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ECOSSISTEMAS INDUSTRIAIS COMO ECO-INOVAÇÃO COERENTE COM
A CONSTRUÇÃO DE UMA ECONOMIA VERDE
Felipe Nogueira da Cruz1
Debora Nayar Hoff2
RESUMO
Face às evidências da gestação de uma crise ambiental, diversos atores têm
pontuado a importância das estruturas industriais para o estabelecimento de
estratégias de desenvolvimento favoráveis à conservação da qualidade dos
serviços ecossistêmicos. Nesse particular, a corrente conhecida como Ecologia
Industrial advoga a reestruturação da indústria sob o formato de um sistema
fechado, baseado em relações simbióticas e intrinsecamente ajustado às
tolerâncias e características dos sistemas naturais: o Ecossistema Industrial.
Este trabalho investigou como os Ecossistemas Industriais constituem um tipo
de eco-inovação coerente com a construção de uma Economia Verde.
Verificou-se que os Ecossistemas Industriais oferecem oportunidades de
investimento e emprego em consonância com as necessidades de
conservação do capital natural. Ademais, eles fornecem fortes evidências de
que os esforços inovativos na direção de tecnologias ambientalmente seguras
podem induzir ganhos econômicos e ambientais, constituindo uma estratégia
viável no direcionamento de uma recuperação econômica verde.
Palavras-chave: Ecossistemas
econômica verde.
Industriais;
Eco-inovação;
Recuperação
ABSTRACT
Given the evidence of the gestation of an environmental crisis, many players
have punctuated the importance of industrial structures for establishing
development strategies conducive to preserving the quality of ecosystem
services. In this respect, the current known as Industrial Ecology advocates
industry restructuring under the format of a closed system based on symbiotic
and intrinsically adjusted to the tolerances and characteristics of natural
systems: an Industrial Ecosystem. This article provides a literature review and
analyzes how Industrial Ecosystems constitute a kind of eco-innovation
consistent with the construction of a Green Economy. It was observed that the
Industrial Ecosystems provide opportunities for investment and employment in
line with the needs of conservation of natural capital. Industrial Ecosystems
1
Professor Assistente do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de
Juiz de Fora, Campus Governador Valadares. Doutorando em Ciência Econômica pela
Universidade Estadual de Campinas
2
Professora pesquisadora do PPGA da Universidade Federal do Pampa, Campus Santana do
Livramento. Doutora em Agronegócios - CEPAN - UFRGS.
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offer strong evidence that the innovative efforts towards environmentally friendly
technologies can induce economic and environmental gains, and constitute a
useful strategy in targeting a green economic recovery.
Keywords: Industrial Ecosystems; Eco-innovation; Green economic recovery.
Classificação JEL: Q57 – Ecological Economics: Industrial Ecology
1. INTRODUÇÃO
O aumento da eficiência na indústria seguiu uma trajetória tecnológica –
no sentido proposto por Nelson e Winter (1977) e Dosi (1982) –, na qual os
avanços técnicos se deram com base na utilização ilimitada de recursos
naturais de baixa entropia3 e na disposição irrestrita de resíduos no meio
ambiente. Esse movimento estabeleceu um modelo industrial fundamentado na
linearidade dos fluxos de matéria e energia. Nesse esquema, a energia e a
matéria utilizadas no processo de transformação, tomadas como disponíveis de
forma infinita, fluem da biosfera para a indústria. A indústria, por sua vez, emite
rejeitos de maneira ilimitada, os quais retornam para a biosfera sob a forma de
poluição do ar e da água ou de resíduos sólidos.
Esse modelo tradicional de indústria passou a ser concebido como a
chave para o desenvolvimento das nações, principalmente a partir da sua
difusão pelas economias avançadas durante todo o século XX. Os anos
“gloriosos” do pós-Segunda Guerra Mundial contribuíram para a propagação
desse ideário. Nesse período, os países industrializados apresentaram altas
taxas de crescimento com emprego elevado, consubstanciando o que ficou
conhecido como Estado de Bem-Estar (Welfare State). No entanto, os custos
ecológicos desses avanços foram bastante elevados, uma vez que as
externalidades geradas pela atividade industrial colocaram em risco a
integridade dos recursos materiais e energéticos e, por conseguinte, a própria
existência econômica das sociedades (SACHS, 2000; PACHECO, 2013).
A expansão contínua da atividade industrial tem provocado efeitos
sistêmicos que contribuem significativamente para a degradação do meio
ambiente. Os exemplos mais destacados por ambientalistas são o aquecimento
global e a depleção da camada de ozônio. Dada a escala de produção atual, as
emissões não tóxicas, como o dióxido de carbono, tornaram-se uma séria
ameaça ao ecossistema global. É com base nessa avaliação que diversos
estudiosos têm diferenciado “crescimento econômico” de “desenvolvimento”.
Segundo Sachs (2000), desenvolvimento é um conceito pluridimensional que
abarca três critérios essenciais: o social, o ecológico e o econômico. Seu
objetivo pauta-se no bem-estar dos grupamentos humanos condicionado à
dimensão ecológica. Essa condicionalidade baseia-se no postulado ético de
3
A termodinâmica fundamenta-se na concepção de que a energia flui em uma só
direção e tende a se dissipar em calor de baixa temperatura que não pode ser
utilizado. Chama-se entropia essa soma de energia não aproveitável (CECHIN;
VEIGA, 2010).
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solidariedade com as gerações futuras, isto é, de garantia das condições para
que as gerações vindouras se desenvolvam satisfatoriamente.
A ideia de desenvolvimento ambientalmente sustentável popularizou-se
em virtude dos diversos foros e conferências promovidos pela Organização das
Nações Unidas (ONU), especialmente após a publicação do documento Our
Common Future, em 1987. As discussões acerca da viabilidade dessa proposta
centralizaram o debate no problema da relação entre o progresso material das
organizações humanas e a conservação de recursos, reconhecendo a
necessidade vital de novas estratégias de desenvolvimento. Mais
recentemente, em resposta à crise econômica e financeira mundial de 2008, a
ONU adotou a Economia Verde como uma das principais iniciativas para
compatibilizar prosperidade socioeconômica e preservação do meio ambiente.
Nessa perspectiva, as medidas governamentais atualmente direcionadas para
superar os impactos da recente instabilidade do capitalismo mundial devem ser
designadas sob o formato de uma recuperação econômica verde.
A Economia Verde compreende um modelo econômico com reduzida
dependência em relação aos combustíveis fósseis (menos carbono intensivo),
eficiente no uso dos recursos naturais e socialmente inclusivo. Tais
características indicam que a busca pela sustentabilidade ambiental deve ser
pautada pela máxima redução da intensidade material e energética dos
processos produtivos, o que se encontra intimamente ligado às escolhas
tecnológicas e aos arranjos institucionais de cada país. A mudança tecnológica
na direção de tecnologias mais limpas e eficientes no uso dos serviços
ecossistêmicos ocorre por meio das eco-inovações. Sendo assim, a utilização
de tecnologias ambientalmente benignas constitui um dos principais pilares
sobre os quais se sustenta a transição para uma Economia Verde. Na busca
por um sistema econômico mais adequado à noção de limite de recursos, as
inovações ambientais surgem como parte da solução do problema, induzindo
mudanças no paradigma tecno-produtivo na direção de tecnologias que
utilizem o capital natural de forma sustentável e que permitam a disposição
adequada dos rejeitos industriais.
Em um artigo seminal publicado em 1989, Frosch e Gallopoulos
utilizaram a metáfora dos ecossistemas naturais para analisar três setores
específicos: plástico, ferro e platina. Esses autores chegaram à conclusão de
que é possível perseguir um modelo mais integrado e limpo de produção
industrial por meio de práticas como reciclagem, descarbonização,
desmaterialização e troca de resíduos entre firmas. O Ecossistema Industrial,
expressão cunhada pelos dois cientistas, corresponderia, portanto, a um
sistema industrial mais fechado, com redução do uso de materiais virgens e
recursos energéticos e mitigação dos problemas de desperdício e poluição
(FROSCH; GALLOPOULOS, 1989).
Erkman (1997) reporta que uma série de projetos de Ecossistemas
Industriais está em curso nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia, em torno
de atividades específicas, como usinas termelétricas, siderúrgicas, papel e
celulose e cana-de-açúcar. Nesse contexto, o presente trabalho objetiva
investigar como a estruturação de Ecossistemas Industriais constitui uma via
possível para a eco-inovação coerente com a construção de uma Economia
Verde. Entende-se que este é um esforço de pesquisa relevante, pois procura
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apreender a conformação de estratégias industriais aliadas à concepção de
desenvolvimento sustentável.
Além desta introdução, o artigo está estruturado em mais quatro seções.
A segunda seção discute os preceitos subjacentes ao estabelecimento de uma
Economia Verde, bem como a importância da eco-inovação nesse processo. A
terceira seção apresenta alguns conceitos e princípios da abordagem
conhecida como Ecologia Industrial, dado que a temática Ecossistema
Industrial surgiu a partir do desenvolvimento desse enfoque. Em seguida, a
quarta seção trata especificamente dos Ecossistemas Industriais e seu papel
na busca pela sustentabilidade ambiental. Por fim, a última seção apresenta as
considerações finais.
2. ECONOMIA VERDE E ECO-INOVAÇÕES
Os acontecimentos ocorridos no início deste novo milênio consolidaram
a visão de que a humanidade se depara com importantes desafios. Crises
econômicas, sociais e ecológicas interdependentes exigem soluções
inovadoras e mecanismos eficazes de intervenção que garantam a reprodução
econômica das sociedades em um contexto de sérias limitações
ecossistêmicas. Do ponto de vista ambiental, identificam-se crises relacionadas
à perda de biodiversidade, mudanças climáticas, necessidade de uma
revolução energética, escassez de água. As causas de todos esses problemas
partem de um determinante comum: a depleção dos recursos naturais em
virtude da expansão insustentável do sistema econômico (UNEP, 2011).
Diversos atores – cientistas, organismos multilaterais, organizações não
governamentais, grupos de ambientalistas, entre outros – têm questionado a
pertinência da reprodução de um modelo de crescimento insustentável como
única alternativa disponível para as sociedades. Nesse contexto, um novo
paradigma de organização das atividades econômicas vem sendo discutido: a
Economia Verde ou Green Economy. A Green Economy Initiative é coordenada
pelo United Nations Environment Programme (UNEP) e integra as nove
iniciativas conjuntas adotadas pela ONU em resposta à crise econômica e
financeira de 2008. A popularização do termo deu-se durante a Conferência
das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, realizada
em 2012 no Brasil, embora sua origem possa ser traçada em discussões
iniciadas há mais de duas décadas4.
UNEP (2010, p. 5) entende a Economia Verde como aquela “que resulta
em melhorias no bem-estar e equidade social, reduzindo significativamente os
riscos ambientais e a escassez ecológica”. Trata-se de um modelo com
4
Pearce et al. (1989) já haviam apontado que a engrenagem econômica provoca
degradação ambiental, sendo essa tendência um sério obstáculo à obtenção do
desenvolvimento sustentável. Segundo os autores, esse quadro implica na relevância
de estratégias mais incisivas a fim de compatibilizar progresso socioeconômico e
preservação do capital natural, indicando a necessidade de construção de uma
Economia Verde.
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reduzida dependência em relação aos combustíveis fósseis e demais fontes
energéticas não renováveis, eficiente no uso dos recursos naturais e
socialmente inclusivo. Nota-se, portanto, que a Economia Verde alia-se ao
conceito de desenvolvimento sustentável, uma vez que abarca as três
dimensões deste último: o social, o econômico e o ecológico. Nesse sentido,
Almeida (2012) pondera que o conceito de Economia Verde não substitui o
conceito de desenvolvimento sustentável. Na verdade, a Economia Verde pode
ser vista como um conjunto de estratégias que possibilitam a obtenção de um
desenvolvimento sustentável.
As discussões sobre Economia Verde incorporam a concepção de que
sustentabilidade ambiental e avanço econômico não constituem objetivos
antagônicos. Nessa perspectiva, muitos setores verdes – energia renovável e
transporte sustentável, por exemplo – oferecem oportunidades de investimento
e emprego com potencial para liderar a recuperação das nações afetadas pela
recente instabilidade do capitalismo mundial. Segundo UNEP (2011), há um
importante espaço para que acréscimos na renda e emprego se deem com
base em investimentos que reduzam as emissões de dióxido de carbono e
poluição em geral, melhorem a eficiência energética e material e previnam as
perdas de biodiversidade e de serviços ecossistêmicos. Nessa mesma direção,
a Organization for Economic Co-operation and Development (OECD) tem
defendido que o atual período de recuperação econômica oferece uma
atmosfera propícia para a implementação de reformas estruturais, abrindo
oportunidades para ganhos tanto econômicos quanto ambientais (OECD,
2009a).
Os principais pilares sobre os quais se sustenta a transição para a
Economia Verde são a realocação de investimentos e a crescente utilização de
tecnologias ambientalmente seguras. A mudança tecnológica na direção de
tecnologias mais limpas e eficientes no uso dos recursos naturais ocorre por
meio das inovações. Ao inovar, a empresa está buscando solução para um
determinado problema, que é resolvido dentro de um paradigma tecnológico,
isto é, dentro de determinados padrões de soluções amplamente aceitos e
baseados nos princípios das Ciências Naturais (DOSI, 1982). Entretanto,
quando as dificuldades para achar soluções tornam-se crescentes, inclusive
para as questões ambientais, há um forte incentivo para a mudança de
paradigma tecnológico. Mas, essa não é uma condição suficiente, dado que o
estabelecimento de um novo paradigma requer avanços no conhecimento
básico, além de outros fatores institucionais e de mercado (LUSTOSA, 2011).
Freeman e Soete (2008) advertem que a grande dificuldade de uma
agenda econômica verde reside na promoção de tecnologias sustentáveis
dentro de uma economia de mercado que seleciona produtos e processos não
com base em critérios ambientais, mas com base na lucratividade. Um meio
para contornar essa dificuldade seria, conforme os autores, o desenvolvimento
de políticas capazes de aproveitar as características cumulativas e
autorreforçadoras das mudanças técnicas. Isso poderia ser obtido por meio de
políticas que orientassem a produção para uma contínua busca de inovações e
tecnologias em direções benéficas para o meio ambiente, induzindo à
conformação de um novo paradigma tecnológico.
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De acordo com Bernauer et al. (2006), as inovações que promovem
efeitos benéficos sobre o meio ambiente, independentemente destes
resultados serem seu objetivo principal, são denominadas de eco-inovações5.
Estas últimas incluem tanto inovações de produtos e processos quanto
inovações organizacionais, sendo indispensáveis aprimoramentos, radicais ou
não, nas práticas e desempenhos ambientais das corporações (OECD, 2009b).
As eco-inovações, em última instância, possibilitam a obtenção e o
aperfeiçoamento das chamadas Tecnologias Ambientalmente Saudáveis
(TAS), definidas como “o conjunto de conhecimentos, técnicas, métodos,
processos, experiências e equipamentos que utilizam os recursos naturais de
forma sustentável e que permitem a disposição adequada dos rejeitos
industriais, de forma a não degradar o meio ambiente” (LUSTOSA, 2011, p.
115-116).
Outro aspecto que diferencia a eco-inovação dos demais tipos de
inovações refere-se ao problema da dupla externalidade. Além de produzir os
efeitos spillovers típicos da maioria dos esforços de pesquisa e
desenvolvimento, a eco-inovação também gera externalidades positivas em si
mesma (RENNINGS, 1998). Beise e Rennings (2005) explicam que o problema
da dupla externalidade ocorre porque é difícil para o inovador se apropriar dos
lucros oriundos de uma inovação se o conhecimento correspondente é
facilmente acessado pelos imitadores e se os benefícios ambientais gerados
apresentam a característica de bem público. Esse problema reduz os
incentivos que as firmas podem ter para investir em inovações ambientais.
Disso apreende-se a necessidade de determinantes regulatórios e
institucionais para impulsionar a mudança tecnológica na direção de
tecnologias ambientalmente benignas.
Importante ressaltar que determinados tipos de regulação ambiental
podem induzir as firmas a buscar e encontrar oportunidades de eco-inovação
que, além de reduzir as externalidades adversas geradas por elas, resultam em
ganhos de competitividade. Nessa direção, Porter e van der Linde (1995)
argumentam que as regulações geram um conjunto de sinais para as firmas
redirecionarem seus esforços inovativos para campos inexplorados. Destes
esforços podem surgir innovation offsets ou compensações, o que significa que
a redução das externalidades coincide com um aumento de produtividade dos
recursos empregados na atividade de transformação. Os vínculos entre
competitividade e meio ambiente, portanto, não constituem necessariamente
trade-offs.
Andersen (2008) postula que uma teoria sobre eco-inovação deve
enfatizar a dinâmica industrial, tomando como ponto de partida a empresa e a
forma em que ela organiza a produção e o aprendizado em face de um
mercado mundial em rápida transformação. A firma, no centro da análise, deve
5
Na literatura internacional, as atividades inovativas que buscam tecnologias mais
limpas e eficientes no uso dos recursos naturais são identificadas pelos termos ecoinovação (eco-innovation), inovação verde (green innovation), inovação sustentável
(sustainable innovation), inovação ambiental (environmental innovation) e cleaninnovation. Dentre estes, a eco-inovação e a inovação ambiental têm sido os mais
usados (BERNAUER et al., 2006; DE MARCHI, 2012).
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ser vista como uma eco-inovadora potencial capaz de obter ganhos
econômicos com a melhora de seu desempenho ambiental, e não como um
agente poluidor. Essa perspectiva alinha-se àquela defendida pelos
organismos multilaterais (UNEP, 2011; OECD, 2009a), priorizando as
oportunidades que o “esverdeamento” do mercado oferece.
Dado que os fatores institucionais e culturais desempenham um papel
importante na geração e comercialização de conhecimento, Lustosa (2011)
afirma que a inovação ambiental não é resultado de uma decisão baseada em
fatores internos à firma, mas de interações complexas entre ela e seus clientes
e fornecedores, de um contexto mais amplo, que inclui o ambiente institucional,
cultural e social, a infraestrutura científica e tecnológica, aspectos
macroeconômicos, as medidas de caráter regulatório e o grau de competição
do mercado. Considerando esta especificidade, Rennings (2000) identifica três
conjuntos de determinantes da adoção de eco-inovações: o desenvolvimento
tecnológico (technology push), os fatores oriundos da demanda (market pull) e
um determinante derivado do ambiente regulatório (regulatory push/pull-effect),
aspecto este que se diferencia das inovações em sentido mais amplo.
Andersen (2008) destaca que as eco-inovações devem ser examinadas
sob um enfoque sistêmico. Para tanto, esse autor estabelece uma taxonomia
que identifica tipos-chave de inovação ambiental, refletindo suas diferentes
funções. São sugeridas, assim, cinco categorias:
1. Eco-inovações aditivas (add-on): (tecnologias e serviços de
manuseio de poluição e de recursos). São produtos (bens e serviços) que
melhoram o desempenho ambiental do consumidor. O produto em si não
precisa necessariamente ser ambientalmente amigável, o foco é no processo.
Lidam com soluções ambientais nas saídas do processo (limpeza, diluição,
reciclagem, medição, controle e transporte de emissões) e no lado da entrada
de recursos (extração e suprimento de recursos naturais e energia). A
conservação da natureza, seja pelos inputs ou outputs, pode ser inclusa
(ANDERSEN, 2008);
2. Eco-inovações integradas: (processos e produtos de tecnologia
mais limpa). São as inovações integradas que tornam tanto o processo de
produção quanto os produtos mais eco-eficientes do que os processos ou
produtos similares. O investimento neste tipo de inovação pode tanto ser feito
para tornar a empresa mais eco-eficiente do que os concorrentes, como
apenas para melhorar a produtividade da firma. Estas inovações, técnicas ou
organizacionais, permitem alcançar eficiência em energia e recursos, aumentar
reciclagem ou viabilizar a substituição de material tóxico, mudança nas práticas
de produção e consumo. O “esverdeamento” dos produtos é observado na sua
relação com similares, podendo mudar ao longo do tempo, exigindo
continuidade em relação a um objetivo móvel (ANDERSEN, 2008);
3.
Produtos
alternativos
eco-inovados:
(novos
caminhos
tecnológicos). São inovações que representam uma mudança tecnológica
radical. A questão não é ter um produto ou processo mais limpo que os demais.
Ao invés disso, oferecer uma solução ou alternativa muito diferente e
ambientalmente mais benigna. Geralmente têm um amplo efeito sistêmico,
sendo constituídos sobre novas teorias, capacitações e práticas, exigindo
mudanças nos padrões de produção e consumo. A dimensão ambiental reside
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somente no design da produção/produto, que deve ser mais verde que a
alternativa (não similar). O método de produção em si não precisa ser limpo e,
em alguns casos, atrai pouca atenção. São exemplos as tecnologias de energia
renovável e a produção agrícola orgânica (ANDERSEN, 2008);
4. Eco-inovações macro-organizacionais: (novas estruturas
organizacionais). Estas inovações propõem novas soluções para um caminho
eco-eficiente de organização da sociedade. Isto significa novos caminhos de
organização da produção e do consumo em um nível mais sistêmico,
implicando em novas interações funcionais entre as organizações (simbiose
industrial, Ecossistemas Industriais), entre famílias e ambiente de trabalho e
novas formas de organizar cidades e sua infraestrutura técnica (ecologia
urbana). Mudam o planejamento regional e físico e a infraestrutura técnica de
várias formas, sendo consideradas inovações tanto organizacionais quanto
técnicas. Exigem cooperação da esfera pública (por ocorrerem em grande
escala neste domínio) com as empresas, visando desenvolver novas soluções
(ANDERSEN, 2008);
5. Eco-inovações de propósito geral: (mudanças de paradigma
tecnológico). Certas tecnologias de uso geral afetam profundamente a
economia e o processo inovativo, em função das relações que possuem com
uma série de outras inovações tecnológicas. Estas tecnologias são usadas
como referência para definir o paradigma tecno-dominante em determinados
momentos do tempo. Mudanças nas tecnologias de propósito geral são tão
fundamentais que terão sempre efeito importante sobre as eco-inovações,
merecendo então uma atenção especial. Por poderem gerar efeitos tanto
negativos como positivos, tecnologias como as de informação e comunicação
(TIC), biotecnologia, e, recentemente, a nanotecnologia, merecem uma
atenção especial no que diz respeito também à eco-inovação (ANDERSEN,
2008).
Em seu esforço de desenvolver uma classificação abrangente, Andersen
(2008) descreve uma trajetória de progresso técnico, desde a adoção de
serviços de controle da poluição e do uso de recursos até a mudança do
paradigma tecnológico, momento em que a Economia Verde é alcançada. Esse
processo envolve a implantação de eco-inovações macro-organizacionais, isto
é, novas estruturas de organização da produção e do consumo em um nível
sistêmico. Especificamente no âmbito industrial, isso significa a conformação
de estruturas produtivas conhecidas como Ecossistemas Industriais, baseadas
no fechamento do ciclo matéria-energia e na simbiose industrial. Considerando
que a temática Ecossistema Industrial surgiu a partir do desenvolvimento do
campo de estudos multidisciplinar conhecido como Ecologia Industrial, a
próxima seção apresenta os principais conceitos desse último enfoque.
Posteriormente, na quarta seção, discutir-se-á os Ecossistemas Industriais e
seu papel na busca pela sustentabilidade ambiental.
3. ECOLOGIA INDUSTRIAL: O FECHAMENTO DO CICLO MATÉRIAENERGIA E A SIMBIOSE INDUSTRIAL
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Na Ciência Econômica, o estudo sobre as relações entre sistema
econômico e o sistema natural tem sido dominado pela abordagem
neoclássica. Esse enfoque, conhecido como Economia Ambiental, examina os
vínculos entre meio ambiente e competitividade a partir do marco teórico da
economia do bem-estar, comparando os custos e os benefícios sociais da
adoção de medidas de segurança ambiental. Entende-se que os custos
constituem um resultado espontâneo do esforço empreendido pelas firmas para
melhorar seu desempenho ambiental6, assim como dos recursos necessários
ao monitoramento e cumprimento das regulações estabelecidas pelo Estado.
Os benefícios, por sua vez, são situados exclusivamente na esfera social, o
que implica negligenciar possíveis vantagens competitivas que as firmas
podem obter em termos de redução de custos de produção, melhorias na
qualidade de produtos e aumento na participação de mercado (LÓPEZ, 1996;
ANDERSEN, 2008).
Amparando-se na aplicação de leis econômicas fundamentais em um
contexto estático, a Economia Ambiental propõe a “internalização das
externalidades”, isto é, o estabelecimento de compensações monetárias para
reparar os prejuízos causados contra o meio ambiente. Predomina a noção de
que os danos provocados pela atividade econômica, tais como contaminação e
poluição em suas diversas formas, constituem falhas que devem ser
precificadas e, portanto, reduzidas à lógica de mercado. Além disso, não há
uma análise do modelo de indústria historicamente construído, muito menos do
padrão tecnológico vigente como fatores que agravam os problemas
ambientais (ANDERSEN, 2008).
Insatisfeitos com o ideário proposto pelo arcabouço neoclássico, alguns
estudiosos iniciaram uma reflexão crítica tomando como referência as análises
do economista romeno Georgescu-Roegen7. O resultado foi o desenvolvimento
de uma visão sistêmica e integrada de todos os componentes do sistema
econômico e suas relações com a biosfera, consubstanciando a corrente
conhecida como Economia Ecológica. Essa perspectiva enfatiza o substrato
biofísico das atividades humanas, isto é, os padrões complexos dos fluxos de
matéria e energia dentro e fora do processo de transformação, em contraste
com as teorias correntes que consideram a economia em termos de unidades
monetárias abstratas. Ademais, advoga que a qualidade dos serviços providos
pelos ecossistemas dependerá da extensão na qual a produção agrícola e
industrial e os processos urbanos forem reestruturados para operar em
harmonia com os componentes do meio ambiente.
6
A análise econômica tradicional parte da concepção de que, confrontada com um
conjunto de combinações insumo-produto, a firma atua racionalmente escolhendo a
combinação técnica que garanta lucro máximo. Nesse sentido, qualquer fator que
obstaculize a livre atuação da empresa – uma regulação ambiental, por exemplo – fará
com que esse agente incorra em ineficiências, elevando seus custos de operação.
7
Nicholas Georgescu-Roegen foi quem primeiro utilizou os princípios da
termodinâmica para explicar as barreiras impostas pela natureza à expansão
econômica. Para Georgescu, a economia é um sistema dissipativo sustentado por um
fluxo metabólico. Sua expansão dentro de um sistema finito e materialmente fechado
(a biosfera) exige um custo. Se esse custo for maior que o benefício gerado pelo
crescimento, este estará sendo antieconômico (CECHIN; VEIGA, 2010).
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Considerando estes aspectos, mas debruçando-se sobre o processo
produtivo e as possibilidades de ajuste que este pode ou tem que sofrer para
adaptar-se às noções de limites ecossistêmicos que a Economia Ecológica
coloca em pauta, alguns estudiosos, em grande parte ligados às discussões
das Engenharias de Produção, Química e Ambiental, desenvolveram um
enfoque conhecido como Ecologia Industrial8. Desrochers (2002) identifica
esse enfoque como uma das perspectivas mais influentes que emergiram nos
anos recentes no debate sobre a interlocução entre a indústria e o meio
ambiente.
A Ecologia Industrial entende o desenvolvimento tecnológico no contexto
dos ecossistemas maiores que o suportam, examinando as fontes de recursos
utilizados na esfera da produção e a capacidade de o meio ambiente absorver
os rejeitos industriais. O sistema econômico é apreendido como um subsistema
de um universo maior e mais complexo, uma vez que a indústria depende dos
serviços e recursos providos pela biosfera, da qual não pode ser dissociada
(LIFSET; GRAEDEL, 2002; PACHECO, 2013).
Assim como os ecossistemas naturais, o sistema industrial é descrito
como uma distribuição de fluxos de matéria e energia. Essa analogia com a
Biologia é aplicada essencialmente ao nível dos distritos e regiões industriais,
importando noções da Ecologia para a construção de um modelo de análise
dos relacionamentos interfirma e de sua interface com o meio ambiente. É
nesse sentido que se procura entender o metabolismo industrial, isto é, o
conjunto de entradas e saídas de matéria e energia presentes na indústria,
desde a extração desses recursos da natureza até sua reintegração ao
ambiente abiótico (LIFSET; GRAEDEL, 2002; ERKMAN, 1997).
O’Rourke et al. (1996) destacam que a Ecologia Industrial abriga um
grupo heterogêneo de pesquisadores, gestores, engenheiros, consultores e
analistas políticos. Segundo esses autores, o enfoque abrange tanto aqueles
que apostam em mudanças incrementais da estrutura industrial quanto os
defensores de uma transformação radical da indústria. Desse modo, a Ecologia
Industrial pode ser entendida mais como um amplo espectro de conceitos do
que um marco teórico unificado, o que explica as diferentes formas em que ela
é elucidada pelos estudiosos.
Frosch e Uenohara (1994), por exemplo, apontam que a Ecologia
Industrial fornece um enfoque sistêmico e integrado que auxilia o manejo dos
impactos ambientais provocados pelos processos industriais. Tal abordagem
postula a necessidade de um entendimento apropriado do metabolismo
industrial e de conhecimentos específicos sobre usos alternativos para os
resíduos, além de mecanismos que estimulem a otimização do uso de
materiais e energia, a exemplo do mercado, incentivos e estruturas
8
As discussões propostas pela Ecologia Industrial aproximam-se daquelas da
Economia Ecológica. Neste artigo, destaca-se a vinculação via tecnologia. Por um
lado, na busca por um sistema econômico mais adequado à noção de limites
ecossistêmicos, as inovações surgem como parte da solução do problema,
particularmente aquelas que permitem reduzir as pressões sobre o ambiente natural,
isto é, as eco-inovações. Por outro lado, a tecnologia constitui uma variável
fundamental no esquema teórico proposto pela Ecologia Industrial, conforme será
esclarecido ao longo desta seção.
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regulatórias. Allenby (1992), por sua vez, percebe a Ecologia Industrial como o
instrumento por meio do qual um estado de desenvolvimento sustentável é
garantido. Ela consiste, segundo esse autor, em uma visão sistêmica da
atividade industrial e sua inter-relação com os sistemas biológicos, físicos e
químicos, com o intuito de sustentar a qualidade de vida indefinidamente, dada
a contínua evolução econômica, cultural e tecnológica.
O que se pretende enfatizar com as duas definições apresentadas é
que, baseada nas perspectivas dos autores acerca do estado atual da indústria
e do meio ambiente, a Ecologia Industrial pode assumir traços ideológicos
distintos. Se, por um lado, ela constitui uma arena de defesa das melhorias de
eficiência incrementais em curso na indústria, por outro, ela compreende um
paradigma revolucionário que deve ser assimilado pela humanidade de forma a
garantir a própria existência econômica das sociedades. Importante ressaltar
que, independentemente de tais divergências, o amplo espectro da Ecologia
Industrial desemboca em diretrizes gerais que norteiam seu desenvolvimento.
Nesse particular, Tibbs (1993) enumera seis conceitos que exprimem tais
diretrizes: i) metabolismo industrial; ii) sistemas energéticos; iii) interfaces com
a biosfera; iv) desmaterialização/descarbonização; v) Ecossistemas Industriais;
e vi) política de inovação.
A Ecologia Industrial constitui uma visão sistêmica e integrada de todos
os componentes da Economia Industrial e suas relações com a biosfera,
enfatizando o substrato biofísico das atividades produtivas. Disso apreende-se
a relevância de conceitos como metabolismo industrial, sistemas energéticos e
interfaces com a biosfera. A Ecologia Industrial também entende as trajetórias
tecnológicas como um elemento crucial, mas não exclusivo, para a
reestruturação do sistema industrial em níveis ambientalmente sustentáveis.
Apreende-se
agora
a
importância
de
conceitos
como
desmaterialização/descarbonização, Ecossistemas Industriais e política de
inovação, uma vez que todos eles perpassam a esfera do desenvolvimento
tecnológico (TIBBS, 1993).
Para que a Ecologia Industrial alcance seus objetivos básicos é
necessário que ocorra o que se entende por fechamento do ciclo ou do
sistema, isto é, a transformação dos sistemas industriais lineares em sistemas
mais fechados, onde a utilização de materiais e energia é otimizada e há
menos dependência de recursos naturais não renováveis. Além do fechamento
do ciclo matéria-energia, a análise das interrelações entre os diversos agentes
que compõem o sistema industrial constitui outro aspecto crucial da Ecologia
Industrial. Aqui, mais uma vez, os estudiosos utilizam a analogia com a Biologia
para elucidar a simbiose industrial como fator determinante para a
reestruturação da indústria em níveis ambientalmente seguros. Na verdade,
como destaca Pacheco (2013), a centralidade da simbiose industrial advém da
operacionalidade do fechamento do ciclo, já que é por meio dela que se torna
possível reaproveitar os fluxos do metabolismo industrial através de uma
relação de mutualismo.
A simbiose descreve a relação biológica na qual pelo menos dois
organismos diferentes realizam trocas que são mutuamente benéficas.
Aplicado à Ecologia Industrial, esse conceito refere-se à cooperação entre
atores geograficamente próximos, trocando ou compartilhando matéria,
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energia, informação ou subprodutos. Nesse processo, o benefício coletivo é
maior do que a soma dos benefícios individuais quando cada agente age
isoladamente. O benefício compartilhado é resultado de ganhos sinérgicos
obtidos com os usos alternativos para os subprodutos, com o compartilhamento
de estruturas físicas e com a prestação conjunta de serviços (CHERTOW,
2004; PACHECO, 2013).
Em geral, a simbiose industrial ocorre em espaços locais ou regionais. O
aumento da distância entre as firmas reduz as oportunidades de troca porque
não é eficiente transportar materiais específicos para além das fronteiras
regionais. O calor e o vapor, por exemplo, se dissipam rapidamente, enquanto
que a água necessita de tubulações especiais, envolvendo custos adicionais.
Ademais, é importante considerar a degradação energética que envolve o
transporte dos subprodutos (CHERTOW, 2004; PACHECO, 2013).
A simbiose industrial engaja as empresas e indústrias, tradicionalmente
separadas, em um modelo coletivo, cuja troca física de matéria, energia e
informação promove vantagens competitivas. As estratégias de colaboração e
as possibilidades sinérgicas oferecidas pela proximidade geográfica induzem
novas formas de comportamento interfirma baseadas na cooperação.
Conforme descreve Ayres (2002), os benefícios resultantes da simbiose
industrial podem ser entendidos como economias de integração não
negligenciáveis, com impactos positivos na elevação da eco-eficiência das
operações industriais.
Com base no critério de fechamento do ciclo matéria-energia e na
simbiose industrial, diversos autores, entre eles Allenby (1992), descrevem
uma economia composta por sistemas mais eficientes que estimulam o fluxo
cíclico dos recursos, provocando, assim, menos impactos sobre o meio
ambiente. Tais sistemas são chamados de Ecossistemas Industriais, tema
discutido na próxima seção.
4. ECOSSISTEMAS INDUSTRIAIS
ECONÔMICOS E AMBIENTAIS
COMO
FONTE
DE
GANHOS
Frosch e Gallopoulos (1989) pioneiramente utilizaram a expressão
Ecossistema Industrial para descrever determinado tipo de arranjo produtivo no
qual os efluentes de um processo servem de insumos para outro. A
preocupação fundamental não recai sobre a quantidade absoluta de rejeitos
que são gerados na atividade industrial, mas sim nas potencialidades de
conversão dos mesmos em insumos úteis. Por isso, Tibbs (1993) sugere uma
ampla reconceituação dos resíduos como a chave para a criação de
Ecossistemas Industriais.
Para Gertler (1995), o Ecossistema Industrial consiste de uma
comunidade de empresas localizadas em uma determinada região que
interagem trocando e utilizando resíduos materiais e energéticos. Esse modelo
de cooperação minimiza a degradação ambiental. Nesse sentido, é lícito
considerar os Ecossistemas Industriais como a manifestação da aplicação dos
princípios da Ecologia Industrial no nível interfirma.
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No que tange ao fluxo de matéria, a perspectiva dos Ecossistemas
Industriais advoga a manutenção da capacidade sistêmica de reprodução dos
recursos naturais e de assimilação de resíduos, o que poderia ser alcançado
por meio da reciclagem. Em relação à produção e ao consumo de energia,
essa corrente adverte a necessidade de se reduzir o uso de combustíveis
fósseis e de outras energias não renováveis. Esse objetivo poderia ser
alcançado por meio da utilização eficiente de energias renováveis em
diferentes níveis de qualidade (energia em cascata).
Tanto a reciclagem da matéria quanto a ideia de energia em cascata
fornecem a base para se pensar as formas de conectar diferentes processos
geradores de resíduos, plantas e indústrias em uma rede operacional que
minimiza a quantidade total de matéria e energia que é eliminada em
vazadouros ou que é perdida em processos intermediários. O conceito chave
da abordagem dos Ecossistemas Industriais é a visão dos processos industriais
como sistemas interativos ao invés de componentes isolados. Ao fomentar a
cooperação entre as firmas, tal enfoque diferencia-se de outras iniciativas que
incidem sobre a unidade produtiva individual. Cooperando umas com as outras,
as empresas poderiam melhorar seu desempenho econômico e ambiental.
Korhonen (2001) afirma que o conceito de Ecossistema Industrial busca
captar a emergência de um sistema industrial fundamentado na cooperação
entre unidades produtivas individuais, de forma que estas utilizem seus
subprodutos como insumos úteis, reduzindo o uso de materiais virgens, bem
como a emissão de rejeitos. Para esse autor, o termo faz analogia a alguns
princípios dos ecossistemas naturais: i) roundput; ii) diversidade; iii) localidade;
e iv) gradualismo.
Os ecossistemas naturais são adaptados às condições ambientais
locais, respeitando seus limites. Os sistemas industriais tradicionais superam
tais limites por meio da importação de recursos. Ademais, guiam-se pela
crença, teoricamente estabelecida, de que o capital natural pode ser
substituído indefinidamente por inovação tecnológica ou capital construído. No
entanto, para alcançar a metáfora de um ecossistema, a indústria deverá
substituir recursos importados por recursos renováveis locais, além de reciclálos por meio do uso de subprodutos e do fluxo energético em cascata
(roundput). Para tanto, deverá acompanhar o tempo cíclico dos recursos locais
ao invés de exceder sua taxa de renovação (gradualismo), adaptando-se aos
limites naturais da localidade. Dada a diversidade em atores, insumos,
produtos, informação e em interdependência, deverá também promover
relações simbióticas entre agentes e ecossistemas (KORHONEN, 2001).
Ainda conforme Korhonen (2001), a conformação de um Ecossistema
Industrial envolve a transição de um fluxo linear de matéria-energia para um
fluxo quasi-cíclico, onde os recursos e resíduos são limitados e o sistema opera
por meio de uma reciclagem quase completa dos fluxos materiais. Em um
Ecossistema Industrial ideal, ambos os sistemas (o subsistema industrial e a
biosfera) operam de acordo com os quatro princípios descritos. Importante
destacar que tais princípios descrevem um tipo ideal e, portanto, constituem
diretrizes e direções iniciais para o desenvolvimento dos Ecossistemas
Industriais.
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Com base no modelo cíclico do fluxo matéria-energia e nos quatro
princípios citados por Korhonen (2001), a Figura 1 representa um Ecossistema
Industrial ideal.
Figura 1
Ecossistema Industrial ideal
Energia solar
Diversidade
Roundput
Roundput
Diversidade
Localidade
Gradualismo
Uso de recursos
renováveis
Localidade
Outputs que a
natureza tolera
e reutiliza
Gradualismo
Calor residual
(radiação infravermelha para o espaço)
Fonte: Elaboração própria a partir de Korhonen (2001).
O modelo esquematizado parte da coexistência de dois sistemas: o
subsistema industrial e o ecossistema natural, sendo que este último contém o
primeiro. O único insumo do conjunto do sistema é a energia solar e o único
subproduto é o calor residual. Os insumos do subsistema industrial incluem
somente recursos renováveis, os quais são reciclados. A energia flui em
cascata entre os diversos atores da indústria. Os produtos lançados no
ecossistema natural incluem apenas materiais que o meio ambiente é capaz de
absorver e reutilizar. Ademais, os dois sistemas operam de acordo com os
mesmos princípios: roundput, diversidade, localidade e gradualismo. Tal
modelo acarreta ganhos ambientais, uma vez que o uso de recursos virgens e
a emissão de rejeitos são reduzidos. Ganhos econômicos também são
possíveis por meio da redução dos custos associados à aquisição de matéria
bruta e energia, bem como dos custos referentes à gestão dos resíduos.
Há o consenso de que a criação de um Ecossistema Industrial é
altamente desejável do ponto de vista ambiental. No entanto, uma série de
obstáculos impedem sua implementação. Em primeiro lugar, tem-se a ideologia
econômica prevalecente. A teoria convencional afirma que os processos
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industriais são projetados para maximizar os benefícios imediatos do fabricante
e a utilidade do consumidor, em vez de buscar o benefício do conjunto da
economia. Erkman (1997) explica que as idéias econômicas tendem para a
direção oposta daquilo que propõe a Ecologia Industrial, favorecendo a
abertura dos ciclos de matéria e a obsolescência dos produtos.
Como escreve Sachs (2000), a eficiência econômica não pode ser mais
avaliada unicamente por meio da rentabilidade da empresa, mas sim com base
nas externalidades sociais e ecológicas. É necessário um tratamento holístico
para que haja o equilíbrio entre os benefícios econômicos e as necessidades
ambientais. Para tanto, como observam Frosch e Gallopoulos (1989), o
conceito de Ecologia Industrial deve ser reconhecido e valorizado pelo Estado,
por líderes da indústria e da mídia e pelo sistema educacional, de modo a
favorecer a abordagem dos Ecossistemas Industriais.
Os rejeitos e efluentes oriundos da atividade produtiva representam
apenas o lado da oferta do Ecossistema Industrial. Assim, uma segunda
questão nos remete ao lado da demanda, isto é, ao papel do consumidor. Os
resíduos gerados pelo consumo das famílias também devem ser usados como
insumos úteis nos próximos ciclos de produção. Mudanças na produção,
portanto, devem ser acompanhadas por alterações nos padrões de demanda
dos consumidores e no tratamento dos materiais, uma vez comprados e
utilizados (FROSCH; GALLOPOULOS, 1989).
Uma terceira barreira para a implementação de Ecossistemas Industriais
refere-se ao padrão tecnológico vigente. Conforme pondera Sachs (2000), a
tecnologia é uma variável fundamental, pois corresponde à maneira de
relacionar o meio ambiente com os objetivos de progresso material da
sociedade. Desse modo, grande esforço deve ser empreendido em direção a
tecnologias que permitam aproveitar melhor a oferta potencial de recursos em
bases sustentáveis.
Muitos autores visualizam a inovação tecnológica como o instrumento
central para a solução dos problemas ambientais. Nesse particular, Lifset e
Graedel (2002) destacam o papel das empresas: como lócus de expertise
tecnológica, elas são agentes fundamentais para a reestruturação da indústria
em um modelo ambientalmente seguro. Assim, por um lado, o papel das firmas
é um tópico crucial a ser investigado pela Ecologia Industrial, bem como um
componente fundamental para a adoção de uma política ambiental satisfatória.
Por outro lado, o Ecossistema Industrial é uma eco-inovação, no sentido do
arranjo produtivo que busca minimizar os impactos ambientais negativos, ao
mesmo tempo que requer inovações que permitam o aumento de eficiência e
novas possibilidades de aproveitamento de resíduos e subprodutos.
Como enfatizam Frosch e Gallopoulos (1989), harmonizar os desejos do
desenvolvimento industrial global com as necessidades de segurança
ambiental é um grande desafio. No entanto, os incentivos são óbvios: as
empresas minimizarão seus custos e aumentarão sua competitividade ao
aderirem a uma abordagem mais racional. Para além da retórica do
desenvolvimento sustentável, uma motivação para a estruturação dos
Ecossistemas Industriais é o incremento da competitividade: esse modelo é
uma forma das empresas explorarem seus produtos e recursos, incluindo os
resíduos, com maior eficiência. A criação de um Ecossistema Industrial, além
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de altamente vantajosa do ponto de vista ambiental, é também altamente
lucrativa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O modelo de indústria historicamente construído toma o meio ambiente
como um recurso infinito, apoiando-se na concepção errônea de que os
serviços “gratuitamente” ofertados pelos ecossistemas são ilimitados. Ao
promover a utilização intensiva de insumos brutos, extraídos diretamente da
natureza, e seu posterior descarte, ele não incentiva o reaproveitamento
desses materiais nos ciclos produtivos subsequentes. Ademais, a utilização
dos combustíveis fósseis instituiu um sistema industrial baseado em fontes de
energia não renováveis, cujos impactos adversos se fazem sentir por meio da
emissão de gases oriundos do processo de combustão.
Face às evidências da gestação de uma crise ambiental, diversos atores
têm pontuado a importância das estruturas industriais para o estabelecimento
de estratégias de desenvolvimento favoráveis à conservação da qualidade dos
serviços ecossistêmicos. Nesse particular, a corrente conhecida como Ecologia
Industrial advoga a reestruturação da indústria sob o formato de um sistema
fechado e estável baseado em relações simbióticas, isto é, sob a perspectiva
de um Ecossistema Industrial.
Os Ecossistemas Industriais buscam a conformação de estruturas
produtivas intrinsecamente ajustadas às tolerâncias e características dos
sistemas naturais. Além disso, eles promovem ganhos substanciais em
produtividade. Em primeiro lugar, a necessidade de se alterar o design e o ciclo
de vida dos produtos traduz-se no surgimento de bens com melhor
desempenho ou qualidade superior. Para a firma, isso pode implicar
diferenciação de produto e aumento da participação no mercado. Em segundo
lugar, mudanças nos processos de produção induzem uma maior eficiência dos
recursos empregados. Esse ganho de eficiência pode ser resultado de
menores gastos com monitoramento e manutenção, economia de matériasprimas por meio do reuso ou reciclagem, utilização de subprodutos, menor
consumo de energia e disposição mais segura de resíduos.
Dadas as vantagens ambientais e econômicas obtidas através da
conformação dos Ecossistemas Industriais, entende-se que estes últimos são
estratégias eco-inovativas viáveis para a construção de uma Economia Verde.
Considerando o cenário favorável para a alocação das inversões em setores
verdes – conforme sugerido por diversos órgãos multilaterais (OECD, 2009a;
UNEP, 2011) –, os Ecossistemas Industriais oferecem oportunidades de
investimento e emprego em consonância com as necessidades de
conservação do capital natural. Isso revela que sustentabilidade ambiental e
progresso socioeconômico não constituem objetivos antagônicos.
Percebe-se que, longe de uma oposição axiomática entre meio ambiente
e competitividade, os Ecossistemas Industriais fornecem fortes evidências de
que os esforços inovativos na direção de tecnologias ambientalmente seguras
podem induzir ganhos de competitividade não negligenciáveis. Nesse sentido,
as proposições da Ecologia Industrial constituem um instrumental relevante
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para o direcionamento das atividades de pesquisa e desenvolvimento, bem
como das políticas em matéria ambiental no contexto de uma recuperação
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