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Prof. Alberto Amaral

2003, Boletim da Sociedade Portuguesa de Química

13 Prof. Alberto Amaral CONDUZIDA POR F. PINA E MARIA JOÃO MELO ainda está na Faculdade de Ciências, decidimos seguir a Engenharia Química. Não houve assim nenhumas razões de peso; gostava de coisas de laboratório, mexia em bichos. Quando era miúdo abria toupeiras e coisas do género, até que me fartei daquela existência dirigida para a medicina, e enveredei pela Engenharia Química. O período da sua licenciatura foi marcado pela crise académica de 62. Como viveu essa crise? Foi com um ce rt o dive rt imento; Portugal atravessava um período complicado, as pessoas hoje, pelo menos os jovens, já não têm a percepção do que foi. 0 centro principal das atenções foi Coimbra e um bocado o Técnico, no Po rt o foi algo mais contido. Mas que abalou um bocado a instituição. Creio que a Faculdade de Letras tinha O Professor Alberto Amaral, recebeu-nos no CIPES em pleno Matosinhos, num edifício antigo, bem apresentado, com o excelente metro de superfície à porta. Numa cidade onde a meio da tarde se viam pessoas no café em frente, sentadas nas mesas em tranquila conversa, fazendo lembrar um tempo onde as pessoas falavam umas com as outras e se conheciam nos cafés. Um tempo que ainda resiste nalguns locais, uma certa tranquilidade e qualidade de vida que vai durar até quando? sido recentemente reaberta`? Sim, sim. A Faculdade de Letras do Po rt o tem um passado histórico muito complicado, a Faculdade de Letras foi extinta por um ministro. Será restabelecida mais tarde, mas viverá sempre no terror de poder ser extinta uma segunda vez. É algo que pesava na consciência dos professores. Mas a crise académica de 62 teve algo Fez a sua licenciatura em Engenharia Químico-Industrial, na Faculdade de a massacrar-me para ir para medicina, e a ver com a sua tomada de consciência tanto me massacrou que acabei por política, ou passou-lhe ao lado? Engenharia do Porto, em Julho de 1965. dizer, medicina não!...risos. Naquela al- Porque razão escolheu a Química, ou tura a Engenharia Química estava relati- melhor a Engenharia Química? vamente na moda, aliás um dos meus primos mais velhos tinha estado a estu- Concerteza que sim. Não só isso como depois o período em que estive em Cambridge, em Inglaterra. Havia um meu avô que era médico e a dar Engenharia Química; de modo que minha avó queria um descendente que quer eu quer um outro primo que é da 1965, em 1968, encontramo-lo com o lhe seguisse as pisadas; andava sempre minha idade, o Adélio Machado, que doutoramento feito em Cambridge. Tendo acabado a sua licenciatura em 14 QUÍMICA Trata-se de um período muito curto para os padrões da época? Em Janeiro de 66 fui para Inglaterra trabalhar numa área que não era laboratorial; doutorei-me em Química Quântica, e acho que isso poderá ter tido alguma influência, porque era algo que não estava dependente do sucesso laboratorial, mas meramente do trabalho de computador. Isso permitiu fazer o doutoramento com uma certa rapidez. Por outro lado, também é verdade que, naquela altura, nós com os 3 anos da Faculdade de Ciências tinhamos uma preparação teórica muito boa. A minha preparação em termos de Matemática, Física, Química era claramente superior à dos meus colegas Ingleses. Já tinha uma posição de assistente quando foi para Cambridge? Não, não; porque devido exactamente a esses períodos da crise académica, houve uma recusa em contratarem-me devido à minha posição algo contestatária. Eu fui para Inglaterra meramente como particular, com uma bolsa. E sem qualquer figação contratual á Universidade. Fui contratado quando regressei. E como foi o seu contacto lá em Inglaterra? O seu supe rvisor foi o Professor Linnett. Edimburgo, para fazer investigação para criar nas pessoas o hábito de dis- numa área completamente diferente, ci- cutir; havia sempre um tema, para o bernértica/inteligência artificial; e por- qual eram contactados dois indivíduos tanto recomendou-me que esperasse de ideias perfeitamente opostas. Um pela vinda do Linnett para Cambridge. debate a que assisti tinha por tema Sai do Porto na ressaca da crise académica e vai para Cambridge. O que é que sentiu quando chegou a Inglaterra um País com liberdade, como é que isso o marcou? "todos os Deuses são redundantes", e os convidados foram o Arcebispo de Cantuária e um notório ateu. Isto criava todo um ambiente de facto extraordinário, porque não havia meramente a questão da aprendizagem, havia também a for- Marcou muito. Há uma situação que eu mação das pessoas; as pessoas eram nunca esqueço. Uma vez eu estava em formadas como gentleman e a pior coisa Londres, e havia uma manifestação, na que se podia fazer era cometer um acto Trafalgar Square. de um conhecido nazi, que não fosse digno de um gentleman. o Moseley, um Inglês meio nobre, e Aí uma pessoa estava de facto marcada. havia um grupo grande de Judeus que faziam uma contra-manifestação. E a polícia estava lá para proteger o E quais eram os actos não dignos de um gentleman? nazi...enfim as pessoas tinham liberda- ...risos. Por exemplo aldrabar, cometer de de falar enquanto não pertubassem a uma incorreção social grave. Mas era de ordem pública, tinham direitos. Foi uma facto um ambiente extraordinário. Havia coisa que a mim, habituado ao velho facilidades enormes na investigação. Portugal, me marcou imenso; a liberdade de expressão, os direitos das pes- E quando voltou? soas, os tribunais a funcionar (uma coisa linha o serviço militar. Adiei aquilo até que nós ainda não temos não é...), efi- perto dos trinta anos, e em 72 acabei cazes e a actuar a tempo e horas. por achar melhor ir para Moçambique. No regresso, a minha mulher estava Na altura era possível ser requisitado grávida do meu primeiro filho e não pela Universidade. E passei quatro anos podia vir de avião, e viemos de barco. em Moçambique durante os quais fiz o Vínhamos de barco em direcção a Es- serviço militar. panha quando numa manhã metem o Então conheceu o Professor Sousa Lobo em Moçambique? Sim o contacto foi feito por professores; jornal de bordo por baixo da porta, e o havia professores da Faculdade (no- jornal de bordo anunciava exactamente meadamente o Professor João Cabral) que o Salazar tinha caído da cadeira: Sim. que me apoiaram e me ajudaram, inclu- abrimos uma garrafa de champa- sivamente a obter a bolsa de estudos. nhe!...risos. Nunca mais me esqueci É curioso porque ele a fi rmou, na entrevista anterior, que o Maio de 68 passou ao lado de Inglaterra. Concorda com esta afirmação dele? E escolheu logo a Química Quântica e aquele laboratório em particular? Escolhi a Química Quântica porque enfim, dentro do nosso Departamento de Química, houve uma certa orientação sobre em que áreas apostar; e nessa altura a área que me propuseram desse episódio, na vinda de barco, em pleno oceano, recebermos a notícia que "o Senhor" tinha deslizado da cadeira pára baixo. Do ponto de vista científico como era o ambiente cultural? Discutia muito com os seus colegas? Sim, sim! é curioso que o Maio de 68 de facto não se fez sentir em Inglaterra. Aqui há tempos, há uns três ou quatro anos atrás, pa rt icipei num exercício engraçado. Fiz pa rt e da equipa que fez a foi da Química Quântica, que eu achei Era um sítio extraordinário, porque a acreditação periódica da Universidade interesante e que me entusiasmou; a grande ênfase de Cambridge é na in- de Columbia em Nova Iorque; e notei, o ideia original não era que eu fosse tra- vestigação e no desenvolvimento pes- que é muito curioso, que o Maio de 68 balhar com o Linnett, mas sim com um soal. Cambridge era uma das Universi- ainda está presente nas pessoas. O indivíduo muito conhecido na altura que dades onde se preparavam os quadros Maio de 68 teve uma importância maior, era o Longuet-Higgens; nessa altura, o do Império, toda a ênfase era posta na- estranhamente, numa universidade Linnett ainda estava em Oxford. O Lon- quilo que nós faziamos por nós próprios. americana em Nova Iorque do que teve guet-Higgens escreveu-me uma carta a E havia de facto grandes debates. A pró- em Inglaterra, em particular em Cam- dizer que, em boa verdade gostaria de pria união de estudantes organizava um bridge. Ou, pelo contrário, até talvez na- ser supervisor mas que iria mudar para debate semanal muito interessante, tural porque os problemas que levaram QUÍMICA ao Maio de 68 em França, não existiam ou vinte anos atrás, mas as dos últimos em Inglaterra. quatro cinco anos. E é essa a razão. Pertence a uma numerosa geração de Químicos que rumaram a Inglaterra para fazer o doutoramento. É um movimento que aconteceu em Lisboa, no Porto e em Coimbra. Porque razão Inglaterra e não outro qualquer País, como França, Alemanha, Estados Unidos, ou mesmo Itália? Então porque é que abandonou a Química principalmente numa área tão estimulante como a que investigava? Sim havia razões. Por um lado pela boa reputação das Universidades em Ingla- Por uma razão simples. Porque depois de 12 anos de Reitor em que estive praticamente afastado da investigação em Química Quântica, seria extremamente difícil regressar. Eu tinha perdido muito tempo. Tenho aqui uma sua citação, que foi escrita para comentar os ranking das escolas."As medidas anteriores que visavam a criação de uma escola inclusiva, uma escola aberta a todos, símbolo de um sistema que favorece a mobilidade social e a igualização dos cidadãos, passaram agora a ser atacadas em nome da defesa e promoção da qualidade do ensino, se necessário com recurso à substituição progressiva das inovações pedagógicas por pedagogias tradicionais reinventadas (os exames, os procedimentos disciplinares, os chumbos, etc.)." Estas suas palavras não correm o risco de ser interpretadas como a defesa de um nivelamento por baixo? que eram três anos no máximo quatro, Mas vinha de uma Química teórica que não necessita de tanta infra-estrutura de laboratório... as coisas funcionavam normalmente. O Sim mas as coisas mudam completa- caso Francês era complicado, porque mente, e eu estive completamente afas- É evidente, quando se tira alguma coisa tado do meio. Por outro lado, durante o fora do contexto, não se pode perceber... terra. Depois porque era um processo que estava bem estabelecido. Sabia-se havia uma confusão entre os dois tipos de doutoramento; o caso alemão estava de lado porque as pessoas não falavam alemão, nos Estados Unidos o caso também estava praticamente arrumado porque era muito caro e era bem mais longo. Do lado do Estado Português houve claramente um benefício da solução inglesa, até porque o Veiga Simão, que na altura era ministro, tinha sido doutorado em Inglaterra; e uma boa parte dos professores que na altura estavam doutorados, ainda que em Engenharia, tinham de facto sido doutorados em Inglaterra, Pelo meu lado tendo um processo de serviço militar à frente, convinha-me também algo que não fosse demasiado longo porque depois podia vir a ter problemas. Mas as estatísticas estão aí. Acho que cerca de 75 por período que estive na Reitoria, tive um grande interesse pelo desenvolvimento de matérias ligadas às políticas do ensino superior. Tive alguns amigos meus es- Mas todo o seu artigo parecia reflectir este sentir. Não há dúvida nenhuma que o caso dos trangeiros que começaram de certo Estados Unidos é um caso óbvio, em modo a convidar-me para este tipo de ac- que a Universidade funciona em muitos tividades . Aliás o Reitor de uma Univer- casos (e não é só a universidade), como sidade Holandesa, que na altura dirigia um instrumento perpetuante da socie- um centro de política do ensino superior, dade de classes. No fim de contas só vai teve uma grande influência na minha viragem para essa área. Convidou-me para fazer várias conferências e era uma área nova. Também é verdade que eu nunca tive a ideia de que uma pessoa deva estar muito tempo na mesma coisa. Comecei pela Engenharia Química, depois passei para a Química... para uma grande Universidade privada americana, ou quem tem dinheiro, ou uma determinada percentagem de alunos de carácter excepcional que lá consegue chegar, mas a generalidade da população não tem qualquer possibilidade de lá chegar. Por outro lado, na Europa, durante as últimas décadas houve uma enorme ênfase no usar o en- Mas esteve numa área extremamente sino como factor de promoção social. O cento dos jovens académicos que se aliciante, o estudo da estructura elec- acesso para todos, o ensino secundário foram doutorar na área da Ciência e trónica. Tecnologia o fizeram na Inglaterra. Ao contrário das áreas das letras e das Já foi mais aliciante... Ciências Sociais em que foram para Uma área a que foi atribuído o prémio Nobel ainda em 1998?! França para todos, o ensino superior para todos, e isso hoje começa a ser posto em causa. E porque é que começa a ser posto em causa? Porque de repente as classes mais favorecidas notaram que afinal aquela tal licenciatura já não dava No seu curriculum abreviado não consta nenhuma publicação em Química. No entanto trabalhou e publicou com o Prof. Linnet, um Químico de grande envergadura. Será que quer apagar a Química da sua vida? cânica Quântica foi aliciante nos anos rantido nos sítios devidos. E portanto há vinte e trinta, quando de certo modo que retomar, ou que recriar as vanta- toda a Física foi formulada e era uma gens de classe. E só conseguem recriar grande novidade. Acho que depois a as vantagens de classe, tornando a criar partir dos anos setenta, começou muito um ranking de instituições. De um lado Não. De maneira geral os curricula que a mastigar. Mais computador, menos os bons Colégios para onde irão os seus Acho que a Química Quântica ou a Me- direito aos filhinhos de terem o tacho ga- me pedem são curricula para coisas ac- computador, mais algoritmo menos al- filhos, do outro a escola de não sei de tuais, e neste momento eu não faço Quí- gortimo, o algoritmo dos algoritmos! onde para onde irá o filho do padeiro, e mica. Num curriculum resumido não para mim as coisas perderam o seu fas- depois por aí acima. A sociedade terá de vou buscar as coisas que fiz há quinze cínio. pensar então o que é que pretende. 15 16 QUÍMICA Mas não precisamos de gente bem pre- biblioteca fazer trabalho, a ideia era de- Então como é que proporia essa diver- parada e qualificada? e a Universida- senvolver a capacidade de um indivíduo sificação do ensino superior? de não a poderá formar? saber por si. O professor dizia eu sou Sim sim, pois pode. Mas não tem nada que ver com esta coisa do ranking. Que é a coisa mais estúpida que se pode imaginar. Eu não admito um rankingdas escolas secundárias sem ter em conta todos os outros factores que lhe estão associados. Uma escola no Casal Ventoso, nunca será uma escola das primei- um investigador e venho para aqui uma hora aturar estes tipos. A qualidade das aulas de uma maneira geral era má. Era má e eram poucas, quer dizer. Havia três trimestres, só havia aulas teóricas Como em Inglaterra, universidades que de facto são conhecidas a nível mundial e que só têm alunos de excepção, Oxford, Cambridge, etc, e as outras que depois ensinam o resto da população. no primeiro e segundo trimestre; cada E nós temos possibilidade de ter isso trimestre tinha dezasseis aulas, o resto aqui em Portugal? era trabalho pessoal. Só teremos isso se tivermos a coragem ras do ranking, onde quer que seja. As- O grande drama hoje é que nós temos em deixar que uma ou duas sejam e as neira será penalizar essa escola, e os as universidades que se massificaram, outras não. Claro,..risos..., esse é o pro- professores, que se calhar até são muito não há hoje dentro do País universida- blema. Em Inglaterra não é preciso mais dedicados do que aqueles que tra- des de elite. Ora não se ensina da nehum ranking para saber que Oxford e balham na escola dos meninos da Foz. mesma maneira um aluno de elite e um Cambridge são excelentes e que a Uni- aluno de massas. versidade Oxford-Brooks, um antigo Po- Isto no caso do ensino secundário, mas um ranking universitário? Essa é uma das áreas de interesse aqui do CIPES', os desafios da massificação. O ranking universitário,... também aí Quais são esses desafios? tenho as minhas dúvidas. O grande problema da massificação é o litécnico promovido, é uma outra coisa completamente diferente Portanto acha que há necessidade de nós termos também este tipo de estratégia? Precisamos ou não de gente qualifica- da Universidade não se ter adaptado a da e bem preparada? isso. Nós continuamos a olhar para os Isso não tem nada a ver com os ran- nossos alunos e a dizer que estão mal uma ou duas instituições com capacida- kings. preparados; continuamos a ignorar que, de de competir a nível internacional, quando temos um ensino massificado, essa é a única possibilidade; não se Se nós queremos que em Portugal haja Precisamos de boas universidades? uma porção muito grande dos alunos pode andar a dizer que todos os Politéc- Isso sim! tem de ter um acompanhamento muito nicos, todas as Universidades vão fazer mais completo, e mais intenso do que o investigação. Não dá, onde é que têm Faz muito melhor, mais bem ao ensino, de um aluno numa Universidade de dinheiro para isso? onde é que têm pes- ter uma universidade que por exemplo elite; se calhar as Universidades deve- soas? Nenhum País tem. Nos Estados siga os padrões da Universidade de Co- riam preocupar-se em homogeneizar os Unidos em que há três mil e não sei lumbia (NY), que tivesse excelência alunos à entrada, vendo quais são as quantas instituições de ensino superior, como padrão absoluto, e em que, quem deficiências deles: Nós continuámos há cento e poucas Universidades de in- não for excelente, o professor, o investi- como professores universitários, e eu vestigação. Claro que depois poderemos gador, vai para o olho da rua! o que nós próprio a mim me acuso, a pensar que ter outros problemas como os de justiça não fazemos. Isso faz muito melhor à se o aluno é adulto deverá trabalhar por social, etc., mas terão de ser resolvidos qualidade do que fazer o ranking. O ran- si, que se desenrasque! e isto não fun- de outra forma. king não é algo que contribuia para a ciona numa universidade de massas, qualidade. em Cambridge sim. Mas toda a gente sabe que Cambridge Então sugere que haja diversos tipos era uma Universidade excelente e pro- de universidades, uma para as elites... vavelmente continua a ser uma Uni- Acha que podemos ter uma boa gestão sem ter uma boa política para o Ensino Superior? Não ligaria em excesso as duas coisas. Exactamente. Não é possivel nenhum O que uma pessoa tem de perceber é País ter dinheiro para ter ensino supe- que estamos numa fase, não é só uma Era e é, mas isso é por outra razão. O rior com investigação em termos de um fase em Portugal, também noutros paí- padrão de qualidade das aulas de Cam- sistema massificado. Não tem dinheiro ses europeus e nomeadamente em In- bridge era horroroso. nem interessa. Porque uma grande glaterra, onde há uma emergência de massa de alunos que hoje chegam ao políticas de pendor neoliberal. Que põe versidade excelente. Na altura? ensino superior não quer um ensino de uma grande ênfase na eficácia e efi- Na altura e agora. É uma Universidade elite. Quer é uma coisa que lhe dê uma ciência económica das instituições, o de elite. A função da Universidade não é profissão. Nem sequer fazer uma carrei- que leva a por em causa os modelos tra- dar a papa aos meninos nas aulas. Cada ra de investigação. Nem todos, se ca- dicionais de gestão das instituições uni- dois alunos tinham um tutor, porque o lhar, querem um grande desenvolvi- versitárias. Será que um Reitor é um tutor mandava os meninos irem para a mento teórico nas aulas. bom gestor ou é preciso ir buscar um QUÍMICA I 17 tipo à Sonae? A minha opinião é que ção da profissionalização do gestor aca- chamada Regents House onde se sen- uma Universidade de excelência não démico. O presidente de uma universi- tam três mil professores; sempre que há pode ser gerida como uma empresa, dade americana é escolhido pelas suas uma decisão da administração central — e isso dura há vários anos — sempre que não tem nada a ver uma coisa com a qualidades, mas é um individuo que outra. Até porque uma Universidade de não é um empresário, é um académico há uma ideia ao nível central de profis- Excelência é uma universidade onde se que é treinado como gestor; eles sionalizar a gestão, como bastam cinco faz inovação. E a inovação está ligada a mudam de universidade para universi- assinaturas para levar essa decisão ao outra coisa, está ligada à transgressão. dade, têm as suas carreiras. Embora Regents House, a universidade vota As grandes descobertas da Física, a Me- haja recentemente uma crítica quanto à sempre conta, em nome da defesa dos cânica Quântica a Teoria da Relativida- profissionalização das universidades valores académicos. E a Universidade de etc, foram transgressões enormes americanas. Há um livro que foi escrito de Cambridge continua a ser boa. Mas em relação às teorias científicas aceites. por um individuo chamado Charles se calhar não é gerida pelos padrões de Se calhar numa universidade muito re- Smith, que é da universidade de Nova economia e de eficiência que um em- gulada, empresarial, esse tipo de desco- Iorque, onde se chama a atenção para presário poderia escolher. berta nunca teria sido possível. que em muitos sítios o que aconteceu foi, ao irem buscar não o presidente Em relação aos acordos de Bolonha, académico, mas o gestor profissional, as quais acha que serão as consequên- Exactamente, a capacidade de inovação pessoas se esqueceram de uma coisa: é cias da sua aplicação, pensa que have- da universidade está também muito li- que dentro das universidades há um rá uma profunda re-estruturação do gada a um certo desperdício, à possibi- número enorme de horas de trabalho nosso ensino superior? Porque não há desperdício? lidade de uma pessoa poder fazer coi- que são feitas voluntariamente pelos do- sas malucas, durante cinco anos aquilo centes e sem custos. Presidentes do não dá nada mas um dia...E isso não é Conselho Científico, Directivo e Pedagó- possivel numa instituição que seja geri- gico, membros do Senado, etc. O traba- da como uma empresa. lho que isso dá em termos de adminis- Mas nos Estados Unidos as melhores universidades serão por certo inovadoras e são privadas. Como o explica? tração sendo feito voluntariamente, não tem encargos para a instituição. Quando surge o gestor profissional bem pago, as pessoas olham para o lado e pensam, Não pode comparar os Estados Unidos, então é o trabalho dele. E o gestor pro- com a sua cultura muito específica, com fissional, nos Estados Unidos, perdeu os outros países. Quando fui fazer a de repente o apoio dos académicos, e a acreditação da Universidade de Colum- solução foi reproduzir-se e criar uma es- bia em Nova Iorque, eles tinham termi- tructura administrativa para substituir a nado uma operação de recolha de fun- falta de apoio do lado académico, e por- dos que em dois anos lhes deu cerca de tanto isso gera este conflito entre os ad- dois biliões de dólares, cerca de 400 mi- ministadores e os académicos; o que Eu sou um céptico dos acordos de Bolonha. Acho que os acordos de Bologna não fazem muito sentido, quando durante muito tempo se fez a defesa que uma das riquezas das universidades europeias era a diversidade dos seus sistemas de ensino. Temo que os acordos de Bolonha possam acabar, ou poderiam acabar, numa grande uniformização a nível europeu. Mas não vai acontecer. Estou convencido que os acordos de Bologna não vão chegar ao fim. Há uma propaganda, um marketing, em torno de Bolonha de que está tudo a correr sob esferas. Mas isso não corresponde há realidade. lhões de contos; isto em dádivas! eu se em boa verdade acabou por resultar Mas afirma-se que se deseja preservar for pedir dinheiro aqui, aos nossos anti- num aumento dos encargos da gestão a diversidade. gos alunos, riem-se-me na cara...risos. para substituir o trabalho voluntário que Isto funciona nos Estados Unidos, mas desapareceu. Todos nós queremos que não nos outros países. Acho que não se as instituições sejam bem geridas. Só devem importar modelos. Assim como um estúpido é que não quer isso. Mas de. Eu neste momento estou a fazer um Se analisar o que está a acontecer nos diversos países verá uma outra realida- não podemos importar o modelo do pri- gerir bem uma instituição universitária trabalho com um grupo de investigado- vado americano para a Europa. Porque não tem nada a ver com gerir uma fá- res internacionais e financiado pelo go- o que aconteceu nos Estados Unidos foi brica de salsichas ou de parafusos ou, o verno Italiano, o qual pretende nomea- que todas as primeiras instituições do que quer que seja. É uma coisa com- damente analisar o estado de ensino superior, todas as grandes insti- pletamente diferente. implementação do processo de Bolo- tuições, eram todas privadas. Só apareceram instituições públicas depois das instituições privadas. Por isso são instituições que mantiveram uma longa tradição de qualidade. As privadas aqui na Estava a dizer que para as universidades de excelência não poderiamos ter um gestor tipo Sonae, mas para as outras? nha; tivemos recentemente uma reunião em Milão, onde se concluiu que, por exemplo, na Alemanha só dois por cento dos alunos é que estão em cursos compatíveis com o processo de Bolo- Europa são meras operações comer- Deixe-me dar-lhe um exemplo. A minha nha. Porque o governo permite estarem ciais. Mesmo assim nas grandes institui- querida universidade de Cambridge, em os dois sistemas a funcionar em parale- ções americanas o que há é uma tradi- boa verdade é governada por uma coisa lo, numa mesma Universidade, e estas 18 I QUÍMICA preferem o sistema tradicional ao méto- se vier a ser desempregado, o problema Idade Média. Porque na Idade Média do Bolonhês. é seu. Para se manter "empregável" vai havia muito mais razões para a mobili- Os italianos também têm os dois sistemas a funcionar em paralelo? Exactamente, e em França também, onde há mais de dez mil nomes diferentes de cursos. O que acontece é que as instituições têm os dois sistemas a funcionar em paralelo. Isto de Bolonha é mais algo que está a ser empurrado, de cima, do que propriamente algo em que as instituições estejam convictamente envolvidas. Se ler a lei portuguesa, ou a proposta que está na Assembleia da República o que é que diz? Em princípio é de quatro, mas pode ser de cinco ou pode ser de seis. O mestrado pode ser fazer pós-graduações, e vai pagá-las. É dade. As cadeiras eram todas iguais, em uma desresponsabilização do Estado. todas as faculdades o sistema de estu- Mas acha então que os três anos não são suficientes para termos um ensino superior ou pelo menos uma formação de qualidade? Três anos não são suficientes, não. E em relação ao sistema europeu de créditos? Isso não aquece nem arrefece. Mas será uma vantagem, uma vez que permite uma circulação dos estudantes mais fácil? dos era todo igual e a língua era a mesma. Havia muito mais uniformidade e, por haver poucas universidades, os alunos defendiam-se com a mobilidade°. Eu temo que se levassem o processo de Bolonha até às últimas consequências iríamos acabar num sistema muito mais homogeneizado do que o que temos hoje. E isso para si é uma desvantagem...? É e, aliás, toda a gente diz que é. Haveria mais mobilidade? de um ano ou pode ser de dois. Pode-se Acha que sim? Deixe-me dizer uma Porquê? Para ir a outro lado ver uma juntar o primeiro ao segundo ciclo que coisa. O que é ridículo no meio disto coisa igual? A própria fase de homogeneizar acaba por destuir a mobilidade. pode ser de cinco anos, ou três mais um tudo é que os alunos são cada vez ou quatro mais dois. menos móveis. Mas há países em que a tendência é Se pensarmos que um semestre são rante 13 anos. Num balanço de activi- encurtar um pouco o primeiro ciclo. trinta créditos, e que em vez de fazer- dades há sempre um deve e um haver. mos avaliação cadeira a cadeira pode- Resumidamente, o que mudou para mos transferir o equivalente a um se- melhor, e o que ficou na mesma, ou mestre? eventualmente piorou, após os seus Mas está na lei que pode ser quatro anos. O primeiro acordo assinado, na Sorbonne, é conhecido como o Viagra dos ministros fracos...risos. Porque havia três ministros que estavam com problemas em casa, a França a Itália e a Alemanha, e conjuntamente com a Iglaterra assinaram aquilo; o Inglês assinou porque julgou que era como o sistema inglês e achou piada ver os franceses e os alemães a assinarem aquilo; e os outros porque precisavam da desculpa euro- Sobre isto estamos de acordo, mas o Foi Reitor da Universidade do Porto du- mandatos. que é rídiculo é que o aluno é cada vez Acho que a universidade mudou signifi- menos móvel. cativamente. Mudou porque se tornou Porquê? uma universidade com reconhecimento internacional, mudou porque foi uma Por um lado porque deixou de haver fi- época feliz em que havia dinheiro, e nanciamento comunitário para a mobili- portanto fizeram-se investimentos enor- dade; e também é menos móvel dentro mes em matéria de equipamentos para dos próprios países, como é o caso in- ensino, em matéria de equipamentos glês, porque passaram a substituir as para investigação. E mudou substan- bolsas por empréstimos. Hoje a mobili- cialmente porque em termos de inves- dade em Inglaterra está a diminuir e tigação e de pós-graduação foram feitos Mas a nova Ministra da Educação italia- está a diminuir de uma forma significa- progressos muito grandes. Também não na já disse que vai permitir coisas que tiva, porque um aluno faz as contas e havia a mania de que as universidades nada têm a ver com Bolonha. Portanto diz, se eu ficar em casa ao fim de qua- eram empresas; o que vai piorar neste eu não sei o que isto vai dar. Mas tam- tro anos devo tanto, se eu mudo vou momento são todas estas restições de bém é possível olhar para o processo de pagar mais, faz as contas e se calhar natureza económica. Que, por sua vez, Bologna como uma forma de desres- conclui que a dívida não compensa. Há poderão provocar também uma desva- ponsabilizar financeiramente o.governo um conjunto de políticas reais que são lorização social dos diplomas universitá- em relação ao ensino superior. Não absolutamente contraditórias com a da rios. Por outro lado, vai piorar o facto de sendo fácil na maioria dos países euro- mobilidade. peia para implementar aquilo em casa. peus impor as propinas, se calhar é possível reduzir os compromissos do Estado diminuindo a duração dos estudos. Por- Então na sua opinião nós não precisávamos de nenhuma re-estruturação? no ensino superior não haver políticas coerentes, que não há. Para si um Reitor pode condicionar a Universidade, isto é, ter um mau Reitor que ao fim de três anos, se você tem o Há um colega meu que diz que, é um primeiro ciclo, pode, em teoria, ir traba- inglês aliás, a percentagem de alunos lhar; o conceito de emprego foi substi- que é móvel na Europa é inferior à per- Sim sim, não só nisso. No período em tuido pelo conceito de empregabilidade, centagem de alunos que era móvel na que estive como Reitor, e não falo só de ou um bom Reitor pode ser crucial? QUÍMICA mim, falo de um conjunto de Reitores passaporte para o emprego, hoje não é para comprar coisas. la alimentar esse que havia no País, inclusivamente havia nada. ciclo. E isto quebrou-se. Não sei se este uma grande influência do conselho de Reitores na definição de políticas. Muitas leis que hoje estão aí publicadas, o financiamento, a avaliação, a flexibilidade de gestão das universidades, a pró- Atendendo a que o diploma universitá- modelo sobreviverá. Se calhar era bom rio vale pouco, acha que mesmo assim que não sobrevivesse. Se comparar as vale a pena fazer uma licenciatura e estatísticas mundiais, verá que está a estudar Química em par ti cular? acontecer em todos os países, nomeadamente nos Estados Unidos, Inglater- pria lei da autonomia, feitas pelos Reito- Sim vale porque quem não tiver uma li- res antes do Governo. E hoje esse cenciatura está bem mais tramado do ra etc, um crescente aumento das desi- dinamismo perdeu-se e as pessoas que quem tiver uma!...risos gualdades sociais. Não é muito prometedor... Poderá piorar ainda? perdeu-se também muita coesão entre Sabe porquê, porque na actual organi- Exactamente o que eu digo. Tenho até os membros do CRUP. zação mundial da economia quem não vergonha do mundo que vou deixar aos tiver qualificações está feito...porque o meus filhos e aos meus netos. agora em vez de tomarem a iniciativa aguardam pelas políticas ministriais; Não está de acordo com o ranking, mas quanto à avaliação da Universidade? capital vai para onde for mais benéfico para ele, o que se mede como "onde os Eu devo dizer que sou das pessoas que recursos forem mais baratos". A indús- mais trabalha em avaliação. Se olhar tria têxtil portuguesa vai falir toda, e no para aquilo que está aqui naquela pare- calçado estão a ir uns atrás dos outros, de são tudo avaliações internacionais. porque se faz a mesma coisa mais ba- Referências rato na China; e um dia será mais bara- 1 - A Faculdade de Letras da Universidade to em África. E quem diz disto diz do do Porto foi extinta pelo Decreto n.° 15.365, Mas avaliação não deve ser tornada pública? resto. Se a Ford-Volkswagen descobrir Sim, o que acho é que quanto mais tra- que é mais barato montar os monovolu- balho nisso, mais cínico sou sobre os mes na República Checa, onde ainda efeitos concretos da avaliação. são mais bem educados do que nós, e A avaliação dos nossos centros de in- recebem menos, mudam para lá calma- vestigação foi uma das coisas impor- mente. E daí que a tal noção do empre- tantes feita pelo anterior Ministério da go tenha desaparecido, a ideia é a de Ciência e Tecnologia e mantida pelo empregabilidade. de 12 de Abril de 1928. Restaurada em 1961 pelo Decreto n.° 43.864, de 17 de Agosto, inicia as aulas no ano lectivo de 1962-1963 com duas licenciaturas, História e Filosofia, e o curso de Ciências Pedagógicas. 2 - Na altura, o curso de Engenharia Química consistia em 3 anos preparatórios leccio- actual. Avaliar a produtividade científi- Hoje um jovem que tirou um curso e ca, ou o que quer que se define como nados na Faculdade de Ciências, com uma que se casou, pode dali a cinco meses produtividade científica. Houve muitas enorme carga em Matemática, Física e Quí- ou seis meses estar desempregado. Não surpresas, boas e más. mica, seguidos de 3 anos na Faculdade de tem estabilidade de trabalho, será que Sim, não sei se foi feita da melhor ma- pode ter filhos?, é um risco muito gran- Engenharia, com uma componente mais técnica e aplicada. neira; mas a avaliação da investigação é de. Tudo isto modifica dramaticamente muito mais fácil de fazer do que a do a nossa sociedade. A minha esperança ensino. Aliás repare nenhum de nós ja- é que este modelo não seja estável. mais reagiu quanto tem os seus artigos Porque, repare, há uma crise económi- 4 - Esta situação começou a inve rter-se avaliados pelos referees, sempre foram, ca a nível mundial, que apesar de todas quando o "príncipe" percebeu a impo rtância 3 - CIPES - Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior e por isso está habituado a isso. No en- as globalizações não está a diminuir, da universidade e começou a criar universi- sino os critérios são completamente di- antes pelo contrário. Se calhar puseram dades locais as quais muitas vezes foram ferentes. os pobres tão pobres que agora não há protegidas proibindo os nacionais de se des- quem compre o que se fabrica em ex- locarem para estudar no estrangeiro. Por cesso. No ciclo anterior, no período do exemplo, em Po rt ugal, em 1440, o rei Afon- Fordismo, o mecanismo baseava-se so V deferiu uma petição dirigida às Co rtes num círculo vi rt uoso, em que se procu- pela Universidade de Coimbra, na qual se Falou mesmo agora na desvalorização social dos diplomas universitários. Não há re-estruturação que possa inverter a situação? rava o emprego total; havia um estado pedia que todos os súbditos com diplomas Hoje o diploma universitário em si, e providência que assegurava os grandes obtidos no estrangeiro tivessem que pagar com a excepção de duas sou três áreas riscos como a saúde, dava subsídios de 20 coroas à Universidade e fossem preteri- muito especiais, já não tem o valor que casa, de transportes, etc; e assim, a dos, a favor dos licenciados por Coimbra, tinha antigamente; um canudo era um malta que trabalhava tinha dinheiro nos concursos a empregos públicos. 19 2O QUÍMICA Perfil Prof. Alberto Amaral horas semanais de leccionação. Esta docentes o que veio a resultar no iní- era a janela aberta para a modernida- cio da actividade de investigação re- Se tiver ocasião, procure no Departa- de que se foi depois progressivamente gular, sistemática e com um ritmo que mento de Química de Cambridge a fo- alargando e por onde Alberto Amaral não cessou ainda de crescer. Na Fa- tografia de grupo do ano de 1965/66. saltou para Cambridge logo no termo culdade de Ciências, teve um papel Procure o mais jovem e franzino dos da sua licenciatura, mesmo sem ter importante pela sua capacidade de in- fotografados. É o Alberto Amaral! garantido o apoio financeiro... tervenção no palco da política univer- Com raízes em Fafe, Alberto Amaral Em Cambridge, trabalhou no desen- sitária e nos seus bastidores onde se fez os seus estudos no Porto, no então volvimento de métodos semi-empíri- iniciou. Foi nesta altura que tomou a Liceu Nacional D. Manuel II, hoje de- cos sob a orientação de J. W. Linnett, iniciativa pessoal de preparar a cons- dicado de novo a Rodrigues de Frei- um antigo aluno de Charles Coulson trução do centro de cálculo da Univer- tas, e na Universidade do Porto. A Li- que estava então no topo da sua pro- sidade do Porto e dos departamentos cenciatura em Engenharia Químico dutiva carreira. Em menos de três de Química e de Física, lançando as Industrial estava então organizada em anos regressou ao Porto trazendo a bases do que é hoje o pólo dois da seis anos, os três primeiros na Facul- sua juventude, o seu conhecimento universidade no Campo Alegre. Como dade de Ciências, no velho edifício da pioneiro de Química Quântica, a sua Reitor, iniciou uma nova era no exercí- Academia Real de Marinha e Comér- excelente capacidade pedagógica e o cio da função. Reorganizou profunda- cio e da Academia Politécnica, e os úl- seu inconformismo para uma Facul- timos três anos na Faculdade de En- dade ainda moldada pelas suas graní- genharia, à Rua dos Bragas. Na ticas paredes novecentistas. A sua pu- Faculdade de Ciências, cobriam-se as blicação didáctica sobre as aplicações bases de Matemática, Física e de Quí- de teoria de grupos em Química foi mica a um nível muito respeitável mas pioneira em Portugal e circulou por algo irregular. Na Química pontificava longos anos. Não fui aluno de Alberto a velha geração liderada por Alberto Amaral. Passei pela Faculdade de Terminados os seus mandatos de 14 Brito e Mendonça Monteiro que tinha Ciências enquanto ele estava em anos, Alberto Amaral regressa à quali- atravessado a profunda depressão Cambridge. Tive depois contacto com dade de simples professor da Univer- económica e social subsequente à ele até ao jantar de despedida conjun- sidade do Porto e à direcção do CIPES nossa participação na primeira Gran- to quando ele seguiu para a Universi- (Centro de Investigação de Políticas do de Guerra e depois a longuíssima "rec- dade de Lourenço Marques (o Serviço Ensino Superior ligado à FUP, Funda- tificação" financeira do Estado Novo. A Militar assim obrigava) e eu para Ox- ção das Universidades Portuguesas). iniciação dos futuros engenheiros era ford em 1972. Reencontrei-o no re- É hoje uma personalidade muito des- feita pela Química Inorgânica de Hum- gresso ao Porto que fizemos com 2 tacada a nível europeu e com uma ac- mente todos os serviços da universidade, preparou os planos e começou o esforço de reinstalação das várias faculdades e liderou muitas das inovações da política universitária portuguesa nos últimos anos. berto Almeida, que passara pelos meses de diferença logo após a pro- tividade bem reconhecida na área de campos da Flandres e que, entre mulgação do decreto de Sottomayor investigação das políticas do ensino aulas no Colégio Almeida Garre tt e as- Cardia sobre a gestão universitária. superior. Tem uma actividade muito sistência técnica ao Instituto do Vinho Partilhámos depois o gabinete vários intensa como consultor, como orador do Porto, se mantivera mais de 30 anos quando o edifício dos Leões já e como autor ou co-autor de grande anos em posições juniores para só vir rebentava por todas as costuras face número de publicações. Nestas áreas, a chegar ao lugar de Professor Cate- ao rápido desenvolvimento do número é, provavelmente, o perito português drático alguns anos mais tarde, nas de estudantes, do quadro docente e de maior impacto internacional. Entre vésperas da jubilação. Deste ambien- da investigação. Pouco tempo depois nós tem actuado como consultor de te, Alberto Amaral recordará até hoje o Alberto Amaral candidatou-se a Presi- sucessivos governos de cores diversas método das câmaras de chumbo para dente do Conselho Directivo da Facul- e a Missão de que está encarregado a síntese do ácido sulfúrico que veio a dade de Ciências, posição que só veio ser o tema da última lição do velho a abandonar quando assumiu a posi- mestre; terá visitado em Estarreja as ção de Reitor da Universidade do fábricas de produção de adubos onde Porto. A gestão de Alberto Amaral no aquele método era usado. Fernando Departamento de Química, na Facul- Serrão e João Cabral lutavam em con- dade de Ciências e, depois, na Reito- dições hoje inimagináveis para manter ria foi muito inovadora e transformou a uma réstia de esperança e de activi- instituição no que hoje conhecemos. dade científica naquele ambiente de Ainda no Departamento de Química, ensino livresco onde se podiam espe- impulsionou o início da preparação de rar de cada docente mais de trinta doutoramento de uma série de jovens para a reforma dos estudos de saúde em Portugal tem tido um amplo reconhecimento e tem conseguido manter alguma estabilidade nesta área especialmente delicada pela gravidade dos problemas com que se debate, pela força dos interesses em jogo e pela importância e impacto das opções tomadas. José Ferreira Gomes