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Prof. Alberto Amaral
CONDUZIDA POR F. PINA E MARIA JOÃO MELO
ainda está na Faculdade de Ciências,
decidimos seguir a Engenharia Química.
Não houve assim nenhumas razões de
peso; gostava de coisas de laboratório,
mexia em bichos. Quando era miúdo
abria toupeiras e coisas do género, até
que me fartei daquela existência dirigida
para a medicina, e enveredei pela Engenharia Química.
O período da sua licenciatura foi marcado pela crise académica de 62. Como
viveu essa crise?
Foi com um ce rt o dive rt imento; Portugal
atravessava um período complicado, as
pessoas hoje, pelo menos os jovens, já
não têm a percepção do que foi. 0 centro principal das atenções foi Coimbra e
um bocado o Técnico, no Po rt o foi algo
mais contido. Mas que abalou um bocado a instituição.
Creio que a Faculdade de Letras tinha
O Professor Alberto Amaral, recebeu-nos no CIPES em pleno
Matosinhos, num edifício antigo, bem apresentado, com o excelente metro de superfície à porta. Numa cidade onde a meio
da tarde se viam pessoas no café em frente, sentadas nas
mesas em tranquila conversa, fazendo lembrar um tempo onde
as pessoas falavam umas com as outras e se conheciam nos
cafés. Um tempo que ainda resiste nalguns locais, uma certa
tranquilidade e qualidade de vida que vai durar até quando?
sido recentemente reaberta`?
Sim, sim. A Faculdade de Letras do
Po rt o tem um passado histórico muito
complicado, a Faculdade de Letras foi
extinta por um ministro. Será restabelecida mais tarde, mas viverá sempre no
terror de poder ser extinta uma segunda
vez. É algo que pesava na consciência
dos professores.
Mas a crise académica de 62 teve algo
Fez a sua licenciatura em Engenharia
Químico-Industrial, na Faculdade de
a massacrar-me para ir para medicina, e
a ver com a sua tomada de consciência
tanto me massacrou que acabei por
política, ou passou-lhe ao lado?
Engenharia do Porto, em Julho de 1965.
dizer, medicina não!...risos. Naquela al-
Porque razão escolheu a Química, ou
tura a Engenharia Química estava relati-
melhor a Engenharia Química?
vamente na moda, aliás um dos meus
primos mais velhos tinha estado a estu-
Concerteza que sim. Não só isso como
depois o período em que estive em
Cambridge, em Inglaterra.
Havia um meu avô que era médico e a
dar Engenharia Química; de modo que
minha avó queria um descendente que
quer eu quer um outro primo que é da
1965, em 1968, encontramo-lo com o
lhe seguisse as pisadas; andava sempre
minha idade, o Adélio Machado, que
doutoramento feito em Cambridge.
Tendo acabado a sua licenciatura em
14 QUÍMICA
Trata-se de um período muito curto
para os padrões da época?
Em Janeiro de 66 fui para Inglaterra trabalhar numa área que não era laboratorial; doutorei-me em Química Quântica,
e acho que isso poderá ter tido alguma
influência, porque era algo que não estava dependente do sucesso laboratorial, mas meramente do trabalho de
computador. Isso permitiu fazer o doutoramento com uma certa rapidez. Por
outro lado, também é verdade que, naquela altura, nós com os 3 anos da Faculdade de Ciências tinhamos uma preparação teórica muito boa. A minha
preparação em termos de Matemática,
Física, Química era claramente superior à dos meus colegas Ingleses.
Já tinha uma posição de assistente
quando foi para Cambridge?
Não, não; porque devido exactamente a
esses períodos da crise académica,
houve uma recusa em contratarem-me
devido à minha posição algo contestatária. Eu fui para Inglaterra meramente
como particular, com uma bolsa. E sem
qualquer figação contratual á Universidade. Fui contratado quando regressei.
E como foi o seu contacto lá em Inglaterra? O seu supe rvisor foi o Professor
Linnett.
Edimburgo, para fazer investigação
para criar nas pessoas o hábito de dis-
numa área completamente diferente, ci-
cutir; havia sempre um tema, para o
bernértica/inteligência artificial; e por-
qual eram contactados dois indivíduos
tanto recomendou-me que esperasse
de ideias perfeitamente opostas. Um
pela vinda do Linnett para Cambridge.
debate a que assisti tinha por tema
Sai do Porto na ressaca da crise académica e vai para Cambridge. O que é
que sentiu quando chegou a Inglaterra
um País com liberdade, como é que
isso o marcou?
"todos os Deuses são redundantes", e os
convidados foram o Arcebispo de Cantuária e um notório ateu. Isto criava todo
um ambiente de facto extraordinário,
porque não havia meramente a questão
da aprendizagem, havia também a for-
Marcou muito. Há uma situação que eu
mação das pessoas; as pessoas eram
nunca esqueço. Uma vez eu estava em
formadas como gentleman e a pior coisa
Londres, e havia uma manifestação, na
que se podia fazer era cometer um acto
Trafalgar Square. de um conhecido nazi,
que não fosse digno de um gentleman.
o Moseley, um Inglês meio nobre, e
Aí uma pessoa estava de facto marcada.
havia um grupo grande de Judeus que
faziam uma contra-manifestação. E a
polícia estava lá para proteger o
E quais eram os actos não dignos de
um gentleman?
nazi...enfim as pessoas tinham liberda-
...risos. Por exemplo aldrabar, cometer
de de falar enquanto não pertubassem a
uma incorreção social grave. Mas era de
ordem pública, tinham direitos. Foi uma
facto um ambiente extraordinário. Havia
coisa que a mim, habituado ao velho
facilidades enormes na investigação.
Portugal, me marcou imenso; a liberdade de expressão, os direitos das pes-
E quando voltou?
soas, os tribunais a funcionar (uma coisa
linha o serviço militar. Adiei aquilo até
que nós ainda não temos não é...), efi-
perto dos trinta anos, e em 72 acabei
cazes e a actuar a tempo e horas.
por achar melhor ir para Moçambique.
No regresso, a minha mulher estava
Na altura era possível ser requisitado
grávida do meu primeiro filho e não
pela Universidade. E passei quatro anos
podia vir de avião, e viemos de barco.
em Moçambique durante os quais fiz o
Vínhamos de barco em direcção a Es-
serviço militar.
panha quando numa manhã metem o
Então conheceu o Professor Sousa
Lobo em Moçambique?
Sim o contacto foi feito por professores;
jornal de bordo por baixo da porta, e o
havia professores da Faculdade (no-
jornal de bordo anunciava exactamente
meadamente o Professor João Cabral)
que o Salazar tinha caído da cadeira:
Sim.
que me apoiaram e me ajudaram, inclu-
abrimos uma garrafa de champa-
sivamente a obter a bolsa de estudos.
nhe!...risos. Nunca mais me esqueci
É curioso porque ele a fi rmou, na entrevista anterior, que o Maio de 68 passou
ao lado de Inglaterra. Concorda com
esta afirmação dele?
E escolheu logo a Química Quântica e
aquele laboratório em particular?
Escolhi a Química Quântica porque
enfim, dentro do nosso Departamento
de Química, houve uma certa orientação sobre em que áreas apostar; e
nessa altura a área que me propuseram
desse episódio, na vinda de barco, em
pleno oceano, recebermos a notícia que
"o Senhor" tinha deslizado da cadeira
pára baixo.
Do ponto de vista científico como era o
ambiente cultural? Discutia muito com
os seus colegas?
Sim, sim! é curioso que o Maio de 68 de
facto não se fez sentir em Inglaterra.
Aqui há tempos, há uns três ou quatro
anos atrás, pa rt icipei num exercício engraçado. Fiz pa rt e da equipa que fez a
foi da Química Quântica, que eu achei
Era um sítio extraordinário, porque a
acreditação periódica da Universidade
interesante e que me entusiasmou; a
grande ênfase de Cambridge é na in-
de Columbia em Nova Iorque; e notei, o
ideia original não era que eu fosse tra-
vestigação e no desenvolvimento pes-
que é muito curioso, que o Maio de 68
balhar com o Linnett, mas sim com um
soal. Cambridge era uma das Universi-
ainda está presente nas pessoas. O
indivíduo muito conhecido na altura que
dades onde se preparavam os quadros
Maio de 68 teve uma importância maior,
era o Longuet-Higgens; nessa altura, o
do Império, toda a ênfase era posta na-
estranhamente, numa universidade
Linnett ainda estava em Oxford. O Lon-
quilo que nós faziamos por nós próprios.
americana em Nova Iorque do que teve
guet-Higgens escreveu-me uma carta a
E havia de facto grandes debates. A pró-
em Inglaterra, em particular em Cam-
dizer que, em boa verdade gostaria de
pria união de estudantes organizava um
bridge. Ou, pelo contrário, até talvez na-
ser supervisor mas que iria mudar para
debate semanal muito interessante,
tural porque os problemas que levaram
QUÍMICA
ao Maio de 68 em França, não existiam
ou vinte anos atrás, mas as dos últimos
em Inglaterra.
quatro cinco anos. E é essa a razão.
Pertence a uma numerosa geração de
Químicos que rumaram a Inglaterra
para fazer o doutoramento. É um movimento que aconteceu em Lisboa, no
Porto e em Coimbra. Porque razão Inglaterra e não outro qualquer País,
como França, Alemanha, Estados Unidos, ou mesmo Itália?
Então porque é que abandonou a Química principalmente numa área tão
estimulante como a que investigava?
Sim havia razões. Por um lado pela boa
reputação das Universidades em Ingla-
Por uma razão simples. Porque depois
de 12 anos de Reitor em que estive praticamente afastado da investigação em
Química Quântica, seria extremamente
difícil regressar. Eu tinha perdido muito
tempo.
Tenho aqui uma sua citação, que foi
escrita para comentar os ranking das
escolas."As medidas anteriores que visavam a criação de uma escola inclusiva,
uma escola aberta a todos, símbolo de um
sistema que favorece a mobilidade social e
a igualização dos cidadãos, passaram
agora a ser atacadas em nome da defesa
e promoção da qualidade do ensino, se necessário com recurso à substituição progressiva das inovações pedagógicas por
pedagogias tradicionais reinventadas (os
exames, os procedimentos disciplinares,
os chumbos, etc.)." Estas suas palavras
não correm o risco de ser interpretadas
como a defesa de um nivelamento por
baixo?
que eram três anos no máximo quatro,
Mas vinha de uma Química teórica que
não necessita de tanta infra-estrutura
de laboratório...
as coisas funcionavam normalmente. O
Sim mas as coisas mudam completa-
caso Francês era complicado, porque
mente, e eu estive completamente afas-
É evidente, quando se tira alguma coisa
tado do meio. Por outro lado, durante o
fora do contexto, não se pode perceber...
terra. Depois porque era um processo
que estava bem estabelecido. Sabia-se
havia uma confusão entre os dois tipos
de doutoramento; o caso alemão estava
de lado porque as pessoas não falavam
alemão, nos Estados Unidos o caso também estava praticamente arrumado porque era muito caro e era bem mais
longo. Do lado do Estado Português
houve claramente um benefício da solução inglesa, até porque o Veiga Simão,
que na altura era ministro, tinha sido
doutorado em Inglaterra; e uma boa
parte dos professores que na altura estavam doutorados, ainda que em Engenharia, tinham de facto sido doutorados
em Inglaterra, Pelo meu lado tendo um
processo de serviço militar à frente, convinha-me também algo que não fosse
demasiado longo porque depois podia
vir a ter problemas. Mas as estatísticas
estão aí. Acho que cerca de 75 por
período que estive na Reitoria, tive um
grande interesse pelo desenvolvimento
de matérias ligadas às políticas do ensino
superior. Tive alguns amigos meus es-
Mas todo o seu artigo parecia reflectir
este sentir.
Não há dúvida nenhuma que o caso dos
trangeiros que começaram de certo
Estados Unidos é um caso óbvio, em
modo a convidar-me para este tipo de ac-
que a Universidade funciona em muitos
tividades . Aliás o Reitor de uma Univer-
casos (e não é só a universidade), como
sidade Holandesa, que na altura dirigia
um instrumento perpetuante da socie-
um centro de política do ensino superior,
dade de classes. No fim de contas só vai
teve uma grande influência na minha viragem para essa área. Convidou-me
para fazer várias conferências e era uma
área nova. Também é verdade que eu
nunca tive a ideia de que uma pessoa
deva estar muito tempo na mesma coisa.
Comecei pela Engenharia Química, depois passei para a Química...
para uma grande Universidade privada
americana, ou quem tem dinheiro, ou
uma determinada percentagem de alunos de carácter excepcional que lá consegue chegar, mas a generalidade da
população não tem qualquer possibilidade de lá chegar. Por outro lado, na
Europa, durante as últimas décadas
houve uma enorme ênfase no usar o en-
Mas esteve numa área extremamente
sino como factor de promoção social. O
cento dos jovens académicos que se
aliciante, o estudo da estructura elec-
acesso para todos, o ensino secundário
foram doutorar na área da Ciência e
trónica.
Tecnologia o fizeram na Inglaterra. Ao
contrário das áreas das letras e das
Já foi mais aliciante...
Ciências Sociais em que foram para
Uma área a que foi atribuído o prémio
Nobel ainda em 1998?!
França
para todos, o ensino superior para
todos, e isso hoje começa a ser posto
em causa. E porque é que começa a ser
posto em causa? Porque de repente as
classes mais favorecidas notaram que
afinal aquela tal licenciatura já não dava
No seu curriculum abreviado não consta nenhuma publicação em Química.
No entanto trabalhou e publicou com o
Prof. Linnet, um Químico de grande
envergadura. Será que quer apagar a
Química da sua vida?
cânica Quântica foi aliciante nos anos
rantido nos sítios devidos. E portanto há
vinte e trinta, quando de certo modo
que retomar, ou que recriar as vanta-
toda a Física foi formulada e era uma
gens de classe. E só conseguem recriar
grande novidade. Acho que depois a
as vantagens de classe, tornando a criar
partir dos anos setenta, começou muito
um ranking de instituições. De um lado
Não. De maneira geral os curricula que
a mastigar. Mais computador, menos
os bons Colégios para onde irão os seus
Acho que a Química Quântica ou a Me-
direito aos filhinhos de terem o tacho ga-
me pedem são curricula para coisas ac-
computador, mais algoritmo menos al-
filhos, do outro a escola de não sei de
tuais, e neste momento eu não faço Quí-
gortimo, o algoritmo dos algoritmos!
onde para onde irá o filho do padeiro, e
mica. Num curriculum resumido não
para mim as coisas perderam o seu fas-
depois por aí acima. A sociedade terá de
vou buscar as coisas que fiz há quinze
cínio.
pensar então o que é que pretende.
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16
QUÍMICA
Mas não precisamos de gente bem pre-
biblioteca fazer trabalho, a ideia era de-
Então como é que proporia essa diver-
parada e qualificada? e a Universida-
senvolver a capacidade de um indivíduo
sificação do ensino superior?
de não a poderá formar?
saber por si. O professor dizia eu sou
Sim sim, pois pode. Mas não tem nada
que ver com esta coisa do ranking. Que
é a coisa mais estúpida que se pode
imaginar. Eu não admito um rankingdas
escolas secundárias sem ter em conta
todos os outros factores que lhe estão
associados. Uma escola no Casal Ventoso, nunca será uma escola das primei-
um investigador e venho para aqui uma
hora aturar estes tipos. A qualidade das
aulas de uma maneira geral era má. Era
má e eram poucas, quer dizer. Havia
três trimestres, só havia aulas teóricas
Como em Inglaterra, universidades que
de facto são conhecidas a nível mundial
e que só têm alunos de excepção, Oxford, Cambridge, etc, e as outras que
depois ensinam o resto da população.
no primeiro e segundo trimestre; cada
E nós temos possibilidade de ter isso
trimestre tinha dezasseis aulas, o resto
aqui em Portugal?
era trabalho pessoal.
Só teremos isso se tivermos a coragem
ras do ranking, onde quer que seja. As-
O grande drama hoje é que nós temos
em deixar que uma ou duas sejam e as
neira será penalizar essa escola, e os
as universidades que se massificaram,
outras não. Claro,..risos..., esse é o pro-
professores, que se calhar até são muito
não há hoje dentro do País universida-
blema. Em Inglaterra não é preciso
mais dedicados do que aqueles que tra-
des de elite. Ora não se ensina da
nehum ranking para saber que Oxford e
balham na escola dos meninos da Foz.
mesma maneira um aluno de elite e um
Cambridge são excelentes e que a Uni-
aluno de massas.
versidade Oxford-Brooks, um antigo Po-
Isto no caso do ensino secundário, mas
um ranking universitário?
Essa é uma das áreas de interesse aqui
do CIPES', os desafios da massificação.
O ranking universitário,... também aí
Quais são esses desafios?
tenho as minhas dúvidas.
O grande problema da massificação é o
litécnico promovido, é uma outra coisa
completamente diferente
Portanto acha que há necessidade de
nós termos também este tipo de estratégia?
Precisamos ou não de gente qualifica-
da Universidade não se ter adaptado a
da e bem preparada?
isso. Nós continuamos a olhar para os
Isso não tem nada a ver com os ran-
nossos alunos e a dizer que estão mal
uma ou duas instituições com capacida-
kings.
preparados; continuamos a ignorar que,
de de competir a nível internacional,
quando temos um ensino massificado,
essa é a única possibilidade; não se
Se nós queremos que em Portugal haja
Precisamos de boas universidades?
uma porção muito grande dos alunos
pode andar a dizer que todos os Politéc-
Isso sim!
tem de ter um acompanhamento muito
nicos, todas as Universidades vão fazer
mais completo, e mais intenso do que o
investigação. Não dá, onde é que têm
Faz muito melhor, mais bem ao ensino,
de um aluno numa Universidade de
dinheiro para isso? onde é que têm pes-
ter uma universidade que por exemplo
elite; se calhar as Universidades deve-
soas? Nenhum País tem. Nos Estados
siga os padrões da Universidade de Co-
riam preocupar-se em homogeneizar os
Unidos em que há três mil e não sei
lumbia (NY), que tivesse excelência
alunos à entrada, vendo quais são as
quantas instituições de ensino superior,
como padrão absoluto, e em que, quem
deficiências deles: Nós continuámos
há cento e poucas Universidades de in-
não for excelente, o professor, o investi-
como professores universitários, e eu
vestigação. Claro que depois poderemos
gador, vai para o olho da rua! o que nós
próprio a mim me acuso, a pensar que
ter outros problemas como os de justiça
não fazemos. Isso faz muito melhor à
se o aluno é adulto deverá trabalhar por
social, etc., mas terão de ser resolvidos
qualidade do que fazer o ranking. O ran-
si, que se desenrasque! e isto não fun-
de outra forma.
king não é algo que contribuia para a
ciona numa universidade de massas,
qualidade.
em Cambridge sim.
Mas toda a gente sabe que Cambridge
Então sugere que haja diversos tipos
era uma Universidade excelente e pro-
de universidades, uma para as elites...
vavelmente continua a ser uma Uni-
Acha que podemos ter uma boa gestão
sem ter uma boa política para o Ensino
Superior?
Não ligaria em excesso as duas coisas.
Exactamente. Não é possivel nenhum
O que uma pessoa tem de perceber é
País ter dinheiro para ter ensino supe-
que estamos numa fase, não é só uma
Era e é, mas isso é por outra razão. O
rior com investigação em termos de um
fase em Portugal, também noutros paí-
padrão de qualidade das aulas de Cam-
sistema massificado. Não tem dinheiro
ses europeus e nomeadamente em In-
bridge era horroroso.
nem interessa. Porque uma grande
glaterra, onde há uma emergência de
massa de alunos que hoje chegam ao
políticas de pendor neoliberal. Que põe
versidade excelente.
Na altura?
ensino superior não quer um ensino de
uma grande ênfase na eficácia e efi-
Na altura e agora. É uma Universidade
elite. Quer é uma coisa que lhe dê uma
ciência económica das instituições, o
de elite. A função da Universidade não é
profissão. Nem sequer fazer uma carrei-
que leva a por em causa os modelos tra-
dar a papa aos meninos nas aulas. Cada
ra de investigação. Nem todos, se ca-
dicionais de gestão das instituições uni-
dois alunos tinham um tutor, porque o
lhar, querem um grande desenvolvi-
versitárias. Será que um Reitor é um
tutor mandava os meninos irem para a
mento teórico nas aulas.
bom gestor ou é preciso ir buscar um
QUÍMICA I 17
tipo à Sonae? A minha opinião é que
ção da profissionalização do gestor aca-
chamada Regents House onde se sen-
uma Universidade de excelência não
démico. O presidente de uma universi-
tam três mil professores; sempre que há
pode ser gerida como uma empresa,
dade americana é escolhido pelas suas
uma decisão da administração central —
e isso dura há vários anos — sempre que
não tem nada a ver uma coisa com a
qualidades, mas é um individuo que
outra. Até porque uma Universidade de
não é um empresário, é um académico
há uma ideia ao nível central de profis-
Excelência é uma universidade onde se
que é treinado como gestor; eles
sionalizar a gestão, como bastam cinco
faz inovação. E a inovação está ligada a
mudam de universidade para universi-
assinaturas para levar essa decisão ao
outra coisa, está ligada à transgressão.
dade, têm as suas carreiras. Embora
Regents House, a universidade vota
As grandes descobertas da Física, a Me-
haja recentemente uma crítica quanto à
sempre conta, em nome da defesa dos
cânica Quântica a Teoria da Relativida-
profissionalização das universidades
valores académicos. E a Universidade
de etc, foram transgressões enormes
americanas. Há um livro que foi escrito
de Cambridge continua a ser boa. Mas
em relação às teorias científicas aceites.
por um individuo chamado Charles
se calhar não é gerida pelos padrões de
Se calhar numa universidade muito re-
Smith, que é da universidade de Nova
economia e de eficiência que um em-
gulada, empresarial, esse tipo de desco-
Iorque, onde se chama a atenção para
presário poderia escolher.
berta nunca teria sido possível.
que em muitos sítios o que aconteceu
foi, ao irem buscar não o presidente
Em relação aos acordos de Bolonha,
académico, mas o gestor profissional, as
quais acha que serão as consequên-
Exactamente, a capacidade de inovação
pessoas se esqueceram de uma coisa: é
cias da sua aplicação, pensa que have-
da universidade está também muito li-
que dentro das universidades há um
rá uma profunda re-estruturação do
gada a um certo desperdício, à possibi-
número enorme de horas de trabalho
nosso ensino superior?
Porque não há desperdício?
lidade de uma pessoa poder fazer coi-
que são feitas voluntariamente pelos do-
sas malucas, durante cinco anos aquilo
centes e sem custos. Presidentes do
não dá nada mas um dia...E isso não é
Conselho Científico, Directivo e Pedagó-
possivel numa instituição que seja geri-
gico, membros do Senado, etc. O traba-
da como uma empresa.
lho que isso dá em termos de adminis-
Mas nos Estados Unidos as melhores
universidades serão por certo inovadoras e são privadas. Como o explica?
tração sendo feito voluntariamente, não
tem encargos para a instituição. Quando
surge o gestor profissional bem pago, as
pessoas olham para o lado e pensam,
Não pode comparar os Estados Unidos,
então é o trabalho dele. E o gestor pro-
com a sua cultura muito específica, com
fissional, nos Estados Unidos, perdeu
os outros países. Quando fui fazer a
de repente o apoio dos académicos, e a
acreditação da Universidade de Colum-
solução foi reproduzir-se e criar uma es-
bia em Nova Iorque, eles tinham termi-
tructura administrativa para substituir a
nado uma operação de recolha de fun-
falta de apoio do lado académico, e por-
dos que em dois anos lhes deu cerca de
tanto isso gera este conflito entre os ad-
dois biliões de dólares, cerca de 400 mi-
ministadores e os académicos; o que
Eu sou um céptico dos acordos de Bolonha. Acho que os acordos de Bologna
não fazem muito sentido, quando durante muito tempo se fez a defesa que
uma das riquezas das universidades europeias era a diversidade dos seus sistemas de ensino. Temo que os acordos de
Bolonha possam acabar, ou poderiam
acabar, numa grande uniformização a
nível europeu. Mas não vai acontecer.
Estou convencido que os acordos de
Bologna não vão chegar ao fim. Há uma
propaganda, um marketing, em torno
de Bolonha de que está tudo a correr
sob esferas. Mas isso não corresponde
há realidade.
lhões de contos; isto em dádivas! eu se
em boa verdade acabou por resultar
Mas afirma-se que se deseja preservar
for pedir dinheiro aqui, aos nossos anti-
num aumento dos encargos da gestão
a diversidade.
gos alunos, riem-se-me na cara...risos.
para substituir o trabalho voluntário que
Isto funciona nos Estados Unidos, mas
desapareceu. Todos nós queremos que
não nos outros países. Acho que não se
as instituições sejam bem geridas. Só
devem importar modelos. Assim como
um estúpido é que não quer isso. Mas
de. Eu neste momento estou a fazer um
Se analisar o que está a acontecer nos
diversos países verá uma outra realida-
não podemos importar o modelo do pri-
gerir bem uma instituição universitária
trabalho com um grupo de investigado-
vado americano para a Europa. Porque
não tem nada a ver com gerir uma fá-
res internacionais e financiado pelo go-
o que aconteceu nos Estados Unidos foi
brica de salsichas ou de parafusos ou, o
verno Italiano, o qual pretende nomea-
que todas as primeiras instituições do
que quer que seja. É uma coisa com-
damente analisar o estado de
ensino superior, todas as grandes insti-
pletamente diferente.
implementação do processo de Bolo-
tuições, eram todas privadas. Só apareceram instituições públicas depois das
instituições privadas. Por isso são instituições que mantiveram uma longa tradição de qualidade. As privadas aqui na
Estava a dizer que para as universidades de excelência não poderiamos ter
um gestor tipo Sonae, mas para as outras?
nha; tivemos recentemente uma reunião em Milão, onde se concluiu que,
por exemplo, na Alemanha só dois por
cento dos alunos é que estão em cursos
compatíveis com o processo de Bolo-
Europa são meras operações comer-
Deixe-me dar-lhe um exemplo. A minha
nha. Porque o governo permite estarem
ciais. Mesmo assim nas grandes institui-
querida universidade de Cambridge, em
os dois sistemas a funcionar em parale-
ções americanas o que há é uma tradi-
boa verdade é governada por uma coisa
lo, numa mesma Universidade, e estas
18
I
QUÍMICA
preferem o sistema tradicional ao méto-
se vier a ser desempregado, o problema
Idade Média. Porque na Idade Média
do Bolonhês.
é seu. Para se manter "empregável" vai
havia muito mais razões para a mobili-
Os italianos também têm os dois sistemas a funcionar em paralelo?
Exactamente, e em França também,
onde há mais de dez mil nomes diferentes de cursos. O que acontece é que as
instituições têm os dois sistemas a funcionar em paralelo. Isto de Bolonha é
mais algo que está a ser empurrado, de
cima, do que propriamente algo em que
as instituições estejam convictamente
envolvidas. Se ler a lei portuguesa, ou a
proposta que está na Assembleia da
República o que é que diz? Em princípio
é de quatro, mas pode ser de cinco ou
pode ser de seis. O mestrado pode ser
fazer pós-graduações, e vai pagá-las. É
dade. As cadeiras eram todas iguais, em
uma desresponsabilização do Estado.
todas as faculdades o sistema de estu-
Mas acha então que os três anos não
são suficientes para termos um ensino
superior ou pelo menos uma formação
de qualidade?
Três anos não são suficientes, não.
E em relação ao sistema europeu de
créditos?
Isso não aquece nem arrefece.
Mas será uma vantagem, uma vez que
permite uma circulação dos estudantes mais fácil?
dos era todo igual e a língua era a
mesma. Havia muito mais uniformidade
e, por haver poucas universidades, os
alunos defendiam-se com a mobilidade°. Eu temo que se levassem o processo de Bolonha até às últimas consequências iríamos acabar num sistema
muito mais homogeneizado do que o
que temos hoje.
E isso para si é uma desvantagem...?
É e, aliás, toda a gente diz que é.
Haveria mais mobilidade?
de um ano ou pode ser de dois. Pode-se
Acha que sim? Deixe-me dizer uma
Porquê? Para ir a outro lado ver uma
juntar o primeiro ao segundo ciclo que
coisa. O que é ridículo no meio disto
coisa igual? A própria fase de homogeneizar acaba por destuir a mobilidade.
pode ser de cinco anos, ou três mais um
tudo é que os alunos são cada vez
ou quatro mais dois.
menos móveis.
Mas há países em que a tendência é
Se pensarmos que um semestre são
rante 13 anos. Num balanço de activi-
encurtar um pouco o primeiro ciclo.
trinta créditos, e que em vez de fazer-
dades há sempre um deve e um haver.
mos avaliação cadeira a cadeira pode-
Resumidamente, o que mudou para
mos transferir o equivalente a um se-
melhor, e o que ficou na mesma, ou
mestre?
eventualmente piorou, após os seus
Mas está na lei que pode ser quatro
anos.
O primeiro acordo assinado, na Sorbonne, é conhecido como o Viagra dos ministros fracos...risos. Porque havia três
ministros que estavam com problemas
em casa, a França a Itália e a Alemanha, e conjuntamente com a Iglaterra
assinaram aquilo; o Inglês assinou porque julgou que era como o sistema inglês e achou piada ver os franceses e os
alemães a assinarem aquilo; e os outros
porque precisavam da desculpa euro-
Sobre isto estamos de acordo, mas o
Foi Reitor da Universidade do Porto du-
mandatos.
que é rídiculo é que o aluno é cada vez
Acho que a universidade mudou signifi-
menos móvel.
cativamente. Mudou porque se tornou
Porquê?
uma universidade com reconhecimento
internacional, mudou porque foi uma
Por um lado porque deixou de haver fi-
época feliz em que havia dinheiro, e
nanciamento comunitário para a mobili-
portanto fizeram-se investimentos enor-
dade; e também é menos móvel dentro
mes em matéria de equipamentos para
dos próprios países, como é o caso in-
ensino, em matéria de equipamentos
glês, porque passaram a substituir as
para investigação. E mudou substan-
bolsas por empréstimos. Hoje a mobili-
cialmente porque em termos de inves-
dade em Inglaterra está a diminuir e
tigação e de pós-graduação foram feitos
Mas a nova Ministra da Educação italia-
está a diminuir de uma forma significa-
progressos muito grandes. Também não
na já disse que vai permitir coisas que
tiva, porque um aluno faz as contas e
havia a mania de que as universidades
nada têm a ver com Bolonha. Portanto
diz, se eu ficar em casa ao fim de qua-
eram empresas; o que vai piorar neste
eu não sei o que isto vai dar. Mas tam-
tro anos devo tanto, se eu mudo vou
momento são todas estas restições de
bém é possível olhar para o processo de
pagar mais, faz as contas e se calhar
natureza económica. Que, por sua vez,
Bologna como uma forma de desres-
conclui que a dívida não compensa. Há
poderão provocar também uma desva-
ponsabilizar financeiramente o.governo
um conjunto de políticas reais que são
lorização social dos diplomas universitá-
em relação ao ensino superior. Não
absolutamente contraditórias com a da
rios. Por outro lado, vai piorar o facto de
sendo fácil na maioria dos países euro-
mobilidade.
peia para implementar aquilo em casa.
peus impor as propinas, se calhar é possível reduzir os compromissos do Estado
diminuindo a duração dos estudos. Por-
Então na sua opinião nós não precisávamos de nenhuma re-estruturação?
no ensino superior não haver políticas
coerentes, que não há.
Para si um Reitor pode condicionar a
Universidade, isto é, ter um mau Reitor
que ao fim de três anos, se você tem o
Há um colega meu que diz que, é um
primeiro ciclo, pode, em teoria, ir traba-
inglês aliás, a percentagem de alunos
lhar; o conceito de emprego foi substi-
que é móvel na Europa é inferior à per-
Sim sim, não só nisso. No período em
tuido pelo conceito de empregabilidade,
centagem de alunos que era móvel na
que estive como Reitor, e não falo só de
ou um bom Reitor pode ser crucial?
QUÍMICA
mim, falo de um conjunto de Reitores
passaporte para o emprego, hoje não é
para comprar coisas. la alimentar esse
que havia no País, inclusivamente havia
nada.
ciclo. E isto quebrou-se. Não sei se este
uma grande influência do conselho de
Reitores na definição de políticas. Muitas leis que hoje estão aí publicadas, o
financiamento, a avaliação, a flexibilidade de gestão das universidades, a pró-
Atendendo a que o diploma universitá-
modelo sobreviverá. Se calhar era bom
rio vale pouco, acha que mesmo assim
que não sobrevivesse. Se comparar as
vale a pena fazer uma licenciatura e
estatísticas mundiais, verá que está a
estudar Química em par ti cular?
acontecer em todos os países, nomeadamente nos Estados Unidos, Inglater-
pria lei da autonomia, feitas pelos Reito-
Sim vale porque quem não tiver uma li-
res antes do Governo. E hoje esse
cenciatura está bem mais tramado do
ra etc, um crescente aumento das desi-
dinamismo perdeu-se e as pessoas
que quem tiver uma!...risos
gualdades sociais.
Não é muito prometedor...
Poderá piorar ainda?
perdeu-se também muita coesão entre
Sabe porquê, porque na actual organi-
Exactamente o que eu digo. Tenho até
os membros do CRUP.
zação mundial da economia quem não
vergonha do mundo que vou deixar aos
tiver qualificações está feito...porque o
meus filhos e aos meus netos.
agora em vez de tomarem a iniciativa
aguardam pelas políticas ministriais;
Não está de acordo com o ranking, mas
quanto à avaliação da Universidade?
capital vai para onde for mais benéfico
para ele, o que se mede como "onde os
Eu devo dizer que sou das pessoas que
recursos forem mais baratos". A indús-
mais trabalha em avaliação. Se olhar
tria têxtil portuguesa vai falir toda, e no
para aquilo que está aqui naquela pare-
calçado estão a ir uns atrás dos outros,
de são tudo avaliações internacionais.
porque se faz a mesma coisa mais ba-
Referências
rato na China; e um dia será mais bara-
1 - A Faculdade de Letras da Universidade
to em África. E quem diz disto diz do
do Porto foi extinta pelo Decreto n.° 15.365,
Mas avaliação não deve ser tornada
pública?
resto. Se a Ford-Volkswagen descobrir
Sim, o que acho é que quanto mais tra-
que é mais barato montar os monovolu-
balho nisso, mais cínico sou sobre os
mes na República Checa, onde ainda
efeitos concretos da avaliação.
são mais bem educados do que nós, e
A avaliação dos nossos centros de in-
recebem menos, mudam para lá calma-
vestigação foi uma das coisas impor-
mente. E daí que a tal noção do empre-
tantes feita pelo anterior Ministério da
go tenha desaparecido, a ideia é a de
Ciência e Tecnologia e mantida pelo
empregabilidade.
de 12 de Abril de 1928. Restaurada em
1961 pelo Decreto n.° 43.864, de 17 de
Agosto, inicia as aulas no ano lectivo de
1962-1963 com duas licenciaturas, História
e Filosofia, e o curso de Ciências Pedagógicas.
2 - Na altura, o curso de Engenharia Química consistia em 3 anos preparatórios leccio-
actual. Avaliar a produtividade científi-
Hoje um jovem que tirou um curso e
ca, ou o que quer que se define como
nados na Faculdade de Ciências, com uma
que se casou, pode dali a cinco meses
produtividade científica. Houve muitas
enorme carga em Matemática, Física e Quí-
ou seis meses estar desempregado. Não
surpresas, boas e más.
mica, seguidos de 3 anos na Faculdade de
tem estabilidade de trabalho, será que
Sim, não sei se foi feita da melhor ma-
pode ter filhos?, é um risco muito gran-
Engenharia, com uma componente mais
técnica e aplicada.
neira; mas a avaliação da investigação é
de. Tudo isto modifica dramaticamente
muito mais fácil de fazer do que a do
a nossa sociedade. A minha esperança
ensino. Aliás repare nenhum de nós ja-
é que este modelo não seja estável.
mais reagiu quanto tem os seus artigos
Porque, repare, há uma crise económi-
4 - Esta situação começou a inve rter-se
avaliados pelos referees, sempre foram,
ca a nível mundial, que apesar de todas
quando o "príncipe" percebeu a impo rtância
3 - CIPES - Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior
e por isso está habituado a isso. No en-
as globalizações não está a diminuir,
da universidade e começou a criar universi-
sino os critérios são completamente di-
antes pelo contrário. Se calhar puseram
dades locais as quais muitas vezes foram
ferentes.
os pobres tão pobres que agora não há
protegidas proibindo os nacionais de se des-
quem compre o que se fabrica em ex-
locarem para estudar no estrangeiro. Por
cesso. No ciclo anterior, no período do
exemplo, em Po rt ugal, em 1440, o rei Afon-
Fordismo, o mecanismo baseava-se
so V deferiu uma petição dirigida às Co rtes
num círculo vi rt uoso, em que se procu-
pela Universidade de Coimbra, na qual se
Falou mesmo agora na desvalorização
social dos diplomas universitários.
Não há re-estruturação que possa inverter a situação?
rava o emprego total; havia um estado
pedia que todos os súbditos com diplomas
Hoje o diploma universitário em si, e
providência que assegurava os grandes
obtidos no estrangeiro tivessem que pagar
com a excepção de duas sou três áreas
riscos como a saúde, dava subsídios de
20 coroas à Universidade e fossem preteri-
muito especiais, já não tem o valor que
casa, de transportes, etc; e assim, a
dos, a favor dos licenciados por Coimbra,
tinha antigamente; um canudo era um
malta que trabalhava tinha dinheiro
nos concursos a empregos públicos.
19
2O
QUÍMICA
Perfil Prof. Alberto Amaral
horas semanais de leccionação. Esta
docentes o que veio a resultar no iní-
era a janela aberta para a modernida-
cio da actividade de investigação re-
Se tiver ocasião, procure no Departa-
de que se foi depois progressivamente
gular, sistemática e com um ritmo que
mento de Química de Cambridge a fo-
alargando e por onde Alberto Amaral
não cessou ainda de crescer. Na Fa-
tografia de grupo do ano de 1965/66.
saltou para Cambridge logo no termo
culdade de Ciências, teve um papel
Procure o mais jovem e franzino dos
da sua licenciatura, mesmo sem ter
importante pela sua capacidade de in-
fotografados. É o Alberto Amaral!
garantido o apoio financeiro...
tervenção no palco da política univer-
Com raízes em Fafe, Alberto Amaral
Em Cambridge, trabalhou no desen-
sitária e nos seus bastidores onde se
fez os seus estudos no Porto, no então
volvimento de métodos semi-empíri-
iniciou. Foi nesta altura que tomou a
Liceu Nacional D. Manuel II, hoje de-
cos sob a orientação de J. W. Linnett,
iniciativa pessoal de preparar a cons-
dicado de novo a Rodrigues de Frei-
um antigo aluno de Charles Coulson
trução do centro de cálculo da Univer-
tas, e na Universidade do Porto. A Li-
que estava então no topo da sua pro-
sidade do Porto e dos departamentos
cenciatura em Engenharia Químico
dutiva carreira. Em menos de três
de Química e de Física, lançando as
Industrial estava então organizada em
anos regressou ao Porto trazendo a
bases do que é hoje o pólo dois da
seis anos, os três primeiros na Facul-
sua juventude, o seu conhecimento
universidade no Campo Alegre. Como
dade de Ciências, no velho edifício da
pioneiro de Química Quântica, a sua
Reitor, iniciou uma nova era no exercí-
Academia Real de Marinha e Comér-
excelente capacidade pedagógica e o
cio da função. Reorganizou profunda-
cio e da Academia Politécnica, e os úl-
seu inconformismo para uma Facul-
timos três anos na Faculdade de En-
dade ainda moldada pelas suas graní-
genharia, à Rua dos Bragas. Na
ticas paredes novecentistas. A sua pu-
Faculdade de Ciências, cobriam-se as
blicação didáctica sobre as aplicações
bases de Matemática, Física e de Quí-
de teoria de grupos em Química foi
mica a um nível muito respeitável mas
pioneira em Portugal e circulou por
algo irregular. Na Química pontificava
longos anos. Não fui aluno de Alberto
a velha geração liderada por Alberto
Amaral. Passei pela Faculdade de
Terminados os seus mandatos de 14
Brito e Mendonça Monteiro que tinha
Ciências enquanto ele estava em
anos, Alberto Amaral regressa à quali-
atravessado a profunda depressão
Cambridge. Tive depois contacto com
dade de simples professor da Univer-
económica e social subsequente à
ele até ao jantar de despedida conjun-
sidade do Porto e à direcção do CIPES
nossa participação na primeira Gran-
to quando ele seguiu para a Universi-
(Centro de Investigação de Políticas do
de Guerra e depois a longuíssima "rec-
dade de Lourenço Marques (o Serviço
Ensino Superior ligado à FUP, Funda-
tificação" financeira do Estado Novo. A
Militar assim obrigava) e eu para Ox-
ção das Universidades Portuguesas).
iniciação dos futuros engenheiros era
ford em 1972. Reencontrei-o no re-
É hoje uma personalidade muito des-
feita pela Química Inorgânica de Hum-
gresso ao Porto que fizemos com 2
tacada a nível europeu e com uma ac-
mente todos os serviços da universidade, preparou os planos e começou
o esforço de reinstalação das várias faculdades e liderou muitas das inovações da política universitária portuguesa nos últimos anos.
berto Almeida, que passara pelos
meses de diferença logo após a pro-
tividade bem reconhecida na área de
campos da Flandres e que, entre
mulgação do decreto de Sottomayor
investigação das políticas do ensino
aulas no Colégio Almeida Garre tt e as-
Cardia sobre a gestão universitária.
superior. Tem uma actividade muito
sistência técnica ao Instituto do Vinho
Partilhámos depois o gabinete vários
intensa como consultor, como orador
do Porto, se mantivera mais de 30
anos quando o edifício dos Leões já
e como autor ou co-autor de grande
anos em posições juniores para só vir
rebentava por todas as costuras face
número de publicações. Nestas áreas,
a chegar ao lugar de Professor Cate-
ao rápido desenvolvimento do número
é, provavelmente, o perito português
drático alguns anos mais tarde, nas
de estudantes, do quadro docente e
de maior impacto internacional. Entre
vésperas da jubilação. Deste ambien-
da investigação. Pouco tempo depois
nós tem actuado como consultor de
te, Alberto Amaral recordará até hoje o
Alberto Amaral candidatou-se a Presi-
sucessivos governos de cores diversas
método das câmaras de chumbo para
dente do Conselho Directivo da Facul-
e a Missão de que está encarregado
a síntese do ácido sulfúrico que veio a
dade de Ciências, posição que só veio
ser o tema da última lição do velho
a abandonar quando assumiu a posi-
mestre; terá visitado em Estarreja as
ção de Reitor da Universidade do
fábricas de produção de adubos onde
Porto. A gestão de Alberto Amaral no
aquele método era usado. Fernando
Departamento de Química, na Facul-
Serrão e João Cabral lutavam em con-
dade de Ciências e, depois, na Reito-
dições hoje inimagináveis para manter
ria foi muito inovadora e transformou a
uma réstia de esperança e de activi-
instituição no que hoje conhecemos.
dade científica naquele ambiente de
Ainda no Departamento de Química,
ensino livresco onde se podiam espe-
impulsionou o início da preparação de
rar de cada docente mais de trinta
doutoramento de uma série de jovens
para a reforma dos estudos de saúde
em Portugal tem tido um amplo reconhecimento e tem conseguido manter
alguma estabilidade nesta área especialmente delicada pela gravidade dos
problemas com que se debate, pela
força dos interesses em jogo e pela
importância e impacto das opções tomadas.
José Ferreira Gomes