t
stitu
In
Brazilian Journal of Biosciences
ências
Revista Brasileira de Biociências
de Bio
ci
o
UF
RGS
ISSN 1980-4849 (on-line) / 1679-2343 (print)
ARTIGO
Primeiro registro de Quekettia vermeuleniana Determann
(Orchidaceae) para o Brasil
Jefferson José Valsko1, Ana Sofia Sousa de Holanda2 e Amauri Herbert Krahl2*
Recebido: 16 de setembro de 2013
Recebido após revisão: 23 de julho de 2014
Aceito: 3 de agosto de 2014
Disponível on-line em http://www.ufrgs.br/seerbio/ojs/index.php/rbb/article/view/2771
RESUMO: (Primeiro registro de Quekettia vermeuleniana Determann (Orchidaceae) para o Brasil). A espécie Quekettia
vermeuleniana Determann é registrada pela primeira vez para o Brasil, no estado do Amazonas (Manaus), sendo coletada em
floresta ombrófila densa. Uma descrição, uma ilustração da espécie e uma chave de identificação das espécies brasileiras estão
propostas melhor identificação.
Palavras-chave: Floresta ombrófila densa, orquídea, Amazônia.
ABSTRACT: (First record of Quekettia vermeuleniana Determann (Orchidaceae) in Brazil). The species Quekettia vermeuleniana Determann is recorded for the first time in the Brazil, in the state of Amazonas (Manaus), and it was collected in dense
ombrophilous forest. A description and an illustration for the species, and an identification key for Brazilian species are provided
for a better identification.
Key words: Dense ombrophilous forest, orchid, Amazônia.
INTRODUÇÃO
MATERIAL E MÉTODOS
Orchidaceae é a maior família das fanerógamas e
possui aproximadamente 25.000 espécies em cerca de
850 gêneros distribuídos por quase todo o planeta, sendo
que a maioria ocorre nos trópicos (Dressler 1993, Fay
& Chase 2009). No Brasil ocorrem 240 gêneros e 2.451
espécies (Barros et al. 2013) e podem ser encontradas em
todas as formações vegetais brasileiras (Hoehne 1949).
Na Amazônia são catalogadas 737 espécies em 147
gêneros (Barros et al. 2013). Na região de Manaus, vários
trabalhos com orquídeas foram desenvolvidos nas décadas 1970 e 1980 (Braga 1977, 1978, 1981, 1982), porém,
a maioria tratou somente das fitofisionomias campina e
campinarana (Braga 1977, 1982). Para a floresta ombrófila densa, cita-se o trabalho de Cruz & Braga (1997).
O gênero Quekettia Lindl. foi descrito por John Lindley em 1839 em homenagem ao botânico inglês Edwin
John Quekett, sendo Quekettia microscopica Lindl. a
espécie tipo (Lindley 1839). Até o momento, não existe
uma revisão taxonômica para o gênero. Para o Brasil, são
listadas somente três espécies: Quekettia microscopica
Lindl., Quekettia papillosa Garay e Quekettia pygmaea
(Cogn.) Garay & R.E. Schult. (Barros et al. 2013). Portando, diante destas informações, este trabalho teve como
objetivo relatar a descoberta de Quekettia vermeuleniana
Determann para o Brasil, na região de Manaus, o que
implica na ampliação da sua área de ocorrência.
O Projeto Dinâmico Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF) foi criado na década de 1970 com o
intuito de aplicar a teoria da biogeografia de ilhas para
o planejamento de unidades de conservação, a fim de
avaliar a importância da manutenção de uma reserva
florestal grande ou de várias pequenas de igual tamanho
(Biergaard et al. 1992). Sendo assim, durante um estudo
da flora de Orchidaceae das reservas do PDBFF na região do município de Manaus, foi constatada a primeira
ocorrência de Q. vermeuleniana para o Brasil. A espécie
foi encontrada em um trecho de floresta ombrófila densa,
situada em um fragmento de 100.000 m2 na Reserva Porto
Alegre (59o56’06.58”W / 59o56’06.55”W e 2o22’50.30”S
/ 2o21’41.83”S), isolada entre os anos de 1980 e 1990
(Biergaard et al. 1992), da qual pertence ao PDBFF e está
localizada a aproximadamente 80 km ao norte da cidade de Manaus, estado do Amazonas. Foram realizadas
consultas aos herbários indexados EAFM, HB, HBRA,
IAN, INPA, MG, MIRR e PA (acrônimos de acordo com
Thiers 2013) e ao herbário não indexado HUAM da
Universidade Federal do Amazonas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quekettia vermeuleniana Determann, Selbyana
5(3-4): 306. 1981 (Figs. 1-3).
Erva epífita, cespitosa, cerca de 5,00 cm de altura.
Raízes fasciculadas, crassas, cilíndricas, esbranquiçadas.
1. Programa de Pós-Graduação em Diversidade Biológica, Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Av. Gal. Rodrigo Otávio Jordão
Ramos, 3000, CEP 69077-000, Manaus, AM, Brasil.
2. Departamento de Botânica, Programa de Pós-graduação em Botânica, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Manaus,
AM, Brasil.
* Autor para contato. E-mail: amaurikrahl@hotmail.com
R. bras. Bioci., Porto Alegre, v. 12, n. 3, p. 173-176, jul./set. 2014
174
Valsko et al.
Rizoma inconspícuo. Pseudobulbos 2,60-3,00 × 1,301,60 mm, oblongo, unifoliado, esverdeado, rodeado
por bainhas imbricantes, 2,61-2,88 mm compr. Folhas
22,34-27,09 × 1,67-2,08 mm, semicilíndricas, achatadas,
levemente arqueadas, verdes com pontuações roxas,
ápice agudo. Inflorescência 9,25 mm compr., racemo
simples, lateral, 1-4-flora, amareladas, 2 flores abertas
simultaneamente. Bráctea floral 3,75 × 0,75 mm, lanceolada, creme a esverdeada com pontuações roxas,
ápice agudo. Sépala dorsal 4,45 × 0,75 mm, elíptica,
livre, amarelada, ápice acuminado; sépalas laterais 5,15
× 1,21 mm, lanceoladas, adnatas lateralmente em ¾,
assimétricas, amareladas, ápice acuminado; pétalas 4,41
× 1,22 mm, lanceoladas, amareladas com pontuações
roxas concentradas na base, ápice agudo; labelo 5,26 ×
2,10 mm, base estreita e oblonga, expandindo de forma
orbicular na porção distal, ápice arredondado, disco com
calo carnoso e oval, verde amarelado. Coluna 2,90 mm
compr., alongado no ápice, duas estruturas cilíndricas de
ápice agudo; antera dorsal; polínias 2, amarelas, ovais;
estipe retangular; viscídio elíptico, arqueado. Fruto não
observado.
Material examinado: BRASIL. AMAZONAS: Manaus, BR 174, km 63, Reserva Porto Alegre, 12 setembro
2012, J. J. Valsko s.n. (INPA); 12 setembro 2012, J. J.
Valsko s.n. (EAFM).
Figura 1. Ilustração de Quekettia vermeleuniana. A. Hábito. B. Flor em vista dorsal. C. Labelo em vista dorsal. D. Ginostêmio em vista lateral.
E. Ginostêmio em vista dorsal. F. Polínário em vista dorsal. G. Capa da antera em vista frontal. H. Sépalas, pétalas e labelo dissecados.
R. bras. Bioci., Porto Alegre, v. 12, n. 3, p. 173-176, jul./set. 2014
Quekettia vermeuleniana no Brasil
A espécie foi descrita em 1981 no Suriname (Determann 1981), sendo pouco conhecida e registrada somente
para Suriname e Guiana Inglesa (Carnevali et al. 2007) e
agora, com esse trabalho, sendo registrada para o Brasil
pela primeira vez, aumentando assim, sua área de dis-
Figura 2. Imagens de Quekettia vermeleuniana. A. Hábito. B. Flor
em vista lateral. C. Flor em vista dorsal. Escalas: 20 mm (A); 2 mm
(B-C).
175
tribuição. Difere-se das demais espécies brasileiras no
seu tamanho diminuto (cerca de 5 cm de altura), pela
inflorescência em racemo e por produzir até duas flores
abertas simultaneamente no máximo. Além disso, são
observadas diferenças morfológicas nas flores, tais como,
labelo com a porção proximal estreita e ápice expandido
de forma circular e esbranquiçado e pelo disco com calo
oval e carnoso do qual possui coloração verde amarelado.
O nicho em que os indivíduos foram encontrados
apresenta inundação periódica por curto período de
tempo, geralmente entre os meses de março a junho,
formando pequenas lagoas isoladas dentro da floresta.
Isso pode ser em relação do solo apresentar depressões,
sendo pouco drenável. O sub-bosque é composto por
palmeiras acaule e uma densa quantidade de arvoretas as
quais apresentam muitas briófitas e outras epífitas agregadas aos galhos, indicando uma alta umidade local. Os
indivíduos de Q. vermeleuniana foram encontrados em
duas árvores de aproximadamente 25 m de altura, recém
caídas na floresta, distanciadas a 50 m uma da outra,
ocupando os galhos mais finos nas copas das árvores, o
que tudo indica que a orquídea ocupa o dossel da floresta
onde a luminosidade é alta, assim como observado por
Determann (1981) no Suriname.
A chave de identificação foi baseada nas descrições
originais (Lindley 1839, Cogniaux 1909, Garay 1954,
Determann 1981), na descrição de Q. microscopica de
Cogniaux (1904-1906) e nas flores dissecadas apresentadas por Pabst & Dungs (1977).
Figura 3. Imagem a partir de digitalização em escaner do espécime
coletado. Escala: 10 mm.
R. bras. Bioci., Porto Alegre, v. 12, n. 3, p. 173-176, jul./set. 2014
176
Valsko et al.
Chave de identificação para as espécies brasileiras de Quekettia
1. Labelo com alguma calosidade .............................................................................................................................. 2
1’. Labelo sem calosidade .......................................................................................................................................... 3
2. Labelo com uma calosidade; inflorescência em racemo simples ............................... Quekettia vermeuleniana
2’. Labelo bicaloso; inflorescência em racemo duplo ....................................................... Quekettia microscopica
3. Labelo oblanceolado e inteiro; sépalas laterais coalescentes lateralmente. .................... Quekettia papillosa
3’. Labelo triangular e trilobado; sépalas laterais livres...................................................... Quekettia pygmaea
REFERÊNCIAS
BARROS, F., VINHOS, F., RODRIGUES, V. T., BARBERENA, F. F. V.
A., FRAGA, C. N., PESSOA, E. M., FORSTER, W. & MENINI-NETO,
L. 2013. Orchidaceae. In: Lista de Espécies da Flora do Brasil. Jardim
Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://floradobrasil.jbrj.gov.
br/jabot/floradobrasil/FB20177>. Acesso em: 05 fev. 2014.
COGNIAUX, A. 1904-1906. Orchidaceae. In: MATIUS, C.F.P.,
EICHLER, A.G. & URBAN, I. (eds.). Flora Brasiliensis. v. 3. pt 6. Munich: F. Fleischer. p. 1-604.
COGNIAUX, A. 1910. VII. Orchidaceae. In: URBAN, I. (ed.). Symbolae Antillanae seu Fundamenta Florae Indiae Occidentalis, 6: 293-696.
BIERREGGARD, R. O., LOVEJOY, T. V., KAPOS, A. S. & HUTCHINGS R. 1992. The biological dynamics of tropical rain forest fragments.
BioScience, 42: 859–866.
CRUZ, J. & BRAGA, P. I. S. 1997. Aspectos taxonômicos e fenológicos
de Orchidaceae epifíticas no campo petrolífero do rio Urucu, Amazonas
– Brasil. Revista da Universidade do Amazonas - Série Ciências Biológicas, 1(1): 1-137.
BRAGA, P. I. S. 1977. Aspectos biológicos das Orchidaceae de uma
campina da Amazônia Central. Acta Amazonica, 7(2): 1-89.
DETERMANN, R. O. 1981. A new species of Quekettia (Orchidaceae)
from Surinam. Selbyana, 5(3-4): 306-307.
BRAGA, P. I. S. 1978. Estudos da flora orquidológica do Estado do Amazonas III – X Brassocattleya rubyi Braga (Orchidaceae) híbrido natural
novo da flora amazônica. Acta Amazonica, 8(3): 371- 378.
DRESSLER, R. L. 1993. Phylogeny and classification of the orchid family. Cambridge; Harvard University Press. 314 p.
BRAGA, P. I. S. 1981. Orquídeas das campinas amazônicas brasileiras.
Bradea, 3(23): 170- 173.
BRAGA, P. I. S. 1982. Aspectos biológicos das Orchidaceae de uma
campina da Amazônia Central. II – Fitogeografia das campinas da
Amazônia Brasileira. Tese (Doutorado em Botânica). Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e Fundação Universidade do Amazonas,
Manaus, Amazonas, 345 p.
CARNEVALI, G., CHRISTENSON, E., FOLDATS, E., RAMÍREZMORILLO, I. M., ROMERO-GONZÁLEZ, G. A., VARGAS, C. A. &
WERKHOVEN, M. 2007. Orchidaceae. In: FUNK, V., HOLLOWELL,
T., BERRY, P., KELLOFF, C. & ALEXANDER, S. N. (Eds.). Checklist
of the Plants of the Guiana Shield (Venezuela: Amazonas, Bolivar, Delta
Amacuro; Guyana, Surinam, French Guiana). The Contributions from the
United States National Herbarium, 55: 131.
FAY, M. F. & CHASE, M. W. 2009. Orchid biology: from Linnaeus via
Darwin to the 21st century. Annals of Botany, 104(3): 259-364.
GARAY, L. A. 1954. Notatio orchidologica III. Archivos do Jardim
Botânico do Rio de Janeiro, 13: 29-54.
HOEHNE, F. C. 1949. Iconografia de orquidáceas do Brasil. São Paulo:
Secretaria da Agricultura. 601 p.
LINDLEY, J. 1839. Quekettia microscopica. Edwards’s Botanical Register 25: Misc. 3, James Ridgway: London.
SILVA, M. F. F. & SILVA, J. B. F. 2004. Orquídeas nativas da Amazônia
Brasileira II. Belém: Universidade Federal Rural do Pará, Museu
Paraense Emílio Goeldi. 540 p.
THIERS, B. 2013. Index Herbarium. A global directory of hebaria and
associated staff. New York Botanical Garden’s Virtual Herbarium. Disponível em: <http://sweetgum.nybg.org/ih/>. Acesso em: 16 mar. 2013.
R. bras. Bioci., Porto Alegre, v. 12, n. 3, p. 173-176, jul./set. 2014