Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

Academia.eduAcademia.edu
OmniPax Editora Rev Bras Terap e Saúde, 9(2):1-7, 2019 Yoga para Manejo e Redução da Síndrome de Burnout em Profissionais da Saúde Yoga to Handle and Reduce the Burnout Syndrome in Health Professionals Laura Sanches Lopes a , Randolfo dos Santos Junior a , Alexandre Lins Werneck a ∗ a Programa de Residência Multiprofissional em Atenção ao Câncer, Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP) Resumo: Contextualização: O trabalho da enfermagem envolve aspectos estressores relacionados a questões administrativas, questões ocupacionais e de relações humanas. Esses estressores podem afetar a saúde dos trabalhadores de instituições hospitalares, causando-lhes prejuízos como, por exemplo, o desenvolvimento da síndrome de burnout. Objetivo: Avaliar os efeitos da intervenção com a prática de yoga como estratégia para o manejo e redução da síndrome de burnout em profissionais de enfermagem. Métodos: Este é um estudo longitudinal prospectivo com abordagem quantitativa. Para a avaliação utilizamos um questionário para a obtenção de dados sociodemográficos e ocupacionais, bem como o Maslach Burnout Inventory Services Survey, a Escala de Coping Ocupacional e a Escala de Ansiedade e Depressão Hospitalar. Foram realizadas dez sessões com a prática de yoga, com periodicidade de um encontro por semana. Resultados: Após a intervenção foi observado uma melhora significativa dos indicadores de estresse, ansiedade, depressão e da estratégia de manejo para enfrentamento dos estressores ocupacionais. Conclusão: A partir dessa experiência são necessários novos estudos com amostras maiores e maior controle de variáveis, assim como sessões regulares para manutenção dos ganhos com a prática de yoga a fim de que os benefícios não se percam. Palavras-chave: Intervenção, Yoga, Síndrome de burnout, Adaptação psicológica. Abstract: Background: Nursing work involves stressful factors related to management, occupational and human relations issues. These stressors can affect the workers’ health at hospital institutions, causing impairments such as the development of burnout syndrome. Objective: To evaluate the effects of the early medical intervention with the practice of yoga as a strategy for the management and reduction of the burnout syndrome in nursing professionals. Methods: This is a longitudinal prospective study with a quantitative approach. We used, for the evaluation, a questionnaire to obtain socio demographic and occupational data, the Maslach Burnout Inventory Services Survey, the Occupational Coping Scale, and the Hospital Anxiety and Depression Scale. The program consisted of ten yoga sessions, once a week. Results: After an intervention through Yoga, a significant improvement was observed in the indicators of stress, anxiety, depression, and in the management strategy to face occupational stressors. Conclusion: From this experience, new studies with larger samples and greater control of variables are necessary, as well as regular sessions to maintain gains obtained and not to lose the benefits with the practice of yoga. Keywords: Early medical intervention, Yoga, Burnout syndrome, Psychological adaptation. 1. Introdução O trabalho de enfermagem em oncologia pode demandar um grande investimento do profissional dessa área, tanto mental quanto afetivo, pelo fato de ele precisar lidar com diversos aspectos envolvidos no tratamento de uma doença grave, como a revelação do diagnóstico, a tomada de decisão a respeito de tratamentos e prognósticos, a necessidade de cuidados prolongados e intensivos, e, em alguns momentos, o cuidado de pacientes que se encontram fora de possibilidade terapêutica, assim como relacionar-se constantemente, em todo o processo, com os pacientes, seus acompanhantes e/ou familiares. Estes fatores relacionados à natureza do câncer, à complexidade do cuidado oferecido, ao envol∗ Autor correspondente: slopes.lau@gmail.com DOI 10.7436/rbts-2019.09.02.01 vimento intenso com pacientes e familiares, associados ainda aos conflitos interdisciplinares e éticos experienciados pela equipe, são considerados estressores no trabalho com oncologia e nem sempre, porém, os profissionais encontram-se psicologicamente preparados para enfrentar todas essas situações 1 . No que concerne à organização do trabalho de enfermagem, frequentemente é preciso enfrentar condições ocupacionais precárias, tais como: sobrecarga de trabalho (constantemente justificada por falta de pessoal), a indefinição do papel profissional, a falta de autonomia e autoridade na tomada de decisões, entre outras. Estas condições podem gerar estresse, que, por sua vez, tem o potencial de se desenvolver como causa ou condição para inúmeros problemas de saúde, como doenças autoimunes, articulares, cardiISSN 2177-9910 2 ovasculares, câncer, diabete, infecções, ansiedade e depressão, além de também poder estar associado a um alto índice de absenteísmo no trabalho 2,3 . Esta série de consequências indica que os profissionais dessa área precisam de estratégias eficazes de enfrentamento para gerenciar a vida profissional moderna. Frente a circunstâncias ameaçadoras ou desafiadoras, o indivíduo busca meios de enfrentamento para lidar com os estressores crônicos ou agudos, recorrendo a um conjunto de esforços cognitivos e comportamentais tendo em vista atuar sobre o problema a partir das exigências situacionais, dos fatores pessoais e dos recursos disponíveis. Este conjunto de estratégias de enfrentamento conceitua-se como coping e refere-se a uma variável individual que interatua com outros fatores, podendo ter seu foco na solução de problemas ou na regulação da emoção envolvida 4 . Quando os mecanismos de coping falham ou se tornam insuficientes para lidar com os estressores crônicos vivenciados, o indivíduo pode, consequentemente, desenvolver a síndrome de burnout, que é uma síndrome multidimensional que ocorre a partir de uma resposta inadequada do indivíduo ao estresse emocional crônico decorrente do ambiente do trabalho. Seus componentes podem aparecer associados, ou independentes entre si, sendo eles: exaustão emocional (EE), despersonalização (DE) e baixa realização profissional (RP) 5 . A respeito de cada um destes componentes, entende-se que a exaustão emocional configura a falta de energia associada a um sentimento de esgotamento emocional. Já a despersonalização diz respeito ao distanciamento emocional que pode se refletir no modo como o trabalhador se relaciona com as pessoas, por exemplo com indiferença e sequidão. Por fim, a baixa realização profissional se caracteriza pelo sentimento de fracasso no trabalho, insatisfação e desmotivação, podendo levar ao desejo de abandonar a profissão 2,5 . A partir do reconhecimento do burnout como um fator relevante para a saúde dos profissionais, uma série de medidas de prevenção e intervenção estão sendo propostas como atenuantes para estes indicadores, servindo como proteção dos profissionais contra o estresse laboral. Sob o prisma do cuidado integral e da promoção de saúde, observa-se um crescente interesse pela prática de yoga, técnica milenar oriunda dos países orientais, especialmente da Índia, que tem sido difundida no ocidente em suas diversas ramificações. O yoga, consiste em uma abordagem de técnicas e cuidados com o corpo que considera a pessoa integralmente. Utiliza-se de exercícios combinados com a respiração para equilibrar o corpo físico, os processos mentais e psicológicos. Possui recursos Lopes et al. que promovem a autorregulação, o alívio de tensões psicofísicas (ansiedade, estresse e depressão), a associação de bem-estar e autoconhecimento, além de desenvolver a competência de estabelecer uma atitude saudável e equilibrada com relação à vida 6,7 . Com a Portaria no 849/2017, foi aprovada a inclusão do yoga, entre outras práticas, na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) do Sistema Único de Saúde brasileiro 8 . Este foi um passo substancial em favor do reconhecimento desta prática em benefício da saúde da população, abrangendo o espectro de seu alcance. Além disto, o yoga foi classificado como uma prática mente-corpo pela OMS e, apesar de não ser uma terapia, tem sido cada vez mais utilizado com sucesso no tratamento do estresse e da ansiedade. Tendo isso em vista, levou-se em conta uma série de estudos que apontam diversos efeitos benéficos do yoga como recurso terapêutico na área da saúde para compor os percursos de análise do presente trabalho. Entretanto, apesar da intensa propagação do yoga, não há a pretensão de substituir a conduta médica tradicional, senão integrá-lo à assistência a saúde 6,9 . Sendo assim, se esta prática é capaz de reduzir os níveis de estresse e ansiedade, então é possível que o yoga possa auxiliar no tratamento contra o burnout. O presente estudo teve como objetivo verificar o efeito da prática regular de yoga como recurso para o manejo e redução da síndrome de burnout e do coping ocupacional em profissionais de enfermagem de oncologia. 2. Métodos e Casuística 2.1. Procedimentos éticos Inicialmente o intuito deste trabalho foi realizar um estudo piloto acerca do impacto do yoga nos aspectos relacionados ao estresse organizacional a partir de um delineamento longitudinal prospectivo com abordagem quantitativa. A metodologia do estudo foi submetida à avaliação e aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, sob o parecer no 2.090.095, para sua posterior execução. Foi solicitado o consentimento livre e esclarecido para todos os participantes. 2.2. Seleção e alocação dos participantes O recrutamento dos sujeitos ocorreu após uma oficina realizada com a equipe de enfermagem do setor de oncologia clínica do Hospital de Base de São José do Rio Preto, no próprio local de trabalho, durante o expediente, totalizando 14 funcionários presentes. Yoga para manejo e redução da síndrome de burnout em profissionais da saúde 3 de yoga, conforme o seguinte protocolo de pesquisa. 2.3. Instrumentos de avaliação 2.3.1. Questionário para a obtenção de dados sociodemográficos e ocupacionais O questionário desenvolvido pela autora do presente trabalho visou coletar os dados sócio demográficos e ocupacionais dos participantes incluindo nome, gênero, idade, estado civil, número de filhos, escolaridade, função que ocupa na organização, tempo na função, tempo de trabalho na organização, jornada diária de trabalho (parcial e total), número de empregos, renda individual, religião, crença ou espiritualidade, doença, se pratica atividade física, se já praticou yoga, se realiza atividades de lazer, se realiza tratamento médico atualmente, se faz uso de medicamentos e se faz uso de substâncias psicoativas. Figura 1: Fluxograma dos participantes na intervenção. A oficina teve como objetivo discutir a temática do estresse nos serviços de saúde, os sintomas da síndrome de burnout e, posteriormente, vivenciar o yoga e a meditação por meio de experiência sensorial utilizada como recurso para o manejo do estresse. Dentre os sujeitos presentes na oficina, somente cinco aceitaram voluntariamente participar do estudo após a explicação do programa, leitura e preenchimento do termo de consentimento livre e esclarecido. Na Figura 1, encontra-se resumido o fluxograma dos participantes na intervenção. Os critérios de inclusão no estudo consistiram em completar todas as etapas do estudo (no mínimo 70%), preencher corretamente os instrumentos de avaliação e apresentar disponibilidade para participar semanalmente do grupo de intervenção realizado no horário e no setor de trabalho, em uma sala reservada previamente. Os participantes foram, então, submetidos a duas avaliações: uma que ocorreu após a oficina (antes do início do programa) e outra ao final do programa 2.3.2. Maslach Burnout Inventory Services Survey (MBI-HSS) Este inventário é a versão em português, traduzida e adaptada por Trigo 10 . Pode ser usado com o intuito de diagnosticar e/ou avaliar a predisposição dos indivíduos à síndrome de burnout, e é destinado aos profissionais dos serviços de saúde e correlacionados. O MBI-HSS é utilizado para avaliar os três aspectos do burnout: EE, DE e RP. Cada um destes aspectos é medido por uma subescala separadamente. A subescala de exaustão emocional (EE) avalia as queixas sobre esgotamento emocional, ao passo que a subescala de despersonalização (DE) mede respostas impessoais e falta de empatia durante a atividade profissional (clientes, pacientes). Por outro lado, a subescala de realização pessoal (RP) avalia os sentimentos de competência e satisfação com o trabalho. Trata-se de um questionário de autopreenchimento respondido por escala tipo likert de 7 pontos. A escala apresenta 22 itens, sendo nove relacionadas à EE; cinco, à DE; e oito, à RP. A literatura apresenta dois critérios de rastreamento com relação à interpretação do MBI. Autores apontaram a ocorrência da síndrome quando há a combinação de altas pontuações em todas as subescalas 11 . Todavia, há também autores que empregam como critério a presença de alta pontuação em pelo menos uma das subescalas 12 . 2.3.3. Escala coping ocupacional Este instrumento é a versão brasileira da escala proposta por Latack 13 . Validado para mensuração em ambiente ocupacional por Pinheiro, Trócolli & Tamayo 14 . A escala apresenta os fatores de controle (tentativas de modificar os fatores que causam 4 a situação estressora), esquiva (evitar a situação, delegar tarefas, procrastinação, etc.) e manejo de sintomas (comportamentos de saúde e autocuidado como medidas de proteção). É composta de vinte e nove itens, sendo que onze estão relacionados ao controle; nove, à esquiva; e outros nove itens, ao manejo do estresse (com opções de intensidade que variam). 2.3.4. Escala de Ansiedade e Depressão Hospitalar (HADS) A escala em questão visa detectar graus leves de transtornos afetivos em adultos. Ao paciente, é solicitado e recomendado que responda baseando-se em como se sentiu durante a última semana. Possui 14 questões de múltipla escolha em duas subescalas (ansiedade e depressão) com sete itens cada (ponto de corte 8). Foram adotados os pontos de corte apontados, recomendados para ambas as situações: de 0 a 7 pontos: improvável, de 8 a 11 pontos: possível (questionável ou duvidoso) e de 12 a 21: provável, apontados por Zigmond e Snaith 15,16 . 2.4. A intervenção com o Hatha Yoga As sessões foram conduzidas pela própria pesquisadora do presente trabalho, que tem formação em Hatha Yoga, vertente de yoga mais difundida no ocidente, que é composto por posturas corporais, controle da respiração, concentração e meditação 17 . A intervenção englobou a prática de yoga fundamentada em seus aspectos filosóficos e técnicas corporais de introspecção, aquecimento, posturas (àsanas), exercícios de respiração (pranayamas), meditação (livre ou guiada) e relaxamento (yoganidra), durante uma mesma sessão, sendo realizadas dez sessões semanais de, em média, 50 minutos. Basicamente, cada sessão foi executada em dois momentos, sendo o primeiro dedicado à prática de yoga, com duração de 40 minutos. Essa prática era iniciada em posição sentado com momento de introspecção, aquecimento através da movimentação suave das articulações (cabeça, coluna, ombros, quadris e membros), alongamentos e exercícios de respiração (respiração completa, polarizada, bhástrika, kapalabhati, sama vrtti, entre outras), em seguida, trabalhadas as posturas (àsanas) em pé de forma progressiva, em termos de exigência energética e dificuldade, sendo reduzida a intensidade e, posteriormente, realizada a meditação e o relaxamento. O segundo momento era dedicado à troca de experiências, que durava 10 minutos, a fim de ouvir os participantes, compartilhar dúvidas, sensações ou sentimentos que emergiram durante a sessão. Lopes et al. 3. Resultados Uma semana após a seleção dos participantes, foi iniciada a intervenção com as práticas de yoga. A única participante a concluir o programa não esteve presente nos dois primeiros encontros devido ao seu período de férias, portanto realizou apenas 8 das 10 sessões. A seguir, encontram-se os resultados verificados antes e depois das sessões. 3.1. Questionário para a obtenção de dados sociodemográficos e ocupacionais A participante foi submetida à avaliação pelo protocolo de pesquisa de autopreenchimento. Entre os dados sociodemográficos, destacaram-se: sexo feminino, 35 anos, divorciada, mora com os pais e com os dois filhos, reside na cidade de São José do Rio Preto, SP. Ademais, no quesito escolaridade, está cursando pedagogia à noite e, em razão disso, faz estágio no ensino infantil pela manhã, com duração de cinco horas. Também trabalha em instituição hospitalar à tarde (com expediente de seis horas), totalizando, juntamente com o estágio, uma jornada diária de trabalho de onze horas. Tem como renda individual de 1 a 2 salários mínimos. É da religião católica, não pratica atividade física e/ou atividade de lazer. Além disto, atualmente realiza tratamento para depressão e faz uso dos seguintes medicamentos: escitalopran, depakene e quetiapina. O dado de maior relevância encontrado após a intervenção foi uma significativa redução do uso de medicação psiquiátrica com o acompanhamento do médico psiquiatra responsável. Manteve-se apenas o uso do escitalopran. 3.2. Maslach Burnout Inventory Services Survey (MBI-HSS) No MBI, foram avaliadas as informações para a síndrome de burnout evidenciando indicador grave de exaustão emocional, indicador moderado de despersonalização e indicador grave de baixa realização profissional. Após o programa, evidenciou-se uma redução dos indicadores de exaustão emocional e despersonalização, ambos para leve. O indicador de baixa realização profissional manteve-se grave, como é possível observar na Tabela 1. 3.3. Escala de coping ocupacional Na Escala de Coping Ocupacional, foi observada uma tendência ao uso mais recorrente de estratégias de controle e esquiva na primeira avaliação. Após o programa, houve um aumento significativo no indicador de manejo. Não houve mudança significativa nos índices de controle e esquiva, conforme Tabela 2. Yoga para manejo e redução da síndrome de burnout em profissionais da saúde 5 Tabela 1: Resultados de avaliação do MBI-HSS pré e pós-intervenção. MBI-HSS Pré-intervenção Pós-intervenção Exaustão emocional Despersonalização Baixa realização profissional 4.1 (Grave) 2.6 (Moderado) 4.5 (Grave) 1.2 (Leve) 0.4 (Leve) 4.875 (Grave) Tabela 2: Resultados de avaliação da escala de coping ocupacional pré e pós-intervenção. Escala de Coping Ocupacional Pré-intervenção Pós-intervenção Controle Esquiva Manejo 3,45 3 1,5 3,81 3 2,88 Tabela 3: Resultados de avaliação do HAD pré e pósintervenção.. HAD Pré-intervenção Pós-intervenção Ansiedade Depressão 14 16 5 2 3.4. Escala de Ansiedade e Depressão Hospitalar (HAD) No HAD, evidenciou-se indicadores que sugerem provável ansiedade e depressão. Posteriormente ao programa, houve significativa redução nesses indicadores, conforme Tabela 3. 4. Discussão A participante do presente estudo apresentou fatores de vulnerabilidade, precarização da saúde mental, indicadores elevados de estresse, ansiedade e depressão. Embora não seja um estudo com uma grande população e, por este motivo, com resultados que não podem ser generalizados, os efeitos benéficos para a síndrome de burnout, coping ocupacional, ansiedade e depressão após a intervenção foram notáveis no presente estudo de caso. Na avaliação do burnout, anterior ao início do programa, evidenciou-se sua provável ocorrência, uma vez que há a combinação de altas pontuações em todas as subescalas (EE, DE e RP). Alguns estudos realizados com equipes de enfermagem corroboram e enfatizam a importância e a necessidade de estudos sobre o tema. Em estudos de revisão observam-se indicadores de burnout variando de 7,7% a 41% entre profissionais de saúde no Brasil e em outros países 18 . Após a intervenção, a paciente apresentou uma resposta favorável ao programa proposto evidenciando uma redução dos índices de exaustão emocional e despersonalização, que caíram para “leve”. No entanto, manteve-se grave a baixa realização com o trabalho, dado que aponta a limitação do programa quanto a este aspecto, uma vez que a prática de yoga não interfere na insatisfação com o trabalho. A insatisfação com o trabalho está relacionada com as variáveis ocupacionais, que podem ser desencadeadoras da síndrome e estão ligadas aos fatores estressores que envolvem aspectos das relações administrativas, organizacionais e humanas 19 , podendo exceder as fontes de adaptação do indivíduo ao sistema social no qual está inserido. Quanto aos mecanismos concernentes às estratégias de enfrentamento utilizadas pela participante no ambiente de trabalho, na primeira avaliação predominaram o uso de estratégias de enfrentamento ocupacional baseadas em esquiva (evitar a situação, delegar tarefas, procrastinação, etc) e controle (tentativas de modificar os fatores que causam a situação estressora). Após o programa, foi constatada uma melhora significativa nas estratégias de manejo (comportamentos de saúde e autocuidado como medidas de proteção) apresentadas pela participante, evidenciando uma provável efetividade da prática de yoga para a potencialização desta estratégia. Dito isto, é importante atentar ao fato de que o aumento do índice de manejo resultou em um equilíbrio entre as estratégias de controle, esquiva e manejo para o enfrentamento dos estressores ocupacionais. Tendo isto em vista, é importante salientar que todas as estratégias são potencialmente adequadas para a manutenção da saúde mental, sendo necessário avaliar o contexto e a finalidade para qual está sendo utilizada. A literatura aponta que o yoga está surgindo como uma alternativa ao tratamento padrão para a depressão, o que se justifica por diversas razões, por exemplo, a remissão insuficiente e/ou efeitos adversos de antidepressivos, a preferência por evitar medicamentos ou reduzir o uso, a falta de recursos 6 financeiros, entre outras 20 . Desta forma, foi possível verificar, ao final do presente estudo, uma significativa redução no uso de medicação psiquiátrica, acompanhada pelo médico psiquiatra responsável O aumento no manejo do estresse como estratégia de enfrentamento, por meio da prática de yoga, pode indicar uma consequente correlação com a significativa redução dos indicadores de ansiedade e depressão apresentados pela participante ao final da intervenção. Destaca-se a importância de verificar esta afirmação, sobre a possível correlação entre tais variáveis, em novos estudos com populações maiores e com testes estatísticos. De acordo com um estudo de revisão, foi possível responder, baseado em evidências, que o yoga melhora cerca de 40% dos sintomas de ansiedade e depressão sem efeitos colaterais nocivos, podendo ser utilizada por si ou como tratamento adjuvante 21 . Após o programa com a prática de yoga houve melhora significativa dos indicadores de estresse, ansiedade, depressão e da estratégia de manejo para enfrentamento dos estressores. Tal melhoria se encontra em consonância com os estudos atuais que apontam que o yoga pode ser benéfico para a melhoria do estresse, da ansiedade e para a promoção da saúde psicológica geral 22 ; da saúde psicológica e comportamentos saudáveis, como mindfulness, estresse, resiliência, afeto e qualidade do sono 23 ; da depressão 20 ; da qualidade de vida no trabalho 6 ; da qualidade do sono e estresse no trabalho 24 ; do autocuidado e burnout em enfermeiros 25 , entre outros. Para a realização da intervenção com a prática de yoga no contexto hospitalar foram realizados os ajustamentos e adaptações necessários à prática, considerando a caracterização da população, o tempo disponibilizado pela chefia e a estrutura física disponível para a realização das sessões. Optou-se por realizar uma prática que facilitasse o envolvimento dos participantes no estudo, no entanto, apesar das adaptações empreendidas, houve baixa adesão dos participantes até o final do estudo. Sendo assim, a desistência dos participantes levounos a escrever o presente relato de caso da participante que completou o estudo. Corroborando com outro estudo, ressaltamos que aspectos distintos possam ter dificultado a implementação do programa, como fatores culturais e religiosos; aspectos relacionados à dinâmica ocupacional, como redução do pessoal de enfermagem, sobrecarga de trabalho, disponibilidade de tempo e eventual prejuízo no desempenho das atividades demandadas pelo serviço, o que pode ter provocado ansiedade ou insegurança nos participantes 6 . Observou-se que houve uma dificuldade da equipe em conciliar a atividade proposta com a rotina vigente. Apesar das dificuldades encontradas, notou- Lopes et al. se uma repercussão positiva da intervenção com o yoga nos participantes, até mesmo naqueles que não finalizaram o programa, mas expressaram o interesse em sua continuação. Mostra-se necessário o envolvimento das organizações com a saúde integral dos profissionais, buscando desenvolver uma cultura que estimule o autocuidado e prevenção do estresse entre os trabalhadores como educação continuada e forma de prevenção às doenças ocupacionais. Estas iniciativas contribuirão seguramente para uma melhor qualidade de vida dos profissionais, gerando, por conseguinte, uma melhor qualidade no serviço ofertado aos pacientes. 5. Conclusão Após a intervenção, foi observado que a prática de yoga trouxe benefícios à participante, uma vez que proporcionou uma melhora significativa dos indicadores de estresse, ansiedade, depressão e da estratégia de manejo para enfrentamento dos estressores ocupacionais. Há, no Brasil, uma escassez de estudos com amostras maiores e que possam ter um maior controle de variáveis para avaliar a eficácia dessas intervenções e, dessa forma, apoiar a prática de yoga no contexto ocupacional. Desse modo, seria importante haver mais estudos que pudessem demonstrar a eficácia de modelos de intervenção baseados em práticas integrativas com o yoga. A partir dessa experiência, recomenda-se que haja sessões regulares para manutenção dos ganhos proporcionados pela prática de yoga, com o propósito de que se torne um habito cotidiano que desenvolva a consciência de exercer, sempre que necessário, as técnicas aprendidas (de respiração, relaxamento, meditação, etc.) com o yoga a fim de que os benefícios não se percam. Referências [1] A. B. Rodrigues. Burnout e Estilos de Coping em Enfermeiros que Assistem Pacientes Oncológicos. Tese de doutorado em Enfermagem na Saúde do Adulto, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, 2006. [2] F. M. França, R. Ferrari, D. C. Ferrari, e E. Dornelles Alves. Burnout e os aspectos laborais na equipe de enfermagem de dois hospitais de médio porte. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 20(5):1–9, 2012. [3] I. M. Moraes Filho e R. J. Almeida. Estresse ocupacional no trabalho em enfermagem no Brasil: uma revisão integrativa. Revista Brasileira em Promoção da Saúde, 29(3):447–454, 2016. [4] S. M. S. Baqutayan. Stress and coping mechanisms: A historical overview. Mediterranean Journal of Social Sciences, 6(2):479–488, 2015. [5] Ministério da Saúde do Brasil. Doenças Relacionadas ao Trabalho: manual de procedimentos para os serviços de saúde. Number 114 in Série Normas e Manuais Técnicos. Editora MS, Brasília, DF, 2001. Yoga para manejo e redução da síndrome de burnout em profissionais da saúde [6] A. C. Spagnol, E. A. Villa, V. M. Valadares, M. E. A. Freitas, A. P. S. Silveira, J. S. Vieira, E. S. Candian, e B. K. S. Oliveira. O yoga como estratégia para promover a qualidade de vida no trabalho. Revista Conexão UEPG, 10(1):80–91, 2014. [7] L. A. L. Santos e D. L. Santos. A influência da prática regular de kundalini yoga sobre variáveis funcionais em indivíduos portadores da síndrome da fibromialgia. Revista Brasileira de Ciências do Movimento, 16(2):7–15, 2008. [8] Diário Oficial da União. Portaria n◦ 849 de março de 2017 [internet. http://189.28.128.100/dab/docs/portalda b/documentos/prt_849_27_3_2017.pdf, 2017. [9] O. Parshad. Role of yoga in stress management. The West Indian Medical Journal, 53(3):191–194, 2004. [10] T. R. Trigo. Validade fatorial do Maslach Burnout InventoryHuman Services Survey (mbi-hss) em uma amostra brasileira de auxiliares de enfermagem de um hospital universitário: influência da depressão. Dissertação de Mestrado em Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, Sp, 2012. [11] J. Graham e M. Richards. Mental health of hospital consultants: the effects of stress and satisfaction at work. Lancet, 347:724–728, 1996. [12] E. Grunfeld, T. J. Whelan dnd L. Zitzelsberger, A. R. Willan, B. Montesanto, e W. K. Evans. Cancer care workers in Ontario: prevalence of burnout, job stress and job satisfaction. Canadian Medical Association Journal, 163(2):724– 728, 2000. [13] J. C. Latack. Coping with job stress: measures and future directions for scale development. Journal of Applied Psychology, 71(3):377, 1986. [14] F. A. Pinheiro, B. T. Tróccoli, e M. R. Tamayo. Mensuração de coping no ambiente ocupacional. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 19(2):153–158, 2003. [15] A. Zigmond e R. Snaith. The hospital anxiety and depression scale. Acta Psychatrica Scandinavia, 67(6):361–370, 1983. [16] N. J. Botega, M. R. Bio, M. A. Zomignani, C. Garcia-Junior, e W. A. B. Pereira. Transtornos do humor em enfermaria de clínica médica e validação de escala de medida (HAD) de ansiedade e depressão. Revista de Saúde Pública, 29:359– 363, 1995. [17] M. L. D. Bernardi, M. H. C. Amorim, E. Zandonade, D. F. Santaella, e J. A. N. Barbosa. Efeitos da intervenção hathayoga nos níveis de estresse e ansiedade em mulheres mastectomizadas. Ciência & Saúde Coletiva, 18:3621–3632, 2013. [18] M. C. Fogaça, W. B. Carvalho, V. A. Cítero, e L. A. NogueiraMartins. Fatores que tornam estressante o trabalho de médicos e enfermeiros em terapia intensiva pediátrica e neonatal: estudo de revisão bibliográfica. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, 20(3):261–266, 2008. [19] J. R. A. Costa, J. V. Lima, e P. C. Almeida. Stress no tra- [20] [21] [22] [23] [24] [25] 7 balho do enfermeiro. Revista da Escola de Enfermagem da USP, 37(3):63–71, 2008. L. Louie. The effectiveness of yoga for depression: a critical literature review. Issues in Mental Health Nursing, 35(4):265–276, 2014. I. B. Skowronek, A. L. Mounsey, e L. Handler. Can yoga reduce symptoms of anxiety and depression? The Jorunal of Family Practice, 63(7):398–407, 2014. R. E. Maddux, D. Daukantaité, e U. Tellhed. The effects of yoga on stress and psychological health among employees: an 8- and 16-week intervention study. Anxiety, Stress & Coping, 31(2):121–134, 2018. N. L. Trent, M. Miraglia, J. A. Dusek, E. Pasalis, e S. B. S. Khalsa. Improvements in psychological health following a residential yoga-based program for frontline professionals. Journal of Occupational and Environmental Medicine, 60(4):357–367, 2018. R. Fang e X. Li. A regular yoga intervention for staff nurse sleep quality and work stress: a randomised controlled trial. Journal of Clinical Nursing, 24(23-24):3374–3379, 2015. G. K. Alexander, K. Rollins, D. Walker, L. Wong, e J. Pennings. Yoga for self-care and burnout prevention among nurses. Workplace Health & Safety, 63(10):462–470, 2015. Notas Biográficas Laura Sanches Lopes é graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Pós-graduação Psicologia em Saúde pelo Programa de Residência Multiprofissional em Atenção ao Câncer – FAMERP. Randolfo dos Santos Júnior é graduado em Psicologia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Especialista em Psicologia da Saúde. Doutor em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Psicólogo do Hospital de Base e preceptor do Programa de Residência Multiprofissional em Atenção ao Câncer – FAMERP. Docente do Departamento de Psicologia da FAMERP, orientador e docente do Programa de Mestrado em Psicologia e Saúde da FAMERP. Alexandre Lins Werneck é graduado em Letras com habilitação em Tradução e Interpretação pela União das Faculdades dos Grandes Lagos (UNILAGO). Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP). Doutor em Ciências da Saúde pela FAMERP. Professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem – nível Mestrado da FAMERP.