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A Governação “Sombra” no Espaço Marítimo Angolano A Governação “Sombra” no Espaço Marítimo Angolano “NARRAÇÃO DA AUSÊNCIA DE UMA POLÍTICA DE ORDENAMENTO E DE GESTÃO DO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL” 2024 F. Nassoma Bentral-Baldacchino A GOVER NAÇÃO “SOMBR A” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO autor F. Nassoma Bentral-Baldacchino editor EDIÇÕES ALMEDINA, S.A. Avenida Emídio Navarro, 81, 3D 3000-151 Coimbra Tel.: 239 851 904 • Fax: 239 851 901 www.almedina.net • editora@almedina.net design de capa EDIÇÕES ALMEDINA, S.A. editor EDIÇÕES ALMEDINA, S.A. impressão e acabamento Maio, 2024 isbn depósito legal …. Os dados e as opiniões inseridos na presente publicação são da exclusiva responsabilidade do seu autor. Toda a reprodução desta obra, por fotocópia ou outro qualquer processo, sem prévia autorização escrita do Editor, é ilícita e passível de procedimento judicial contra o infrator. MENÇÕES ESPECIAIS Regras de redacção O presente trabalho não segue as regras do novo acordo ortográfico. No caso de transcrições, mantivemos a grafia original. Modo de citar A presente dissertação obedece às regras de citação e de redacção de referências bibliográficas da norma portuguesa NP 405. 5 Ao Meu Jesus, amigo que nunca falha! E Em memória a minha querida avó Francisca de Oliveira. PREFÁCIO É com enorme gosto que, respondendo a um seu convite, escrevo o Prefácio deste excelente e incisivo estudo da Mestre Francisca Nassoma Cumandala Bentral-Baldacchino. Encaro este convite com regozijo, mas não com surpresa: o regozijo que senti ao me ser solicitado a feitura de um prefácio para o livro que o Leitor tem entre mãos resulta, tão-só, da qualidade da obra; a ausência de surpresa provém também do facto deste trabalho resultar da dissertação de Mestrado que, a pedido da agora Mestre Francisca Bentral me ter solicitado ser o orientador do Mestrado por ela escrito e que deu origem a este notável trabalho. Tal como foi o caso do desenrolar dos capítulos que a Francisca me ia enviando a par e passo, e com a desenvoltura que demonstrou nas provas públicas de defesa a que se sujeitou com brilho, sinto-me de novo cativado com a o rigor, o carácter inovador, e a coragem da agora Autora de um livro que, estou certo, atrairá atenções, no melhor sentido da expressão. Assim espero e confesso que não é nada que me espante. Detalho o porquê deste meu prognóstico. No que ao Mestrado dela diz respeito, a receção pelos meus colegas de júri traduziu-se numa óbvia alegria pelos membros do júri perante quem ela se submeteu, caso nem sempre comum em exercícios deste tipo. No que concerne a esta obra, a Mestre F. N. C. Bentral subiu claramente de patamar. Como aluna, a Francisca esmerou-se. Agora, como Autora, logrou dar um marcado passo em frente. Auguro o melhor para o seu futuro. Nos livros que aceito prefaciar, nunca me limito a apenas referir que o texto é bom, útil, sério e construtivo. Só aceito prefaciar, claro está, os 9 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO trabalhos que considero de qualidade. Mas, para além disso, faço sempre questão de indicar aquilo que considero os pontos fortes aos quais considero dever dar mais atenção – sobretudo, como é aqui manifestamente o caso, quando a qualidade do que aceito prefaciar não me deixa dúvidas. O que é aqui o caso. Tenho como dever académico, ademais, sublinhar de maneira explícita aquilo que considero inovador, no sentido mais forte do termo: tudo o que desafie, com fundamentos indiscutíveis rupturas criativas do que considero serem “sabedorias convencionais” que dificultem suscitar a consciência de que mais deve ser feito para o bem-comum sobre o qual um texto se debruça. O que, sem qualquer dúvida é aqui o caso: basta, para tanto absorver sem pestanejar, o título desta Obra: o livro intitula-se A Governação “sombra” no espaço marítimo angolano. E, para que o Leitor não tenha dúvidas, a Autora acrescentou-lhe um subtítulo explícito da sua nitidez: “Narração da ausência de uma política de ordenamento e de gestão do espaço marítimo nacional”. Com galhardia e precisão, tanto factuais como jurídico-políticas, a Mestre Francisca Bentral soube bem, e de frente, pôr o dedo em várias das feridas, que tanto lesam Angola, como o fazem aqui, em Portugal. Antes seja ouvida e haja capacidade de resposta. Bem disso precisamos. Se acordarmos, livros como este depressa se podem tornar em marcos de mudanças que a todos beneficiam. Como a Autora escreve na sua Introdução, “A ausência na ordem jurídica de uma política de ordenamento e de gestão do espaço marítimo nacional, a omissão legislativa sobre a matéria e a necessidade de ordenar as áreas marítimas com vista a assegurar a eficiência, a segurança e a sustentabilidade das atividades humanas no mar, leva-nos a refletir um exemplo de modelo de governação dos espaços marítimos que deveria ser adotado na ordem jurídica angolana”. E continua citando o Ministério angolano do Urbanismo e do Ambiente: “uma vez que o país ocupa uma superfície marítima de 162 000 m, uma orla marítima de 1650 km2 com uma profundidade de variação mínima média entre 3 aos 5 metros, enquanto as profundidades na zona do talude continental atingem 5000 a 5500 metros nas zonas Centro e Sul, sendo o mar a espinha dorsal da sua economia e exportando mais de 95 % dos recursos que dela provêm”. Seria difícil começar melhor no chamar de atenção para quaisquer Leitores... Estou em crer que a leitura desta obra, muitíssimo bem pensada e redigida, tornar-se-á porventura mais fácil de compreender indo 10 PREFÁCIO aos conceitos centrais nela introduzidos pela Autora, visto ela lhes dar conteúdos robustos. Para não maçar os Leitores tocarei, de forma expedita e superficial apenas três dos muitos conceitos que a Autora manuseia com cuidado: (i) “governança”, (ii) “sombra”, e (iii) “segurança marítima”. Em todos estes casos, a Mestre Francisca Bentral, não perde tempo. Segue a direito. Quando utiliza o termo “governança”, o conteúdo semântico que lhe dá é o de um claro abandono da gestão ambiental de um espaço marítimo, seja ele qual for, sem o aproveitamento ou a distribuição devida dos recursos, numa óbvia falta de plano de um qualquer plano de gestão das atividades ligada ao mar nas zonas em causa. O sentido que atribui ao termo “sombra” redunda no descuido/contraditório/uma falsa imagem, que localiza como estando “abaixo da vontade legislador e dos compromissos internacionais”. Seguramente mais interessante ainda é o significado que impõe à expressão “segurança marítima”, que dialeticamente encara como uma forma – que não posso caraterizar senão como a de uma ativista com visão e lucidez – de “instabilidade, de “ausência de soberania no espaço marítimo por falta da vigilância” que deveria ser requerida. A força ilocucionária destas verdadeiras transmutações linguísticas, cartografam as interpretações feitas pelo Leitor que é sempre chamado à intenção crítica da Autora. Um tour de force notável. Parece-me ser este o método seguida por uma Autora indignada por aquilo que encara como lacunas perigosas para o que considera, ser, com óbvia convicção e fundamento certeiro, o bem-comum do seu País. Outra maneira de o soletrar é a seguinte: a necessária postura oficial angolana na definição geoestratégica e geopolítica exigem a gestação de uma identidade marítima e de um exercício continuado e sustido de soberania nas suas águas territoriais e zonas económicas exclusivas. Carências no exercício da soberania angolana na sua parcela do Atlântico descredibilizam a sua posição nestas regiões, uma afirmação consequente de Angola no seu Atlântico – aquelas parcelas do mar que as Nações Unidas lhe atribuírem – exige o exercício continuado do Estado angolano, exercendo, nele, uma soberania de que não pode prescindir. Para terminar, mudando de tom e de ponto de aplicação, gostaria de relatar em breves linhas, o historial daquilo que deu azo à emergência do Mestrado escolhido pela agora Mestre Francisca Bentral. Bendito o dia em que, na NOVA School of Law, Faculdade de Direito da Universidade Nova 11 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO de Lisboa, um grupo de colegas meus me instaram a desenhar e criar um Mestrado do Mar. Anuí de imediato, surpreendendo-me a mim próprio, confesso. Interrompi uma Sabática (a única que usufrui numa carreira académica de 32 anos, 22 deles na NSL) para o fazer; não só porque me pareceu essencial, mas também porque foi o meu Pai quem introduziu, em Portugal e no mundo Lusófono, o Direito do Mar. Avancei, muito por isso mesmo, quantas vezes contra tanto ventos como marés, desfazendo sem muito me preocupar a minha licença sabática. Tudo ponderado, tomei a decisão de apelidar o Mestrado, que Co-Coordenei até me jubilar (o que teve lugar em setembro de 2022), dando-lhe o nome de Mestrado em Direito e Economia do Mar: a Governação do Mar (desde há alguns anos, dos Oceanos). Ou seja, desenhei um mestrado focado no Direito, na Economia, e na Política. O que me pareceu imprescindível. O processo não foi, porém, pacífico, pois várias vozes se levantaram contra a pluridisciplinaridade que lhe incuti ab initio – isto numa Universidade que apela a isso mesmo e numa Faculdade que dizia querer também fazê-lo. Sem que eu fosse informado, o Mestrado que gizei foi redesenhado de modo a tornar-se apenas jurídico – sendo assim eu excluído dele, ficando lá só “juristas de cepa”, ao que me foi dito ser a intenção. Soube da tentativa porque vários colegas me mostraram o documento redutor que iria ser submetido ao Conselho Científico da Faculdade. Mas muitas vezes Deus escreve direito por linhas tortas, e dois dias antes da confrontação, foi anunciado que o Mestrado recebido pelo edu-universal (uma agência internacional de rankings académicos que eu não conhecia) como o quarto melhor do Mundo, entre todos os mestrados relativos ao Mar. À nossa frente ficaram um mestrado em Roterdão, outro em Copenhaga e um terceiro em Melbourne (todos eles com Universidades viradas para os respetivos portos de águas profundas). O documento que iria ser apresentado dois dias depois, desapareceu de repente, ficando o que estava. Com o benefício da retrospeção, ainda bem. Dois anos depois fomos classificados como o primeiro, o melhor Mestrado, o melhor, à frente destes outros três. Hoje em dia aí está, com docentes das várias áreas com nele convivem, e há a intenção, do lado da Professora Assunção Cristas, que me substituiu, de criar uma Licenciatura com um design semelhante. Que avance e singre! Voltando ao Mestrado: a Francisca Nassoma Bentral-Baldacchino, como muitos outros mestrandos de várias nacionalidades, muito disso 12 PREFÁCIO beneficiaram. As aulas são, em geral, dadas em Língua Inglesa – o que o projeta como um Mestrado global fornecido em Portugal. O que me parece justo. Desde há muito sabemos que a investigação científica beneficia de uma língua franca. Se assim não fosse o nosso Mestrado não teria tido o rating que teve, isso estou certo. E os alunos lusófonos aprendem a falar, claro está, em Inglês, melhorando também essa valência – sendo absurdo, a meu ver, considerar que tal “mata a Língua Portuguesa”. Não o faz de todo, enriquece-nos o ampliar de horizontes, internacionalizando-nos e cativando, para cá, discentes e docentes que falam bem, claro está, o Inglês. Em todo o caso, quase toda a bibliografia existente nestes campos está redigida nessa língua... Disso mesmo beneficiou, por exemplo, a Francisca, que começou a trabalhar nestas áreas em Malta. A dissertação dela, tal como este livro, estão escritos em Português, numa língua que ela nem por sombras perdeu, evidentemente… Queria acabar este já longo prefácio com alegria e algum regozijo desvanecido. Muitos livros houvesse como este. Escrito com cuidado, firme e rigoroso, com um claro e explícito posicionamento que, agrade-nos ou não, me parece, sempre, ser salutar. Muitas das dissertações do domesticamente chamado “Mestrado do Mar” também o são – embora raramente incluam a largura de banda e o pragmatismo deste, agora decantado num livro que deixará marcas na Angola natal da Autora, Francisca Bentral-Baldachino. Despercebido, não passará decerto. Quando sentados numa bicicleta e com os pés nos pedais, só conseguimos deixar de cair enquanto nos mantivermos em movimento. ARMANDO MARQUES GUEDES Professor Catedrático Jubilado, NOVA School of Law, UNL 13 PRINCIPAIS SIGLAS, ABREVIATURAS E ACRÓNIMOS AAFDL – Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Ac. – Acórdão AIM – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 AMN – Autoridade Marítima Nacional Art.º – Artigo Art.ºs – Artigos CCB – Convenção da Corrente de Benguela CEEAC – Comunidade Económica dos Estados da África Central Cit. por – citado por Cfr. – Conferir ou confrontar CNUDM – Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar COMFORCE – Central African Multinational Force CRA – Constituição da República de Angola DMA – Domínio Marítimo da África DL – Decreto Lei DPM – Domínio Público Marítimo DR – Diário da República Ed. – Edição ELP 2025 – Estratégia de Longo Prazo Angola 2025 ENM – Estratégia Nacional para o Mar EST – Esquemas de Separação de Tráfego FDUL – Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa FDUNL – Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa 15 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO FMI – Fundo Monetário Internacional GMDSS – Global Maritime Distress and Safety System i.e. – isto é IMPA – Instituto Marítimo Portuário de Angola Jur. – Jurisprudência LA – Lei de Água LEM – Lei dos Espaços Marítimos LMMPAC – Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas LOTU – Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo LRIT – Sistema de Identificação e Localização de Longo Alcance (Long Range Identification & Tracking) LT – Lei de Terras MARPOL 73/78 – Convenção Internacional sobre a Prevenção da Poluição por Navios e Protocolo MMSI – Maritime Mobile System Identification MRCC – Maritime Rescue Co-ordination Centre n.º(s) – número(s) op. cit. – obra citada OEM – Ordenamento do Espaço Marítimo OPRC 1990 – Cooperação e Combate Contra a Poluição para Hidrocarboneto OTAN – Organização do Tratado do Atlântico do Norte p. – Página pp. – Páginas p.p – pontos percentuais ref. – refundida REPTUR – Regulamento Geral dos Planos Territoriais, Urbanísticos e Rurais s. – Seguinte ss. – Seguintes SADC – Comunidade de Desenvolvimento da África Austral SAR – Sistema de Busca e Salvamento SINAVIM – Sistema Nacional de Vigilância Marítima UA – União Africana UE – União Europeia Vol. – Volume VTS – Vessel Traffic System (Sistema Nacional Integrado para o Controlo do Tráfego Marítimo) 16 INTRODUÇÃO À ausência na ordem jurídica de uma política de ordenamento e de gestão do espaço marítimo nacional, a omissão legislativa sobre a matéria e a necessidade de ordenar as áreas marítimas com vista a assegurar a eficiência, a segurança e a sustentabilidade das actividades humanas no mar, leva-nos a reflectir um exemplo de modelo de governação dos espaços marítimos que deveria ser adoptado na ordem jurídico angolana, uma vez que o país ocupa uma superfície marítima de 162 000 m, uma orla marítima de 1 650 km2 com uma profundidade de variação mínima média entre 3 aos 5 metros, enquanto as profundidades na zona do talude continental atingem 5 000 a 5 500 metros nas zonas Centro e Sul, sendo o mar a espinha dorsal da sua economia e exportando mais de 95 % dos recursos que dela provêm1. Esta realidade vasta e complexa acarreta desafios e impõe grandes responsabilidades na sua governação que deve atender ao enquadramento jurídico dos bens do domínio marítimo. Neste estudo visa fornecer uma análise global e coordenada da política de gestão da zona marítima nacional, com uma gama complexam, envolvendo diferentes níveis de autoridades, operadores económicos e outras partes interessadas, que apelam a soluções que passam por instrumentos de gestão sistemáticos de planeamento e de ordenamento do espaço marítimo. 1 ANGOLA. Ministério do Urbanismo e Ambiente – Programa de investimento ambiental: relatório do estado geral do ambiente em Angola, p. 63. 17 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Este tipo de abordagem da gestão e da governação marítima deve ser desenvolvido no âmbito da política para o mar que determine a extensão dos espaços marítimos sob soberania e jurisdição nacionais e que defina os poderes que o Estado deve exercer2. A política marítima terá por objectivo apoiar a utilização sustentável, equitativa e eficiente dos recursos vivos e não vivos, protecção e a preservação do meio marinho e elaborar projectos intersectorial coerentes e transparentes para as políticas sectórias de actuação para o mar. De sublinhar que a necessidade de um instrumento estratégico intersectorial de governança do espaço marítimo permitirá às autoridades públicas e às partes interessadas aplicar uma abordagem baseada no ecossistema, tendo em conta a utilização sustentável dos recursos marinhos e a promoção do desenvolvimento e do crescimento sustentável da economia marítima e costeira. Nesta senda, sugere-se a implantação de um sistema que assenta, justamente, numa concepção global da problemática do ordenamento marítimo como sistema de normas, princípios e instrumentos em que avultam os planos de gestão marítima, em razão do âmbito oceânico, da interacção terra-mar, dos objectivos visados e da política de acções que os concretizam, protegem a biodiversidade e o ecossistema marinho, ordenando os usos e actividades marítimas, como formas sistemáticas de governação do espaço marítimo nacional. A concepção integrada de ordenamento marítimo a adoptar promoverá a coexistência das diferentes utilizações e a repartição adequada do espaço marítimo entre as utilizações relevantes, através da criação de um quadro para um processo de decisão coerente, transparente, sustentável e fundamentado. Para tal, é necessário que se preveja obrigações tendentes a estabelecer um processo de ordenamento do espaço marítimo e que se traduza em planos económicos oceânicos, bem como em obrigações que digam respeito às opções concretas quanto às modalidades de execução das políticas sectórias nestes domínios através do processo de ordenamento. Todavia, aquando do estabelecimento dos planos de ordenamento do espaço marítimo e das estratégias de gestão costeira integrada, deverá 2 Parágrafo sexto do preâmbulo da Lei n.º 14/10, de 14 de Julho, Lei dos Espaços Marítimos. 18 INTRODUÇÃO ser dada a devida atenção às alterações climáticas, aos riscos naturais e à dinâmica do litoral, designadamente à erosão e à deposição, pois podem ter repercussões severas no desenvolvimento e crescimento económico costeiro, nos ecossistemas costeiros e marinhos, com a consequente deterioração do estado ambiental, perda de biodiversidade e degradação dos serviços ecossistémicos3. Salientamos que as actividades marinhas e costeiras estão, com frequência, estreitamente interligadas. Por este motivo, o ordenamento do espaço marítimo deverá ter por objectivo integrar a dimensão marítima de algumas utilizações ou actividades costeiras e os seus impactos e permitir, em última instância, uma visão integrada e estratégica. O ordenamento do espaço marítimo visa igualmente desempenhar um papel muito útil na determinação das orientações relativas à gestão sustentável e integrada das actividades humanas no meio marítimo, à preservação dos habitats, à fragilidade dos ecossistemas costeiros, à erosão e a factores sociais e económicos e encorajar utilizações múltiplas. Todas estas incursões irão trazer na presente análise uma concentração de informações, institutos, princípios e conhecimentos técnico-marítimos, a fim de promover o desenvolvimento económico sustentável marinho, em termos de pedagógicos, e um amplo intercâmbio de boas práticas e debates interactivos no campo Direito Administrativo e Direito Internacional do Mar, tendo em vista a elaboração de orientações internacionais sobre o Ordenamento do Espaço Marítimo Nacional, explorar casos de estudo de aplicação do OEM, com o intuito de identificar as melhores práticas internacionais e a preparação de recomendações sobre o formato, o âmbito e o valor acrescentado da cooperação internacional no domínio do OEM. De realçar que, no âmbito da política marítima nacional, bem como dos vários projectos de financiamento para os sectores com actividades ligadas ao mar, não estão identificadas as necessidades de realizar mais estudos de investigação, para obter informações mais rigorosas que contribuam para a adopção de futuras medidas para protecção espacial e temporal ou para a aplicação de programas de monitorização nas áreas marítimas. 3 Vide paragrafo décimo terceiro do preâmbulo da Directiva 2014/89/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Julho de 2014. 19 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Essas e outras observações demonstram o desinteresse e distanciamento do poder executivo em relação aos assuntos marítimos, que, até o momento, não apresenta uma política de ordenamento e de gestão ou medidas de governação no espaço marítimo de soberania e jurisdição nacional. 20 Capítulo I Regime da delimitação das fronteiras marítimas SECÇÃO I Da historicidade da demarcação das fronteiras terrestre e fluviais4 1. Razão de ordem As fronteiras africanas foram definidas pelas potências coloniais europeias entre 1885 e 1900; todavia, a actual carta geográfica dos países africanos é fruto da adaptação de acordos estabelecidos entre essas potências, que ignoraram os direitos dos povos africanos e até mesmo a importância de bem visíveis acidentes geográficos5. A presente demarcação da fronteira terrestre e delimitação marítima supõe um acto de respeito aos tratados que definiram a divisão de África e não uma combinação de diferentes factores históricos e culturais. É completamente expectável que haja conflito na delimitação de fronteiras, 4 Vide o nosso artigo de avaliação, Segurança marítima costeira no leito de Angola, p. 5. 5 Vide OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Os Caminhos Históricos das Fronteiras de Angola, e “Fronteiras de Angola e a evolução histórica”, artigo publicado no Jornal de Angola, 30 de Novembro de 2009. 21 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO sobretudo, se algum Estado africano pretender estender a sua plataforma continental. Deste legado histórico, Angola herdou uma costa marítima de 1650 km2, uma superfície marítima de 162 000 m, e uma configuração terrestre de bloco maciço de forma sensivelmente quadrangular, entre elas o enclave de Cabinda situado na costa do rio Zaire, ocupando uma área de cerca de 1 246 700 km2 na região da África Central Ocidental, com uma fronteira terrestre de 4837 km2, o que faz que seja considerada o quinto país com maior dimensão na África subsariana, sendo os recursos marinhos a espinha dorsal da sua economia. A razão desta secção é analisar o percurso histórico problemático da demarcação – entendida como um acto de administração verdadeiramente distinto da delimitação, esta, sim, um acto pleno de jurisdição, consistindo na colocação de marcos no terreno para assinalar os limites descritos, adoptados no Tratado de Delimitação6 –, das fronteiras terrestres e fluviais, definidas por meio de tratados celebrados pelas potências coloniais, descurando qualquer referência à delimitação da fronteira marítima. Seguidamente, examinaremos a fronteira lateral norte e nordeste, leste e sudeste e sul, bem como a costa marítima sul e norte angolana, fundamental para o entendimento do presente tema de investigação. 2. A demarcação da fronteira norte e nordeste Em relação a outros pontos cardeais e seus colaterais, a demarcação definitiva da fronteira norte e nordeste é seguramente a que maior complexidade regista, após longos anos conflituantes de negociação, pois Portugal procurava dirimir a sua posição geográfica na região com os britânicos, os franceses, mais tarde com os belgas. 6 OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Subsídios para o estudo da delimitação e jurisdição dos espaços marítimos em Angola, p. 428; no sentido sociológico a demarcação de fronteira é entendida como uma realidade de identidades sociais, política e jurídica que se impõe entre nações e povos com o território in Andrey Cordeiro Ferreira – Políticas para fronteira História e Identidade: a luta simbólica nos processos de demarcação de terras indígenas Terena. Mana, vol. 15, n.º 2. (Outubro, 2009), disponível em: https://doi. org/10.1590/S0104-93132009000200003. 22 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS As primeiras dificuldades surgem em 1846 quando a Inglaterra contestou a soberania de Portugal nos territórios da costa ocidental de África situados entre os paralelos 5º 12´ e 8º de latitude S., isto é, entre a margem direita do rio Zaire e a sul do Ambriz. Tal objecção veio a constituir a Questão do Ambriz e a Questão do Zaire, por terem lançado erradamente na costa oriental os territórios de Malembo e Cabinda – esse erro foi corrigido dois anos depois na Convenção adicional de 30 de abril de 1819, com a justificação de «erro verbal» 7. A contestação inglesa teve por base o erro de redacção geográfico descrito no tratado celebrado entre Portugal e Inglaterra, em 28 de Julho de 1817, relativo ao regime de excepção no tráfico de escravos8, estabelecendo que os territórios em que os súbditos portugueses continuariam a ter liberdade de tráfico por pertencerem a coroa portuguesa eram: a) todos os efectivamente possuídos por essa coroa entre o paralelo 18º e o 8º latitude S; b) aqueles em que Portugal declara que reserva o seu direito, chamados Malembo e Cabinda, na costa oriental de África, desde o paralelo 5º 12´, ao paralelo 8º latitude S. Somente a 9 de Novembro de 1850 é que o Embaixador Inglês em Lisboa esclareceu que Lorde Palmerston apenas soubera em 1847, pelos comissários britânicos de Luanda, que Ambriz fica a 7º 52´, isto é, ao norte do paralelo 8º. Por mais que o Governo Inglês tenha reconhecido o equivoco ‒ que colidia com as limitações fixadas no tratado de 1817 ‒, ainda assim não desistiu da contestação ao direito português de ocupação do Ambriz, fundamentando que um erro não prevaleceria sobre o texto e a interpretação dos tratados. Por seu turno, Portugal replicava os seus direitos invocando: 1.º a prioridade do descobrimento; 2.º a posse conservada durante séculos; OLIVEIRA , Joaquim Dias Marques de, op. cit., pp. 17 e 18. Ao contrário dos dois primeiros tratados celebrados a 19 de Fevereiro de 1810 no Rio de Janeiro e 22 de Janeiro de 1815 em Viena, respectivamente, este tratado fixa matematicamente os limites do regime de excepção no tráfico de escravos com uma grande precisão geográfica. 7 8 23 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO 3.º a introdução da civilização pelo cristianismo; 4.º a conquista pelas armas; 5.º o reconhecimento do seu domínio pelos indígenas9. Sequentemente a esses acontecimentos, a 26 de Novembro de 1853, foi emitida uma nota que vem aduzir que «Portugal adquiriu no século XV o direito à soberania da região compreendida entre o 5º 12´ e o 8º latitude S., mas que esse direito se acha prejudicado pelo abandono, “suffered to lapse”, porque não ocupara»10. Em réplica a esta nota, a coroa inglesa alegou que Portugal havia deixado cair o direito que pela prioridade da descoberta – tinha essa parte da costa, porque não havia ocupação. Efectivamente, não havia nesta circunscrição territorial autoridades permanentes que afirmassem a soberania, que se opusessem ao tráfico de escravos e que protegessem e promovessem o comércio lícito. Em reacção a estes factos, a coroa portuguesa ordenou, a 20 de Janeiro de 1855, a ocupação e anexação dos portos de Ambriz e de Cabinda, sendo que apenas em 6 de Junho deste ano tal se cumpriu, mediante uma expedição militar chefiada por José Baptista de Andrade, a fim de pôr termo à Questão do Ambriz11. Face às medidas tomadas por Portugal, em 1860, o Governo inglês endereçou uma nota ao Embaixador de Portugal em Londres avisando que qualquer tentativa para estender a ocupação para o norte ‒ como era o propósito português ‒ encontraria a oposição das forças navais inglesas. Neste sentido, foram dadas instruções aos comandantes dos cruzadores ingleses da costa ocidental de África; por seu turno, as autoridades portuguesas de Ambriz e de Angola foram, por mais de uma vez, informadas destas instruções. 9 SANTARÉM, Visconde de – Demonstração dos direitos que tem a coroa de Portugal sobre os territórios situados na costa ocidental de África entre o 5º e 8º de latitude meridional e por conseguinte aos territórios de Molembo, Cabinda, Zaire e Ambriz. 10 CORDEIRO, Luciano – A Questão do Zaire. Revista de Estudos Livre, p. 82-262. 11 A fim de pôr termo à actividade de contrabando estrangeiro no norte de Angola e aumentar as receitas aduaneiras angolanas, em 1838, Sá da Bandeira ordenou a ocupação e anexação dos portos de Ambriz e de Cabinda. Porém, o seu plano para expansão comportava inúmeras dificuldades, sendo executado lentamente. 24 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS Perante a ameaça inglesa, Portugal teve de se submeter e, para evitar que o conflito se agravasse, desistiu da ocupação de Cabinda, limitando-se a lembrar o fundamento dos seus direitos e propor uma solução do caso em aberto12. Depois de alguns anos de negociações, finalmente, foi assinado o tratado em 26 de Fevereiro 1884, no qual a Inglaterra reconhecia a soberania portuguesa em toda a costa compreendida entre os paralelos de 5º 12´ e 8º de latitude Sul, fixava Nóqui como limite no rio Zaire, e a fronteira interior ocidental coincidiria com os limites das actuais possessões das tribos da costa e marginais13. Não satisfeita com as negociações luso-inglesas, a França, a Associação Internacional Africana, a Alemanha e uma grande parte da opinião pública inglesa levantaram sérias objecções contra o tratado de 26 de Fevereiro de 1884, que acabou por não ser ratificado com receio de que se tratasse de um expediente dilatório. É precisamente nestas circunstâncias que se levanta a Questão do Zaire, o que motivou os líderes das potências coloniais a conferenciarem de 15 Novembro de 1884 a 14 Fevereiro de 1885 em Berlim para a partilha de África. Paralelamente, a Associação Internacional do Congo exigia a posse de toda margem direita e esquerda do rio Zaire; por sua vez, Portugal opôs-se terminantemente e reivindicou toda a margem navegável do Zaire até Nóqui. Em 14 de Fevereiro de 1885, em Berlim, foi assinada a Convenção entre Portugal e a Associação Internacional do Congo, na qual Portugal recebia tratamento de «nação mais favorecida», fazendo-se, assim, a delimitação de fronteiras, reconhecendo Portugal a bandeira da Associação, e prometendo acatar-lhe neutralidade14. 12 Memorando do Ministro dos Negócios Estrangeiros ao Ministro de Portugal em Londres, de 8 de Novembro de 1882, no Volume dos Negócios Externos, 1884 (Questão do Zaire), p. 5, cit. por OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Fronteiras de Angola e a evolução histórica. Jornal de Angola. 30 de Novembro de 2009. [Consult. 2020-05-05] Disponível em http://jornaldeangola.sapo.ao/politica/fronteiras_de_angola_e_a_evolucao_historica. 13 Tratado de 26 de Fevereiro de 1885, cit. por OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Subsídios para o estudo da delimitação e jurisdição dos espaços marítimos em Angola. 14 Livro Branco de 1885, Questão do Zaire, vol. II, p. 128, cit. por OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Fronteiras de Angola e a evolução histórica. Jornal de Angola. 30 de Novembro de 2009. 25 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Na pretensão de obter reconhecimento dos territórios situados entre o rio Chiloango e Massabi, em 1884, Portugal renovou com a França a proposta de delimitarem o domínio fluvial e terrestre no Congo, em que a França insistia que a fronteira seguisse o curso do Chiloango, desde a sua confluência com o Lucula até à sua foz. No entanto, as negociações foram longas, tanto mais que se tratou simultaneamente das fronteiras da Guiné15, tendo o processo sido concluído com a com a assinatura da Convenção para a delimitação das possessões portuguesas e francesas na África Ocidental datada de 12 de Maio de 1886 16. Esta Convenção decreta que «Na região do Congo, a fronteira entre as possessões portuguesas e as possessões francesas, seguirá, conforme o traçado indicado na carta n.º II, anexa à presente convenção, uma linha que, partindo da ponta de Chamba, situada na conferência do Loema ou Luísa Loango e do rio 15 Estabelece o art.º I da Convenção para a delimitação das possessões portuguesas e francesas na África Ocidental assinada em Lisboa a 12 de Maio de 1886 que «Na Guiné, a fronteira que há de separar as possessões portuguesas das possessões francesas, seguirá conforme o traçado indicado na carta n.º I anexa à presente convenção: – Ao norte, uma linha que, partindo do cabo Roxo, se conservará, tanto quanto possível, segundo as indicações de terreno, a igual distância dos rios de Casamansa (Cazamance) e de São Domigues de Cacheu (San-Domingo de Cacheu) até à intersecção do meridiano de 17.º 30´ de longitude oeste de Paris com o paralelo de 12.º 40´ de latitude norte. Entre este ponto e o meridiano de 16º de longitude oeste de Paris a fronteira confundir-se há com o paralelo de 12º 40´ de latitude norte. – A leste, a fronteira seguirá o meridiano de 16º de longitude oeste de Paris, desde o paralelo de 12º 40´ de latitude norte até ao paralelo de 11º 40´ de latitude norte. – Ao sul, a fronteira seguirá uma linha que partirá da foz do rio Cajet, situado entre a ilha Catack (que ficará para Portugal) e a ilha Tristão (que ficará para França) e, conservando-se tanto quanto possível, segundo as indicações do terreno, a igual distância do rio Componi (Tabatí) e do braço meridional do rio Cassini (esteiro de Kakondo) a princípio, e do rio Grande por fim, virá terminar no ponto de intersecção do meridiano de 16º de longitude oeste de Paris com o paralelo de 11º 40´ de latitude norte. – Ficarão pertencendo a Portugal todas as ilhas compreendidas entre o meridiano do cabo Roxo, a costa, e um limite meridional formado por uma linha que seguirá o thalweg do rio Cajet e se dirigirá depois para sudoeste, seguindo o canal dos Pilotos até atingir o paralelo de 10º 40´ de latitude norte com o qual se confundirá até ao meridiano de cabo Roxo». 16 Publicado no Diário do Governo n.º 194 de 1 de Setembro de 1887; Colecção de legislação p. 413; Livro Branco de 1887, vols. 1.º e 2.º, a Convenção consta dos anexos cit. por OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Fronteiras de Angola e a evolução histórica. Jornal de Angola. 26 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS Lubinda, se conservará, tanto quanto possível, e seguindo as indicações do terreno, a igual distância dêstes dois rios, e a partir da nascente mais septentrional do rio Luali, seguirá a linha de cumiada que separa a bacia do Loema ou Luísa Loango da bacia do Chiloango, até ao meridiano de 10º 30´ de longitude leste de París, depois confundir-se há com êste ridiano até ao seu encontro com Chiloango, que neste ponto serve de fronteira entre as possessões portuguesas e o Estado Livre do Congo», nos termos do art.º III. Com efeito, a citada Convenção foi ratificada a 31 de Agosto de 1887, e, a 12 de Janeiro de 1901,17 assinou-se, em Paris, o Protocolo que interpreta e completa o artigo III da Convenção de 12 de Maio de 1886, relativo ao traçado da linha de fronteira Franco-Portuguesa na região do Congo. Estava assim consumada a divisão do Congo em três partes: belga, francesa e portuguesa. Para Marques de Oliveira, o Enclave de Cabinda nasce neste cenário, confinando na sua parte norte com o Congo Francês e a restante parte com o Estado Livre do Congo, com o cuidado de se instalar o seu limite a sul e o rio Zaire (ficando definida a fronteira norte e nordeste da foz do rio Zaire até à divisória das águas do Zaire e do Zambeze com o meridiano 24º Leste de Greenwich e a fronteira nordeste desde a intersecção do paralelo 6º de Latitude Sul com o rio Cuango, até à da divisória das águas do Zaire e do Zambeze com o meridiano 24º Leste Greenwich), de forma a desalojar Portugal de margem norte18. Quanto ao nordeste, a Bélgica defendia que a fronteira nordeste de Angola se fixava no Cuango, apontando a delineação na direcção sul com todo o curso do rio Cuango; contrariamente, Portugal alegava que o limite ia para além deste rio, seguindo o curso do Cuango apenas na região compreendida entre o paralelo de Nóqui e o de 6º de latitude Sul, sendo a linha divisória as águas que pertencem a bacia do Cassai entre os paralelos 6º e 12º de latitude Sul. 17 Colecção de legislação p. 251, Tomo VII, cit. por OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Fronteiras de Angola e a evolução histórica. Jornal de Angola, o Protocolo consta dos anexos. 18 OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Os Caminhos Históricos das Fronteiras de Angola, p. 25; GUEDES, Armando Marques [et tal.] – Pluralismo e legitimação: a edificação jurídica pós-colonial de Angola, p. 70. 27 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Os governos português e belga assinaram a 5 de Julho de 1913, em Bruxelas, o Protocolo da demarcação das fronteiras luso-belga de Cabinda e do paralelo do Nóqui ao Cuango19. Relativamente à demarcação da fronteira na região do Dilolo, o problema teve origem nos termos da Convenção que regula os respectivos limites de fronteiras e adopta diversas disposições fiscais, assinada em Bruxelas a 25 de Maio de 189120 e trocadas as ratificações em Lisboa a 1 de Agosto do mesmo ano, que fixou geograficamente a fronteira no alto Cassai e lago Dilolo, situando este último na linha divisória das águas do Zaire e do Zambeze, e definindo, como limite, um afluente do rio Cassai que nascia no lago Dilolo, nos termos do art.º 3.º da Convenção. Verificando, mais tarde, que os signatários da Convenção tinham cometido um erro geográfico por se haver reconhecido a inexistência do afluente do rio Cassai que nasce no lago Dilolo (este lago situa-se na bacia do rio Zambeze), o Governo português analisou que a interpretação mais lógica feita ao artigo III da Convenção seria tomar como fronteira o afluente do Cassai, cuja nascente se encontra mais próxima do lago Dilolo, no braço oriental do Luakanu em Cha-calumbo21. Não obstante ter sido Portugal a propor inicialmente Cha-calumbo, ao ser levantada a carta geográfica da região, constatou-se que a nascente mais próxima, por uma diferença de 15 km e que fica ao nordeste do lago Dilolo, é a do rio Luau e não a do afluente oriental do Luakeno. Portanto, vem novamente Portugal alegar que o rio Luau era o limite da fronteira, 19 Livro Branco de 1913, tomo VII, p. 209; vem publicados os mapas do traçado das fronteiras, CIT. POR OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Fronteiras de Angola e a evolução histórica. Jornal de Angola. 20 Publicado no Diário do Governo n.º 101 de 6 de Maio de 1892, Livro Branco de 1891, Limites no Congo, p. 102 (OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Fronteiras de Angola e a evolução histórica. Jornal de Angola. 30 de Novembro de 2009.); os trabalhos de demarcação realizaram-se em conformidade com a referida Convenção, e o acordo de troca de notas de 12 de Abril e 6 de Agosto 1907 e de 30 de Abril e 2 de Junho de 1910, e concluíram com um protocolo datado de 18 de Setembro de 1915. 21 Arquivo do Ministério dos Negócios e Estrangeiros, cota 3º piso, armário n.º 9, maço 13. Nota do Ministro de Portugal em Bruxelas, Visconde Santo Thirso, ao Secretário Geral do Departamento dos Negócios Estrangeiros do Estado Independente do Congo, A. Cuvelar, Bruxelas 12 de Abril de 1907. 28 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS cuja nascente era preciso ligar à linha divisória das águas do Zaire e do Zambeze22. Por seu turno, o Congo Belga enfrentava um obstáculo vital ao seu desenvolvimento económico: o acesso ao mar. O rio Zaire revelou-se não navegável em todo o seu curso, nomeadamente, na região das cataratas entre Matadi e Kinshasa. Neste sentido, o Governo belga desenvolveu uma intensa actividade junto do Governo português, de forma a obter a cedência da margem esquerda do rio Zaire, para aí construir um porto suficientemente capaz de responder melhor que Matadi e para permitir a modificação do traçado da linha férrea nos primeiros 30 km. Assim, no desejo de mutuamente darem uma demonstração de boa vizinhança e de favorecerem a valorização dos respectivos territórios, Portugal e a Bélgica assinaram, a 22 de Julho de 1927, em Luanda, a Convenção em que acordaram a troca de terrenos. Estabelece o art.º I da mencionada Convenção que «A Bélgica cede a Portugal, em plena soberania, a parte da Colónia do Congo Belga compreendida pelos seguintes limites: – A fronteira actual entre a confluência do Cassai com o Luakano até o ponto mais próximo da origem do rio Luau, nas proximidades do marco 25; – Uma linha recta deste ponto até a origem do Luau; – O rio Luau até a sua confluência com o Cassai; – O Cassai para montante desde essa confluência até a do Luakano; – A superfície aproximada deste território é de 3500 quilómetros quadrados». Dispõe o art.º II que «Portugal cede à Bélgica, em plena soberania, a parte do território de Angola compreendida pelos limites seguintes: – O rio M´pozo desde o ponto em que deixa de formar a fronteira Luso-Belga, junto do marco 10 embocadura do Mia, até à embocadura do rio Duizi, que fica a cerca de 2300 metros a montante daquele ponto; 22 COUTINHO, Gago, Memorandum reservado para elucidação das questões de fronteiras Angola – Congo, p. 10. 29 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO – O rio Duizi a montante da sua confluência com o M´pozo até à fronteira actual; – A fronteira actual entre o Duizi e o M´pozo, passando pelos marcos 10 e 11; – A superfície aproximada desta porção de território é de três quilómetros quadrados. Observando que a troca de terrenos não constava na agenda das resoluções aprovadas na primeira conferência luso-belga, realizada em Lisboa de 6 a 10 de Dezembro de 1926, Joaquim Marques de Oliveira diz que «esta convenção só se explica à luz de factores supervenientes, que decorreram à margem dos trabalhos da conferência»23. Com estes factos, fica encerrado a questão da delineação da fronteira nordeste de Angola. 3. A demarcação da fronteira leste e sudeste A disputa relativa à fronteira leste e sudeste manifestou-se como uma extrema complicação com o Ultimatum Inglês de 11 de Janeiro de 189024, que exigia o termo do projecto português de ocupar os terrenos africanos a partir da costa oeste oceânica do Atlântico à costa leste do Índico, isto é, de Angola a Moçambique. A Inglaterra opôs-se às cláusulas das Convenções Luso-Francesa de 13 de Maio de 1886 e Luso-Alemã de 30 de Dezembro de 188625 que contém 23 OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de, op. cit., p. 7, disponível para consulta em: http://info-angola.ao/index.php?option=com_content&view=article&id=2652:front eiras-de-angola-e-a-evolu-hista&catid=687&Itemid=1727&showall=&limitstart=6. 24 Vide PATRÍCIO, Miguel – Do ultimatum de 1890 ao Tratado Luso-britânico de 1891 – Ensaio da História Diplomática. RIDB, pp. 11371-11408; MARTINEZ, Pedro Soares – História Diplomática de Portugal, Lisboa: Verbo, 1982; PINTO, Eduardo Vera-Cruz – Apontamentos de História das Relações Internacionais, Lisboa: AAFDL, 1998; TEIXEIRA, Nuno Severiano – O ultimatum inglês – Política Externa e Política Interna no Portugal de 1890. 25 Em troca de reconhecimento da ligação de Angola a Moçambique e sem prejuízo de eventuais direitos de terceiros, custaram a Portugal as regiões de Casamansa e Ziguinchor para a França e a região entre Cabo Frio e a foz do rio Cunene para a Alemanha; Negócios 30 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS em anexo o mapa que compreende toda a região que se estende entre Angola e Moçambique, a bacia inteira do Zambeze, o país dos Matabeles e os distritos do lago Nyssa até à latitude do rio Rovuma, alegando que essas potências nunca tiveram interesses na zona. A mesma potência entendia que, de acordo com o convencionado na Conferência de Berlim, a ocupação efectiva era condição essencial para o exercício de jurisdição em África, algo que Portugal não poderia assegurar nos territórios em causa. Por sua vez, Portugal contrapunha que, tal como refere a 1.ª parte, do art.º 35.º do Acto Geral da Conferência de Berlim, a ocupação efectiva é só aplicável à costa e não ao interior africano26. Com vista a reconhecer os limites territoriais, depois de árdua negociação, o Governo português e o Governo inglês assinaram, em Londres, o Tratado de 11 de Junho de 1891, em conformidade com o art.º IV da Convenção de 20 de Agosto de 1890, na qual Portugal perdia a maior parte do planalto de Manica, vinte milhas ao norte e dez ao sul do rio Zambeze, de Tete ao Chole, que permitia a ligação entre Angola e Moçambique, ficando acordado que a linha divisória (parte do leito do Zambeze adjacente ao Kabompo e o curso deste rio) eram substituídos pela linha que constitui a fronteira ocidental do Barotze, desde um ponto situado a montante dos rápidos de Katima até ao ponto em que o rio Zambeze entra no reino de Barotze27. Sobre este Tratado surge a questão, invocada pela Inglaterra, de saber quais eram os limites ocidentais do Barotze. A questão foi resolvida por meio de arbitragem decidida a 30 de Maio de 1905, em que ficaram reconhecidas, para Portugal, cerca de 30 000 km2, correspondente a quatro quintas partes deste território, tendo Portugal perdido territórios consideráveis na África Central ficando para sempre desfeita a ambição Externos: Documentos apresentados ás Cortes na Sessão Legislativa de 1887 pelo Ministro e Secretario d’Estado dos Negócios e Estrangeiros: negociações relativas à delimitação das possessões portuguezas e alemãs na África Meridional. 26 PATRÍCIO, Miguel , op. cit., p. 11378. 27 OLIVEIRA Joaquim Marques de, Fronteiras de Angola e a evolução histórica, p. 8, disponível para consulta em: http://info-angola.ao/index.php?option=com_content&view =article&id=2652:fronteiras-de-angola-e-a-evolu-hista&catid=687&Itemid=1727&showal l=&limitstart=6. 31 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO secular da ligação entre Angola e Moçambique28. Deste modo, Angola viu assegurada a área que lhe assinalava a carta de 190029. Contudo, só em 18 de Agosto de 1931 foram rubricados a acta final e um acordo em que ficou descrita a fronteira desde Andara até Katima, ao sudoeste africano e à Rodésia30. Desta forma, estabeleceu-se definitivamente a questão do Barotze e, consequentemente, os limites da fronteira sudoeste de Angola. 4. A demarcação da fronteira sul Contrariamente aos anteriores pontos cardeais, as negociações sobre a circunscrição das fronteiras do sul de Angola com o sudoeste africano alemão foram menos tensas. A fim de salvaguardar eficazmente os interesses comerciais situados ao longo da costa entre o Cabo frio e o rio Orange, o Embaixador da Alemanha em Lisboa dirigiu a carta, datada de 18 de Outubro de 1884, ao Ministro Estrangeiro informando a pretensão do seu Governo. Em resposta, Portugal concordou ser conveniente definir as fronteiras das possessões limítrofes, de modo a ficar definitivamente estatuída a esfera de acção em que cada uma das duas potências poderá exercer desassombradamente nesta parte do continente Africano. Posteriormente, surge o problema de localização exacta do Cabo frio: Portugal afirmava que o limite sul de Angola era o paralelo do Cabo frio, situado em 18º 24´ de latitude sul, e a Alemanha, nas suas cartas, fixava-o em 18º S31. Na condição de desistir de todos os direitos e pretensões que pudesse alegar relativamente aos territórios ao norte do rio Cunene, bem como OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de, op. cit., p. 75. De acordo com a escala geográfica 1:9.000.000 ou a carta de 1900 a zona ocidental de Barotze uma linha que, partindo de Catima no Zambeze, sobe por este rio até encontrar o seu afluente Lueti, com o qual se confunde até à sua origem; corta pelo meridiano de 20º Este de Greenwich para o norte até ao paralelo de 13º Sul, onde inflecte para nordeste em direcção ao ponto de confluência do Lefuge com o Zambeze; sobe esse afluente em direcção ao meridiano de 24º Este, acompanhando-o para norte até a linha divisória de águas entre o Zaire e o Zambeze. 30 SANTOS, Eduardo dos – A Questão do Barotze. 31 Joaquim Dias Marques de Oliveira, op. cit., p. 11. 28 29 32 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS a abster-se de qualquer interferência política nesta região, a Alemanha propôs, a 27 de Julho de 1886, a sua delimitação, fixando como linha divisória a foz do rio Cunene, seguindo pela margem esquerda do curso deste rio até o ponto fronteiro do Humbe. Contrapôs Portugal a 4 de Agosto desse mesmo ano, argumentando que a marcação partiria do Cabo frio, seguindo pelo cordão orográfico do lado do nascente, até chegar a Otymorongo, daí seguindo para a margem setentrional do Etocha, e o rio Ovampo prolongar-se-ia, então, até às lagoas Ansun do Berg Damara. Das lagoas Ansun seguiria o rio Omaramba até cortar o paralelo de 18º, dirigindo-se depois para Mai-ini, e pela margem norte do Thobe, prosseguindo então até à confluência deste com o Zambeze. Esta linha de limites, ao ter de se adaptar ao estado actual das circunstâncias e aos acidentes naturais do terreno, descendo umas vezes e subindo outras, para além de passar pelo paralelo do Cabo frio, apenas ficaria menos bem determinada pela incerteza, ainda hoje existente, dos conhecimentos geográficos desta parte da África Central, a porção que fica entre a lago de Etocha e Mai-ini32. Portugal comunicou a sua aceitação à proposta através de um memorandum enviado ao Governo alemão, a 22 de Setembro de 1886, conquanto solicitou a alteração para a linha de limite o curso do Cunene até às cataratas no prolongamento da Serra da Chela ou Canná, daí um paralelo até ao Cubango, e o curso deste rio, até se aproximar da margem norte do Chobe, e confluência deste com o Zambeze. Em contrapartida, o Governo alemão sugeriu a linha do paralelo das cataratas, depois o Cubango até Andara, daí até encontrar o Zambeze nos rápidos de Katima – esta sugestão foi aceite pelo Governo português e o acordo foi assinado a 30 de Dezembro de 1886 em Lisboa e ratificado por decreto de 14 de Julho de 188733. Segundo o art.º 2.º do referido acordo «a fronteira partindo do Cunene, seguia o seu curso até as cataratas que forma no sul do Humbe, 32 PORTUGAL, Ministério dos negócios Estrangeiros – Documentos apresentados as Cortes na sessão Legislativas de 1887 pelo Ministro e Secretario de Estado dos Negócios e Estrangeiros, negociações relativas à delimitação das possessões portuguezas e alemãs na África Meridional, pp. 11-15. 33 Ratificada por Decreto de 11 de Julho de 1887 e publicada no Diário do Governo n.ºs 159 e 160 de 21 e 22 de Julho de 1887, respectivamente. 33 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO ao atravessar a Serra Canná; daqui em diante seguia o paralelo até ao rio Cubango, o seu curso até Andara e, finalmente, deste lugar a fronteira seguia em linha recta na direcção do leste até aos rápidos de Katima no Zambeze»34. Não obstante, o território compreendido entre o Cunene e o Cubango manteve-se em litígio até que os territórios do Sudoeste passaram para a União Sul-Africana, tendo sido assinado o Tratado a 22 de Junho de 192635, na cidade do Cabo. Finalmente, as actividades de demarcação da fronteira entre o Sudoeste Africano e Angola registou-se com a assinatura do acto de Kakeri em 23 de Setembro de 1928, fixando o ponto de longitude 18º 25º 06,2´ E36. Assim, encerrou-se a série de controvérsias que envolveram a demarcação da fronteira sul de Angola, ficando definitivamente resolvida a questão da zona neutra, assegurando-se Angola da posse do rectângulo de 4950 km2 entre os rios Cunene e Cubango. Com a demarcação da fronteira sul, concluíram-se os trâmites para a fixação das fronteiras terrestres de Angola. 5. A delimitação das fronteiras marítimas sul e norte Depois de estudarmos o historial da constituição fronteiriça terrestre e fluvial, é o momento de analisar a delineação da fronteira marítima lateral sul e norte, atendendo à sua extensão aproximada de 1650 km, e às características profundamente irregulares da costa angolana, muito instável e recheada de baías, desembocaduras, baixos a descoberto, deltas e outros acidentes naturais, percebendo-se, claramente, a necessidade de definir o ordenamento do espaço marítimo nas águas sob jurisdição nacional. Sobre as fronteiras marítimas, o art.º 13.º da Carta sobre a Protecção e a Segurança Marítimas e o Desenvolvimento em África (Carta de Lomé) 34 PORTUGAL, Ministério dos negócios Estrangeiros – Documentos apresentados as Cortes na sessão Legislativas de 1887 pelo Ministro e Secretario de Estado dos Negócios e Estrangeiros, negociações relativas à delimitação das possessões portuguezas e alemãs na África Meridional, pp. 41-44. 35 Publicado no Diário do Governo, I série, n.º 249 de 6 de Novembro de 1926, consta dos anexos juntamente com o Relatório da Comissão de delimitação da fronteira marítima entre a República de Angola e a República da Namíbia 36 Diário do Governo 1ª série, n.º 222, de 25 de Setembro de 1931. 34 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS dispõe que «o Estado deve esforçar-se para delimitar as suas respectivas fronteiras marítimas, em conformidades com as disposições dos instrumentos internacionais relevantes». A delimitação da fronteira norte é a que maior complexidade oferece pelas cláusulas estabelecidas nos Tratados celebrados pelas potências, pela configuração geográfica a que corresponde o sistema oro-hidrográfico de um território formado de duas partes distintas e geograficamente separadas, e pelo Enclave de Cabinda que ocupa a margem direita do rio Zaire, compreendido entre os paralelos 4º 22´ e 5º 45´ de latitude sul, e os meridianos 12º e 13º 03´ de longitude este Greenwich37, sobretudo, pela cedência da margem esquerda do rio Zaire, conforme a Convenção de 22 de Julho de 1927, relativa a troca de terrenos. Conforme traçado na carta n.º II, anexada à Convenção de 12 de Maio de 1886, a linha divisória da fronteira entre o norte de Cabinda e a República do Congo Brazaville, nos termos do art.º III da mencionada Convenção, completado pelo Protocolo de Paris de 12 de Janeiro de 1890 ficou estabelecida da seguinte forma: … a fronteira confundir-se há com a linha de cumeada que separa as bacias do Loema ou Luisa Loango e do Chiloango até à origem do primeiro rio que se acha à 10-22´-50´´ de longitude Este de Paris, pouco mais ou menos e 4-22´-50´´ de latitude Sul pouco mais ou menos. A partir dêste ponto, a fronteira seguirá a linha divisória das águas das bacias do Niari-Quillou, ao Norte, e do Chiloango, ao sul, até ao meridiano 10-30´ de longitude Este de Paris, aproximando-se tanto quanto possível do paralelo que passa pela origem do rio Loema ou Luisa Loango acima indicado. A fronteira seguirá em seguida o meridiano 10-30´ até ao ponto de intercepção com a crista das alturas que limitam a encosta chamada floresta do Mayombe, depois confundir-se há com esta crista até ao seu encontro com o rio Chiloango, que serve neste sítio de fronteira entre as possessões portuguesas e o Estado Livre do Congo. 37 No mesmo sentindo, OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de – Subsídios para o estudo da delimitação e jurisdição dos espaços marítimos em Angola, p. 212; veja-se também, o mesmo autor, op. cit., p. 79. 35 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Quanto à fixação da fronteira sul da província de Cabinda, o segundo parágrafo do art.º III da Convenção de 14 de Fevereiro de 1885, estabelece que Ao norte do rio Zaire, a recta que une a embocadura do rio que se lança no Oceano atlântico ao sul da baía de Cabinda, junto de Ponta Vermelha, a Cabo Lombo; o paralelo deste último ponto prolongado até à sua intersecção com o meridiano da confluência do Cula-calla com o Lu-culla; o meridiano assim determinado até à seu encontro com o rio Lu-culla; o curso do Lu-culla até à sua confluência com o Chiloango. Nesta conformidade, Angola possui cerca 524 km de fronteira marítima lateral norte, partilhando 304 km ao norte da província de Cabinda com a Repúblicas do Congo Brazaville e 220 km entre o Sul da província de Cabinda e ao norte da província do Zaire com a República Democrática do Congo. Contudo, pela falta de delimitação definitiva, vislumbra-se sérias ameaças de segurança na região, e estes países resolvem a controvérsia por meio de troca de notas diplomáticas, acordando no exame das respectivas propostas de extensão da plataforma continental, sem prejuízo do futuro estabelecimento dos limites fronteiriços. São comummente chamados «acordos de não objecção»38. Entende Joaquim Marques de Oliveira que a definição da fronteira marítima ao norte de Cabinda entre Angola e a República do Congo pode ser feita por Uma linha perpendicular definida pelo azimute 235.º com o seu Ponto de início, na Baliza A, cujas coordenadas são as seguintes; Latitude 05º 01´36,29´´; Longitude 12º 00´53,19´´, até ao ponto de intersecção com a linha perpendicular de 06º 01´54,44´´ respeitante a fronteira lateral norte ao norte da província do Zaire, traçada a partir do Ponto de início fixado na mediana do rio Zaire39. Relativamente à fronteira marítima norte ao sul entre essa província e a República Democrática do Congo, o autor defende que pode vir a ser definida por 38 Vide o nosso artigo de avaliação na disciplina de Segurança Marítima, Janeiro, 2019, p. 11. 39 36 OLIVEIRA, Joaquim Dias Marques de, op. cit., p. 217. REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS Uma linha perpendicular definida pelo azimute 230.º com o seu Ponto de início, na Baliza D, de coordenadas desconhecidas, mas cuja latitude se prevê de 5º 47´ 14, até ao ponto de intersecção com a linha paralela de latitude 06º 01´54,44´´ traçada a partir do Ponto de início fixado na mediana do rio Zaire40. Quanto à possível delimitação definitiva ao norte da província do Zaire entre Angola e a República Democrática do Congo, o referido doutrinário é de opinião que seja definida por Uma linha ao longo do paralelo de latitude 06º 01´54,44´´ traçada a partir do ponto de início fixado na mediana do rio Zaire, até a intersecção com a linha perpendicular definida pelo azimute 230º com o seu Ponto de início na Baliza D, de coordenadas desconhecidas, mas cuja latitude se prevê de 5º 47´14 41. Por seu turno, o art.º 12.º da Lei dos Espaços Marítimos (LEM), estabelece que «As fronteiras marítimas do Estado Angolano com os Estados com costas adjacentes, salvo se de outro modo for estabelecido por Convenção Internacional ou outra prática for adoptada a título provisório, são constituídas pela linha equidistante». Contrariamente à fronteira marítima ao norte, a fronteira da orla costeira sul, isto é, o Mar Territorial, a Zona Económica Exclusiva e a Plataforma Continental estão definidas no tratado de delimitação e demarcação da fronteira marítima assinada a 4 de Junho de 200242, em Luanda, entre a República de Angola e a República da Namíbia, nos termos do art.º 13.º da LEM conjugado com art.ºs 74.º e 83.º da CNUDM. As negociações tiveram por base a Declaração de 30 de Dezembro de 1886 e o Tratado de 22 de Junho de 192643 ‒ que serviram de títulos históricos nos termos da 2.ª parte do art.º 15.º CNUDM ‒, em que se declarava que a fronteira entre a República de Angola e a República da Namíbia era determinada por uma linha mediana traçada a partir das duas margens do rio Cunene. Idem, p. 220. Idem, p. 222. 42 Aprovado pela Resolução n.º 3/03, de 3 de Fevereiro, Diário da República I Série n.º 9. 43 Primeiro e segundo parágrafo do preâmbulo do Tratado da delimitação e demarcação da fronteira marítima entre República de Angola e a República da Namíbia, de 4 de Junho de 2002, com os anexos. 40 41 37 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Estabelece o parágrafo 1 do art.º III do Tratado de Delimitação e Demarcação da Fronteira Marítima que O ponto de partida para a determinação do Mar Territorial, Zona Económica Exclusiva e Plataforma Continental entre a República de Angola e a República da Namíbia, será a intercepção da linha de base e do paralelo de 17º 15´, Latitude Sul. A partir desse ponto, sobre a linha de base a fronteira marítima estender-se-á ao longo do paralelo 17º 15´ latitude Sul em direcção Oeste, por uma distância de 200 milhas náuticas. O artigo acima citado foi regido à luz do ponto 23 do Anexo B que dispõe que Demarcar e delimitar a fronteira marítima entre a República da Namíbia e a República de Angola, monumentado dos marcos em terra firma, na linha de Latitude 17º15´ Sul. Estes marcos serão monumentados de tal forma que a linha de visão entre os marcos projectados na direcção Oeste interceptará a linha de base. O ponto de intercepção desta linha e a linha de bases deverão ter a latitude de 17º15´ Sul e uma longitude que coincidirá com a posição da linha de base. Este ponto início e em direcção Este, a fronteira deverá continuar a ser a linha entre o ponto início e a mediana da foz do rio Cunene. Respeitante às ilhas situadas no mar44, estatui o art.º IV do Tratado que «Onde a linha definida, de acordo ao Artigo III do presente Tratado, atravessar uma ilha situada no mar, a mesma linha constituirá a fronteira marítima entre a República da Namíbia e a República de Angola». Em suma, após estudarmos o percurso histórico do marco territorial e marítimo de jurisdição nacional, propormo-nos reflectir, a seguir, sobre 44 Haverá ilha(s) situadas nas águas marítimas angolanas? Pois, este assunto vem sendo ignorado há séculos! Em concreto, é a Ilha Santa Helena descoberta em 1501 pelo navegador galego João da Nova, que, na ocasião, estava a serviço de Portugal. João da Nova dirigia-se à Índia, tendo nessa viagem também descoberto a Ilha de Ascensão. O primeiro habitante permanente da ilha foi o soldado português Fernão Lopes, que permaneceu isolado em Santa Helena de 1515 a 1545, excepto durante uma breve visita que ele fez à Europa, após 10 anos de isolamento na ilha. Portugal nunca colonizou Santa Helena, sendo que a ilha veio a ser ocupada pela marinha britânica no século xix. 38 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS o legado cultural marítimo, bem como a renovada importância do mar no contributo estratégico para o desenvolvimento económico e o poder do Estado. SECÇÃO II A identidade marítima, geoeconomia e o poder do Estado 6. Razão de ordem Após a abordagem histórica da demarcação da fronteira terrestre e fluvial, temos, pois, motivos para reconhecer os benefícios de uma relação angolana com o mar, que ganhará consistência na busca de identidade cultural marítima e da geoeconomia do mar. No passado, o mar era tido como um activo estratégico decisivo para a expansão marítima; actualmente, o mar é considerado como um recurso natural, um enorme espaço económico e político, fonte de poder e de riqueza, e de extremo impacto na qualidade de vida na população. O mar nacional representa um dos principais mananciais significativos de receita pública, essencialmente com o petróleo e o gás natural, sendo mais importante do que a representação de outros sectores terrestres no processo de crescimento económico sustentável. Daí falar-se no promissor desafio da exploração e do desenvolvimento dos clusters de interesses ligados ao mar, nomeadamente, em diversas áreas económicas, científicas e tecnológicas, donde decorre a noção de hypercluster da economia do mar, para que a economia angolana não dependa exclusivamente das receitas do petróleo e do gás natural. O mar é, no primeiro plano, um meio de comunicação, de trocas comerciais e da existência de uma consciência colectiva marítima virada para as questões do mar, i. e., questões económicas e de poder de Estado que importam para o enfoque marítimo. A essas questões correspondem a ideia do conceito de talassocracias, como entende António Rebelo Duarte45. 45 Vide DUARTE, António Rebelo – A geoestratégia, o mar e a economia, texto apresentado na Conferência no Instituto Dom João de Castro, 28 de Janeiro de 2008, p. 12 s., disponível em: https://www.idjc.pt/pdf/A_GEOESTRATEGIA_E_O_MAR.pdf. 39 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Todavia, as questões do mar continuam a não inspirar interesse ao Governo angolano que carece de uma política de articulação e harmonização das áreas marítimas 46, de modo a extrair o máximo partido dos seus recursos vivos e não vivos. Não será exagerado lembrar que o mar é o mais importante dos recursos naturais do espaço económico angolano; contudo, é o recurso menos explorado e com desafios mais promissores e, previsivelmente, irá ter um desenvolvimento mais relevante em termos de criação de valor na economia mundial, razão pela qual é, hoje, dito como a nova fronteira de exploração económica. Em título de resumo, nesta secção, ocupar-nos-emos de retratar aspectos que poderão ajudar a procurar uma relação cultural e de verdadeira soberania com o mar, bem como identificar componentes relevantes de desenvolvimento estratégico para a economia do mar. 7. O mar na identidade cultural angolana Historicamente, Angola não tem um legado cultural marítimo que possamos narrar e que sirva de cobrança para questões ligadas ao mar, bem como para enfrentar desafios e tensões e aproveitar as oportunidades do século xxi. Não há uma ligação umbilical entre Angola e o mar que a história se pode encarregar de cerzir47. Numa visão histórica e geográfica, com sentido poético, Armado Pereira caracteriza o mar em frases tão profundas e apelativas, dizendo que «_ o mar não afasta, aproxima; não é um motivo de dispersão, mas é a grande estrada natural de ligação e de atracção»48. 46 Sirva de exemplo a inexequibilidade e incumprimento dos diplomas do sector marítimo. 47 Neste sentido, Damião Fernandes Capitão Ginga afirma que «o povo angolano não tem cultura marítima, ainda que desde cedo uma boa parte da população se tenha dedicado às atividades ligadas ao mar» (Angola e a complementaridade do mar: o mar enquadramento fator geoestratégico de segurança, defesa e de afirmação – Tese de Doutoramento em Relações Internacionais na especialidade em Ciências Políticas pela Faculdade de Ciências Políticas, Lusofonia e Relações Internacionais da Universidade Lusófona de Humanidade e Tecnologias), p. 182. 48 Cfr. PEREIRA, Armando Gonçalves – A economia do mar, p. 24. 40 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS A identidade marítima que propomos revelar surge num espírito de formação única, com a sua contiguidade e afinidade alcançadas pelo mar, que, como grande estrada natural, desempenha uma acção atractiva e de aproximação entre povos, exercendo o mar a função dominante geoestratégica no sul do Atlântico, deixando mais clara a ligação e inserção no triangulo lusófono (Brasil, Angola e Cabo Verde). Falar da lusofonia é falar da maritimidade, a história lusófona está indissociavelmente ligada ao mar. Esta ligação existe desde a materialização da política de expansão marítima e da colonização que marcou a humanidade, devendo ser preservada e valorizada como estratégia de presente e de futuro para que se estreitem os lanços da Comunidade Lusófona dispersa por todos os continentes e unida pelos maiores oceanos49. Não obstante os elementos histórico, linguístico e cultural partilhados pelos povos lusófonos, ainda assim, a ideia da construção de identidade marítima lusófona carece de tradição e cultura de navegação, legado que não foi passado aos países africanos que integram a comunidade50. Com efeito, a identidade que Angola mantém com o Atlântico assegura a nacionalidade, ajuda a consolidar a independência, permite manter a coesão nacional, mas falta-lhe, ainda, a valia estratégica para se afirmar como soberania de serviço em apoio marítimo ao controlo dos mares na região do Golfo da Guiné, dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa e da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, na projecção de poder que lhe proporcionará alianças geopolíticas compensadoras e a consequente visibilidade internacional. Digamos que a visão míope impede o Estado angolano de exercer a sua influência nos grandes espaços marítimos que lhe estão jurisdicionalmente afectados. Aqui, gostaríamos de lembrar que a dimensão terrestre – cerca de 1 246 700 km2 ‒ apresentando a sua costa uma extensão significativa de 1650 km2, é superior ao espaço marítimo com uma dimensão aproximada de 36 670 km2 (3 %) para Mar Territorial, 611 160 km2 (49 %) respeitante à Zona Económica Exclusiva e uma proporção de 1 069 530 km2, caso for deferido o pedido de extensão da Plataforma Continental. Destarte, com a submissão da extensão da Plataforma Continental aumenta a 49 Vide nosso artigo Mar e Identidade Marítima, curso de Mestrado em Direito e Economia do Mar, pp. 7 e 8. 50 Idem. 41 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO responsabilidade de cuidar do destino dos espaços marítimos que lhe pertencem51. O mar e seu fundo marinho representam a grande mina nacional, dada a existência de recursos biológicos e minerais e de reservas de hidrocarboneto na Zona Económica Exclusiva e na Plataforma Continental. Contudo, estima-se que o solo e o subsolo, o fundo marinho e os leitos correspondentes angolanos alberguem 35 dos 45 minérios mais importantes do comércio mundial entre os quais se destacam o petróleo, gás natural, diamantes, fosfatos, substâncias betuminosas, ferro, cobre, magnésio, ouro e rochas ornamentais, etc.52. Com as várias descobertas no mar angolano, o país tornou-se o segundo maior produtor de petróleo na costa oeste do continente africano53. Apreciaríamos lembrar que a actividade de prospecção e pesquisa 51 Julgamos ser falta de seriedade do Governo angolano em questões do mar, visto que não consegue preservar e proteger o espaço marítimo sob a sua jurisdição, mas compromete-se internacionalmente com «a sua pretensão de reservar para si os direitos de soberania sobre a plataforma continental para efeitos de exploração e aproveitamento dos seus recursos naturais em toda a extensão da área apresentada à Comissão de Limites da Plataforma Continental», conforme declaração prestada pela Florbela Rocha Araújo, antiga Secretária do Presidente da República para os Assuntos Judiciais e Jurídicos e Membro da Comissão Interministerial para Delimitação e Demarcação dos Espaços Marítimos de Angola, na Conferência dos Estados partes da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, disponível para consulta em: http://www.embaixadadeangola.pt/angola-desenvolve-estudospara-medir-limites-exteriores-mar/ . 52 Para mais informações, consulte o site: http://www.governo.gov.ao/opais.aspx. 53 O petróleo abriu as portas a Angola para Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) como membro de pleno direito desde 2008, na qualidade de segundo maior produtor de petróleo, com produção actual de 1,8 milhão de b/d (barris por dias), com a terceira maior reserva de África com 12 mil milhões de barris, comparadas com 37,4 mil milhões da Nigéria e 48,4 mil milhões da Líbia e é 12.º maior do mundo em 2016, com cerca de 70 % do seu PIB proveniente do sector petrolífero, in Boletim de Conjuntura da Indústria do Petróleo, n.º 3 2.º semestre, 2017, pp. 2 e 3, disponível em: http://www.epe. gov.br/sites-pt/publicacoes-dadosabertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao226/ topico336/Boletim%20de%20Conjuntura%20da%20Ind%C3%BAstria%20do%20 Petr%C3%B3leo_2sem2017.pdf, vide também o Relatório do Fundo Monetário Internacional n.º 18/157, junho, 2018, disponível em: https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s &source=web&cd=&ved=2ahUKEwiO3LLl8aHrAhX3WxUIHcJmCzoQFjAAegQIBBAB& url=https%3A%2F%2Fwww.imf.org%2Fpt%2FPublications%2FCR%2FIssues%2F2018%2F 06%2F11%2FAngola-Selected-Issues-45958&usg=AOvVaw2cQozqrxDIk0XVZX8THc0Q. 42 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS de hidrocarboneto nas águas nacionais teve início em 1910, sendo a primeira descoberta comercial feita em Abril de 1955 no vale do Kwanza (300 km2 ao longo da costa Atlântica, com uma profundidade para o interior do território de 140 km2) e em Setembro de 1962 nas águas marítima de Cabinda. O petróleo tornou-se o principal material de exploração em 1973, e a exploração em águas profundas e ultra-profundas, a partir de 1500 m, torna a indústria petrolífera angolana pioneira a nível mundial54. Para além da exploração de hidrocarboneto, o mar tem dado outras oportunidades ao país, que não tem sabido aproveitar a sua múltipla funcionalidade, que pode representar um dos mais significativos mananciais de recursos, especialmente económicos, mais do que os respectivos processos de crescimento até aqui adoptados. É a hora de Angola se lançar ao mar; não basta ser reconhecida internacionalmente apenas pelo petróleo, existem outros recursos não vivos e vivos a serem descobertos e potencializados. Outra tarefa que achamos ser o mais importante no processo de identificação marítima é a sensibilização55 e inclusão do povo nos assuntos ligados ao mar, investimento na investigação científica e tecnológica, formação de quadros nas diversas áreas do mar, a implementação nas comunidades de programas educacionais e, no primeiro e segundo ciclos, disciplinas relacionadas com o mar, tendo em vista ditar e consolidar o pensamento cultural marítimo nas gerações vindouras. 8. O mar e o poder do Estado A localização geográfica de Angola permite que o seu mar seja próspero em biodiversidade, essencialmente pelo cruzamento entre a Corrente Fria de Benguela e a Corrente Quente da Guiné, enriquecido com ecossistema de mangais e um habitat para a sua flora e fauna. 54 Para mais informações sobre a história do crude em Angola, consulte o site: http:// www.sonangol.co.ao 55 Entende Damião Capitão Ginga que «a falta de cultura marítima do povo angolano resulta na fraca atitude e sensibilidade psicológica da nação como um todo em relação aos assuntos do mar», op. cit., p. 183. 43 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO O mar nacional apresenta-se, na maior parte da sua extensão, calmo, com velocidades médias dos ventos que rondam os 0,3 m/s e correntes marítimas que, ao longo da costa, raramente atingem um nó, com uma ondulação suave, navegável durante todo o ano permitindo o trânsito submarino, sendo que a partir de 5 m da costa a profundidade ronda os 100 m56. Apesar da faixa litoral sul se situar em posição latitudinal correspondente a temperaturas de massas de águas oceânicas superficiais relativamente quentes, a temperatura da água a 10 metros de profundidade é baixa, devido à ascensão de águas frias, transportadas pela Corrente Fria de Benguela57. Com efeito, a Corrente de Benguela é altamente variável, propensa a eventos de aquecimento em grande escala chamados Benguela Niños, invasões de água quente do leste ou água fria do sul e mudanças nos ventos e na salinidade. Tudo isto compõe os efeitos na pesca e complica a tarefa de gerenciamento sustentável de recursos58. Conforme referimos oportunamente, o mar não constitui um elemento genético da consciência marítima do povo angolano, nem tão pouco um factor do poder nacional na orientação estratégica para a construção do futuro económico sustentável e melhoria de qualidade de vida das populações. Isto porque, desde a descoberta e a exploração de petróleo e gás, o poder executivo sempre privilegiou estes recursos não vivos face aos demais recursos marinhos; com efeito, compreende-se que essa preferência se tenha justificado no decorrer da guerra civil e no período de reconstrução nacional, mas, passada essa fase,59 é inaceitável o pouco interesse ou mesmo a falta dele na protecção e preservação do meio marinho, investigação científica marinha, desenvolvimento e transferência 56 Vide nosso Mar – meio sustentável para a economia angolana tema de avaliação na disciplina Os Recursos Naturais Marinhos e a Economia, curso de Mestrado em Direito e Economia do Mar, Junho, 2019, p. 7. 57 HENRIQUES, M. H.; CANALES, M. L. & MBADU, E. – Foraminíferos atuais do litoral de Benguela (Angola): diversidade e implicações ecológicas. In Lopes, F. C., Andrade [et al.] – Para conhecer a terra memórias e notícias de geociências no espaço Lusófono, p. 201. 58 The Benguela current, GEF. 2016. Disponível em: https://www.thegef.org/news/ benguela-current. 59 Já passaram dezoito anos desde a assinatura da paz, a 4 de Abril de 2002. 44 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS de tecnologia marinha, conforme convencionado nas Partes XII, XIII e XIV da CNUDM. Comparando os investimentos financeiros feitos no sector petrolífero e demais sectores ligados ao mar, se o governo subtraísse 3 % ou 2 % do primeiro sector para investir nas restantes áreas marítimas60 ‒ a partir da segunda República ‒, cremos que Angola registaria resultados satisfatórios, inclusivamente no âmbito da política do crescimento azul. Achamos que as decisões que o Estado angolano tem tomado sobre as matérias do mar não têm em conta a política nacional em matéria de meio ambiente, nem tão pouco o dever de proteger e preservar o meio marinho, nos termos do art.º 193.º do CNUDM, conjugados com a Lei n.º 5/98, de 19 de Junho (que define os conceitos e princípios de base da protecção, preservação e conservação do meio ambiente e promoção da qualidade de vida e a utilização racional dos recurso naturais), com a Lei 6-A/04, de 8 de Outubro (Lei dos Recursos Biológicos e Aquáticos (LRBA)) que estabelece as politicas de conservação e renovação sustentável dos recursos biológicos aquáticos61, com as disposições da Convenção da Corrente de Benguela, e com a Estratégia e o Plano de Acção Nacional para a Biodiversidade. Este reparo constata-se na manifestação da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, no Decreto Presidencial n.º 49/19, de 6 de Fevereiro, de levar avante a construção das refinarias no litoral sul do país, 60 Mesmo que o Governo não reduzisse o investimento no sector petrolífero, se fosse cabimentada metade da linha de crédito chinês para fomentar os sectores da biotecnologia, energia renováveis, turismo marinho e marítimo, recursos minerais, aquicultura e pescas, certamente, Angola alcançaria o crescimento inteligente, sustentável e inclusivo para a sua economia. Infelizmente, esse crédito foi aplicado, sobretudo, na construção de infra-estruturas que, passados menos de oito anos, se encontram arruinadas. 61 Conforme já referimos, o problema em Angola não é a falta de leis, mas, sim, a respetiva aplicabilidade. De informar que, em Agosto de 2019, houve um derrame nas águas marítimas de Cabinda num dos blocos de exploração de petróleo, matando os recursos vivos da região – todavia a notícia não teve impacto nacional, dito melhor, foi abafada (não é a primeira vez que tal sucede) e, pelo que sabemos, o Estado angolano não intentou nenhuma acção judicial contra a empresa petrolífera nos termos da Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil pelos Prejuízos devidos a Poluição por Hidrocarbonetos, de 1992 versão inglesa, cuja adesão foi aprovada pela Resolução n.º 32/01, de 1 de Novembro. 45 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO nas províncias de Benguela e Namibe62, justamente na região da Corrente Fria de Benguela, onde existem correntes de águas, acompanhadas de ventos frios, que se movem no sentido sul-norte e que banham a costa ocidental meridional de África, desde o Cabo da Boa Esperança na África do Sul, passando pela Costa dos Esqueletos na Namíbia e pela Costa de Angola até alcançar o equador, onde vira, rapidamente, para oeste para se transformar na Corrente Equador Sul63. A Corrente Fria de Benguela representa um dos 64 grandes ecossistemas marinhos em todo o mundo, cuja preservação constitui objecto de múltiplas iniciativas intergovernamentais. De entre elas, destaca-se a Comissão da Corrente de Fria de Benguela, criada em 2007, constituída por Angola, Namíbia e África do Sul, e visa proteger e promover a sustentabilidade do ecossistema marinho na região64. Esperamos que a pretensão de construção da refinaria nesta costa litoral não se materialize, não pela razão do baixo preço do barril do petróleo, previsto em menos 20 % (equivalente a 20 milhões de barris por dia provocado pela epidemia da Covid-19)65, mas pelo dever de proteger e preservar o ecossistema marinho, sobretudo, porque mexerá com o nosso futuro e com o futuro das próximas gerações. 62 Mais informações assunto vide Russos lançam construção de refinaria no sul de Angola em projeto de 10,5 mil MEuro. Diário de Notícias. 12 de Julho de 2017. Disponível em: https://www.dn.pt/lusa/russos-lancam-construcao-de-refinaria-no-sul-de-angola-emprojeto-de-105-mil-meuro-8632311.html. 63 HENRIQUES, M. H.; CANALES, M. L. & MBADU, E. – Foraminíferos atuais do litoral de Benguela (Angola): diversidade e implicações ecológicas. In Lopes, F. C., Andrade [et al.] – Para conhecer a terra memórias e notícias de geociências no espaço Lusófono, p. 201. 64 The Benguela current, GEF. 2016. Disponível em: https://www.thegef.org/news/ benguela-current. 65 Devido à crise orçamental de 2020, o Governo angolano prevê uma revisão significativa das previsões do Orçamento Geral do Estado de 2021, antecipando uma recessão de 1,2 % com o petróleo abaixo de 35 dólares norte-americanos e o preço do quilate de diamante nos 100,3 dólares (Governo angolano reduz número de ministérios. Deutsche Welle. Disponível em: https://www.dw.com/pt-002/governo-angolano-reduz-n%C3%BAmero-deminist%C3%A9rios/a-52948905). Somos de opinião que sejam reconstruídas as refinarias existentes na zona norte do país, uma vez que o ecossistema da zona litoral sul figura na lista mundialmente protegida (COVID 19: impactos económicos e sociais em Angola: contribuição para debate). 46 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS Sobre a protecção do ecossistema marinho ocupar-nos-emos na segunda secção do capítulo terceiro. No tocante ao exercício do poder do Estado no mar, importa lembrar que, no passado, a colónia portuguesa reivindicou o direito de soberania, alegando que a ocupação efectiva é só aplicável à costa marítima e não ao interior africano, nos termos da 1.ª parte, do art.º 35.º do Acto Geral da Conferência de Berlim; tal como hoje, o mar vê renovada a sua importância na medida em que surge como o último espaço do planeta a permitir a descoberta de novas fronteiras nacionais66. Todavia, o governo colonial prestou pouca atenção à gestão do espaço marinho e seus recursos e, ainda hoje, para análise de quaisquer questões do mar, procura-se incentivo às actividades terrestres e hídricas para trabalhar de maneira integrada. Este tipo de observações encontra eco em António Rebelo Duarte ao defender que Independentemente da dicotomia e rivalidade entre poderes marítimo e terrestre, a força gerada pelo mar é incontestável, como a história o comprova, devendo ser avaliadas devidamente as potencialidades políticas, económicas e culturais do oceano, na prossecução de uma estratégia para o espaço oceânico em geral e zonas marítimas sob jurisdição nacional, em particular67. Certamente, o mar constitui um factor de poder regional (Região do Golfo da Guiné (RGG) e comunitário (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) na reorientação estratégica para a regeneração construtiva do futuro. Na Região do Golfo da Guiné, apesar da língua não unir Angola com outros membros, actualmente, verifica-se a mobilização e interesse dos Estados em busca de uma visão estratégica para a segurança marítima, desenvolvimento económico sustentável, científico e tecnológico marinho. Assim como os demais países da região, Angola enfrenta problemas que minam o processo de desenvolvimento e de segurança marítima, nomeadamente, a pesca ilegal (não regulada e não declarada), os crimes contra a biodiversidade, o transbordo ilegal de produtos em alto mar, a pirataria marítima, o tráfico de drogas, a imigração ilegal, o despejo de 66 67 DUARTE, António Rebelo, op. cit., p. 4. Idem p. 13. 47 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO dejectos tóxicos e a disputa pelo alargamento da plataforma continental. Dos problemas evocados, o grande risco e desafio à soberania marítima angolana é a falta de capacidade de governação do domínio marítimo nacional. Por outro lado, a integração de Angola na CPLP, através do mar, é densificada pela língua, política, economia e valores culturais, mas alargando-a também ao domínio da segurança, já que as fronteiras culturais se alargam pelo Atlântico Sul e se estendem onde chega a CPLP68. Em suma, o mar é o reflexo de responsabilidade de cidadania e sentido de Estado; portanto, o interesse por ele não deve enlear apenas na exploração offshore do petróleo e na política, deixando na periferia vocações e motivações culturais, educacionais e tecnológicas. 9. Angola e a geoeconomia marítima Apresentando o bilhete de identidade histórico, geográfico e evidenciando o grau de parentesco do território angolano com o mar, concentrar-nos-emos, agora, no poder do Estado na economia, em particular, na economia no mar. Para começar a noção “Economia no Mar” ou “Economia do Mar” foi aclarada no IV Congresso do Jornal da Economia do Mar, na qual ficou diferenciada que a Economia do Mar diz respeito ao ramo das ciências exactas, tais como física, matemática, química, enquanto a Economia no Mar se refere ao conjunto das ciências exactas e sociais implementada no mar69. Alguns autores, como João Confraria, optam pelo segundo conceito, defendendo este doutrinário que a Economia do Mar corresponde às actividades económicas que dependem de recursos marítimos»; do mesmo modo Félix Ribeiro entende que «a Economia do Mar integra um vasto conjunto de actividades que têm como base a variedade de utilizações que o Mar suporta, nomeadamente, defesa, transportes e logística, energia, pesca e aquacultura, turismo e desporto, bem como a concepção e fabrico dos equipamentos e estruturas que permitem viabilizar essas mesmas 68 69 48 Idem, p. 11. IV Congresso do Jornal da Economia do Mar, Estoril, de 22 a 23 de Janeiro, 2019. REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS utilizações e salvaguardar a permanência dessa base de recursos e proteger as populações dos riscos que o Mar envolve»70. Assim como para Damião Capitão Ginga, a Economia do Mar surge como uma variante da Economia que se encontra ligada às políticas e às práticas inseridas numa estratégia conjunta de instituições e de sectores especializados, tendo por objectivo o melhor aproveitamento das vantagens e das potencialidades do Mar, a fim de permitir o desenvolvimento sustentado dos Estados71. Pelo nosso lado, optaremos por tratar de economia no mar por englobar várias disciplinas do saber que se dedicam ao estudo dos recursos marinhos, a ser implementada no espaço marítimo de jurisdição nacional. O mar é um dos principais activos estratégicos e económicos, mas mingua da necessidade de encontrar novas oportunidades e domínios de crescimento para potencializar a anémica economia angolana. Julgamos nós que a resposta estratégica que se procura não deve ser reduzida, exclusivamente, à economia e à política, mas, também, deve basear-se na articulação entre a formação, a tecnologia, as empresas e as instituições públicas e privadas especializadas em assuntos do mar, a fim de permitir o desenvolvimento sustentável tão almejado pelo Estado. De igual modo, consideramos que outra forma de ultrapassar esta debilidade e estagnação económica poderá basear-se na ideia de que o futuro passará pelo mar e pela investigação e exploração dos seus recursos, incluindo os do solo e subsolo das águas nacionais72. Trata-se, obviamente, de uma efectiva reconstituição num país riquíssimo em recursos mineiros marinhos e terrestres, com um reduzido leque de ministérios (recordaria que foi reduzido o número de departamento ministeriais de 28 para 21, com a fusão de alguns ministérios, nomeadamente da Defesa com o dos Antigos Combatentes, o da Cultura com o da Hotelaria e Turismo, o dos Transportes com o das Telecomunicações e Tecnologias de Informações, o 70 Cfr. CONFRARIA, João – Economia e política do mar. Caderno de Economia, n.º 24 (95), (2011), p. 14, e RIBEIRO, Félix – A economia do mar. In MATIAS, N. V.; SOROMENHO-MARQUES, V.; LEITÃO, A. G. (coord.) – Políticas Públicas do Mar, p. 130. 71 GINGA, Damião Capitão, op. cit., p. 56. 72 DUARTE, António Rebelo, op. cit., p. 16. 49 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO do Comércio com o da Indústria e o da Agricultura com os das Pescas e do Mar), a fim de dirimir ao mínimo a possibilidade de existência de conflito de interesses e competências, bem como propiciar maior racionalização da despesa pública73. Outra possibilidade seria procurar novos caminhos, no sector marítimo, no sentido de uma rápida adaptação ao competitivo mundo globalizado. Em relação ao valor estratégico que o mar representa, na nossa economia teremos, primeiramente, de alterar a política das actividades de utilização do mar, visto que a economia depende totalmente do petróleo. Traz-se à colação o indicador deste recurso não vivo que nos últimos três anos contribuiu 2,71 % para o crescimento do PIB74. Além disso, nos últimos três anos, registou-se uma recessão económica com a descida de 5,5 % do PIB75. Como exemplo, em 2018, verificou-se um recuo de 4,5 % do PIB – esta cifra deve-se pelo declínio da taxa de crescimento da actividade petrolífera na ordem de 3,87 pontos percentuais (p.p.), justificado, principalmente, pela quebra nos níveis de produção do petróleo e gás em 12,48 % e reflexo do declínio de alguns poços petrolíferos, conjugado com os baixos níveis de investimento observados, particularmente, nos segmentos de prospecção, pesquisa e exploração e com a ineficiência dos sistemas de recuperação secundária. No que diz respeito à desaceleração da actividade não petrolífera em 0,98 p.p. decorreu do menor dinamismo observado na actividade dos sectores da indústria transformadora (passou de 1,18 % para 0,10 %), serviços mercantis (passou de 1,48 % para 0,65 %) e da construção (passou de 2,51 % para 1,85 %)76. Entretanto, prevê-se para 2021 e 2022 73 Decisão tomada na terceira sessão ordinária do Conselho de Ministros datada de 27 de Março de 2020. 74 Cfr. Universidade Católica de Angola – Relatório económico de Angola 2016. Disponível para consulta em: http://www.ceic-ucan.org/wp-content/uploads/2017/06/ Apresenta%C3%A7%C3%A3o-do-Relat%C3%B3rio-Econ%C3%B3mico-de-Angola2016.pdf. 75 Economia de Angola sofreu recessão de 0,9% no ano passado. RTP Notícias. 20 de Abril de 2020. Disponível para consulta em: https://www.rtp.pt/noticias/economia/ economia-de-angola-sofreu-recessao-de-09-no-ano-passado_n1222448. 76 Vide Banco Nacional de Angola – Relatório Anual e Contas 2018, p.17 [em linha]. Disponível para consulta em: https://www.bna.ao/uploads/%7B490f344a-dce2-4be2-a749a125996dbf65%7D.pdf. 50 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS um crescimento económico do PIB no sector não petrolífero de 79 % e 21 % no sector petrolífero, quanto a taxa de crescimento do PIB, de acordo com o resultado da MODUCAN (modelo de previsão macroeconómica constituído com base nas equações do modelo IS/LM, que determina os pontos correspondentes à taxa de crescimento do PIB e à taxa de juros) regista-se –1,4 em 2019, –6,8 em 2020, –0,2 em 2021 e 1,6 para 202277. Já o Fundo Monetário Internacional regista saldo negativo na taxa de crescimento económica de –1,5 em 2019 e –1,4 em 2020, para 2021 o Fundo Monetário Internacional estima um crescimento positivo de 2,678. A génese desta vulnerabilidade deve-se à baixíssima produção nacional, ou seja, a dependência da importação fortaleceu-se como o cancro da economia angolana, aliás, este diagnóstico é associado à falta de rigor e de organização nos sectores de produção. Se assim continuar, ficaremos sem economia e sem margem de manobra fiscal, só nos restando, claro, potencializar outros meios marinhos e todo o sector real económico79. Para rematar, dentre outros requisitos, para amplitude mais reforçada, a estratégia económica marítima passará pela identificação do potencial dos recursos marinhos, excepto o petróleo, pela coerente e integrada planificação da acção estratégica que justificam uma coordenação entre órgãos ministeriais com actividade marítima, já que nos defrontamos com um cenário de crise estrutural que exige resposta para «o que fazer» e «como agir» e daí a necessidade de ordenar o espaço marítimo. 77 COVID 19: impactos económicos e sociais em Angola: contribuição para debate. Vide, também, Potencial impacto socioeconómico da pandemia da COVID-19 uma análise sintética. PNUD Angola. N.º 2-21 (Abril, 2020). 78 The great lockdown: worst economic downturn since the great depression, in INTERNATIONAL MONETARY FUND – World economic outlook (International Monetary Fund). April 2020. Disponível para consulta em: https://www.imf.org/en/Publications/ WEO/Issues/2020/04/14/weo-april-2020. 79 A economia angolana é distinguida por três sectores: sector primário (agricultura, pescas e derivados, diamantes e outros e petróleo); sector secundário (indústria transformadora, construção e energia) e sector terciário (serviços mercantis), de acordo com BANCO NACIONAL DE ANGOLA – Relatório Anual e Contas 2018, p. 13. Disponível para consulta em: https://www.bna.ao/uploads/%7B490f344a-dce2-4be2-a749-a125996dbf65%7D.pdf. 51 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO 10. Porquê planear e ordenar o espaço marítimo? Actualmente, uma das prioridades mundiais é o ordenamento das actividades que ocorrem no mar; vários são os países que se preocupam com o ordenamento do espaço marinho sob sua jurisdição. Logo, é chegada a hora de Angola velar pela defesa das zonas marítimas, no intuito de rentabilizar o bem comum, através da gestão das actividades humanas que ocorrem no mar. O Estado exerce jurisdição e direitos de soberania em matéria de conservação, exploração e aproveitamento dos recursos naturais, biológicos e não biológicos, na zona contínua, na zona económica exclusiva e na plataforma continental, ou seja, este poder constitui uma oportunidade para meditar sobre a gestão destes recursos e nas vantagens estratégicas que estes trazem para a sua valorização económica, social e ambiental. Assim, no espírito de estabelecer uma verdadeira «política para o mar», que determina a extensão dos espaços marítimos sob jurisdição nacionais e que define os poderes que o Estado angolano neles deva exercer, foi promulgada a Lei n.º 14/10, de 14 de Julho (Lei dos Espaços Marítimos). Todavia, para que a acção «política para o mar» resulte eficaz é necessário delinear estratégias organizadas em torno de clusters produtores de riqueza, que potenciarão a indústria e os serviços virados para determinados sectores, como, por exemplo, para o turismo, telecomunicações, tecnologia, energias renováveis, aquicultura, pesca, transporte marítimo, e em clusters de conhecimento. A planificação das actividades e exploração no mar parece-nos ser a via possível para que Angola, que vive uma crise económica e financeira, olhe para o mar como a sua «reserva estratégica», cuja finalidade é gerar emprego, riqueza, aumentar a coesão social, promover o desenvolvimento económica sustentável e, sobretudo, ampliar o seu poder na interacção com outros Estados. O processo referido exigirá uma gestão eficaz, tendo em conta as especificidades de cada zona marítima, principalmente da Zona Económica Exclusiva e da Plataforma Continental, em conformidade com a densidade e natureza das utilizações marítimas, a vulnerabilidade ambiental, a estrutura administrativa e política, ou o modelo de governança, a dotação de capacidade empresarial, de tecnologia, de desenvolvimento sustentável e o sistema de fiscalização. A zona que for palco de utilizações marítimas 52 REGIME DA DELIMITAÇÃO DAS FRONTEIRAS MARÍTIMAS diversas e intensivas deve ser objecto de um processo de ordenamento mais pormenorizado do que uma zona em que são exercidas poucas actividades. Como já antes mencionado, a actividade marítima que mais contribui para o crescimento do PIB é a petrolífera, isto por falta de competitividade dos diferentes sectores de actividade no mar; este quadro poderá alterar-se se for aumentado o exponencial dos usos nos sectores da náutica de recreio, turismo náutico, pesca, transporte marítimo, etc. É tempo de empreender outra história e destino em Angola. O mar está à nossa espera para nos ajudar a mergulhar no projecto colectivo, feito desígnio nacional, que garanta o recurso ao ordenamento do espaço marítimo, a fim de favorecer o crescimento sustentável dos sectores marítimos. Para elaborar um plano de ordenamento do espaço marítimo, os instrumentos utilizados podem ser juridicamente vinculativos ou de natureza mais indicativa. Também, é essencial definir claramente quem fica vinculado pelo plano, i. e., agentes económicos, autoridades publicas ou público em geral80. A planificação do espaço marítimo será crucial do ponto de vista económico e jurídico, da previsibilidade e da transparência, levando a uma redução dos custos suportados pelo Estado, investidores e operadores. Além disso, sem ordenamento do espaço marítimo, é vã a pretensão de dirimir os conflitos de sobreposição de autoridade e de jurisdição entre os vários ministérios e agências governamentais responsáveis pelo domínio marítimo. Em suma, expostas as razões da necessidade de planificar e ordenar o espaço marítimo, seguidamente analisaremos os objectivos e perspectivas que trará este instrumento ao ordenamento jurídico interno. 80 Comissão Europeia – Ordenamento do espaço marítimo na UE – balanço e perspectivas. Disponível em: https://ec.europa.eu/maritimeaffairs/sites/maritimeaffairs/ files/docs/body/com_2010_771_brochure_pt.pdf. 53 Capítulo II Ordenamento do espaço marítimo SECÇÃO I Disposições gerais 11. Razão de ordem A análise que se segue focar-se-á nos pontos que julgamos de reflexão para o enquadramento da temática. A experiência estrangeira revela serem fundamentalmente dois os modos adoptados pelos Estados para legislarem em matéria de Ordenamento do Espaço Marítimo, i. e., criar uma nova legislação propositadamente para esse efeito, reinterpretando e alterando a legislação já existente, quer atinente ao ambiente ou ao ordenamento do espaço terrestre, estendendo ao espaço marítimo, quer aquela relativa à Gestão Integrada da Zona Costeira81. O Ordenamento do Espaço Marítimo, doravante abreviada por OEM, constitui uma tarefa fundamental do Estado que se concretiza através de políticas do mar, cuja implementação compete aos órgãos públicos 81 NORONHA, Francisco, O que há de novo no Mar? Primeiro comentário à Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional. Revista do Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente, n.º 34, Ano XVII (2014), pp. 23-44. 55 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO e privados de actuação no mar, por outras palavras, o OEM é um dos instrumentos transectoriais de apoio à execução da Estratégia Nacional para o Mar. Na plenitude do enquadramento legal-contextual alargado, cremos que se justificaria a promulgação desse instrumento, através da enunciação do quadro jus-internacional regulador dos assuntos do mar, desde logo da Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar, da Convenção sobre Diversidade Biológica, da Convenção sobre a Protecção do Património Cultural Subaquático, da Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios, e da Estratégia Marítima Integrada de África 2050. No plano interno, conveniente seria chamar à colação, pelo menos a Lei n.º 14/10, de 14 de Julho, a Lei do Espaço Marítimo, a Lei n.º 6-A/04, de 8 de Outubro, a Lei dos Recursos Biológicos Aquáticos e a Lei n.º 6/02, de 21 de Junho, Lei da Água. Um dos objectivos do OEM será identificar e encorajar utilizações múltiplas, considerando as alterações climáticas e de acordo com as legislações existente; tendo como objectivo a congregação e integração de várias abordagens do mar (ecossistema, biodiversidade e meio ambiente) num único diploma estratégico no âmbito do crescimento azul. 12. Reflexões sobre o ordenamento do espaço marítimo Em Angola, o ordenamento do espaço marítimo é tema que ainda não mereceu reflexão, nem integrada no Direito. Em todo o caso, o enquadramento jurídico desta matéria está cada vez mais na ordem do dia, nos países mais conscientes e mais exploradores da sua própria economia azul. É certo que o interesse de alguns Estados pelo ordenamento do espaço marítimo cresce cada vez mais, porém, enquanto área científica, esse ordenamento tem-se desenvolvido à margem do Direito e das ciências voltadas para a terra82, o que se justifica por o ordenamento do espaço marítimo ter nascido no seio da área científica voltada para o mar (por exemplo, a engenharia ambiental, a biologia marinha) com a preocupação 82 Aqui reforça o nosso entendimento quanto à terminologia Economia no Mar ou Economia do Mar. 56 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO fundamental de preservar e proteger os recursos marinhos da crescente procura pelos agentes económicos83. Dada as circunstâncias da sua origem, a planificação do espaço marítimo deve contar com especialistas em assuntos do mar, mas, também, precisará de quem saiba congregar todas essas áreas científicas, daí a integração do ordenamento do espaço marítimo no Direito. Sublinha Joana Albernaz Delgado que não só tal integração no Direito vai assentando num quadro jurídico que nunca se preocupou satisfatoriamente com a uniformização terminológica ao nível do espaço marítimo, proliferando conceitos variadíssimos que agravam a insegurança de uma matéria que já por si é aflorada numa pluralidade de disposições e de instrumentos normativos, como também as cautelas associadas à relação com o ordenamento terrestre têm criado incertezas quanto ao modo mais eficaz e adequado de trazer o ordenamento do mar para o Direito, identificando-se formas muito diferentes de absorção do ordenamento do espaço marítimo nos vários ordenamentos jurídicos84. Relativamente aos objectivos para orientar o OEM, entende-se que deverá ser encarado como um processo que começa com um acordo sobre os objectivos estratégicos, que são, em seguida, mais detalhados sob forma de objectivos operacionais, i. e., claramente mensuráveis e quantificáveis, numa perspectiva a longo prazo e orientada para o futuro. A planificação deverá ter presente a dimensão da orla marítima nacional no seu todo num único quadro de ordenamento85. 83 Vide DELGADO, Joana Albernaz, Histórias da terra e do mar. In GARCIA, Maria da Glória [et al.] (coord.) – Direito do Mar: novas perspectivas, p. 160; bem como, RIBEIRO, Marta Chantal – A protecção da biodiversidade marinha através de áreas protegidas nos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição do Estado: discussões e soluções jurídicas contemporâneas – o caso português, p. 470 ss.; e ainda NORONHA, Francisco – O ordenamento do espaço marítimo – para o corte com uma visão terrestrialmente centrada do ordenamento do território, p. 59 s. 84 DELGADO, Joana Albernaz, op. cit., p. 162 s.; e ainda CORREIA, Fernando Alves – Linhas gerais do ordenamento e gestão da zona costeira em Portugal. Revista de Legislação e de Jurisprudência, n.º 3956 (2009), pp. 252 ss. 85 Comissão Europeia – Ordenamento do espaço marítimo na UE – balanço e perspectivas. Disponível para consulta em: https://ec.europa.eu/maritimeaffairs/sites/ maritimeaffairs/files/docs/body/com_2010_771_brochure_pt.pdf. 57 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Com as inúmeras actividades a desenvolver nas águas oceânicas nacionais acrescido daquelas que cada dia se descobrem e reinventam, hoje, cada vez mais, é visível os conflitos resultantes do aproveitamento e exploração dos recursos, destarte a questão da planificação e do OEM deve assumir um papel central para o Estado. O Estado angolano está consciente de que os problemas relacionados com a gestão das utilizações do espaço marítimo estão estritamente interligados, considerados como um todo86. Porém, sem a planificação e ordenação do espaço oceânico, esta gestão ficará circunscrita a uma abordagem licenciadora avulsa, longe de qualquer linha orientadora para melhor distribuição dos usos e para a mais eficaz e justa resolução dos conflitos87. Dentre outras razões, a crescente relevância do espaço marítimo a nível mundial, tem que ver, na opinião de António Rebelo Duarte com a potencial instabilidade que decorre do chamado resource stress, visto como uma combinação de stresses, nomeadamente hídrico, económico, político e democrático, associados a um explosivo potencial de conflitualidade, com guerras decorrentes da escassez de matérias-primas e de outros recursos vitais e das induzidas guerras imigratórias, a que não serão estranhas as alterações climáticas e o aquecimento global já hoje conhecido como multiplicador de ameaças88. O ordenamento do espaço oceânico constituirá a evolução lógica e a estruturação das obrigações e da utilização dos direitos concedidos ao abrigo da CNUDM, assim como permitirá a todos os clusters e hubs falar a uma só voz e tomar um só registo no posicionamento que se quer assumir perante o mar89. A par de outras ferramentas, o OME terá o seu lugar de excelência na forma eficaz e harmoniosa de suplantar os inevitáveis desacordos e impasses a um nível acima de vários sectores implicados nos interesses do mar, por isso, a sua abordagem vai além da perspectiva 86 Terceiro parágrafo do preâmbulo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, Angola subscreveu-a em 10 de Dezembro de 1982, e ratificou-a no dia 5 de Dezembro de 1990. 87 DELGADO, Joana Albernaz, op. cit., p. 158. 88 DUARTE, António C. Rebelo, op. cit., p. 4. 89 DELGADO, Joana Albernaz, op. cit., p. 158. Igualmente, ponto 7 da Diretiva 2014/89/ EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Julho de 2014. 58 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO sectorial, do conhecimento científico, das biotecnologias, do turismo, da pesca, das energias renováveis e da aquicultura. Portanto, o mar tornou-se tão desejado, tão disputado ou tão desafiado nos dias actuais90, na medida em que deixa de ser visto como objecto de utilização tradicional dispersa e desprovida de qualquer estratégia e passa como o último espaço do planeta a permitir descoberta de novas fronteiras nacionais. 13 O mar propriedade exclusiva do Estado O mar, como recurso natural, constituindo parte do domínio público hídrico, é propriedade do Estado angolano (art.º 10.º, da Lei n. 9/04 e art.º 5.º, n. 1, conjugado com os artigos 2.º, 4.º e anexo da Lei n. 6/02). O direito ao uso deste recurso é concedido de modo a garantir a sua preservação e gestão em benefício do interesse público. A propriedade estatal dos recursos naturais é um princípio que vem desde as primeiras versões da Lei Constitucional de 11 de Novembro de 1975, cujo artigo 11.º proclamava que «todos os recursos naturais existentes no solo e subsolo, nas águas territoriais, na plataforma continental e no espaço aéreo são propriedade do Estado que determinará as condições do seu aproveitamento e utilização». Como se vê a actual redacção do artigo 16.º da Constituição, repete inteiramente aquela letra original com pequenos acréscimos, conjugada com a alínea g) da Lei n.º 3/04, de 25 de Junho. De igual forma, este princípio vem firmado no Direito Internacional, constando de documentos como a Resolução da Assembleia Geral da ONU 1803 (XVII), de 14 de Dezembro de 1962, a Declaração de Estocolmo, a Declaração sobre a instauração de uma Nova Ordem Económica Internacional (aprovada pela Resolução da Assembleia Geral da ONU 3201 (S.VI), de 1 de Maio de 1974) e a Carta dos Direitos e Deveres Económicos dos Estados (aprovada pela Resolução da Assembleia Geral da ONU 281 (XXIX), de 12 de Dezembro de 1974)91. DELGADO, Joana Albernaz , op. cit., p. 156. Vide o nosso tema de dissertação em Direito em Prática Jurídica, A transferência dos bens imóveis para o domínio privado do Estado após a independência de Angola, Lisboa, Maio, 2019, p. 68. 90 91 59 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Percebe-se que a ratio deste princípio visa essencialmente ordenar o acesso equitativo e equilibrado dos particulares aos recursos naturais; todavia, o mar foi, sempre, visto como um recurso para gerir e não para ordenar. Relativamente ao seu regime jurídico, entendemos que a propriedade do Estado sobre recursos naturais não é distinta da propriedade originária da terra, diferenciando apenas na integração do domínio do Estado, tendo natureza de propriedade pública ou de domínio público não podendo ser transmissível a particulares, salvo o direito de exploração (n.ºs 2 e 3 do art.º 10.º da Lei de Terra, art.º 5.º da Lei n.º 10/04); contrariamente a este regime são os recursos mineiros que se integram no domínio privado do Estado, transmissíveis em vida ou por morte do seu titular (art.ºs 42.º e 48.º do Código Mineiro). Na opinião de Morais Guerra, a característica desta propriedade do Estado tem por «objecto os recursos naturais do solo e do subsolo, parecendo-nos mais de natureza público-dominal, é deveras importante pela sua repercussão no objecto dos direitos fundiários concedidos ao abrigo da [Lei n.º 9/04]92». O legislador constituinte, de forma criativa, decretou que a «terra constitui propriedade originária do Estado» (1.ª parte do n.º 1, do art.º 15.º e n.º 1, do art.º 98.º da Constituição e o art.º 5.º da LT), olvidando referenciar outros elementos que compreendem a definição do território nacional, tais como o espaço hídrico e o espaço aéreo. Esta exclusão encontra explicação no n.º 2, do art.º 202.º do Código Civil, que distingue coisas «no comércio» e «fora do comércio». Estatui este preceito que «consideram-se fora do comércio aquelas que não podem ser objecto do direito privado e as que são, por sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual», e as «coisas comerciáveis aquelas que são objecto de direito privado». Sobre esta controvérsia, a doutrina clássica civilística e administrativa discutiram a respeito e a solução apresentada oferece interesse teórico. Assim, para o civilista Cabral de Moncada, as coisas públicas «são inalienáveis e imprescritíveis, mas esta inalienabilidade e imprescritibilidade não são suas características essenciais (pois outras coisas há que estão in comércio e que também as possuem); são mera consequência da 92 GUERRA, José Armando Morais – Temas de direito fundiário e de direito do ordenamento territorial, p. 97. 60 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO sua natureza jurídica especial de incomerciáveis». Continuando com a citação, diz este civilista que «as coisas públicas são aquelas de que a todos é lícito aproveitar-se pelo uso; dito doutro modo, as coisas públicas são aquelas que, estando apropriadas pelo Estado, estão simultaneamente à disposição de todos, enquanto que as comuns se acham apenas postas à utilização dos indivíduos compreendidos numa certa circunscrição administrativa»93. Por seu turno, o administrativista Marcello Caetano defende que «há coisas públicas que podem ser objecto de grande número de direitos e outras quase absolutamente incomerciáveis. É assim que nem sempre o domínio público corresponde a um direito de propriedade pública. O domínio administrativo pode ir até à apropriação colectiva, mas não se identifica necessariamente com ela»94. Nesta conformidade, o mar integra o domínio público do Estado, compreendendo a característica da inalienabilidade, imprescritível e impenhorável e incomerciável (arts. 95.º da CRA e 13.º da Lei n.º 18/10, de 6 de Agosto, Lei do Património Público), sendo regido pelo direito público e excluindo a possibilidade da aplicação direito privado, principalmente, o direito das coisas. O mesmo não sucede com as terras, que embora sejam propriedade originária do Estado, está sujeito ao regime do direito privada. Todavia, a transferência da propriedade dos recursos vivos e não vivos marinhos verifica-se sempre após a sua extracção no espaço marítimo. Serve de exemplo, a transferência da propriedade do petróleo produzido situa-se sempre fora ou para além da boca do poço, devendo o ponto de contagem do petróleo produzido proceder o ponto de transferência da propriedade (art.º 82.º da Lei n.º 10/04, de 12 de Novembro, Lei das Actividades Petrolíferas). 14. Regulamentação do espaço marítimo nacional A composição da organização do território, estabelecida no art.º 5.º da Constituição, não se preocupa em descrever as várias dimensões do 93 94 MONCADA, Luís Cabral de – Lições direito civil, pp. 95 e 104. CAETANO, Marcello – Manual de Direito Administrativo. Tomo II, p. 827. 61 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO território, sendo certo que a definição do território nacional compreende o espaço terrestre, o espaço hídrico e o espaço aéreo95. Em conformidade com os n.ºs 2 e 3, do art.º 3.º da Lei magna conjugado com a Lei n.º 14/10, de 14 de Julho, Lei dos Espaços Marítimos (LEM), a regularização da territorialidade do mar está dividida em três espaços marítimos: os espaços marítimos submetidos à soberania total do Estado angolano; os espaços marítimos sujeitados à jurisdição e à soberania do Estado; e espaço internacional. Os limites das diferentes zonas oceânicas sobre as quais Angola exerce direitos de soberania e de jurisdição estão previstas na Lei n.º 14/10, de 14 de Julho, e estende a sua aplicação para além do alto mar (art.º 2.º). Esta opção normativa contraria a disposição da CNUDM – repara-se que a Convenção não confere aos Estados costeiros poderes além do alto mar, pela razão de, nesta zona, vigorar o princípio do património comum da humanidade. Por outro lado, a Convenção apenas estabelece a extensão da plataforma continental além das 200 milhas marítimas (n.º 4, do art.º 76.º), pese, embora, a Lei em questão não identificar a plataforma continental para além das 200 milhas. É relevante referir que, juridicamente, a plataforma continental96 coexiste com a zona económica exclusiva até às 200 milhas marítimas e para além desta distância com o alto mar; neste último, ao Estado costeiro é-lhe atribuído o direito de exploração e aproveitamento dos recursos da plataforma continental e a obrigação de salvaguardar as liberdades do alto mar (arts. 77.º, n.º 1 e 87.º da CNUDM). De volta à territorialidade do mar, no plano internacional, é estabelecido que, pela ordem jurídica, se facilite as comunicações e se promova os usos pacíficos dos mares e oceanos, a utilização equitativa e eficiente dos seus recursos, a conservação dos recursos vivos e o estudo, a protecção e a preservação do meio ambiente; e que, pela ordem económica justa e equitativa, se tenha em conta os interesses e as necessidades da 95 MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui – Constituição portuguesa anotada. Tomo I, p. 131. 96 Sobre esta matéria vide BECKER-WEINBERG, Vasco – Plataforma Continental. In MENDES, Nuno Canas; COUTINHO, Francisco Pereira (org.) – Enciclopédia das Relações Internacionais, pp. 391-395. 62 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO humanidade em geral e, em particular, os interesses e necessidades dos países em desenvolvimento, quer costeiros, quer sem litoral97. Aludida a facilidade de comunicação, é patente na busca de soluções conjunta de regulamentação dos problemas do espaço oceânico que estes estão estritamente inter-relacionados98. Daqui resulta o modelo complexo e diversificado da regulação jurídico-internacional sobre o mar, que incorporou regras de fundamento costumeiro, como assim entende Fernando Loureiro Bastos, afirmando que «o estatuto jurídico-internacional do mar está organizado de forma a existir uma conciliação entre os poderes e os deveres dos diversos Estados e dos navios com a sua nacionalidade»99. A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar sistematizou a delimitação dos espaços marítimos, cada um com o seu próprio regime jurídico a partir de características implícitas. A mesma estrutura normativa gramatical e teleológica foi transposta para a LEM. Analisaremos, de seguida, os tipos distintos de espaços marítimos (sem termos em conta as motivações políticas e económicas) de acordo com a Constituição e com a LEM: a) Os espaços marítimos submetidos à soberania total do Estado angolano incluem as águas interiores, mar territorial, bem como o espaço aéreo subjacente, o solo e o subsolo, o fundo marinho e os leitos correspondentes. A soberania exercida nas águas interiores é idêntica à exercida sobre a parte emersa da crusta terrestre (art.º 18.º da LEM), já a soberania exercida sobre o mar territorial está sujeita as limitações decorrentes da CNUDM e demais normas do direito internacional (art.º 24.º da LEM), nomeadamente: direito de passagem inofensiva de navios com a nacionalidade de qualquer Estado; e direito de passagem em trânsito (arts. 29 da LEM e 17.º seguintes da CNUDM); 97 Parágrafos quarto e quinto do preâmbulo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, concluída em Montego Bay, Jamaica, em 10 de Dezembro de 1982. 98 Idem. 99 BASTOS, Fernando Loureiro – Direito Internacional do Mar: guia de estudo, p. 88. Para Wagner Menezes, «os temas que estão disciplinados na Convenção são comummente estudados na estrutura doutrinária compreendida como Direito do Mar» (O Direito do Mar, p. 84). 63 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO b) Os espaços marítimos sujeitados à jurisdição e à soberania do Estado abrangem a zona contínua, zona económica exclusiva e na plataforma continental – na primeira o Estado angolano pode exercer poderes de fiscalização necessários para evitar infracções às leis e aos regulamentos aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários; na zona económica exclusiva, o Estado angolano exerce direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais vivos e não vivos existentes na coluna de água abrangida pela zona, bem como sobre as potencialidades energéticas dessa coluna de água e da camada aérea que sobre ela assenta, incluindo direitos de jurisdição sobre a utilização e colocação de ilhas artificiais, instalações e estruturas, investigação científica marinha e a criação de reservas naturais para fins de protecção e preservação do meio marinho; quanto à plataforma continental, o Estado exerce direitos dominiais próprios e de raiz sobre a própria plataforma, com o seu leito e subsolo, recursos vivos e não vivos nela existentes (arts. 31.º, 36.º e 47.º, n.º 1, da LEM, conjugado com artigos 33.º, n.º 1, 56.º, n.º 1 e 77.º, n.º 1 da CNUDM). Tendo em consideração a definição de soberania estatuída no n.º 1, do art.º 2.º da CNUDM, que dita que «a soberania do estado costeiro estende-se além do seu território e das águas interiores […], a uma zona de mar adjacente pelo nome de mar territorial» e que a mesma Convenção atribui direitos de soberania na zona económica exclusiva, coloca-se a seguinte questão: tratar-se-á do mesmo poder de soberania conferido às águas interiores e mar territorial? Responde o art.º 55.º do mesmo diploma que «A zona económica exclusiva é uma zona situada além do mar territorial e a este adjacente, sujeito ao regime jurídico específico estabelecido na presente Parte, segundo o qual os direitos a jurisdição do Estado costeiro e os direitos e liberdades dos demais Estados são regidos pelas disposições pertinentes da presente Convenção». De igual modo, o n.º 1, do art.º 77.º da CNUDM estabelece que «O Estado costeiro exerce direitos de soberania sobre a plataforma continental para efeitos de exploração aproveitamento dos seus recursos naturais». Por seu turno, o n.º 1 do art.º 40, combinado com o n.º 1 do art.º 38.º da LEM, estatui que «O Estado angolano, para a prossecução dos 64 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO direitos de soberania que exerce na sua zona económica exclusiva, elabora, nos termos das alíneas a) a j) do n.º 4, do artigo 62.º da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, leis e regulamentos que fixam regras de capturas permitidas dos recursos vivos na zona económica exclusiva»; sobre a plataforma continental, o Estado angolano exerce poderes de soberania finalisticamente limitados para efeitos de exploração e de aproveitamento dos seus recursos naturais (1, do art.º 49.º da LEM). Com essas justificações, podemos afirmar que o exercício dos direitos de soberania do Estado angolano nos espaços marítimos das águas interiores, mar territorial, zona económica exclusiva e na plataforma continental não são equivalentes -- pode dizer-se que, nas duas primeiras zonas, o Estado exerce o poder de soberania absoluta e, nas duas últimas, poderes de soberania relativa. A esse respeito, defende Fernando Loureiro Bastos que «é preferível a utilização do conceito de jurisdição ( jurisdiction), mesmo quando são expressamente atribuídos “direitos de soberania” relativamente à exploração de recursos naturais»(100); c) Espaço internacional é o alto mar; a Convenção concede-lhe a Parte VII (arts. 86.º a 120.º) e trata este espaço como todas as zonas/ /partes do mar não incluídas na zona económica exclusiva, o mar territorial ou nas águas interiores de um Estado, nem nas águas arquipelágicas de um Estado Arquipelágico aplica o estatuto jurídico-internacional, excepto as liberdades de que gozam todos os Estados na zona económica, conforme art.º 58.º da CNUDM. Neste sentido, determina o n.º 1, do art.º 58.º que «Na zona económica exclusiva, todos os Estados, quer costeiros quer em litoral, gozam, nos termos das disposições da presente Convenção, das liberdades de navegação e sobrevoo e de colocação de cabos e ductos submarinos, a que se refere o artigo 87.º, bem como de outros usos do mar internacionalmente lícitos, relacionados com as referidas liberdades, tais como os ligados à operação de navios, aeronaves, cabos e ductos submarinos e compatíveis com as demais disposições da presente Convenção». Desta feita, a aplicação do regime deste 100 Idem, p. 90. 65 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO espaço marítimo é a mesma da zona económica exclusiva, salvo restrições impostas na parte final do art.º 86.º. Actualmente, o entendimento da impossível subordinação do alto mar ao Direito recebe objecções, dentre alguns autores, aduzem Luís da Costa Diogo e Rui Januário, que existe a possibilidade de [Estado] exercer o poder no alto mar desde que se promova a correcta coordenação das suas utilizações. O uso público será, desta forma, o resultado de um compromisso entre o poder dos Estados (sobre cada vez maiores parcelas de mar) e a necessária manutenção da liberdade no alto mar, o qual como, bem do domínio público internacional, deverá conferir utilidades comuns a toda a Comunidade, o que pressuporá a existência de um princípio de igualdade entre Estados101. Conforme apresentado, a Convenção consolidou os temas pontuais sobre o mar, tipificando e estabelecendo o regime jurídico de cada espaço oceânico a ser observado pelos Estados. 15. Articulação do ordenamento marítimo e terrestre Os instrumentos de ordenamento marítimo e do ordenamento do território articular-se-ão sempre que estes incidam nas políticas que têm por objecto o espaço biofísico, constituído pelo conjunto dos solos urbanos e rurais, do subsolo, dos interiores, do mar territorial, da plataforma continental, bem como da zona económica exclusiva, enquanto elementos ou recursos naturais contidos no interior das fronteiras territoriais nacionais com relevo para a execução dos respectivos instrumentos102. Apesar destes instrumentos incorporarem o conceito do ordenamento territorial, todavia, a abordagem do ordenamento marítimo é diferente do 101 DIOGO, Luís Gomes da Costa; JANUÁRIO, Rui Justino – Direito Internacional do Mar e temas de Direito Marítimo, p. 80. 102 Artigo 1.º e alínea i) do art.º 2.º, da Lei n.º 3/04, de 25 de Junho, Lei do Ordenamento do Território e Urbanismo. 66 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO ordenamento terrestre, isto pela diversidade das zonas marítimas e das utilizações humanas, a exclusão de direitos de propriedade individuais no espaço oceânico, e pelas diferenças nas organizações administrativas e nos sistemas jurídicos que dão origem a uma grande variedade de estratégias, passando por políticas de gestão integrada da zona costeira103. No entanto, acoitando a noção da plataforma continental – o princípio de “a terra domina o mar” – quando refere que «compreende todo o leito e o subsolo das áreas submarinas que se estendem além do seu mar territorial, em toda a extensão do prolongamento natural do seu território terrestre, até ao bordo exterior da margem continental […]»104, e atendendo às disposições da Lei n.º 3/04, de 25 de Junho, Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo, concluir-se-á, com exactidão, que o legislador adoptou pela interpretação e implementação deste último diploma, estendendo-o ao espaço marítimo. A primeira linha de constatação é feita nos termos da alínea a) do art.º 2.º, da Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo (LOTU), ao decretar que «as águas interiores, plataforma continental, mar territorial e zona económica exclusiva que, como recursos naturais passíveis de uso e ocupação, relevem para os fins do ordenamento do território». Conforme acima aduzido, a noção do território alberga os elementos espaciais terra, mar e ar, portanto, a lei em referência apenas equipara a terra ao território, definindo-o como «espaço biofísico constituído pelo conjunto dos solos urbanos e rurais, do subsolo, das águas interiores, do mar territorial, da plataforma continental, bem como da zona económica exclusiva […]» (al. i), do art.º 2.º). Embora o legislador pudesse ter abrangido o tratamento do ordenamento do espaço marítimo e do território e do urbanismo na Lei n.º 3/04, o certo é que este diploma se ocupa da organização e gestão do espaço biofísico territorial, urbano e rural, em razão do conteúdo material e os objectivos visados e a política de acções que os concretizam, valorizando os solos, ordenando-os, infra-estruturando-os para uso geral e colectivo, 103 Comissão Europeia – Ordenamento do espaço marítimo na UE – balanço e perspectivas. Disponível para consulta em: https://ec.europa.eu/maritimeaffairs/sites/ maritimeaffairs/files/docs/body/com_2010_771_brochure_pt.pdf, p. 7. 104 Primeira parte do artigo 76.º da CNUDM. 67 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO como formas sistemáticas de intervenção do Estado e das autarquias locais no ordenamento do território105. Importa sublinhar que a lei em questão visa tratar exclusivamente o desenvolvimento do solo. Neste contexto, torna-se claro que o espaço marítimo não tem sido tomado como território na concepção global da problemática do ordenamento territorial. Certamente, porque muitos factores contribuíram para a falta de afeição do ordenamento do território ao mar, desde já, por o espaço marítimo não ser dominável como o espaço terrestre e por não ser susceptível de ocupação humana para fins de fixação habitacional. Em todo o caso, a assunção do mar enquanto parte do território para efeitos de ordenamento regista-se com o reconhecimento da inter-relação dos problemas do espaço marítimo e com as regras de delimitação do espaço marítimo passíveis de poderes de soberania e/ou de jurisdição, de acordo com a CNUDM. Daqui, podemos perspectivar o ordenamento do espaço marítimo como parte imprescindível do ordenamento do território ao lado do ordenamento do espaço terrestre106. Todavia, a necessidade de articular ambos os ordenamentos justifica-se na organização do território do Estado e nos instrumentos de ordenamento do território e do urbanismo que visam proteger os recursos hídricos, zonas ribeirinhas e a orla costeira107, mormente, esta última zona onde se concentram a maioria das actividades económicas marítimas propensas a conflitos. Por fim, concernente à gestão de uso e utilização, estes ordenamentos divergirão na medida em que o espaço terrestre é um processo integrado da organização do espaço biofísico, tendo como objectivo o uso e transformação do território de acordo com as capacidades, vocações, permanência de equilíbrio biológico e de estabilidade geológica, numa perspectiva de manutenção e aumento da sua capacidade de suporte à vida [al. d) do anexo I, do Decreto n.º 4/01, de 2 de Fevereiro], ao passo que o OEM deverá 105 Segundo parágrafo do preâmbulo e artigo 3.º da Lei n.º 3/04, de 25 de Junho, Lei do Ordenamento do Território e Urbanismo. 106 No mesmo sentido, NORONHA, Francisco – O ordenamento do espaço marítimo – para o corte com uma visão terrestrialmente centrada do ordenamento do território, p. 34. 107 Parte final do n.º 2, do art.º 1.º e al. g) do n.º 1, do art.º 4.º da Lei n.º 3/04, de 25 de Junho. 68 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO ser visto como o processo pelo qual as autoridades públicas analisam e organizam a forma como as actividades humanas se distribuem no espaço e no tempo nas zonas marinhas para alcançar objectivos ecológicos, económicos e sociais108. SECÇÃO II Domínio público marítimo 16. Razão de ordem O Domínio Público Marítimo (DPM) é apenas uma das modalidades do domínio público hídrico, juntamente com o Domínio Público Lacustre e Fluvial e Domínio Público das Restantes Águas. Como a própria designação indica, domínio público hídrico diz respeito às águas públicas, com os respectivos leitos e margens, zona terrestre de protecção e faixa máxima de protecção, atento à natureza da sua utilidade e das funções que desempenha. No entanto, o DPM não se restringe única e exclusivamente às águas dominiais, porque havendo conexão entre estas águas, os leitos e as margens podem estender o âmbito deste domínio. Considera-se do Domínio Público Marítimo as águas marítimas costeiras e interiores e respectivos leitos e margens, que correspondem a uma faixa marítima de protecção que tem como limite máximo a batimétrica 30 metros do zero hidrográfico, bem como o uso privativo de parcelas de terrenos destinados à implantação de infra-estrutura e equipamentos de apoio não só à utilização das praias, mas a toda a orla costeira, abrangendo uma faixa de protecção terrestre com a largura máxima de 500 metros109. Ordenamento do Espaço Marítimo na EU, op. cit., p. 3. A definição do domínio público marítimo estava estabelecida, implicitamente, na conjugação do segundo parágrafo do preâmbulo e art.º 3.º do Decreto n.º 4/01, de 2 de Fevereiro. Todavia, este diploma foi revogado pelo Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto. 108 109 69 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Por outro lado, o legislador ordinário dita que os terrenos do domínio público marítimo destinados à implantação de infra-estruturas e equipamentos de apoio não só à utilização das praias, mas a toda orla costeira, bem como à faixa de protecção terrestre com a largura máxima de 500 metros, são desafectados do domínio público transferido para o domínio privado dos Governos Provinciais» (n.ºs 1 e 2, art.º 2.º e art.º 3.º, do Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto). O n.º 1, do art.º 95.º da Constituição e o art.º 14.º da Lei n.º 18/10, de 6 de Agosto de 2010, do Património Público, prescrevem os bens do domínio público110. Assim, integram no domínio público marítimo bens que estão estabelecidos nas alíneas a), b) e f) e als. a), b), c) e k), dos respectivos artigos. Todavia, esta enumeração não é um catálogo que seja taxativo porque a al. k), do art.º 95.º e a al. p) do art.º 14.º, de ambos os diplomas, mantêm uma cláusula aberta em matéria de bens dominiais ao preverem que possam ser classificados outros bens por via legislativa, e carecem de ser interpretados à luz dos conceitos do Direito Internacional do Mar tendo em conta as normas da CNUDM. 110 A doutrina clássica entendeu domínio público como «conjunto de bens que o estado aproveita para os seus fins usando de poderes de autoridade», ou seja, através do direito público» – Cfr. MOREIRA, Carlos – Do Domínio Público, pp. 124 e ss. Igualmente, existe outro autor que definiu como «conjunto das coisas públicas e os direitos públicos que à Administração competem sobre elas» – CAETANO, Marcello – Manual de Direito Administrativo. Tomo II, p. 815 –, aliando a «Noção de Coisa Pública» e o conceito de «domínio público». Nesta mesma obra, outras dimensões contribuem para a distinção do domínio público e domínio privado, tal como o domínio privado indisponível e disponível (pp. 894 s). Outra figura confundível com este instituto é a propriedade pública, a qual Marcello Caetano «alerta-nos para a circunstância, de em razão do critério da comerciabilidade de direito público, haver coisas públicas que podem ser objecto de um grande número de direitos e outras quase absolutamente incomerciáveis. É assim que nem sempre o domínio público corresponde a um direito de propriedade pública» (CAETANO, Marcello, op, cit. p. 827); as Ordenações Filipinas, L.º II, tit. XXVI, diferenciam a soberania com propriedade (aquela agora transplantada do rei para o povo), e que dava à coroa (agora ao Estado) o «domínio eminente» sobre o território, domínio que envolvia a faculdade de distribuir, pelos súbditos, as terras do seu património (agora do património da nação), e do qual decorriam múltiplas sujeições para os seus possuidores, como a do aproveitamento dos bens […]”, citado por PRETO, António Martinez Valadas – O regime de terras do Estado em Moçambiqu. Revista Jurídica de Macau , p. 36. Vide definições estatuídas no art.º 2.º da Lei n.º 18/10. 70 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO Por seu turno, o art.º 1.º, da Lei de Terras, define o que é o domínio público do Estado, integrando, por força das als. a) e e), do n.º 1, do art.º 29.º, da Lei n.º 9/04, de 9 de Novembro, Lei de Terras (LT) as águas interiores, o mar territorial, a plataforma continental, a zona económica exclusiva, os fundos marinhos contíguos, incluindo os recursos vivos e não vivos neles existentes, as praias e a orla costeira. Ainda de acordo com a referida Lei, «são havidos como terrenos reservados ou reservas os excluídos do regime geral de ocupação, uso ou fruição por pessoas singulares ou colectivas, em função da sua afectação, total ou parcial», à realização de fins especiais (art.º 27.º, n.º 1). Em função da sua afectação, são havidos como parte integrante das reservas parciais, por força da als. a), b) e c), do n.º 7, do art.º 27.º, da lei em análise, o leito das águas interiores, do mar territorial e da zona económica exclusiva, a plataforma continental e a faixa da orla marítima e do contorno de ilhéus, baías e estuários, medida da linha das máximas preia-mares, observando uma faixa de protecção para o interior do território, por permitirem todas as formas de ocupação ou uso que não colidam com os fins previstos no respectivo diploma constitutivo. Quanto à definição das áreas integrantes do domínio público marítimo, designadas como zonas marítimo-terrestres, esta é feita casuisticamente, estando acometida ao governo a competência para constituir reservas e definir a sua extensão (n.º 2, do art.º 27.º da LT). Um aspecto a ter em atenção é o facto de, nos termos da Constituição e da Lei n.º 18/10, o legislador excluir a coluna de água e a superfície das águas da Zona Económica Exclusiva de fazer parte do domínio público marítimo, conferindo apenas esta qualidade aos recursos naturais biológico e não biológico aí existente, conforme redacção da al. b), do art.º 95.º da Constituição e al. b), do art.º 14.º, da Lei n.º 18/10, e al. a), do art.º 36.º da Lei n.º 14/10111. 111 A mesma constatação, segundo Francisco Noronha, faz a redacção do n.º 1, do art.º 2.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril, que estabelece as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Português, NORONHA, Francisco – O que há de novo no Mar? Primeiro comentário à Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional. Revista do Centro de Estudos de Direito do Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente, pp. 26-27. 71 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Por conseguinte, aqui colocaremos, com acuidade, as questões que apelam à política integrada dominial marítima, na perspectiva da sua valorização e salvaguarda dos bens marinhos, tendo como finalidade a gestão diligente, criteriosa, e uniforme dos assuntos do mar que servirá como suporte essencial a medidas político-governativas estruturais112. 17. Ordenamento do espaço marítimo como tarefa pública A circunstância do ordenamento do espaço marítimo se tratar de uma tarefa pública decorre do chamamento de princípios gerais, fundamentalmente de natureza biológica aquática, designadamente: os princípios do desenvolvimento sustentável, da conservação e utilização óptima dos recursos biológicos aquáticos, da prevenção, da precaução; da integração; da defesa dos recursos genéticos, da participação de todos os interessados; da coordenação institucional e da compatibilidade da política de gestão dos recursos biológicos aquáticos com as políticas de ordenamento do território, ambiental, de recursos hídricos e de exploração de outros recursos naturais no mar e nas águas continentais, da cooperação na gestão dos recursos partilhados, da responsabilização, do utilizador pagador, do poluidor pagador e da igualdade, da livre iniciativa económica, da defesa da concorrência, da protecção dos direitos de investidores (art.º 6.º, da Lei n.º 6-A/04, de 8 de Outubro, Lei dos Recursos Biológicos Aquáticos). A convocação destes princípios faz com que se deslumbre o traço da existência da tarefa pública ou da responsabilidade pública conforme assim entendemos. Além destes, o legislador, na Lei 5/98, de 19 de Junho, Lei de Bases do Ambiente, elencou princípios que nos dão a ideia da responsabilidade pública com o meio ambiente, tais como o princípio da formação e educação ambiental, do equilíbrio e o da unidade de gestão e acção (art.º 4.º). Já a perspectiva de natureza biológica remete-nos para uma abordagem ecossistemática que, assente na natureza complexa e dinâmica dos ecossistemas, propugne a protecção adequada do ambiente marinho, a coordenação institucional e compatibilidade da política de gestão dos 112 Parágrafo cinto do preâmbulo da Lei n.º 18/10, de 6 de Agosto, Lei do Património Público. 72 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO recursos, o uso racional e sustentável dos recursos biológicos aquáticos, do ambiente costeiro e ribeirinho, bem como a sua gestão integrada que, intimamente, vai ligar os princípios que regerão a gestão do ordenamento do espaço marítimo nacional (arts. 6.º, al. i), 8.º, al. a) e 63.º, al. e) da Lei dos Recursos Biológicos Aquáticos). Para tanto, a coordenação e compatibilização da política do ordenamento marítimo e da gestão dos recursos marinhos no espaço nacional devem ser articuladas com outras políticas públicas sectoriais, especialmente com o ordenamento do espaço terrestre e medidas ambientais (art.º 22.º da Lei n.º 3/04, de 25 de Junho, art.º 16.º, da Lei de Terras, art.º 5.º da Lei 5/98 e al. f), do arts. 9.º e 10.º, da Lei n.º 6/02, de 21 de Junho, Lei de Águas). A marca da actividade pública resulta ainda de outros objectivos consagrados no art.º 63.º, da Lei n.º 6-A/04, de 8 de Outubro – para alcançar estes objectivos tem de existir um regime público e também um aparelho público, competindo neste caso, à administração pública alcançar estes fins de interesse público. A questão que se coloca é saber qual a entidade competente para a realização destes mesmos objectivos; embora a competência primordial pertença ao executivo, entende-se, porém, que muitos destes objectivos impõe ou requerem a intervenção de entidades públicas de base territorial, nomeadamente do Estado (através dos governo provinciais)113 e das autarquias locais pelas amplas atribuições que dispõem sobre o território114. Devido aos problemas constatados nos departamentos ministeriais, dentre os quais fusão sem conexão de atribuição (agricultura com o mar), dificuldades financeiras e carência de recursos humanos com formação para o mar, somos pela criação de uma agência nacional com representação de todas as secções ministeriais com actividade ligada ao mar, a fim de responder aos assuntos oceânicos. 113 Nos termos do parágrafo cinco do Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto, incumbe os Governos Províncias enquanto autoridades administrativa de exercerem a gestão e o controlo dos terrenos urbanísticos do parâmetro da orla costeira. 114 A primeira eleição autárquica está agendada para este ano, mas devido à recessão económica e orçamental provocada pela pandemia da Covid-19, é mais do que provável que seja remarcada para próximo ano. 73 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Outra questão que deve ser esclarecida, por haver discórdia doutrinária, é a distinção entre a valorização e a salvaguarda dos recursos marinhos, por se entender que uma coisa é a defesa do bem com suas características, outra completamente diferente é a valorização que não seja rentabilização económica, melhor dito, acrescentar valor não é necessariamente retirar um valor económico do bem115. Na delimitação objectiva do OEM excluir-se-á do âmbito da sua aplicação as áreas militares e outras que, em caso de justificado interesse nacional, venham a ser definidas (n.º 2, do art.º 1, do Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto); não obstante, o legislador pode evidenciar actividades administrativas em ordem a lograr a promoção da exploração económica sustentável, racional e eficiente dos recursos marinhos e dos serviços dos ecossistemas, a preservação, protecção e recuperação dos valores naturais e dos ecossistemas, a segurança jurídica e a transparência dos procedimentos de atribuição dos títulos de utilização privativa, bem como prevenir e minimizar eventuais conflitos entre usos e actividades. Sem dúvida que a actividade de promoção de políticas activas de ordenamento do espaço marítimo é uma tarefa pública que compete ao Estado e às autarquias locais, portanto, em nossa opinião, deve-se criar, o quanto antes, condições para inclusão dos planos de ordenamento da orla costeira, que, durante quase uma década, tem sido disciplinado pelos planos especiais de ordenamento do território e do urbanismo e pela lei de terras116, no ordenamento do espaço marítimo. 18. A relação entre o ordenamento do espaço marítimo e o plano de ordenamento da orla costeira O plano de ordenamento da orla costeira é encarado como um instrumento regulamentar de natureza administrativa que congrega medidas de ordenamento dos diferentes usos e actividades específicas da orla costeira, de valorização e qualificação das praias, orientando o desenvolvimento de Partilha a mesma opinião: MIRANDA, João – Ordenamento do Espaço Marítimo. Primeiro e segundo parágrafos do preâmbulo do Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto. 115 116 74 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO actividades aí a implementar, regulando o uso balnear e conservando os patrimónios biológicos e geológicos existentes na orla costeira. Importa sublinhar que não existe no ordenamento jurídico angolano um instrumento específico que regule o ordenamento da orla costeira, porque, revogada o Decreto n.º 4/01, de 2 de Fevereiro, nos termos do art.º 8.º do Decreto Presidencial n.º 232/11, esta matéria integrou-se no domínio privado dos Governos Provinciais e ficou sujeita ao regime da Lei de Terras e da Lei do Ordenamento do Território e Urbanismo (segundo parágrafo do preâmbulo e art.º 1, n.º 1 do citado diploma). Neste decreto, o legislador dissemina um conflito de interpretação e de aplicação ao estatuir que «são transferidos para o domínio privado dos Governos Provinciais, todos os direitos fundiários adquiridos sobre os terrenos compreendidos no perímetro da orla costeira» (artigo 4.º), quando, na verdade, as administrações provinciais, em representação do Estado, sempre foram titulares do domínio directo destes terrenos. Todavia, a incompreensão surge em saber-se quando é que a aquisição de uns dos direitos fundiários sobre terrenos da orla costeira se transfere para a titularidade dos Governos Provinciais: como transferir a ocupação ou uso havidos sobre os terrenos compreendidos no perímetro da orla costeira? Em resposta, o mesmo decreto estatui que «São respeitados, nos termos da legislação em vigor, os direitos fundiários constituídos sobre terrenos desafectados por títulos válidos das autoridades administrativas» (art.º 5.º). Por sua vez, estabelece a Lei de Terras que o Estado pode transmitir ou constituir sobre os terrenos concebíveis integrados no seu domínio privado em benefício de pessoas singulares ou colectivas, desde que estes façam prova da sua capacidade para garantir o aproveitamento útil e efectivo dos terrenos a conceder (art.º 34.º e n.º 2, do art.º 45.º)117. Quanto à transmissão da ocupação ou uso dos terrenos abrangendo a orla marítima, o único direito fundiário que a Lei de Terras “reconhece” (mas não “respeita”) à ocupação e ao direito de uso é o domínio útil consuetudinário conferido às famílias que integram as comunidades 117 Sobre o regime dos direitos reais fundiários, vide a nossa dissertação de mestrado em prática jurídica, op. cit., p. 67-81. Ainda, o nosso tema de relatório para obtenção de certificado do Curso de Pós-graduação em Direito Notarial e Registal, A fictícia aquisição dos direitos fundiários à luz da Lei de Terras angolana. 75 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO rurais; por sua vez, o n.º 1, do art.º 6.º do Decreto estipula que a efectivação da transferência de todos os planos de ordenamento da orla costeira para o domínio privado dos Governos Provinciais é conduzido por estes e articulado com todos os órgãos interessados. Com isto, torna-se evidente que se trata da transferência dos planos de ordenamento da orla costeira e não da ocupação e do direito de uso havidos aos terrenos reservados ao contorno da orla costeira. Este Decreto Presidencial não compreende um conjunto de limitações e interdições do uso do espaço da orla costeira, nem estabelece positivamente o regime do uso do solo; porém, entende-se que este regime é definido ao nível dos planos territoriais nacionais, provinciais e municipais – os chamados instrumentos do ordenamento urbanístico (2.º parágrafo do preâmbulo do Decreto Presidencial conjugado com o art.º 28.º da Lei n.º 3/04). A realidade descrita tem gerado conflitos de sobreposição de competência territorial do Estado do porto entre os Governos Provinciais e as administrações portuárias118 por um lado, por outro, cria desconforto aos entes privados por se depararem com dispersões de atribuições entre várias entidades públicas com actividades conexas ao mar, e, muitas das vezes, ficam perdidos por não saberem aonde se dirigir para regularizar assuntos respeitantes ao uso e a actividades específicas da orla costeira e marítima. Contudo, inquieta-nos o seguinte: fará sentido existir dois instrumentos diferentes – o do ordenamento do espaço marítimo e o do da orla costeira? Até que ponto é que os valores que salvaguardam os recursos marinhos e os valores naturais ambientais não justifiquem que haja um único instrumento? Sem prejuízo da coerência, articulação e compatibilidade dos planos especiais de ordenamento do território e do urbanismo que são aplicados na orla costeira, nos termos do Decreto Presidencial n.º 232/11, que remete para Leis n.º 3/04, de 25 de Julho, justificar-se-á a unificação da lei 118 A este respeito, o n.º 2, do art.º 6.º do Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto, estabelece que «As transferências [todos os direitos fundiários adquiridos sobre todos os territórios compreendidos no perímetro da orla marítima] abrangem também todo o cadastro das ocupações autorizadas, no âmbito das licenças emitidas pelo Capitão do Porto». 76 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO do ordenamento de todo o espaço marítimo e terrestre ou a dispersão em dois diplomas distintos? Em resposta a questão, João Miranda vem dizer que basta haver uma única lei de base de espaço que compreendesse quer espaço terrestre quer espaço marítimo em vez de haver regimes ou instrumentos diferentes. Atendendo as afinidades toda continuidade que existe no território porque território terrestre e marítimo é um território contínuo indivisível, na verdade, poderíamos justificar se for tratamento integrado do problema, sendo que, em muitos casos em vez de haver duas perspectivas distintas poderia haver uma única119. No que diz respeito a orla costeira, este doutrinário mostra sensibilidade na sua opinião, ao defender a possibilidade de haver um instrumento específico de gestão territorial destinado a proceder ao ordenamento da orla costeira. Do nosso lado, tendo em consideração as matérias específicas a que estes espaços (marítimo e terrestre) se dedicam e pela sua natureza, por exemplo, a tridimensionalidade do mar120, a característica quintessencial 119 MIRANDA, João – Ordenamento do Espaço Marítimo, sessão n.º 7 , do II Curso de Pós-graduação em Direito Marítimo Portuário 2019/2020, FDUL, 27 de Março, 2020; ainda o mesmo autor com Estudos de Direito do Ordenamento do Território e do Urbanismo, p. 13; DELGADO, Joana Albernaz, Histórias da terra e do mar. In GARCIA, Maria da Glória [et al.] (coord.) – Direito do Mar: novas perspectivas, p. 178 e seguintes. 120 Como é sabido, a tridimensionalidade do mar decorre da tríade fundos marinhos, coluna de água e superfície. Desta tridimensionalidade resulta a coexistência, no mesmo espaço e, em simultâneo, de múltiplos usos (pescas, aquicultura, parques eólicos, indústria de gás e petróleo, extração mineira, navegação, turismo, etc.). Por seu turno, esta coexistência de múltiplos usos é geradora de conflitos com usos de uma modulação dúplice, e que a doutrina estrangeira vem desdobrando em user-user conflicts (conflitos entre usos ou actividades levados a cabo por dois ou mais particulares na mesma área ou volume do espaço marítimo) e user-environment conflicts (quando determinados usos ou actividades explorados por um particular apresentam inconvenientes para a protecção e conservação do ambiente marinho numa dada área ou volume de espaço). NORONHA, Francisco – Comentário à Diretiva 2014/89/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Julho, que estabelece um quadro para o ordenamento do espaço marítimo. In GARCIA, Maria da Glória; CORTÊS, António; ROCHA, Armando (coords.) – Direito do Mar: novas perspectivas, nota n.º 24, p. 134. DOUVERE, Fanny; EHLER, Charles N. – New perspectives on sea use management: initial 77 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO do ecossistema marinho, a conservação dos recursos biológicos do mar e a dinâmica do ambiente marinho, somos a favor da implementação de duas leis distintas, uma de aplicação para o ordenamento marítimo e outra para ordenamento terrestre. A nossa posição contra a necessidade de reunir num único diploma o ordenamento de todo o espaço justifica-se, precisamente, pela complexidade e fragmentação na abordagem dos temas essenciais e pelos eventuais desrespeito e conflitos que este diploma comportará em relação aos princípios da superintendência, subsidiariedade e da atribuição de competência. Não obstante, percebe-se que a necessidade surge em criar-se um quadro jurídico, à semelhança do que acontece no ordenamento do espaço terrestre, que, além de gerar segurança e certeza jurídica nos procedimentos de licenciamento e concessão, possua força vinculativa não só para entes públicos e particulares, mas também para terceiros121. Portanto, somos optimistas quanto à implementação do diploma que visará regular o ordenamento e gestão espaço marítimo nacional, abrangendo todos os programas de planificação afectos às actividades económicas marítimas no espaço de jurisdição e soberania do Estado, e sanar os problemas de conflitos de sobreposição, de interpretação e omissões, aqui invocados. 19. Ordenamento espacial para uma economia marítima próspera O ordenamento espacial marítimo é fundamental para a protecção e preservação dos recursos marinhos e para a potencialização dos usos e actividades ali exercida. Com o crescimento do sector marítimo, exacerbar-se-á a concorrência pela utilização das águas costeiras nacionais. findings from European experience with marine spatial planning. Jornal of Environmental Management, Vol. 90, Issue (January 2009), p.77. SCHAEFER, Nicole; BARALE, Vittorio – Maritime spatial planning: opportunities &challenges in the framework of the EU integrated maritime policy. Journal of Coastal Conservation, Vol. 15, Issue 2, Springer, (June 2011), p. 240. 121 SCHAEFER, Nicole; BARALE, Vittorio, op. cit., p. 242. NORONHA, Francisco, op. cit., pp. 134-135. 78 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO Observa-se a necessidade da adopção do sistema de ordenamento espacial para actividades marítimas nas águas de jurisdição angolana, a fim de assegurar a coerência das decisões que afectam o mesmo ecossistema ou os mesmos usos e actividades marítimas, i. e., é necessário que haja um certo grau de homogeneidade entre estes. Se não existir alguma forma de ordenamento indicativo, as decisões de investimento serão refreadas pela incerteza quanto à possibilidade de obter uma licença para o exercício de uma dada actividade num determinado local marítimo. Serve de exemplo, os seguintes modelos122: i) sistema de ordenamento concebido com a participação de todos os interessados; ii) sistema de fornecimento de dados espaciais – a criação desta rede exigirá a adopção de medidas legislativas, institucionais e financeiras para facilitar o acesso a dados provenientes dos diversos sectores marítimos e informação pública, como apoio à política marítima nacional. A política marítima deverá criar instrumentos e métodos destinados a assegurar a coerência dos sistemas de ordenamento do espaço terrestre e do espaço marítimo, a fim de evitar duplicações da regulamentação e impedir a transferência para o espaço marítimo de problemas de ordenamento terrestre não resolvidos. Um olhar geral, sob a forma de plano de desenvolvimento espacial global, marítimo e terrestre, permitiria estabelecer um conjunto coerente de objectivos e princípios políticos123. Quanto mais as actividades económicas se afastam da costa, maior é a possibilidade de serem exercidas em águas sujeitas ao direito de passagem inofensiva. Neste contexto, há que criar-se um mecanismo para promover a cobertura cartográfica das águas costeiras angolanas, tal como estabelece a al. b), do art.º 6.º, da Lei n.º 6/02, para fins de ordenamento espacial e segurança. O recenseamento das actividades existentes ou previstas nas águas ou nos fundos marinhos é essencial. É imprescindível, também, uma Estes sistemas são de experiência canadiana. COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS – Livro Verde: Para uma futura política marítima da União: uma visão europeia para os oceanos e os mares, p. 38. 122 123 79 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO representação cartográfica da distribuição da flora e fauna marinhas, para efeitos da análise do ecossistema. Uma cartografia exaustiva dos fundos marinhos tem múltiplas utilizações. A ter em consideração que a cartografia para as áreas potenciais deve estar em harmonia com o modelo terrestre e os regimes existente, de modo a evitar situações de conflitos ou de interpretação flexíloqua. Com base nos dados proveniente das diferentes fontes (Direcção Nacional de Recursos Naturais; Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica; Centro de Estudo de História e Cartografia Antiga; Instituto Hidrográfico e de Sinalização Marítima de Angola; Direcção Nacional do Ambiente; Instituto de Investigação Científica e Tropical), será possível elaborar um verdadeiro atlas das águas costeiras, susceptível de ser utilizado como instrumento para o ordenamento espacial, ao mesmo tempo que se cria uma preciosa ferramenta pedagógica para integrar o mar na vida cultural dos angolanos. 20. A atractividade crescente das zonas costeiras enquanto local de lazer e trabalho As zonas costeiras são de importância para a estratégia marítima nacional, fonte de alimentos e matérias-primas, constituem um vínculo vital para os transportes e para as trocas comerciais e albergam os habitats mais valiosos de protecção mundial. O litoral angolano é povoado por comunidades que vivem da pesca artesanal e é o destino para quem procura uma vida à beira-mar apenas pelo prazer, não emergindo novas actividades na sua periferia. Os serviços de pescas e de lazer ligados ao mar são levados a cabo, normalmente, por cidadãos com baixo ou sem nível de escolaridade. As condições laborais, sobretudo piscatórias, são precárias. Poucas empresas surgem na zona costeira e não satisfazem a demanda da necessidade do emprego, pese, embora, a insuficiência de dados estatísticos. Normalmente estes empreendimentos são classificados como pequenas e médias empresas. A falta de estatísticas leva as autoridades responsáveis pelo ordenamento a não referirem o peso destes elementos nas decisões relativas ao desenvolvimento económico na zona ou águas costeiras. 80 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO No entanto, não existem estimativas disponíveis quanto ao valor destas zonas, à oferta de lazeres ligados ao mar ou aos efeitos positivos do mar na qualidade de vida nestas zonas. Porém, os valores do cenário que a costa oferece, o ir à praia e as actividades de recreio podem ter um impacto significativo no bem-estar124. Assim sendo, a capacidade de atracção dos recursos ou zonas costeiras está sujeita ao esgotamento além da sua capacidade de carga, a conflitos de utilização devido à escassez de espaço, havendo grandes variações sazonais na população e emprego, e os ecossistemas que sustentam as zonas costeiras degradam-se – a deterioração do meio marinho, especialmente do ecossistema na zona da Corrente Fria de Benguela, reduz consideravelmente a qualidade de vida. As zonas costeiras estão particularmente expostas a riscos, agravados pelos eventuais impactos das alterações climáticas. Entre os sectores importantes para as costas, os mais vulneráveis a possíveis alterações no clima são as pescas, a agricultura e o turismo. A vulnerabilidade dos sistemas humanos e naturais nas costas aumentou devido à construção na proximidade da orla costeira e à falta de espaço para ter em conta a subida do nível do mar125. Sem embargo do que foi dito, de notar que as medidas que conduzem ao ordenamento das actividades que ocorrem nas zonas costeiras, de modo a salvaguardar a sustentabilidade ambiental dos ecossistemas marinhos, não têm sido severamente cumpridas. 21. Dos usos e actividades económicas conexas ao mar Com a ampliação dos usos e actividades económicas no mar nacional, estão a tomar lugar cenários de insegurança, nas várias formas de tráfico ilegal, pesca ilegal, degradação do ambiente marinho, perda da biodiversidade e nos efeitos agravados sobre mudança Livro Verde, op. cit., p. 27. Neste sentido, COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS – Comunicação da Comissão Relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho: Avaliação da Gestão Integrada da Zona Costeira (GIZC) na Europa [em linha]. Disponível para consulta em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52007DC0308&fr om=PT. 124 125 81 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO climática126. Contudo, as grandes variedades de actividades estão inter-relacionadas de alguma forma, e todas têm um impacto potencial sobre a consequente prosperidade, através da contribuição para a estabilidade social, económica, política, defesa e segurança127. O inter-relacionamento entre os sectores económicos no espaço marítimo tem por base os princípios da solidariedade, racionalidade e da integração, com a finalidade de proteger a diversidade biológica do ambiente marinho, bem como cumprir os objectivos económicos e sociais. Nesta conformidade, prevê-se como objectivos da política marítima nacional o alcance ou a manutenção do bom estado ambiental marinho, a aplicação de uma abordagem ecossistémica à gestão das actividades humanas nas zonas marinhas e a integração das preocupações ambientais marinhas nos diferentes sectores. Para atingir estes objectivos pode incluir-se medidas espaciais e de coordenação de gestão do espaço marítimo. Por conseguinte, o ordenamento do espaço marítimo pode constituir um instrumento para apoiar determinado aspecto da execução da política marítima, nomeadamente na planificação de múltiplas actividades no espaço oceânico nacional. Em seguida, expomos algumas actividades de relevo: a) A pesca é uma das mais actividades económicas exercidas nas águas nacionais. Esta actividade é feita de forma regulada e registada (não obstante a verificação de pesca ilegal). Porém, verificam-se problemas de declínio das unidades populacionais de peixes e baixa rendibilidade, com o sector a enfrentar, também, uma crescente invasão na captura de pescado por parte de navios estrangeiros. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO)128 indica que a aquicultura oferece um enorme 126 Vide nosso Mar – meio sustentável para a economia angolana, tema de avaliação na disciplina Os Recursos Naturais Marinhos e a Economia, curso de Mestrado em Direito e Economia do Mar, p. 11. 127 União Africana – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 (Estratégia AIM 2050). Versão 1.0, 2012, p. 7. Disponível para consulta em: https://au.int/sites/default/files/ documents/30932-doc-2050_aim_strategy_pt_0.pdf. 128 Relatório destaca o crescente papel do peixe na alimentação mundial [em linha]. FAO. Roma. 19 de Maio de 2014. Disponível para consulta em: http://www.fao.org/news/story/pt/ item/232037/icode/. 82 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO potencial para responder à procura de alimentos, associada ao crescimento da população global. No entanto, percebe-se que a dificuldade consistirá em gerir este aumento de uma forma sustentável e compatível com o ambiente, por um lado; por outro, a competição no espaço marítimo poderá constituir um importante problema em certas zonas costeiras, obrigando a aquicultura a distanciar-se da costa, e exigirá novos trabalhos de investigação e aplicação de tecnologia em jaula offshore129. Está estabelecida uma área reservada de pesca equivalente à extensão do mar territorial até às quatro milhas náuticas, bem como as águas continentais para a pesca artesanal, podendo estender-se até oito milhas náuticas na zona norte, entre o Ambriz e o enclave de Cabinda. Já a captura necessita de acessos flexíveis, a fim de dar resposta a mudanças nos padrões de distribuição das unidades populacionais de peixes130. Para estes dois sectores (aquicultura e captura), é importante dispor de um acesso claramente definido e a longo prazo, pelo que é essencial um quadro normativo que envolva a participação e contemplação de todos os que exercem estas actividades, máxime, as cooperativas e as comunidades pesqueiras. Além disso, os conhecimentos costumeiros sobre o mar que os pescadores possuem podem ser úteis para optimizar a localização de, por exemplo, zonas marinhas protegidas, parques eólicos e haliêuticos, limitando simultaneamente os custos. Compete ao Ministério da Agricultura, Pescas e do Mar131 a gestão do ordenamento das pescas, promover a preparação progressiva 129 COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS – Livro Verde: Para uma futura política marítima da União: uma visão europeia para os oceanos e os mares. Vol. II, Anexo, p. 8. 130 Em 2018, foi estabelecido uma quota de 320 000 de toneladas para captura de pescado; as províncias costeiras do Sul, Benguela e Namibe, representam a maioria das capturas por beneficiarem da corrente fria de Benguela. Para mais informações, vide Angola mantém quota de 320 mil toneladas para captura de pescado em 2018. Observador. 29 de Janeiro de 2018. Disponível para consulta em: https://observador.pt/2018/01/29/ angola-mantem-quota-de-320-mil-toneladas-para-captura-de-pescado-em-2018/. 131 O Ministério das Pescas e do Mar é criado na terceira República, posteriormente fundida com o Ministério da Agricultura. 83 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO e a actualização periódica dos planos de ordenamento, ajustando a capacidade de captura ao potencial disponível e explorável dos recursos (n.º 1, do art.º 8.º da Lei n.º 20/92). Este plano tem a duração de cinco anos, sendo prorrogada automaticamente por iguais períodos (n.º 2, do art.º 11.º da Lei n.º 6-A/04, da LRBA). Relativamente ao domínio da protecção do meio marinho, evidencia-se a carência de harmonia e flexibilidade em matéria de utilização, i.e., na designação e delimitação das zonas marinhas protegidas. b) A utilização das energias renováveis seria a solução primordial para a política nacional de combate às alterações climáticas, assim como para outros objectivos vernáculos. As fontes de energia renovável offshore, em particular, a energia eólica marítima, contribuirão significativamente para este objectivo. Os parques eólicos offshore e outras fontes de energia renováveis devem ser ligados à rede em terra132, através da implementação do sistema de vigilância marítima com vista a garantir a protecção dos recursos marinhos existentes no espaço nacional contra as ameaças no mar. Reconhecendo que o mar desempenha um papel essencial na competitividade, no desenvolvimento sustentável e na segurança do aproveitamento energético, a Declaração de Luanda sobre a Segurança Marítima e Energética133 aponta várias recomendações, mas omite o que achamos ser fundamental: a criação de um programa de investigação, financiada pelo sector público ou privado, que vise apoiar o desenvolvimento das energias renováveis produzidas offshore e optimizar o ordenamento do espaço marítimo. c) As águas oceânicas nacionais são intensivamente exploradas para a produção de petróleo e de gás com uma produção de 1,8 milhão 132 Ordenamento do Espaço Marítimo na EU – balanço e perspectiva, op. cit., p. 10. Directiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Directivas 2001/77/CE e 2003/30/CE. 133 Documento designando as recomendações da Conferência Internacional sobre a Segurança Marítima e Energética, Luanda, 28 de Outubro de 2015. 84 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO de b/d134 (barris por dias), obtendo uma reserva de 12 mil milhões de barris, sendo o sector petrolífero responsável pelo aumento das receitas públicas (75,92 %), equivalentes a 67,88 % do total das receitas e 12,26 % do PIB135. As operadoras petrolíferas136 desenvolvem know-how na área das tecnologias marinhas, não só no domínio da exploração de hidrocarbonetos no mar, como também nas actividades em offshore realizadas a mais de três quartos em águas profundas onde os desafios são maiores. Apesar de vários instrumentos regulatórios para garantir que as operações petrolíferas em offshore se realizem com um elevado grau de segurança e de protecção do ambiente e da saúde humana, ainda assim, registam-se situações de derrame de petróleo nas águas marítimas do norte do pais, cujas informações são muitas vezes abafadas137 – na verdade, isso ocorre pelo fraco controlo e intervenção na segurança contra o derrame de petróleo no mar nacional. O exercício das operações petrolíferas assenta num elevado nível de responsabilidade relativamente aos princípios da preservação e a protecção ambiental, nos termos do art.º 23.º da Lei da Actividade Petrolífera, em que o dano ambiental é preferencial face aos demais e que o poluidor terá de pagar (art.º 24.º). A responsabilidade pelos 134 BANCO NACIONAL DE ANGOLA – Relatório Anual e Contas 2018. Disponível para consulta em: https://w w w.bna.ao/uploads/%7B490f344a-dce2-4be2-a749a125996dbf65%7D.pdf. 135 FMI – Relatório do Fundo Monetário Internacional. N.º 18/157, 2018. Disponível para consulta em: https://www.google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd =&ved=2ahUKEwi6qe3UraLrAhWRWhUIHTEoCOcQFjAAegQIAxAB&url=https%3A% 2F%2Fwww.imf.org%2Fpt%2FPublications%2FCR%2FIssues%2F2018%2F06%2F11%2FA ngola-Selected-Issues-45958&usg=AOvVaw2cQozqrxDIk0XVZX8THc0Q, p. 6. 136 A Lei n.º 10/04, de 12 de Novembro, Lei das Actividades Petrolíferas, define operações petrolíferas, como «as actividades de prospecção, pesquisa, avaliação, desenvolvimento e produção de petróleo» e «operador como entidade que executa, numa determinada concessão petrolífera, as operações petrolíferas (art.º 2.º, n.ºs 12 e 13)». 137 Em 2008, foi adoptado um Plano Nacional de Contingência contra Derrames de Petróleo no Mar, que estabelece as estratégias e prioridades nacionais, bem como a sua inter-relação com todos planos locais em termos de preparação e resposta a derrames de petróleo no mar. 85 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO danos causados ao meio ambiente marinho constitui uma condição prévia para fazer os operadores petrolíferos sentir-se responsáveis pelos eventuais efeitos negativos das suas operações no ambiente enquanto tal138. De atender que as actuais práticas da indústria petrolífera, em matéria de segurança ambiental, não dão garantias totalmente adequadas a que os riscos de acidentes offshore nas águas de jurisdição nacional sejam minimizados ou que se consiga mobilizar a resposta mais eficaz de uma forma atempada. Com os regimes de responsabilidade existentes no direito interno, o responsável pode nem sempre ser claramente identificável, podendo não ser capaz de pagar todos os custos da reparação dos danos ambientais que causou ou não ser responsabilizado pelos mesmos. Isto pode ser uma das razões para reflectir no estabelecimento de um quadro regulamentar adequado a actividades offshore que tenha em conta os princípios do ordenamento do espaço marítimo nacional139. d) O transporte marítimo é um catalisador para outros sectores, nomeadamente a construção naval e os equipamentos marítimos. O transporte marítimo e os portos são elos-chave das cadeias logísticas que ligam o comércio externo à economia nacional. Salienta-se que a actividade portuária é exclusiva do sector público, podendo ser desenvolvida por entidades privadas, nos termos da Lei n.º 5/02, de 16 de Abril, e n.º 1, do art.º 117.º, da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto. Em Angola, cerca de 80 % das importações e exportações são feitas por via marítima140. Quanto ao crescimento económico neste 138 Vide nosso trabalho de avaliação na disciplina de Direito Europeu do Mar, sob o tema Que património marítimo da união europeia?, p. 24. 139 COMISSÃO EUROPEIA – Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: enfrentar o desafio da segurança da exploração offshore de petróleo e gás. Disponível para consulta em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52010DC0560& from=PT. 140 Os resultados definitivos do Comércio Externo (importação e exportação), apurados em 2018, indicam uma taxa de variações anual de 76,87 % para as exportações e 58,69 % para as importações. O combustível teve a maior participação no valor total das exportações com 95,67 % (Exportações angolanas em 2018 com variação de 76,87% e importações com 58,69%. Diário de notícias. 15 de Maio de 2019. Disponível para consulta em: https:// 86 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO sector, verifica-se a ausência de políticas operacionais globais para promoção do sistema portuário no mercado regional, com vista à captação de fretes marítimos, de forma competitiva e estimulada por políticas e programas bens concebidos. Igualmente, observa-se a falta de publicação de informações e estatísticas suplementares respeitante ao sector – esta e outras razões vão repercutir-se na ineficiência e decadência do sector. A inovação neste sector deve ser determinada não só pela sociedade, mas também pela evolução da legislação. O instrumento do ordenamento do espaço marítimo pode apoiar o processo do tráfego marítimo e sistemas adequados à organização do tráfego, tomando em consideração as rotas marítimas acordadas a nível internacional, a respectiva gestão e as deslocações de navios fora delas141. e) Os oceanos e os mares geram igualmente receitas graças ao turismo. A região costeira nacional é detentora de uma beleza extraordinária, recursos culturais, históricos, naturais e é rica em biodiversidade. Os turistas que passam férias nessa área usufruem do mar, da praia e da zona costeira de formas muito diversas. Muitos destinos turísticos devem a sua popularidade à proximidade do mar e dependem da qualidade ambiental deste. Para a sustentabilidade do turismo em geral e, em particular, do ecoturismo, sector este que se encontra retraído em receitas públicas e crescimento do PIB, é, pois, crucial prever uma política de desenvolvimento sustentável turístico em coordenação com www.dn.pt/lusa/exportacoes-angolanas-em-2018-com-variacao-de-7687-e-importacoes-com-5869-10899555.html). 141 Ordenamento do Espaço Marítimo na EU – balanço e perspectiva, op. cit., p. 10; Directiva 2002/59/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Junho de 2002, relativa à instituição de um sistema comunitário de acompanhamento e de informação do tráfego de navios e que revoga a Directiva 93/75/CEE do Conselho. Disponível para consulta em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32002L0 059&from=DA; Directiva 2010/65/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Outubro de 2010, relativa às formalidades de declaração exigidas aos navios à chegada e/ou à partida dos portos dos Estados-Membros e que revoga a Directiva 2002/6/CE. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32010 L0065&from=pt. 87 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO os demais Departamentos Ministeriais transversais à actividade turística, de forma a alcançar os objectivos macro e microeconómicos preconizados pelo Executivo (art.º 11.º da Lei n.º 9/15, de 15 de Junho, Lei do Turismo). Na primeira fase, os objectivos da política nacional para o sector do turismo devem assentar nos recursos que satisfaça as necessidades actuais, respeitando o ambiente e a biodiversidade, permitindo que as vertentes económicas e socioculturais evoluam de forma equilibrada e em respeito pelos valores locais (n.º 1, do art.º 12.º). A estratégia nacional para a promoção do “crescimento azul” reconhece o sector do turismo como uma área com especial potencial para promoção de uma economia sustentável, transversal e competitiva, nos temos do artigo 4.º da Lei n.º 9/15. Esta expectativa está longe de ser concretizada, porque à medida que vão mudando os titulares dos órgãos ministeriais sem chegarem ao termo de mandato, muitas vezes, os novos titulares não dão seguimento aos projectos implementados pelo seu antecessor. Do exposto resulta que a força do sector marítimo nacional residirá no espírito empresarial e na capacidade de inovar. Porém, dada a centralização económica deste sector pelo Estado, muito tem de ser feito para garantir que o sector privado tenha acesso a factores de potenciar a concorrência e competitividade nos sectores marítimos. Importa referir que os usos e actividades que se desenvolvem no espaço marítimo implicam uma dependência estrutural e funcional da orla costeira, sendo também necessária uma articulação com os valores naturais aí existentes. Em termos de conclusão, o ordenamento do espaço marítimo seria altamente benéfico por permitir estabelecer parâmetros que facilitem a cooperação inter-actividades entre os sectores económicos no espaço marítimo nacional, sobretudo porque, em Angola, o desenvolvimento das actividades marinhas é encarado separadamente, sector por sector, assim como as tentativas de protecção e conservação dos ecossistemas marinhos. 88 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO SECÇÃO III Dos planos de ordenamento do espaço marítimo 22. Razão de ordem O planeamento dos usos ou actividades ligadas ao mar é uma das linhas orientadoras da Estratégia Nacional para o Mar (ao lado do conhecimento e o ordenamento do espaço marítimo), que vela pelos aspectos económicos, sociais e ambientais, pelo crescimento e o desenvolvimento sustentável do sector marítimo e identifica as diferentes utilizações dadas ao espaço marítimo, bem como gere as utilizações múltiplas que ocorrem no espaço tridimensional marinho, prevendo e minimizando os conflitos de usos e utilizações nas zonas marinhas e identificar e encorajar utilizações142. Nesta conformidade, o plano de ordenamento do espaço marítimo é visto como uma ferramenta de governação indispensável para assegurar directrizes assentes nos princípios do desenvolvimento sustentável, da protecção, da precaução, da defesa dos recursos genéticos e da coordenação institucional, através do levantamento dos usos e utilizações presentes e futuros, com a finalidade de uma gestão verdadeiramente integrada143. A elaboração desta ferramenta deve seguir as normas definidas no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial, daí que o nosso estudo refira a necessidade da integração e articulação com os planos, políticas e programas que incidem nos terrenos compreendidos no perímetro da orla costeira e águas adjacentes, decorrentes da Lei de Terra, da Lei de Água e do Decreto Presidencial n.º 232/11 e do plano marítimo-nacional, entre outros documentos normativos. A elaboração do plano terá de ser feita com a participação da comunidade, para satisfação de interesses nacionais, sobretudo, para solucionar o problema de burocratização dos procedimentos de concessão ou licenciamento de título de utilização privativa, tendo por base uma 142 Sobre esta matéria, Ordenamento do Espaço Marítimo: Volume síntese: memória geral da proposta de Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo. Disponível no site: https://www.dgpm.mm.gov.pt/ordenamento-e-maritimo. 143 Idem, p. 2; Despacho do Governo português 32277/2008, de 18 de Dezembro, DR, 2.ª Série, p. 50546. 89 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO informação técnico-científica sólida. Após a auscultação pública, para melhor gestão e utilização da área marítima, o passo a seguir deve ser a criação de planos de ordenamento que prevejam a execução de usos e actividades afectos a esse espaço. Em síntese, de modo narrativo, observaremos os objectivos, princípios e fases fundamentais do processo do ordenamento marítimo, bem como os conflitos de usos ou actividades que possam surgir na utilização da mesma área ou contra o ambiente marinho. 23. Objectivos e princípios do plano de ordenamento do espaço marítimo Os principais objectivos do Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo, doravante POEM, passam por promover um levantamento de todas as actividades que se desenvolvem no espaço marítimo sob soberania ou jurisdição angolana, tais como cartografar essas actividades; ordenar os usos e actividades do espaço marítimo, existentes e futuros, em articulação com a zona costeira, garantir a utilização sustentável dos recursos, a sua preservação e conservação, fomentando a utilização eficiente do espaço marítimo, desenvolver os parâmetros de sustentabilidade de cada actividade e do espaço marítimo, definir actividades passíveis de desenvolvimento a médio e longo prazo, fomentar a importância económica, social e ambiental do mar, definir as orientações para o desenvolvimento de indicadores de avaliação do desempenho sustentável das actividades marítimas e respectiva monitorização e registar a interacção dos diferentes fins, a sua incidência económica e social, as suas prioridades e a influência que as diversas utilizações têm na interacção montante-jusante144. Sobre os princípios a observar, há os contidos nas convenções referentes ao mar e os compromissos marítimos internacionais assumidos por Angola, bem como outras políticas e instrumentos em vigor, ou em curso, tais como a Estratégia Marítima Integrada de África 2050, a Política Nacional em Matéria de Gestão dos Recursos Hídricos, o Programa 144 Artigos 15.º da Lei n.º 6/02, de 21 de Junho e 12.º seguintes da Lei n.º 6-A/04, de 8 de Outubro. Sétimo parágrafo do Despacho do Governo português 32277/2008, de 18 de Dezembro, Diário da República, 2.ª Série, p. 50547; 90 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO Nacional da Política de Ordenamento do Território, a Política para o Mar, o Plano Nacional para o Turismo, o Plano de Ordenamento dos Recursos Biológicos Aquáticos, os Planos Gerais de Desenvolvimento e Utilização dos Recursos Hídricos das Bacias. Os princípios contidos nestas legislações são válidos e poderiam ser utilizados para o ordenamento do espaço marítimo. Eis alguns princípios gerais que poderiam ser acordados para a definição da política marítima145: i) ii) iii) iv) v) Atendendo à complexidade das relações, os procedimentos deverão garantir a integração dos melhores pareceres técnicos e científicos disponíveis; Todos os interessados deverão ser consultados, não só devido à dificuldade de policiar as actividades exercidas no mar e à necessidade de aqueles apoiarem plenamente as restrições que lhes são impostas, mas também para se compreenderem os efeitos colaterais das acções previstas para as partes interessadas; Para garantir a coerência entre os sectores, a definição da política para o mar deverá ser estritamente coordenada com os objectivos, as zonas geográficas e a política externa; sendo necessário determinar as competências institucionais e os meios de assegurar a cooperação, a colaboração, a coordenação e a integração; Dar especial atenção à coerência dos objectivos, as questões relacionadas com os mares e a Estratégia Marítima Integrada de África 2050; A definição das políticas deverá incluir a fixação de metas, relativamente às quais se avaliará o desempenho, e mecanismos que possibilitem o aperfeiçoamento constante dessas políticas e da respectiva execução. Como instrumento previsão da Estratégia Marítima Nacional, o POEM deve assegurar o desenvolvimento sustentável do espaço marítimo e a utilização sustentável dos recursos marinhos, tendo em consideração os princípios da preservação, da precaução, da abordagem ecossistémica e da gestão integrada para a prossecução desse desenvolvimento. 145 Livro Verde, op. cit., p. 41. 91 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO O mar não é objecto de direitos de propriedade privada da mesma forma que o espaço terrestre e as condições de planificação dos respectivos ordenamentos diferem, daí a constatação de que planear do mar para a terra é crucial e exige coerência não só entre os planos e as estratégias elaboradas para o mar e os elaborados para terra, mas também ao nível da execução146. Importa referir que, havendo incompatibilidade entre o plano de ordenamento do espaço marítimo e o plano e programa terrestre preexistentes (quer seja plano sectorial, programa especial ou outro), estes terão de ser adaptados ou alterados para incorporar os planos do espaço marítimo; assim é pela justificação de que os instrumentos de gestão territorial têm um enfoque essencialmente na vertente terrestre, não considerando o âmbito multidimensional do mar, i. e., o fundo, a coluna de água, a superfície e a atmosfera, e pela circunstância de os princípios que enformam o ordenamento marítimo serem diferentes dos princípios do ordenamento terrestre. 24. Sistema de ordenamento e de gestão do espaço marítimo O sistema de ordenamento e de gestão do espaço marítimo (SOGEM) deve compreender o conjunto integrado de instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional e a Estratégia Nacional para o Mar147, e ter como objectivos o crescimento e desenvolvimento sustentável do sector marítimo, considerando os aspectos económicos, sociais e ambientais, e promover a coexistência entre o ordenamento do espaço marítimo e o plano ou planos correspondentes e outros processos, como a gestão costeira integrada ou as práticas formais ou informais equivalentes148. O sistema de gestão do espaço marítimo será a base da política nacional para o mar. Destarte, pretende-se elaborar uma Estratégica Nacional Ordenamento do Espaço Marítimo na EU – balanço e perspectiva. op. cit., p. 6. Artigo 6.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril, Lei de Base do Ordenamento do Espaço Marítimo portuguesa. 148 Artigo 6.º, n.º 2, al. c) da Directiva 2014/89/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Julho de 2014, que estabelece um quadro para o ordenamento do espaço marítimo. Disponível para consulta em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/ PT/TXT/?uri=CELEX%3A32014L0089. 146 147 92 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO para o Mar149 que, comparando com outros regimes jurídicos, não altere o regime da conservação da natureza ou do ambiente, não seja aplicável a áreas de jurisdição portuária, actividades de defesa ou de segurança nacional e esteja em articulação com a Lei do Ordenamento do Território e do Urbanismo e a Lei de Águas. Quanto ao projecto de lei relativo aos instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional, do nosso conhecimento, ainda não há avanço substancial. Com a promulgação de um diploma que estabeleça as bases da política de ordenamento e gestão do espaço marítimo angolano, o sistema jurídico organizará e dará coerência ao ordenamento marítimo nacional, estabelecendo regras, instrumentos, assemelhando as zonas marítimas, emergindo, principalmente, o domínio de efectivação das políticas de gestão e de desenvolvimento marítimo, incluindo o que o legislador vier a prescrever no futuro regime jurídico de elaboração, alteração, revisão e suspensão dos instrumentos de ordenamento. Para melhor analise e compreensão, este tema esquematizamos em dois subtemas, i é, os instrumentos de planeamento do espaço marítimo e a utilização do espaço marítimo nacional, elementos que compreendem o SOGEM. 24.1. Instrumentos de planeamento do espaço marítimo A necessidade da análise tipológica de instrumentos de planeamento150, particularmente vocacionados para o ordenamento do espaço marítimo será uma valia para o alcance do crescimento azul e desenvolvimento sustentável no sector marítimo nacional. Da experiência portuguesa retiram-se dois tipos de instrumentos: os planos de situação e planos de afectação (art.º 7.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril, que estabelecem as bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo português). 149 ANGOLA. Ministério das Relações Exteriores – Relatório do workshop sobre formação de uma Estratégia Marítima Nacional. 150 Este instrumento abrangerá todos espaços marítimos sob a soberania e jurisdição nacional desde a linha de base até ao limite exterior da plataforma continental, integrando as águas interiores, o mar territorial, a zona contígua, a zona económica exclusiva e a plataforma continental, conforme artigo 3.º da Lei n.º 14/10, de 14 de Julho. 93 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO O plano de situação identifica a distribuição espacial e temporal dos usos e das actividades desenvolvidas em uma ou mais áreas e/ou volumes do espaço marítimo, como por exemplo: zonas de aquicultura, pesca, instalações e infra-estruturas para a prospecção, exploração e extracção de petróleo, de gás e de outros recursos energéticos, de minérios e agregados, e para a produção de energia a partir de fontes renováveis, rotas de transporte e fluxos de tráfego marítimo, áreas de treino militar, sítios de conservação da natureza e das espécies e zonas protegidas, zonas de extracção de matérias-primas, zonas de investigação científica, o percurso dos cabos e condutas submarinos e zonas de turismo e de património cultural submarino151. Certamente se compreenderá que a identificação dos sítios de protecção e de preservação do meio marinho e da distribuição temporal e espacial de usos e actividades é imprescindível para garantir a compatibilidade e a sustentabilidade das diversas utilizações a desenvolver e , desde logo, evitar que sejam atribuídos títulos de utilização com diferentes usos ou actividades nas mesmas áreas ou volumes no espaço marítimo nacional. Nesta conformidade, cartografar aquilo que existe ou efectuar levantamento dos usos e actividades no âmbito do POEM será profícuo para a elaboração do plano de situação152. O plano de situação é encarado como algo prévio à elaboração do plano de afectação, em que se tem em conta e se reflecte toda a informação relevante e acessível sobre o espaço marítimo nacional. Este plano terá uma dinâmica própria, que se verificará na sua elaboração faseada, consoante a informação disponível e obtida sobre a zona oceânica, com alteração, revisão e medidas de suspensão igualmente específicas.153. 151 Alínea a) do n.º 1, do art.º 7.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril, que estabelece as bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo português (LBOGEM) conjugada com o art.º 8.º, n.º 2 da Directiva 2014/89/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Julho de 2014. 152 Neste sentido, BECKER-WEINBERG, Vasco; MARTINS, Rosa, op. cit., p. 280; BECKER-WEINBERG, Vasco – Ordenamento e Gestão do Espaço Marítimo Nacional: enquadramento e legislação; PORTUGAL. Direcção_Geral de Política do Mar – Ordenamento do Espaço Marítimo: Volume 5 – Relatório de Diagnóstico e Fundamentação Técnica. Tomo 2 – Caracterização Cartográfica, p. 2-23. 153 Idem, p. 281. 94 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO Por sua vez, o plano de afectação é percebido como a execução dos usos e actividades previstos no plano de situação. Estes instrumentos de planeamento não estão isentos de críticas, mormente porque estas figuras, em parte, podem vir a possuir conteúdo que se confunde com o dos planos de ordenamento da orla costeira, e com o do regulamento do espaço costeiro, previstos no Decreto n.º 2/06, de 23 de Janeiro, que estabelece o Regulamento Geral dos Planos Territoriais, Urbanísticos e Rurais (designado por REPTUR)154. Analisando a doutrina portuguesa, deparamo-nos com algumas opiniões críticas, dentre elas, Jorge Miranda ao alegar que «Não teria sido preferível fundir as duas figuras, encarando o plano de situação como um prius face ao plano de afetação, fazendo integrar neste o conteúdo do primeiro? A solução prevista legalmente aponta no sentido inverso, determinando que “os planos de afetação devem ser compatíveis ou compatibilizados com o plano de situação, logo que aprovados, automaticamente integrados nestes” (art.º 7.º, n.º 3, da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril, que estabelece as bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo, o legislador português)»155. Do seu lado, Francisco Noronha entende que «foi intenção do legislador, ao menos no que concerne aos planos de afetação, fazer deles planos de natureza regulamentar e munidos de eficácia plurisubjetiva, e como tal, diretamente impugnáveis pelos particulares em sede jurisdicional»156. No que respeita ao procedimento de formação dos instrumentos de ordenamento caberá às autoridades competentes elaborar e aprovar os planos de uma área e/ou volumes de espaço da zona do espaço marítimo, bem como sujeitá-la a uma avaliação durante a sua execução no território marítimo. Enfim, no devido momento, deverá procurar-se esclarecer todas a questões relativas ao regime aplicável aos instrumentos de planeamento do ordenamento do espaço marítimo nacional, isto é, a forma do acto de 154 Artigo 1.º do Decreto n.º 2/06, de 23 de Janeiro; SILVA, Águeda – Planeamento territorial – a coordenação de intervenções – âmbito regional e nacional in Oliveira, Fernanda Paula (coord.) – Direito do Urbanismo e do Ordenamento do Território, p. 79-97. 155 MIRANDA, João, op. cit., p. 15; igualmente do autor, Ordenamento do espaço marítimo. 156 NORONHA, Francisco, op. cit., p. 32; BECKER-WEINBERG, Vasco; MARTINS, Rosa, op. cit., p. 288. 95 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO aprovação dos planos ou recorrer-se da experiência da formação de planos territoriais e incorporando nos instrumentos de planeamento do espaço marítimo os regimes dos planos sectoriais157 ou planos especiais 158. 24.2. A utilização do espaço marítimo nacional O instrumento do sistema de ordenamento e gestão marítima incide sobre a utilização de todo o espaço oceânico nacional, na perspectiva da sua valorização e salvaguarda em articulação com os demais vectores, principalmente, a preservação e o exercício das actividades económicas, com vista a contribuir para o desenvolvimento económico sustentável159. Aqui, podemos equivaler a terminologia «espaço marítimo nacional» com o termo técnico «espaços marítimos sob soberania e jurisdição nacionais» acolhido pelo art.º 3.º da Lei n.º 14/10; este artigo deixa evidência de que o melhor será o legislador avançar mais em termos substanciais, optando por «ordenamento e gestão dos espaços marítimos sob soberania e jurisdição nacional»160. Cabe ao legislador decidir se inclui, ou não, neste diploma, disposições sobre o exercício de actividades e sobre a articulação entre atribuição dos títulos de utilização privativa com outros procedimentos. Podemos distinguir dois tipos de utilização: a utilização geral ou comum dos bens de domínio público reconhecido a todos cidadãos ‒ consequência do respaldo das alíneas a), b) e f), do n.º 1, do art.º 95.º da Constituição, Constantes dos artigos 40.º a 45.º do Decreto n.º 2/06, de 23 de Janeiro. Constante dos artigos 46.º a 51.º do Decreto n.º 2/06, de 23 de Janeiro. 159 O n.º 2, artigo 1.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril (a Lei de Base do Ordenamento do Espaço Marítimo portuguesa) estabelece que «A política de ordenamento e de gestão do espaço marítimo nacional define e integra as ações promovidas pelo Estado português, visando assegurar uma adequada organização e utilização do espaço marítimo nacional, na perspetiva da sua valorização e salvaguarda, tendo como finalidade contribuir para o desenvolvimento sustentável do País». BECKER-WEINBERG, Vasco; MARTINS, Rosa – A Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional. In GARCIA, Maria Glória; CORTÊS, António; ROCHA, Armando (coord.) – Direito do Mar: novas perspectivas, p. 274. 160 A este respeito vide a posição critica de NORONHA, Francisco, op. cit., p. 26. 157 158 96 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO art.º 14.º, als. a), b), c) e k), da Lei n.º 18/10, e o art.º 23.º, n.º 3, da Lei n.º 6/02 ‒, e a utilização ou uso privativo dos bens de reservas parciais de integração do domínio marítimo, nos termos das als. a), b) e c), do n.º 7, do art.º 27.º da Lei de Terras e Decreto Presidencial n.º 232/11, por pessoas singulares ou colectivas. Esta matéria tem que ser conjugada com a Lei n.º 6/02, de 21 de Junho, Lei de Água (LA), que prevê a utilização privativa dos recursos hídricos (art.º 24.º e seguintes). Considerando a gestão integrada, o desenvolvimento dos recursos hídricos e, simultaneamente, a sua protecção e conservação, o legislador consentiu (na Lei de Água) a determinados sujeitos o uso privativo para a produção de energia, reprodução de espécies piscícolas ou de outros recursos aquáticos, a localização das obras hidráulicas a construir, o volume de água concedido e os fins e actividade a que se destina (art.º 25.º da Lei de Águas). Entre linhas, aqueles que beneficiam do uso privativo gozam de um exclusivo que lhes confere o direito de privar qualquer outra pessoa de utilização da parcela que se encontra onerada com uma servidão administrativa (arts. 12.º, n.º 5 e 31.º da LA)161. A regra do direito angolano para utilização privativo de recursos hídricos é a de que o beneficiário da concessão, ou licença, deve obrigatoriamente requerer o registo no prazo de três meses a contar da data da outorga do direito de uso, para efeitos em relação a terceiros (art.º 12.º, n.ºs 3, 4 e 5). Uma vez adquirido o direito de utilização privativo, convém ao seu titular fazer o uso que for determinado no título, podendo este ser revisto nos termos a serem estabelecidos e ser sujeito a um conjunto de deveres a ser enunciado por Lei. Com vista a evitar duplicidade de interpretação, supomos que o legislador perfilha o mesmo critério adoptado na Lei, n.º 6/02 para distinguir as utilizações sujeitas à concessão da licença, na medida em que o título de concessão constitua ex novo na esfera jurídica do titular de direito de 161 Sobre o uso privativo de bens do domínio público, vide CAETANO, Marcello, op. cit., p. 937 e ss.; Sobre a problemática da utilização dos bens do domínio público por particulares e sobre a sua utilização privativa, vide LEITÃO, Alexandra – A utilização do domínio público hídrico por particulares. In MIRANDA, João [et tal.] (coord.) – Direito da Água , pp. 183 e ss.; GUERREIRO, Sandra Cristina Pereira – A natureza jurídica do direito de utilização privativa do domínio hídrico: entre o direito obrigacional e o direito real administrativo. In MIRANDA, João [et tal.] (coord.) – Direito da Água, pp. 227 e ss. 97 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO utilização privativo e não podendo afectar os usos comuns preexistentes ou direitos de terceiros162. Não podemos deixar de destacar a gravidade cometida pelo legislador ao decretar, na epígrafe do art.º 7.º do Decreto Presidencial n.º 232/11, o «regulamento de concessão de orla costeira» e, depois, ditar, no seu corpo, que «a concessão dos direitos fundiários faz nos termos do arts. 81.º a 93.º do Decreto 58/07, de 13 de Julho, Regulamento Geral de Concessão de Terrenos». O direito fundiário de que os artigos em remissão se ocupam trata-se do direito de ocupação precária, constituída por contrato de arrendamento celebrado por tempo determinado, e destina-se a terrenos a utilizar temporariamente e aqueles em relação aos quais se revele inconveniente a criação de direitos fundiários duradouros (art.º 40.º da LT e 81.º do citado Decreto). Verifica-se discórdia na forma de aquisição da orla costeira, visto que a concessão e contrato de arrendamento são formas distintas para constituição de um direito: o primeiro é regido no âmbito do Direito Público e o segundo pelo Direito Privado. Contudo, de destacar que o único direito fundiário em que a celebração do negócio jurídico é transmitida ou constituída pelo contrato especial de concessão é o direito de superfície (al. d), do n.º 1, do art.º 46.º da LT). Ainda há questão do prazo: o direito de ocupação precária tem por prazo não superior a um ano, renovado por período sucessivos (art.º 55.º, n.ºs 1, al. e) e 2 da LT) e, em regra, as concessões dos recursos hídricos são outorgadas, temporariamente, por um período de 50 anos, passíveis de renovação (art.º 51.º da LA)163. 162 Por se tratar da utilização privativa de bens do domínio público, entende-se que o particular não deixa de prosseguir um interesse público, no sentido em que vai exercer um direito preexistente que está dependente da atribuição de um novo direito que é mais coadunável com o regime da concessão e menos com o regime da licença. Esta licença tem que ver com situações que, no fundo, vão remover o obstáculo para a realização de uma actividade normalmente proibida ou permitida. Sobre esta matéria, vide MONIZ, Ana Raquel – O domínio público: o critério e o regime jurídico da dominialidade , pp. 467 e ss. 163 Nos termos do artigo 55.º n.ºs 1, al. d) e 2, da Lei de Terras, o contrato especial de concessão de direito de superfície «tem por prazo não superior a 60 anos, renovado por períodos sucessivos se nenhuma das partes o tiver denunciado no tempo e pela forma convencionados ou se não ocorrer nenhuma causa de extinção prevista na lei». 98 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO Não obstante, reconhece o legislador que, ao abrigo do disposto na Lei de Terra, não implica a aquisição, por acessão ou por outro modo de aquisição, de qualquer direito sobre outros recursos naturais (2.ª parte do n.º 4, do art.º 10.º). Assim, atendendo a que os bens integrados no domínio público hídrico são regidos pela Lei de Águas e pelo seu Regulamento (Decreto Presidencial n.º 82/14, de 21 de Abril), e a orla costeira, parte integrante deste domínio, particularmente do domínio marítimo, perfilhamos que, na falta de uma lei de ordenamento e gestão do espaço marítimo de jurisdição nacional, a sua aquisição por concessão deve ser em conformidade com o disposto nos diplomas mencionados. 25. Fases fundamentais do processo de ordenamento marítimo O ordenamento do espaço marítimo é definido como um processo de decisão coerente, transparente, sustentável e fundamentado, no qual os órgãos públicos planificam, avaliam, implementam e monitorizam a forma como os usos e actividades humanas se distribuem no tempo e no espaço nas zonas marinhas para alcançar o desenvolvimento económico, ecológico e social164. Este processo de ordenamento deverá ter em conta as interacções terra-mar e promover a cooperação intersectorial. Todos os interessados devem ser envolvidos no processo de ordenamento do espaço marítimo desde a primeira fase (planificação). Tal é indispensável para procurar sinergias e desenvolver a inovação e para clarificar os objectivos e benefícios do processo. Outrossim, é indispensável a abertura de debate entre os diversos sectores de actividades, de modo a identificar os conflitos e encontrar uma forma de coexistência. O processo de ordenamento do espaço marítimo deve ser dirigido por uma única entidade administrativa (a denominar de Agência Nacional Marítima), que lhe competirá definir responsabilidades e encorajar a interacção entre departamentos ministeriais que prosseguem atribuições envolvendo actividades desenvolvidas no mar, e não apenas entre estes, mas também entre entidades privadas. Tal não implicará necessariamente 164 Artigo 3.º, n.º 2, da Directiva 2014/89/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Julho de 2014, que estabelece um quadro para o ordenamento do espaço marítimo. 99 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO a criação de uma nova entidade – a agência congregará todas representações dos ministérios e institutos públicos com actividades ligadas ao mar com vista a atingir os objectivos de governação traçados para o sector marítimo, garantir que os planos de ordenamento marítimo se baseiem em dados fiáveis e evitar cargas administrativas adicionais. Um ordenamento marítimo eficaz exige o desenvolvimento de uma visão conjunta baseada em interesses nacionais. O ordenamento do espaço marítimo deve processar-se no respeito do direito internacional do mar. Para garantir a eficácia jurídica do ordenamento do espaço marítimo nacional, há que assegurar a cooperação interministerial e clarificar as competências administrativas. Uma zona económica exclusiva oferece condições mais favoráveis para uma aplicação mais eficiente do ordenamento do espaço marítimo, na medida em que facilita a execução deste. Para elaborar um plano de ordenamento do espaço marítimo, os instrumentos utilizados podem ser juridicamente vinculativos ou de natureza mais indicativa. É essencial definir claramente quem fica vinculado pelo plano, ou seja, agentes económicos, autoridades públicas, público em geral165. Os indicadores a definir na fase inicial do processo devem ter por base as estruturas ao nível nacional, provincial, municipal e comunal. Os sistemas de monitorização devem ter devidamente em conta que os processos naturais do meio marinho e as diferentes utilizações do espaço marinho têm escalas espaciais e temporais diferentes. A transparência é uma condição sine qua non da responsabilidade e legitimidade. É necessário identificar todos os decisores e partes interessadas pertinentes e garantir que todas as fases do processo sejam compreensíveis. As expectativas ligadas ao processo de tomada de decisão devem ser devidamente consideradas e os motivos subjacentes às decisões tomadas no âmbito do processo devem ser comunicados e justificados perante as partes interessadas pertinentes. 165 100 Idem. ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO 26. Participação pública no ordenamento marítimo A elaboração de um quadro para o ordenamento do espaço marinho deve ser constituída através do processo de discussão pública (por debates intensos e participação de todos os interessados), ao nível nacional, abrangendo particulares interessados e vários sectores marítimos, a fim de buscar uma solução harmonizadora e que contribua para a Estratégia Nacional para o Mar, conciliando as questões ambiental e económica. A participação pública166 é um dos princípios centrais da matéria marítima e a sua inclusão no processo de ordenamento marítimo é o corolário do artigo 52.º da Constituição, preceituando, nesta conformidade, o art.º 27.º do Decreto Presidencial n.º 82/14, de 21 de Abril, em que a «Atribuição de título de utilização dos recursos hídricos, que careçam de estudo de impacto ambiental, fica obrigatoriamente sujeita à auscultação pública prévia». O exercício do direito à informação e do direito à participação, para o regime jurídico aplicável à elaboração, alteração, revisão e suspensão dos planos de OEM, deve conter mecanismos que contribuam para o reforço da participação cívica de todos os particulares (interessados ou não), quanto às causas da degradação do meio marinho e o contributo para a melhoria do mesmo. Subjectivamente, o direito de participação deve estender-se aos ministérios que tutelam os sectores de actividades desenvolvidas no espaço marítimo, aos municípios interessados e às associações científicas, profissionais, sindicais e empresariais com interesses nas actividades desenvolvidas no mar167. Posto isto, e tendo presente as noções gerais sobre o instituto de ordenamento marítimo nacional, perceber-se-á que a lei poderá vir a exigir a participação mínima das autoridades na fase do planeamento 166 No ordenamento jurídico interno angolano verifica-se a ausência de um diploma que regule o acesso à informação e participação nas decisões tomadas em matéria de interesse público, bem como do direito de recurso, caso estes direitos não sejam respeitados. Contrariamente à Lei n.º 1/17, de 23 de Janeiro, Lei de Imprensa, que estabelece os princípios gerais orientadores da Comunicação Social e regula as formas de Exercício da Liberdade de Imprensa. 167 Neste sentido, NORONHA, Francisco, op. cit., p. 37. 101 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO e permitir uma margem de liberdade de prazo para que os diplomas complementares168 se adaptem à realidade concreta. É fundamental a participação pública na fase do planeamento, envolvendo o máximo possível não apenas de indivíduos com interesses específicos, mas também a análise das condições existentes e futuras, por exemplo, conflitos a constatar na área que será objecto de OEM169. Em cumprimento do princípio da transparência no processo de ordenamento do espaço marítimo, os resultados da participação deverão estar disponíveis para consulta, a fim de que os participantes tenham oportunidade de analisar os resultados; mais importante do que uma resposta, será haver uma explicação quanto ao porquê de se ter seguido ou não determinada proposta surgida em sede de participação pública. 27. Conflitos de uso ou actividades dos meios marinhos Os conflitos de uso ou actividades no espaço oceânico sucedem quando estiver em causa uma modulação dúplice, ou seja, conflitos entre utilizadores particulares (user-user conflicts) e entre o ambiente marinho (user-environment conflicts)170. Outrossim, a possibilidade do aparecimento de conflitos mistos, i. e., quando os usos ou actividades desenvolvidos por particulares, no mesmo espaço marítimo, são em si incompatíveis e, simultaneamente, se mostram, ambos ou um deles, potencialmente prejudiciais para a protecção e conservação do ambiente marinho171. 168 Por exemplo, diplomas que definem os instrumentos de acompanhamento permanente e de avaliação técnica do ordenamento do espaço marítimo nacional; o regime jurídico aplicável à elaboração, alteração, revisão e suspensão dos instrumentos de OEM; o regime jurídico aplicável aos títulos de utilização privativa do espaço marítimo nacional e o regime económico e financeiro associado à utilização privativa do espaço marítimo nacional; a regulamentação dos meios de financiamento das políticas de ordenamento e de gestão do espaço marítimo nacional. Nesta conformidade, o art.º 30.º Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril estabelece as bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo português (LBOGEM). 169 Sobre a participação pública no Ordenamento do Espaço Marítimo, vide RONCHA, Inês Maria da Cunha – O direito de participação pública na tomada de decisão sustentável [em linha], pp. 64 a 101. Disponível para consulta em: https://estudogeral.sib.uc.pt/ handle/10316/29916?mode=simple. 170 DOUVERE, Fanny; EHLER, Charles N., op. cit., p. 77. 171 NORONHA, Francisco, op. cit., nota 88, p. 35. 102 ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO Com efeito, alguma doutrina entende que os instrumentos de ordenamento do mar devem equacionar três níveis de ordenamentos horizontais sobrepostos que, em simultâneo, devem ser cruzados verticalmente nas várias dimensões que abrangem172. Tendo em conta que estão em causa bens dominiais ambientalmente sensíveis, é exigido do titular da concessão ou licença de utilização de determinado espaço marítimo que adapte medidas necessárias para a obtenção e manutenção do bom estado ambiental do meio marinho da zona que lhe for atribuída. Normalmente, essa zona é definida por menção ao uso que dela se pretende fazer do espaço. Destarte, trata-se de uma obrigação plena na abordagem ecossistémica concebida como princípio do ordenamento da e gestão do espaço marítimo. Há que se estabelecer critérios para a resolução de conflitos de usos ou actividades no âmbito da zona marítima coberta por um determinado plano de afectação ou plano de situação, na eventualidade de surgir conflitos de usos ou de actividades em que se mostre necessário proceder à alteração ou revisão do plano. Para o efeito, primeiramente, há que colacionar a política nacional em matéria de gestão dos recursos hídricos que visa a igualdade de tratamento e oportunidade para os intervenientes, a preservação do bem-estar e do ambiente, a promoção da prática de uso eficiente da água, bem como o incentivo à iniciativa particular relativa ao uso racional dos recursos hídricos disponíveis (n.º 1, do art.º 10.º, da LA). Nesta conformidade, a Lei de Água contempla o critério de subordinação de prioridade dos usos privativos. Relativamente aos conflitos, dispõe esse diploma que «[…] são resolvidos em função da rentabilidade socioeconómica e impacto ambiental dos respectivos usos (n.º 3, do art.º 33.º)». Quanto aos conflitos resultantes de uso ou actividades no mar, em nossa opinião, deve-se optar pelo critério de subordinação, na medida em que está subjacente a resolução dos interesses sociais, económicos e ambientais, justamente para a prossecução do desenvolvimento sustentável173. DELGADO, Joana Albernaz, op. cit., p. 181; NORONHA, Francisco , op. cit., p. 36. O legislador português optou pelos critérios de preferência a maior vantagem social e económica para a resolução de conflitos de usos e actividades que surjam no âmbito de áreas ou volumes cobertos por um determinado plano de afetação, artigo 11.º da Lei n.º 17/2014, de 10 de Abril. 172 173 103 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Portanto, o ordenamento do espaço marinho surge para gerir os conflitos resultantes da crescente necessidade de utilização do espaço oceânico, no intuito de proteger e conservar os ecossistemas, bem como prevenir mecanismos claros e consensuais para a sua resolução. 104 Capítulo III Governança no espaço marítimo nacional SECÇÃO I Coordenação nas utilizações dos sectores ligados ao mar 28. Razão de ordem Qualquer forma de governação no espaço nacional deve ter em conta os princípios circunscritos na ordem interna e na ordem internacional. Uma política marítima incluindo a Região do Golfo da Guiné e a zona da corrente fria de Benguela deverá visar o crescimento e a criação de mais e melhores postos de trabalho, contribuindo assim para uma economia marítima nacional forte, em expansão, competitiva e sustentável, em harmonia com o meio marinho. Deverá proporcionar uma maior previsibilidade para o sector e outros interessados e uma abordagem mais eficaz em matéria de conservação dos recursos marinhos. Para tanto, é necessário coordenar e integrar as políticas sectoriais, através de trabalho conjunto para obter resultados positivos – pensamos nós que a melhor forma seria examinar a possibilidade de se criar um grupo de trabalho horizontal em que os interessados são convidados a expor as suas preocupações, bem como as suas sugestões de melhoramento em matéria marítima. 105 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Tais sugestões estão patentes na CNUDM que fomenta os Estados a regulamentar o uso dos espaços marítimos e de seus recursos a partir de mecanismos de governança, pautados por regimes de cooperação e integração das políticas do sector marítimo. Porém, a doutrina defende que a governança (no espaço marítimo) vai além de actividades esteadas em autoridades, com apoio em determinado poder de polícia de natureza administrativa e com o respectivo comando do Estado, que objectiva efectivar as políticas que são regularmente institucionalizadas174. Portanto, das responsabilidades ref lectidas nas disposições das convenções internacionais, de que Angola é signatária, nomeadamente na Convenção Internacional para Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS 1974) e no respectivo protocolo de 1978175, Convenção Internacional sobre Padrões de Formação, Certificação e de Serviço de Quartos para os Marítimos, 1978176, Convenção Internacional sobre a Cooperação e Combate Contra a Poluição para Hidrocarboneto (OPRC 1990)177, Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil pelos Prejuízos devidos à Poluição Hidrocarbonetos (CLC 1992)178, Convenção Internacional para Constituição de um Fundo Internacional para a Compensação pelos Prejuízos devidos a Poluição Hidrocarbonetos (FUND PROT 1992 ou FUND 1992)179, Convenção Internacional sobre a Prevenção da Poluição por Navios e Protocolo (MARPOL 73/78) e anexos 174 ROSENAU, James N. – Governance and democracy in a globalizing world. In ARCHIBUGI, Daniele; HELD, David; KÖHLER, Martin (eds.) – Re-imagining Political Community, p. 30 ss. 175 Convenção n.º 1/12, de 19 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 242, adesão aprovada pela Resolução n.º 11/89, Diário da República n.º 20 de 27 de Maio. 176 Convenção n.º 3/12, de 21 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 244, adesão aprovada pela Resolução n.º 11/89, Diário da República n.º 20 de 27 de Maio. 177 Convenção n.º 7/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 33/01, Diário da República n.º 51 de 9 de Novembro. 178 Convenção n.º 8/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 32/01, Diário da República n.º 50 de 1 de Novembro. 179 Convenção n.º 10/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 31/01, Diário da República n.º 49 de 26 de Outubro. 106 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL (I, II, III, IV e V)180, Convenção Internacional sobre a Intervenção em Alto Mar em caso de Acidentes que causem Poluição por Hidrocarbonetos, tal como emendada em 1973 e 1991 (INTERVENTION 1969)181, Convenção para Prevenção da Poluição Marinha por Alijamento de Resíduos e outras Matérias (LC 1996)182 e Convenção Internacional sobre a Responsabilidade e Indemnização Relacionadas com o Transporte Marítimo de Substancias Perigosas e Tóxicas (HNS 1996)183, emerge obrigações importantes para gerar vontade política, desejável para a implementação da estratégia, e desafios a serem enfrentados pela decisões de governança no espaço oceânico nacional com vista a equacionar, máxime, os conflitos de actividades que impactam no meio ambiente marinho. Em resumo, no presente capítulo, em particular nesta secção, focar-nos-emos nas medidas de coordenação interna dos assuntos ligados aos oceanos, que visam constituir uma estrutura destinada a promover a integração da política marítima, a protecção e preservação do meio marinho, levando em consideração que o desenvolvimento sustentável passa necessariamente, para além da partilha geográfica, pelos desafios comuns de natureza diversa que os Estados da região do Golfo da Guiné enfrentam. 29. A utilização comum e partilha da informação de vigilância do domínio marítimo africano Uma das prioridades a ser catalogada na Estratégia Nacional Marítima é a harmonização na partilha de informação relativa à vigilância do 180 Convenção n.º 11/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 41/01, Diário da República n.º 62 de 21 de Dezembro. 181 Convenção n.º 12/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 29-A/01, Diário da República n.º 46 de 5 de Outubro. 182 Convenção n.º 13/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 22/01, Diário da República Sup. n.º 22 de 11 de Maio. 183 Convenção n.º 14/12, de 26 de Dezembro, publicado no Diário da República, I Série n.º 246, adesão aprovada pela Resolução n.º 29/01, Diário da República n.º 46 de 5 de Outubro. 107 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO domínio marítimo africano, essencialmente dos Estados do Golfo da Guiné184; sendo outra prioridade definir os limites da sustentabilidade das actividades humanas com impacto no meio marinho, nomeadamente no âmbito da Estratégia Marítima Integrada de África 2050185, com vista a basear-se no reconhecimento inequívoco de que, para podermos colher os resultados desejados, todas as políticas ligadas ao mar devem ser elaboradas de uma forma articulada. Relativamente à matéria de vigilância marítima, a Comissão do Golfo da Guiné preconiza os Estados uma coordenação neste sentido, e recomenda para si um estudo mais profundo dos riscos, desafios e ameaças ao domínio marítimo da região, através dos mecanismos existentes, tanto numa perspectiva de segurança como de protecção das actividades realizadas no mar186. Dentre os mecanismos de vigilância tidos pela Comissão, supomos que estão inclusos a promoção da cooperação entre as guardas costeiras dos Estados e os serviços adequados e a promoção da interoperabilidade do sistema de vigilância, através da congregação dos actuais sistemas de vigilância e localização utilizados para garantir a segurança marítima, a protecção do transporte marítimo, a protecção do ambiente marinho, o 184 Os Estados-membros da Comissão do Golfo da Guiné são: República de Angola; República dos Camarões; República do Congo; República Democrática do Congo; República do Gabão; República do Gana; República da Guiné Equatorial; República Federal da Nigéria e República Democrática de São Tomé Príncipe. 185 UNIÃO AFRICANA – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 (Estratégia AIM 2050, p. 7; BERNARDINO, Luís Manuel Brás – A Estratégia Marítima Integrada de África 2050 – uma nova dimensão para a segurança marítima africana. Revista Militar, p. 240. 186 Consideram-se riscos e desafios à segurança do domínio marítimo do Golfo da Guiné: a pesca ilegal, não regulamentada e não declarada; os crimes contra a biodiversidade; a pirataria marítima; o transbordo ilegal de produtos em alto mar; o roubo de petróleo; o tráfico de drogas; o tráfico de seres humanos; a imigração ilegal; o despejo de dejectos tóxicos; disputas pelo alargamento das plataformas continentais dos Estados; a falta de capacidade de governação dos domínios marítimos nacionais; a falta de coerência legislativa em alguns dos países da região e a corrupção que afecta os países da região, especialmente a industria marítima. Paragrafo 10.1 seguintes do Relatório Síntese: do seminário sobre a estratégia integrada da região do Golfo da Guiné, p. 5; UNIÃO AFRICANA – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 (Estratégia AIM 2050), p. 12. 108 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL controlo das pescas, o controlo das fronteiras externas e outras actividades de fiscalização no cumprimento da legislação dos países da região187. O objectivo da vigilância marítima deve pautar-se pela obtenção de um conhecimento mais fiel das actividades em curso no mar, com atenção para uma ampla gama de ameaças e vulnerabilidades no Domínio Marítimo da África (DMA)188, tais como a segurança e protecção dos sistemas de transporte marítimo, o controlo da pesca, os crimes contra a biodiversidade, a pirataria marítima, o transbordo ilegal de produtos em alto mar, o roubo de petróleo, o tráfico de drogas, o tráfico de seres humanos, a imigração ilegal, o despejo de dejectos tóxicos, escassez/má manutenção de instrumentos de ajuda à navegação e levantamentos hidrográficos modernos e controlo das fronteiras marítimas, de modo a melhorar viabilidade marítima dos Estados-membros da União Africana (UA)189. Estas ameaças e vulnerabilidades, segundo Luís Manuel Bernardino, causaram «uma perturbação crescente no Sistema Político Internacional, revelando-se uma permanente ameaça transnacional à segurança global, demonstrando que o factor “segurança no mar” é primordial na consolidação do “desenvolvimento em terra” e que ambos são atualmente elementos estratégicos no desenvolvimento sustentável no continente Africano»190. 187 UNIÃO AFRICANA – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 (Estratégia AIM 2050), pp. 13-14; ver também COMISSÃO EUROPEIA – Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: uma política marítima integrada para a União Europeia , p. 5 s; e COMISSÃO EUROPEIA – Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu: relativa a um projecto de roteiro para a criação de um ambiente comum de partilha da informação de vigilância do domínio marítimo da EU. 188 UNIÃO AFRICANA – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 (Estratégia AIM 2050), p. 13. 189 A decisão [Assembly/AU/Dec.252(XIII)] adoptada pela 13ª Sessão Ordinária da Conferência da UA, realizada em Sirte, Líbia, Julho, 2009, encarregou as Organizações Regionais Africanas e demais interlocutores da África de desenvolverem, coordenarem e harmonizarem as políticas e estratégias e melhorarem as normas de segurança e da protecção marítima, bem como a economia marítima para a criação de mais riqueza nos seus mares e oceanos, garantindo o bem-estar ao povo africano; art.º 4.º da Carta sobre a Protecção e a Segurança Marítimas e o Desenvolvimento em África (Carta de Lomé). 190 BERNARDINO, Luís Manuel Brás, op. cit., p. 241. 109 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO A mais-valia da integração da vigilância marítima deve consistir na representação mais fiel que o sector marítimo proporcionará aos Estados-membros, permitindo a troca de informação e dados entre os parceiros, aumentando a interoperabilidade organizacional, legal, técnica e semântica. Abordar este exercício de partilha da informação numa perspectiva africana propicia um quadro político coerente, que vai permitir um desenvolvimento sustentável de todas as actividades relacionadas com o mar, e a garantia de uma boa governança marítima (art.º 12.º da Carta de Lomé). Analisar este tema é reflectir na filosofia de orientação dos princípios e valores que inspiraram a Estratégia-AIM 2050191, em que a sua materialização passa pela criação de um sistema especializado para facilitar o intercâmbio de informações em formato electrónico entre os Estadosmembros; desconhecemos, portanto, as propostas ou recomendações da Comissão do Golfo da Guiné sobre esta matéria. Abrimos parêntesis para referir que os Estados-membros da União Europeia estão vinculados a transpor para a sua ordem interna a Directiva da União, o mesmo não sucedendo com países africanos, porque não delegaram o poder legislativo à UA. No que diz respeito a Angola, foi criado o Sistema Nacional de Vigilância Marítima (SINAVIM) pelo Decreto n.º 59/09, de 26 de Outubro. Todavia, urge a necessidade de implementação do Sistema de Vigilância e Informação que possibilite o intercâmbio de informações marítimas entre utilizadores autorizados, entre eles a Segurança e Serviços Marítimos, os armadores, agentes, comandantes, carregadores e outros para quem a informação do sistema possa ser relevante, tendo em conta a actividade que desenvolvem no âmbito do sector, pois, tal como refere Damião Capitão Ginga, «trata-se portanto, de caracterizar os fluxos de tráfego e o conjunto das actividades desenvolvidas nos espaços marítimos, uma vez que só se consegue identificar o que é ilícito se existir um conhecimento profundo do cenário»192. O SINAVIM é um órgão de coordenação intersectorial liderado pelo Ministério da Defesa Nacional (através da Marinha de Guerra Angolana), 191 Artigo 4.º do Acto Constitutivo da UNIÃO AFRICANA – Estratégia Marítima Integrada de África 2050 (Estratégia AIM 2050), p. 14. 192 GINGA, Damião Fernandes Capitão, op. cit., p. 263. 110 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL cuja finalidade é contribuir para o exercício de poderes de soberania e/ou jurisdição nos espaços oceânicos nacionais (arts. 1.º e 2.º, do Decreto n.º 59/09). Este sistema tem como objectivo principal integrar, de forma coordenada, as entidades que exercem as suas actividades no mar com a finalidade de reforçar a vigilância e monitorização permanente dos espaços marítimos nacionais. Outros objectivos são o controlo do tráfego marítimo (Vessel Traffic Services (VTS)193 na zona costeira e portuária, o auxílio e apoio às operações SAR e a localização de embarcações em perigo de naufrágio ou zonas de risco. O SINAVIM constitui-se, fundamentalmente, em duas componentes: a componente de detecção e a componente de intervenção. A primeira actua no âmbito da obtenção dos dados e informação sobre as diversas actividades desenvolvidas no espaço marítimo nacional, por forma a identificar as actividades ilícitas que põem em causa a vida humana, que prejudicam o ambiente, os recursos naturais e, sobretudo, que conflituam com a soberania ou jurisdição do Estado. Já a componente de intervenção actua no âmbito do exercício de fiscalização e patrulhamento no mar, de operações SAR ou de repressão das actividades ilícitas no espaço marítimo nacional194. 30. Importância do meio marítimo para a utilização sustentável dos nossos recursos marinhos Um meio marinho saudável é condição sine qua non para que Angola tire pleno partido do potencial do seu mar. A sua deterioração reduz a capacidade de os oceanos gerarem rendimento e emprego, afectando significativamente as actividades económicas e marítimas, entre as quais 193 Idem, os Vessl Traffic Services (VTS) representam a maior importância que tem sido dada à segurança marítima, quer em termos de security e safety, quer na consciência de garantir um conhecimento tão completo quanto possível das actividades que têm lugar nos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição dos Estados ribeirinhos, a fim de salvaguardar os interesses nacionais económicos, de segurança e defesa, e de afirmação no quadro internacional. 194 Tchindele, Daniel Mango – O exercício da autoridade do Estado no Mar: análise do Sistema de Autoridade Marítima de Angola, proposta de criação de um novo sistema, p. 76 s. 111 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO o transporte marítimo e os portos, o turismo costeiro e marítimo, a aquicultura e a pesca. Conservar um meio marinho saudável significa manter a diversidade biológica nos níveis de população, de espécies, genéticos e de habitat, bem como a manutenção dos processos ecológicos que apoiam a diversidade biológica e a produtividade dos recursos [al. g) do art.º 63.º, da Lei n.º 6-A/04]. Os recursos necessários para um sector das pescas dinâmico só podem ser assegurados se os níveis das unidades populacionais permitirem uma exploração sustentável195. A protecção do meio marinho exige uma acção imediata. Para tal, as políticas das pescas e do ambiente devem ser vistas como parceiros que lutam por objectivos comuns com base nas ciências biológica e tecnológica, visando alcançar um bom estado ecológico do meio marinho angolano, a satisfação das necessidades, em especial alimentares, dos cidadãos, e salvaguardando a possibilidade de satisfação das necessidades das gerações futuras. Importa sublinhar que Angola carece de uma estratégica temática para a protecção do meio marinho, pilar ambiental da futura política marítima, que será útil para definir os quadros que permitirão reger todas as utilizações do mar nacional, cujo objectivo final consiste na busca de um meio marinho saudável. A estratégia em questão deve introduzir o princípio de um ordenamento espacial baseado na gestão dos recursos biológicos, ecológicos e dos ecossistemas (art.º 64.º, al. a) da Lei n.º 6-A/04). A introdução deste princípio poderá levar à designação de mais zonas marinhas protegidas, assegurará a sustentabilidade de longo prazo dos mananciais biológicos aquáticos e promoverá a sua utilização óptima, em especial, prevenindo a diminuição da dimensão de qualquer pescaria abaixo dos níveis que assegurem a renovação sustentável, tendo em conta os factores ecológicos e económicos [al. h), do art.º 63.º da Lei n.º 6-A/04]. A política de segurança marítima é uma das preocupações do Governo angolano que, nos últimos anos, tem vido adoptar medidas de reestruturação da política funcional, legislativa e estratégica em matéria da Defesa 195 Artigos 6.º, n.º 3, al. b), 9.º, al. e) e 63.º al. h) da Lei n.º 6-A/04, de 8 de Outubro, Lei dos Recursos Biológicos e Aquáticos; Livro Verde, op. cit., p. 11. 112 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL Nacional196. Entende Damião Capitão Ginga que «o conjunto dos objectivos nacionais permanentes no âmbito da Segurança e Defesa não podem ser resultantes diretos do enunciado geral, simples e vago das finalidades últimas da actividade política, mas sim do conjunto de interesses nacionais expressamente sublinhados pelos diplomas jurídico-legais que desenham os objectivos da Estrutura Superior Segurança e Defesa Nacional»197. Pelo exposto, percebe-se que o âmago da política marítima nacional deve procurar uma compreensão mútua e uma visão comum das diferentes políticas sectoriais marítimas, a fim de alcançar o desenvolvimento económico marítimo sustentável, que será o principal repto para a futura política para o mar. As questões da política de sustentabilidade ambiental são uma preocupação transversal da Estratégia de Longo Prazo Angola 2025 (ELP 2025)198, que estabelece como objectivo geral assegurar a existência e manter a qualidade dos recursos da natureza, garantindo o seu uso saudável para as gerações actuais e futuras, através de um quadro legal e institucional apropriado e de adequada gestão, envolvendo forte participação da sociedade. Para a concretização desse objectivo, são definidos como objectivos específicos: preservar os recursos da biodiversidade; evitar a destruição de ecossistemas e a descaracterização dos biomas, especialmente aqueles que são únicos ao País; assegurar o uso sustentável dos recursos renováveis, respeitando as suas taxas de regeneração; controlar as emissões poluentes e o lançamento de dejectos, respeitando a capacidade de absorção do ambiente e impondo regras para a emissão de CO2, de aerossóis e outros gases tóxicos, minimizar os impactos ambientais causados pela exploração do petróleo, diamantes, gás natural e outros recursos não-renováveis; adoptar um conjunto de leis e edificar instituições que garantam o respeito dos recursos naturais, enquanto bens públicos necessários ao desenvolvimento económico e ao bem-estar da população angolana. 196 Nesta conformidade, Decreto Presidencial n.º 108/18, de 25 de Abril que aprova o Livro Branco de Defesa Nacional. 197 GINGA, Damião Fernandes Capitão, op. cit., p. 177. 198 ANGOLA. Ministério da Economia e Planeamento – Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022. Vol. I, pp. 180. Disponível para consulta em: https://www.info-angola. com/attachments/article/4867/PDN%202018-2022_MASTER_vf_Volume%201_13052018. pdf. 113 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO De igual forma, a política ambiental procura respeitar os objectivos da Agenda 2063 da UA, em particular: o Desenvolvimento da Economia Azul para um crescimento económico acelerado para o qual são definidas, como áreas prioritárias, os recursos marinhos e a energia e as operações portuárias e o transporte marítimo; as comunidades e economias ambientalmente sustentáveis e resilientes aos factores climáticos, cujas áreas prioritárias compreendem a gestão sustentável de recursos naturais; a conservação da biodiversidade; os recursos genéticos e ecossistemas; padrões de consumo e produção sustentáveis; a segurança da água, a resiliência climática; a prevenção e resposta a desastres naturais e as energias renováveis199. Relativamente às actividades humanas que possam gerar risco ou danos ambientais marinhos, como a generalidade das actividades industriais, afirmam expressamente António Cortês e Armando Rocha que «a solução passará, antes, pela busca criativa de soluções responsáveis que permitam conjugar a exploração e recursos naturais marinhos com a subsistência desse ecossistema específico, ou, numa linguagem jurídica, que permitam a concentração dos princípios da protecção e preservação do ambiente marinho e da liberdade de exploração dos recursos naturais marinhos»200. Em larga medida, para os referidos autores, os desafios da protecção jurídica do ambiente marinho prendem-se com a expressa incerteza que existe em relação à identificação e quantificação dos efeitos da acção humana, ao momento em que esses efeitos se farão sentir, e ao local onde se manifestarão201. Por fim, atendendo a que a maior parte das zonas marítimas angolanas e os seus recursos ainda não foram descobertos e explorados, reiteramos que, para se estabelecer elos entre diferentes políticas do sector marítimo, é essencial, antes, explorar plenamente a avaliação e identificação dos riscos da acção humana na elaboração da política marítima com vista à protecção, preservação e utilização sustentável dos nossos recursos marinhos. 199 Idem. CORTÊS, António; ROCHA, Armando – O princípio de protecção do ambiente marinho na ordem jurídica global. In GARCIA, Maria da Glória [e tal.] (coord.) – Direito do Mar: novas perspectivas, p. 38. 201 Idem, p. 39. 200 114 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL 31. A articulação de uma estratégia angolana para o Mar A Estratégia Nacional para o Mar (ENM) constitui um instrumento político fundamental para que Angola possa proteger e valorizar o inestimável recurso marinho existente nas águas marinhas nacionais, respondendo, simultaneamente, aos desafios internacionais e promovendo os objectivos do sector marítimo. A posição geoestratégica do espaço marítimo e a dimensão da costa marítima sob soberania e/ou jurisdição nacional impõem importantes desafios e responsabilidades nas áreas da defesa nacional, segurança e vigilância marítima, imigração ilegal, pesca ilegal (não regulada e não declarada), tráfico de drogas, crimes contra a biodiversidade, mas encerra, também, um conjunto de oportunidades de desenvolvimento económico que importa aproveitar. Sugere-se que a ENM seja implementada através de um diálogo com todas as partes interessadas e orientada para a acção, coordenação e articulação, clarificando, simplificando e acelerando os procedimentos para os agentes económicos, tendo por base uma informação técnico-científica sólida, bem como o respeito dos princípios e acordos internacionais assumidos por Angola. A definição das acções e medidas prioritárias da Estratégia Nacional para o Mar dá sequência ao trabalho que Angola tem vindo a fazer a nível nacional e internacional202. A mais-valia para a estratégia será a abordagem integrada da governação dos assuntos do mar, que congregue os esforços das diferentes tutelas, dos agentes económicos, das comunidades científicas, das organizações não governamentais e da sociedade civil, co-responsabilizando todos os actores para o aproveitamento do mar como factor diferenciador do desenvolvimento económico e social, valorizado e preservando este património. 202 Serve de referência a algumas actividades realizadas, o seminário sobre a Estratégia Marítima Integrada da Região do Golfo da Guiné, realizada em Luanda, nos dias 23, 24 e 25 de Julho de 2019; Workshop sobre Formulação de uma Estratégica Marítima Nacional, realizado , nos dias 15 e 16 de Novembro de 2018 e Conferência Internacional sobre a Segurança Marítima e Energética, realizada em Luanda, nos dias 7 e 8 de Outubro de 2015; a subscrição de Angola, em 2015, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. 115 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Convém tornar bem claro que esta estratégia não é a solução para todos os problemas e que só poderá alcançar os seus objectivos se o mar for considerado por todos como um verdadeiro projecto nacional. O Estado tem um papel facilitador e promotor de condições de desenvolvimento económico e social, mas o papel principal na concretização dos objectivos que são a razão de ser desta ENM cabe às empresas e à sociedade civil. «A obtenção de resultados tangíveis só será perceptível em alguns casos a médio e longo prazo, exigindo por isso uma aposta rápida, mas persistente nas áreas ligadas à educação, capacitação de meios humanos, criação e optimização de infra-estruturas e investigação e desenvolvimento»203. É necessário ter presente que a realidade económica e financeira actual terá travado o processo de reestruturação da Administração Pública em curso e os recursos nacionais disponíveis, condicionando a ENM a ser orientada por uma abordagem ambiciosa, mas realista, assumindo um carácter prático e exequível, inclusivo, envolvendo as entidades públicas e privadas ligadas ao mar, bem como toda a sociedade civil, reforçando a vontade de participação responsável e de cooperação na resolução activa dos problemas. Sugere Damião Capitão Ginga que «Para a materialização e elaboração de uma Estratégia Marítima Angolana deverão ser ponderados todos elementos relativos a dimensão marítima interna (infra-estruturas, políticas públicas, etc.), tornando-se então fundamental que o tratamento seja feito de maneira transversal e integral dos diversos assuntos e actividades que concorrem na edificação do sector marítimo»204. A necessidade deste instrumento é sentida em áreas onde existe sobreposição de jurisdição e competências de várias autoridades que, em acréscimo, se encontram divididas pelos vários níveis da administração local, regional e central, sendo particularmente evidente nas áreas de interface entre mar e terra205. Todavia, é necessário apontar os principais caminhos e criar uma estrutura de coordenação dos assuntos do mar que se adeque a um país em 203 Estas observações também constam na Estratégia Nacional para o Mar (2006-2016), publicado pelo Ministério Defesa Nacional, p. 7. 204 GINGA, Damião Fernandes Capitão, op. cit., p. 360. 205 Questões debatida no Workshop sobre Formulação de uma Estratégica Marítima Nacional, realizada, nos dias 15 e 16 de Novembro de 2018. 116 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL aprendizagem na matéria, com possibilidade de aproveitar todo o potencial que o seu mar encerra, para a geração presente e para as gerações futuras. De destacar que o objectivo central a atingir com a Estratégia Nacional para o Mar deve ser o de aproveitar melhor os recursos do oceano nacional e suas zonas costeiras, promovendo o desenvolvimento económico e social de forma sustentável e respeitadora do ambiente, através de uma coordenação eficiente, responsável e empenhada que contribua activamente para a Agenda Internacional dos Oceanos. Um objectivo com este alcance deve adoptar-se como um projecto nacional que conjugue e valorize o crescimento das actividades económicas, o emprego e a coesão social, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida dos angolanos, para o respeito, a protecção e a manutenção do património natural e cultural e das condições ambientais para as gerações vindouras, alicerçado em valores e princípios globais reconhecidos no seio das Nações Unidas, da União Africana e noutros fora internacionais. Face ao enquadramento nacional e internacional, a formulação da ENM dará prioridade ao desenvolvimento de conhecimento, competências e ferramentas de gestão partilhada que permitam abordar as causas dos problemas e não apenas os seus sintomas. Para isso deve-se criar uma estrutura de coordenação dos assuntos do mar que promova a articulação de políticas, a definição de rumos estratégicos, a clarificação de áreas de acção e competências, acrescentando valor aos objectivos sectoriais, fazendo que o resultado global seja mais do que a soma dos resultados meramente sectoriais206. Dado o seu carácter horizontal, a implementação da ENM exige para além das responsabilidades de cada organismo competente a nível sectorial, a criação de uma estrutura de coordenação que assegure a necessária coerência das acções, promovendo a complementaridade das políticas sectoriais e criando mecanismos de valorização dos objectivos partilhados e incentivos a acções conjuntas. É fundamental que a estrutura de coordenação a criar apoie o Ministério das Relações Exteriores, contribuindo eficazmente para a preparação das posições angolanas a apresentar nos diversos fora internacionais, de forma a maximizar a articulação e coerência de acção de Angola. 206 Estratégia Nacional para o Mar (2006-2016), op. cit., p. 11. 117 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Em suma, na situação actual, é necessária uma política de racionalização e qualificação dos recursos humanos disponíveis, importando, desde logo, considerar todos os agentes relevantes como recursos humanos necessários ao desenvolvimento da ENM. Bem assim, a Estratégia Nacional para o Mar não pode ser implementada, tendo em conta a inoperância do sistema integrado de vigilância, a falta de meios que possibilitem uma eficaz e articulada vigilância marítima, a salvaguarda contra riscos do meio marinho e ameaças aqui invocadas. 32. Medidas de segurança e defesa no espaço marítimo nacional A defesa nacional corresponde a um conceito alargado e multissectorial, resultado da sua natureza, conforme expresso no art.º 206.º da Constituição e art.º 1.º da Lei n.º 2/93, de 26 de Março, Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas. Assim, a defesa surge como um conjunto de medidas e de actividades que contribuem para assegurar que uma dada sociedade possa responder com eficácia e presteza às ameaças e aos riscos207. O mar nacional tem sido palco de desenvolvimento de actividades criminosas e ilícitas, que minam a segurança e estabilidade nacional. Esta situação é fomentada pela incapacidade de garantir a salvaguarda da soberania e/ou jurisdição do imensurável espaço marinho contra as ameaças e riscos decorrentes no mar. Da amplitude destas ameaças e riscos derivam os elementos que devem contribuir para a capacitação e o robustecimento da segurança e defesa. Apesar da restruturação, do redimensionamento e reequipamento feito no quadro das Reformas do Sector de Segurança, das Reformas do Sector da Defesa, sobretudo, na Marinha de Guerra Angolana, essas reestruturações ainda são insuficientes, por falta de capacidade técnica e de recursos humanos devidamente habilitados e capacitados nas unidades navais, o que representa uma das maiores vulnerabilidades na segurança e defesa do espaço marítimo nacional, bem como um fracasso frente aos desafios e objectivos da Estratégia Nacional para o Mar. 207 DUARTE, António Paulo [et al.] – Documento de apoio: referencial de educação para a segurança, a defesa e a paz: as Forças Armadas e as forças e serviços de segurança, p. 4. 118 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL Reconhecemos que a defesa no espaço marinho só funcionará se a sua capacidade for assegurada pelo poder dissuasório, visando garantir uma resposta atempada e eficaz aos riscos e ameaças. Por conseguinte, esta constatação é intrínseca à ideia de defesa: quanto maior for a capacitação dos meios que podem e devem responder às ameaças e riscos, mais eficaz será a resposta que darão, garantindo a celeridade e o menor dispêndio de cada intervenção208. Para alguns autores209. um país como Angola, que se posiciona entre uma potência pequena e uma potência média, os assuntos relacionados com a segurança e defesa devem constituir responsabilidade de todos, dado que, na actual conjuntura internacional, o melhor ou menor aproveitamento das acessibilidades marítimas e da dimensão dos mares e oceanos, como vectores de desenvolvimento, ditam o posicionamento geopolítico e geoestratégico de qualquer Estado ribeirinho. Nesta ordem de ideias, entendemos que Angola tem tirado pouco proveito (muito menos do que devia) do seu posicionamento geopolítico e geoestratégico, pois, tal como opinam Eugênio Costa Almeida e Luís Manuel Bernardino, a temática da defesa e segurança nacional e regional em que Angola tem assento no quadro das Organizações Regionais Africanas, nomeadamente a Comunidade Económica dos Estados da África Central (CEEAC) e a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) ainda está condicionada a uma pura reflexão geoestratégica dos analistas e estudiosos angolanos, mormente, quando os assuntos se relacionam com a acção político-estratégica ou com os assuntos delicados da soberania do Estado210. Com maior prudência, Armindo Bravo da Rosa considera que as temáticas da defesa e segurança à luz de um conceito mais amplo, pois que as profundas mudanças introduzidas na última década do século xx, no cenário internacional, apesar de abrirem novas oportunidades na cooperação entre 208 Idem. ALMEIDA, Políbio Fernando Amaro Valente de – Ensaios de geopolítica, pp. 14-17. 210 ALMEIDA, Eugênio Costa; BERNARDINO, Luís Manuel – Uma reflexão estratégica sobre a segurança e defesa em Angola e a intervenção no contexto regional subsaariano. Revista Sol Nascente, p. 47; mesmo autores, A Comissão do Golfo da Guiné e a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul. Revista Militar., pp. 43-61. 209 119 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO as nações e não só, e ter trazido a retracção gradual dos níveis de hostilidade directa entre determinadas potências, ainda persistente a hostilidade indirecta, uma vez atenuada as ameaças clássicas tradicionais de cariz militar e ameaças assimétricas, que fazem surgir outros factores de instabilidade, traduzidos em novos riscos e potenciais ameaças […]211. Relativamente aos meios de protecção utilizados para defesa e segurança à soberania ou jurisdição no espaço oceânico nacional, como sabemos, a Marinha de Guerra não dispõe de meios técnicos e humanos habilitados que possam executar missões de soberania marítima (principalmente de vigilância) e a segurança marítima ‒ numa orla costeira com dimensão de cerca de 1650 km de extensão e em todo espaço oceânico nacional ‒, sendo que o patrulhamento nas águas nacionais é feito através navios de pequeno e médio porte, tais como lanchas e patrulhas de fiscalização212. Importa referir que o Governo angolano tem vindo a realizar um grande investimento na Marinha de Guerra Angolana, desde o registo do crime de sequestro de um navio-tanque contratado pela Sonangol carregado de crude ocorrido a 12 milhas da costa angolana, em Janeiro de 2014. Todavia, é de se esperar que o desenvolvimento e expansão da Marinha de Guerra esteja travado devido actual crise económica e financeira que o país vive. Sabe-se que Angola tem especial interesse em participar activamente na segurança e defesa da Região do Golfo da Guiné, a fim de preservar a sua própria segurança. No entanto, a inserção da Angola na CEEAC (através do ramo militar COMFORCE) e na SADC confere-lhe uma dicotomia, simultaneamente, de responsabilidade e de intencionalidade na salvaguarda dos interesses regionais ao nível da segurança e defesa, principalmente, marítima e aérea. Neste contexto, Eugênio Costa Almeida e Luís Manuel Bernardino vêm dizer que «ainda que a importância em que se reveste a presença de Angola seja grande, quase que fundamental, para a defesa das rotas marítimas de e para Angola, bem como para a defesa das suas zona 211 ROSA, Armindo Bravo da – Política de defesa de Angola. Revista Nação e Defesa., pp. 73-74. 212 Na realidade, as generalidades dos meios da Marinha de Guerra angolana estão adstritas ao Ministério das Pescas, actualmente Ministério da Agricultura Pescas e Mar. 120 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL territorial e zona económica exclusiva, o país não dispõe uma Marinha de Guerra que possa assegurar a sua segurança de forma a se considerar, minimamente, admissível»213. Sem embargo do que ficou dito, em suma, essa abordagem eleva-nos a ideia de uma defesa multidimensional e multissectorial, com a respectiva coordenação e integração a abarcar múltiplos domínios e actividades humanas, cada um deles a reforçar, mutuamente e de forma sinergética, as capacidades que a defesa tem em responder às ameaças e riscos e as medidas que tendem a reforçar os meios e as capacidades ao dispor da defesa. SECÇÃO II A biodiversidade e o ecossistema marinho 33. Razão de ordem Angola é um dos mais importantes centros de biodiversidade marinha e uma das áreas mais produtivas em recursos haliêuticos do mundo, tornando-se um dos países mais importantes do continente africano, particularmente em relação à variedade de ecossistemas, ao grau de endemismo de espécies e à diversidade de flora. A linha da sua costa é de grande importância para os processos ecológicos e pela fauna e flora que alberga. A postura do nosso país perante a responsabilidade internacional de protecção do oceano e de preservação dos seus ecossistemas e biodiversidade deve consistir em segurar o bom estado ambiental214 de todas ALMEIDA, Eugênio Costa; BERNARDINO, Luís Manuel, op. cit., p. 49. O conceito de «bom estado ambiental» é definido pela Directiva-Quadro Estratégica Marinha (Directiva 2008/56/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho de 2008) como a conservação da biodiversidade ou a atenuação das pressões antropogénicas, as quais incluem a pesca, os danos no leito marinho, o lixo marinho e os contaminantes, através de descritores (os 11 descritores qualitativos são definidos no Anexo I da DirectivaQuadro Estratégia Marítima e especificados na Decisão da Comissão 2017/848UE, sendo os seguintes: D1 – Biodiversidade, D2 – Espécies não indígenas, D3 – Peixes e moluscos explorados comercialmente, D4 – Cadeias alimentares, D5 – Eutrofização, D6 – Integridade dos fundos marinhos, D7 – Alteração das condições hidrográficas, D8 – Contaminantes, D9 213 214 121 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO as águas marinhas nacionais, através da fixação de metas ambientais apropriadas e da elaboração de programas de monitorização adequados à execução das metas e medidas e à sua eficácia. Para obter informações rigorosas que contribuam para a adopção de futuras medidas ou para a aplicação de programas de monitorização, urge a necessidade de realizar estudos de investigação215, a fim de se criar redes coerentes e representativas de zonas marinhas protegidas, particularmente, as associadas à pesca ou à protecção de certos habitats. A abordagem ecossistémica encontra-se sistematizada no leque do princípio geral do ordenamento do espaço marítimo. As actividades humanas no mar exercem pressões que afectam a vida marinha e os habitats, bem como as funções essenciais dos nossos oceanos216. Pode parecer paradoxal, porém, a inexistência de legislação complementar e a não-ratificação de alguns Acordos Multilaterais de Ambientes, que não são os principais obstáculos à protecção e conservação do ecossistema e da biodiversidade marinha – o verdadeiro motivo prende-se com a deficiente aplicação das legislações e com a falta de uma política clara e estratégias sectoriais. Contextualizado as razões do tema desta secção, descreveremos em termos de ecossistema e biodiversidade em Angola, particularmente da gestão da biodiversidade e dos ecossistemas para o equilíbrio ecológico, o desenvolvimento económico e social e a partilha justa e equitativa dos benefícios provenientes desses recursos, bem como a protecção do ambiente marinho. 34. Gestão da biodiversidade e dos ecossistemas marinhos Entende-se por biodiversidade «a variabilidade entre os organismos vivos de todas as origens, incluindo, inter alia, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos dos – Contaminantes nos peixes e mariscos, D10 – Lixo, Energia, incluindo o ruído submarino, D11 A introdução de energia, incluindo ruído submarino. 215 Alíneas a) e b) do art.º 128.º e n.º 1, do art.º 142.º da Lei n.º 6-A/04, de 8 de Outubro, Lei dos Recursos Biológicos Aquáticos. 216 Primeiro parágrafo da Directiva-Quadro Estratégica Marinha, p. 1. 122 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL quais fazem parte; compreende a diversidade dentro de cada espécie, entre as espécies e dos ecossistemas» e por ecossistema «um complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais e de microrganismos e seu ambiente não vivo, interagindo como uma unidade funcional». Conceitos estatuídos no texto do art.º 2.º da Convenção sobre a Diversidade Biológica (ratificado por Angola em Abril de 1998)217 e art.º 1.º da Convenção da Corrente de Benguela (esta última prevê apenas a definição de ecossistema). A informação sobre a biodiversidade em Angola é escassa, pelo que a investigação é considerada uma prioridade para o incremento do conhecimento que permita a sua gestão efectiva. Importa referir que o conhecimento existente sobre a biodiversidade em Angola está disperso por várias agências sectórias e indivíduos, sob a forma de projectos, relatórios, artigos científicos, mapas, fotografias aéreas e imagens de satélite, acrescido do facto de alguns documentos e informações sobre a biodiversidade angolana, realizados na época colonial, encontrarem-se fora do País. Portanto, de acordo com a Estratégia e o Plano de Acção Nacional para a Biodiversidade (para a conservação desta biodiversidade), as decisões dos organismos de gestão deverão basear-se em informação actualizada e detalhada218. Lamentavelmente, assim não sucede por falta de amplitude na divulgação de informação e acesso à mesma, obtida através de acções de investigação sobre a biodiversidade em Angola, impedindo o estudo para uma boa gestão e uma adequada conservação dessa biodiversidade. As áreas de protecção ambiental criadas ainda no tempo colonial para a conservação de habitats e de espécies particulares estão hoje postas em causa, sem administração, nem fiscalização adequadas e com infra-estruturas degradadas, resultando no facto de grande parte das espécies protegidas estarem em sérios riscos de extinção. Nesta senda, foram definidas oito áreas estratégicas, através de um processo de consulta 217 Adaptada no Rio de Janeiro, a 5 de Junho de 1992; a Assembleia Nacional aprovou, em 2001, a Convenção sobre o Comércio de Espécies da Fauna e da Flora em Extinção (CITES) e, em 2002, o Protocolo de Cartagena sobre a Biossegurança (um acordo suplementar da Convenção sobre a Diversidade Biológica). 218 Neste sentido, a Resolução n.º 42/06, de 26 de Julho, que aprova a Estratégia e o Plano de Acção Nacional para a Biodiversidade, publicado no Diário da República, I série n.º 90, p. 1500. 123 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO pública que envolveu representantes de instituições governamentais, autoridades locais e tradicionais, associações do ambiente, sector de ensino, sector privado e imprensa219. Entretanto, no âmbito do projecto de Gestão e Governação Espacial Marinha220, que está a ser desenvolvido pelo Programa de Acção Estratégica da Convenção de Benguela 2019-2021, o Grupo de Coordenação do Ordenamento do Espaço Marinho propôs a delimitação de cinco novas Áreas Marinhas de Importância Ecológica ou Biológica, nas seguintes zonas: Chiloango (província de Cabinda); Ponta Padrão e Soyo (província do Zaire); Longa e Amboim (província do Cuanza Sul); Ombaka (província de Benguela) e Bentiaba (província do Namibe)221. Desconhecemos a distribuição das actividades a serem exercidas em cada área, mas, sabendo do potencial das referidas zonas, cremos que as mesmas são ou serão definidas para a prática de pesca e aquicultura. Na costa angolana, existem espécies protegidas como as tartarugas marinhas que nidificam em praias tranquilas e que têm registado um declínio, sendo uma das prováveis causas para tal a perturbação de zonas de praia, a captura directa, o assalto aos ninhos e a exploração de inertes. Igualmente, as aves marinhas mais representativas ao longo da costa do país, como por exemplo, o Atoba-do-cabo, a Pardela preta, o Corvo-marinho-do-cabo, o Albatroz-de-bico-amarelo-do-atlântico, a Ardena grisea e o Albatroz-de-sobrancelha, estão listadas como vulneráveis e em risco, necessitando de medidas especiais de conservação222. Uma dezena das espécies de mamíferos marinhos, dos quais baleias, cachalotes, orcas e golfinhos encontram-se em ameaça e risco de sobrevivência, sobretudo, o manatim que está sujeito a capturas voluntárias e Idem, p. 1499. Este projecto é financiado pelo Governa da Alemanha, com um valor de 8,9 milhões de dólares, correspondente a 7,7 milhões de euros, informação disponível em: https://www. dn.pt/lusa/angola-vai-delimitar-mais-cinco-areas-de-importancia-ecologica-9722724.html, consultado em 14/07/2020. 221 Idem. 222 Vide tabela 5 em BENGUELA CURRENT CONVENTION – Ameaças induzidas por humanos às tartarugas,aves marinhas e outras espécies vulneráveis;visão geral, análise de necessidades eidentificação das partes interessadasÁfrica do Sul: preparado para Convenção da Corrente de Benguela, p. 18. 219 220 124 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL involuntárias223. Das 57 espécies de peixes cartilagíneos (tubarões e raias) que ocorrem nas águas costeiras angolanas cerca de 12 estão classificadas como espécies que merecem medidas particulares de conservação224. A população dos lobos marinhos (Arctocephalus pusillus) na região da corrente de Benguela encontra-se estimada em 2 milhões, sendo promovida, activamente, a plena protecção destas espécies, questionando-se a capacidade de estabelecer um sistema de utilização sustentável225. Outras espécies que também enfrentam grandes riscos e ameaças são as baleias jubarte (Megaptera novaeangliae) – por viver ao longo do litoral tornam-se motivo de preocupação nas explorações de petróleo e gás e actividade haliêutico, incluindo as rotas comerciais de navios. 226 Importa salientar que, no litoral de Benguela, habitam as associações de foraminíferos bentónicos e planctónicos, sendo que as condições ambientais a que tais associações estão sujeitas, como, por exemplo, a contaminação de origem antrópica, estão a pôr em risco o desenvolvimento destas e outras populações que ali vivem, contribuindo para a degradação dos habitats que integram o Grande Ecossistema Marinho da Corrente Fria de Benguela227. É nas águas de Benguela que encontramos o Grande Ecossistema Marinho da Corrente Fria de Benguela228 visto como sangue vital do Atlântico Sul e que apoia um importante reservatório global de biodiversidade e biomassa de zooplâncton, peixe, aves marinhas e mamíferos 223 Vide tabela 4 que alista as espécies de mamíferos marinhos que se encontram em risco de sobrevivência ao longo da costa angolanaAmeaças induzidas por humanos às tartarugas,aves marinhas e outras espécies vulneráveis;visão geral, análise de necessidades eidentificação das partes interessadasÁfrica do Sul: preparado para Convenção da Corrente de Benguela, p. 14. 224 Resolução n.º 42/06, de 26 de Julho, que aprova a Estratégia e o Plano de Acção Nacional para a Biodiversidade, publicado no Diário da República, I série n.º 90, p. 1449 225 Idem p. 14. 226 Idem, p. 15. 227 Sobre este assunto, vide HENRIQUES, M. H.; CANALES, M. L.; MBADU, E., op. cit., p. 199-208. 228 O Grande Ecossistema Marinho da Corrente de Benguela é definido como «o grande ecossistema marinho associado com a Corrente de Benguela e caracterizado pela distinta batimetria, hidrografia, produtividade e populações dependentes de tróficos, na área da aplicação desta Convenção», texto do art.º 1.º da Convenção da Corrente de Benguela. 125 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO marinhos, sendo a pesca, aproximadamente, seis vezes mais produtiva que a do mar do Norte. A região da Corrente Fria de Benguela abrange as águas costeiras, desde bacias hidrográficas e estuários até à fronteira marítima das plataformas continentais e as margens externas das correntes costeira. É uma região relativamente ampla, em torno de 200 000 km2, definida pela sua topografia submarina ou batimetria, profundidade e composição do fundo do mar ou hidrografia, produtividade de suas pescaria e composição de sua cadeia alimentar natural. Em todo mundo, 80 % da pesca marítima global é proveniente desses ecossistemas229. De lembrar que, durante o período de guerra, uma profusão de frotas estrangeiras pescava nas águas nacionais, particularmente na região da Corrente Fria de Benguela -- as consequências foram a migração da população para a costa e a pressão localizada sobre os recursos marinhos e costeiros (por exemplo, destruição de florestas e manguezais costeiros) e a poluição severa do ecossistema. No entanto, os três países que integram a região (Angola, Namíbia e África do Sul) fizeram uma análise diagnóstica transfronteiriça da situação em que se encontrava os ecossistemas marinhos que identificou e investigou as causas dos impactos negativos na região e construiu uma estrutura comum para encontrar soluções. Os diálogos nacionais iniciaram o processo de alinhamento de diferentes ministérios relacionados com as actividades terrestres e hídricas para trabalhar de maneira integrada e baseada no ecossistema. Após aproximadamente duas décadas de investigação, consulta e negociação no sentido de proteger a biodiversidade, manter a integridade dos ecossistemas e minimizar os riscos dos impactos irreversíveis a longo prazo, causados pelas actividades humanas, os Estados da região assinaram a Convenção da Corrente de Benguela, na qual reconhecem o carácter único do Grande Ecossistema Marinho da Corrente de Benguela, a riqueza e a complexidade do seu funcionamento físico e biológico, o seu significado para o desenvolvimento socioeconómico e para o bem-estar das populações dele dependente e as ameaças ao mesmo230. 229 The Benguela current, GEF. 2016. [Consult. 2020-05-08]. Disponível em: https:// www.thegef.org/news/benguela-current. 230 Primeiro parágrafo do preâmbulo da Convenção da Corrente de Benguela, assinada em Benguela, aos 18 de Março de 2013. 126 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL No cerne da Convenção reside o conceito de uma abordagem ecossistémica a longo prazo, que visa manter os bens e serviços do ecossistema para efeitos de utilização sustentável, ao mesmo tempo que se reconhece que os seres humanos são parte integral do processo. Este instrumento fixa três prioridades, designadamente a minimização da poluição marinha, quer de fontes baseadas em terra, quer de exploração mineira marinha e das indústrias de extracção de petróleo; a harmonização de políticas, leis e regulamentos, por forma a que as actividades industriais de um país não impactam o meio ambiente costeiro e marinho de outro país; e a gestão transfronteiriça dos recursos pesqueiros, incluindo a monitorização e controlo das actividades piscatórias231. A Convenção da Corrente de Benguela estabelece a Comissão da Corrente de Benguela232 (que já existia desde Janeiro de 2007) como uma organização intergovernamental permanente, que tem como base o conceito de governação oceânica de um Grande Ecossistema Marinho, rumo à gestão dos recursos a uma escala maior do ecossistema e do equilíbrio das necessidades humanas, relativamente aos imperativos de conservação. Para efeitos do objectivo da Convenção, foram atribuídas funções à Comissão, nos termos do art.º 8.º da CCB, nomeadamente promover, tanto quando possível, a harmonização, implementação e execução das políticas e leis vigentes, implementação e execução das políticas e leis vigentes relacionadas com a conservação e gestão dos recursos marinhos transfronteiriços e do ambiente; incentivar a harmonização de medidas de conservação e gestão dos recursos marinhos e do ambiente; promover e apoiar programas de investigação relacionados com os recursos marinhos transfronteiriços e o ambiente; promover a recolha, intercâmbio, divulgação e análise dos dados e informações pertinentes, incluindo dados estatísticos, biológicos, ambientais e socioeconómicos; promover a colaboração na monitorização, controlo e vigilância, incluindo as actividades conjuntas na região da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC). Como medidas de execução, a Comissão está focada na gestão dos recursos haliêuticos partilhados, na avaliação e monitorização do 231 232 Quarto parágrafo da parte introdutória da referida Convenção. A Comissão da Corrente de Benguela está sedeada em Swakopmund – Namíbia. 127 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO ambiente físico, no estabelecimento de um sistema de informação sobre o ecossistema, bem como na gestão cooperativa da biodiversidade e da sua saúde do ecossistema233. Ainda há muito por se fazer para a protecção da biodiversidade, manutenção ecossistémica e minimizar o impacto negativo no meio marinho dentro da nossa área de soberania ou jurisdição marítima, uma vez que a zona marítima norte do país representa grandes ameaças e riscos de segurança que obstaculizam a gestão da biodiversidade e ecossistema da corrente quente da Guiné, que ocupa a totalidade da costa de Cabinda. 35. Poluição marinha resultante de hidrocarboneto A CNUDM define a poluição do meio marinho como a introdução pelo homem, directa ou indirectamente, de substâncias ou de energia no meio marinho, incluindo os estuários, sempre que a mesma provoque ou possa vir provocar efeitos nocivos, tais como danos aos vivos e à vida marinha, riscos à saúde do homem, entrave às actividades marítimas, incluindo a pesca e as outras utilizações legítimas do mar, alteração da qualidade da água do mar, no que se refere à sua utilização, e deterioração dos locais de recreio (parágrafo 4, do ponto 1, do art.º 1.º). Nos termos do ponto 2, do art.º 2.º da Convenção Internacional sobre a Cooperação e Combate Contra a Poluição para Hidrocarboneto (OPRC 1990), aderida por Angola através da Resolução n.º 33/01, publicado no Diário da República n.º 51, de 9 de Novembro, entende-se por incidente de poluição por hidrocarboneto234 233 Mais informações sobre a Comissão da Corrente de Benguela, vide o site: www. benguelacc.org 234 Nos termos do parágrafo quinto do art.º 2.º do Protocolo de 1992 à Convenção Internacional sobre a Responsabilidade Civil pelos Prejuízos devidos à Poluição por Hidrocarbonetos, 1969, «Hidrocarbonetos significa quaisquer hidrocarbonetos minerais persistentes, nomeadamente petróleo bruto, fuelóleo, óleo diesel pesado e óleo de lubrificação, quer sejam transportados a bordo de um navio, quer como carga, quer como combustível do navio». 128 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL um acontecimento ou uma série de acontecimentos com a mesma origem tendo como consequência uma descarga real ou presumível de hidrocarbonetos e constituíndo ou sendo susceptível de constituir uma ameaça para o meio marinho, para o litoral ou para os interesses conexos de um ou mais Estados, impondo-se uma acção urgente ou uma actuação imediata. Parte da poluição por hidrocarbonetos está relacionada com derrames que ocorrem durante as operações de carga e descarga dos hidrocarbonetos e por ruptura de condutas e vazamento nas plataformas de petróleo, por descargas ilegais ou acidentes. Grande parte destes acidentes são causados por erros humanos, todavia, para evitar derrames nas nossas águas é importante criar estratégias, tecnologias ou equipamentos que diminuam os riscos de acidentes e operações de combate à poluição do mar. Os eventos de poluição por hidrocarbonetos estão associados a acidentes em navios que levam ao derrame de grandes quantidades de hidrocarbonetos, o que motivou a comunidade internacional a elaborar uma convenção que estabelece regras de prevenção, controlo da poluição marinha e protecção do meio marinho [Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (MARPOL 73/78), aderida por Angola através da Resolução n.º 41/01, publicado Diária da República n.º 62, de 21 de Dezembro]. Actualmente, os navios petroleiros de porte bruto de certas dimensões estão obrigados, antes de entrarem em serviço ou emissão, a vistoria inicial, vistorias periódicas e vistoria intermédia. Esta última permite assegurar que os equipamentos, os sistemas de bombagem e de encanamentos associados, incluindo os monitores de descarga de hidrocarbonetos, sistemas de lavagem com petróleo bruto, os equipamentos separadores hidrocarbonetos/água e os equipamentos de filtragem de hidrocarbonetos cumpram integralmente os requisitos e estão em boas condições de funcionamento (regra 4 da Convenção MARPOL 73/78). Entretanto, no caso de se verificar a poluição marinha por hidrocarboneto, os proprietários de navios235, pelos danos resultantes do derrame 235 Entende-se por navio «qualquer embarcação marítima ou engenho marítimo seja de que tipo for, construído ou adaptado para o transporte de hidrocarbonetos a granel como carga, desde que se trate de um navio com capacidade para o transporte de hidrocarbonetos 129 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO de hidrocarbonetos provenientes de navios-tanque, são responsabilizados objectivamente e não dependem, por isso, da existência de culpa ou negligência da sua parte pelos danos; dito doutro modo, a responsabilidade do proprietário está limitada a um montante calculado em função da arqueação do navio, nos termos do art.º 5.º da Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil pelos Prejuízos devidos à Poluição por Hidrocarbonetos, adoptada em Bruxelas, em 29 de Novembro de 1969, alterada pelo protocolo assinado em Londres, em 27 de Novembro de 1992, aderido por Angola através da Resolução n.º 32/01, publicado no Diário da República n.º 50, de 1 de Novembro. Nos termos da al. a) do artigo 3.º, do Protocolo de 1992 relativo à Convenção acima mencionada, a responsabilidade civil é aplicada aos prejuízos devidos à poluição causados no território, incluindo no mar territorial de um Estado contratante e na zona económica exclusiva desse Estado, estabelecida em conformidade com o direito internacional ou, eventualmente, numa área para além e adjacente ao mar territorial desse Estado, determinada por esse Estado em conformidade com o direito internacional, numa extensão não superior a 200 milhas náuticas contadas a partir das linhas de base utilizadas para determinar a largura do mar territorial. Tanto a Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil pelos Prejuízos devidos à Poluição por Hidrocarbonetos como a Convenção Internacional para a Constituição de um Fundo Internacional para Compensação pelos Prejuízos devidos à Poluição por Hidrocarbonetos, adoptada em Bruxelas, em 18 de Dezembro de 1971, alterada pelo Protocolo assinado em Londres, em 27 de Novembro de 1992 (aderida por Angola pela Resolução n.º 31/01, publicado pelo Diário da República n.º 49, de 26 de Outubro), estabeleceram um sistema de responsabilidade em dois níveis: a responsabilidade objectiva, mas limitada, do proprietário registado do navio, por um lado; por outro, o Fundo, financiado pelos e outros tipos de carga só de ser considerado quando transporte, efectivamente, como carga, hidrocarbonetos a granel assim como durante qualquer viagem que se siga àquele transporte, a menos que se prove que não existem quaisquer resíduos de hidrocarbonetos a bordo originados por aquele transporte a granel», conforme parágrafo primeiro do art.º 2.º do Protocolo de 1992 à Convenção Internacional sobre a Responsabilidade Civil pelos Prejuízos devidos à Poluição por Hidrocarbonetos, 1969. 130 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL destinatários dos hidrocarbonetos, que assegura uma compensação (indemnização) para as vítimas dos danos resultantes da poluição por hidrocarbonetos que não consigam obter do proprietário do navio uma indemnização integral. Por fim, independentemente de a concepção do princípio poluidor-pagador assentar na reparação integral do dano, esta compensação não favorece o meio marinho – como é sabido, os derrames de hidrocarbonetos prejudicam o ecossistema, constatando-se uma diminuição do nível de actividade fotossintética das algas e do fitoplâncton. Além dos efeitos físicos, a poluição por hidrocarbonetos tem efeitos químicos devido à toxicidade quando ingeridos e devido ao efeito impermeabilizante236. 36. A protecção do meio marinho nas águas nacionais O meio marinho é um património precioso que deve ser protegido, preservado e, quando exequível, recuperado, com o objectivo último de manter a biodiversidade e de possibilitar a existência de oceanos e mares diversos e dinâmicos, limpos, sãos e produtivos237. Nesta conformidade, o Estado tem obrigação de proteger e preservar o meio marinho; igualmente, tem direito de soberania para aproveitar os seus recursos naturais de acordo com a sua política em matéria de meio ambiente (arts. 192.º e 193.º da CNUDM). Assim, o estabelecimento de áreas marinhas protegidas238, incluindo as zonas já designadas, ou a designar, ao abrigo da Estratégia e Plano de Acção Nacional para a Biodiversidade, do Programa de Acção Estratégica da Convenção de Benguela e de outros acordos internacional de que Angola faça parte, constitui um contributo importante para a consecução do bom estado ambiental nos termos dos referidos instrumentos. 236 PORTUGAL. Direcção-Geral da Autoridade Marítima – Guia de apoio ao combate à poluição do mar por hidrocarbonetos e outras substâncias perigosas, p. 12. 237 Neste sentido, terceiro parágrafo da Directiva 2008/56/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho de 2008, (Directiva-Quadro Estratégia Marinha). 238 De acordo com o art.º 2.º da Convenção sobre a Diversidade Biológica, área protegida é entendida como «uma área geograficamente definida que tenha sido designada ou regulamentada e gerida para alcançar objectivos específicos da conservação». 131 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Consultado o instrumento legislativo Europeu, no âmbito do domínio da política para o meio marinho, o bom estado ambiental é definido como «o estado ambiental das águas marinhas quando estas constituem oceanos e mares dinâmicos e ecologicamente diversos, limpos, sãos e produtivos nas suas condições intrínsecas, e quando a utilização do meio marinho é sustentável, salvaguardando assim o potencial para utilizações e actividades das gerações actuais e futuras»239. Deste conceito subentende-se que o bom estado ambiental será atingido quando a diversidade biológica for mantida e a qualidade e a ocorrência de habitats e a distribuição e abundância das espécies sejam conformes com as condições fisiográficas, geográficas e climáticas prevalecentes. Não obstante, o Estado deve desenvolver e implementar medidas de abordagem ecossistemática à gestão de actividades humanas, de modo que o emprego dessas actividades seja mantido a níveis compatíveis com o bom estado ambiental. Entendem alguns autores240 que, numa área marinha em bom estado ambiental, não há perda adicional de diversidade dentro de cada espécie, entre espécies e de habitats e ecossistemas a escalas ecologicamente relevantes. Para Vasco Becker-Weinberg e Marta Chantal Ribeiro, o alicerce da consecução do bom estado ambiental «é a abordagem ecossistémica a qual, por sua vez, se realiza através de um conjunto de princípios e instrumentos de onde avultam a precaução, a avaliação de impacte ambiental, a gestão adaptativa e as áreas marinhas protegidas»241. Conforme já referido, Angola possui um dos Grandes Ecossistemas Marinhos e as áreas de protecção ambiental cobrem aproximadamente 6,6 % do território nacional, o que corresponde a aproximadamente 82 200 km2. Contudo, há necessidade de determinar «áreas especiais» no espaço marinho nacional que, por razões técnicas reconhecidas relativamente às características específicas do seu tráfego, exigem a adopção de 239 Artigo 3.º, n.º 5, da Directiva 2008/56/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho de 2008. 240 DOMINGOS, Isabel [et al.] – Ecossistema da Plataforma Continental, p. 55, disponível para consulta em: https://www.sophia-mar.pt/uploads/GUIA_Plat_Cont_Final.pdf. 241 RIBEIRO, Marta Chantal; BECKER-WEINBERG, Vasco – Direito do Mar, Protecção do Ambiente Marinho e Legislação Europeia e Ordenamento do Espaço Marítimo Nacional, respectivamente. RIBEIRO, Marta Chantal (coord.) – Módulos de Formação Sophia: conhecimento para a gestão marinho. 132 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL métodos especiais obrigatórios para a prevenção da poluição do mar por hidrocarbonetos onde a vulnerabilidade do meio ambiente marinho é muito grande242. O art.º 3.º, ponto 8, do Decreto Executivo 224/12, de 16 de Julho, define “áreas sensíveis” como «áreas geográficas constituídas por ecossistemas em que ligeiras alterações nos parâmetros físicos, químicos e biológicos usados na avaliação da qualidade do ambiente provoquem alterações severas na ecologia local de que resultem danos de difícil recuperação». Outra questão a considerar é o lixo no meio marinho, tido como um problema particularmente premente, devendo o Estado tomar medidas que visem travar a produção de lixo marinho nas águas nacionais, contribuindo assim para o objectivo da Agenda para o Desenvolvimento Sustentável 2030243, visto que o lixo marinho, nomeadamente os resíduos de plástico, resulta em grande parte de actividades terrestres, causadas por más práticas de gestão dos resíduos sólidos, por más infra-estruturas, pela deposição de lixo em espaços públicos por parte dos cidadãos e por uma falta de sensibilização do público – os programas de prevenção de resíduos e os planos de gestão de resíduos deverão contemplar medidas específicas 244. Como medida necessária à protecção do ambiente, à manutenção do equilíbrio ecológico e à prevenção dos padrões ambientais das actividades humanas, potencialmente poluidoras, por um lado; por outro, devido à exigência de regular a prevenção e reparação dos danos ambientais e criar condições para que o cidadão usufrua do direito a um ambiente são e não 242 SILVA, Joaquim Ferreira da – Resposta à poluição marinha. Revista de Direito do Ambiente e Ordenamento do Território, pp. 106 e 107. 243 Adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 25 de setembro de 2015, a agenda determina os 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas a implementar todos os Estados membros do ONU; bem como Agenda 2063 da União Africana, adaptada a 27 de Janeiro de 2014. 244 ANDRADE, Vicente José Pinto de – Desenvolvimento Sustentável e Economia Verde e o Quadro Pós-2015; Parágrafo trinta e cinco da Directiva (UE) 2018/851 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de Maio de 2018, que altera a Directiva 2008/98/CE relativa aos resíduos; ONU – Roteiro para a Localização dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável: implementação e acompanhamento no nível subnacional disponível no site: https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2017/06/ Roteiro-para-a-Localizacao-dos-ODS.pdf. 133 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO poluído, foi promulgado o Decreto Presidencial 194/11, de 7 de Julho, que regula a responsabilidade por danos ambientais e tem por objecto estabelecer a responsabilidade pelo risco e degradação do ambiente, baseado no princípio do “poluidor-pagador”, para prevenir e reparar danos ambientais (art.º 1.º). Estatui este diploma que «os padrões de qualidade em vigor em Angola são os referidos pelas normas ISO, que se referem a organização internacional de «standarização» das Nações Unidas (n.º 3, do art.º 9.º)». Por sua vez, estabelece o n.º 1 do art.º 24.º da Lei nº 10/04 (Lei de Actividade Petrolífera) que «no exercício das suas actividades, as licenciadas, a Concessionária Nacional e suas associadas devem tomar as precauções necessárias para a protecção do ambiente, com vista a garantir a sua preservação, nomeadamente no que concerne à sua saúde, água, solo e subsolo, ar, a preservação da biodiversidade, fauna e a flora, ecossistemas, paisagem, atmosfera e os valores cultura, arqueológica e estéticos»; por sua vez, o art.º 69.º da Lei n.º 6-A/04, adopta medidas de preservação de espécies de recursos biológicos aquáticos. Pelo exposto, percebemos que, para obtenção do bom estado ambiental marinho, o Estado terá de fixar metas ambientais apropriadas, programas de avaliação do estado ambiental, no sentido de atenuar as principais pressões exercidas sobre o meio marinho (feitos através de descritores, critérios e indicadores), e medidas que contribuam directamente para reduzir a pressão, i.e., medidas que incluam acções de governação e campanhas de sensibilização ou de comunicação, por exemplo, para reduzir a deposição de lixo. SECÇÃO III O exercício da autoridade do Estado no mar 37. Razão de ordem A importância da geoestratégia dos mares, oceanos e das vias navegáveis interiores para o desenvolvimento socioeconómico de Angola e do seu papel para o desenvolvimento sustentável do continente só alcançará a sua ênfase, se for prestada mais atenção e recursos consideráveis para a 134 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL segurança marítima, visto que a criminalidade transfronteiriça contribui para a propagação da insegurança e da instabilidade e representa riscos graves para a navegação marítima no espaço nacional. De acordo com a realidade angolana, a carência da aplicação da lei no mar verifica-se no reforço da formação e profissionalização das forças navais e da guarda costeira, das agências responsáveis pela protecção e segurança marítimas, das autoridades portuárias e alfandegárias, e na promoção de uma estratégia integrada de recursos humanos para o sector marítimo que vise apoiar a oferta de competências, tendo em conta o equilibro do género em toda a cadeia de valor marítima, bem como a manutenção ou medidas de acções exequíveis de patrulha, vigilância e reconhecimento de soberania no território marítimo para fins de aplicação da lei e operações de busca e salvamento. A segurança marítima está intimamente associada ao desenvolvimento económico. O Estado deve optar por políticas que garantam a disponibilidade de recursos tanto por meio de fundos públicos, como por meio de estabelecimento de parcerias público-privadas necessárias para o investimento em equipamento, operações e formação em matéria de protecção e segurança marítimas, em conformidade com os procedimentos domésticos. Nesta secção, analisaremos a protecção contra os actos ilegais e deliberados e procuraremos, igualmente, colmatar o vazio relativo à política pública da Autoridade Marítima, em articulação com os factores de desenvolvimento económico e de estabilidade nacional. Conforme a abordagem sumária nas secções anteriores sobre a segurança e defesa no espaço marítimo nacional, aqui trataremos do envasamento e desvios na formulação, na concretização e nas reformulações de fronteiras entre a defesa e segurança interna, i.e., entre a Marinha e a Autoridade Marítima Nacional, a fim de harmonizar o exercício da autoridade do Estado do mar. 38. Um olhar sobre a evolução institucional da Autoridade Marítima Nacional A história da Autoridade Marítima é a história secular das dinâmicas dos interesses e dos actores que sentem, analisam, reflectem, pressionam, 135 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO debatem, agendam, formulam, reformulam, concretizam, avaliam e contestam a lei e a sua aplicação245. São raríssimos os artigos publicados sobre a Autoridade Marítima Nacional, só se sabe de uma dissertação sobre o tema: Exercício da Autoridade do Estado no Mar: análise do sistema da autoridade marítima de Angola, proposta de criação de um novo sistema, de Daniel Mango Tchindele. Há um enorme vazio e perplexidade na relação de Angola com o mar; prova disto é a falta de interesse no ensaio histórico sobre a Autoridade Marítima, desconhecendo-se estudos académicos que o aprofundem e delimitem, e, também, não abundam as posições públicas, acrescendo ainda a falta de análises independentes, estudos, relatórios e autores que se exprimam publicamente. No período colonial, as repartições marítimas da metrópole (capitanias dos portos e delegações marítimas), órgãos externos da Direcção-Geral dos Serviços de Fomento Marítimo, eram consideradas repartições militares e sujeitas exclusivamente às autoridades do Ministério da Marinha e o pessoal que nelas prestava serviço só podia ser notificado pelas autoridades administrativas nos termos em que podia ser feita a sua requisição pelos tribunais civis246. Eram incumbências principais das repartições marítimas cumprir e fazer cumprir as disposições legais relativas às marinhas de comércio, de pesca e de recreio, rebocadores e embarcações auxiliares; à indústria da pesca; à segurança e disciplina da navegação marítima, fluvial e lacustre; à iluminação e sinalização das margens para segurança da navegação; à assistência a pessoas e embarcações em perigo, com vista à salvação de vidas humanas; à disciplina nas praias e assistência aos banhistas; à segurança da exploração dos leitos das águas; aos objectos achados no mar ou por este arrojados; à poluição das águas e margens; aos terrenos do domínio público marítimo e aos inscritos marítimos. Além destas atribuições, asseguravam, também, o policiamento geral das respectivas áreas de jurisdição, sem prejuízo das atribuições policiais das autoridades portuárias (art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 265/72, de 31 de Julho, Regulamento Geral 245 Neste sentido, PAULO, Jorge Silva – A Autoridade do Estado no Mar: génese e ordenamento da Autoridade Marítima, p. 5 s. 246 Art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 265/72, de 31 de Julho, Regulamento Geral das Capitanias. 136 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL das Capitanias). Actualmente, essas competências estão repartidas em diversos órgãos marítimos e de actividades conexas. Após a independência, as atribuições de Autoridade Marítima, asseguradas pela Direcção Provincial dos Serviços de Marinha, foram transferidas com amplas atribuições para a Direcção da Marinha Mercante de Angola, actualmente Instituto Marítimo Portuário de Angola (IMPA), que exerce as funções de coordenação, orientação, controlo, fiscalização, licenciamento e regulamentação de todas as actividades relacionadas com a marinha mercante e portos (art.º 1.º do Decreto 66/07, de 15 de Agosto, que aprova o estatuto orgânico do IMPA). As Capitanias dos Portos247 e as Delegações Fluviais são delegações regionais ou provinciais do IMPA (n.º 7, do art.º 16.º do Decreto 66/07), classificadas como serviços externos. De acordo com o organigrama do IMPA, as Capitanias dos Portos estão hierarquicamente subordinadas à Direcção-Geral deste instituto. Lamentavelmente, ainda se mantém o défice estrutural e funcional que se visava colmatar com a criação da Autoridade Marítima Nacional; por outro lado, verifica-se subsidiariedade nas atribuições de competências entre a Administração Marítima Nacional e o Instituto Marítimo Portuário de Angola, de tal modo que Daniel Mango Tchindele afirma que «O IMPA assume-se como Administração Marítima Nacional»248. De facto, o legislador foi infeliz ao redigir que a Administração Marítima Nacional é um órgão tutelado pelo Departamento Ministerial responsável pelo sector marítimo-portuário, o qual, sob a designação de IMPA, dispõe de atribuições e exerce competências nos domínios da marinha mercante, da marinha de recreio e do desporto náutico, dos portos, da navegação e da segurança marítima; das actividades económicas exercidas no âmbito dos sectores marinho, fluvial, lacustre e portuário, assim como da supervisão 247 Nos termos do n.º 23, do art.º 3.º da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas, entende-se por Capitania do Porto «órgão local da Administração Marítima Nacional destinada a desempenhar, por delegação de poderes e na respectiva área de jurisdição, as funções que lhe são atribuídas por lei, bem como as de fiscalizar o cumprimento da legislação aplicável, das normas e regulamentos, das directivas e demais decisões e procedimentos da competência da Administração Marítima Nacional». 248 TCHINDELE, Daniel Mango – O exercício da autoridade do Estado no Mar: analise do Sistema de Autoridade Marítima de Angola, proposta de criação de um novo sistema, p. 50. 137 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO e regulamentação das actividades desenvolvidas neste sector, por um lado; e, por outro, que este órgão é integrado e apoiado pelas Capitanias dos Portos, pela Autoridade Nacional Competente para a Protecção do Transporte Marítimo e dos Portos, pela Autoridade Nacional de Controlo de Tráfego Marítimo, pela Polícia Marítima, e pelo Serviço Nacional de Fiscalização Pesqueira e de Aquicultura (artigos 3.º, n.º 8 e 12.º da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas (LMMPAC)]. 39. A Autoridade Marítima Nacional A expressão «autoridade marítima» surge para designar os órgãos com atribuições e competências para o exercício da autoridade do Estado nos espaços marítimos sob soberania e/ou jurisdição nacional, nomeadamente patrões-mores, cabos de mar, guardas de lastro, capitães dos portos, intendentes da Marinha, delegados dos intendentes da Marinha nos portos, chefes de divisão ou departamentos marítimos e outros249. Há poucos estudos sobre a Autoridade Marítima Nacional e é difícil aceder aos documentos internos do Estado, nos quais se descreve ou justifica a política pública de autoridade marítima. A criação da Autoridade Marítima é intrínseca aos ministérios com atribuições nos assuntos do mar250, da armada, dos vários serviços que 249 Sobre origem da expressão «autoridade marítima», vide PAULO, Jorge Silva – A Autoridade do Estado no Mar: génese e ordenamento da Autoridade Marítima, p. 9 ss.; do mesmo autor, Autoridade Marítima Nacional: a orgânica e o enquadramento jurídico. RDeS – Revista de Direito e Segurança, p. 61-167. 250 Nos termos do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas, compõem a Autoridade Marítima Nacional os seguintes órgãos: o Ministério dos Transportes, que é o Departamento Ministerial responsável pelo sector marítimo-portuário que coordena a Autoridade Marítima Nacional; o Departamento Ministerial responsável pela Defesa Nacional [e Veteranos da Pátria]; o Departamento Ministerial responsável pelo Interior; o Departamento Ministerial responsável pelo [Cultura, Turismo] Ambiente; Departamento Ministerial responsável pela Agricultura e Pesca [e Mar]; o Departamento Ministerial responsável pelas Relações Exteriores; Departamento Ministerial responsável pela Saúde; o Departamento Ministerial responsável pelos [Recursos Minerais] Petróleos; o Departamento Ministerial responsável pela Justiça; os Órgãos do Sistema de Segurança Nacional; a Administração Marítima Nacional; a Autoridade 138 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL abrangeram a marinha marcante, os portos, os pilotos, a hidrografia, o salvamento marítimo, a pesca e o recreio. Segundo Jorge Silva Paulo, a autoridade marítima «é um poder tipificado em razão da matéria e da competência»251. Nos termos do n.º 20, do art.º 3.º da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas (LMMPAC), a Autoridade Marítima Nacional (AMN) é definida como «conjunto de entidades, órgãos ou serviços de nível central, provincial ou local de natureza interministerial e intersectorial que, investidas nos poderes de autoridade marítima, exercem funções executivas, consultivas, policiais e de coordenação». No entanto, a AMN assume um carácter de transversalidade que integra todas as entidades civis e militares com competências sobre as actividades marítimas e portuárias exercidas em espaços sob soberania ou jurisdição marítima nacional252. Em razão da matéria, cabe à Autoridade Marítima garantir o cumprimento da lei aplicável aos espaços marítimos e ao domínio público marítimo, principalmente garantir a segurança, fiscalizar e controlar a navegação, controlar e garantir a segurança da faixa costeira do domínio público, das fronteiras marítimas fluviais ou lacustres, preservar e proteger a área, assim como o meio marinho, os recursos naturais e o património natural marinho e subaquático, prevenir o combate à poluição das águas sob jurisdição nacional, garantir a sinalização e balizagem marítimas, os acessos, a segurança marítima, as ajudas e avisos à navegação e a radiobalizagem marítima (art.º 8.º da Lei n.º 27/12). Pese embora a Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas definir, estabelecer a composição e ditar as atribuições da AMN, todavia, não prevê um sistema de autoridade marítima constituída pelas entidades, órgãos ou serviços de nível central, provincial ou local que, com funções de coordenação, executivas, consultivas ou policiais, exerçam poderes de autoridade marítima. competente para a Segurança de Navios e Instalações Portuárias e o Sistema Nacional de Vigilância Marítima e a Guarda Costeira Nacional. 251 Autoridade Marítima Nacional: a orgânica e o enquadramento jurídico. RDeS – Revista de Direito e Segurança, p. 65. 252 N.º 1, do art.º 7.º da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas. 139 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO Não obstante, o referido diploma legal prevê o Sistema Nacional Integrado para o Controlo do Tráfego Marítimo nas águas nacionais, abreviadamente designado por SNICTM/VTS (Vessel Traffic System), que tem como objectivo monitorizar, controlar e fornecer informações adicionais aos navios em águas confinadas ou muito movimentadas – é coordenado pela Autoridade Nacional de Controlo de Tráfego Marítimo e exercido pela Administração Marítima Nacional (art.º 14.º). Sublinha Fernando Manuel Silva Mota que o sistema VTS «É um sistema estruturante do ponto de vista da segurança marítima e tem como objectivos aumentar a segurança da navegação ao longo da costa e nos Esquemas de Separação de Tráfego (EST), aumentar a segurança da vida humana no mar, evitar intrusões e o desembarque ilegal de pessoal e actividades ilícitas nas águas costeiras bem como proteger e melhorar o ambiente marinho na costa»253. Relativamente à coordenação, fiscalização, implementação e supervisão da aplicação das medidas de protecção previstas no Código de Protecção dos navios de comércio do tráfego internacional e das instalações portuárias a que se destinam, aos riscos e ameaças contra a segurança dos navios e das instalações portuárias, incluindo as instalações portuárias offshore, fixas ou flutuantes usadas para armazenamento, carga e descarga de navios, foi criado, através do Decreto n.º 48/05, de 8 de Agosto, o Comité Nacional para Aplicação do Código Internacional de Segurança de Navios e das Instalações Portuárias, órgão interministerial coordenada pela Direcção Nacional da Marinha Marcante e Portos (arts. 1.º e 2.º do referido Decreto e art.º 13.º da LMMPAC). Há vários modelos organizacionais de autoridade marítima no mundo. Cabe a cada Estado optar pelo seu modelo, que em regra é articulado com a marinha militar em consideração ao percurso histórico e à cultura nacional quanto à sua íntima relação com o mar254. O modelo da autoridade marítima angolana é semelhante ao português por apresentar uma autoridade administrativa emblemática, i.e., embora 253 MOTA, Fernando Manuel da Silva – Segurança Marítima: o caso nacional e perspectivas de futuro. Instituto de Estudos Superiores Militares [em linha]. Disponível para consulta em: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/12670/1/1TEN%20Fernando%20 Mota.pdf. 254 Mesmo entendimento PAULO, Jorge Silva, op. cit., p. 68. 140 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL o capitão de porto esteja integrado numa estrutura orgânica que não tem natureza policial, o capitão de porto é, por inerência legal, o comandante local da Polícia Marítima e é um oficial da armada, ainda que fora da estrutura militar255. De igual modo, o capitão de porto tem um leque muito amplo de competências e de responsabilidades, destacando-se o facto de que das suas decisões cabe recurso contencioso. Contudo, há um défice na definição, estruturação e eficácia de exercício das funções da Autoridade Marítima estabelecida pela Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas. Nesta senda, Daniel Mango Tchindele propõe um sistema baseado em duas vertentes: a coordenação política entre os ministérios com atribuições marítimas, através do Conselho de Ministros do Mar, sob a presidência do Vice-Presidente da República, com o apoio do SecretárioGeral do Mar, e a coordenação operacional dos serviços executivos, sob a direcção do Almirante Comandante da Marinha – Autoridade Marítima Nacional (órgão). O mesmo autor apresenta uma estruturação do sistema de Autoridade Marítima hierarquicamente subordinada ao Presidente da República, coordenada e fiscalizada pela Marinha de Guerra de Angola256. Discordamos da proposta de organigrama, porque obscurece as fronteiras rígidas entre a Armada e a Autoridade Marítima, e faz retroceder todas as reformas feitas até ao momento, no âmbito do Direito Marítimo, sobretudo, do Direito do Mar. 40. Vigilância e monitorização nas zonas oceânicas nacionais De acordo com o glossário da Organização do Tratado do Atlântico do Norte (OTAN), a vigilância marítima é entendida como a observação sistemática da superfície e subsuperfície das áreas marítimas, através de todos os meios disponíveis, com o principal objectivo de localizar, 255 Idem, p. 69; A Polícia Marítima é uma força policial armada e uniformizada, dotada de competência especializada nas áreas e matérias legalmente atribuídas à Administração Marítima Nacional e composta de agentes paramilitares. A Polícia Marítima depende metodologicamente da Administração Marítima Nacional, sendo regida por Estatuto Orgânico próprio (art.º 18.º da Lei n.º 27/12, de 28 de Agosto, Lei da Marinha Mercante, Portos e Actividades Conexas). 256 TCHINDELE, Daniel Mango, op. cit., pp. 90 e 91. 141 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO identificar e determinar o movimento de navios, submarinos ou outros veículos, amigos ou inimigos, que operam na superfície ou subsuperfície dos mares e oceanos257, e a monitorização é definida como a «actividade composta por observar, avaliar e relatar o desempenho, eficiência e práticas de trabalho de uma organização ou parte dela»258. Destas noções podemos dizer que a monitorização distingue-se da vigilância por ser uma acção continuamente melhorada ao longo do tempo, i.e., os dados adquiridos servem para complementar o conhecimento de que já se tem de determinado trabalho ou pesquisa; portanto, para se chegar a uma conclusão sobre as actividades monitorizadas é necessário levar a cabo acções de vigilância259. Angola é responsável por uma vasta zona oceânica, porém, vem demonstrando que não está capaz de dissuadir e prevenir qualquer actividade que ponha em causa a segurança e protecção marítima260, pese embora terem sido tomadas medidas políticas e investimento financeiro para colmatar a situação; ainda assim, mantém-se a carência de recursos humanos e tecnológicos para assegurar a vigilância e monitorização permanente nos 1650 km2 da costa marítima. Através do Decreto n.º 59/09, de 26 de Outubro, foi criado o Sistema Nacional de Vigilância Marítima, designado por SINAVIM261, a fim de garantir o exercício de poderes de soberania e jurisdição nos espaços marítimos nacionais. Este sistema tem por objecto reforçar a vigilância e monitorização permanente dos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição angolana, o controlo do tráfego marítimo na zona costeira NATO – Glossary of terms and definitions (English and French), p. 114. Idem, p. 85. 259 Neste sentido, CAROLAS, Pedro Miguel da Encarnação – Vigilância e monitorização dos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição portuguesa, p. 8. 260 As ameaças de segurança caracterizam-se por porem em causa a sustentabilidade ambiental ou por colocarem em risco a vida humana. Já a ameaça de protecção caracteriza-se por dois tipos: erosivas e sistemáticas. CAROLAS, Pedro Miguel da Encarnação, op. cit., p. 20. 261 O SINAVIM é definido como sendo um órgão interministerial de coordenação das atividades dos seguintes ministérios: Ministério da Defesa Nacional e Veteranos da Pátria, Ministério do Interior, Ministério da Justiça e dos Direitos humanos, Ministério dos Transporte, Telecomunicações e Tecnologias de Informação, Ministério da Cultura, Turismo e Ambiente, Ministério da Agricultura e Pescas, Ministério dos Recursos Minerais e Petróleos, Ministério das e Comunicação Social e Órgãos do Sistema de Segurança Nacional. Este sistema é liderado pelo Ministério da Defesa Nacional e Veteranos da Pátria. 257 258 142 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL e portuária, o auxílio e apoio às operações SAR (sistema de Busca e Salvamento) e a localização de embarcações em perigo de naufrágio ou em zonas de risco (arts. 1.º e 2.º). Todavia, desconhece-se o documento orientador que apresenta os vectores e medidas de acção para avaliar estes objectivos dentro de determinado período. Sublinha-se que a falta deste instrumento programático representa um dos fracassos na coordenação do sistema. O SINAVIM é apoiado, tecnicamente, pelo Sistema Nacional Integrado para o Controlo do Tráfego Marítimo (VTS)262, pelo Sistema Nacional de Monitorização e Captura do Pescado263 e pelo Sistema Nacional de Observação e Vigilância do Território Nacional264. Este sistema é composto por duas componentes: a componente de detecção e a componente de intervenção. A componente de detecção actua no âmbito da obtenção dos dados e informações sobre as diversas actividades desenvolvidas no espaço marítimo nacional, por forma a identificar as actividades ilícitas que põem em causa a vida humana, que prejudicam o ambiente, os recursos naturais e, sobretudo, que conflituam com a soberania ou jurisdição do Estado. A componente de intervenção actua no âmbito do exercício de fiscalização e patrulhamento no mar, operações SAR ou repressão das actividades ilícitas nos espaços marítimos265. Convém-nos também referir alguns sistemas de vigilância e monitorização no espaço marítimo que surgiram com o exponencial desenvolvimento da electrónica266, dentre eles: Sistema controlado pelo Instituto Marítimo Portuário de Angola. Este sistema é fiscalizado pelo actual Ministério da Agricultura e Pesca. 264 Tal como o SINAVIM, este sistema pelo Ministério da Defesa e Veterano da Pátria. 265 Na componente de deteção e processamento de informação, contribuem as entidades detentoras de meios para o efeito, de forma coordenada, mediante a interligação dos respetivos centros de coordenação marítima, nomeadamente, a Marinha de Guerra de Angola (MGA), a Polícia Fiscal Marítima, o Ministério da Agricultura e Pescas, o Ministério dos Recursos Minerais e Petróleos, o Ministério da Cultura, Turismo e Ambiente, o Ministério dos Transportes, Telecomunicações e Tecnologia de Informação, órgãos do Sistema de Segurança Nacional e outros organismos. Na componente de intervenção actuam a MGA, a Polícia Marítima e a Polícia de Investigação criminal. TCHINDELE, Daniel Mango, op. cit.. 266 Sobre esta matéria vide CORREIA, Armando José Dias – Controlar remotamente o mar. Revista da Armada, pp. 10-12. MOTA, Fernando Manuel da Silva, op. cit., pp. 15-18. 262 263 143 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO a) O Sistema de Identificação e Localização de Longo Alcance (Long Range Identification & Tracking – LRIT)267 que tem como objectivo o seguimento pelos Estados dos navios com a sua bandeira, sujeitos à regulamentação SOLAS (mais de 300 tons), através de informações padronizadas de posição, fornecidas pelos sistemas de seguimento. A implantação do LRIT e os respectivos Centros de Dados permitem a fusão e troca de informações entre os sistemas de controlo do tráfego marítimo e os sistemas SAR. b) O GMDSS é um sistema automático de emergência e comunicações que permite a difusão de alertas a nível mundial que, no caso da difusão de um pedido de emergência, efectuado por qualquer embarcação, é enviado o seu MMSI (Maritime Mobile System Identification), permitindo uma rápida identificação e georreferência, contribuindo, decisivamente, para a simplificação das operações de rádio e para a melhoria de busca e salvamento marítimo, devidamente coordenada em centros de salvamento específicos como, por exemplo, o Maritime Rescue Co-ordination Centre (MRCC) no Centro de Operações Marítimas268. 41. A segurança e defesa militar naval nos espaços marítimos No âmbito da segurança e defesa da soberania nacional, as forças navais representam o exercício de autoridade do Estado no território marítimo, e impõe-se como uma das principais preocupações dos Estados ribeirinhos. É precisamente no mar que as forças navais devem utilizar a acção de Estado através de medidas tanto defensivas quanto ofensivas, explorando as suas características de mobilidade, de permanência, de versatilidade e PARGANA, Miguel Xavier da Cunha Oliveira Júdice – O exercício da autoridade do Estado no Mar. 267 Este sistema foi especificado no âmbito do Comité de Segurança Marítima da IMO (Maritime Safety Committee - MSC), aprovada pela Resolução MSC 202(81) a nova regra 19-1 do Capítulo V referente à segurança da navegação da Convenção Internacional para Salvaguarda da Vida Humana do Mar, designada por Convenção SOLAS 1974/1988 (com conteúdo consolidada até 1 de Janeiro de 2010), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2008. 268 MOTA, Fernando Manuel da Silva, op. cit., p. 17 s. 144 GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL de flexibilidade. Por esta e outras razões, é afirmado que o mar tem um valor geoestratégico imensurável no âmbito da Segurança e Defesa, pelo que permite tomar medidas e acções conducentes à defesa da soberania e da integridade territorial perante uma ameaça ou agressão externa269. Alguns autores defendem que a função estratégica de projecção do mar que bordeja Angola deve surgir como fundamento para que o Estado invista, com maior seriedade, na edificação do seu dispositivo naval, mormente pelo quadro geopolítico onde o país se encontra inserido, sendo necessário que se criem capacidades de projecção de forças, de forma a garantir a sua própria segurança, minimizando deste modo as suas vulnerabilidades270. Relativamente à “doutrina da Marinha de duplo uso”, que define a Autoridade Marítima Nacional como mais um serviço do ramo militar do mar, i.e., dá a possibilidade à Marinha de desempenhar missões de âmbito militar e funções de guarda costeira, esta não é acolhida em Angola, pois a Marinha desempenha apenas funções de guarda costeira e não propriamente missões militares, tanto a nível nacional como internacional. A guarda costeira angolana apresenta-se como órgão civil, actuando como polícia marítima no âmbito da segurança interna, preservando a autoridade do Estado no domínio marítimo, prevenindo as práticas ilícitas e promovendo a segurança. Por sua vez, apesar da falta de meios operacionais, e outros já referidos, a Marinha de Guerra de Angola tenta garantir a segurança e defesa nas águas nacionais, destacando-se nas operações SAR (Buscas e Salvamento). Neste sentido, GINGA , Damião Fernandes Capitão, op. cit., p. 224 s. FERNANDES, A. Horta; BORGES, João V. – Enquadramento conceptual. In Nogueira J. M. Freire (coord.) – Pensar a Segurança e Defesa., p. 87. GINGA , Damião Fernandes Capitão, op. cit., p. 225 269 270 145 Considerações Finais Na perspectiva de contribuir para a gestão de planificação e ordenamento do uso e utilização dos espaços marítimos nacionais pelos entes públicos e privados com actividade ligada ao mar, ingressámos neste desafio para colmatar o vazio doutrinário que se verifica no ramo do Direito do Mar e Marítimo em Angola. Angola, tendo sido colonizada por um país reconhecido mundialmente pela sua perspicácia e domínio sobre o mar, não soube construir uma identidade cultural marítima e um conhecimento de segurança e defesa do espaço marítimo. Paralelamente, Angola declarou aprofundar a relação com o mar a fim de se salvaguardar das ameaças e riscos que tentam a sua soberania, assim como proteger e preservar os recursos marinhos. Em contrapartida, o Governo angolano precisa de articular e harmonizar as diversas políticas dos departamentos ministeriais com actividade no mar. Independentemente das boas intenções políticas para o mar, urge o despertar dos angolanos para os assuntos marítimos, pois o alcance do desenvolvimento sustentável marítimo carece da participação da população. Acautelamos o legislador a ser cuidadoso na adopção do modelo de ordenamento e gestão do espaço marítimo, não transportando as soluções da terra para o mar, pois as questões do mar devem ser respondidas pelas áreas do saber ligados a elas. É necessário este sublinhado, porque nos deparamos com matérias de competência marítima a serem delegadas a 147 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO sectores não ligados à área, tendo, como exemplo, o Decreto Presidencial n.º 232/11, de 23 de Agosto, que retira a competência territorial da orla costeira da Capitania e a transfere para os Governos Provinciais, levantando-se com este acto o problema da jurisdição do Estado no porto. Tal como aqui estudámos, ordenar o espaço marítimo nacional constitui uma tarefa fundamental do Estado, que se concretiza através de políticas do mar e cuja implementação compete aos órgãos públicos e privados de actuação no mar. Um dos objectivos do OEM é, com certeza, identificar e encorajar utilizações e usos múltiplos do mar. Igualmente, o planeamento dos usos ou actividades ligadas ao mar é uma das linhas orientadoras da Estratégia Nacional para o Mar. O Governo angolano deve adoptar o plano de ordenamento do espaço marítimo como uma ferramenta de governação indispensável para assegurar as directrizes assentes nos princípios do desenvolvimento sustentável, da protecção, da precaução, da defesa dos recursos genéticos e da coordenação institucional, através do levantamento dos usos e utilizações presentes e futuras, com a finalidade de uma gestão marítima verdadeiramente integrada. Reconhecemos que a política de geoestratégia e geoeconomia para o mar nacional e o seu papel para o desenvolvimento sustentável do continente só alcançará a sua ênfase se forem executados investimentos em equipamento, operações e formação, em matéria de protecção e segurança marítimas, e adoptadas medidas de reformas para a Marinha de Guerra Angolana. De sublinhar também que o distanciamento de Angola com o mar não se deve à falta de interesse ou vontade política legislativa, social e financeira, mas, sim, ao incumprimento dos mesmos e à falta de avaliação das medidas de carácter nacional, regional e internacional. A promulgação da Lei de Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional alterará profundamente o paradigma nacional e incrementará, inevitavelmente, a responsabilidade dos serviços e organismos da Administração Pública que intervêm na utilização do espaço marítimo nacional. Atendendo à nossa realidade, este diploma representará um desafio em assegurar a compatibilização entre planos de ordenamento do espaço marítimo e planos com incidência territorial, concretamente, o plano de ordenamento da orla costeira. 148 CONSIDERAÇÕES FINAIS Contudo, Angola deve comprometer-se, seriamente, com uma Estratégia Nacional para o Mar, a fim de alcançar o uso e utilização sustentável dos recursos marinhos, a afirmação do seu poder no espaço marítimo, e, sobretudo, para o Angolano identificar o mar como sua identidade e sustento. 149 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A Comissão do Golfo da Guiné e a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul. Revista Militar. N.º 2532 (Janeiro 2013) pp. 43-61. ALMEIDA, Eugênio Costa; BERNARDINO, Luís Manuel – Uma reflexão estratégica sobre a segurança e defesa em Angola e a intervenção no contexto regional subsaariano. Revista Sol Nascente. – Luanda: Centro de Investigação Sol Nascente. – n.º 9 (2016), pp. 44-153. 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Razão de ordem A demarcação da fronteira norte e nordeste A demarcação da fronteira leste e sudeste A demarcação da fronteira sul A delimitação das fronteiras marítimas sul e norte SECÇÃO II – A IDENTIDADE MARÍTIMA, GEOECONOMIA E O PODER DO ESTADO 6. 7. 8. 9. 10. Razão de ordem O mar na identidade cultural angolana O mar e o poder do Estado Angola e a geoeconomia marítima Porquê planear e ordenar o espaço marítimo? 21 21 22 30 32 34 39 39 40 43 48 52 165 A GOVERNAÇÃO “SOMBRA” NO ESPAÇO MARÍTIMO ANGOLANO CAPÍTULO II – ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO 55 SECÇÃO I – DISPOSIÇÕES GERAIS 55 55 56 59 61 66 11. 12. 13 14. 15. Razão de ordem Reflexões sobre o ordenamento do espaço marítimo O mar propriedade exclusiva do Estado Regulamentação do espaço marítimo nacional Articulação do ordenamento marítimo e terrestre SECÇÃO II – DOMÍNIO PÚBLICO MARÍTIMO 16. Razão de ordem 17. Ordenamento do espaço marítimo como tarefa pública 18. A relação entre o ordenamento do espaço marítimo e o plano de ordenamento da orla costeira 19. Ordenamento espacial para uma economia marítima próspera 20. A atractividade crescente das zonas costeiras enquanto local de lazer e trabalho 21. Dos usos e actividades económicas conexas ao mar SECÇÃO III – DOS PLANOS DE ORDENAMENTO DO ESPAÇO MARÍTIMO 69 69 72 74 78 80 81 89 89 22. Razão de ordem 23. Objectivos e princípios do plano de ordenamento do espaço marítimo 24. Sistema de ordenamento e de gestão do espaço marítimo 24.1. Instrumentos de planeamento do espaço marítimo 24.2. A utilização do espaço marítimo nacional 25. Fases fundamentais do processo de ordenamento marítimo 26. Participação pública no ordenamento marítimo 27. Conflitos de uso ou actividades dos meios marinhos 90 92 93 96 99 101 102 CAPÍTULO III – GOVERNANÇA NO ESPAÇO MARÍTIMO NACIONAL 105 SECÇÃO I – COORDENAÇÃO NAS UTILIZAÇÕES DOS SECTORES LIGADOS AO MAR 28. Razão de ordem 166 105 105 PREFÁCIO 29. A utilização comum e partilha da informação de vigilância do domínio marítimo africano 30. Importância do meio marítimo para a utilização sustentável dos nossos recursos marinhos 31. A articulação de uma estratégia angolana para o Mar 32. Medidas de segurança e defesa no espaço marítimo nacional SECÇÃO II – A BIODIVERSIDADE E O ECOSSISTEMA MARINHO 33. 34. 35. 36. Razão de ordem Gestão da biodiversidade e dos ecossistemas marinhos Poluição marinha resultante de hidrocarboneto A protecção do meio marinho nas águas nacionais SECÇÃO III – O EXERCÍCIO DA AUTORIDADE DO ESTADO NO MAR 37. Razão de ordem 38. Um olhar sobre a evolução institucional da Autoridade Marítima Nacional 39. A Autoridade Marítima Nacional 40. Vigilância e monitorização nas zonas oceânicas nacionais 41. A segurança e defesa militar naval nos espaços marítimos 107 111 115 118 121 121 122 128 131 134 134 135 138 141 144 CONSIDERAÇÕES FINAIS 147 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 151 167