos sobrevivem, e Ogmunðr foge. Não se passa
muito tempo, no entanto, antes de que ambos sejam reconciliados:
Algum tempo depois Kvillanus mandou presentes caros para Odd, ouro
e prata e muitos tesouros; e junto com tudo isto, palavras de amizade e ofertas
de reconciliação. Então Oddr aceitou os presentes, pois ele era esperto o
suficiente para perceber que Ogmunðr Matador-de-Eyþjof, ou Kvillanus, como
ele se chamava agora, nunca poderia ser derrotado, sendo, como você pode
dizer, tanto um fantasma quanto um homem. Não se sabe se eles tiveram
quaisquer outros negócios futuros, então este é o fim de sua briga29.
( ọvaọ Odds Saga, Capítulo 30.Veọsão nossa)
O episódio de Homem-casca, encerrado com Bjalkaland espelha, portanto, o
ocorrido na primeira iniciação de Oddr em Bjarmaland; todo o processo da narrativa
aponta para um inequívoco rito de passagem de elevação de status, que completa a
trajetória de Oddr e que resumimos na seguinte tabela:
Bjarmaland
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O Homem-Casca/ Bjalkaland
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Tipo de ọito
Iniciação/ maturidade
Aumento de status
Dádivas de Gusir
Flechas de pedra de Jólfr
Viking
Rei em Garðaríki
Flechas
Status alcançado
Apelido; camisa
Maọcas posteọioọes
Consoọtes
Olvor, da Irlanda (12);
Silkisif
Hildigunn, a giganta.
Papel de Ogmunðọ
(Apenas em A/B)
Criado como nêmesis;
Última batalha e desistência /
precipitador da segunda
apaziguamento
iniciação
Tabela 02: Paọalelos das duas iniciações de ọvaọ-Oddọ
3. Conclusões - as iniciações e o uso do leste
Da análise dos episódios de iniciações e ritos de passagem pelos quais Oddr passa,
chegamos à conclusão que o leste assume, em adição ao sentido de provedor de cenário
e ambiente, a conotação de região limítrofe, liminar.
De fato, o papel de Bjarmaland nesse sentido foi bem discutido e argumentado; a
região incorpora uma gama considerável de imaginários que perpassa a mera dimensão
das Foọnaldaọsöguọ, assumindo conotações limítrofes como religioso, o fantástico, o
mítico e o desconhecido. Bjarmaland torna-se uma materialização, um lugar atingível do
que se discute no campo do mito.
O acréscimo inovador das Foọnaldaọsöguọ, das quais empregamos a ọvaọ-Odds
Saga enquanto recorte exemplar, é a assimilação de tal sentido de Bjarmaland ao leste
enquanto um todo, particularmente a Austrvegr e Garðaríki.
Antevêem-se elementos dessa derivação e conotação em passagens de outras
fontes como a Gylfaginning, na Edda Maior, na qual o leste sofre assimilações de cunho
mítico e é explicado por vezes de forma evemerizada. Em contraposição a esta referência
isolada em meio a um meio acadêmico evemerizado e ocidentalizado, as Foọnaldaọsöguọ
nos oferecem este imaginário constante, reapropriado e amplificado.
Esta reapropriação do material mítico não é feita com intuitos de instrução, ou da
elaboração acadêmica geográfica das regiões de além. É um emprego de simbolismo e de
conceitos presentes no imaginário coletivo empregados agora enquanto elementos de uma
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narrativa cujo o propósito primário é o entreter ao invés do educar.
Concluímos esta análise, portanto, com a afirmação desta dimensão que o leste se
reveste e que espelha uma situação reveladora do próprio movimento intelectual e mental
dos séculos XIII e XIV na Escandinávia.
Nesses séculos ocorrerá a bifurcação das formas literárias entre o factio e o fictio,
entre o educativo e instruidor, e o fantástico, maravilhoso e voltado ao entretenimento e
à diversão. As Foọnaldaọsöguọ formarão o corpus principal de literatura destinada ao
entretenimento, e o leste assumirá significados relevantes, tanto em quesitos de
constituição de cenário como de agregação e ressignificação de conceitos e categorias
míticos.
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Lista o tida
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<http://fasnl.ku.dk/bibl/bibl.aspx?sid=oeos&view=manuscript> Último acesso em 11/07/2015.
1
2
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3
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1, 165-187.
4
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11/07/2015.
5
PÁLSSON, Hermann & EDWARDS, Paul (trads). Seven Viking Romances. London: Penguin Books, 1985.
Tradução para o inglês.
6
A Crônica primária russa, também chamada de Crônica Nestoriana ou Crônica dos tempos passados,
escrita no século XII na Rus kievita.
7
As principais áreas à leste da Escandinávia. Austrvegr compreendia a região báltica; Garðaríki, a Rus de
Kiev e Novgorod. Quanto à Bjarmaland, localizava-se nas adjacências do Mar Branco, parcialmente no
teritório da atual Karelia.
8
Destacamos o estudo de Anna Heiniger sobre o Dyradómr na Eyrbyggja saga, com a qual trocamos
informações valiosas acerca da liminaridade e espaços liminares nas Sagas escandinavas. HEINIGER, Anna
Katharina. Liminal Spaces and places in the Sagas. Comunicação apresentada no International Medieval
Congress of Leeds. Leeds, 2014.
... að þa ug væ i háttað þá e auðgi e ọnduðust að lausafé skyldi skipta með hinum dauða og
ọrfum hans. Skyldi hann hafa hálft eða þriðjung en stundum minna. Það fé skyldi bera út í skóga, stundum
í hauga og ausa við oldu. “tu du vo u hús að ge . Óláfs saga ins Helga. In: JÓNSSON, 1911: 133 K.,
312
9
10
As versões das fontes primárias são de nossa lavra. Tratam-se de versões, e não traduções, efetuadas a
partir dos textos em antigo nórdico e com o auxílio de traduções inglesas, quando necessário.
11
Os lap es. Fi
a
as sagas es a di avas.
12
"Skilr þú hér nokkut mál manna? sagði Oddr; eigi heldr en fuglaklið, sagði Ásmundr; eða þikist þú nokkut
af skilja?" Örvar-Odds Saga, redação S. In: RAFN, C. Fornaldar sögur Norðrlanda. Kaupmannahöfn: Popp,
1829-1830, vol. I. 4 K., 175.
13
De formas similares na ficção contemporânea, onde aparentemente todas as raças alienígenas e povos
distantes falam ou compreendem o inglês.
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14
"Hvat segir þú til," sagði Oddr, "hvat vér munum þess gera, at Björmum þykki verst?" "Þess er vel spurt,
" sagði hann. "Haugr stendr upp með ánni Vínu. Hann er gerr af tveim hlutum, silfri ok moldu. Þangat skal
bera gaupnir silfrs eptir hvern mann þann, sem ferr af heiminum, ok svá, er hann kemr í heiminn, ok
jafnmikla mold. Þat munu þér svá gera, at Björmum mun verst þykkja, ef þér farið til haugsins ok berið féit
í burt þaðan." Ọrvar-Odds Saga, redação A/B. Capítulo 04. In: VILHIÁLMSSON, Bjarni & JÓNSSON,
Guðni (eds). Fornaldarsögur Norðurlanda. Reykjavík, 1943-1944, vol I. Citaç es su se ue tes o o O“ ,
seguidas de número de capítulo.
15
"Ertu sá Oddr," sagði Ögmundr, "at fór til Bjarmalands fyrir löngu?" (OS, 13).
16
Sírnir svarar: "Er þetta Oddr sá, sem fór til Bjarmalands?" (OS, 19)
17
Hann kveðst Vignir heita, - "eða ertu Oddr sá, er fór til Bjarmalands?" (OS, 21)
18
"Ertu eigi sá Oddr, er fór til Bjarmalands fyrir löngu?" (OS, 27)
19
"Viltu, at ek segi þér," kvað Rauðgrani, "hversu Ögmundr er til kominn, ok get ek, at þér þykki þá engi
ván, at hann verði unninn af mennskum mönnum, ef þú veizt allan hans uppruna.
En þat er þar fyrst af at segja, at Hárekr hét konungr, er réð fyrir Bjarmalandi, þá er þú fort þangat herferð,
eptir því sem þú veizt, hvern skaða er þú gerðir þá Björmum. En er þú vart í burtu farinn, þóttust Bjarmar
hafa raunillt af fengit ok vildu gjarna hefna, ef þeir gæti. Var þat þá tiltekja þeira, at þeir fengu eina gýgi
undan forsi stórum, galdra fulla ok gerninga, ok lögðu í sæng hjá Háreki konungi, ok við henni átti hann
son; sá var vatni ausinn ok nafn gefit ok kallaðr Ögmundr. Flestum mennskum mönnum var hann ólíkr
þegar á unga aldri, sem ván var sakir móðernis hans, en faðir hans var þó inn mesti blótmaðr. Þegar er
Ögmundr var þrévetr, var hann sendr á Finnmörk, ok nam hann þar alls kyns galdra ok gerninga, ok þá er
hann var í því fullnuma, fór hann heim til Bjarmalands. Hann var þá sjau vetra ok svá stórr sem fullrosknir
menn, rammr at afli ok illr viðskiptis. Ekki hafði hann batnat yfirlits hjá Finnunum, því at hann var þá bæði
svartr ok blár, en hárit sítt ok svart, ok hekk flóki ofan fyrir augun, þat er topprinn skyldi heita. Var hann
þá kallaðr Ögmundr flóki. Ætluðu Bjarmar þá at senda hann til móts við þik ok at drepa þik; þó þóttust þeir
vita, at mikils mundi við þurfa, áðr en þér yrði í hel komit. Var þat þá enn tiltæki þeira, at þeir létu seiða at
Ögmundi, svá at hann skyldi engi járn bíta atkvæðalaus. Því næst blótuðu þeir hann ok trylldu hann svá,
at hann var engum mennskum manni líkr. (OS, 19)
E e Odd ko hei til Gautla ds eð fóst óðu sí u , auð “í i ho u þa at sitja u vet i .
Þat þekktist Oddr. Ok er á leið vetrinn, ógladdist hann fast. Kómu honum þá í hug harmar sínir, þeir er
hann hafði fengit af Ögmundi flóka. Þó hugsast honum svá til, at hann mun eigi hætta lengr fóstbróður
sínum til at berjast við Ögmund, því at hann þóttist þar stóra skaða hafa af fengit. Verðr þat þá hans ráð
at leynast í burt einn á náttarþeli. Ferr hann þá at flutningum, þar sem þeira þarf við, en stundum ferr
hann um merkr ok skóga, ok ratar hann harðla stóra fjallvegu. Hann hefir þá örvamæli sinn á baki sér. Ferr
hann nú víða um lönd, ok kemr svá ráði hans, at hann hafði þat eitt til atvinnu sér, er hann skaut fugla fyrir
sik. Hann spennir þá at sér um bol ok fætr næfrum. Síðan gerir hann sér næfrahött mikinn á höfuð sér. Er
hann ekki öðrum mönnum líkr, meiri miklu en allir menn aðrir, er hann er allr þakinn næfrum. Nú er ekki
sagt frá honum fyrr en hann kemr ór mörkum fram, ok sér hann, at heruð hefjast upp fyrir honum. Hann
sér, at þar stendr einn bær mikill, en þar var annarr bær skammt frá. Þat kom honum í hug, at hann mundi
snúa á inn minna bæinn; þat hafði hann aldri fyrr freistat. Hann gengr þar at dyrum. Þar var maðr fyrir
d u ok klauf skíð. “á va lítill ve ti ok hvít f i hæ u .
20
Hann heilsar þeim vel, er kominn var, ok spurði karl hann at nafni.
"Næframaðr heiti ek," sagði ha
21
… O“, 24 .
(...) engi er önnur jafnfrið í Garðaríki ok viðar annarstaðar. (OS, 24)
22
Trecho de difícil versão por conter ditados e expressões idiomáticas. Segue a redação A/B, ed. Guðni
Jónsson & Carl Rafn:
"Ek heiti Næframaðr," sagði hann. "
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Hverr ertu, félagi?" sagði konungr.
"Þat veit ek," sagði hann, "at ek em hvívetna eldri, ok er hvárki vitit né minnit heima hjá mér, ok
hefik lengi legit úti á mörkum nær alla ævi mína. En bráð eru brautingja erendi, konungr, ek vil
biðja þik vetrvistar."
Konungr svarar: "Ertu at nokkuru íþróttamaðr?"
"Þat ferr fjarri," sagði hann, "því at ek em óliprari en aðrir menn."
"Nennir þú nokkuru?" sagði konungr.
"Ek kann ekki at vinna, enda nenni ek ekki at vinna," sagði Næframaðr.
"Þá horfir allóvænt" sagði konungr, "fyrir því at ek hefi þess heit strengt at taka við þeim einum
mönnum, at þeir sé at nokkuru íþróttamenn."
"Aldri kann ek einn hlut at gera," sagði Næframaðr, "þann öðrum sé gagn at."
"Kunna muntu at draga saman dýr, ef menn skjóta," sagði konungr. "Þá má vera, at ek fara til
þess eitthvert sinn."
"Hvar vísar þú mér til sætis?" sagði Næframaðr.
"Þú skalt sitja utar inum óæðra megin, þar sem mætast þrælar ok frelsingjar." (OS, 24)
23
Konungr leit við honum ok mælti: "Bogmaðr ertu mikill."
"Já, herra," sagði hann, "því hefi ek helzt vanizt at skjóta dýr ok fugla til matar mér." (OS, 25).
24
"Svá vel sem skotit var it fyrra sinn," segir konungr, "þá er nú miklu betr skotit, ok þat má ek segja, at
aldrigi hefi ek sét jafnvel skotit." (OS, 26).
25
Ok nú spyrr konungr: "Hvárt ertu ekki öðrum mönnum líkr um íþróttir, bæði um skot ok sund?"
"Sénar eru nú allar mínar íþróttir, er þessar eru," sagði Næframaðr; "ek heiti Oddr, ef þú vilt þat vita, en
ek kann eigi greina fyrir þér um kyn mitt." (OS, 26).
26
27
Þat ætlu
vé , at vé vitu
eigi allge la, hve
vé h fu
hé í fóst i haft O“, 27
"Svá má vera," sagði konungr, "eða hverr er þessi maðr, er svá hefir dulizt fyrir oss?"
"Nú heiti ek Oddr, sem ek sagða yðr fyrir löngu, sonr Gríms loðinkinna norðan ór Noregi."
"Ertu eigi sá Oddr, er fór til Bjarmalands fyrir löngu?"
"Sá er maðrinn, er þar hefir komit." (OS, 27)
28
A lista atravessa toda a costa do Báltico, de nordeste a sudoeste, citando regiões específicas que
compõem as atuais Finlândia (Kirjálalandi – Karelia; Rafestalandi - Tavastehus), Estônia (Refalandi –
Revalia; Virlandi – Virumaa; Eistlandi – Estônia propriamente dita), Letônia (Líflandi – Livônia; Cúrlandi Kúrland), a Prússia Oriental (Vitlandi – Witland; Lánlandi – Samland; Ermlandi - Warmia) e a Polônia
(Púlinalandi). Encontra paralelos em outras fontes escandinavas como, por exemplo, a Heymslýsing (AM
544 4to, f.3v), onde se lê:
“Hia Garðariki liggia lond þessi
[a.] Kirialir, Refalir, Tafeistaland
[b.] Virland, Eistland,
http://ppg.revistas.uema.br/index.php/brathair
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Brathair 15 (1), 2015
ISSN 1519-9053
[c.] Lifland, Kurl [and],
[d.]
[e.] Erml [and], Púlinaland
Obtido em Hauksbók. Edição de JÓNSSON, p.155.
29
Nokkurum tíma síðar sendir Kvillánus Oddi gjafir miklar bæði í gulli ok silfri ok marga góða gripi ok þar
með vináttumál ok sættarboð. Þá Oddr þessar gjafir, því at hann fyrirstóð af sinni vizku, at Ögmundr
Eyþjófsbani, sem þá nefndist Kvillánus, var ósigranligr, því at hann mátti eigi síðr kallast andi en maðr. Ok
er eigi getit, at þeir hafi síðan nokkura hluti við átzt, ok lauk svá þeira skiptum. (OS, 30).
http://ppg.revistas.uema.br/index.php/brathair
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