ecr
nº 1 | 2009
estudos de
conservação e
restauro
studies in conservation and restoration
estudios de conservación y restauración
IS S N - 1647-2098
ficha técnica
Edição
Data
Centro de Investigação em Ciência e
Dezembro 2009
Tecnologia das Artes (CITAR)
Universidade Católica Portuguesa
Centro Regional do Porto
Rua Diogo Botelho 1327
Design editorial
Mafalda Barbosa
4169 - 005 Porto, Portugal
revista.ecr@porto.ucp.pt
Direcção
Ana Calvo
Imagem capa
Microfotograia do corte transversal da
amostra por MO a 200x por Jorgelina
Carballo | “Fuga para o Egipto”
[Retábulo-mor da Igreja Matriz de Freixode-Espada-à-Cinta]
Conselho de redacção
Eduarda Moreira da Silva
Administração do website
Salomé de Carvalho
Luís Teixeira | Mafalda Barbosa
Comité Cientíico
A propriedade intelectual dos conteúdos
Ana Isabel Seruya
pertence aos respectivos autores e os
António João Cruz
direitos de edição e publicação à revista
Carmen Garrido
ecr.©
José Aguiar
Os artigos são da responsabilidade
Luís Elias Casanovas
Nieves Valentín
cientíica e ética dos seus autores.
Raquel Carreras
Rocío Bruquetas
Avaliação por peer review.
Roger Van Schoute
ISSN
1647-2098
Periodicidade
Anual
estudos de conservação e restauro | nº 1
2
índice
editorial ......................................................................................................... 05
artigos
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandre Gonçalves, Ana Bailão ..................................... 11
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e
perspectivas
Soia Gomes .............................................................................................. 24
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the
identiication of proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer,
Ricardo J. Carreira ...................................................................................... 39
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico:
a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho ............................................................................................ 57
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado ................................... 73
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso ...................................................................................... 86
Entre a tradição e a modernidade: os pigmentos ao dispor dos artistas e o
conhecimento sobre esses materiais em Portugal no início do século XX
António João Cruz ....................................................................................... 93
estudos de conservação e restauro | nº 1
3
Radiograia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e
restauro da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho ........................................................... 113
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão ................................................................................................ 128
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira ..................................................................................... 140
recensões críticas
Conservación del Patrimonio Cultural - Criterios y normativas
Ana Macarrón
Ana Calvo ................................................................................................. 154
Conservação Preventiva e Preservação das Obras de Arte
condições-ambiente e espaços museológicos em Portugal
Luís Efrem Elias Casanovas
Salomé de Carvalho ................................................................................... 157
Conservação Urbana e territorial Integrada.
Relexões sobre salvaguarda, reabilitação e gestão de Centros Históricos
em Portugal
Francisco Queiroz e Ana Margarida Portela
Eduarda Moreira da Silva ............................................................................ 159
notícias ........................................................................................................ 162
estudos de conservação e restauro | nº 1
4
editorial
A publicação desta nova revista - ecr, estudos de conservação e restauro - vem completar
o processo iniciado em 2002, aquando da criação do curso de licenciatura em conservação
e restauro na Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa, Centro Regional do
Porto.
Como tal, o esforço que tal desaio intelectual pressupõe constitui para nós motivo de
especial satisfação.
A investigação representa no actual panorama universitário com o estabelecimento do
segundo e terceiro ciclo de estudos, um objectivo fundamental. A existência de uma
plataforma de publicação é, por isso, o melhor meio para que essa investigação alore e
para que seus resultados possam ser avaliados. Este foi o principal motivo que esteve na
base da criação duma revista dedicada à conservação e restauro de bens culturais. Uma
revista de rigorosos conteúdos cientíicos, avaliada anonimamente por pares e que nasce,
além disso, no contexto do grupo de investigação em conservação e restauro do CITAR
(Centro de Investigação em Ciência e Tecnologia das Artes). Uma revista que tem por
objectivo converter-se numa referência na nossa área.
Contudo, não são ainda muitos os fóruns neste âmbito, o que representa uma diiculdade
acrescida. Muito embora possamos destacar em Portugal a revista impressa Conservar
Património da Associação Professional de Conservadores-Restauradores (ARP), e a
internacional em suporte electrónico, dirigida por um português, e-Conservation Magazine,
para além das editadas pelo Instituto Português de Museus e da Conservação, somos de
opinião que se justiicava uma publicação universitária, periódica e especializada, que
servisse de referência e lugar de debate, não apenas aos nossos investigadores, mas
também a todos aqueles que, de fora, trabalham nesta área.
Duas razões estiveram na base da opção por uma revista digital – embora não descartemos
a hipótese de edições impressas - as facilidades técnicas que dispúnhamos no seio da
universidade e do CITAR, e, sobretudo, as possibilidades de difusão e expansão do suporte
electrónico.
A revista ecr está aberta à publicação em três línguas - português, inglês e espanhol
- o que nos permite atingir vários objectivos. Por seu lado, a língua inglesa possibilita
uma enorme capacidade de propagação, pelo que todos os artigos contêm um resumo e
palavras-chave em inglês, embora pensemos que tal facto não deva excluir um esforço
de aperfeiçoamento da terminologia desta área em português, o que terá um enorme
potencial de acolhimento em países como o Brasil. Por outro lado, o espanhol é a segunda
língua mais falada no mundo. A isto soma-se a ampla colaboração, no campo cultural, de
vários membros do grupo de nacionalidade espanhola. A esta amplitude linguística está
subjacente o desejo de ultrapassar fronteiras e alcançar o maior número de leitores e
colaboradores.
estudos de conservação e restauro | nº 1
5
A revista ecr conta com uma secção fundamental de artigos especializados completada
por uma secção de resenhas bibliográicas. Com estas, pretende-se dar a conhecer as
publicações recentes com interesse editadas na nossa área. Por im, na secção de notícias
divulgam-se as actividades mais relevantes dos nossos centros e investigadores.
Neste primeiro número pudemos contar com a participação de muitos membros do grupo
de investigação, para além de propostas externas que agradecemos e esperamos que
aumentem em próximas edições. Os temas abordados são vários, relexo da diversidade
do nosso campo proissional: desde artigos que nos dão a conhecer documentos históricos
como o de António João Cruz, com um manuscrito relativo a pigmentos, de inícios do século
XX, ou o de José Ferrão Afonso, sobre a destruição e substituição de retábulos do século XVI
no Porto, Guimarães e Amarante. Registam-se, também, contributos com uma orientação
mais tecnológica como o exposto por Frederico Henriques, Alexandre Gonçalves e Ana
Bailão, com a aplicação da análise espacial à deterioração de uma pintura sobre tela e o de
Luis Bravo Pereira, sobre tratamentos informáticos aplicados à radiograia. Salientamos,
ainda, textos de aplicações químicas, físicas ou bioquímicas a objectos artísticos, como o
de Irina Sandu et al. sobre um novo sistema para a identiicação de aglutinantes orgânicos
em objectos policromados ou o de Joana Salgueiro e Salomé Carvalho com o estudo de
uma obra de Grão Vasco por meio de radiograia. De igual modo, também se incluem
abordagens mais teóricas como o artigo sobre reintegração cromática da autoria de Ana
Bailão e casos especíicos como o dos problemas de uma colecção de arte contemporânea
de Soia Gomes; a intervenção de conservação e restauro no Galeão Real de D. João VI,
de Daniela Coelho, sem esquecer o estudo analítico e intervenção numa pintura mural de
Ana Bidarra e outros autores.
Para terminar estas linhas, gostaríamos de agradecer ao Director da Escola das Artes e do
CITAR, Exmo. Prof. Doutor Joaquim Azevedo, bem como ao Director de Departamento de
Arte e do grupo de investigação em Património Cultural: estudos, conservação e gestão, o
Prof. Doutor Gonçalo de Vasconcelos e Sousa, as facilidades e o apoio concedidos ao longo
deste processo; a todos os docentes da área e colaboradores do grupo de investigação
pela sua cooperação entusiástica desde o primeiro momento; aos membros dos comités de
redacção e cientíico pelo seu valioso trabalho; a todos que os que participaram no desenho
e manutenção da página web e a todos quantos contribuíram para que esta revista fosse
e seja uma realidade.
Ana Calvo
estudos de conservação e restauro | nº 1
6
editorial
editorial
The publication of this new magazine – ecr,
La publicación de esta nueva revista - ecr,
estudos de conservação e restauro - is part of the
estudos de conservação e restauro - viene
process initiated in 2002 when a licentiateship
a complementar el proceso iniciado en el
degree in conservation and restoration was
año 2002, al crearse una licenciatura en
created at the Arts Faculty of the Portuguese
conservación y restauración en la Escola das
Catholic University in Porto. Accordingly, in
Artes de la Universidade Católica Portuguesa en
addition to the effort involved this intellectual
Oporto. Por ello, este reto intelectual supone,
challenge also gives us particular satisfaction.
junto a su esfuerzo, una especial satisfacción
During our university career, once the second
también.
and above all the third cycle of the Ph.D. have
Resulta
been established, research is understandably
recorrido universitario, una vez establecidos
an essential objective. And a platform for
el segundo y, sobre todo, el tercer ciclo de
publication is the best medium for that research
doctorado, la investigación se convierta en un
to appear and for its results to be measured
objetivo fundamental. Y, una plataforma para
comprensible
que,
en
nuestro
and evaluated. This was the core reason
publicar es el mejor medio para que alore esa
behind the need and the commitment to launch
investigación, y se puedan medir y evaluar
a magazine touching on the conservation and
sus resultados. Por este motivo básico surgió
restoration of cultural assets. A magazine
with accurate scientiic content, anonymously
la necesidad y la apuesta de sacar adelante
evaluated by peer review and born furthermore
restauración de bienes culturales. Una revista
una revista en el ámbito de la conservación y
in the context of the conservation-restoration
de
research group of CITAR (Arts Science and
anónimamente por pares, y que nace, además,
Technologie Research Centre). A magazine,
en el contexto del grupo de investigación en
then, that is powered by the aim of becoming a
reference in our ield.
conservación-restauración del CITAR (Centro
There are still few forums for this particular
Artes). Una revista a la que mueve, pues, la
here
contenido
cientíico,
evaluada
de Investigação em Ciência e Tecnologia das
ield so that the dificulty is even greater.
Nevertheless,
riguroso
in
Portugal
we
can
highlight the magazine Conservar Património
pretensión de convertirse en una referencia en
nuestro campo.
No son muchos todavía los foros existentes
of the Portuguese Association of Professional
para este ámbito, por eso la diicultad es
Conservators-restorers
the
todavía mayor. Aunque podemos destacar
a
en Portugal la revista en papel Conservar
Portuguese called e-Conservation Magazine,
Património de la Asociación Profesional de
as well as the institutional magazines of the
Conservadores-restauradores
Institute
(ARP), y la internacional digital, dirigida por
international
of
digital
(ARP)
magazine
Museums
and
and
run
by
Conservation.
de
Portugal
Nevertheless, we believed that we were still
un
lacking a specialised university periodical to
además de las institucionales del Instituto
serve as a landmark and discussion forum not
dos Museus e da Conservação, no obstante,
only for our researchers but also for all those
pensamos que aún hacía falta una publicación
working in this area.
universitaria, periódica y especializada, que
Two reasons inclined us to a digital format,
sirviera de marco y lugar de debate no sólo
although we have not discarded the possibility
para nuestros investigadores, sino también
estudos de conservação e restauro | nº 1
portugués,
e-Conservation
Magazine,
7
of paper editions: the technical facilities we
para todos aquellos que, desde fuera, trabajan
knew we could count on within the context of
en este área. Dos motivos nos inclinaron por
the University and CITAR and above all the ease
una revista digital – aunque no descartamos la
of dissemination and expansion made possible
posibilidad de tiradas en papel -, las facilidades
by this medium.
técnicas con que contábamos en el contexto
Ecr is open to three languages – Portuguese,
English and Spanish - to allow it to fulil various
de la Universidad y del CITAR, y, sobre todo,
las posibilidades de difusión y expansión que
objectives. English is obviously widespread and
facilita sin duda este medio.
all the articles have an abstract and key words
La revista ecr está abierta a tres lenguas
in English. However, we are of the opinion that
- portugués, inglés y español - para poder
this should not preclude guaranteeing support
for speciic Portuguese terminology in this ield,
alcanzar así varios objetivos. Evidentemente la
particularly as this would be accessible to other
de propagación, así todos los artículos tienen
countries such as Brazil. Spanish, on the other
un
hand, is the second most spoken language in
pero pensamos que ello no debería excluir
lengua inglesa cuenta con una gran capacidad
resumen
y
palabras
clave
en
inglés,
the world, to which is added the proximity and
el aianzamiento de la terminología propia
extensive collaboration in cultural matters in
portuguesa en este campo que, además,
the last years, with the presence of various
tiene también en otros países, como Brasil, un
Spanish members in the group. Underlying this
amplio potencial de acogida. Por otra parte, el
linguistic span is the desire to reach as many
español es la segunda lengua más hablada en el
readers and contributors as possible beyond
mundo, a lo que se une la vecindad y la amplia
our borders.
colaboración en materia cultural de los últimos
Ecr has a core supply of specialised articles
años, con la presencia de varios miembros del
and a section on bibliographical summaries.
grupo de dicha nacionalidad. Tras esta amplitud
With these we intend to keep abreast of recent
lingüística subyace el deseo de llegar, más allá
publications of interest in our ield. Finally, we
de las fronteras, al mayor número tanto de
will have a news section containing relevant
lectores como de colaboradores.
activities of our centres and researchers.
La
In this irst issue we have counted on the
revista
ecr,
fundamental,
de
completado
con
cuenta
con
artículos
una
un
apartado
especializados,
sección
de
reseñas
group as well as other external contributions
bibliográicas. Con éstas últimas, se quiere
for which we are grateful and which we hope
estar al tanto de las publicaciones recientes
will increase with the following issues. The
de interés que se editen en nuestro ámbito.
participation of various members of the research
topics are varied as beits the diversity of our
professional ield. We have articles on historical
Finalmente, en una sección de noticias se
acogen las actividades relevantes de nuestros
documents such as the one by António João
centros e investigadores.
Cruz on a manuscript of pigments of the early
20th century; one by José Ferrão Afonso on
En este primer número hemos podido contar
the destruction and substitution of retables in
del grupo de investigación, además de otras
16th century Porto, Guimarães and Amarante.
propuestas
There are contributions of a more technological
esperamos que aumenten en los próximos
nature, including those by Frederico Henriques,
números. Las cuestiones abordadas son muy
Alexandre Gonçalves and Ana Bailão, on the
nuestro
application of spatial analysis of the damage
to a painting on canvas; and one by Luis Bravo
Pereira on x-ray computer treatment. Texts on
estudos de conservação e restauro | nº 1
con la participación de numerosos miembros
externas
que
agradecemos
y
variadas, relejo de la propia diversidad de
que
campo
aportan
profesional:
documentos
hay
artículos
históricos
como
el de Antonio João Cruz con un manuscrito
8
chemical, physical or biochemical applications
de pigmentos de principios del siglo XX; o el
on art objects, such as the one by Irina Sandu
et al, on a new system for the identiication
de José Ferrão Afonso, sobre la destrucción
of organic agglutinants in polychrome objects
en
and the one by Joana Salgueiro and Salomé
aportaciones con orientación más tecnológica,
de Carvalho with their study on a work by
como las expuestas por Frederico Henriques,
Grão Vasco through an x-ray. We also touch on
Alexandre Gonçalves y Ana Bailão, con la
more theoretical themes such as that by Ana
Bailão on chromatic reintegration; and speciic
aplicación de análisis espacial de los deterioros
cases such as the problems of a contemporary
the
Pereira, sobre tratamientos informáticos a la
conservation and restoration intervention on
físicas o bioquímicas a los objetos artísticos,
art
collection
by
Sofía
Gomes;
also
D. João VI’s royal galleon by Daniela Coelho;
y sustitución de retablos en el siglo XVI
Oporto,
Guimarães
y
Amarante.
Hay
de una pintura sobre tela; y el de Luis Bravo
radiografía. Textos de aplicaciones químicas,
como el de Irina Sandu et al. sobre un nuevo
and the analytical study and intervention on a
sistema para la identiicación de aglutinantes
mural by Ana Bidarra and other authors.
orgánicos en objetos policromados y el de
Finally, we would like to thank the Director
Joana Salgueiro y Salomé de Carvalho con el
of the School of Arts and of CITAR, Professor
estudio de una obra de Grão Vasco por medio
Joaquim Azevedo, and the Head of Department
and of the research group - Cultural Heritage:
de una radiografía; También se aportan temas
más teóricos como el de Ana Bailão sobre la
management,
reintegración cromática; y casos especíicos
Professor Gonçalo de Vasconcelos e Sousa, for
como los problemas de una colección de arte
studies,
conservation
and
all their support throughout the entire process.
contemporáneo de Sofía Gomes; la intervención
We would also like to thank all teaching staff
de conservación-restauración en el Galeón Real
in this area and those working in the research
de D. João VI, de Daniela Coelho; y el estudio
group for their continued and enthusiastic
analítico e intervención en una pintura mural
cooperation. We are also grateful to the
de Ana Bidarra y otros autores.
for their valuable work, to those who helped
agradecer al Director de la Escola das Arte y del
set up and maintain the web page and to all
CITAR, Excmo. Prof. Doutor Joaquim Azevedo,
those who have made this magazine possible.
así como al Director del Departamento de Arte
members of the editorial and scientiic board
Para
inalizar
estas
líneas,
nos
gustaría
y del grupo de investigación en Patrimonio
Ana Calvo
Cultural: estudios, conservación y gestión,
Prof. Doutor Gonçalo de Vasconcelos e Sousa,
las facilidades y apoyo que nos han brindado en
todo este proceso; a todos los docentes del área
y colaboradores del grupo de investigación por
su cooperación entusiasta en todo momento;
a los miembros de los comités de redacción
y cientíico por su valioso trabajo; a los que
han participado en el diseño y mantenimiento
de la página web; y a todos aquellos que han
ayudado para que esta revista sea ya una
realidad.
Ana Calvo
estudos de conservação e restauro | nº 1
9
artigos
estudos de conservação e restauro | nº 1
10
Tear feature extraction with spatial analysis:
A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandre Gonçalves, Ana Bailão
Abstract
This paper on Conservation of Cultural Heritage explores the use of spatial analysis functions
for fe ature extraction. The study evaluates the performance of neighbourhood functions
for the delimitation of a tear in a thangka painting. The pathology area was documented
with a non-conventional technique in painting conservation.
Keywords
Painting conservation, spatial analysis, neighbourhood statistics, feature extraction,
thangka.
Resumo
Este artigo em Conservação de Património Cultural explora a utilização de funções de análise
espacial para extracção de características da superfície. O estudo avalia o comportamento
das funções de vizinhança na determinação de um rasgão numa pintura thangka. A
patologia foi documentada por intermédio de uma técnica de diagnóstico em conservação
de pintura não convencional.
Palavras-chave
Conservação de pintura, análise espacial, estatística de vizinhança, determinação de
características, thangka.
Resumen
Este estudio en Conservación de Patrimonio Cultural explora el uso de las funciones del
análisis espacial para la identiicación de características de la supericie. El artículo evalúa
el comportamiento de las funciones de proximidad en la delimitación de un desgarro en
una pintura thangka. La zona de la patología ha sido documentada con una técnica no
convencional de diagnóstico en conservación de pintura.
Palabras clave
Conservación de pintura, análisis espacial, estadística de proximidad, determinación de
características, thangka.
estudos de conservação e restauro | nº 1
11
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
1. Introduction
In conservation and restoration, methods of inspection and analysis are essential in the
characterization of the conservation state of works. This study is focused on the use of
spatial analysis concepts in a less conventional area – artworks.
We suggest and explore the applicability of some solutions to perform a graphic
documentation with the use of Geographical Information Systems (GIS). The described
methodology addresses the diagnosis and interpretation of a digital image – a macro-
photography of a type of pathology -, depicting a tear in a thangka painting. A research
goal was to explore the potential contact between spatial analysis, performed with the
use of computational resources, and the conservation and restoration. As well as in more
conventional application areas which use GIS as a tool, the use of spatial analysis for
feature extraction on an artwork provides information about its metric characteristics,
which may be interesting for documenting purposes.
In conservation, a few works on this speciic subject were presented: the analysis of
craquelures (Abas, 2004), the use of global ilters in the panel of Leonardo - Mona Lisa
(Mohen, Menu and Mottin, 2006:98), the principal component analysis (PCA) on panel
paintings of Tomar (Pires et al., 2007), and segmentations with Bayesian classiiers in
lacunas of ancient Chinese mural paintings (Liu and Lu, 2008:121-131). Also for mural
paintings measuring the lacunas with a maximum likelihood classiication enabled the
characterization of its extension (Henriques et al., 2009:13-15). In other areas, such as
architectural heritage, this typology of works has been more developed (Lerma, 2001:255258), (Lerma, 2005:73-77).
In the spatial analysis ield, some of these functions are used to delimitate and describe
areas that present identiiable quantitative characteristics. For example, in the pattern
recognition area, a digitized image containing several objects is analysed through a process
consisting of three major phases: image segmentation, feature extraction and classiication
(Castleman, 1996:448). In the process described as follows, analytic operations were
carried out with GIS by the application of several spatial analysis tools (neighbourhood
statistics functions, reclassiication and region grouping). At the end of the operation
sequence a tear region in a painting was extracted and quantiied.
2. Methods of surface inspection and analysis
2.1 Traditional methods
The use of inspection and analysis methods in the conservation of paintings is a common
task. We reference some known analytical results for thangkas, useful to explore data
correlation via spatial analysis, where it is possible to present a chemical documentation
of the painting materials. A variety of techniques can be applied for the inspection of these
works and, for instance, some studies on thangkas from the Himalayas were done by
estudos de conservação e restauro | nº 1
12
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
X-ray luorescence (XRF), infrared spectroscopy with Fourier transforms (FTIR), Raman
spectroscopy (RS), high performance liquid chromatography (HPLC) and scanning electronic
microscope (SEM) (Mass et al., 2008:661).
2.2 Use of GIS in documentation of artworks
Some of the main advantages that can be enumerated for GIS-based techniques are the
possibility of using a non-contact system, the ability to execute the analysis of pictorial
data and the information retrieval concerning the state of conservation of the analysed
artwork. The layer-based operating paradigm of GIS data and operations is a valuable
resource that allows the representation of datasets in a logical model, and the production
of new datasets which may correspond to the extraction of interesting features in artwork
analysis. Another interesting capacity is the rapid and easy thematic mapping capability of
GIS software, useful for visualizing purposes.
GIS-based methods differ from traditional image software because GIS software has the
possibility to combine alphanumerical data with graphic information. For the conservatorrestorers, the principal disadvantage of spatial analysis is the fact of being a computerdependent technology requiring the availability of software and hardware systems and the
specialized formation of operators. The speciicity of theory and terminology requires a
particular knowledge in spatial data processing technologies.
3. Spatial data and operations
A raster data format is one of two primary approaches to represent the locational component
of geographic information. The other, not referred here, is the vector format (Burrough
and McDonell, 1998). The raster format represents data in a grid of regularly distributed
values, called cells, each one storing a single value. A data collection is usually displayed as
a layer, in a matrix-like layout. This is similar to the usual representation of images, such
as the digital photographs applied on this paper, where there is a correspondence between
pixels and cells in a raster layer.
In raster operations, analytical functions can be grouped in the following typologies: local,
focal, zonal and global (Burrough and McDonell, 1998). The differences between the
various function types are explained by the range of cells included in the calculus, which is
called the neighbourhood. Both spatial or geometric representation of data, as well as the
attributes that the cells portray, can be used and evaluated to produce a new data layer.
Local functions are deined as combinations of one or more raster layers, only taking
into account the value of the corresponding cells. They include overlay operations and
reclassiication (change of values according to a function).
Focal functions take the values of cells in shape-deined neighbourhoods around each
cell in the layer to calculate the value for it. This deines a moving window, sequentially
estudos de conservação e restauro | nº 1
13
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
applied to each cell
Ci , j ,
deining the cells over which some statistical function applies.
Any cell that is inside the neighbourhood will be included in the processing. This type of
operation is also commonly known as convolution (Burrough and McDonnel, 1998: 186).
The window is usually a square with 3x3 cells, but any other size or shape is possible (the
size of the window can be deined in number of cells or map units). The general equation
for rectangular windows (sized 2m+1 by 2n+1 cells) centred on cell at position
Ci , j = f ({c k ,l : i − m ≤ k ≤ i + m, j − n ≤ l ≤ j + n})
where
f stands for a given operator and
ck ,l
i, j is:
is the value of the layer at position
Several types of statistics can be a choice for function
k, l .
f : for example, average, majority,
maximum, mean, minimum, minority, range, standard deviation and sum are some options.
The average statistic, also designated as low-pass ilters (Burrough and McDonnel, 1998:
186), has the effect of removing extremes from data, producing a smoother image. In the
majority, minority, maximum, minimum, medium and sum statistics, if the input raster
values are integer, the output values are integer. If the values of the input use loating
point, outputs are also of the same type. If there is more than a single value for majority/
minority in the neighbourhood, the process gives No Data to the output cell.
Zonal functions use groups of cells with the same value (called “zones”) to perform some
statistics or geometric calculation on them. These zones can be deined in the layer being
analysed or in a second layer. All the statistics applicable in focal functions can be used
as zonal statistics. Examples of geometric options include thickness and area of individual
patches, and the computation of the distance from any cell to the closest cell with a speciic
value.
4. Methodology
4.1. The thangka and its conservation state condition
A thangka is a painting in cloth linen or silk, and an artistic and religious demonstration
of the Tibetan culture [igure 1]. This painting was made with a particular technology,
painted directly over the tissue, without preparation and has the following size: 115X91cm
(nearly).
When the photographic documentation was done, the painting had a good adhesion of the
chromatic layer and a signiicant number of small tears. In some of these tears, several
back small cloths of original reinforcement were applied.
estudos de conservação e restauro | nº 1
14
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
igure 1 - The thangka
4.2. Equipment and data
Photographs of the thangka were taken with a Sony Cyber-shot F-717 5 Mpixels digital
camera with a sensor charge-coupled-device (CCD). This was converted to 8-bit raster,
with 3 bands, in TIFF format. The hardware used for the proceedings was a Pentium 4, CPU
3.00 GHz, with 1.0 GB of RAM. For the analytic operations ArcGIS 9.3™ software, with the
estudos de conservação e restauro | nº 1
15
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
Spatial Analyst™ extension (which allows the processing of raster data) was used.
Operations were conducted in an image section, with 460 columns per 632 lines and
851.72 kB of size, depicting the area of one of the tears, near the chin of one of the three
igures in the scene left side [igure 2].
igure 2 - The tear
A) Near the goddess chin; B) Detail
4.3. Application
To recognize an area with a very irregular geometry, and to differentiate it from the
background, a variety of functions and process lows can be applied. In our case, the
tear segmentation was implemented using a sequence of operations consisting of a focal
function, followed by a reclassiication (local function) and a region group (zonal function).
The sequence of operations was performed to explore the capacity of enhancement of the
cells in the tear limits, and the homogeneity of the cells in the interior of the tear.
The three bands of the image (RGB) were imported as individual raster layers, and
multiplied, originating a new single-band raster layer with 461 columns per 633 lines. For
estudos de conservação e restauro | nº 1
16
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
it, the application of a scheme of graduated colours enhances the layer’s extreme values,
when compared to the original layer. The purpose of this step is to force lowest values
(represented in the most dark tones), which hypothetically depict the features to extract,
to move further in the scale limits, enabling an easier distinction of these cells from their
closest neighbour cells.
Focal functions were applied to the resulting layer (minimum, maximum, range, sum,
mean, standard deviation, variety, majority, minority and median statistics). The considered
neighbourhood was a circular window with a 3-cell radius. [igure 3].
igure 3 - Comparison between a focal function applied to the original image (below)
and to the multiplication of the three bands (above)
Some of these functions have the effect of smoothing the cell values and others enhance
the distinction between the tear cells and the adjacent zones. Being the goal of the process
the tear feature extraction, the enhancement functions appear to be a good intermediate
step. However, when each of the two zones (tear and non-tear) is individually observed,
these functions have the effect of augmenting the range of cell values, and delimitation
and identiication of the tear would be more dificult to execute. Considering this, the mean
focal function was chosen because it provided good results in achieving some homogeneity
of cell values inside the tear – useful for a later extraction of the tear shape – but did not
estudos de conservação e restauro | nº 1
17
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
jeopardize a noticeable distinction between tear and non-tear areas.
In the next step of the process a reclassiication to two classes (“tear” and “no-tear”) was
done [igure 4].
igure 4 - Dialog box of a classiication operation.
The reclassiication operation implies the attribution of different values to the cells, where
input values are replaced by new values according to a rule. Reclassiication is frequently
used to simplify or to modify the interpretation in raster data, grouping intervals or unique
values into different classiications - for instance, assigning a value of 1 for cells with values
from 1 to 50, assigning a value of 2 for cells from 51 to 100, and so on. In our case, a
classiication with two resulting classes, that is, the cutting value deines a threshold. The
threshold value for the reclassiication was tuned by empirical tests, being chosen a value
that established a clear distinction between tear and non-tear areas. Class 1 (“tear”) had
47.438 cells and class 2 (“non-tear”) had 244.375 cells. [igure 5].
igure 5 - Image reclassiied in two classes:
in violet, the “tear” cells; in green, the “non-tear” cells.
A signiicant amount of isolated class 1 cells (i.e., cells reclassiied as “tear” but with no
adjacent cells in the same class) appeared. To minimize this, an operation called boundary
estudos de conservação e restauro | nº 1
18
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
clean was performed in the sequence [igure 6].
igure 6 - After the operation boundary clean.
This operation is used mainly to move isolated cells to nearby cell groups with the same value
(ESRI, n/d). It uses irstly an expansion of the cells classiied as “tear” and subsequently a
retraction: initially, “tear” cells invade their neighbour “non-tear” cells in all eight directions
and change their values. Next, a shrinking of the “tear” cells is done. So, any cells that
are not interior, i.e., that have at least one of the eight nearest neighbours with a different
value, may be substituted. This results in class 1 (“tear”) having 46.170 cells and class 2
(“non-tear”) 245.643 cells.
The next operation is called region grouping. Regions, which may also be called “patches”,
are deined as contiguous zones, i.e., contiguous group of cells with the same value. The
identiication of regions is a zonal function that produces a new data layer, where each
region is assigned a unique code. If available, the count of the number of cells for each
region provides an estimation of its area [igure 7].
igure 7 - Result of region group:
each identiied region is displayed with a different colour.
estudos de conservação e restauro | nº 1
19
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
The inal step is a selection of the regions that match the tear, which is done manually. Six
regions were identiied. The number of cells in each region is displayed in [table 1].
ObjectID
Value
Count
24
25
543
31
32
17442
43
44
235
44
45
127
84
85
161
87
88
243
table 1 - Number cells in the six regions that matched the tear.
After this last operation, it is possible to identify and to select (using a minimum area
threshold) the region associated to the tear [igure 8].
igure 8 - The inal area identiied as “tear”.
We can recall the set of applied proceedings as a neighbourhood statistic local and focal
function (mean; a reclassiication on two classes; a boundary clean operation; a region
grouping and a selection of the regions that have at least a speciied area.
estudos de conservação e restauro | nº 1
20
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
4.5. Results and discussion
According to the statistical function being used, a better or worst outline enhancement
occurs. The application of these operations contributes to a better characterization
performance of the pathology area, when compared with the absence of a focal function in
the process sequence. Reclassiication is a fundamental step in the process, and the ideal
cutting value is usually extracted with tests (thus, a training phase is recommended). When
segmentation is an objective, the boundary clean operation can be used to simplify the
“transition pixels” of the cell regions. It demands, from the operator, a subjective recognition
of the analysed item, in order to check which is the largest possible achievable accuracy
using several threshold values. After the region group operation, and the extraction of all
the areas, it was possible to get the quantitative characteristics (area, perimeter, thickness
and other geometric properties) of the tear shape.
The set of applied operations demonstrates a process to execute a two-class segmentation
with raster basic operations. However, after this experience, the choice of a threshold
value in the reclassiication appears to be the bottleneck of the sequence, because of its
dependency on the operator expertise and on the light parameters of the photographic
images. This demonstrates the application of the process in feature extraction for the study
of pathologies in Cultural Heritage, but requires an adequate assessment of the results in
each intermediate state.
5. Concluding remarks
With the use of basic raster spatial analysis operations it was possible to segment tear-type
pathology in an easel painting.
The subjectivity of some parts of the process, and the dependency on expert operators to
tune the parameters in some of the used functions, make us believe that it not predictable
that an error-free fully-automated segmentation process is achievable. However, the
process provided good results with a careful and meaningful tuning of the parameters. The
choice of the best parameters and their values is a ield to explore further.
References
ABAS, Fazly (2004). Analysis of craquelure patterns for content-based retrieval. PhD thesis.
Southampton: Faculty of Engineering, Science and Mathematics School of Electronics and
Computer Science.
BURROUGH, Peter and McDONELL, Rachael (1998). Principles of Geographical Information
Systems. Spatial Information Systems and Geostatistics. Oxford: Oxford University Press.
ESRI (n/d). «Your online technical resource». In ESRI Suport Center [access:24.3.2009].
http://support.esri.com/
estudos de conservação e restauro | nº 1
21
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
HENRIQUES, Frederico; GONÇALVES, Alexandre; CALVO, Ana and BAILÃO, Ana. A lacuna
pictórica – Metodologias de interpretação e análise. In: Pedra e Cal, Ano XI. Abril- Junho,
42 (2009), pp. 13-15.
LERMA, José Luis (2001). Automatic feature recognition technique on stone monuments
using visible and IR photography. In Proceedings International Cultural Heritage Informatics
Meeting. 2. New York: Russell Sage, pp. 255-258.
LERMA, José Luis. Automatic plotting of architectural facades with multispectral images.
In: Journal of Surveying Engineering, Vol. 131, 3 (2005), pp. 73-77.
LIU, Jianming; LU, Dongming (2008). Knowledge Based Lacunas Detection and
Segmentation for Ancient Paintings. In VSMM 2007, LNCS; Vol. 4820. Berlin, Heidelberg:
Springer-Verlag. pp.121–131.
MASS, Jennifer; HUANG, Jo-Fan; FISKE, Betty; SHAFTEL, Ann; ZHANG, Xian; LAURSEN,
Richard; Shimoda, COURTNEY; MATSEN, Catherine and BISULCA, Christina (2008). Thangka
production in the 18th–21st centuries: documenting the introduction of nontraditional
materials into Tibetan painting practice. In ICOM-CC 15th Triennial Meeting New Delhi,
India, September 22-26; Vol. II. New York: Russell Sage. p.661.
MOHEN, Jean-Pierre; MENU, Michel and MOTTIN, Bruno (2006). Mona Lisa – Inside the
Painting. New York: Abrams, p.98.
PIRES, Hugo; MARQUES, Patrícia; HENRIQUES, Frederico; OLIVEIRA, Ricardo (2007).
Integrating laser scanning, multispectral imagery and GIS in C&R documentation practices:
A irst approach using two XVI century wood paintings from Convento de Cristo in Tomar».
In XXI International CIPA Symposium, 01-06 October 2007, Athens, Greece. [access:
04.03.2009] http://cipa.icomos.org/ileadmin/papers/Athens2007/FP118.pdf
Acknowledgments
The authors thank Zarco Antiquities, Lda. the permission in using the thangka images, and
Prof. Ana Calvo for the discussions and support.
This work has been supported by “Fundação para a Ciência e a Tecnologia” and “Programa
Operacional Ciência e Inovação 2010” (POCI 2010), co-funded by the Portuguese
Government and European Union by FEDER Program. This research was also supported in
part by “Fundação para a Ciência e a Tecnologia” training grant SFRH / BD / 42488 / 2007.
Biographical notes
Frederico Henriques - Doutorando de Conservação de Pintura na Universidade Católica
Portuguesa (UCP); Licenciado em Conservação e Restauro no Instituto Politécnico de Tomar
(IPT); Bacharel na Escola Superior de Conservação e Restauro (ESCR); e-mail: frederico.
painting.conservator@gmail.com
estudos de conservação e restauro | nº 1
22
Tear feature extraction with spacial analysis: A thangka case study
Frederico Henriques, Alexandra Gonçalves, Ana Bailão
Alexandre Gonçalves - Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Civil e Arquitectura
do Instituto Superior Técnico (IST); e-mail: alexg@civil.ist.utl.pt
Ana Bailão - Pós-graduação no curso Conservação e Técnicas de Pintura, na Escola das
Artes da Universidade Católica Portuguesa (UCP); Licenciada em Conservação e Restauro
pelo Instituto Politécnico de Tomar (IPT); e-mail: ana.bailao@gmail.com
estudos de conservação e restauro | nº 1
23
Colecção Manuel de Brito
Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Resumo
A intenção de desenvolver um projecto na área da arte portuguesa moderna / contemporânea
resultou na dissertação do Mestrado em Técnicas e Conservação de Pintura, da Universidade
Católica Portuguesa. A documentação e o registo das obras são uma forma de conservação
e uma ferramenta de trabalho e de segurança para os museus. Dar um contributo concreto
para a salvaguarda de uma colecção relevante em Portugal, consagrando a aplicabilidade
da investigação, foi o objectivo deste trabalho. Assim, elaborou-se o inventário do núcleo
da Colecção Manuel de Brito, afecto ao Centro de Arte, em Algés, fazendo uma avaliação
do seu estado de conservação.
Palavras-chave
Colecção, conservação, inventário, Manuel de Brito, técnicas, materiais.
Abstract
Our master thesis carried out in the Portuguese Catholic University about conservation
and painting techniques came to light from our intention of developing a project in the
area of modern and contemporary art. Nowdays, museums consider the documentation
and registration of artwork a useful tool towards its conservation and safety. The Manuel
Brito painting collection managed by Centro de Arte in Algés is a very important one in the
context of Portuguese contemporary art. Our main objective was to give a contribution in
order its safeguard considering the possibility of an applied research. Accordingly, we made
the collection’s inventory and the evaluation of its conservation condition.
Keywords
Collection, conservation, inventory, Manuel Brito, techniques, materials.
Resumen
La intención de desarrollar un proyecto en el área de arte portugués moderno/contemporáneo
dio lugar a una tesis de Mestrado em Técnicas e Conservação de Pintura, en la Universidad
Católica Portuguesa. La documentación y registro de las obras constituyen formas de
conservación y una herramienta de trabajo así como de seguridad para los museos. Ofrecer
una contribución concreta para la salvaguarda de una colección relevante en Portugal,
airmando la aplicabilidad de la investigación, fue el objetivo de este trabajo. Se elaboró el
inventario del núcleo de la Colección Manuel de Brito, vinculado al Centro de Arte en Algés,
estudos de conservação e restauro | nº 1
24
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
haciendo una evaluación de su estado de conservación.
Palabras clave
Colección, conservación, inventario, Manuel de Brito, técnicas, materiales.
Introdução
Ao longo de quatro décadas Manuel de Brito, através da Galeria 111, constituiu uma
colecção onde estão representados praticamente todos os artistas que expuseram na sua
galeria, tendo o galerista sido fundamental não apenas na sedimentação de um mercado
de arte nacional, mas também na revelação de novos artistas e no incentivo de uma
crescente aproximação entre estes e o público.
A colecção Manuel de Brito ilustra grande parte da produção artística portuguesa do século
XX, abrangendo obras desde 1914 até à actualidade. Iniciada com a aquisição de uma
peça de Joaquim Bravo, está estimada em mais de trezentas obras de alguns dos mais
importantes artistas nacionais, como Eduardo Batarda, António Dacosta, José Escada,
Eduardo Luiz, Jorge Martins, Menez, Graça Morais, António Palolo, Costa Pinheiro, Júlio
Pomar, Paula Rego, Ana Vidigal e Fátima Mendonça.
No âmbito de um protocolo assinado entre a Câmara Municipal de Oeiras e os herdeiros de
Manuel de Brito, actuais proprietários da colecção, icou acordado que parte desta - núcleo
representativo que engloba 260 obras, unicamente portuguesas - seria cedida à autarquia,
em regime de comodato, por um período de onze anos. No dia 29 de Novembro de 2006
foi inaugurado o Centro de Arte Manuel de Brito (CAMB) que tem como objectivo promover
a divulgação e o estudo da colecção.
Até à celebração deste protocolo, a importante colecção apenas havia sido objecto de
apresentações pontuais e temporárias, não havendo qualquer publicação ou estudo mais
abrangente acerca deste conjunto de obras. Exposta pela primeira vez em 1994, no Museu
do Chiado, no âmbito de Lisboa – Capital Europeia da Cultura, esta colecção nunca se
ixou num espaço permanente, próprio e adequado, de forma a poder ser usufruída pelo
público1.
Existindo apenas uma simples lista geral das obras da colecção considerou – se necessário,
para estruturar devidamente a actividade do Centro, elaborar um inventário mais
desenvolvido, visando o conhecimento do acervo, nomeadamente o estado de conservação,
os materiais e os mecanismos de deterioração, o seu percurso e as condições em que se
mantiveram as obras que o constituem.
1 Desta exposição surgiu o catálogo Colecção Manuel de Brito. Imagens da Arte Portuguesa do século XX, o
único existente, onde se mostram três vastos núcleos pertencentes à colecção.
estudos de conservação e restauro | nº 1
25
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Aspectos do panorama artístico português – Anos 50 e 60
É nos anos 60 que entre nós surgem as galerias comerciais privadas e os marchands
proissionais, estes desempenharam, ao longo da última metade do século XX, um papel
importante no fortalecimento e desenvolvimento da circulação e promoção da arte moderna
e contemporânea. É com o seu trabalho que aos poucos os artistas vão sendo reconhecidos
e assim vão criar um espaço de legitimação da sua obra. Em 64 abre a Galeria 111,
inicialmente ligada ao comércio do livro. Dirigida por Manuel de Brito, conseguiu ultrapassar
as diiculdades inanceiras através do seu sucesso comercial contribuindo decisivamente
para o desenvolvimento e consolidação do que já começava a ser um mercado de arte.
Manuel de Brito, pessoa singular e determinante no cenário artístico português, não só
como galerista mas também como coleccionador, nascera num meio humilde, educado pela
mãe, técnica de gravura que, desde cedo, lhe terá proporcionado uma maior proximidade
com o meio artístico. Começa a trabalhar ainda jovem, estudando à noite. O seu emprego
na Livraria Progresso, no Campo Grande, aproxima-o ainda mais dos artistas e do próprio
ambiente artístico e cultural da época.
É a partir da galeria que Manuel de Brito forma a sua colecção, hoje, um documento valioso
para a história moderna e contemporânea das artes plásticas em Portugal. A importância
e dimensão do seu acervo deve-se à sua actividade como galerista, tendo tido o privilégio
de contactar directamente com os artistas e com as suas obras. A diiculdade que estes
tinham em vender e a existência de uma maior oferta em relação à procura facilitou a
aquisição das obras, muitas vezes compradas no encerramento das exposições realizadas.
Inventário
A documentação como forma de memória, de identidade, de testemunho, de registo e
de conservação foram conceitos base que enquadraram o inventário realizado (MACEDO,
2008:357). Partindo-se das normas estabelecidas pelo Instituto Português de Museus2,
o inventário foi adaptado ao tipo de peças existentes no acervo. Foi apresentada uma
icha tipo para esta colecção, abordando-se a importância e as funções práticas de um
inventário, assim como os problemas que surgiram no preenchimento de determinados
campos das ichas. Este permitiu fazer o levantamento do estado de conservação da
colecção, um historial da obra e um registo manuscrito e fotográico (frente e verso) de
cada peça (Fig.1). Daqui resultou uma relação exaustiva dos bens culturais que constituem
o acervo próprio do CAMB, visando a identiicação e a individualização de cada obra e
integrando a respectiva documentação, de acordo com as normas técnicas mais adequadas
à sua natureza e características (Art.17º, 2004:5381). Por questões relacionadas com os
2 Existe um esforço de normalização nas normas estabelecidas pelo Instituto Português de Museus através
da designação de nomenclaturas e de glossários, mas que se veriica incompleto para a arte contemporânea,
nomeadamente nas descrições técnicas e de composição dos materiais ou na descrição da apresentação da
obra.
estudos de conservação e restauro | nº 1
26
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
objectivos deste trabalho e por se ter veriicado uma grave lacuna nestes dois campos e
até a inexistência, em algumas ichas de inventário, de outras instituições3, consultadas,
de uma descrição pormenorizada do estado de conservação, deu-se maior relevância à
parte da conservação e da informação técnica de cada peça.
Foram inventariadas 156 obras durante as exposições realizadas no CAMB. Tentou-se, em
cada icha de inventário, fazer um registo das exposições em que cada obra participou, das
condições de apresentação, se foi o caso disso, bibliograia, registo fotográico (frente e
verso e de pormenores) (Fig.2), procurou-se descrever, com a máxima precisão, as técnicas
e materiais utilizados, tendo sido esta uma informação importantíssima no levantamento
e compreensão do estado de conservação de cada obra. Veriicou-se que existem alguns
campos que necessitariam de ser desenvolvidos e completados, como o “Historial da obra”
e a “Bibliograia”, assim como a “Categoria” e o “Estilo/Movimento”, onde existiu alguma
diiculdade em inserir determinadas obras em certas categorias e estilos. Na primeira porque
a arte contemporânea é particularmente avessa ao respeito pelas “categorias” tradicionais
da prática artística e no segundo, por estar associado ao estudo de épocas passadas,
apresenta uma diiculdade crescente de aplicação às práticas da contemporaneidade que,
permanentemente, desaiam as categorias estabelecidas, em que os artistas deixaram de
ser formados em academias em que se seguiam regras, procedimentos e princípios válidos
para todos. O facto de não existir qualquer tipo de icha técnica ou de documentação
referente às obras também não facilitou, em alguns casos, a determinação da datação e
da técnica, que só à vista desarmada foi uma tarefa que se revelou complicada e onde
surgiram algumas dúvidas, sendo aqui importante o testemunho dos artistas4 ou o recurso
a métodos de exame e análise para conirmar as técnicas aplicadas.
O inventário de uma colecção também se aigura como um instrumento de suporte aos
momentos em que a obra é exposta. No caso da arte contemporânea, nas obras como
instalações, vídeo ou objectos, o registo do ambiente que o artista pretende criar constitui
um factor relevante na fruição e compreensão da obra de arte. Sentiu-se uma lacuna
a nível da documentação relacionada com a disposição física e apresentação pública de
algumas obras, particularmente as que requerem instalações especíicas, sendo este um
elemento relevante para apoiar a exposição das mesmas, já que nem sempre a presença ou
a colaboração dos artistas é viável. Deste modo, é aconselhável fazer um registo rigoroso,
acompanhado por fotograias e planos, da montagem da peça para a exposição.
3 Foram contactadas instituições culturais de referência, como o Centro de Arte Moderna José de Azeredo
Perdigão, a Fundação Arpad Szenes – Vieira da Silva e o Museu Nacional de Arte Contemporânea - Museu do
Chiado, de modo a perceber que tipo de inventário é usado e estabelecer o melhor modelo para o conjunto de
obras pertencentes à Colecção Manuel de Brito
4 «Veriicámos também que o levantamento rigoroso dos materiais utilizados por cada artista, no âmbito
das entrevistas, não é exequível ou iável, (…) ao im de alguns anos os autores raramente se lembram com
rigor dos materiais que utilizaram.» - cf. MACEDO, Rita – Desaios da Arte Contemporânea à Conservação e
Restauro. Documentar a Arte Portuguesa dos anos 60/70. 2008. 2 vols., 399 f, 279 f. Tese de Doutoramento
apresentada à Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, 2008, p.362.
estudos de conservação e restauro | nº 1
27
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Conseguiu-se assim criar uma ferramenta de trabalho essencial no dia-a-dia do CAMB,
elaborando-se um inventário despretensioso e aberto a alterações e a um desenvolvimento
mais profundo. A possibilidade de informatização das ichas de inventário, irá permitir
armazenar a informação de uma maneira muito mais lexível do que num sistema manual,
para além de proporcionar uma série de meios como, por exemplo, a fácil localização das
peças ou de facilitar correcções e actualizações. Outro aspecto importante é o facto das
ichas de inventário poderem servir de base para o chamado condition report, o registo
exacto e informativo do estado de conservação da obra à entrada do museu. Com a
rotatividade das exposições, a movimentação e manuseamento destas obras é constante,
daí que um bom registo da condição do objecto seja fundamental.
Materiais e Técnicas
O inventário da colecção permitiu seguir a própria evolução da arte no século XX, bem
como as suas novidades e permanências, nomeadamente do ponto de vista dos materiais
e das técnicas. No contexto português as mudanças dão-se mais lentamente, não havendo
alterações signiicativas nas matérias utilizadas pelos artistas portugueses até aos anos
50/605. A partir desta década, e tomando como exemplo as obras pertencentes à Colecção
Manuel de Brito, passa-se de uma pintura “tradicional” para uma pintura com colagens
«mesmo que dentro dos seus limites oicinais tradicionais, dá, em muitos casos, entrada a
materiais e técnicas diversas e opostas» (ÁVILA, 2007:2) (CAMB0006 - Homenagem a um
crítico, Eduardo Luiz) (Fig.3). Introduzem-se na matéria pictórica materiais não habituais,
como a areia (CAMB0098 - A pedido de uma senhora japonesa, António Dacosta) (Fig.4),
a folha de ouro (CAMB0079 - Sol e CAMB0078 - Tensão de Opostos, Eduardo Nery) (Fig.5),
o papel (CAMB0002 - Sem título, João Abel Manta) (Fig.6), o metal (CAMB0033 - Metro,
Júlio Pomar) (Fig.7) e objectos da vida quotidiana, como maços de cigarro (CAMB0022 Highlife, Rolando Sá Nogueira) (Fig.8), espelho (CAMB0073 - Tigre et tortues, Júlio Pomar)
(Fig.9), tecidos (CAMB0014 - A relíquia herética, Eduardo Luiz) (Fig.10), etc.
O plexiglas material de eleição da artista Lourdes Castro, utilizado nas suas “sombras”
(CAMB0040 - Sombra projectada de Christa Maar) (Fig.12), as chapas de metal e sistemas
mecânicos desenvolvidos por René Bertholo (CAMB0068 - Arc en ciel e CAMB0067 - Bateau
à quai II) (Fig.14) são exemplos da introdução de novos materiais industriais no âmbito da
pintura-objecto. Mário Cesariny fez experimentações técnicas, onde costumava sobrepor
camadas de tinta que depois friccionava, a im de misturar as cores de forma arbitrária
5 A Favrel Lisbonense, a companhia de materiais artísticos, foi a primeira a introduzir as tintas à base de
resinas sintéticas, em Portugal. «Até 1974 em Portugal, todos os materiais importados eram extremamente
caros, e isto era uma das razões para que os produtos da Favrel fosse tão popular entre os artistas
portugueses» - cf. FERREIRA, Joana Lia; [et al] – Eternity is in love with the productions of time: Joaquim
Rodrigo’s classical palette in a vinyl synthetic medium. In LEARNER, Thomas J.S.; [et al] – Modern Paints
Uncovered. Los Angeles: The Getty Conservation Institute, 2007, p.43.
estudos de conservação e restauro | nº 1
28
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
e às quais, por vezes, juntava café e vernizes industriais6, O mago (CAMB0067) (Fig.11)
parece ser um exemplo disto. Obras mais recentes, do inicio do século XXI, mostram como
a experimentação de materiais do quotidiano é levada ao extremo, estes são trazidos para
o campo das artes com funções estéticas (CAMB0115 - Mar Salgado – escultura em sal,
João Pedro Vale) (Fig.15).
A maioria das obras inventariadas segue o formato da pintura, podendo depois variar
a técnica e os materiais. O óleo continua a ser o aglutinante mais usado, visto que, no
panorama português, a introdução e o uso de novos materiais deu-se mais lentamente.
São também usados o acrílico, o pastel, a aguarela e a tinta-da-china. O suporte mais
utilizado é a tela, seguida pelo papel que deixa de ter uma atribuição secundária.
A madeira é substituída pelos seus derivados – platex e contraplacado. As técnicas e
os estilos tradicionais mantêm-se, mas com a introdução de novos materiais, como os
produtos sintéticos e comerciais, cuja composição, processos de envelhecimento ou o seu
comportamento perante a presença e a combinação de materiais de natureza oposta, é um
dos principais problemas da conservação da arte moderna e contemporânea.
Estado de Conservação
Foram analisados os diferentes problemas de conservação que este tipo de obras de arte,
da segunda metade do século XX, levanta em relação à arte antiga, quer pelo uso de
diversos materiais quer pelo uso de novas técnicas. Ao contrário do que se poderia pensar,
mais de metade das obras inventariadas apresentam-se em bom estado de conservação,
ou seja, a peça não exibe problemas de conservação, os seus materiais estão estáveis, mas
exibem algumas lacunas e/ou deformações - quer seja do suporte, quer seja da matéria -,
estalados mecânicos, produtos de corrosão, intervenções de restauro e/ou ataque biológico
(excrementos de mosca, fungos ou insectos xilófagos), tudo o que constitua uma alteração
à sua forma original. Exemplo é a pintura CAMB0010 - Le bilboquet de Eduardo Luiz
(Fig.13), cuja camada pictórica apresenta-se estável e com uma boa adesão ao suporte,
no entanto, a tela apresenta deformações convexas nos quatro cantos e um estalado
circular do lado esquerdo, sobre a camada pictórica preta, que parece ter sido originado
por impacto.
As restantes obras apresentam-se em muito bom estado de conservação, o que signiica
que o seu estado actual corresponde a uma aproximação, quase total, do seu estado
original. “Quase total” porque a obra desde o momento da sua criação está, inevitavelmente,
vulnerável à alteração física, no entanto não mostra problemas de conservação. No caso das
pinturas, a camada pictórica apresenta-se estável e sem lacunas e com uma boa adesão ao
suporte, embora possa exibir estalados prematuros ou de secagem e de envelhecimento.
6 TCHEN, Adelaide Ginga – Mário Cesariny (1923). CAMJAP: Centro de Arte Moderna José de Azeredo
Perdigão. [consulta: 10.09.2008] http://www.camjap.gulbenkian.pt/l1/ar%7BD2B27546-03B0-4185-A5F80B5ACC3E203C%7D/c%7B9a7cb829-47b5-4285-8fca-aa1740d9dc79%7D/m1/T1.aspx
estudos de conservação e restauro | nº 1
29
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Desde que estes não provoquem o perigo de destacamento ou levantamento da camada e
não constituam um risco para o seu estado de conservação, fazem parte do seu processo
de envelhecimento e são intrínsecos à obra. Por exemplo, a pintura CAMB0001 - O mago
de Mário Cesariny (Fig.11) apresenta uma boa adesão das camadas pictóricas e o suporte
estável, ao centro da pintura, é possível observar um estalado pontual que penetra a
camada pictórica branca. Provavelmente, foi causado pela sobreposição de camadas, a
camada inferior não estava completamente seca quando a camada superior foi aplicada.
Contudo, do conjunto observado identiicaram-se algumas obras em estado regular, estas
exibem lacunas e/ou faltas de suporte e/ou de matéria e necessitam de uma intervenção
de conservação e/ou restauro. Exemplo disto, é a obra CAMB0028 - Le jardin de Maria
Vieira da Silva, exibe estalados que estão a provocar o levantamento da camada pictórica
e a camada pictórica branca apresenta pouca adesão à camada inferior, estando em perigo
de destacamento (Fig.2). O sistema mecânico da obra CAMB0068 – Arc en Ciel de René
Bertholo (Fig.14) não funciona, a peça liga mas não há qualquer movimento, sendo este
«imprescindível para uma correcta leitura do objecto e respeito da intenção artística original»
(MACEDO, 2008:320). O sal colado à superfície da escultura CAMB0115 - Mar salgado de
João Pedro Vale (Fig.15) apresenta-se estável, contudo são visíveis destacamentos e faltas
em alguns pontos mais expostos e salientes da peça (zonas mais sujeitas a factores de
deterioração) acompanhadas por zonas de risco de perda de sal, causadas, provavelmente,
pelo seu transporte e manuseamento. A obra não deve ser transportada e/ou movimentada
e sobretudo deve-se evitar, sempre que possível, o seu manuseamento, uma vez que o sal
se destaca facilmente da superfície da peça.
Tendo como base o inventário realizado, o levantamento dos materiais e técnicas utilizados
e os tipos de alterações/danos que as obras apresentavam, procurámos deinir medidas de
conservação preventiva e curativa, tal como, a ixação da camada pictórica em destacamento,
para evitar a sua possível perda, sobretudo durante o seu transporte e manuseamento, tal
como a veriicação de grades e de cunhas para eliminar as deformações da tela, a remoção
dos sistemas de suspensão que estão no verso das obras e não têm qualquer função ou
remover os pequenos excrementos de mosca.
Transporte e manuseamento
Uma vez que o Centro não tem uma exposição permanente, a colecção é apresentada com
mostras rotativas que focam artistas, épocas ou núcleos, as peças estão permanentemente
em trânsito, podendo a sua embalagem e transporte ser prejudiciais à sua preservação,
uma vez que estes podem expor os objectos a um ambiente menos controlado, como
elevados níveis de luz, pó, poluentes e risco de infestações, stress mecânico e estrutural
devido ao movimento, vibração e mudanças de ambiente.
Foram acompanhadas a desmontagem da exposição Anos 70. António Dacosta - Exposição
antológica e a montagem da exposição À Volta do Papel. 100 Artistas, com o intuito de
estudos de conservação e restauro | nº 1
30
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
perceber como todo este processo se desenrola e qual a sua importância do ponto de vista
da conservação das obras, uma vez que toda a sequência de movimento que implique
a saída exterior de uma obra é um factor de risco para o seu estado de conservação
(ROTAECHE GONZÁLEZ de UBIETA, 2007:51).
Ao contrário do que se crê, a maior taxa de incidentes dá-se precisamente nos momentos
que parecem ser os menos perigosos, como por exemplo a desembalagem ou o transporte
manual no interior do museu. Esta é a razão principal para que o movimento de obras deve
ser sempre acompanhado e supervisionado por um conservador responsável. No entanto,
deve-se salientar que, normalmente, a taxa de incidente é baixa devido à experiência de
todos os proissionais envolvidos.
Embalagens de boa qualidade, o transporte disponível, o manuseamento cuidado seguindo
as regras recomendadas, uma boa preparação para a exposição e uma simples protecção
do verso podem prevenir o dano mecânico de pinturas frágeis (BOOTH, 1989). Isto requer
diligência, recursos, planos e pessoal adequado. A manipulação e transporte constituem,
por isso, um factor fundamental na conservação preventiva. A cada exposição feita é
importante considerar se o estado de conservação de cada obra permite que esta seja
exposta e a viabilidade do seu transporte, daí a importância de um conservador-restaurador
no acompanhamento deste processo.
Condições ambiente
Avaliar as condições ambiente do edifício que acolhe esta colecção e das reservas da
galeria, local onde as obras passam a maior parte do tempo, foi também um objectivo
deste estudo. Havendo a possibilidade do Engº Luís Elias Casanovas poder disponibilizar
o seu termohigrógrafo para o registo da humidade relativa e da temperatura nas reservas
da galeria, foi realizado um estudo comparativo com os dados do CAMB, fazendo-se um
registo anual destes parâmetros.
Mais do que alcançar os valores “mágicos” de humidade relativa e de temperatura, é
importante alcançar a estabilidade, ixando os valores mínimos e máximos que se considerem
aceitáveis tendo como base o passado desta colecção - «Quanto pior for o passado, melhor
será o futuro» (MICHALSKI, 2008), incorporando-a na realidade museológica dos objectos,
do edifício e do público.
Até porque tem-se veriicado a impossibilidade de alcançar dentro do edifício valores tão
rígidos (20ºC ±2 e 50% ±5) e porque os objectos vêm de um ambiente não controlado
(mas estável). O mais importante não é tanto o intervalo de lutuação, mas sim manter
sempre as peças num ambiente constante, sobretudo sem alterações bruscas (HERNÁNDEZ
HERNÁNDEZ, 2001:234). É essencial mudar a mentalidade em relação a este assunto e
continuar avaliar os dados registados para se poder fazer um estudo mais sério e profundo.
estudos de conservação e restauro | nº 1
31
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Conclusão
A necessidade de elaboração de um estudo sério da Colecção Manuel de Brito, um dos mais
importantes núcleos da arte portuguesa do século XX, que promovesse o seu conhecimento
não só em termos históricos, mas também em termos da conservação, foi o motivo desta
dissertação, assim como a necessidade de elaboração de um inventário, ferramenta
fundamental no funcionamento de uma instituição cultural que tem como acervo esta
valiosa colecção.
A dissertação realizada constitui um estudo ainda em aberto. Não é o inal, é apenas o início,
o ponto de partida de um aprofundamento de uma série de sugestões, de recomendações
e de pistas de trabalho que importará veriicar no decurso da normal actividade do Centro
de Arte, no sentido de as consolidar e validar ou, pelo contrário, no sentido de as renovar
em função de novos problemas detectados e das necessidades entretanto surgidas.
Procurou-se realizar este estudo sob um ponto de vista prático e real, sendo a premissa
principal o desenvolvimento de um instrumento prático, mais do que teórico. Este será
provavelmente, o melhor modo de aplicar esta dissertação, numa abordagem dinâmica
que a relação entre teoria e prática exige. Tendo sempre em mente que as obras de arte de
uma colecção, únicas e insubstituíveis, fazem parte da nossa herança cultural e, por isso,
a sua preservação para a posteridade é de extrema importância.
Referências
Art.17º Elementos do inventário museológico. In Lei-Quadro dos Museus Portugueses n.º
47/2004. D.R. I Série – A. 195 (19/08/2004).
ÁVILA, María Jesús. A conservação da arte contemporânea: um novo desaio para os
museus. In: APHA. Boletim. 5 (2007), pp.1-9.
BOOTH, Peter. Stretcher design: problems and solutions. In: The Conservator. 13 (1989),
pp.31-40.
MACEDO, Rita (2008). Desaios da Arte Contemporânea à Conservação e Restauro.
Documentar a Arte Portuguesa dos anos 60/70. 2 vols., 399 f, 279 f. Tese de Doutoramento
apresentada à Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.
MICHALSKI, Stefan. «As condições ambiente ideais, a gestão de riscos, um capítulo do
Manual da ASHRAE – American Society of Heating and Air Conditioning Engineers, as
lutuações comprovadas e por im um modelo integrado de análise de riscos». [consulta:
20.05.2008] http://si.artes.ucp.pt/citar/en/areas/02/results.php
HERNÁNDEZ HERNÁNDEZ, Francisca (2001). Manual de Museologia. Madrid: Editorial
Síntesis.
ROTAECHE GONZÁLEZ de UBIETA, Mikel (2007). Transporte, depósito y manipulación de
obras de arte. Madrid: Editorial Síntesis.
estudos de conservação e restauro | nº 1
32
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Nota biográica
Soia Gomes - formada em Conservação e Restauro pela Faculdade de Ciências e Tecnologia
da Universidade Nova de Lisboa, com um estágio curricular na área de pintura de cavalete,
realizado no Instituto Português de Conservação e Restauro. Entre 2006 e 2008 colaborou
num Ateliê de conservação e restauro de pintura.
Em 2007 iniciou o Mestrado em Técnicas e Conservação de Pintura, da Escola das Arte da
Universidade Católica Portuguesa – Centro Regional do Porto, aguardando neste momento
a data da defesa da dissertação.
Anexo
CAMB0028G1
CAMB0028G2
Nº de inventário - CAMB0028
Título - Le jardin
Autor - Maria Vieira da Silva
1.
Identiicação da obra
1.2.
Nº de inventário – CAMB0028;
1.1.
1.3.
1.4.
1.5.
1.6.
Título – Le jardin;
Dimensões (Max., s/moldura) – 62 x 92 cm;
Área - Arte portuguesa;
Categoria – Pintura;
Descrição – Pintura rectangular, inserida numa moldura preta, rectangular,
de madeira com passepartout em tecido bege. Composição abstracta, com leitura na
horizontal. Repetição (não muito rígida e rigorosa) de formas geométricas quadradas,
rectangulares e de linhas quebradas por manchas de cor (preto, azul, verde e cinzento).
A junção destes elementos forma uma composição “labiríntica” pintada em tons de preto,
cinzento, branco, roxo, azul, verde e apontamentos de vermelho, expandida por toda a
superfície;
estudos de conservação e restauro | nº 1
33
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
1.7.
Inscrições – No verso existem cinco etiquetas: “160”, “Manuel de Brito, Dafundo”,
“Campo Grande”, “N05” e “Expomus – Exposição Colecção Manuel de Brito, Nº da obra
061, Caixa: 11 B, Artista: Maria Helena Vieira da Silva, Título: Le Jardin, Data: 1960,
Dimensão (cm): 65 x 92, Técnica: óleo sobre tela” (sobre a grade). Três inscrições
autógrafas: “IV 60”, “A-8968” e “Le jardin” (sobre a grade). E um carimbo ilegível no
canto inferior esquerdo da tela;
1.8.
1.9.
Propriedade – Herdeiros de Manuel de Brito;
Instituição – Centro de Arte Manuel de Brito (CAMB), Algés;
1.10. Observações –
2.
2.1.
2.2.
Produção
Autoria – Maria Helena Vieira da Silva (Lisboa, 1908- Paris, 1992);
Justiicação de Autor - Obra assinada. Assinatura a azul - “Vieira da Silva”.
Localizada no canto inferior esquerdo;
2.3.
Estilo/movimento – Abstraccionismo.
3.
Datação
2.4.
Observações -
3.1.
Século/ano – Século XX, 1960;
4.
Localização
3.2.
Justiicação da data – Data assinalada no verso da obra.
4.1.
Localização da obra – CAMB, piso 0, sala 0A;
4.2.
Data - 21/01/2008.
5.
Informação técnica
5.1.
Suporte – Tela assente numa grade de madeira ixa, com uma travessa vertical.
Constituída por um só pano, parece ser comercial devido ao carimbo (ilegível) no canto
inferior esquerdo. O ponto (sistema de cruzamento dos ios) é bastante fechado e do tipo
tafetá (ponto 1-1) – os ios da trama passam alternadamente, por cima e por baixo, dos
ios da teia;
5.2.
Matéria – Óleo;
5.4.
Observações – A obra está ixa à moldura por meio de três travessas verticais
5.3.
Técnica – Pintura a óleo sobre tela;
que estão ixas com parafusos às travessas verticais da grade. O sistema de suspensão é
constituído por dois camarões fechados colocados sobre a grade, unidos por um arame.
estudos de conservação e restauro | nº 1
34
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
6.
6.1.
6.2.
Conservação
Estado actual – Regular;
Descrição – A camada pictórica apresenta um estalado prematuro, recto e de
ruptura aberta e uniforme, das camadas superiores castanhas e pretas. Pontualmente,
existem pequenas lacunas da camada pictórica que são coincidentes com os estalados
existentes e acompanhadas por levantamentos da camada pictórica na área envolvente.
Estes estalados penetram em todas as camadas e são lineares, aleatórios, de ruptura
uniforme, os mais abertos estão a provocar o levantamento da camada pictórica
(branca, verde e azul e igura azul do lado inferior esquerdo). A camada pictórica
branca apresenta pouca adesão à camada inferior, estando em perigo de destacamento;
6.3.
Intervenções anteriores – Não existem;
6.5.
Observações –
6.4.
7.
7.1.
Pesquisa adicional –
Historial da obra
Exposições – Vieira da Silva - recent oil paintings. Nova Iorque, M. Knoedier and
Co., Inc. 1966, sem nº.
8.
Bibliograia
9.
Imagem
9.1.
9.2.
Nº de inventário Geral – CAMB0028G1-2;
Nº de inventário Pormenor – CAMB0028A1, CAMB0028T1-2, CAMB0028C1-6 e
CAMB0028I1-5;
9.3.
Tipo de imagem – JPEG;
9.5.
Autor - Soia Gomes e Carlos Alberto Santos.
9.4.
10.
Data – 21/01/2008;
Inventariantes
10.1. Inventariante – Soia Gomes;
10.2. Data – 21/01/2008.
estudos de conservação e restauro | nº 1
35
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
CAMB0028A1 (Assinatura)
CAMB0028C1 (Lacunas)
CAMB0028C2 (Lacunas)
CAMB0028C3 (Lacunas)
CAMB0028C4 (Lacunas)
CAMB0028C5 (Lacunas)
CAMB0028C6 (Levantamento da
camada pictórica)
CAMB0028T1
(Estalado prematuro)
CAMB0028T2
(Estalado prematuro)
CAMB0028|1 (Incrição/etiqueta)
CAMB0028|2 (Inscrição)
CAMB0028|3 (Etiqueta)
CAMB0028|4 (Carimbo)
CAMB0028|5(Inscrição)
estudos de conservação e restauro | nº 1
36
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Fig.3 - CAMB0006
Fig.4 - CAMB0098
Homengagem a um Crítico
A pedido de uma senhora japonesa
(fotograia de Carlos Santos)
Fig.5 - CAMB0079
Fig.6 - CAMB0002
Sol
(fotograia de Carlos Santos)
(fotograia de Carlos Santos)
Sem título
Fig.7 - CAMB0033
Fig.8 - CAMB0022
Metro
(fotograia de Carlos Santos)
(fotograia de Carlos Santos)
estudos de conservação e restauro | nº 1
Highlife
37
Colecção Manuel de Brito: Inventário e conservação. Problemas e perspectivas
Sofia Gomes
Fig.9 - CAMB0073
Fig.10 - CAMB0014
Tigre et tortues
(fotograia de Carlos Santos)
A relíquia herética
(fotograia de Carlos Santos)
Fig.11 - CAMB0067
Fig.12 - CAMB0040
Fig.13 - CAMB0010
O Mago
Sombra projectada de Christa Maar
(fotograia de Carlos Santos)
(fotograia de Carlos Santos)
(fotograia de Carlos Santos)
Le bilboquet
Fig.14 - CAMB0068
Fig.15 - CAMB0115
Arc en ciel
Mar Salgado
(fotograia de Carlos Santos)
estudos de conservação e restauro | nº 1
38
The Biochemistry and Artistic studies:
a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova,
Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
Abstract
The paper proposes a novel, integrated approach to the identiication and quantiication
of the organic binders, mainly proteinaceous, as the “invisible” component of polychrome
layers in artifacts belonging to movable and immovable cultural heritage. The analytical
methodology discussed here will demonstrate the signiicance and eficiency of biochemical
assays for the detection of organic binders and how these tests can improve/complement
the already existing techniques, while considering also the costs and time of analysis that
commonly limit their application in the current laboratory practice for artworks diagnosis.
Keywords
Biochemical analyses, organic binders, identiication and quantiication, works of art.
Resumo
Este artigo propõe uma abordagem nova e integrada para a identiicação e quantiicação
aglutinantes orgânicos, na sua maioria proteicos, como componentes invisíveis das camadas
policromadas dos objectos que integram o património móvel e imóvel. A discussão da
metodologia analítica que aqui se faz, demonstrará a importância da eicácia dos ensaios
bioquímicos na detecção de aglutinantes orgânicos e o modo como estes testes podem
ser melhorados e complementar as técnicas analíticas disponíveis, tendo em conta os
factores custo e tempo de realização das análises, em geral condicionantes que limitam a
sua aplicação na prática corrente do trabalho laboratorial de diagnóstico em obras de arte.
Palavras-chave
Análises bioquímicas, aglutinantes orgânicos, identiicação e quantiicação, obras de arte.
Resumen
Este trabajo propone una novedosa aproximación para la identiicación y cuantiicación de
los aglutinantes, fundamentalmente a base de proteínas, que forman capas “invisibles”
como componentes de la policromía en objetos muebles e inmuebles del patrimonio cultural.
La metodología analítica presentada demostrará la eiciencia de los ensayos bioquímicos
para la detección de aglutinantes orgánicos y cómo esos tests pueden complementar las
estudos de conservação e restauro | nº 1
39
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
técnicas ya existentes, incluso considerando también los costes y tiempo necesarios para
los análisis que normalmente limitan aquella posible aplicación en el diagnóstico de objetos
artísticos en la práctica habitual de laboratorio.
Palabras clave
Análisis bioquímicos, aglutinantes orgánicos, identiicación y cuantiicación, obras de arte.
Introduction
Conservation Science is a cross-bridging ield, in which disciplines such as Art History,
Artistic Studies, Chemistry, Biochemistry, Physics, contribute to further improve the
knowledge and practice for the conservation of Cultural Heritage. Polychrome works of
art typically present a complex history and composition, thus often requiring thorough
identiication of the constituent materials for the purpose of authentication [1-8] or before
any conservation intervention can be carried out. The analytical effort is particularly justiied
when the history of the art-object is not well known, or when past restoration interventions
are to be expected, as part of the anamnesis of the object. Knowledge obtained from the
study of artists’ materials and techniques contributes to our understanding of art history,
improves the decision making process of conservators and reveals compositional changes
of painting materials due to ageing, weathering and environmental factors [1-11]. In many
cases, conservation scientists are asked to help with the authentication of art-objects,
through the identiication of the constituent materials and their degree of ageing [2-3,
6-13]. Therefore, the identiication and quantiication of organic binders is a major step
in the study and authentication of polychrome artifacts, many times being crucial for
understanding and recognizing the existing historical, artistic and technical information.
The present article proposes an innovative complementary methodology useful for the
identiication and quantiication of proteinaceous binders and adhesives in polychrome
artifacts. Considering the analytical dificulties that conservation scientists encounter when
performing qualitative and quantitative analysis on organic paint materials, the paper aims
to underline the potential and beneits of combining traditional and innovative techniques
for an improved and accurate characterization of proteinaceous binders in polychrome artobjects from cultural heritage, showing some preliminary results obtained through the use
of biochemical assays and mass-spectroscopic analyses.
1. State-of-the-Art of Proteinaceous Binders Characterization
A paint sample is a very small multilayered fragment (less than 0.5 mg), with a complex
composition and structure, where the organic binder is present in quantities of 20% or less
[9-11].
estudos de conservação e restauro | nº 1
40
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
The identiication and quantiication of proteinaceous media in polychrome artworks is still
considered a dificult challenge for the conservation scientist because:
•
•
•
•
aged proteins are denaturated and scarcely soluble in water and organic solvents;
several organic substances or pollution contaminants may be simultaneously present in
the polychrome structure (especially if the objects undergone restoration interventions);
during ageing different degradation compounds can be formed,
a low protein content (at most 0.2 mg) is generally encountered in small heterogeneous
paint samples (of 1 mg or less).
Errors or contamination in phase of sampling organic materials can lead to erroneous
results or to their misinterpretation [9-12]. An important help in this preliminary phase
can be received by applying non invasive techniques (UV luorescence, IR relectography,
relectance spectroscopy, colorimetry), in order to be able to choose the right spot where
collecting materials [Fig. 1].
Figure 1 - Analytical techniques useful for sampling of polychrome artworks and
identiication of organic binders
estudos de conservação e restauro | nº 1
41
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
Many techniques can be applied for the identiication of paint constituents of polychrome
layers. Binding media analysis can be basically performed with chromatographic and
spectrometric techniques: Gas-Chromatography (GC), Pyrolysis-Gas Chromatography–
Mass
Spectrometry
(Py-GC/MS),
Liquid
Chromatography
(LC),
High
Performance
Liquid Chromatography (HPLC), paper and thin layer chromatography, Size Exclusion
Chromatography (SEC), Direct Temperature-Resolved Mass spectrometry (DTMS), Static
Secondary Ion Mass Spectrometry (SIMS), UV-Vis and Fourier Transformed Infrared
spectroscopy (FTIR), Imaging Spectroscopy (IS) etc. [13-30].
Major limitations are related with the inherently small sample size [1-2, 9-11] and quantity
(up to 500 µg) [2, 6, 9-10] or with the dificulty in re-solubilizing certain binding media (such
as “egg tempera”) once they have dried into the paint ilm [2, 11, 14-18]. In addition many
techniques imply sample deterioration during manipulation or preparation prior analysis
[1, 9, 14-19, 23-27, 29, 32-43]; dificulties in inding appropriate extraction conditions
of proteins from the binding medium without hydrolysis [9, 13-18]; and in developing
analytical methods closely adapted to the small sample amount (possibly in the NANOgram
order) [1, 9, 42].
As a general rule, natural organic binders are best identiied by a combination of two or
more different, but complementary techniques [1, 3-4, 9-11, 29, 40]. Traditional techniques
(microscopy, staining tests, spectroscopy, chromatography) have been employed with good
results since the ’30s, but in many cases the dedicated laboratories did not develop a real
methodology, with reduced costs and minimum losses of material [9-30]. Furthermore,
the precise quantiication of binders in complex mixtures was rarely achieved. Few
innovative techniques (MALDI-TOF-MS, immune-enzymatic assays) were reported lately
for identiication of natural binders, but further research still has to be done [31-45].
The proteinaceous binders have a similar emission of luorescence (around 440 nm)
therefore their identiication through UV luorescence mapping on the paint surface or in
cross-section is not fully and exclusively indicative; in exchange the pigments can give
speciic luorescence, the pigment being able to remove the binder’s luorescence [1, 19,
24, 39].
Since the ’30s, studies were developed regarding the application of staining tests to the
identiication of binders in cross-sections [1, 9, 19-24]. Microscopic staining techniques
allow cross-section examination but they lack speciicity, having been used to distinguish
between oil and protein binders since the early part of XXth century (Ostwald-1935,
Plesters-1956, Gay-1978, Johnson and Packard-1971, Masschelein-Kleiner-1986) [1,
19, 21, 24]. More recently, staining techniques have been proposed for detection of
natural resins and carbohydrates (Johnson and Packard-1971, Talbot-1982, Wolbers and
Landrey-1987, Messinger-1992) [1, 19, 22-23]. Other investigations were performed with
special microscopic techniques for the examination of cross-sections [9, 20, 22-23]. A new
estudos de conservação e restauro | nº 1
42
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
use of non-covalent luorescent dyes was also reported for mapping of proteins in the ield
of the microscopic characterization of paint materials within multilayered samples (cross-
sections) [46]. Micro-spectroluorimetric techniques were described as successful in the
identiication of organic binding media and varnishes on cross-sections of paint materials
[47-48], but further experiments are required for quantifying the luorescent radiation
emitted by complex mixtures of binders.
Fourier Transform Infrared (FTIR/micro-FTIR) and micro-Raman spectroscopy can
also provide important information [9-10, 13, 25-30]. FTIR and micro-FTIR are commonly
used to recognize the presence of proteinaceous materials in paint layers [1-4, 25-26,
29], but in case of complex mixtures the interpretation of the spectra may be extremely
arduous and the distinction between egg, glue, and milk proteins can be performed only in
few cases. The differentiation between “yolk tempera” and “mixed tempera” techniques is
still dificult, as in the case of “tempera grassa” to be distinguished from a “egg yolk paint”
as shown in Fig. 2 [3-4, 25].
Figure 2 - Comparison of the FTIR spectra of an “egg yolk tempera” and
a “mixed” technique (egg tempera and oil)
Furthermore, the presence of major proportions of inorganic matter such as paint extenders
and pigments as well as organic colorants, can make (micro-)FTIR and RAMAN detection
very dificult or even impossible [13, 26, 28].
The chromatographic techniques usually require time consuming sample pre-treatment
but can offer good information when mixtures of oils and proteins are present, although
there are several restrictions if mixtures of oil and egg are present [9, 14-17]. A protocol
estudos de conservação e restauro | nº 1
43
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
for a reliable chromatographic identiication of organic materials in artworks reports the
application of two analytical procedures on different aliquots of the same micro-sample
[15]. The use of PY silylation-GC/MS and GC/MS allows the recognition of markers, the
quantiication of some signiicant compounds useful for the identiication of binders in
samples and enables the study of degradation mechanisms of organic materials, for further
evaluating the conservation state of an artwork [14, 16].
Techniques developed for protein-peptide analysis in biological luids (proteomics)
could make an important contribution to the study of proteinaceous paint media and
their degradation processes [31-38]. Some papers lately reported successful attempts
for analysis of protein binders using Matrix-Assisted Laser Desorption/Ionization Time of
Flight Mass Spectrometry (MALDI-TOF-MS) [34]. In this technique, the protein or peptide
molecules are irst ionized after irradiation with laser beam, and then analyzed in a TOF
(time-of-light) analyzer [35]. The protein samples can be analyzed in linear or relector
mode. The linear mode is preferentially used for the analysis of proteinaceous molecules
having a molecular weight between 10 000 and 350 000 Da, while the relector mode is
normally used in the analysis of peptide fragments with a molecular weight up to 10 000
Da, resulting from enzymatic protein digestion [36]. Although the linear mode is more
sensitive than the relector mode due to physical constraints of the analyzer, the relector
mode provides higher resolution mass spectra. A recent paper indicates several steps of
extraction of proteins from a paint sample without hydrolysis [38], while another recent
article proposed a simple protocol for analysis of proteinaceous binders from 10 types of
paint ground layers, using trypsin digestion [33].
MALDI-TOF-MS/MS, referred as MALDI, is a well established technique for protein
identiication through Peptide Mass Fingerprint (PMF) or Peptide Fragment Fingerprint (PFF).
PMF combined with PFF provides a unique method for unambiguous protein identiication,
with some exclusive features: fast measurements, easy mass spectra interpretation and
simplicity in handling [36].
Immunological techniques have also been investigated, with promising results for the
identiication of proteinaceous binders in polychrome samples and paint cross-sections, but
for the moment their optimization is still far from being fully assessed [39-45]. Published
papers report the use of immunoluorescence techniques to identify the media of XVth–
XVIIIth century European paintings [43] and artiicially aged collagen paints [44]. A recent
paper proposes an optimized analytical protocol using Immuno-Fluorescence Microscopy
(IFM) for the identiication of markers of egg white and casein, respectively [39]. The
radio-immunoassay (RIA) or enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA) have been
proposed as alternative methods [39, 40, 42, 45]. An ELISA protocol was developed at
the Getty Conservation Institute for quick and simultaneous identiication of glues, casein,
plant gums etc. [39]. Antibody-based immunological approaches utilize the unique ability
of antibodies (Immunoglobulins, Ig = proteins produced by all animal immune systems
estudos de conservação e restauro | nº 1
44
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
in response to the presence of an antigen) to seek out and bind to speciic protein-rich
regions called epitopes (antigenic determinants) on the antigen’s molecule (foreign body
or substance that generates an immunological reaction - proteins, polysaccharides, nucleic
acids). The most powerful antigens (immunogens) are proteins (lipoproteins, glycoproteins)
and therefore the immunological techniques are mainly used in protein analysis.
Multivariate chemometric techniques of data handling are a precious tool to draw
information from large sets of chemical data. Although in conservation science they have
not yet attained diffusion comparable to other ields, a variety of multivariate criteria for
analysis have been proved extremely useful in the study of cultural heritage, using pattern
recognition and classiication models [12-13].
2.Proposal of an Integrates Methodology for the Identiication of Proteinaceous
Binders
The combined use of traditional and innovative analytical techniques, such as optical
microscopy, luorescent staining tests, colorimetry, spectroscopic techniques (relectance
spectroscopy, micro-FTIR/FTIR, micro-Raman), micro-spectroluorimetry, MALDI-TOF-
MS, IFM/ELISA, will lead to a new, integrated methodology for the identiication and
quantiication of the binders contained in polychrome layers [49-50] [Fig. 3].
Figure 3 - Scheme of the proposed analytical protocol: FING_BIND_PRINT
A large range of samples can be analyzed: pure proteins, natural binders, bought
from market (possibly bio-market) or provided by different companies (as commercial
formulations: e.g. isinglass), “mock samples” containing natural binders. The later will be
estudos de conservação e restauro | nº 1
45
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
made in laboratory, according to known, historical recipes and the proteinaceous binders
in micro-fragments taken from them will be analyzed and quantiied. Finally real samples
taken from works of art (from paintings, polychrome sculptures, selectively and accurately
chosen) will allow the validation of the entire experimental protocol.
The ancient treatises (as those written by Cennini, De Mayerne, Dionysos from Fourna,
Filipe Nunes etc.) [51-56] offer a huge variety of traditional recipes for creating paint
materials and therefore the standard samples (known as “mock samples”) will be prepared
according to the already published sources and artiicially aged in conditions of luorescent
lamp exposure at a certain level of relative humidity (around 45%) and temperature (ca.
30°C), equivalent to 100 years of exposure in museum conditions [13]. The reference
spectra and images obtained will lead to the creation of a database of reference materials,
useful for further identiication of binders in real case-studies.
Each sample will be divided in two: a part to be used in micro-destructive analytical
techniques and the other fragment to be embedded in a resin (as a cross-section).
In the irst phase (called FING), the application of several techniques (microscopy coupled
with staining tests, colorimetry, spectroscopy) will lead to the irst two levels of information:
•
presence of the organic material based on the aspect, color, relectance and speciic
•
primary distinction between classes of organic binder (oil, protein, resin or gum).
luorescence of each layer and on spectroscopic ingerprinting;
For example, the cross-section obtained from a “mock sample” imitating a ground layer
made of calcium carbonate (or gypsum) and animal glue can be examined and photographed
with an optical microscope and the distribution of the proteinaceous binder contained in it
mapped through a luorescent staining, using the ilter for blue excitation (Fig. 4).
Figure 4 - Example of characteristic auto-luorescence of an animal glue and the image of a
luorescent staining in the same layer, for mapping the distribution of the binder according the speciic
luorescence (“mock sample” reproducing a ground layer made of calcium carbonate and rabbit glue,
applied over a wooden support, 100x).
In a second phase (called BIND), MALDI-TOF-MS and immunological assays are useful
to differentiate and quantify the proteinaceous binder in complex mixtures (as binary
mixtures with another protein, with an oil or other type of natural organic material; as
complex mixtures or stratiications of layers), such as in the identiication between an oily
estudos de conservação e restauro | nº 1
46
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
tempera (“tempera grassa”) or an oil paint layer (third level – type of organic binder and
fourth level of information – ratio of organic binder in a mixture). Microspectroluorimetry
will also be useful for measuring the luorescent signal (as position, width and intensity of
the emission peak/band) of the binders or of mixtures of them on cross-sections.
The MALDI-TOF preparatory step is very important to achieve reliable results, therefore a
speciic protocol for the preparation of protein-containing samples has to be designed and
applied, trying to minimize the number of steps, for a maximum eficiency on a minimum
quantity of sample. Further tests for quantiication through isotopic labeling (18O labeling)
can be considered as a new way to many biochemical applications and as a potential
substitute of ELISA [37].
As example, the same sample shown in Fig. 4 was analyzed through MALDI-TOF-MS and
mass-spectra were obtained and compared for both “mock sample” fragment and another
sample of only animal glue (Fig. 5).
Figure 5 - Reference spectra of a calcium carbonate and animal glue ground layer
and of only animal glue, obtained through MALDI-TOF-MS analysis
For obtaining the ifth level of information (Fig. 3), immunological essays (ELISA, IFM on
cross-sections) can be applied for differentiating binders (such as between a rabbit skin
glue and a ish glue/isinglass), but also as a veriication of the MALDI-TOF-MS protocol of
quantiication.
Several samples can be analyzed at once by ELISA protocols on 96 well-microplates [Fig. 6].
estudos de conservação e restauro | nº 1
47
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
The results of the immuno-enzymatic reaction can be measured quantitatively (optical
density or absorbance) with a spectrophotometer or an automated plate reader. Primary
antibodies speciic for the proteins in the art samples can be utilized for the capture step,
whereas secondary antibodies labeled with an enzyme (e.g.: Alkaline Phosphatase) can
be utilized for the detection step. If both layers of antibodies are present in the microplate
well, the solution will turn yellow in the presence of the enzyme’s substrate (p-NPP),
meaning that the antigen for the speciic antibody is present [Fig. 6].
A
B
C
D
E
F
G
H
Figure 6 - Example of an ELISA plate after the addition of the substrate:
the yellow color simultaneously conirms the presence of protein-based samples as positive result
for egg white (3A-C, 4A-C, 6A-C, 7A-C, 8A-C, 9A-C), egg yolk (6D-F, 7D-F, 8D-F, 9D-F, 10D-F) and
animal glue samples (G7-9 and H10-12)
The third phase (called PRINT) will consist in the implementation of the designed
methodology to samples taken from real works of art. Considering the complexity of real
case-studies, the database of reference materials and the chemometric analysis of results
will be essential for a reliable and reproducible application of the proposed analytical
protocol.
3. Advantages and Disavantages of the Biochemical Approach
The method of peptide mass mapping, as MALDI-TOF-MS, applied for the identiication of
proteinaceous binders in polychrome artifacts, has many advantages [31-34, 50]:
•
•
•
•
•
highly sensitive (detection limits in the order of femtomoles),
small amount of sample (0.5 µg - 0.5 g),
simultaneous analysis,
simple and rapid (2 hours of preparation) protocol,
may determine the individual types of proteinaceous binders in their mixtures,
but some disadvantages exist [32-33, 38]:
estudos de conservação e restauro | nº 1
48
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
•
•
•
sophisticated instrument set-up is needed,
database of proteinaceous binders references has to be build-up,
interactions with pigments can inhibit trypsin’s action.
As it was previously assessed, biochemical tools as ELISA and IFM have a great potential
for the use in detection of organic binders (mainly proteinaceous), constituting polychrome
layers in artworks. Nevertheless, besides the advantages of the ELISA assay [40, 42, 45,
49]:
•
•
•
•
•
•
highly sensitive (detection limits in the order of nanograms, even less than 10-9 g),
a single extraction can be used in multiple assays, thus extending the usefulness of
small sample sizes,
simultaneous analysis of several samples,
relatively simple (do not need sophisticated instruments) and rapid (1 to 3 days of
preparation + 1 day of test) protocol,
cost-effective (if we consider the number of samples that can be analyzed with one
test),
may determine the biological source of the protein (i.e., rabbit skin glue vs. ish glue),
there are some main disadvantages [40, 42]:
•
the high degree of antibodies’ speciicity can also create dificulties (with both collagen
and plant gums, multiple antibodies must be used to ensure detection of antigen from
•
•
•
a broad range of possible sources);
loss of spatial resolution (the extraction procedure effectively destroys any ability to
localize a given protein to a particular layer or position in the sample);
decrease in immunoreactivity of antigens with light and/or thermal ageing (though
samples nearly 2000 years old were successfully identiied);
possible interactions with pigments where the binder may become degraded or insoluble.
Considering both the advantages and disadvantages, an IFM choice vs. ELISA will point on
several characteristics that have to be considered in the analysis of real samples [39-41,
49]:
•
•
detection of antigen by IFM is likely not to be as sensitive as ELISA;
interfering background unspeciic staining (as the bright green-yellow luorescence
of gypsum grounds), which can make the interpretation of data from real samples
•
ambiguous;
problem of bleaching of the luorophore with repeated excitation, and thus the signal
may degrade over repeated measurements;
estudos de conservação e restauro | nº 1
49
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
•
unlike with an ELISA assay, the sample remains intact and the antigen is localized to a
•
it is possible to detect multiple antigens within the same sample.
speciic region of the sample;
Considering the above-mentioned aspects, an idea would be to use IFM in conjunction
with ELISA: a small portion of the material sampled for cross-section examination can be
reserved for analysis by ELISA.
When using the sample embedded as a cross-section, a pre-screening of the sample
can be made to identify proteins of interest present in the cross-section and subsequent
examination using IFM can then be targeted at proteins known to be present and therefore:
•
•
this will limit the number of incubations to which a cross-section must be subject;
will remove any ambiguity in the face of a negative staining result.
The ELISA and IFM protocols are usually expensive (antigens for speciic proteins in
particular), therefore using both techniques as conjugated tools together with the abovementioned techniques (MO, luorescent staining and micro-spectroluorimetry, MALDI-TOF-
MS, micro-FTIR/micro-Raman) will improve the detection/quantiication protocol and also
will reduce the costs for necessary materials.
Conclusions
The overall methodology that is proposed in the present paper creates a new and original
experimental design (FING-BIND-PRINT) with several advantages: simple and fast; cost
effective; requiring minimum quantity of material; easily reproducible on real samples.
From preliminary tests performed on a series of fresh (2009) and laboratory aged (7-5
years) samples of egg and glue (as ilm of a dried solution on a glass slide or mixed
with charge or pigment) it was assessed that ELISA assay can be useful when combined
with luorescent staining microscopy [49-50]. However, optimization of blocking buffer
needs to be done and further experiments will be performed for the quantiication of the
three binders when in mixtures between themselves or with other binding materials (oil,
resins etc.). Fluorescence microscopy with a biomedical stain was useful for mapping the
binder distribution in paint cross-sections of variable age (fresh “mock samples” - 2008
and naturally aged polychrome samples – XVI-XVIIIth centuries), but other mock samples
with known composition and binders ratios should be tested in order to evaluate the
effectiveness of the stain and also to register luorescence spectra on each layer. From the
same cross-sections thin sections should be obtained in order to be able to perform several
comparative tests between classical stains, IFM and luorescent staining and qualitatively
evaluate the speciic answer. An important issue to be also tested will be the reduction of
the sample’s amount to less than 1 mg (if possible less than 0.5 mg).
estudos de conservação e restauro | nº 1
50
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
The accuracy and reproducibility of the obtained results from each technique will be
evaluated based on a correlation factor (expressed as %): positive correlation (the result
corresponds to the composition of the paint model), uncertain correlation (the result is
uncertain as to the composition of the paint model) and negative correlation (the result
does not correspond to the composition of the paint model).
Cross-referencing the results from each technique and the level of information obtained
a inal evaluation of the entire analytical protocol can be given for each set of paint
model. The interference sources and limits will be identiied and characterized for further
improvements of the methodology.
References
[1] AA.VV. (2009), Scientiic Examination for the Investigation of Paintings: A Handbook
for Conservators-restorers, a cura di D. Pinna, M. Galleotti, R. Mazzeo, 224 pag.;
[2] Sandu I.C.A., Sandu I., Luca C. (2006), Modern aspects concerning the conservation of
the cultural heritage, Vol. IV. Determination of conservation state and restoration of easel
paintings, Performantica, Iasi, 432 p.;
[3] Sandu I.C.A., Bracci S., Sandu I., Lobefaro M., (2009), Integrated analytical study for
the authentication of ive Russian icons (16th-17th centuries), in Microscopy Research and
Technique, 72: 755-765;
[4] Sandu I.C.A., Bracci S., Sandu I. (2006), Instrumental analyses used in the authentication
of old paintings. I. Comparison between two icons of XIX century, in Review of Chemistry,
Bucharest, vol. 57, n. 7, p. 796 – 803;
[5] Matteini M., Moles A.M., (2002), La Chimica nel Restauro. I materiali dell’arte pittorica,
, Ed. Nardini, Firenze;
[6] Sandu, I.C.A., Sandu, I., Popoiu P., van Saanen A. (2001), Methodological aspects
concerning the scientiic conservation of cultural heritage, Corson, Iaşi, 686 p.;
[7] Kühn H. (1986), Conservation and Restoration of Works of Art and Antiquities, vol. 1,
London: Butterworths pp. 157-167;
[8] Horie C,.V., (1987), Materials for Conservation. Organic Consolidants, Adhesives and
coatings, Butterworths, London,;
[9] Doménech-Carbó M.T. (2008), Novel analytical methods for characterising binding
media and protective coatings in artworks, in Analytica Chimica Acta 621, p. 109-139;
[10] Pique F., (2006), Il progetto Organic materials in wall paintings: risultati della prima
fase, in Atti del IV Congresso Nazionale IGIIC – Lo stato dell’Arte, Siena, 28-30 Settembre
2006;
[11] Lanterna G. (1999), Il punto attuale sulle indagini dei leganti pittorici, in OPD-Restauro,
estudos de conservação e restauro | nº 1
51
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
Centro Di, Firenze, p.142-148;
[12] Checa-Moreno R, Manzano E, Mirón G, Capitan-Vallvey (2008), Comparison between
traditional strategies and classiication technique (SIMCA) in the identiication of old
proteinaceous binders, LF, Talanta, 75(3):697-70;
[13] Nevin A., Osticioli I., Anglos D., Burnostck A., Cather S., Castellucci E. (2008), The anlaysis
of naturally and artiicially aged protein-based paint media using Raman spectroscopy
combined with Principal Component Analysis, in Journal of Raman Spectroscopy, 39, 9931000;
[14] Sandu I., Luca C., Sandu I.C.A., Vasilache V. (2007), Authentication of ancient easelpaintings through materials identiication from polychrome layers. I. Gas-chromatography
analysis, in Review of Chemistry, Bucharest, vol.58, n.9, p. 621 – 634;
[15] Colombini M. P., Modugno F., (2004), Characterisation of proteinaceous binders in
artistic paintings by chromatographic techniques, in J. Sep. Sci., 27, 147–160;
[16] Chiavari G., Lanterna G., Luca C., Matteini M., Prati S., Sandu I.C.A. (2003), Analysis of
Proteinaceous Binders by in situ Pyrolysis and Silylation, in Chromatographia, Wiesbaden,
Germany, 57, 9/10, p. 645;
[17] Casoli A., Cremonesi P., Palla G., Vizzari M., (2001), Application of gas chromatography-
mass spectrometry analysis to the study of works of art: paint media identiication in
polychrome multi-material sculptures, in Ann Chim.; 91(11-12):727-39;
[18] Schilling M.R., Khanjian H.P., (1996), Gas chromatographic analysis of amino acids
as ethyl cloroformate derivatives. III. Identiication of proteinaceous binding media by
interpretation of amino acid composition data in Preprints of the 11th Triennial Meeting of
the ICOM Committee for Conservation, Edinburgh, p.211;
[19] Sandu I.C.A., Luca C., Sandu I., Vasilache V., Hayashi M., (2008), Authentication of
ancient easel-paintings through materials identiication from polychrome layers. III. Microstratigraphic analysis, in Review of Chemistry, Bucharest, vol. 59, 8, p. 785 – 793;
[20] Schaefer S. (1997), Fluorescent Staining Techniques for the Characterization of Binding
Media within Paint Cross Sections and Digital Image Processing for the Quantiication of
Staining Results, in Postprints of the Symposium on Early Italian P Sainting Techniques and
Analysis, Maastricht, Holland;
[21] Mascchelein Kleiner L., 1992, Liants, vernis e adhesives anciens, 3e ed. Mise á jour,
Institut Royal du Patirmoine Artistique, Bruxelles;
[22] Wolbers R., Landrey G., (1987),The use of direct reactive luorescent dyes for the
characterization of binding media in cross sectional examination, in Preprints of the 15th
Annual Meeting of the American Institute for Conservation of Historic and Artistic Works,
Vancouver, p.168;
estudos de conservação e restauro | nº 1
52
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
[23] Talbot R.R., The luorescent antibody technique in the identiication of proteinaceous
materials, in Third Annual Conference on Art Conservation Training Programs, Queens
University, Kingston, Ontario, 1982;
[24] Plester J., (1956) Cross-Sections and Chemical Analysis of Paint Samples, in Studies
in Conservation, Vol. 2, No. 3, pp. 110-157;
[25] Sandu I.C.A., Luca C., Sandu I., Vasilache V., Hayashi M. (2008), Authentication of
ancient easel-paintings through materials identiication from polychrome layers. II. FTIR
Spectroscopy, in Review of Chemistry, Bucharest, vol. 59, 4, 384-387;
[26] Bitossi G., Giorgi R., Mauro M., Salvadori B., Dei L. (2005), Spectroscopic techniques
in Cultural Heritage Conservation: A Survey, in Applied Spectroscopy Review, vol. 40, nr.
3, p. 187-228;
[27] Boon J.J. (2004), Imaging microspectroscopy studies of paint cross-sections, in
Proceedings of the sixth Infrared and Raman Users Group Conference (IRUG6), Florence,
Italy, March 29th-April 1st 2004, p.66;
[28] Adrover Garcia I. (2001), Applicazioni della spettrofotometria IR allo studio dei beni
culturali, Collana I Talenti, Il Prato, Padova;
[29] Odlyha M., (1995), Investigation of the binding media of paintings by thermoanalytical
and spectroscopic techniques, Termochimica Acta, 269/270, pp.705-727;
[30] Odlyha M., (1990), A novel approach to the problem of characterizing the binding
media in early Italian Paintings (13th/16th century) in Preprints of the 9th Triennal Meeting
of the ICOM Committee for Conservation, Dresden, p.57;
[31] Kuckova S., Crhova M., Vankova L., Hnidza A., Hynek R., Kodicek M., Towards proteomic
analysis of milk proteins in historical building materials, in Int.J. of Mass Spectrom., in
press;
[32] Kuckova S., Radovan H., Kodicek M. (2008), Analysis of art objects using mass
spectrometry, in 9th International Conference on NDT of Art, Jerusalem, Israel, 25-30 May
2008;
[33] Kuckova S., Hynek R., Kodicek M. (2007), Identiication of proteinaceous binders used
in artworks by MALDI-TOF mass spectrometry, in Anal Bioanal Chem., 388(1):201-6;
[34] Hynek R, Kuckova S.,Hradilova J., Kodicek M., (2004), Rapid Commun Mass
Spectrom.,18 1896-1900;
[35] Karas M., Hillenkamp F., (1988), Laser desorption ionization of proteins with molecular
masses exceeding 10000 daltons, Analytical Chemistry, Vol. 60, pp 2299-2301;
[36] Mann M., Hendrickson R. C., Pandey A., (2001), Analysis of Proteins and Proteomes by
Mass Spectrometry, Annual Review of Biochemistry, Vol. 70, pp 415-435;
[37] Carreira R. J., Rial-Otero R., López-Ferrer D., Lodeiro C., Capelo J. L., (2008), Ultrasonic
estudos de conservação e restauro | nº 1
53
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
energy as a new tool for fast isotopic 18O labeling of proteins for mass spectrometry-based
techniques: Preliminary results, Talanta, Vol. 76, pp 400-406;
[38] Tokarski C., Martin E., Rolando C., Cren-Olive C. (2006), Identiication of Proteins in
Renaissance paintings by Proteomics, Anal. Chem., 78, 1494-1502;
[39] Vagnini N., Pitzura, L., Cartechini, L., Miliani C., Brunetti B.G., Sgamelotti A. (2008),
Identiication of proteins in painting cross-sections by immunoluorescence microscopy, in
Anal Bioanal Chem, 392:57–64;
[40] Heginbotham A, Millay V. and Quick M. (2006),The Use of Immunoluorescence
Microscopy (IFM) and Enzyme-linked Immunosorbent Assay (ELISA) as Complementary
Techniques for Protein Identiication in Artists’ Materials, in Journal of the American Institute
for Conservation, 45(2), 89–105;
[41] Ramirez B., Sonsoles V. (2001), Characterization of proteins in paint media by
immunoluorescence: a note on methodological aspects, in Studies in Conservation, 46(4),
282–288;
[42] Mazurek J., Schilling M., Chiari G. (2008), Antibody assay to characterize binding
media in paint, in ICOM Committee for Conservation Preprints, 15th Triennial Conference
in New Delhi, India, September 22-26 2008, p.678;
[43] Kockaert L, Gausset P, Dubi-Rucquory M. (1989), Detection of ovalbumin in paint
media by immunoluorescence, in Studies in Conservation, 34:183–188;
[44] Hodgins G, Hedges R. (2000), Toward the immunological detection of media: the
detection of artiicially aged collagen-based paints, in Art et Chimie, La couleur, Actes du
congres, Sons la direction de Jacques Goupy et Jean-Pierre Mohen. CNRS Editions, Paris;
[45] Hodgins G., Hedges, R. (1999), A systematic investigation of the immunological detection
of collagen-based adhesives, in 6th International Conference on Non- Destructive Testing
and Microanalysis for the diagnostics and Conservation of the Cultural and Environmental
Heritage, Rome, 1795–1810.
[46] Schaefer S. (2004), Application of Fluorescent Probes in Art Materials Research,
in International Conference on Fluorescence Methods: FOCUS ON FLUORESCENCE,
Amsterdam, Sept. 24/25, 2004;
[47] Claro A., Melo M.J., Schäfer S., Seixas de Melo J.S., Pina F., van den Berg K. J.,
Burnstock A. (2008), The use of Microspectroluorimetry for the characterization of lake
pigments, Talanta, 74;
[48] Bottiroli G., Gallone Galassi A., Bernacchi E., (1984), Microspectroluorimetric
techniques as applied to the analysis of binding media and varnishes in color samples taken
from paintings, in Proceedings of the Symposium Scientiic Methodologies applied to works
of art, Florence, 2-5 May 1984, Italy;
estudos de conservação e restauro | nº 1
54
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
[49] Sandu I.C.A., Roque A. C. A., Schaefer S. (2009), Implications of the biochemical
assays in the analysis of organic binders from polychrome works of art, MATCONS 2009Matter and Materials in/for Heritage Conservation, September 15 -19, 2009, Craiova,
Romania (oral presentation);
[50] Sandu I.C.A., Roque A. C.A, Kuckova S., Carreira R. J., Fernandes L., Schaefer S., Neves
E. R., Bracci S., (2009) FING-BIND-PRINT: a proposal for an integrated, complementary
methodology of identiication and quantiication of proteinaceous binders in polychrome
artworks, in Chemistry Solutions, 42nd IUPAC Congress, Glasgow, 2-7th August 2009
(poster);
[51] 1996, Dionysos of Fourna, The Painter’s Manual, Oakwood Publications, California;
[52] 1984, Cennini, Cennino: Il libro dell’arte o trattato della pittura/di Cennino Cennini; a
cura di Fernando Tempesti. 1a ed. Biblioteca Longanesi. Milano;
[53] Doerner M., 1984, The Materials of the Artist and their Use in Paintings. With Notes
on the Techniques of Old Masters, rev. edition, A Harvest/HBJ Book, Harcourt Bracer
Jovanovich, Publishers, San Diego, New York, Londo;
[54] 1982, Nunes, F., Arte Poética, e da Pintura e Symmetria, com Princípios de Perspectiva,
Edição facsimilada de 1615 com estudo introdutório de Leotina Ventura, Ed. Paisagem,
Porto;
[55] 1974, Mayerne, Théodore Turquet de: Pictoria sculptoria & quae subalternarum
artium, 1620: Le manuscrit de Turquet de Mayerne, présenté par M. Faidutti et C. Versini.
Lyon: Audin;
[56] Painted Wood: History and Conservation (1994), Proceedings of the Symposium
Organized by the Wooden Artifacts Group of the American Institute for Conservation of
Historic and Artistic Works, Williamsburg, Virginia, Nov.
Biographical notes
Irina Crina Anca Sandu - PhD in Chemistry for Conservation (2003, Romania)
As Assistant Researcher at FCT-UNL in Lisbon and member of REQUIMTE, she develops
researches for the Conservation and Restoration of Cultural Heritage. She is author/coauthor of 10 monographs for conservation, of more than 45 published papers (13 of which
as main author) and was involved in 20 research projects or scientiic collaborations. Since
her graduation in Romania (1997) she specialized in icons conservation and diagnosis,
having acquired solid competences in conservation science. In the past 12 years she built
up collaborations in an interdisciplinary context, with specialists from Romania, Italy,
Portugal, Holland, Egypt, Macedonia etc.
Ana Cecilia Roque - PhD in Biotechnology (2004, Portugal)
Cecília obtained a degree in Chemical Engineering (Biotechnology specialization) in 1999
estudos de conservação e restauro | nº 1
55
The Biochemistry and Artistic studies: a novel integrated approach to the identification of
proteinaceous binders in polychrome artifacts
Irina Crina Anca Sandu, Ana Cecília A. Roque, Stepanka Kuckova, Stephan Schäfer, Ricardo J. Carreira
and a PhD in Biotechnology in 2004 by Instituto Superior Técnico (Portugal) in collaboration
with the University of Cambridge (UK). She was a visiting scholar, supervisor of students
and a post-doc researcher at the Institute of Biotechnology, University of Cambridge (UK)
between 1999 and 2005. Cecília was a visiting student at the Catholic University of America
(Washington, DC) in 2004, and a post-doc researcher at INESC-MN (Lisbon) in 2005. She is
an Assistant Professor at the Chemistry Department (FCT-UNL) and member of REQUIMTE
since 2006, working in the ields of Bioprocessing (emphasis on Afinity Interactions), de
novo Design of artiicial receptors, Combinatorial Chemistry and Nanobiotechnology.
Štěpánka Kučková - Ph.D. in Analytical Chemistry (2006, Czech Republic)
Since 2006 she is Assistant Professor at Dept. of Chemistry and Chemical Education, Charles
University, Prague. Between 2006 and 2008 she worked at the Institute of Theoretical
and Applied Mechanics ASCR, Prague; in 2005 was Guest researcher in Polytechnic
University at Valencia, Spain; between 2003 - 2005 she worked at the Academy of Fine
Arts in Prague and in 2003 at the Institute of Inorganic Chemistry. Her main scientiic
interests are the identiication of protein binders from historical paintings using MALDITOF mass spectrometry; of natural pigments and organic components using FTIR and gas
chromatography.
Stephan Schäfer - is a Professor for Painting and Contemporary Art Conservation at the FCT UNL in Lisbon and Responsible for the Laboratory of Paintings Conservation. He is specialized
in restoration of paintings, pest control management and spectroscopic comparison of
luorescent solvate-chromatic dyes. Between 1994 and 1996 he had a Fulbright scholarship
at the University of Delaware & H.F. DuPont Winterthur Museum, USA. He published more
than 10 papers about painting conservation-characterization and alternative methods for
pest control in collections and museums. He is member of various professional associations
(International Institute for Conservation-IIC, International Council of Museums - ICOM,
Associação Brasileira de Conservadores e Restauradores de Bens Culturais - ABRACOR,
Verband Deutscher Restauratoren –VDR).
Ricardo J. Carreira - Ph.D. student
He graduated in Applied Chemistry (specialization in Organic Chemistry) from the Faculdade
de Ciências e Tecnologia - Universidade Nova de Lisboa (FCT-UNL) in 2006. In the same
year he started his PhD project (grant SFRH/BD/28563/2006 from the Fundação para a
Ciência e a Tecnologia, Portugal) at the Bioscope Group under direction of Prof. Dr. José L.
Capelo. Currently, his research is mainly focused on the development of new methodologies
for protein identiication and quantiication by stable isotopic labeling techniques and mass
spectroscopy. Since 2006 he thought in the GC-MS and MALDI-TOF-MS monographic
courses organized by the BioScope Group at the Chemistry Department.
estudos de conservação e restauro | nº 1
56
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico:
a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
Resumo
A ida da Família Real para o Brasil em 1808 foi um acontecimento que alterou profundamente
os costumes da colónia portuguesa na América. A embarcação intitulada de Galeota
Real de D. João VI ou Galeota Imperial foi oferecida ao Rei para uso em ocasiões das
efemérides reais. Esta embarcação foi objecto de uma intervenção de conservação e
restauro dos elementos de talha dourados, devolvendo a unidade e plenitude perdidas em
consequência da acção do tempo e de intervenções anteriores. Promoveu-se a divulgação
do conhecimento adquirido acerca de tão prestigiada obra quanto à produção original na
sua vertente artística, técnica e material.
Palavras-chave
Galeota Real de D. João VI, Galeota Imperial, talha dourada, materiais, técnicas, douramento
a água.
Abstract
The displacement of the Royal Portuguese family to Brazil in 1808 became a signiicant
event responsible for a deep change in the Portuguese colony way of living. The vessel
Galeota Real, property of King D. João VI of Portugal, also known as Galeota Imperial,
was a gift to the King just to be used exclusively on royal ceremonies. An intervention of
conservation and restoration of all its elements in gilded carved wood was carried out.
This work aimed to return the unity and the magniicence already lost, as a result of
time passage and previous restorations. The intervention made possible the acquisition of
relevant knowledge on original and historical manufacturing artistic techniques.
Keywords
Galeota Real de D. João VI, Galeota Imperial, gilded carved wood, materials, techniques,
water gilding.
Resumen
El viaje de la Familia Real a Brasil, en 1808, fue un acontecimiento que alteró profundamente
las costumbres de la colonia portuguesa en América. La embarcación denominada Galeote
Real de D. João VI o Galeote Imperial fue ofrecida al Rey para usarla durante las efemérides
reales. Esta embarcación fue objeto de una intervención de conservación y restauración de
los elementos de talla dorados, devolviendo la unidad y plenitud perdidas como consecuencia
estudos de conservação e restauro | nº 1
57
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
de la acción del tiempo y de las intervenciones anteriores. Así se promovió la divulgación
del conocimiento adquirido sobre obra tan prestigiosa tanto sobre su producción original
en su vertiente artística, como técnica y material.
Palabras clave
Galeote Real de D. João VI, Galeote Imperial, talla dorada, materiales, técnicas, dorado al
agua.
Introdução
No âmbito das Comemorações dos 200 anos da chegada de D. João VI e da Família Real
ao Rio de Janeiro, em 1808, a Galeota Real de D. João VI foi objecto de uma intervenção
de conservação e restauro dos elementos de talha dourados. Esta embarcação está desde
1996 em exposição no Espaço Cultural da Marinha, pertencente ao Museu Naval do Rio
de Janeiro. O projecto em questão foi desenvolvido pela Associação Espírito Santo Cultura
(AESC) com o patrocínio exclusivo da VIVO, ao abrigo da Lei de Incentivo à Cultura do
Estado do Rio de Janeiro.
Imagem 1 - A galeota em navegação
O trabalho foi desenvolvido por uma equipa de técnicos brasileiros e portugueses e visou
de uma maneira geral a remoção das camadas de ouro falso (purpurinas), consolidação e
preparação das madeiras entalhadas bem como a reposição do douramento dos ornatos.
Assim, após a estabilização e reforço de todos os elementos constitutivos da obra, foi
utilizada a técnica original de produção artística: o douramento a água. Para além da
intervenção de conservação e restauro, o projecto contemplou igualmente uma vertente
educativa e pedagógica com a inalidade da sensibilização do público. Este objectivo foi
estudos de conservação e restauro | nº 1
58
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
atingido desde a realização de parcerias com as escolas públicas que visitavam o espaço,
passando pela apresentação teatral subordinada ao tema, até à visita de alunos da pósgraduação de Conservação e Restauro da Universidade Estácio de Sá, permitindo assim
uma divulgação do projecto e consequente debate sobre o mesmo no meio académico.
1. Contextualização histórica e artística da obra
1.1. Contextualização histórica e cultural da época
Na ida da Família Real para o Brasil em 1808, mais concretamente, durante a passagem do
Príncipe Regente pela Baía, o governador João Saldanha da Gama de Melo Torres Guedes de
Brito, o Conde da Ponte, mandou que o Arsenal da Marinha daquela capitania construísse
uma embarcação para uso em ocasiões das efemérides reais. Inspirada na “Galeota Grande”
e na “Saveira Dourada”, que atendiam a Família Real em Lisboa, é provável que a Galeota
Real de D. João VI tenha icado pronta dez anos mais tarde, quando foi presenteada a D.
João VI por ocasião de sua coroação em 1818 (Cunha, 1978).
Os historiadores divergem quanto à data da chegada da Galeota ao Rio de Janeiro. Segundo
Levy Scavarda, a embarcação chegou à cidade no dia 4 de Janeiro de 1818 servindo para os
deslocamentos da família real e dos visitantes ilustres pela baía de Guanabara (Scarvarda,
1968). Na corte joanina, a Galeota foi utilizada em cerimónias de grande importância para
a história do país, inclusive no retorno do Rei para Portugal em 25 de Abril de 1821.O
Príncipe D. Pedro acompanhou a esquadra de seu pai até a entrada da barra a bordo da
Galeota.
Com a independência, foram mudadas as cores e as armas que iguravam no barco. A
Galeota de D. João VI continuou a igurar nas cerimónias pomposas da corte brasileira
dos Braganças, quando passou a ser chamada de Galeota Imperial. D. Amélia Augusta
de Leuchtenberg foi recebida por D. Pedro I a bordo da embarcação. Em 1838 a Galeota
Imperial serviu também para o cerimonial fúnebre da transladação do corpo de José
Bonifácio de Andrade e Silva, o Patriarca da Independência.
Ao tempo do Segundo Reinado, a Galeota participou da recepção festiva da chegada das
divisões navais brasileira e napolitana que trouxeram a Imperatriz D. Teresa Cristina,
em 1843. O tenente da Marinha napolitana Eugénio Rodrigues testemunhou o momento
solene do desembarque e icou impressionado com o luxo e a beleza daquele “palácio
lutuante”. Após as cerimónias religiosas na Capela Imperial, a Princesa Isabel e o Conde
d’Eu embarcaram na Galeota rumo ao Porto de Estrela, de onde subiram para Petrópolis
para a lua-de-mel.
Se a Galeota de D. João VI esteve indissociada da memória das efemérides pomposas
da monarquia, esta também igurou no episódio que marcou o im do regime: o baile da
Ilha Fiscal. Pouco antes da queda do regime, o Imperador e alguns membros da corte
embarcaram na Galeota para veriicar a decoração realizada para o baile em homenagem
estudos de conservação e restauro | nº 1
59
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
à Marinha chilena. Entretanto, não se sabe se o Imperador efectivamente chegou ao último
baile da Monarquia a bordo da Galeota. Sabe-se, porém que a Galeota transportou Pedro
II ao navio que o levou ao exílio.
A Galeota de D. João VI ou Galeota Imperial serviu como um símbolo vivo da presença da
monarquia nos trópicos. Exemplar único nas Américas, a Galeota manteve-se em uso nas
ocasiões festivas durante as primeiras décadas da jovem República. Foi então rebaptizada
como “Iate Quinze de Novembro” ou “Iate Silva Jardim”. Transportou o Presidente da
República Argentina, Dr. Júlio Roca, o Cardeal Arco Verde, o secretário de estado norteamericano Elihu Root, entre outros dignitários. A Galeota realizou a sua última viagem em
Setembro de 1920, no desembarque da Família Real da Bélgica.
1.2. Características estilísticas dos elementos em talha
A Galeota é uma embarcação tipo galé, movida a remo. O seu casco foi construído com
madeiras nobres e mede vinte e quatro metros de comprimento. A Galeota é ornamentada
externamente com frisos e iguras marinhas entalhadas em madeira dourada e outros
motivos tardo-Barrocos. Internamente, o camarim em cedro apresenta assentos estofados
e cortinas. À popa, a Galeota apresenta uma talha leve em estilo Rococó.
2. Descrição formal e técnica
2.1. Descrição formal
As Galeotas são pequenas Galés que admitem a sua propulsão a remo ou a vela, apesar do
ser mais comum o uso dos remos. Estas embarcações eram comuns em Portugal e no resto
da Europa. A sua utilização destinava-se ao passeio e ao comércio realizado perto da costa.
Eram utilizadas igualmente para transportar ao cais ilustres membros das casas reais em
momentos festivos e solenes. A Galeota tem 24 metros de comprimento, 3,60 de boca,
1,25 de pontal e 0,90 de calado. Inicialmente era movida através da acção dos 22 algarves
(remadores) e mais tarde foi aumentado para o número de 30, 15 remos por bordo, cada
remo era suportado manobrado por 2 pessoas e, portanto 60 remadores.
Esquema 1 – Diagrama da Galeota vista em planta, com algumas medidas e áreas
estudos de conservação e restauro | nº 1
60
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
Esquema 2 – Diagrama da Galeota vista lateralmente com o seu peril estrutural
Esquema 3,4 e 5 – Estudos das três secções típicas da Galeota:
a meio da embarcação, na proa e na popa
Como airmou a historiadora Marta Barbosa Viana (Cunha, 1978a), é completada por uma
igura de proa: “um golinho, tendo ao lado uma ornamentação de volutas, âncoras e folhas
de acanto”. A interpretação da igura de proa pode ser mais alargada e ser considerada uma
serpente marinha ou outro animal deste imaginário. É ainda referido um outro elemento –
o frade1 – “…peça esta sobre a qual havia uma cabeça de Neptuno, toda dourada”. Partindo
da proa “começa o verdugo, que era todo dourado. As cores predominantes na Galeota são
o dourado, o azul e o verde.
Continuando em direcção à popa, aparece o camarim, descrito segundo Gastão Penalva
(Cunha, 1978b) como “belíssimo, ornado do escudo real, depois imperial, recamado de
franjas e damascos, guarnecido de vidraças ricas em coroas majestáticas”. Pela gravura de
Debret, das colecções do Museu Histórico Naval, vê-se que a porta tinha ao alto as armas
e os dragões dos Bragança, vestígios que não existem mais. Actualmente, no interior do
camarim, encontra-se a toda a volta um banco em forma de “U”.
A popa apresenta na sua parte externa “uma bordadura toda trabalhada em lores e
arabescos, encerrando duas cornucópias que se defrontam. A saia do leme é embelezada por
outra talha, semelhante à igura de proa”, isto é, ornamentada por dois golinhos (serpentes
marinhas), um de cada lado. Da popa para a proa, por ambos os bordos, até à altura da
antepara de vante do camarim, possui borda falsa, adornada com talhas douradas, que
acaba numa miniatura da igura de proa, também dourada, aplicada num fundo azul”. Com a
declaração de Independência do Brasil em 1822 e a ascensão de D. Pedro I ao trono imperial,
foram mudadas as cores e as armas, bem como a barretina dos remadores. No espelho da
popa estão as armas do Império que substituíram as primitivas, que eram de Portugal.
1 Em linguagem náutica signiica coluna ou antena cilíndrica de madeira que em alguns navios se coloca à ré do
mastro grande. Caverna à proa dos barcos, para dar volta às amarras.
estudos de conservação e restauro | nº 1
61
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
2.2. Estudo tecnológico das obras: identiicação de técnicas e materiais de
execução
2.2.1. Suporte estrutural
Devido à descrição e antigos estudos realizados sobre a Galeota2, é possível especiicar
alguns tipos de madeiras utilizados em determinados elementos da embarcação: no
cavername e tabuados foi usada madeira de tapinhoã amendoim e tapinhoã argelim
(mezilaurus navalium, lauraceae); na proa (frade) empregou-se a maçaranduba (manilkara
huberi, Sapotaceae) e no camarim optaram pela madeira de cedro (Scarvarda, 1968a).
De uma forma geral, as madeiras utilizadas são bastantes pesadas e resistentes, utilizadas
na construção de embarcações. Com a excepção do cedro (cedrus Sp., cupresaceae), uma
madeira que apresenta maior leveza e menor densidade, mas bastante durável, resistente
à biodegradação e com boa capacidade de trabalho (corte, desbaste e entalhe). A madeira
de tapinhoã, extinta há mais de 150 anos, é rara, bastante dura, densa e praticamente
inalterável. Foi largamente utilizado em substituição ao carvalho europeu, no reparo das
embarcações portuguesas que chegavam daniicadas pelas tormentas. Por sua importância,
o corte da madeira era reservado à Coroa Portuguesa. A madeira de maçaranduba é muito
pesada, com grande resistência mecânica e caracterizada pela sua durabilidade natural.
A madeira é assemblada através de encaixes secos e segundo a utilização de elementos
metálicos que asseguram a ligação das diversas partes – cravos originais. Em algumas
zonas apresenta marcas de execução original (formões e goivas). Contudo, algumas marcas
dizem respeito às intervenções anteriores. Além da madeira, a Galeota apresenta em zonas
pontuais a utilização de metal (possivelmente cobre): argolas metálicas utilizadas para
enrolar os cabos e pequenos segmentos dos frisos internos (a bombordo e a estibordo) que
se iniciam na popa no sentido da proa.
2.2.2. Superfície
As técnicas e materiais utilizados na superfície foram analisados segundo a observação da
camada de preparação e a camada cromática, neste caso o douramento.
A camada de preparação encontrada é um estrato com espessura reduzida, de cor branca,
constituída por uma carga (sulfato ou carbonato de cálcio) e um aglutinante (provavelmente
cola animal). A camada cromática neste caso resume-se ao douramento na maior parte
das superfícies a intervir, embora existam algumas zonas da Galeota pintadas com tintas
de cor branca, dois tipos de azul e verde. As tintas que foram aplicadas na Galeota são
industriais de origem sintética e estão aplicadas nas zonas lisas e de “fundo” da talha
dourada. Sobre esta, foram encontradas purpurinas, aplicadas em camadas sucessivas,
fruto de inúmeros repintes anteriores. Em algumas áreas, designadamente o verdugo (a
bombordo e a estibordo) estas camadas atingiam uma totalidade de sete estratos. Como
esta não era a técnica de produção original, o objectivo da intervenção foi o de devolver a
2 Informação recolhida na documentação referente a intervenções anteriores, fornecida pelo departamento de
conservação e restauro do Museu Naval.
estudos de conservação e restauro | nº 1
62
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
nobreza da técnica original – douramento a água.
3. Intervenções anteriores
Uma das primeiras referências acerca do restauro da Galeota refere-se ao camarim, por
ocasião da visita do Presidente da Argentina Júlio Roca ao Brasil, em 1899. O camarim
foi restaurado na Ponta da Areia, no Estaleiro Prado Peixoto. Terá sido nesta altura que o
número de remos foi aumentado em cada bordo, passando de 11 para 15. Foram retirados
do camarim os brasões imperiais e as coroas “majestáticas” que adornavam os vidros
das janelas, substituídos por âncoras. Não há vestígios do brasão imperial que existia em
cima da porta, referido anteriormente. Contudo, o brasão imperial do espelho da popa
permaneceu no seu lugar.
Os elementos em talha originalmente dourados, bem como as áreas lisas (fundos) de
policromia foram repintados sucessivamente, o que pressupõe a existência de inúmeras
intervenções anteriores. Existem pelo menos mais duas intervenções de conservação e
restauro documentadas: uma realizada em 1961 e outra em 1995/1996 e pensa-se que as
restantes e sucessivas camadas de purpurinas aplicadas à superfície poder-se-ão tratar de
uma “manutenção” periódica realizada em determinadas épocas.
Da intervenção de 1961 sabe-se pela documentação que se encontraram restos de
douramento original (folha de ouro) em zonas como o verdugo e o camarim. As cores
seriam de tonalidades ligeiramente diferentes e as janelas do camarim, descritas como de
guilhotina com batente teriam aplicações de massas e de dois tipos de tinta. A intervenção
relativa ao ano de 1995/1996 está bastante melhor documentada e refere inúmeros
procedimentos efectuados. Alguns dos procedimentos referem a limpeza e reaplicação
de elementos decorativos externos perdidos durante o transporte para o espaço actual,
aplicação de massas (epóxidas) e purpurinas, retoques nas áreas de pinturas lisas,
aplicação de protecção do piso e construção do “berço” deinitivo que sustenta actualmente
a embarcação, executado numa madeira brasileira natural da amazónia, denominada
de “garapa”. Neste relatório faz-se referência ao facto dos bancos que se encontram no
camarim não serem originais.
4. Análise do estado de conservação
A Galeota encontrava-se em relativo e aparente bom estado de conservação antes da
intervenção de conservação e restauro de 1995/96. Após a Proclamação da República, a
Galeota icou cerca de dez anos recolhida ao Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro e, de
facto, como airma Fausto Cunha (Cunha, 1978c), pelo facto de estar “guardada em área
militar, portanto de difícil acesso ao público, icou por isso mesmo menos exposta a danos
ou desgaste”. Contudo, os elementos decorativos em talha da embarcação, primitivamente
dourados a folha de ouro ino, sofreram uma inevitável degradação devido à acção do
estudos de conservação e restauro | nº 1
63
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
tempo, no que se refere ao envelhecimento natural e oxidação dos materiais. Esta situação
conjugada com as intervenções anteriores e a natureza dos materiais nelas utilizados
causaram uma degradação da obra. Assim, apesar de ter estado afastada do público e
guardada em local protegido, não houve uma cuidada manutenção e revisão periódica da
obra, favorecendo a sua degradação. Durante esses dez anos, encontrava-se num espaço
de reserva cujas condições de humidade relativa e temperatura variam de forma brusca.
No entanto, estas situações de variação da humidade relativa e de temperatura mantêmse actualmente no local de exposição ao público e deve-se sobretudo ao clima especíico
do País e à falta de controlo e monitorização destes factores no Museu.
Na análise do estado de conservação, é importante ter em conta que as causas e
factores responsáveis pela degradação da obra relacionam-se, provocando reacções em
cadeia. Desta forma, as patologias que a camada dourada (purpurinas) apresenta são
consequência, frequentemente, da degradação do suporte, designadamente a presença de
metais que originam fendas e destacamentos. As fendas do suporte repercutem os seus
movimentos para esta camada que, por não conseguir acompanhar os movimentos, vão
criar um afastamento até ao destacamento do material.
4.1. Suporte estrutural
Toda a superfície do suporte que encontrava visível apresentava diversos tipos de sujidade
como poeiras soltas acumuladas, sujidades entranhadas na madeira com diversas origens e
vestígios de insectos (aranhas), resultando provavelmente do local e do tipo de manutenção
empregue, muitas vezes diicultada pela diiculdade de acesso a determinadas zonas.
4.1.1 Deterioração mecânica
A madeira apresentava deformações pouco acentuadas nas zonas circundantes às fendas
e oxidação nos pregos que se tornaram visíveis, mas também nas zonas da madeira onde
se constata a sua anterior presença, agora apenas com orifícios. A utilização de elementos
metálicos foi realizada com o objectivo de reforçar a ligação das assemblagens. Estas
por sua vez apresentavam alguma debilidade pelo facto de serem áreas que reagem
com maior susceptibilidade à entrada de humidade e consequentemente às variações de
temperatura. Na continuação das assemblagens debilitadas ou em áreas muito próximas
aparecem fendas que seguem a direcção do veio. Encontraram-se algumas lacunas nas
zonas que apresentam elementos metálicos e que haviam sido preenchidas nas anteriores
intervenções com massas à base de resina epóxida.
4.1.2 Deterioração biológica
Não foram detectados vestígios que atestam a presença de fungos ou insectos xilófagos.
Uma vez que presença destes é comum ser uma patologia que não se detecta facilmente
e que merece sempre uma análise mais profunda e atenta a factores que poderão estar
ocultos, foi solicitado a uma reconhecida empresa na área que izesse uma inspecção para
estudos de conservação e restauro | nº 1
64
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
garantir a sua inexistência. Assim, após terem sido realizados um conjuntos de estudos
e testes necessários conirmou-se que não existia presença nem actividade dos insectos
xilófagos, tendo sido redigido um relatório para o efeito. Outros insectos como aranhas
foram identiicados através de marcas características da passagem dos mesmos.
Estado de conservação:
presença de elementos metálicos.
Estado de conservação:
assemblagens debilitadas.
4.2. Superfície
A identiicação do estado de conservação ao nível da superfície foi analisada segundo dois
parâmetros: a camada de preparação e a camada cromática (douramento). A camada de
preparação apresentava perdas pontuais em locais onde também já não existia douramento
mas sim uma das novas camadas de purpurina. Esta patologia pode ser o resultado dos
movimentos desiguais entre o suporte e as camadas superiores, o envelhecimento dos
materiais ou a qualidade de execução da obra.
Estado de conservação: oxidação das purpurinas.
estudos de conservação e restauro | nº 1
65
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
No que se refere ao douramento, a sujidade e a oxidação do material usado (purpurinas)
são os dois factores principais. A quantidade de sujidade é substancial, de origem variada
e encontrava-se em todas as superfícies. É notório o desgaste desta camada, o que se
deve à fricção mecânica exercida sobre a obra. Esta resulta de dois factores principais: por
um lado a manipulação da obra pelo público no acto da sua fruição, uma vez que o espaço
expositivo da obra é visitado diariamente por Escolas do Rio de Janeiro, proporcionando
uma contacto por vezes excessivo com a mesma por parte das crianças e adolescentes; Por
outro lado, as anteriores limpezas efectuadas revelaram-se impróprias quer nos produtos
aplicados, que na técnica de limpeza utilizada pelos funcionários do Museu sem formação
especíica na área.
Existem levantamentos em zonas pontuais, o que levou ao destacamento deinitivo de
material em algumas área. Toda a superfície de talha dourada encontra-se totalmente
repintada com purpurinas. Para além das manchas de sujidade presentes na obra, existem
manchas de tinta de cor branca e outras com uma tonalidade mais escura. É possível que
este escurecimento se relacione com os materiais usados em intervenções anteriores que
tenham oxidação posteriormente.
Estado de conservação:
levantamento e destacamento das camadas
sucessivas de purpurinas
Estado de conservação:
presença de tinta de cor branca
5. Intervenção de conservação e restauro: proa, estibordo, bombordo, cabene/
camarim, popa e leme
Tendo em conta os principais critérios de intervenção que devem reger uma intervenção,
foi considerada prioritária a identiicação dos materiais originais de forma a efectuar
uma intervenção adequada quanto à sua compatibilidade, sem esquecer o critério de
reversibilidade/retratabilidade dos mesmos. Tendo em conta valor estético, artístico,
económico, social e cultural, bem como o tipo de proprietário, optou-se por uma linha de
tratamento de carácter sobretudo conservativo, com acções de restauro determinantes
na consolidação material da obra. Desta forma, o primeiro procedimento a ser realizado
estudos de conservação e restauro | nº 1
66
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
foi o levantamento das intervenções anteriores, principalmente das purpurinas que
desvirtuaram a técnica original. Seguiu-se a consolidação do suporte e posterior preparação
para receber o douramento a ouro ino mediante a técnica de douramento a água, técnica
usada originalmente. Este foi portanto, um processo que se repetiu em todas as áreas
intervencionadas.
A estibordo consideraram-se dois elementos decorativos em talha: o friso superior talhado
em forma de corda (verdugo) e o friso inferior moldado liso. Na intervenção realizada a
bombordo, os procedimentos são idênticos aos efectuados a estibordo.
5.1. Suporte estrutural
Antes de iniciar a descrição dos procedimentos efectuados no suporte, é necessário ter em
conta que se encontrava totalmente coberto por sucessivas camadas de purpurinas. Desta
forma, as seguintes descrições foram efectuadas após a remoção total das mesmas, etapa
descrita com mais pormenor no ponto 5.2. Superfície.
5.1.1. Consolidação Mecânica
Com o objectivo de conferir estabilidade ao suporte foi efectuado o preenchimento de
lacunas causadas pelas assemblagens originais na execução da talha, bem como à
reconstrução volumétrica da talha de elementos decorativos que apresentasse falta
volumétricas consideráveis. Para esse efeito foi usada madeira mais baixa densidade
(casquinha/balsa) e uso de adesivo vinílico. A madeira é muito macia, elástica, com baixa
densidade, funcionando como junta de dilatação do suporte. Após o preenchimento da
lacuna é feito o nivelamento no local. Procurou-se seguir a orientação do veio, para evitar a
ascensão capilar e para não contrariar os movimentos da madeira, pois ao absorver água,
o aumento de volume dá-se nesse sentido. Em lacunas supericiais de suporte foi utilizada
a “massa de dourador”, uma receita usada desde os primeiros tratados artísticos medievais
e renascentistas. Este material é estável a lutuação dimensionais pois tem uma baixa
contracção e alta lexibilidade para acompanhar as mudanças volumétricas do suporte.
Consolidação mecânica:
assemblagens debilitadas.
Consolidação mecânica:
assemblagens debilitadas.
estudos de conservação e restauro | nº 1
Consolidação mecânica:
reconstrução volumétrica.
67
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
5.2. Superfície
Aspecto anterior à intervenção: proa
Processo de limpeza das purpurinas: proa
Processo de douramento
(cré): proa
Processo de douramento
(bollus): proa
Processo de douramento
(folha de ouro): proa
Aspecto anterior à intervenção:
estibordo
Aspecto anterior à intervenção:
estibordo
Processo de limpeza das
purpurinas: estibordo
estudos de conservação e restauro | nº 1
68
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
Processo de douramento
(cré): estibordo
Aspecto anterior à
intervenção: popa
Processo de douramento
(bollus): estibordo
Processo de douramento
(folha de ouro): estibordo
Processo de limpeza das
Processo de
purpurinas: popa
douramento (cré): popa
Processo de
douramento (bollus):
popa
Processo de douramento (folha de ouro): popa
estudos de conservação e restauro | nº 1
69
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
5.2.1 Limpeza Mecânica e Química
Procedeu-se à remoção gradual das sucessivas camadas de purpurinas (que atingia em
alguns pontos a totalidade de sete estratos) mediante a acção química de um removedor
sintético sob a forma de gel decapante, que permitisse a remoção gradual das sucessivas
camadas até atingir o suporte original, de forma a nenhum material interferir com as
posteriores etapas (douramento). Seguiu-se uma fase de remoção mecânica manual
mediante o uso de instrumentos apropriados.
5.2.2 Douramento a água
O douramento integral das superfícies em talha foi realizado segundo a técnica original
de execução, que consiste na decoração da superfície da madeira com folhas metálicas.
Em contacto directo com a madeira está uma primeira camada (camada de preparação
ou preparação branca) constituída por carbonato de cálcio (cré) e cola animal. Após esta
camada situa-se o bólus (argila que é misturada com um aglutinante de poder adesivo), de
cor avermelhada e inalmente a folha de ouro, cujas dimensões são as usuais.
Na técnica de douramento a água, os passos necessários à sua realização foram levados
com todo a rigor, pois deles dependia a sucesso desta operação. Numa fase inicial a
madeira é coberta com um preparado constituído por uma mistura de gesso e cola de
coelho aplicados a quente. Esta fase repete-se várias vezes e após a aplicação inal deve
ser submetida a abrasão de forma a atingir uma superfície lisa. A segunda fase será a
aplicação do bólus que, para além de delimitar as áreas a dourar, permite devido às suas
características de bom assentamento, obter um melhor brunido (González-Alonso, 1997:
155). A terceira fase diz respeito ao acto de dourar propriamente dito, ou seja, a aplicação
de lâminas de ouro (de 24 quilates), que se realiza após a humidiicação da camada de
bólus. Depois do ouro estar completamente seco é brunido com pedras de ágata para
adquirir um aspecto inal brilhante.
Quanto à protecção inal do douramento, optou-se por não aplicar qualquer camada de
protecção uma vez que o ouro ino de 24 quilates apresenta uma grande estabilidade e
baixa oxidação pela acção do tempo.
Conclusão
O projecto de conservação e restauro dos elementos de talha dourados teve como objectivo
último a preservação de um símbolo incontornável do o património brasileiro de modo a
recuperar o aspecto e a dignidade originais da embarcação que, por mais de um século,
igurou como um dos símbolos mais distintivos da grandeza do Brasil.
O novo douramento a água, respeitando a técnica e os materiais originais, foi o principal
objectivo desta intervenção de conservação e restauro da Galeota de D. João VI por se
considerar que devolveria todo o esplendor original da peça, respeitando profundamente
tudo o que ela representa. Assim, procurou-se conservar a integridade material, técnica e
estudos de conservação e restauro | nº 1
70
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
estética da obra em questão, preservando-a para o futuro
A par de outros projectos e actividades que promoveram a divulgação deste momento tão
rico da História em que se comemorou a efeméride dos 200 anos da chegada da Família
Real, a recuperação da Galeota de D. João VI é de extrema importância. De facto, esta
embarcação constitui um símbolo da transferência do governo de Lisboa para o Brasil e
suas consequências sociais, históricas e artísticas.
Aspecto inal da Galeota após a intervenção
Referências
A ÚLTIMA Missão do Bergantim Real (2007). In Revista da Armada. Publicação Oicial da
Marinha. Nº 405. Ano XXXVI. [S.l: s.n.].
CUNHA, Fausto; SIMÃO, Maria Teresa (1978). A Barca do Rei. Rio de Janeiro: Secretaria
de Estado da Educação e Cultura (Departamento da Cultura), Instituto Estadual do livro,
Instituto Estadual do Património Cultural.
CUTILEIRO, Alberto (1998). As Galeotas Reais. Lisboa: Edições Inapa,.
DOCUMENTAÇÃO referente a intervenções anteriores, fornecida pelo departamento de
conservação e restauro do Museu Naval: relatórios, recortes com notícias, catálogos e
amostras de materiais.
estudos de conservação e restauro | nº 1
71
Conservação e Restauro de um Objecto Histórico: a Galeota Real de D. João VI
Daniela Coelho
DUARTE, Roberto. O Barco do Rei. In Off Shore. Ano IV – Nº 43. [S.l: s.n.], pp. 38 e 39.
GONZÁLEZ-ALONSO MARTINEZ, Enriqueta (1997). Tratado del dorado, plateado e a sua
policromia: tecnologia, conservación y restauración. Valencia: Editorial de la Universidad
Politécnica de Valencia.
KRIBS DA (1968). Commercial Foreign Woods on the American Market. New York: Dover
publications Inc.
PLAQUETE Histórica das Galeotas e Bergantins Reais (1965) – Portugal: Ministério do
Ultramar.
SCARVARDA, Levy (1968). O Galeão D. João VI (sesquincentenário de sua chegada ao Rio
de Janeiro) In Revista Marítima Brasileira. [S.l: s.n.].
VIANNA, Marfa Barboza (1945). A Galeota Imperial In Anais do Museu Histórico Nacional.
Vol. VI. Rio de Janeiro: [s.n.].
Agradecimentos
Agradece-se a todos quanto contribuíram para o sucesso da intervenção, desde a
organização geral do projecto e patrocinador, passando pela coordenação geral técnica e
todas as pessoas (técnicos de conservação e restauro e todo corpo da Marinha) que directa
ou indirectamente tornaram possível levar a Galeota a bom porto!
Nota biográica
Licenciatura em Arte – variante Conservação e Restauro, pela Escola das Artes da
Universidade Católica Portuguesa (especialização em pintura de cavalete). Estágio
Proissional em Conservação e Restauro realizado no IMC (Instituto de Museus e da
Conservação). Orientadora de Estágio em Museologia, Conservação e Restauro de uma
aluna do curso de Museologia da Universidade do Rio de Janeiro, Brasil.
A desenvolver a tese de Doutoramento “O mobiliário pintado de inais do século XVII e
século XVIII: materiais, técnicas e estados de conservação” sob a orientação do Prof.
Doutor Gonçalo Vasconcelos e Sousa e co-orientação da Prof. Doutora Ana Calvo. Bolseira
FCT. E-mail: daniela.s.coelho@gmail.com
estudos de conservação e restauro | nº 1
72
“Cristo Ressuscitado”
A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
Resumo
No concelho de Tarouca situam-se dos mais signiicativos monumentos portugueses, com
um representativo espólio de pintura portuguesa dos séculos XV e XVI. Entre os vários
espécimes encontra-se o da igreja de São Pedro de Tarouca, que integra uma pintura
mural, com o tema da “Ressurreição”, situada no arcossólio da nave da Igreja. Trata-se
de uma pintura que se destaca pela sua singularidade, existindo poucos exemplares desta
época nesta região do país. A pintura, pela sua raridade, foi objecto de estudo e análise
laboratorial aquando da intervenção de conservação e restauro, que deixou a descoberto
uma obra de carácter marcadamente maneirista, que se encontrava totalmente repintada.
Neste sentido, discute-se o contexto cronológico e estilístico da obra, apresenta-se o
estudo dos pigmentos utilizados e descreve-se a metodologia de intervenção adoptada,
dando a conhecer os aspectos mais relevantes da sua análise, tais como a presença do
pigmento amarelo de Nápoles ou as alterações observadas na iconograia da pintura após
a intervenção.
Palavras-chave
Pintura mural, restauro, levantamento de repintes, pigmentos, amarelo de Nápoles, MEVEDE.
Abstract
Some of the most representative Portuguese monuments with painting collections dating
from the XV and XVI centuries are located in the municipality of Tarouca, in Viseu district,
south region of Douro valley. One of the most important specimen is the wall painting
of Ressureição, in the arcosolium of São Pedro de Tarouca Parochial´s church. This wall
painting stands out by its singularity and rarity , since there is only a few specimens in the
region chronologically related. A laboratorial approach was conducted, simultaneously, with
the conservation and restoration work. The intervention brought to light unknown aspects
of this artwork, namely its Mannerist style, hidden by a total repainting. Some aspects
of its chronological and stylistic contexts are discussed, as well the materials employed
(pigments – Naples yellow). Accordingly, the analytical conclusions, the methodological
details and the iconographic changes are also presented.
Keywords
Wall painting, restoration, repainting elimination, pigments, Naples yellow, MEV-EDE.
estudos de conservação e restauro | nº 1
73
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
Resumen
En el municipio de Tarouca se sitúan dos de los más signiicativos monumentos portugueses,
con un representativo patrimonio de pintura portuguesa de los siglos XV y XVI. Entre los
varios ejemplos se encuentra el de la iglesia de San Pedro de Tarouca, con una pintura
mural, con el trema de la Resurrección, situada en el arcosolio de la nave de la iglesia.
Se trata de una pintura que destaca por su singularidad, existiendo pocos ejemplares
de la época en esta región del país. La pintura, por su rareza, fue objeto de estudio y
análisis de laboratorio cuando se abordó la intervención de conservación y restauración,
que dejó al descubierto una obra de marcado carácter manierista, que se encontraba
totalmente repintada. En este sentido se discute el contexto cronológico y estilístico de la
obra, se presenta el estudio de los pigmentos utilizados y se describe la metodología de
intervención adoptada, dando a conocer los aspectos más relevantes de los análisis, tales
como la presencia del pigmento amarillo de Nápoles o las alteraciones observadas en la
iconografía de la pintura después de la intervención.
Palabras clave
Pintura mural, restauración, levantamiento de repintes, pigmentos, amarillo de Nápoles,
MEV-EDE.
Introdução
A pintura em estudo, “Cristo ressuscitado”, situa-se no arcossólio da nave da Igreja de
São Pedro de Tarouca. Trata-se de um dos raros exemplares de pintura mural encontrados
no distrito de Viseu, na sua maioria fragmentados e em mau estado de conservação,
tais como as pinturas da igreja de Santa Marinha (Trevões) ou da igreja Matriz de
Sernancelhe, sendo a excepção o conjunto de Meijinhos, o mais representativo e bem
conservado: “os temas marianos encontram-se repartidos pelas paredes da capela-mor,
num envolvimento de cor e de dissolução ictícia do espaço de particular signiicado” [1].
Da pintura mural de São Pedro de Tarouca, representando “Cristo ressuscitado”, não existe
qualquer documentação conhecida, que permita inferir a data de realização da obra e
conhecer o seu mestre, possibilitando uma abordagem mais sustentada às relações de
inluência entre as diferentes realizações pictóricas no distrito. A análise da obra antes da
intervenção [Figura 1], permite identiicar dois grupos distintos de personagens, tendo
como eixo central a igura de Cristo, em pé sobre um túmulo de pedra. Á direita da igura
situam-se três soldados, um de espada em punho, um segundo adormecido sobre o túmulo
e o terceiro a olhar espantado para a igura de Cristo. Á esquerda de Cristo encontra-se
um quarto soldado, também adormecido e o segundo grupo de iguras, composto por
três mulheres que conversam com uma igura masculina, imberbe e de manto vermelho,
cuja atribuição iconográica poderá corresponder à igura de São João Evangelista. A
estudos de conservação e restauro | nº 1
74
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
obra encontra-se enquadrada superiormente por um arco de cor preta que acompanha
interiormente o arcossólio. A qualidade plástica da representação possui um carácter
bastante ingénuo, onde as iguras se encontram delimitadas por linhas de cor preta; a
noção de profundidade é praticamente inexistente, estando a composição representada
num único plano perspéctico. A representação de volumes, nomeadamente nas vestes,
é bastante simples e resume-se à aplicação de linhas de cor preta e de manchas de cor.
Em resumo, trata-se de uma representação bastante simples de um episódio bíblico, que
revela uma qualidade técnica e pictórica medíocre.
Figura 1 - Pintura mural antes da intervenção
A intervenção de conservação e restauro assumiu como propósito inicial a preservação
do suporte, que se encontrava bastante fragilizado devido à presença de vazios e perda
de resistência, bem como a ixação e limpeza da camada cromática, que para além da
acumulação de sujidade, apresentava escorrências causadas por anteriores problemas na
cobertura e risco pontual de destacamento. Durante a intervenção tornou-se incontornável
a necessidade de efectuar um estudo mais aprofundado da obra, nomeadamente ao nível
dos materiais e da contextualização histórica da pintura, uma vez que a presença de
estudos de conservação e restauro | nº 1
75
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
uma camada de pintura subjacente, bastante extensa e em bom estado de conservação,
obrigou a repensar a metodologia de intervenção prevista.
Neste artigo será analisado o processo de conservação, de restauro e de redescoberta
da pintura, procurar-se-á demonstrar a importância que uma intervenção numa obra de
arte poderá desempenhar, não apenas quanto à sua conservação, mas também quanto à
descoberta de obras cuja existência no seu todo ou em parte era até então desconhecida.
Analisam-se ainda os pigmentos utilizados e reinterpreta-se iconográica e estilisticamente
a obra após a intervenção.
Estado de conservação
De um modo geral, a principal questão relativa ao estado de conservação da pintura era
a presença pontual de ocos entre a argamassa e a alvenaria, coincidentes em muitos dos
locais com a existência de fracturas e issuras de diferentes dimensões. Esta situação
colocava em causa a estabilidade da obra e a sua permanência. Parte da pintura encontravase perdida, principalmente nas zonas limite junto ao arco e no intradorso [Figura 2], tendo
sido aplicado cimento para preenchimento. Para além da questão de estabilização da obra
e correcção de intervenções anteriores inadequadas, levantava-se a questão da existência
de um repinte total sobre a pintura.
Figura 2 - Levantamento gráico de patologias, danos e pintura subjacente
A presença de pintura subjacente era visível em zonas pontuais, no entanto e como
acontece em muitos casos, a extensão de pintura original não era perceptível. Como forma
estudos de conservação e restauro | nº 1
76
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
de ultrapassar esta questão e com os riscos inerentes a um levantamento de repintes,
procedeu-se à recolha de amostras para análise de pigmentos bem como à abertura de
janelas de sondagem. De ressalvar que na Figura 2 apenas se assinalou como repinte a
zona superior da pintura, por ser nitidamente perceptível tratar-se de um repinte total,
enquanto que na restante área não era possível uma correcta percepção, não sendo
discernível se o repinte coexistiria a um mesmo nível com a pintura original. Pontualmente
a policromia apresentava risco de destacamento. Toda a pintura se encontrava coberta
por sujidade. Devido a anteriores problemas na cobertura, a entrada de água originou
escorrências e arrastamento de pigmento.
Métodos de análise
Apesar da extensão do repinte e de acordo com o objectivo de identiicar os pigmentos
presentes na pintura original, recolheram-se amostras das cores preta (arco), castanha
(cabelo de Cristo), branca (fundo) e amarela (arco). As mesmas amostras foram utilizadas
para análise da argamassa. A recolha foi efectuada em zonas que ainda não tinham sido
intervencionadas e onde a pintura subjacente se encontrava visível. A análise foi realizada
através de microscopia electrónica de varrimento com um espectrómetro de difusão de
electrões acoplado (MEV-EDE), utilizando um microscópio modelo Hitachi-SU-70. As
amostras foram revestidas com carbono e utilizou-se uma tensão de 25 kV, por períodos
de tempo não inferiores a 60 segundos.
Figura 3: Espectro EDE – amostra de argamassa
A análise dos resultados apresenta como factor comum a presença de cálcio e magnésio, e
alumínio e silício, provenientes da composição da argamassa, respectivamente do ligante
estudos de conservação e restauro | nº 1
77
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
e agregado, e de chumbo, provavelmente resultante da aplicação de uma camada de
branco de chumbo (imprimitura) sobre o suporte [Figura 3]. Os resultados obtidos para a
cor preta [Figura 4], não permitem identiicar qual o pigmento utilizado, tratando-se muito
provavelmente de um pigmento de origem orgânica, que não é possível deinir através
do exame efectuado. A análise do pigmento castanho [Figura 5] identiicou a presença de
ferro, o que poderá indicar tratar-se de ocre castanho.
Figura 4: Espectro EDE – amostra de cor preta
Figura 5: Espectro EDE – amostra de cor castanha
estudos de conservação e restauro | nº 1
78
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
A análise do espectro obtido para a cor branca [Figura 6] indica, para além da elevada
presença de cálcio, comum a todas as amostras, a presença de chumbo e bário, pelo que
se tratará, muito provavelmente de branco de chumbo e barite. O branco de chumbo é
um dos pigmentos mais utilizados em pintura de cavalete, desde a antiguidade até aos
séculos XVII e XVIII [2]. É importante notar que o processo de preparação se manteve
praticamente inalterado na sua essência até quase aos nossos dias, variando apenas em
pequenos pormenores de ordem técnica [3]. No entanto, na pintura mural o pigmento
branco mais utilizado foi a cal. Este pigmento podia ser aplicado por dois processos: no
processo primitivo, as cores eram aplicadas misturadas com cal, empregava-se cal apagada,
que apresentava uma consistência untuosa e mais compacta que a cal recém apagada.
Figura 6: Espectro EDE – amostra de cor branca
No processo mais recente, desenvolvido pelos pintores lorentinos empregava-se um
derivado da cal denominado bianco Sangiovanni, que era preparado expondo ao sol
pedaços de cal apagada puriicada por lavagens com água. Os pedaços depois de secos
eram moídos e expostos de novo ao sol. A moagem e exposição ao sol eram repetidas
diversas vezes, resultando na formação de carbonato de cálcio em consequência da acção
do dióxido de carbono. O produto obtido era bastante denso e brilhante [4]. O branco de
chumbo, como todas as cores à base de chumbo tende a escurecer devido à formação de
sulfuretos, geralmente por reacção com o sulfureto de hidrogénio presente na atmosfera
[5]. A presença de bário poderá estar associada à presença de barite (sulfato de bário),
utilizada como extensor do branco de chumbo. Contudo, a concentração tanto de bário
como de enxofre é bastante reduzida e apesar da presença de chumbo em todas as cores
analisadas, apenas nas amostras de cores branca e castanha se identiicou a presença
estudos de conservação e restauro | nº 1
79
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
de bário pelo que este poderá estar associado ao repinte, caso contrário a sua presença
deveria ter sido detectada em todas as amostras como elemento presente na imprimitura,
onde apenas se identiicou chumbo.
Figura 7: Espectro EDE – amostra de cor amarela
A análise do pigmento amarelo revelou a presença de antimónio e chumbo, o que permite
concluir tratar-se do pigmento amarelo de Nápoles [Figura 7]. O amarelo de chumbo e
antimónio é um pigmento artiicial que tem sido produzido ao longo de diversos períodos.
Estudos revelam que este pigmento atingiu a sua máxima popularidade na Europa entre
1750 e 1850 tendo sido substituído pelo amarelo de crómio e o amarelo de cádmio. As
mais antigas referências ao pigmento surgem em tratados do século XVI, relacionadas
com a sua aplicação em vidrados cerâmicos. As poucas referências à utilização deste
pigmento entre os séculos XIV e XIX, devem-se às confusões envolvendo o amarelo de
chumbo e antimónio, o amarelo de chumbo e estanho e o amarelo de chumbo (massicote).
Uma das mais antigas aplicações de amarelo de Nápoles foi identiicada numa pintura
a óleo datada de 1630-32 [6]. À pintura mural em estudo, de carácter marcadamente
maneirista, é atribuída a datação de inal de seiscentos e início de setecentos, o que
levanta questões relativas à proveniência do pigmento utilizado e da raridade da sua
aplicação. De salientar ainda o artigo de António João Cruz “A cor e a substância: sobre
alguns pigmentos mencionados em antigos tratados portugueses de pintura – pigmentos
amarelos”, onde o autor escreve “… pode notar-se que o amarelo de Nápoles parece ter
tido uma muito reduzida importância na pintura e escultura em Portugal, …” referindo-se
ao estudo de uma série de pinturas datadas de 1400 a 1900, onde este pigmento não foi
identiicado [7]. A possibilidade da presença de antimónio ser resultado da contaminação
do repinte é muito improvável, pois o repinte na zona onde a amostra foi recolhida era de
cor preta. No caso de pigmentos mais antigos o antimónio apenas aparece associado ao
estudos de conservação e restauro | nº 1
80
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
amarelo de Nápoles, não fazendo parte da composição de outros pigmentos; actualmente,
o antimónio não é um elemento comum em tintas, sendo utilizado nas indústrias dos
plásticos e cerâmicas, mas não como pigmento de cor preta. A excepção é o titanato de
crómio, um pigmento inorgânico que resulta da combinação de óxido de crómio, antimónio
e titânio, correspondente no índice de cores ao pigmento azul 24 e com uma cor castanhaamarelada [8]. Para além de não existir correspondência com a cor, não se identiicou a
presença de crómio ou titânio.
Conservação e restauro
Tal como referido na análise do estado de conservação da pintura, a prioridade consistiu
na estabilização do suporte, promovendo a coesão entre a argamassa e a alvenaria. O
preenchimento de vazios foi feito através da injecção de um ligante hidráulico com carga
inerte (PLM-AL®) em suspensão; os vazios mais extensos foram preenchidos adicionando
carga (areia de sílica) ao PLM-AL®. Pontualmente realizaram-se consolidações da argamassa
com um copolímero acrílico (Primal B60®), diluído em água. A ixação da policromia foi
efectuada por aplicação a pincel e injecção de resina acrílica (Paraloid B72®) dissolvida em
solvente aromático (xileno), variando a percentagem da resina entre 4 e 8%. O cimento,
assim como a argamassa não original e em risco de destacamento, foram removidos e
aplicada argamassa tradicional de granulometria idêntica à original, composta por cal em
pasta e areia de rio (1:3).
Figuras 8 e 9 - Pormenores da pintura antes e durante a intervenção
A limpeza teve início após a estabilização do suporte e da policromia, podendo considerar-
se duas fases distintas: limpeza de sujidades supericiais e levantamento de repintes. A
primeira fase consistiu na remoção de sujidades, como poeiras e teias de aranha, por
aspiração e com o auxílio de trinchas de pêlo macio. Após a limpeza supericial e tendo
por base os resultados da análise de pigmentos, procedeu-se à abertura de janelas de
sondagem de forma a perceber qual a extensão de pintura original e qual o seu estado
estudos de conservação e restauro | nº 1
81
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
de conservação. Os resultados mostraram que seria um risco controlado proceder ao
levantamento integral do repinte. A primeira fase da remoção realizou-se mecanicamente
com o auxílio de bisturis. Como parte do repinte não foi possível remover mecanicamente
foi necessário efectuar testes de solventes, de forma a encontrar o solvente mais adequado
para a remoção do repinte sem afectar a policromia original – segunda fase. O teste de
solventes revelou ser necessário recorrer a solventes de categorias I (decapante) e II
(médio), aplicados de forma controlada e reduzindo o risco para o utilizador. Ao longo do
levantamento foi possível observar que o repinte, apesar de representar a cena original,
havia ocultado e alterado personagens. Alguns exemplos são a “descoberta” da igura do
soldado adormecido [Figuras 8 e 9] ou a igura do anjo, que havia sido interpretado de
forma iconograicamente incorrecta, estando representado anteriormente como São João
Evangelista. [Figuras 10 e 11] Apenas se reintegraram as zonas onde foi aplicada nova
argamassa. A reintegração foi realizada em sub-tom por aplicação de mancha de cor.
Utilizaram-se têmperas acrílicas.
Figuras 10 e 11 - Pormenores da pintura antes e durante a intervenção
Após a conclusão da intervenção foi possível deixar a descoberto uma pintura de boa
qualidade, tanto a nível estilístico como técnico, para além de se tratar de uma forma de
representação artística bastante rara neste ponto do País [Figura 12]. Por norma e segundo
a tradição bíblica, as representações igurativas da “Ressurreição” retratam Jesus Cristo
que ressuscita, saindo do túmulo, perante o espanto e a confusão dos soldados [9]. Nesta
pintura isso não se veriica, uma vez que os soldados estão alternadamente retratados com
estudos de conservação e restauro | nº 1
82
“Cristo ressuscitado” - A redescoberta de uma pintura
Ana Bidarra, Carla Roçado, Pedro Antunes, João Coroado
expressões e atitudes diferenciadas, uns adormecidos, outros fascinados ou espantados
diante do fenómeno que observam. Aqui, Cristo Ressuscitado aparece sobre o túmulo
fechado, mostrando assim, de forma mais contundente, a grandeza deste milagre. Encontrase envolto num manto, que possibilita a percepção das formas corporais que icam ocultas
sob o tecido. O manto, esvoaçando de uma forma rebuscada, desenvolve-se com várias
pregas, corporizadas através da cor disposta com tonalidades diferenciadas e realçadas
pela disposição da luz. O cabelo de Cristo, encaracolado, inamente tratado e esvoaçando,
envolve o rosto, remetendo a sua forma de representação para a sintaxe maneirista [10,
11]. Cristo segura uma cruz inamente lavrada. Do seu lado direito, encostados ao túmulo,
dispõem-se os guardas, vestidos com trajes semelhantes aos do Norte da Europa. A cena
desenrola-se numa ambiência de muita serenidade, reforçada pela tranquilidade do rosto
de Cristo. Do lado esquerdo posiciona-se um anjo, com panejamentos amarelos em forma
de caracol, que comunica com três mulheres: Maria de Magdália, Maria e a mãe de Tiago e
Joana, cujas vestes caem de forma pesada, sem denunciar as formas corporais. Os rostos
femininos relectem surpresa, pois encontram-se de olhos baixos, atentos á mensagem
divina. O alongamento corporal das iguras remete para a sintaxe igurativa característica
do maneirismo [10, 11]. O fundo da cena é composto por um arco de volta perfeita com
decoração entrelaçada.
Figura 12 - Pintura após a intervenção
estudos de conservação e restauro | nº 1
83
Conclusão
A análise estilística e iconográica da obra sofreu alterações após a intervenção de
conservação e restauro, revelando uma obra de boa qualidade técnica e iconograicamente
correcta, com um elevado pendor maneirista, que coloca a pintura em inais de seiscentos,
início de setecentos. A “redescoberta” da igura do soldado adormecido ou da igura
do anjo que anuncia a ressurreição às três mulheres, resultam num enriquecimento da
obra e denotam o conhecimento do tema por parte do artista. Procurou-se, através da
análise de pigmentos, situar cronologicamente a pintura num intervalo de tempo mais
limitado. Os resultados obtidos permitiram identiicar a presença de amarelo de chumbo
e antimónio (amarelo de Nápoles), que teve o seu auge de utilização em meados de
setecentos, no entanto este resultado não é eliminatório da proposta inicial de datação,
pois o pigmento já havia sido utilizado anteriormente em outros países, apesar da sua
utilização em pintura de cavalete de produção nacional não ter sido ainda identiicada.
Questões relativas à autoria da obra continuam por resolver; a organização compositiva e
o cromatismo moderado permitem estabelecer paralelismos com o conjunto pictórico da
igreja de São Pedro de Tarouca, ainda que com diferenças signiicativas na utilização da
luz e na intensidade das cores decorrentes da diferença do suporte e da técnica da pintura.
Poderão ainda ser estabelecidos alguns paralelismos com a pintura sobre madeira, que se
encontra no convento de Ferreirim, geograicamente próxima, nomeadamente na temática
representada, “A Ressurreição”, datada de 1533/1534, fruto dos pincéis dos denominados
Mestres de Ferreirim. Outras questões ainda se encontram por estudar tais como a análise
do ligante utilizado na pintura e a argamassa utilizada.
Agradecimentos
Padre Carlos Lopes – Pároco da Igreja de São Pedro de Tarouca
Sr. António Lopes Costa – Mecenas da obra.
Professora Doutora Fátima Eusébio – responsável pelo Departamento de Bens Culturais da
Diocese de Viseu.
Atelier T – Arquitectura e Urbanismo – registo gráico do levantamento de patologias.
Referências
[1] EUSÉBIO, Fátima, MARQUES, Adolfo (2008). Distrito de Viseu, Tesouros de Arte e
Arqueologia. Viseu: Governo Civil do Distrito de Viseu.
[2] CRUZ, António João (2004). As cores dos artistas. História e ciência dos pigmentos
utilizados em pintura. Lisboa: Apenas Livros.
[3] R. J. Gettens, H. Kuhn, W. T. Chase em A. Roy (Editor), Artist’s Pigments: A Handbook
of Their History and Characteristics, Vol. 2, 1993, p. 67.
estudos de conservação e restauro | nº 1
84
[4] CABRAL, João M. Peixoto. “História breve dos pigmentos, 4 – Das Artes da Idade Média”
(2ª parte). In: Química. Boletim da Sociedade Portuguesa de Química, 104, 2007, pp.3950.
[5] CRUZ, António João. A oicina do artista, ou as relações entre a ciência e a arte a
propósito de uma imagem. In: Interacções, (Santarém), 3, 2006, pp.87-101. Disponível
em: http://www.eses.pt/interaccoes.
[6] Iann N. M. Wainwright, John M. Taylor, Rosamund D. Harley em Robert l. Feller (Editor),
Artist’s Pigments: A Handbook of Their History and Characteristics, Vol. 1, 1986, pp. 221223.
[7] CRUZ, António João. A cor e e a substância: sobre alguns pigmentos mencionados
em antigos tratados portugueses de pintura: pigmentos amarelos. In: Artis – Revista do
Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras de Lisboa, (Lisboa), 6, 2007, pp. 139146.
[8] SMITH, Ray (2003). Manual prático do artista. Porto: Civilização Editora.]p.25.
[9] Bíblia Sagrada (1993) - PAULUS Editora.
[10] MARKL, Dagoberto (1995). Os ciclos: das Oicinas à Iconograia. In História da Arte
Portuguesa, Vol. II. Lisboa: Círculo de Leitores.
[11] PEREIRA, Paulo (dir.) (1995). História da Arte. Do modo Gótico ao Maneirismo, Vol.
II. Lisboa: Círculo de Leitores.
Notas biográicas
Ana Bidarra – em doutoramento na Universidade de Aveiro (Departamento de Geociências),
área de especialização: estudo da folha de ouro dos retábulos barrocos portugueses. Mestre
em Geociências com especialização no estudo de pigmentos estruturados. Licenciada em
Conservação e Restauro pelo Instituto Politécnico de Tomar. Conservadora-restauradora
desde 1999.
Carla Roçado - em dissertação na Universidade Católica Portuguesa, área de especialização:
Património. Pós - graduação em Salvaguarda e Dinamização do Património. Conservadorarestauradora desde 1994.
Pedro Antunes – mestrando no Instituto Politécnico de Tomar, área de especialização:
Conservação e Restauro - Património Integrado. Licenciado em Conservação e Restauro
pelo Instituto Politécnico de Tomar. Conservador-restaurador desde 1998.
João Coroado – Doutorado em Geociências pela Universidade de Aveiro, é professor
no Departamento de Arte, Conservação e Restauro do Instituto Politécnico de Tomar. É
membro efectivo da Unidade de Investigação GeoBioTec – Geobiociências, Tecnologias e
Engenharia, inanciado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.
estudos de conservação e restauro | nº 1
85
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplos da época moderna,
em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
Resumo
Ao longo do século XVI ergueram-se retábulos e estruturas de madeira em igrejas da
Foz do Douro, S. Torcato e Amarante que, na sua maior parte, viriam a ser substituídos,
transformados ou simplesmente destruídos.
Palavras-chave
Século XVI, retábulos, madeira, pedra, Foz do Douro, S. Torcato, Amarante.
Abstract
Along the 16th century altarpieces and wooden structures arose at churches in Foz do
Douro, S. Torcato and Amarante. There structures were often substituted, transformed or
simply destroyed.
Keywords
16th century, altarpieces, wood, stone, Foz do Douro, S. Torcato, Amarante.
Resumen
A lo largo del siglo XVI se levantaron retablos y estructuras de madera en las iglesias
de Foz do Douro, S. Torcato y Amarante que, en su mayor parte, fueron sustituidos,
transformados o simplemente destruidos.
Palabras clave
Siglo XVI, retablos, madera, piedra, Foz do Douro, S. Torcato, Amarante.
Introdução
A partir do século XVI, a substituição de retábulos e outras estruturas em madeira foi
frequente nas igrejas portuguesas. O movimento de Reforma desencadeado a partir dos
inais do século anterior esteve, na maior parte das vezes, na origem dessas situações1.
1 Ver, sobre o tema: ROCHA, Manuel Joaquim Moreira da. Altares e invocações na Sé de Braga: a formação
de um espaço contra-reformista. Museu, 4ª Série, 2 (1994), p. 37 e ss; Idem: Dirigismo na produção da
imaginária religiosa nos séculos XVI-XVIII: as Constituições Sinodais. Museu, 4ª Série, 5 (1996), p. 187 e ss;
estudos de conservação e restauro | nº 1
86
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
Existiram, porém, casos em que elas não foram ordenadas pela hierarquia religiosa,
enquanto outras vezes essa ligação não parece ter sido claramente assumida.
Os retábulos de S. Torcato
Na igreja paroquial de S. Torcato, antigo templo do mosteiro medieval da mesma invocação,
existe apenas um retábulo na capela-mor. Trata-se de uma estrutura recente, tendo a
anterior, que datava de 1802, sido destruída durante as campanhas de restauro dos inais
do século passado. Juntamente com o retábulo mor, foram ainda retirados dois altares
colaterais. Em 1548 já existia na igreja o mesmo número de altares; uma notícia do ano
seguinte indica-nos que um dos colaterais era dedicado a S. Sebastião e uma das pedras
de enchimento do altar-mor, erguido em 1802, tinha pintado um fresco da Época Moderna,
representando o martírio de S. Sebastião, que poderia ter pertencido a ele. Infelizmente, a
pintura foi destruída pelos operários que trabalharam na obra de restauro da Igreja.
Em 1568, os colaterais tinham os seus novos retábulos quase concluídos. Eles podem ter
substituído, embora mantendo a mesma invocação (como parece ter sucedido no retábulo
mor, de que adiante falaremos), altares com pinturas murais a fresco não muito anteriores,
cujos vestígios foram encontrados durante as obras de restauro. Só mais tarde, em 1631,
temos pistas para os oragos do outro retábulo lateral: são então referidos juntamente com
os mordomos de S. Sebastião, os oiciais “das Chagas”, a que se juntam, no ano seguinte,
os da “Senhora do Rosario”. Esta última devoção deve ter substituído S. Sebastião (que,
entretanto, parece ter sido transferido para a capela de S. João de Segade): no Tombo de
1723, indica-se que os oragos eram, do lado da Epístola Nossa Senhora das Candeias, do
Evangelho o Cristo Cruciicado. Em 1758, o Dicionário Geográico do padre Luís Cardoso
adianta que os dois colaterais eram dedicados a Nossa Senhora do Rosário e às Santas
Chagas.
O orago da igreja foi S. Torcato e, portanto, devem ter, desde cedo, existido imagens do
santo. De facto, em 20 de Outubro de 1547 o visitador mandou colocar uma lâmpada
«diante de “São Torquade” e ordenou o emprego de cortinas para “cobrir o retábulo”. No
ano seguinte é reiterada a ordem de colocação de cortinas e foi recomendada a remoção
da pintura mural que representava o santo, substituída pelo retábulo. Como se referiu,
no inal do século passado, durante os trabalhos de restauro, descobriram-se vestígios de
uma pintura mural representando uma personagem com mitra e báculo (S.Torcato?), que
pode ter pertencido à pintura encoberta em 1548. Neste ano, a necessidade de construção
de um novo retábulo foi reiterada pelo visitador; ordenou que fosse executado até ao dia
de S. João desse ano e fosse pintado a óleo. Devem, portanto, pertencer a este retábulo
MARTINS Fausto Sanches. Normas artísticas das Constituições Sinodais de D. Frei Marcos de Lisboa. In: Frei
Marcos de Lisboa: cronista franciscano e bispo do Porto. Porto: Centro Interuniversitário da Espiritualidade/
Instituto de Cultura Portuguesa, 2002, p. 295 e ss; AFONSO, José Ferrão. Entre a continuidade e a reforma.
Algumas considerações sobre a Sé do Porto no século XVI. Museu, 4ª Série, 15 (2006), p. 111 e ss.
estudos de conservação e restauro | nº 1
87
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
as duas pinturas quinhentistas, representando S. Torcato e S. Tiago, hoje suspensas na
parede norte da capela de Santa Catarina, contígua à igreja. Foram descobertas em 1958,
ocultas atrás de várias camadas de papel, por um operário que procedia à limpeza dos
altares laterais e, ainda que desiguradas por uma espessa camada de tinta branca que
envolve as personagens e oculta o fundo pictórico, podem ser obra, com o retábulo de que
izeram parte, dos meados do século XVI.
Em 1723 as pinturas deviam estar ainda no altar-mor, “…fabricado ao modo romano inda
em bom uso…”. Nele estava ainda depositado, num sacrário apropriado, o Santíssimo
Sacramento. O antigo retábulo quinhentista, porém, será tema de disputa ainda no século
XVIII entre o Cabido da Colegiada de Guimarães e o visitador. Este último ordenara a sua
substituição por uma nova estrutura, com “recâmara” e camarim, visto que o antigo não
possuía esses elementos, indispensáveis, segundo ele, para a exposição do Santíssimo
Sacramento que até aí se efectuava num camarim portátil. Os cónegos não concordaram
e recorreram em 1765 para o arcebispo de Braga D. Gaspar de Bragança; este atendeu às
suas razões pois, como se airmou, só em 1802 o retábulo quinhentista viria a ser apeado.
Segundo uma descrição de Frei Silvestre da Conceição Xavier, o antigo retábulo possuía,
para além das pinturas de S. Tiago e S. Torcato, respectivamente dos lados da Epístola
e do Evangelho, ainda uma pintura representando Nossa Senhora. Sob as imagens de S.
Torcato e S. Tiago estavam S. Pedro e S. Paulo, os responsáveis, segundo o cronista, pela
vinda do popular santo para Espanha.
Mestre André: um italiano no Porto
Mestre André foi um mestre carpinteiro e de marcenaria, de origem siciliana, activo no
Porto entre 1537 e 1550. O pouco que se sabia sobre esse personagem e a sua obra devese ao investigador Artur de Magalhães Basto. Trabalhou na Sé do Porto para o bispo D. Frei
Baltasar Limpo (1537-1550), para quem construiu um coro alto em madeira, iniciado em
1537 em parceria com o mestre carpinteiro António Simões e, alguns anos depois (15461550), na concepção e execução do coruchéu da Sé, ou seja da cúpula em madeira que
fechou o cruzeiro do transepto. Teria ainda executado, segundo o mesmo investigador,
um coro para a igreja do convento franciscano do Porto. Em troca dos seus serviços, os
frades cederam-lhe uma casa em que habitava junto da Porta do Olival da mesma cidade.
Possuímos uma excelente descrição do coruchéu de mestre André e dos materiais que
utilizava, já que Magalhães Basto publicou as detalhadas referências ao andamento da
obra constantes de um dos livros da Fábrica da Sé portuense. Tratava-se de uma cúpula
de gomos, em madeira especialmente trazida do Alto Douro, com lanternim e varandim
interior; para a época e lugar, era uma arquitectura inovadora.
É possível que mestre André tenha tido um colaborador no projecto da cúpula, o arquitecto
italiano Francisco de Cremona, trazido de Roma e da obra de S. Pedro do Vaticano por D.
estudos de conservação e restauro | nº 1
88
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
Miguel da Silva (1480-1556), a quem se pode associar o mestre siciliano. Na realidade,
encontramo-lo a executar, em 1536, um novo coro alto na igreja monástica de Santo
Tirso de que D. Miguel era abade comendatário. Sendo assim, também a ele se podem
atribuir os dois retábulos colaterais da igreja matriz de S. João da Foz, projectada por
Francisco Cremona para o mesmo D. Miguel da Silva e iniciada c. 1527, da invocação
do Santíssimo Sacramento e de Nossa Senhora do Rosário, que já estariam concluídos
em 1555. Retábulos e igreja seriam destruídos em 1646, sendo boa parte dos materiais
reutilizados na construção da fortaleza de S. João Baptista que se ergueu no mesmo local e
que foi justiicada pelas Guerras da Independência com Espanha. É possível, portanto, que
mestre André tenha, como Francisco de Cremona, integrado o séquito que acompanhou D.
Miguel da Silva quando do seu regresso a Portugal em 1525; não surpreenderia que tivesse
sido ele o responsável pelo coro alto da Sé de Viseu que o mesmo D. Miguel ordenou em
1534 e, desse modo, será também admissível a participação de Francisco de Cremona no
desenho da cúpula do cruzeiro da Sé do Porto.
A cúpula de mestre André, concluída em 1550, não resistiria muito tempo. Em 1556,
sob o pretexto de que deixava entrar água da chuva, seria substituída por uma abóbada
manuelina em pedra (ig.2). Se, em artigo anterior, nos inclinamos para que a substituição
se tivesse icado a dever a razões puramente técnicas, hoje não descuramos a possibilidade
de as iniltrações terem sido apenas um pretexto para ela. Assim, a verdadeira razão para
a mudança poderia ser procurada no ambiente de profundas transformações culturais e
religiosas que se vivia na época e que se sintetizou bem nas iguras de D. Frei Baltasar
Limpo, uma igura ambígua e de charneira, e do seu sucessor D. Rodrigo Pinheiro (15521572), um decidido partidário da Contra-Reforma.
Os retábulos de S. Gonçalo
Em 1610, segundo um cronista dominicano setecentista, o antigo retábulo mor da igreja
de S. Gonçalo, que dataria da época da ediicação do templo (1540), seria substituído por
um novo de madeira. Algumas das peças dessa estrutura, que tinha esculpidas as armas
de D. João III, teriam sido reaproveitadas na fonte conventual a que o cronista dá a curiosa
designação de “ Fonte do Pouco Sizo”. Outras teriam sido distribuídas pela ante sacristia
e o antecoro da igreja. É possível que esse retábulo em pedra tivesse resultado de uma
visita de 1545, em que foi ordenada a construção de um retábulo mor na igreja. Também
é altamente provável que a “Fonte do Pouco Sizo” mencionada seja a que hoje se encontra
a norte do convento, frente ao mercado. Inclui elementos de diversas épocas, entre os
quais sobressaem azulejos de padrão seiscentistas, um escudo real e outros fragmentos
escultóricos. Alguns deles, incluindo as cabeças de anjo e a cartela central em que se
representou S. Gonçalo, podem ter pertencido ao retábulo de pedra original (ig.2).
António Cardoso refere-se a essa fonte aludindo às semelhanças entre a cartela de S.
estudos de conservação e restauro | nº 1
89
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
Gonçalo e as que se encontram, no interior da igreja, sobre a arcaria das colaterais. Anota
a sua ainidade com outras, existentes na igreja do convento compostelano de S. Martinho
Pinário, obra de Mateus Lopes (1542-1603). O pressuposto da airmação de António Cardoso
é que teria sido Mateus Lopes o responsável pela obra da igreja de S. Gonçalo. Sabe-se
hoje, porém, que ela se deve atribuir, no essencial, a Manuel Luís (act.1559-1604), que
a dirigiu entre 1581 e 1585, tendo-lhe sucedido, em 1586, Mateus Lopes. Manuel Luís foi
muito marcado pela obra do escultor e arquitecto coimbrão de origem francesa João de
Ruão (act. 1530-1580) e teria executado na igreja de S. Gonçalo, entre esses anos, um
projecto que poderia datar dos inais da primeira metade da década de sessenta. Assim,
a origem das cartelas deverá estar em Coimbra e João de Ruão, não em Mateus Lopes.
Este apenas adoptaria um tipo que, mais tarde, aplicaria na Galiza. É, portanto, possível
que as cartelas, quer da fonte, quer do interior da igreja, se integrem no ambiente do
antigo retábulo mor de pedra e que este se deva a um mestre muito próximo do escultor
e arquitecto francês.
Se D. João III tinha expressamente ordenado que o túmulo de S. Gonçalo, que se situava
na capela-mor da antiga igreja e, por conseguinte, o retábulo sobre ele, eram intocáveis,
Filipe I, patrocinador do novo templo que se iniciou em 1581, verá neste empreendimento,
dada a popularidade do santo, uma boa oportunidade de legitimar o seu poder recente.
Desse modo colocará as suas armas e uma inscrição alusiva com a data de 1585 à entrada
da capela-mor; concluída a igreja algumas décadas depois, a vontade de D. João III
teria sido esquecida e o seu retábulo apeado. Como se referiu, isso viria a suceder em
1610 (ou 1619, segundo outras fontes). O novo retábulo em madeira foi desenhado pelo
imaginário vimaranense João Ribeiro; por sua vez, viria a dar lugar no século XVIII à actual
estrutura joanina. Restaram, contudo algumas peças do retábulo seiscentista, em muito
mau estado de conservação, disseminadas por várias dependências do convento, entre
elas um “Cristo com a Cruz às Costas Ajudado por São Gonçalo”. Sobressai entre elas,
pela sua elevada qualidade, a pintura a óleo sobre madeira representando “Cristo Atado à
Coluna”, actualmente na sacristia. No retábulo joanino substituiu-se a pintura seiscentista
pelo camarim e trono destinados à exposição do Santíssimo. Essa fora exactamente, pela
mesma época, a pretensão do visitador de S. Torcato; só que aí depararia com a oposição
do grupo, poderoso e determinado, dos cónegos da Colegiada de Guimarães.
Conclusão
Nos três casos referidos, as razões das substituições, bem como a sua cronologia, foram
diversas. Se na Sé do Porto apenas podemos conjecturar sobre as verdadeiras causas que
levaram ao apear da cúpula de mestre André, sabemos de fonte segura que a demolição
da Igreja da Foz foi justiicada por razões militares. O que, contudo, não deixa de ser
extremamente revelador relativamente à mentalidade e ambiente da época. No caso de
estudos de conservação e restauro | nº 1
90
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
S. Torcato, se as directivas partiram, canonicamente, dos visitadores, o processo seria
adiado por resistências originárias do próprio corpo eclesiástico. Saliente-se ainda que em
S. Torcato a colocação dos retábulos nos meados do século XVI originou a ocultação de
pinturas murais anteriores
Referências
AFONSO, José Ferrão. A herança do muratore e o caminho de Coimbra: consuetudo,
sprezzatura e a arquitectura religiosa do Noroeste português na segunda metade do século
XVI. Comunicação apresentada ao 2º Congresso Histórico de Amarante. Amarante, Maio
2008 (no prelo).
AFONSO, José Ferrão. Entre a continuidade e a reforma. Algumas considerações sobre a Sé
do Porto no século XVI. In: Museu, 4ª Série, 15 (2006).
AFONSO, José Ferrão. S. Torcato [texto policopiado]. Guimarães [s. l.], 2000.
BASTO, Artur de Magalhães. A Sé do Porto, Novos dados documentais relativos à sua
igreja. Separata do Boletim Cultural da Câmara Municipal do Porto (Porto), 3, fasc. 3-4
(1946).
BASTO, Artur de Magalhães. Apontamentos para um dicionário de artistas e artíices
que trabalharam no Porto do século XV ao século XVIII. In: Boletim Cultural da Câmara
Municipal do Porto (Porto) 20, fasc. 3-4, (Setembro-Dezembro 1957).
BRANDÃO, Domingos de Pinho. Obra de talha dourada, ensamblagem e pintura na cidade
e na diocese do Porto. Subsídios para o seu estudo. Documentação I. Séculos XV a XVII.
Porto: Diocese do Porto, 1984.
CARDOSO, António. O convento de S. Gonçalo de Amarante, utilizações e reutilizações. In:
Monumentos (Lisboa), 3, (1995).
MOREIRA, Rafael. D. Miguel da Silva e as origens da arquitectura do Renascimento em
Portugal. In: Mundo da Arte. Revista de Arte, Arqueologia e Etnograia (Coimbra), 2ª Série,
1 (Abril, Maio, Junho 1988).
MOREIRA, Rafael. Um exemplo: São João da Foz, de igreja a fortaleza. In: A arquitectura
militar na expansão portuguesa. Porto: CNCDP, 1994.
SERRÃO, Vítor. Cristo Atado à Coluna. O Corpo Ferido na Árvore. In: Catálogo da Exposição
comemorativa dos 500 anos da Festa das Fogaceiras em honra de S. Sebastião. Santa
Maria da Feira: Câmara Municipal de Santa Maria da Feira, 2005.
Nota biográica
Licenciado em História, variante de Arte, pela FLUP; Mestre em História, variante de Arte
pela FLUP; Doutorado em Teoria e História da Arquitectura pela ETSAB da UPB. Assistente
estudos de conservação e restauro | nº 1
91
Porque se destroem e substituem obras de arte?
Três exemplo da época moderna, em S. Torcato, Porto e Amarante
José Ferrão Afonso
Regente da E. Artes da UCP/CRP. Investigador do CITAR da E. Artes da UCP/CRP. Domínios
de Investigação: Arquitectura e História Urbana do Porto no século XVI; História da Arte da
Época Moderna. E-mail: jafonso@porto.ucp.pt.
Figura 1 - Abóbada do cruzeiro da Sé do Porto, que substituiu a cúpula de mestre André
Figura 2 – Fonte (do «Pouco Sizo»?) da cerca do convento de S. Gonçalo de Amarante
estudos de conservação e restauro | nº 1
92
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o
conhecimento sobre esses materiais em Portugal no
início do século XX
António João Cruz
Resumo
Sob a forma de dicionário, são apresentados uns apontamentos manuscritos elaborados
provavelmente na década de 1920 sobre a composição dos pigmentos utilizados em
pintura e equivalências entre os respectivos nomes. O seu autor, não identiicado, tinha
experiência de preparação de pigmentos e signiicativos conhecimentos de química. O
dicionário, com cerca de 150 entradas, pretende constituir um instrumento de trabalho
útil para a interpretação das referências a pigmentos em fontes documentais da época.
Além disso, permite saber quais os pigmentos com que poderá lidar uma intervenção de
conservação e restauro de pintura do início do século XX.
Palavras-chave
Pigmentos, nomenclatura, composição química, tratados técnicos, dicionário; Portugal.
Abstract
In this paper some notes are presented in a dictionary format about composition of pigments
applied in painting and their actual equivalence. These manuscripts were probably written
in the 1920’s and their non-identiied author had considerable experience in pigments’
preparation and also solid chemistry knowledge. The dictionary presents 150 entries and
aims to become a useful tool for the interpretation of pigments references in documental
sources from this time. Besides it allows identifying the pigments a conservator-restorer
may ind while performing a conservation intervention on an early 20th century painting.
Keywords
Pigments, nomenclature, chemical composition, technical treaties, dictionary, Portugal.
Resumen
Bajo la forma de diccionario, se presentan unos apuntes manuscritos elaborados
probablemente en la década de 1920 sobre la composición de los pigmentos utilizados
en pintura y equivalencias entre los respectivos nombres. Su autor, no identiicado, tenía
experiencia en la preparación de pigmentos y signiicativos conocimientos de química. El
diccionario, con casi 150 entradas, pretende constituir un instrumento de trabajo útil para
estudos de conservação e restauro | nº 1
93
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
la interpretación de las referencias a pigmentos en fuentes documentales de la época.
Además, permite saber cuales son los posibles pigmentos utilizados en intervenciones de
conservación y restauración de pinturas al inicio del siglo XX.
Palabras clave
Pigmentos, nomenclatura, composición química, tratados técnicos, diccionario, Portugal.
Introdução
Na passagem do século XIX para o século XX já estavam disponíveis no comércio quase
todos os pigmentos inorgânicos modernos destinados ao uso dos artistas. Com efeito, em
resultado do grande desenvolvimento da química, o século XIX assistiu ao aparecimento
de um grande número de pigmentos sintéticos, alguns dos quais baseados em elementos
químicos recém descobertos, que abriram à pintura novas possibilidades de cor (Barnett et
al. 2006; Bomford et al., 1990; Cruz, 2004). Nessa ocasião faltavam apenas o vermelho de
cádmio, que icou disponível comercialmente cerca de 1910, e o branco de titânio, colocado
à venda em 1918, além de outros pigmentos com muito menor importância.
Aos poucos, estes materiais modernos foram substituindo alguns pigmentos tradicionais,
menos vantajosos do ponto de vista da cor, da estabilidade, da toxicidade ou do custo.
Cerca de 1900 os materiais dos artistas estavam disponíveis prontos a usar, vendidos em
estabelecimentos mais ou menos especializados. Essa produção e esse comércio já em
inais do século XVIII tinham alguma importância, mas foi a partir de meados do século
XIX que a situação se tornou mais generalizada e ganhou maior dimensão sobretudo com
o aparecimento dos tubos de tinta colapsáveis, inventados na década de 1840 (Ayres,
1985:126-133; Bomford et al., 1990). No início do século XX circulavam em Portugal tubos
de tinta das marcas Winsor & Newton e Lefranc (Cruz, 2005), entre outras, vendidos em
estabelecimentos como A Favrel Lisbonense, de José Netto Varella, fundada em Lisboa em
1891 (Ferreira et al., 2007).
Em países como a França, onde foram desenvolvidos muitos dos novos materiais, a
adopção destes foi entusiástica, particularmente pelos pintores impressionistas (Bomford
et al., 1990:55). Também em Inglaterra, graças a uma grande actividade na área do
fabrico, preparação e comercialização de pigmentos, alguns pintores, como J. M. W.
Turner, começavam a usar os novos pigmentos logo que os mesmos icavam disponíveis
(Townsend, 1993, 2002).
Mas sobre o que se passou em países periféricos como Portugal muito pouco se sabe.
Alguns indícios sugerem que a adopção dos novos materiais foi muito demorada. Os novos
pigmentos, alguns deles surgidos no início do século XIX, só em inais do século começaram
estudos de conservação e restauro | nº 1
94
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
a ser mencionados com alguma frequência na literatura técnica publicada em português
(Santos & Cruz, no prelo). Além disso, ainda cerca de 1920, os pigmentos modernos
tinham reduzida importância na paleta de um pintor como Columbano (Cruz, 2005).
Independentemente dessa adopção possivelmente lenta dos novos materiais, as referências
documentais aos pigmentos, sejam os modernos, sejam os tradicionais, continuam a
colocar importantes problemas de interpretação. Sucede que muitas vezes há apenas um
nome e não se sabe ou, pelo menos, não se tem a certeza acerca de qual é o material a
que corresponde. Este é um problema bem conhecido colocado pela literatura técnica mais
antiga e, de uma forma geral, um problema tão mais complicado quanto mais antiga é
a fonte (Clarke, 2001:26-34; Cruz, 2004). Neste contexto, fontes documentais de inais
do século XIX ou princípios do século XX não deveriam suscitar grandes dúvidas. No
entanto, não é isso que sucede, como ainda recentemente foi relatado a respeito de alguns
pigmentos azuis (Santos & Cruz, no prelo). Mesmo sobre algumas designações actuais há
dúvidas sobre a composição química correspondente, ainda que esses pigmentos estejam
disponíveis no comércio e, assim, seja possível dispor de amostras dos materiais em
causa – dúvidas estas que neste caso, contudo, podem ser esclarecidas através de análise
química dessas mesmas amostras (Gil, 2009).
Um conjunto de apontamentos manuscritos do início do século XX, pertencentes à biblioteca
particular do autor deste artigo, parece constituir um instrumento de trabalho útil quer para
a interpretação da literatura técnica portuguesa, quer para a interpretação das referências
a pigmentos encontradas noutras fontes documentais da época. Isso deriva de o seu autor,
não identiicado, mas com directo interesse na preparação de pigmentos, ter pretendido
estabelecer a equivalência entre as várias designações dos principais pigmentos e registar
a respectiva composição ou, ainda mais detalhadamente, a matéria-prima a partir dos
quais são, ou eram, obtidos.
Informação deste tipo não está disponível na literatura técnica publicada em Portugal cerca
de 1900. Com efeito, pelo menos entre os tratados mais conhecidos, alguns apresentam
apenas uma lista de pigmentos sem qualquer outra indicação (Macedo, 1898), enquanto
outros fornecem mais algumas informações mas só para um restrito número de materiais
(Corrêa, 1931). Considerando, assim, o interesse desses apontamentos manuscritos para
o conhecimento dos pigmentos disponíveis para os artistas em Portugal no início do século
XX, publica-se aqui, sob a forma de dicionário, a informação por eles transmitida.
Os apontamentos manuscritos e o seu autor
Os apontamentos encontram-se em folhas de papel, com diferentes características, mas,
em grande número de casos, obtidas por corte a meia altura de cadernos de papel almaço.
Embora pelo conteúdo e pelas características do papel seja possível agrupar e ordenar
estudos de conservação e restauro | nº 1
95
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
algumas dessas folhas, de uma forma geral os apontamentos correspondem a um conjunto
heterogéneo e desordenado de notas. Estes apontamentos encontravam-se dentro de um
livro (Lemoine & Manoir, sd), que contém algumas anotações manuscritas aparentemente
da mesma mão, formando, apontamentos e livro, um conjunto. O livro não tem data de
publicação, mas sabe-se que saiu dos prelos em 1898 (Alexander, 1970: n.º 323). Não foi
possível apurar nada de útil acerca da proveniência do conjunto. O livro tem na folha de
ante-rosto uma assinatura de posse, não identiicada (Fig. 1).
Figura 1 - Provável assinatura do autor dos apontamentos manuscritos na
página de ante-rosto do livro onde se guardavam os apontamentos.
Por outro lado, entre os apontamentos encontrava-se um catálogo de produtos químicos,
pigmentos e corantes da empresa Chemical Produces, Ltd, com sede na Rua da Madalena,
45, 1.º, Lisboa (Fig. 2). O catálogo, com 12 páginas, com espaços em branco para a
colocação dos preços dos materiais, data da década de 1920.
Figura 2 - Catálogo de produtos químicos, pigmentos e corantes, da década de 1920,
que se encontrava juntamente com os apontamentos manuscritos.
estudos de conservação e restauro | nº 1
96
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Parte dos apontamentos é dedicada à “sinonímia das cores empregadas em pintura”, tal
como está registado no topo de uma das folhas (Fig. 3) e baseia-se muito no livro em
que se guardavam os apontamentos. Outra parte apresenta algumas ichas breves sobre
a composição ou preparação de alguns pigmentos (Fig. 4). Sete páginas são dedicadas
à tradução integral do capítulo do livro sobre o azul ultramarino (Lemoine & Manoir, sd:
65-169). Finalmente, há um conjunto de folhas, com aspecto muito mais descuidado, por
vezes riscadas, com cálculos de quantidades e custos associados à preparação de alguns
pigmentos e informações sobre o resultado de algumas experiências a esse respeito (Fig.
5).
Figura 3 - Exemplo de página dos apontamentos dedicada à
“sinonímia das cores empregadas em pintura”.
Figura 4 - Exemplo de página dos apontamentos com ichas
sobre a composição e preparação dos pigmentos.
estudos de conservação e restauro | nº 1
97
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Figura 5 - Exemplo de página dos apontamentos com cálculos de quantidades e custos associados
à preparação de pigmentos e informações sobre o resultado de experiências.
Tudo isto permite concluir que os apontamentos manuscritos são posteriores a 1898,
provavelmente da década de 1920, e que o seu autor tinha experiência de preparação de
pigmentos e signiicativos conhecimentos de química.
Normas de transcrição
Dado o estado desorganizado dos apontamentos manuscritos, estes foram organizados sob
a forma de dicionário. Para cada pigmento mencionado é feita uma entrada, seguindo-se as
indicações encontradas sobre sinónimos e sobre a respectiva composição ou preparação.
No caso de em várias folhas existirem notas sobre um mesmo pigmento, as mesmas
foram numeradas. Havendo notas manuscritas relevantes no livro onde se guardavam os
apontamentos (Fig. 6), estas também foram acrescentadas sob um novo número.
Figura 6 - Exemplo de notas manuscritas no livro onde se guardavam os apontamentos.
estudos de conservação e restauro | nº 1
98
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Pela manifesta falta de novidade, não foram transcritas as mencionadas páginas sobre
o azul ultramarino e, pelo limitado interesse, não foram reproduzidos os registos sobre
experiências e cálculos de quantidades e custos.
Atendendo ao facto de se tratar de apontamentos evidentemente sem forma ainda
deinitiva, foi actualizada a ortograia, desenvolvidas as abreviaturas e, quando necessário,
corrigida a pontuação. No entanto, manteve-se a nomenclatura química da época e, assim,
por exemplo, cyanureto é apresentado como cianureto e não como cianeto. No Quadro
1, porém, estabelece-se a equivalência dos principais termos nessas circunstâncias. Para
facilitar a consulta, para a ordenação alfabética não foram consideradas as partículas, já
que por vezes há variações a esse respeito, e, por isso, por exemplo, amarelo mineral
surge antes de amarelo de Nápoles.
Entre parêntesis rectos é reconstituída informação em falta ou resumida informação
dispersa, assim como, de forma quase icónica, são apresentados alguns comentários sobre
a transcrição.
Residindo parte do interesse destes apontamentos na imagem que proporcionam sobre
o conhecimento a respeito dos pigmentos disponível em Portugal no início do século
XX, não se izeram correcções de conteúdo. Por outro lado, para este dicionário poder
ser um instrumento útil para a interpretação das referências a pigmentos em fontes
documentais da época, sempre que possível, especialmente para os principais pigmentos,
acrescentou-se no inal de cada entrada, em itálico, a correspondente designação genérica
actual (sem ter em conta variantes), ou a principal, no caso de haver várias. Para isso,
além da bibliograia de referência sobre o assunto, designadamente alguns dicionários
particularmente interessados nos aspectos históricos (Eastaugh et al., 2004; Guineau,
2005; Perego, 2005), foi usada a informação apresentada numa das fontes em que se
basearam os apontamentos (Lemoine & Manoir, sd). Nem sempre foi estabelecida essa
equivalência. As razões para isso, entre outras, deveram-se a: ausência de especíico
nome corrente; contradição entre a informação apresentada; diiculdade do caso e falta de
espaço para discussão pormenorizada da situação.
Deve notar-se que as equivalências indicadas, seja de nomenclatura química, seja de
nomenclatura dos pigmentos, são válidas apenas no contexto em que os termos são
mencionados nestes apontamentos. Assim almagre é indicado como sinónimo de vermelho
de Marte, ou seja, como é evidente da descrição, um pigmento sintético, quando noutros
contextos poderá corresponder a um ocre vermelho, ou seja, um pigmento natural. De
forma análoga, o termo cal designa nestes apontamentos o elemento cálcio quando noutros
contextos pode corresponder efectivamente a cal, ou seja, o óxido ou o hidróxido de cálcio.
Convém ainda sublinhar que a indicação actual regista o nome genérico presentemente
atribuído e não implica que o pigmento seja actualmente usado.
estudos de conservação e restauro | nº 1
99
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Transcrição dos apontamentos manuscritos
Acetato de chumbo líquido - Extracto de saturno, acetato básico ou tribásico de chumbo,
etc. Acetato de chumbo cristalizado 300, litargírio 100, água destilada 900. Faz-se ferver
tudo até que o litargírio esteja dissolvido e sem que o licor marque 30 º no areómetro.
Deixa-se depositar. Filtra-se.
Acetato de chumbo neutro - Obtém-se atacando a quente o litargírio pelo ácido acético
(aquoso) e concentrando até marcar 42 º Baumé. Cristaliza-se.
Almagre - Mistura de óxido de cálcio e de ferro anidro ou ainda óxido de ferro anidro
(colcotar) e sulfato de cal (em qualquer dos casos são as substâncias bem trituradas e
depois peneiradas). Obtém-se cores mais ou menos claras segundo a quantidade dos
componentes. Actual vermelho de Marte.
Amarelo de açafrão.
Amarelo de antimónio - Mistura de antimoniato de chumbo e oxicloreto de chumbo e de
bismuto. Amarelo mineral superino. Actual amarelo de Nápoles.
Amarelo de botão de ouro - Cromato de zinco. Actual amarelo de zinco.
Amarelo brilhante - Sulfureto de cádmio. Amarelo de cádmio. Actual amarelo de cádmio.
Amarelo de cádmio - 1) Sulfureto de cádmio. 2) Sulfureto de cádmio. Obtém-se
precipitando um sal de cádmio pelo hidrogénio sulfure [sic] ou por um sulfureto solúvel,
que dá um precipitado amorfo dum belo amarelo alaranjado. Pode também obter-se por
uma corrente de ácido hidrossulfúrico, em substituição do hidrogénio sulfurado [sic].
Podem obter-se em 2 tons. Actual amarelo de cádmio.
Amarelo de Cassel - Amarelo de Turner. Amarelo de Paris. Amarelo de Verona. Amarelo
mineral. Oxicloreto de chumbo. Actual amarelo de Turner.
Azul Columbia - [Preparado a partir de solução de anilina a 10%.] Amassado com gesso
dá bom tinto mas escuro. Actual índigo.
Amarelo de cromo - 1) Amarelo aladin. Amarelo limão. Amarelo d’enxofre. Amarelo
laranja. Amarelo Spooner. Amarelo de Paris. Amarelo de Liepzig. Amarelo imperial.
Cromato de chumbo. 2) Cromato de chumbo (proto). Tratando uma solução de um sal de
chumbo pelo bicromato de potassa obtém-se um amarelo muito intenso e brilhante mais
ou menos claro segundo a quantidade do reagente (bicromato de potássio). Se porém
adicionarmos ao produto obtido algumas gotas de amónia líquida, passa ao amarelo cor
de laranja igualmente mais ou menos avermelhado segundo a quantidade de amónia.
Tratando depois o produto de qualquer dos amarelos obtidos pela potassa, ou [...] com
salitre e lavando a massa obtida depois de fria, passam estes a um vermelho denominado
vermelhão de cromo, ou vermelho austríaco. Actual amarelo de crómio.
Amarelo de cromo jonquilhe - Subcromato de chumbo. Actual amarelo de crómio.
estudos de conservação e restauro | nº 1
100
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Amarelo de cobalto - Nitrito duplo de cobalto e de potássio. Sal de Fischer. Actual amarelo
de cobalto.
Amarelo de Colónia - Mistura de cromato e de sulfato de chumbo. Actual amarelo de
crómio.
Amarelo de estanho - Sulfureto de estanho. Actual ouro musivo.
Amarelo de étoile - Tratando-se o carbonato de chumbo pelo bicromato de potássio
obtém-se um amarelo nos mesmos tons mas não tão intenso como o [amarelo de] cromo,
que tratado pela amónia produz resultados iguais ao [do amarelo de] cromo. Estrela.
Actual amarelo de crómio.
Amarelo de escórias - Antimoniato impuro de chumbo. Actual amarelo de Nápoles.
Amarelo de goma-guta - Actual goma-guta.
Amarelo indiano - 1) Euxantato de magnésia. 2) Euxantato de magnésia. Actual amarelo
indiano.
Amarelo inglês - 1) O protóxido de chumbo misturado em pequena proporção com o
cloreto de chumbo dá um produto amarelo mais ou menos carregado segundo as proporções
dos componentes, e que se emprega na pintura com os nomes de amarelo inglês, amarelo
de Nápoles, amarelo mineral, amarelo de Cassel e amarelo de Turner. 2) [Tinta preparada
a partir de amarelo de cromo e caulino ou amarelo de cromo e tijolo.] A confecção é
orientada de forma que o produto esteja sempre isento [?] de humidade e a incorporação
depois de feita bem a mistura deverá ser peneirada por peneira metálica grossa. Deverá
ser encaixotada logo e pesada quando sair em caixas que comportem 50 quilos. Devem
as caixas ser bem forradas de papel escuro. Azul é preferível. Pode substituir-se o caulino
pela argila branca depois de convenientemente tratada. Actual amarelo de Turner (1) e
amarelo de crómio (2).
Amarelo limão - Iodeto de chumbo.
Amarelo lacas.
Amarelo Mars - Óxido de ferro hidratado. Obtém-se precipitando uma solução de
deutossulfato de ferro (caparrosa verde) pelo carbonato de soda ou de potassa. Este
hidrocarbonato que se forma é verde sujo e passa ao amarelo pela absorção do oxigénio
do ar. Actual amarelo de Marte.
Amarelo de Marte - Óxido de ferro hidratado e de alumina. Actual amarelo de Marte.
Amarelo mineral - Turbito mineral. Sulfato de mercúrio precipitado.
Amarelo de Nápoles - Antimoniato de chumbo. Actual amarelo de Nápoles.
Amarelo ocre - Ocre amarelo. Ocre de rue. Terra de montanha. Actual ocre amarelo.
Amarelo de ouro - Amarelo à base de óxido de zinco.
estudos de conservação e restauro | nº 1
101
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Amarelo palha - Amarelo mineral. Subsulfato de chumbo.
Amarelo real - Amarelo de rei. Orpimenta. Trissulfureto de arsénico. Actual auripigmento.
Amarelo romano - Mistura de óxido e de sulfureto de zinco.
Amarelo siderite - Cromato de ferro.
Amarelo de Steinbuhl - Cromato duplo de cal e de potássio.
Amarelo de estronciana - 1) Cromato de estronciana. 2) Obtém-se fazendo precipitar um
sal de estronciana pelo bicromato de potássio, ou fervendo a solução com um excesso de
cromato de chumbo, pelo qual se precipita um belo amarelo. Actual amarelo de estrôncio.
Amarelo terra de Itália - Sesquióxido de ferro, de alumina e sílica. Actual ocre amarelo.
Amarelo terra de Siena natural - Actual Siena natural.
Amarelo ultramar - Cromato de barita. Actual amarelo de bário.
Azul de anil - Actual índigo.
Azul d’anilina.
Azul antigo - Azul do Egipto. Sal do cobre. Actual azul egípcio.
Azul de Anvers - Mistura de ferrocianureto de ferro e zinco. Azul mineral.
Azul de Bremen - Óxido de cobre hidratado.
Azul de cal - Nitrato de cobre e óxido de cálcio.
Azul celeste - Arseniato de cobre. Actual verde veronês.
Azul de cobalto - 1) Azul Thénard. Azul Leithener. Combinação de alumina e óxido de
cobalto. Aluminato de cobalto. 2) Esmalte. Óxido de cobalto. Actual azul de cobalto (1) e
esmalte (2).
Azul esmalte - Bleu d’azur. Azul royal (excelente). Azul de Schneeberg. Esmalte. Azul
gros ou azul a polvilhar. Salicato duplo de potassa e de cobalto. Actual esmalte.
Azul milori - Ferrocianureto de ferro. Actual azul da Prússia.
Azul de montanha artiicial - Cinzas azuis. Mistura de óxido de cobre e de cal. Actual
azul verditer.
Azul de montanha natural - Malaquite azul. Chessislite. Azurite. Cinzas azuis naturais.
Azul de cobre. Pedra d’Arménia. Azul mineral. Sesquicarbonato de cobre. Actual azurite.
Azul da Prússia - 1) Azul de Berlim. Azul de Paris. Azul de Saxe. Azul de mar. Azul novo.
Azul d’óleo. Azul d’aço. Azul hortense. Azul líquido. Ferrocianureto férrico. 2) Prussiato de
ferro e alumina. 3) Flor de anil. Obtém-se fazendo precipitar uma solução de sulfato férrico
por outra de prussiato amarelo de potássio. Solúvel no ácido oxálico, solução esta que
se emprega em tinta de escrever. Flor de anil ordinária. Faz-se uma solução de prussiato
estudos de conservação e restauro | nº 1
102
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
amarelo de potassa, e outra de sulfato ferroso e alúmen. 3 partes do primeiro sal, 2 do
segundo. Depois precipita-se pela 1.ª solução tomando cor verde azul, coa-se o precipitado
e junta-se pouco a pouco ácido muriático até se tornar bem escuro. É essencial deitar mais
ácido do que menos. Lava-se bem e seca-se à sombra. Actual azul da Prússia.
Azul de Saxe - Ácido sulindigotique. Carmim d’anil. Azul solúvel. Azul químico. Azul
destilado. Azul em licor. Azul em composição. Azul solúvel. Ceruleine. Ceruleu-sulfato.
Azul de tournesol.
Azul Turnbull - Ferrocianureto férrico (ferroso). Actual azul da Prússia.
Azul Ultramar - Azul do Oriente. Azul Guimet. Azul Gmelin. Sulfato e salicato de alumina.
Actual azul ultramarino.
Azul Ultramar natural - Lápis-lazúli. Pedra azul. Salicato duplo de alumina e de soda.
Actual azul ultramarino natural.
Branco de antimónio - Branco stibiado. Óxido de antimónio. Flores argentinas. Neve de
antimónio. Actual branco de antimónio.
Branco de barita - Sulfato de barita. Spato pesado. Baritina. Branco ixo. Barita. Actual
branco de bário.
Branco de bismuto - Subnitrato de bismuto. Subazotato de bismuto. Oxicloreto de
bismuto.
Branco de chumbo - 1) Alvaiade de chumbo. Carbonato de chumbo. Branco de prata.
Branco de Krems. Cerusa de Roterdão. Cerusa do Clichy. Cersua de Lille. Cerusa de 2)
Mulhouse. Sulfato de chumbo. Actual branco de chumbo (1) e sulfato de chumbo (2).
Branco de cobre - Sulfocianureto de cobre.
Branco cré - Carbonato de cal. Branco de Espanha. Branco de Meudon. Branco de Tróia.
Branco de Bougival. Branco petit. Actual cré.
Branco de Hamburgo - Mistura de 1 parte de carbonato de chumbo e 2 partes de barita.
Actual branco de chumbo.
Branco de Holanda - Mistura de ¼ de carbonato de chumbo e ¾ de barita. Actual branco
de chumbo.
Branco laca - Subcarbonato de alumina.
Branco metálico - Mistura de sulfureto de zinco e sulfato de barita. Actual litopone.
Branco transparente.
Branco de tungstene - Tungstato de bário e de zinco.
Branco de Veneza - Mistura de partes iguais de carbonato de chumbo e barita. Actual
branco de chumbo.
estudos de conservação e restauro | nº 1
103
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Branco de zinco - 1) Alvaiade de zinco. Óxido de zinco. Branco de neve. Branco tremie.
2) Plumbato de zinco. Produto natural contendo óxido de zinco e óxido de chumbo. 3)
Preferido. Actual branco de zinco (1).
Carbonato de chumbo - Alavaiade de chumbo. Este sal precipita-se decompondo qualquer
dissolução de um sal de chumbo por um subcarbonato alcalino, ou fazendo passar uma
corrente de ácido carbónico pela dissolução de um subsal de chumbo, no qual caso o excesso
da base passa ao estado de subcarbonato. O processo Clichy imaginado por Thénard consiste
em decompor o acetato tribásico por uma corrente de anidrido carbónico. Em Inglaterra
prepara-se expondo a uma corrente de anidrido carbónico o litargírio humedecido por uma
pequena quantidade de ácido acético. Emprega-se na pintura na fabricação do betume e
do mínio. O processo holandês consiste em expondo lâminas de chumbo enroladas em
espiral aos vapores de vinagre, que existe dentro de potes vidrados tapados também com
lâminas de chumbo, e enterrados por séries em estrume de cavalo destinado a fornecer
pela fermentação o calor necessário para a volatilização do vinagre e combinação com o
chumbo – em presença do ar e o anidrido carbónico [sic], para decompor o acetato básico
que primeiro se forma produzindo o carbonato de chumbo e acetato neutro. Para separar
o alvaiade batem-se as lâminas e lava-se o produto para se lhe tirar o acetato de chumbo.
Seca-se e depois mói-se. Actual branco de chumbo.
Carbonato de cobre (sub) - Azul de montanha. Cinzas azuis. Cobre carbonatado azul.
Azurite. Hidrocarbonato de cobre. Ocra veneris. Pedra d’Arménia. Verde montanha. Cinzas
verdes. Cobre carbonatado verde. Terra verde. Malaquita. Carbonato cúprico. O carbonato
de cobre precipita-se quando se decompõe uma solução de cobre pelos subcarbonatos de
soda ou de potassa. Este sal é verde azulado, pulverulento, insolúvel, decomponível pelo
calor com evolução do ácido, icando livre o óxido.
Carbonato de zinco - Alvaiade. Obtém-se precipitando uma solução de 200 gramas de
sulfato de zinco em 1000 gramas d’água por outra de 220 gramas de carbonato de soda
dissolvido em 1000 gramas de água. Seca-se em estufa a 50º e o precipitado contém 73
% d’óxido de zinco que pela calcinação passa totalmente a óxido.
Carmim - Obtém-se tratando uma decocção forte de cochonilha pelo cremor tártaro ou
mesmo fervendo as duas substâncias juntas. Actual cochonilha.
Carmim Azul - [Preparado a partir de anil e ácido sulfúrico concentrado.] O anil precipitado
desta solução pela potassa, seco e tornado em bolas, constitui o carmim d’anil. A solução
do anil no ácido sulfúrico denomina-se anil líquido ou carmim azul. Actual índigo.
Castanho Breslau - Ferrocianureto de cobre. Castanho de Hatchette.
Castanho de Espanha - Castanho de Eisenach. Sombra de Colónia.
Castanho de Inglaterra - Castanho da Suécia. Castanho de Van Dick.
estudos de conservação e restauro | nº 1
104
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Castanho de manganês - Castanho mineral.
Castanho de Marte - Óxido de ferro e alumina calcinado.
Castanho da Prússia - Produto da calcinação do azul da Prússia.
Castanho químico - Ferrocianureto de cobre. Castanho Breslau.
Castanho de Van Dick - Castanho da Suécia. Castanho de Inglaterra.
Cinábrio verde.
Cinzas verdes - Mistura de arseniato de cobre e gesso (sulfato de cal).
Cloreto de chumbo - Muriato ou oximuriato de chumbo. Pode obter-se precipitando o
subacetato de chumbo líquido étandu [sic] pelo sal marinho. Lava-se e seca-se o precipitado
que é branco e insolúvel (foncé).
Colcotar - Rouge d’Inglaterra, óxido de ferro anidro. Obtém-se aquecendo fortemente,
e com o contacto do ar, o deutossulfato de ferro do comércio (caparrosa verde), depois
lavando o produto até que a água não dê precipitado azul pelo cianureto de potássio.
Actual vermelho de Marte.
Cromato de cal - Obtém-se fervendo um leite de cal em excesso de cromato de chumbo.
Obtém-se uma solução que por evaporação cristaliza em lâminas acetinadas de um amarelo
escuro.
Cromato de zinco - [Pigmento amarelo preparado a partir de sulfato de zinco e de um
bicromato.] Actual amarelo de zinco.
Flor de anil - Azul da Prússia ou de Berlim. Prussiato de ferro. Hidrocianato de ferro.
Cianureto doble [sic] de ferroidratado. Cianureto ferroso férrico. Ferrocianureto férrico.
Obtém-se decompondo uma solução de sulfato de ferro, bastante concentrada e bastante
suroxidada o ferro e para isso basta abandonar a solução ao contacto do ar por alguns dias,
e verter nesta, pouco a pouco, outra solução concentrada de prussiato amarelo de potassa
até cessação de precipitado, repousa-se e decanta-se e coa-se dividindo-se em fragmento
para facilitar a dessecação. Actual azul da Prússia.
Laca amarela - 1) Óxido de ferro aluminado. 2) Alúmen tinto pelo avinhão. 3) Stil de
grain. Faz-se um cozimento forte de lírio amarelo dos tintureiros, junta-se fervendo uma
pouca de pedra-hume e em estando concentrado o cozimento junta-se quanto baste de
alvaiade de chumbo, coa-se, seca-se e reduz-se a trociscos.
Laca branca.
Laca de campeche - Alumina tinta pelo campeche. Sinopla.
Laca carminada - 1) Alumina tinta pela cochonilha. 2) Obtém-se tratando uma decocção
forte de cochonilha pelo hidrato de alumina ou fervendo durante algum tempo as duas
substâncias até a alumina tomar a si toda a matéria corante. Actual cochonilha.
estudos de conservação e restauro | nº 1
105
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Laca de garance - 1) Alumina tinta pela garance. 2) Obtém-se tratando a decocção da
ruiva dos tintureiros pelo hidrato de alumina como ica dito para a laca carminada. Pode
ser mais ou menos escura conforme a decocção ser mais ou menos forte. Actual garança.
Laca verde.
Laca vermelha.
Laca violeta.
Mínio - Zarcão. Óxido vermelho de chumbo. Actual mínio.
Óxido de zinco - Obtém-se queimando o zinco em compridas mulas e deitando na água
o produto da combustão para separa o metal não oxidado. O metal vai ao fundo e o óxido
é decantado rapidamente para outro vaso onde se deposita. Para pintura é mais branco e
não é venenoso como o carbonato de chumbo. Actual branco de zinco.
Roxo rei - Ignoro a procedência ou preparação do que se encontra no mercado. Roxo rei
pode obter-se por mistura de vária proporção de azul e almagre e preto.
Sanguínea - Óxido de ferro argiloso. Vermelho inglês. Hematite. Caput mortuum. Terra
de Siena vermelha. Colcotar.
Sinopla ou laca roxa - Obtém-se fazendo um forte cozimento de 1 quilo de pau-brasil
em 3 litros de água. Concentra-se pela ebulição, até se reduzir a metade do volume, coase e juntam-se 150 gramas de alúmen (hidrato) o que cora o líquido de vermelho que se
torna roxo a avermelhado pela adição vagarosa dum soluto de 150 gramas de carbonato
de soda. O precipitado que se forma seca-se e reduz-se a trociscos. Actual brasil.
Sinopla ordinária - Obtém-se fazendo um forte cozimento de pau-brasil. 1 quilo de
rasuras de pau em 3 litros de água. Concentra-se o cozimento pela ebulição até se reduzir
a metade, depois coa-se, junta-se 150 gramas de alúmen (hidrato), junta-se depois
carbonato de cal ou branco de Espanha a quantidade que a tinta possa atingir e segundo
se queira mais ou menos intensa a cor, coa-se e seca-se à sombra. Actual brasil.
Verde de água - Acetato neutro de cobre. Verde preparado. Verde destilado. Verde
cristalizado. Verdete. Cristais de Vénus. Verde gris. Verdete de Montpellier. Actual verdigris.
Verde d’anilina.
Verde de Bremen - Hidrato de óxido de cobre. Cinzas verdes. Venenoso e alterável à luz.
Verde de Brunswick - Oxicloreto de cobre hidratado.
Verde Casselli - 1) O verde Casselli obtém-se da mistura de 1 parte de bicromato de
potassa e 3 partes de gesso. 2) Produz um verde pouco intenso amarelado.
Verde Casselmann - Acetato de cobre. Este verde é duma cor assaz linda. Actual verdigris.
Verde China.
estudos de conservação e restauro | nº 1
106
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Verde cinábrio - Mistura de cromato de chumbo e ferrocianureto férrico. Actual verde de
crómio.
Verde cromo - 1) Sesquióxido de cobre hidratado. 2) Produz um verde escuro facilmente
reduzível a pó – mas de mau tom. Actual viridian.
Verde Dingler - Modiicação do verde Mathieu Plessis.
Verde erva de Salvetat - Óxido de cromo aluminoso.
Verde esmeralda - Hidrato de sesquióxido de cromo. Verde Pannetier. Verde de Guignet.
Verde de cromo. Verde étoile. Não é tóxico. Insensível à luz. Absolutamente ixo. Actual
viridian.
Verde Gentéle - Stanato de cobre.
Verde inglês - 1) Mistura de verde Scheele e sulfato de barita e de cal. 2) É geralmente
produto do jaune de crome e azul da Prússia quasi sempre carregados de sulfato de barita.
Uma boa cor: tomam-se azul e amarelo verdosos quanto possível, se são avermelhados
a cor é pouco viva e o tom esbatido. A sua mistura: o mais perfeita possível, para isso
misturam-se os produtos ainda em pasta, ou melhor prepara-los conjuntamente. Para
evitar o regresso do amarelo precipita-se este com um excesso de chumbo em meio ácido;
ou operando em presença de pequena quantidade d’ácido oxálico ou de ferrog[...] amarelo
de maneira a precipitar estes sais cuja presença é favorável ao produto inal. Os produtos
comerciais: os verdes assim obtidos são carregados, ou no momento da precipitação ou
com o produto já constituído mas ainda em pasta. Estes verdes adicionados de negro de
ferro ou tons castanhos escuro formam os verdes: verde de canas, verde vagos, verdes
russos. Actual verde esmeralda (1) e verde de crómio (2).
Verde malaquita - Verde montanha. Verde de Braunschweig.
Verde Mathieu Plessi - Fosforeto de cromo.
Verde mineral - Mistura de cerusa, óxido de cobre, malaquita e acetato de chumbo.
Verde nature - Mistura de óxido de cromo e ácido pícrico.
Verte Pelouze - Verde Berlim. Verde da Prússia.
Verde Rinmann - Verde de cobalto é uma cor muito ina e bonita.
Verde Rosenstiehl - Manganto de barita.
Verde Scheele - Mistura de óxido e arseniato de cobre. Tipo do verde inglês.
Verde Schweinfurt - Mistura de acetato e arseniato de cobre. Muito venenoso. Os verdes
derivados deste são: verde inglês, metiz, Perroquet, imperial, Viena, Neuwiell, Kirschberger.
Actual verde esmeralda.
Verde taloclore.
estudos de conservação e restauro | nº 1
107
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Verde terra - Terra verde. Produto natural. Actual terra verde.
Verde turquesa.
Verde ultramar - Verde Leykauf.
Verde veronesa [sic] - Arseniato de cobre.
Verde vessie - O verde vessie é só empregado a água.
Verde zinco.
Vermelhão - Sulfureto de mercúrio por via húmida. Triture durante algumas horas 300
partes de mercúrio, 114 de lor de enxofre, junte ao sulfureto negro que se obtém 75
partes de potassa e 400 partes de água. Submete-se a mistura a uma temperatura de 45 º
pouco mais ou menos e tritura-se com pilão logo que o precipitado tenha tomado uma cor
escarlate. Lava-se com água quente e seca-se o produto obtido. Actual vermelhão.
Vermelhão austríaco - Obtém-se tratando o cromato de chumbo por uma solução de
potassa, ou fundindo o cromato de chumbo com nitrato de potassa e lavando a massa com
água depois de fria. Actual laranja de crómio.
Vermelhão de cromo - Obtém-se pela mesma forma e processo que o vermelhão
austríaco, pois são o mesmo produto. Actual laranja de crómio.
Vermelhão da Índia - Sulfureto de mercúrio por via seca. Extrai-se do cinábrio natural
ou artiicial. Compõe-se de 100 partes de mercúrio e 18 de enxofre que pela trituração
dão um sulfureto em pó muito negro. Segundo Guibourt obtém-se fazendo passar ácido
hidrossulfúrico pelos sais de deuto-óxido de mercúrio. Tem cor negra e sublima-se na
totalidade sem decomposição tomando a cor do vermelhão. Actual vermelhão.
Vermelho almagre - Vermelho inglês. Vermelho de Itália. Hematite vermelha. Ferro
oligiste. Ferro oxidado. Ferro especular. Terra rosa. Vermelho d’Anvers. Etc. Actual ocre
vermelho.
Vermelho de arsénico - Bissulfureto de arsénico. Resalgar. Vermelho rubis. Rubi
d’arsénico. Orpimente. Actual realgar.
Vermelho coralina - Vermelho de Jericó. Vermelho de fenile. Tropéoline. Péonine. Aurine.
Vermelho cromo - Pate orange. Cromato de chumbo. Vermelho austríaco. Actual laranja
de crómio.
Vermelho indiano - Óxido de ferro argiloso. Actual vermelho ocre.
Vermelho Marte - Sesquióxido de ferro e alumina. Actual vermelho de Marte.
Vermelho da Prússia - Vermelho de Nuremberg.
Vermelho púrpura - Cromato tribásico de mercúrio. Cromato de prata.
Vermelho Veneza.
estudos de conservação e restauro | nº 1
108
Entre a tradição e a modernidade:
os pigmentos ao dispor dos artistas e o conhecimento sobre esses materiais
em Portugal no início do século XX
António João Cruz
Zarcão - Mínio de chumbo. Óxido salino. Obtém-se aquecendo o protóxido de chumbo
em presença de ar e a uma temperatura não superior a 300 º. Pode também obter-se
aquecendo fortemente o carbonato de chumbo em contacto com o ar. Actual mínio.
Conclusão
Um aspecto que parece importante aqui destacar é o facto de nestes apontamentos por
vezes não ser claramente indicado que a um mesmo nome podem corresponder diferentes
materiais. Nalguns casos os diferentes materiais são mencionados isoladamente em
diferentes páginas dos apontamentos, como sucede, por exemplo, a respeito do branco
de chumbo. Noutros casos, eles surgem misturados num mesmo registo, como se observa
a propósito do carbonato de cobre. Esta situação muito provavelmente não se deverá a
falta de conhecimentos do autor dos apontamentos, mas sim a um dos objectivos que
presidiram à sua elaboração – construir uma lista de sinónimos.
A respeito dos pigmentos mencionados, em primeiro lugar pode notar-se a ausência de
pigmentos pretos. Como nos apontamentos há uma certa tendência de os pigmentos
estarem agrupados por cor, estariam esses pigmentos inventariados nalguma folha que
entretanto se perdeu?
Por outro lado, é de destacar a clara predominância dos pigmentos sintéticos. No entanto,
não se pode deixar de observar a existência de referências a pigmentos que, ainda
que importantes em tempos mais antigos, era suposto terem escassa ou mesmo nula
importância em pintura no início do século XX. É o caso, por exemplo, da azurite, um
pigmento natural muito pouco adequado à pintura a óleo. Traduzirá essa presença algum
arcaísmo do mercado nacional?
Desta forma precisamente pode ser interpretada a ausência de referência a pigmentos
surgidos no século XX, como o branco de titânio e, sobretudo, o vermelho de cádmio –
pigmentos estes que também não são mencionados na catálogo da década de 1920 da
Chemical Produces, Ltd, que acompanhava os apontamentos.
No mesmo sentido, também alguns nomes parecem sugerir algum arcaísmo, como lor de
anil, entre vários outros.
Para terminar estes breves comentários inais, deve notar-se que o dicionário aqui
apresentado, além de constituir um instrumento útil para a interpretação de outras fontes
documentais da época, permite saber o que se poderá esperar encontrar em pinturas do
início do século XX – o que, no contexto de uma intervenção de conservação e restauro, é
uma importante informação.
estudos de conservação e restauro | nº 1
109
Adenda
Depois de submetido este texto, foi publicado um artigo [Mark CLARKE, A nineteenthcentury colourman’s terminology. In: Studies in Conservation, 54(3) (2009), pp. 160-169]
que reforça a ideia, expressa atrás, de que mesmo a respeito dos pigmentos modernos a
nomenclatura está longe de ser clara e estar esclarecida. Com efeito, a documentação do
arquivo de um dos principais fabricantes de pigmentos, a irma Winsor & Newton, dá conta
do uso no século XIX de vários nomes com signiicado que não corresponde aos pigmentos
a que habitualmente são atribuídos. Trata-se de mais um argumento que justiica a recolha
sistemática da documentação disponível sobre os pigmentos usados no passado.
Referências
ALEXANDER, S. M. Towards a history of art materials - A survey of published technical
literature in the arts. Part III. 1751-late 19th century. In: Art and Archaeology Technical
Abstracts, 8(1) (1970), pp. 155-78.
AYRES, James (1985). The Artist’s Craft. A History of Tools, Techniques and Materials.
Oxford: Phaidon.
BARNETT, J. R.; MILLER, Sarah; PEARCE, Emma. Colour and art: a brief history of pigments.
In: Optics & Laser Technology, 38(4-6) (2006), pp. 445-53.
BOMFORD, David; KIRBY, Jo; LEIGHTON, John; ROY, Ashok (1990). Art in the Making.
Impressionism. London: The National Gallery.
CLARKE, Mark (2001). The Art of All Colours. Mediaeval Recipe Books for Painters and
Illuminators. London: Archetype Publications.
CORRÊA, Carlos (1931). Pintura e Fingidos. Lisboa: Livraria Editora.
CRUZ, António João (2004a). As Cores dos Artistas - História e Ciência dos Pigmentos
Utilizados em Pintura. Lisboa: Apenas Livros.
CRUZ, António João. As Cores Vitruvianas. Os materiais da pintura mural romana segundo
o tratado de Vitrúvio. In: Artis - Revista do Instituto de História da Arte da Faculdade de
Letras de Lisboa, 3 (2004b), pp. 67-86.
CRUZ, António João. A pintura de Columbano segundo as suas caixas de tintas e pincéis.
In: Conservar Património, 1 (2005), pp. 5-19.
EASTAUGH, Nicholas, WALSH, Valentine; CHAPLIN, Tracey; SIDDALL, Ruth (2004).
Pigment Compendium. A Dictionary of Historical Pigments. Oxford: Elsevier ButterworthHeinemann.
FERREIRA, Joana Lia; MELO, Maria João; RAMOS, Ana Maria; ÁVILA, Maria Jesús (2007).
“Eternity is in love with the productions of time”: Joaquim Rodrigo’s classical palette in
estudos de conservação e restauro | nº 1
110
a vinyl synthetic medium. In: Thomas J. S Learner, Patricia Smithen, Jay W. Krueger,
Michael R. Schilling (ed.), Modern Paints Uncovered. Los Angeles: The Getty Conservation
Institute, pp. 43-52.
Gil, Milene. 2009. Comunicação pessoal.
GUINEAU, Bernard (2005). Glossaire Des Matériaux de la Couleur et des Termes Techniques
Employés dans les Recettes de Couleurs Anciennes. Turnhout: Brepols Publishers.
LEMOINE, Raoul ; MANOIR, Ch. du (sd). Manuel Pratique de la Fabrication des Couleurs.
Paris: Librairie de l’École Centrale des Arts et Manufactures.
MACEDO, Manuel de (1898). Manual de Pintura. Lisboa: Companhia Nacional Editora.
PEREGO, François (2005). Dictionnaire des Matériaux du Peintre. Paris: Éditions Belin.
SANTOS, Sónia Barros; CRUZ, António João (no prelo). Traditional and modern blue
pigments in Portuguese 19th century technical literature. In: Proceedings of YOCOCU 2008
- Youth in Conservation of Cultural Heritage. Roma: Italian Association of Conservation
Scientists - Italian Chemical Society.
TOWNSEND, Joyce H. The materials of J. M. W. Turner: Pigments. In: Studies in Conservation,
38(4) (1993), pp. 231-54.
TOWNSEND, Joyce H. The materials used by British oil painters throughout the 19th
century. In: Reviews in Conservation, 3 (2002), pp. 46-55.
Nota biográica
Licenciatura e doutoramento em Química na Faculdade de Ciências da Universidade de
Lisboa. Equiparado a Professor Adjunto do Departamento de Arte, Conservação e Restauro,
da Escola Superior de Tecnologia de Tomar. Há alguns anos que se vem dedicando ao
estudo laboratorial das obras de arte e mais recentemente tem-se interessado pelo estudo
da literatura técnica antiga relacionada com os materiais utilizados em pintura.
Departamento de Arte, Conservação e Restauro, Escola Superior de Tecnologia de Tomar,
Estrada da Serra, 2300-313 Tomar; Centro de Investigação em Ciências e Tecnologias das
Artes (CITAR), R. Diogo Botelho, 1327, 4169-005 Porto; E-mail: ajcruz@netvisao.pt
Quadro 1
Alguns termos arcaicos de natureza química usados nos apontamentos e sua correspondência
actual.
Termo do manuscrito
Correspondência actual
Ácido hidrossulfúrico
Ácido sulfídrico
estudos de conservação e restauro | nº 1
111
Termo do manuscrito
Correspondência actual
Ácido muriático
Ácido clorídrico
Alumina
Alumínio
Cal
Cálcio
Cianureto
Cianeto
Cromato de barita
Cromato de bário
Cromo
Crómio
Deutosulfato de ferro
Sulfato de ferro (II)
Estronciana
Estrôncio
Ferrocianureto
Ferrocianeto
Hidrato de alumina
Hidróxido de alumínio
Hidrogénio sulfurado
Sulfureto de hidrogénio
Magnésia
Magnésio
Muriato
Cloreto
Oximuriato
Oxicloreto
Potassa
Potássio
Salicato
Silicato
Saturno
Chumbo
Soda
Sódio
Subacetato
Acetato básico
Subazotato
Nitrato básico
Subcarbonato
Carbonato básico
Subcromato
Cromato básico
Subnitrato
Nitrato básico
Subsal
Sal básico
Subsulfato
Sulfato básico
Sulfocianureto
Sulfocianato ou tioacianato
Tungstene
Tungsténio
estudos de conservação e restauro | nº 1
112
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de
Santa Cruz de Coimbra: estudo técnico do suporte
e sua relevância na história da conservação e
restauro da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Resumo
Tendo em vista um aprofundamento do estudo da pintura sobre madeira em Portugal, a Escola
das Artes da Universidade Católica Portuguesa reuniu uma equipa multidisciplinar para o
estudo da pintura Pentecostes, da autoria de Vasco Fernandes. O trabalho de investigação
decorreu in situ, no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, e foram realizados diversos
exames: registos fotográicos mediante luz visível; fotograia I.V. e de luorescência U.V;
espectrometria de luorescência de raios X dispersiva de energias (EDXRF) e radiograia,
nunca antes realizados nesta pintura [1]. O exame radiográico permitiu a recolha de
informação inovadora, tendo o enfoque do presente trabalho sido dirigido para a análise
do suporte. A relevância do estudo dos suportes lenhosos na pintura Portuguesa prende-se
com as lacunas consideráveis existentes nesta área de estudo.
Palavras-chave
Pintura, séc. XVI, radiograia, suporte de madeira, Vasco Fernandes, Pentecostes.
Abstract
This study’s goal is to deepen the knowledge about techniques and materials applied in
the execution of Portuguese wooden paintings. The Portuguese Catholic University of
Oporto gathered a multidisciplinary team in order to study the Pentecost panel from Vasco
Fernandes. This study was held in situ, in Santa Cruz de Coimbra Monastery and several
techniques of analyses were applied: photographic examination under visible light, infra-
red and ultra-violet photography, EDXRF and radiography. This last one allowed us to
identify new information regarding both pictorial layer and wooden support, being the
support our main concern. The relevance of the study of wooden Portuguese paintings
is understandable due to the considerable knowledge gaps that still exist in this ield.
Keywords
Painting, 16th century, radiography, wooden painting, Vasco Fernandes, Pentecost.
Resumen
Con el objetivo de profundizar en el estudio de la pintura sobre tabla en Portugal, la
estudos de conservação e restauro | nº 1
113
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Escola das Artes de la Universidad Católica Portuguesa, formó un equipo multidisciplinar
para el estudio de la pintura “Pentecostés”, del autor Vasco Fernandes. El trabajo de
investigación se llevó a cabo in situ, en el Monasterio de Santa Cruz de Coimbra, y fueron
realizados diversos exámenes: registros fotográicos mediante luz visible; fotografía IR y
de luorescencia UV; espectrometría de luorescencia de rayos X dispersiva de energías
(EDXRF) y radiografía, nunca antes realizados en esta pintura [1].El examen radiográico
aportó información innovadora, habiéndose enfocado el presente trabajo en el análisis del
soporte. La relevancia del estudio de los soportes leñosos en la pintura portuguesa se debe
precisamente a las lagunas existentes en este área de estudio.
Palabras clave
Pintura, siglo XVI, radiografía, soporte de madera, Vasco Fernandes, Pentecostés.
Introdução
O presente artigo constitui a conjugação de dois trabalhos de investigação, ambos
subordinados ao estudo da pintura sobre madeira, nomeadamente: A pintura portuguesa
quinhentista de Vasco Fernandes: Estudo técnico e conservativo do suporte e História, teoria
e deontologia da Conservação e Restauro aplicadas à pintura sobre madeira em Portugal.
Tendo como base um amplo projecto de investigação multidisciplinar efectuado por uma
equipa de doutorandos e investigadores do CITAR (Escola das Artes – UCP) e por objectivo
o levantamento e análise exaustivos da pintura denominada Pentecostes, da autoria do
pintor português Vasco Fernandes, expoente da pintura quinhentista e vulto de referência
no panorama da Historiograia da Arte em Portugal. A obra encontra-se no Mosteiro de
Santa Cruz de Coimbra, tutelada pela respectiva Diocese.
A metodologia seleccionada levou à realização in situ das seguintes técnicas de registo e
exame: Registos fotográicos mediante luz visível; Fotograia I.V. e de Fluorescência U.V.;
Espectrometria de luorescência de raios-X dispersiva de energias (EDXRF) e Radiograia.
Cabe neste artigo apresentar apenas os resultados obtidos no exame radiográico com
relevância para o estudo técnico do suporte e para a história da Conservação e Restauro
da pintura sobre madeira em Portugal. Este estudo visa a elaboração de um levantamento
aprofundado das técnicas de execução do suporte na obra do pintor português Vasco
Fernandes, dito “Grão Vasco” (c.1475-1542), através do exame radiograico, tornando
visível o método de execução e ensamblagem primitiva do suporte. Mostra-se assim
que sob a imagem perceptível através de luz visível existe uma outra de pendor técnico.
Paralelamente realizou-se o mapeamento das intervenções, suas causas e consequências,
relectidas nas patologias do estado de conservação da pintura.
estudos de conservação e restauro | nº 1
114
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Imagem 1 - Igreja de Santa Cruz de Coimbra
Imagem 3 - Pentecostes de Grão Vasco
estudos de conservação e restauro | nº 1
Imagem 2 - Pentecostes de Grão Vasco
exposto com destaque na Exposição
permanente “Memórias de Santa Cruz”
Imagem 4 - Pentecostes de Grão Vasco
(reverso)
115
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Após exaustiva recolha e análise dos relatórios e dados existentes, e assim traçado o
percurso material da obra, surgiu a necessidade de documentar com rigor a disposição
actual do suporte. Foi criada uma cronologia virtual de apoio, partindo das técnicas de
produção inicial até à presente data, incluindo todas as acções que tiveram lugar ao longo
do seu percurso. Ensaiou-se no presente estudo e consequentemente nas fotograias
realizadas à pintura, o tratamento computorizado de imagem à escala, através de desenhos
3D de informação complementar pormenorizada. Estes desenhos foram concretizados
recorrendo aos programas informáticos AutoCAD® e 3dsMax® (operados conjuntamente
com técnicos informáticos especíicos) contribuindo assim para um melhor entendimento
da tecnologia implícita na produção dos painéis de madeira, bem como, a distinção entre
original e intervenções posteriores através de mapas de patologias delineados no software
Adobe® Photoshop®.
Este estudo permitiu então criar um método de documentar a pintura, de forma sincrónica
e diacrónica, dando-nos uma visão geral correcta da pintura, da leitura das suas técnicas
e do estado de conservação actual, fruto da passagem do tempo e da intervenção directa.
A pintura de Vasco Fernandes e o estudo dos suportes quinhentistas
Geralmente os suportes são mantidos num nível de investigação diferente em comparação
com a pintura em si (entenda-se camada pictórica), que deine o seu signiicado, tanto
esteticamente como simbolicamente falando. Actualmente, esta visão redutora da obra de
arte deixa de fazer sentido, sendo que cada vez mais os suportes assumem relevância para
o conhecimento integral da obra de arte. Ao interpretarmos as técnicas dos panel-makers
podemos identiicar oicinas e áreas geográicas de inluência, permitindo comparações
e deinir datações. Resta todavia realizar a identiicação dos materiais lenhosos podendo
assim colocar em evidência toda a estrutura interna e determinar concretamente e
indubitavelmente qual o tipo de madeira constitui o suporte deste Pentecostes.
Desta mesma forma, a obra legada por Vasco Fernandes encontra-se amplamente estudada,
porém encontramos lacunas quanto ao estudo dos suportes, lacuna que se estende de
forma global à pintura sobre madeira quinhentista e seiscentista, não obstante o esforço
por parte das entidades competentes em realizar este tipo de estudos que, contudo, são
ainda escassos.
No que se refere à obra pictórica de Vasco Fernandes, são atribuídas a este pintor 11 obras,
de entre outras, atribuídas sem tanta certeza. Este núcleo de 11 pinturas é constituído pelas
seguintes obras: cinco painéis do Retábulo-mor da Sé de Lamego (1506-1511) presentes
no Museu de Lamego; o Tríptico da Lamentação sobre o Corpo de Cristo, S. Francisco,
Santo António (1520), Museu Nacional de Arte Antiga; Retábulos laterais da Sé de Viseu
- S. Pedro; S. Sebastião (1530), Museu Grão Vasco; e o Pentecostes (1535), Mosteiro de
estudos de conservação e restauro | nº 1
116
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Santa Cruz de Coimbra.
De todos os supracitados painéis optámos pelo estudo da pintura Pentecostes (aprox.
166,5cm x 165cm x 1,5cm), uma vez que é um exemplar único e fundamental na obra
de Vasco Fernandes, testemunho da sua adesão aos valores do Renascimento italiano,
perceptível de forma clara pela assinatura latinizante, «VELASCS». Após a observação in
loco, esta pintura imediatamente revelou potencial pelas suas características originais, pelo
resultado da história das suas intervenções e lacuna de estudos similares precedentes.
Breve contextualização histórica
De acordo com documentação explorada por historiadores como Reynaldo dos Santos,
Rackzynski, Dalila Rodrigues, entre muitos outros, esta pintura baliza-se cronologicamente
na empreitada de quatro retábulos para o Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, em 1535,
data em que este pintor viseense recebe parte do pagamento da sua feitura (Rodrigues,
1992: 153).
Actualmente ostenta uma admirável moldura coeva, no entanto, esta não será a original.
Novos resultados avançados pelo exame radiográico credibilizam esta teoria, visto que
estão presentes no painel marcas nos cantos superiores pertencentes à volumetria da
talha da estrutura que o emoldurara. A pintura provém da encomenda realizada para o
retábulo da Capela do Espírito Santo do Claustro da Portaria do Mosteiro de Santa Cruz
de Coimbra, sendo este a “pala” central do mesmo: «Em 1541, D. Fernando de Mendanha
considera pintado “por mão de outro Apeles”. Em inais do mesmo século, Frei Jerónimo
Roman, descrevendo também minuciosamente o mosteiro, refere-se à capela do Espírito
Santo da seguinte forma: “mandada fazer por D. João III, excelente pela traça, é muito
boa a mão de quem lavrou e pintou ali.(…) Foi durante anos uma obra controversa, por se
supor que a assinatura VELASC9 não correspondia á forma latinizada de Vasco. Reynaldo
dos Santos, através do Livro da Receita e Despesa do Mosteiro de Santa Cruz, referente ao
ano de 1534-35, e de um recibo de pagamento a Vasco Fernandes de uma prestação de
quatro retábulos executados para este mosteiro, vem deinitivamente provar a sua autoria
e cronologia” (Rodrigues, 1992: 153).
Após várias reformas acentuadas no Mosteiro, o Claustro da Portaria foi demolido à data
da construção dos Paços do Concelho, e esta obra, único sobrevivente dessa encomenda,
foi transferida para a sala da Sacristia onde permaneceu exposta por alongadas décadas.
Desde 2003, ano em que decorreu a comemoração de Coimbra Capital Nacional da Cultura,
o Pentecostes foi novamente deslocado e colocado em destaque na sala principal da
exposição à data intitulada “Memórias de Santa Cruz”, decorrente na Sala do Refeitório
do Mosteiro, e onde se deteve até à actualidade, não tendo sido desmontada a estrutura
desde então.
estudos de conservação e restauro | nº 1
117
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Levantamento técnico do suporte
Esta magniica pintura quinhentista, realizada a óleo sobre suporte de madeira, presumese carvalho (Quercus s.p.), foi já descrita no ano de 1961 no estudo de Jacqueline Marette,
que a denominara à data «A Descida do Espírito Santo» da seguinte forma “CHÊNE (…)
ÉCOLE PORTUGAISE (…) VASCO FERNANDEZ, SIGNÉ «VELASCS», 1535. 313. La Descente
du Saint-Espirit. Coimbra, église de Santa Cruz. Provient de la chapelle de la Porte du
Couvent de Santa Cruz. 1.610 x 1.630 x 8 mm. (bords). (…) Fil longitudinal. Bon état
dans l’ensamble; rares trous de vers. Neuf planches. Panneau aminci sur les bods”
(Marette, 1961:202 – 203). No entanto, a origem precisa da espécie permanece incógnita
e necessitaria de exames cientíicos por intermédio de análise de micro-amostra para ser
determinada, para o qual não nos foi concedida autorização, dado o carácter invasivo do
processo.
Contudo, é possível considerar a proveniência nórdica, visto que esta “essência coadunase com a referência «bordos de Frandes» contida nos termos do único contrato conhecido
para obra de pintura no século XV, celebrado em Évora, a 13 de Outubro de 1460, (…)
Este contrato e os dois mais detalhados documentos notariais congéneres do inicio do
século XVI (retábulo da Sé de Lamego) acusam a preferência por madeira importada da
Flandres em empreitadas importantes. Nesta região, por sua vez, grande parte do carvalho
utilizado na construção de suportes para pintura provinha de lorestas da bacia do Báltico”
(Vandevivere, 1994: p.61).
No que se refere ao levantamento exaustivo da estrutura do painel, é importante referir
que a largura das pranchas, exceptuando as tábuas das extremidades, varia entre os
18,5cm e os 26,5 cm. As pranchas que delimitam a pintura são manifestamente mais
reduzidas e medem 5,5cm e 6,5 cm. No que se refere à altura, o valor comum é de 165
cm, sendo apenas a central é ligeiramente maior, atingindo os 165,4cm.
A espessura foi o valor que mais sofreu alterações com as intervenções de conservação e
restauro, vendo a sua superfície reversa reduzida para valores variáveis: nas laterais de
1cm a 1,3cm e nos topos de 1cm a 1,5cm. À semelhança das intervenções descritas por
Luciano Freire no seu relatório, presume-se que fora ele o autor desse tratamento que
descrito por ele constou como “(…) importante trabalho de carpinteria (…)” (Freire, 2007:
50). Partindo da premissa de que o painel foi sujeito a esta “importante” intervenção de
carpintaria por se encontrar debilitado, crê-se que esta operação visasse um tratamento
idêntico aos por ele descritos detalhadamente em suportes de outros painéis, com o
objectivo de atenuar o aspecto visual das galerias no tardoz e principalmente para libertar
a obra dessa camada lenhosa totalmente fragilizada isicamente segundo um tratamento
profundo, como o desbaste.
estudos de conservação e restauro | nº 1
118
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Imagem 5 - Pentecostes de Grão Vasco (esquema dimensional)
No exame à vista desarmada, observa-se a presença de 5 tipologias de ensamblagem:
3 variantes de malhetes embutidos cortados ao centro denominados “duplas-caudas de
andorinha” e dois diâmetros distintos de cavilhas de madeira. Sendo que a técnica de
união original interna e consequentemente visível apenas na radiograia é feita em cavilhas
cilíndricas de madeira.
Veriicam-se as já referidas três variantes dimensionais de malhetes em “duplas-caudas de
andorinha”, perfazendo no total 34 caudas cortadas e coladas ao centro e inseridas com o
veio coincidente com o sentido do veio das tábuas originais, dispostas em 4 iadas idênticas
e homogéneas. Todas elas provêm da substituição equacionada na intervenção de 1991 do
Instituto José de Figueiredo (Fonseca, 1991).
As cavilhas de madeira primitivas visíveis, surgem todas inseridas perpendicularmente
ao veio da madeira da prancha, sendo que parte delas são notórias do lado anverso,
isto é, observa-se uma circunferência em estalado na camada pictórica, o que atesta o
atravessamento total da espessura da tábua. As 4 cavilhas de maior diâmetro (1cm),
dispõem-se verticalmente na extremidade na trancha lateral esquerda, distando umas
estudos de conservação e restauro | nº 1
119
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
das outras cerca de 50cm. As cavilhas de menor diâmetro (0,5cm) não apresentam
homogeneidade na localização, sendo apenas comuns nas arestas do topo superior do
painel. O que é actualmente justiicável pela original presença de elementos de talha
vazados sobre a pintura “cantos de moldura”.
Imagem 6 - Pentecostes de Grão Vasco
(esquema dimensional dos sistemas de reforço e ensamblagem)
Imagem 7 - Pentecostes de Grão Vasco
(duplas caudas de andorinha)
estudos de conservação e restauro | nº 1
Imagem 8 - Pentecostes de Grão Vasco
(cavilhas de “fora a fora”)
120
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
No reverso é visível ainda o rebaixo linear de 1cm do topo inferior, talvez para a adaptação
a estruturas em décadas anteriores, visto que a presente moldura (apesar de coetânea)
não ser a primitiva pertencente à estrutura retabular.
Paralelamente à substituição dos malhetes em “duplas-caudas de andorinha” no ano de
1991, na intervenção realizada no Instituto José de Figueiredo, as juntas do painel foram
preenchidas com cola, adesivo sintético em dispersão aquosa Acetato de polivinilo - PVA
(Cola Branca), e presume-se, imposta força mecânica através de grampos para ajudar
à união e secagem em posição correctas. Foi ainda aplicada massa de preenchimento
à base de cera microcristalina e de abelha nas lacunas volumétricas, encontrando-se
presentemente com as juntas fechadas e em perfeita estabilidade.
Sobre este suporte, cabe ainda realçar que as consequências provocadas pelo ataque
de insecto xilófago, outrora intensamente activo, são notórias mesmo após a acentuada
supressão da espessura da madeira, rebaixada de modo uniforme na provável beneiciação
da segunda década de 1900 por Luciano Freire. Não existindo qualquer documentação
atestando as intervenções anteriores às reveladas, é possível que o painel tenha sido
sujeito a tratamentos insecticidas, contra os referidos ataques, assim como foi certamente
submetido a tratamentos de consolidação e limpeza, factores de alteração da tonalidade
natural da madeira até à actualidade.
Resultados da radiograia com relevância para o estudo do suporte
Para clariicar os dados obtidos optou-se pela sua enumeração:
•
Este exame permitiu desvendar e conirmar o pressuposto sistema de ensamblagem
primitivo e o modo como se dispõem: 32 cavilhas lisas de madeira de secção cilíndrica
colocadas com o veio perpendicularmente ao das pranchas pelo denominado método
•
•
•
de furo-respiga;
As dimensões destas cavilhas oscilam entre os 4 e 5,8cm de comprimento e 1,3 a
1,5cm de diâmetro, estando estas dispostas em 4 iadas horizontais com espaçamentos
regulares entre si;
Conirma-se através da análise pormenorizada da aparência dos veios que o corte das
pranchas é tangencial;
Fruto da interpretação da ordem e execução dos furos onde encaixam as cavilhas, pode
determinar-se com precisão como foi montado o painel. Visto que a cavilha quando é
colocada intencionalmente, por norma, apenas preenche na totalidade o lado do furo
onde é inserida, sendo posteriormente encaixada no furo da prancha onde vai unir
deixando um espaço oco. Observando a radiograia (frente) conclui-se que apenas a
“primeira” tábua foi ligada da esquerda para a direita, sendo as restantes oito tábuas
ensambladas ciclicamente da direita para a esquerda. Poderá ser hipoteticamente um
estudos de conservação e restauro | nº 1
121
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
sinal de que o mestre ensamblador optou por aproveitar racionalmente as madeiras
que dispunha, visto que coincide com o facto das duas pranchas dos extremos, remate
•
do painel, serem as de menores dimensões;
Ainda no que se refere a sistemas de reforço, através da radiograia tornou-se perceptível
a real dimensão e modo de colocação dos malhetes em forma de duplas caudas de
andorinha, provenientes de intervenção de conservação e restauro e sua localização
•
face à camada pictórica;
Surpreendentemente o exame de Raios-X veio descobrir um dado, não visível à vista
desarmada e nem perceptível nos exames de luorescência U.V. ou fotograia I.V. Nas
arestas superiores da camada pictórica, é possível levantar a hipótese da presença
original de talha dourada vazada (proveniente da moldura quinhentista original), através
das formas simétricas que o material radiopaco (massas de preenchimento) assume
nessas zonas especíicas. Esses motivos decorativos assemelham-se à técnica e formas
usadas nas estruturas retabulares do século XVI de inluência lamenga. Corroborando
esta tese, surgem as já referidas cavilhas de madeira (de 0,5cm de diâmetro) colocadas
atravessando as pranchas e na sua totalidade apenas nestes locais, cantos superiores,
o que pode indiciar a veracidade da presença desses volumes, motivos de talha, ixos
•
e assentes sobre a pintura;
No que se refere à presença de materiais radiopacos, destaca-se a intervenção de
consolidação das galerias, provocadas por intenso ataque de insecto xilófago, cujo
•
material impregnado, desconhecido, tem este comportamento;
Igualmente relevante é a “não visibilidade” da assinatura do pintor, «VELASCS», na
radiograia. Fenómeno apenas justiicável pelo uso de um pigmento orgânico na sua
execução, e como tal não visível neste exame. Esta teoria foi comprovada através da
análise por EDXRF, que não acusou qualquer componente inorgânico, com excepção
daqueles relativos à camada de preparação.
Imagem 9 e 10 - Pentecostes de Grão Vasco (exame radiográico: preparação das películas)
estudos de conservação e restauro | nº 1
122
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Imagem 11 e 12 - Pentecostes de Grão Vasco
(exame radiográico: impressão de provas radiográicas e revelação das películas inais)
Imagem 13 - Radiograia do Pentecostes de Grão Vasco
estudos de conservação e restauro | nº 1
123
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
Relevância para a História da Conservação e Restauro
O estudo dos suportes da pintura sobre madeira traduz-se em diversas valências, tais como
sendo a técnica, a histórica e a material. As vertentes material e técnica, intersectam-se
directamente e relacionam-se com a dimensão temporal através das alterações directas e
indirectas sobre as obras, ou seja, a evidência física fruto de intervenções que respeitam a
mudança de gosto, que reparam o dano, que redimensionam o objecto, etc., ou da simples
passagem do tempo e seu efeito sobre os materiais. À semelhança da camada pictórica
o suporte lenhoso pode ser alvo de exame analítico profundo, sendo que, de entre os
métodos colocados à disposição, impera a radiograia, pela quantidade de informação que
permite recolher.
Especiicamente para um suporte de madeira de consideráveis dimensões (como sendo o
presente caso), existem elementos internos de junção, marcas de alterações, enim, toda
uma intra-dinâmica que não pode ser analisada de forma desarmada.
A importância do suporte vista de um ponto de vista histórico deriva da junção da
“matéria como aspecto” (Brandi, 2006:8) com “matéria como estrutura”, da qual provêm
características únicas: «Tome-se o exemplo mais evidente de uma pintura sobre madeira,
em que a madeira esteja de tal modo porosa ao ponto de já não oferecer um suporte
conveniente; a pintura será então a matéria como aspecto, a madeira a matéria como
estrutura, ainda que a divisão possa resultar muito menos nítida, porque o facto de ser
pintada sobre madeira confere à pintura características que poderiam desaparecer ao
retirar-se a madeira» (Martinez, 2001:152).
Da análise ainda actual de Cesare Brandi podemos observar a importância do suporte,
que nem sempre foi consonante ao longo da História da Conservação e Restauro e que se
relecte na dimensão académica, mais versada em matéria pictórica.
A matéria estrutural foi, durante muitos séculos, considerada dispensável. O exemplo das
transladações de suporte iniciadas em França, no século XVIII, corroboram esta ideia.
Robert Picault, polidor de bronzes e dourador do rei (Idem, p.152), tornou-se célebre
pelas suas transladações de suporte, verdadeira moda no início da centúria de setecentos.
Picault airmava que se poderia repetir indeinidamente este processo, de forma a
perpetuar a camada pictórica (Idem, Ibidem, p. 152) mediante «grande fogo» e «líquidos
secretos» (Ob. Cit., p. 154). Porém esta técnica depressa esmoreceu, motivada pelas
alterações nefastas que a pintura rapidamente sofria quando removida do seu suporte
original. Desde então a importância dos suportes enquanto estrutura tornou-se crescente.
Actualmente semelhante processo é apenas concebível para casos especíicos em que não
existe qualquer outra solução e face à hipótese de perda total de ambos os componentes,
matéria-aspecto e matéria-estrutura.
A manutenção das estruturas deu origem a alguns tratamentos mais invasivos e
estudos de conservação e restauro | nº 1
124
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
“mutiladores”, como a prática do desbaste dos suportes lenhosos, perante a presença de
uma das principais patologias presentes em pintura sobre madeira: ataque de insectos
xilófagos. Esta mesma característica veriica-se no suporte do Pentecostes de Vasco
Fernandes, sendo uma prática amplamente utilizada durante o século XX.
O advento da radiograia no mundo da Arte veio trazer um novo impulso ao estudo da
pintura sobre madeira, entre outras diversas tipologias artísticas, subitamente reveladas
sob outra perspectiva. Desde Carlos Bonvalot (1894 – 1934) e os «primeiros trabalhos
sobre o universo invisível da pintura portuguesa» (Leandro, 2007:84), passando por João
Couto e o Laboratório Cientíico até aos nossos dias, muito se evoluiu na técnica e na
teoria. Cada vez mais os suportes ganham importância e de igual modo, a lacuna de
prévias aquisições radiográicas do Pentecostes culminam no presente estudo, permitindo
identiicar a moldura original há muito perdida, tipologias de ensamblagens (juntas e
cavilhamento, caudas de andorinha de origem setecentistas, substituídas no século XX,
vestígios do sistema de ensamblagem ao retábulo original) e localização de galerias de
insectos.
Conclusão
A interpretação das técnicas relativas à produção de pintura sobre madeira dominadas por
artistas, marceneiros ou panel-makers, permite-nos identiicar e compreender momentos
temporais especíicos de acordo com características de diferentes oicinas. É importante
determinar a origem geográica, datação e autoria, e é o diálogo entre os elementos de uma
equipa disciplinar que pode originar um conhecimento mais aprofundado das obras de arte.
Não é possível compreender uma pintura sobre madeira na sua totalidade, sem o devido
conhecimento do seu suporte, geralmente visto como secundário, porém detentor de
valiosa informação. Trata-se de uma testemunha “muda” oculta pelo signiicado artístico e
estético da camada pictórica. É essencial conhecer profundamente o suporte, saber ler os
traços menos visíveis da sua integridade material. Embora nem sempre se torne possível
recorrer ao contributo de equipamento técnico, como uma ampola portátil de Raios-X,
existem porém obras de vulto do panorama artístico nacional que podem servir como
impulsionadores para posteriores trabalhos de investigação. O presente case study é, de
um ponto de vista histórico e técnico, semelhante a tantos outros da pintura quinhentista
e seiscentista, e do qual se poderá tirar conclusões melhor fundamentadas sobre tipos
de ensamblagens e seus constituintes internos; aproximação à história das intervenções
das pinturas sobre madeira, entre outra variedade de informação preciosa que coloca
o suporte lenhoso num outro patamar de importância. É necessário colmatar a lacuna
no conhecimento de suportes de pintura sobre madeira, de forma a permitir conclusões
comparativas de cariz cientíico. Este estudo pretende ser um contributo para quebrar a
estudos de conservação e restauro | nº 1
125
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
inércia, revelando partes anteriormente ilegíveis do Pentecostes de Vasco Fernandes que,
sendo a obra de referência que é, vê agora parte da sua história material reconstituída
numa placa radiográica.
Notas
[1] Ressalva-se o exame de Relectograia do Infravermelho realizado por José Pessoa e
apresentado por Dalila Rodrigues na sua tese de Doutoramento em História da Arte na
Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra no ano 2000, intitulada: Modos de expressão
na pintura portuguesa: O processo criativo de Vasco Fernandes (1500-1542).
Referências
ARAGÃO, Maximiano de (1900). Grão-Vasco ou Vasco Fernandes Pintor Viziense Príncipe
dos Pintores Portuguezes. Viseu: Typographia Popular da Liberdade.
BRANDI, Cesare (2006) Teoria do Restauro. Amadora: Edições Orion.
CÂMARA Municipal de Coimbra (2003). Memórias de Santa Cruz: Exposição (22 Dez. - 29
Fev.). Coimbra: C.M.C..
CARVALHO, José Alberto Seabra. Os trabalhos de Luciano Freire por ele próprio: Nota
introdutória à edição de um relatório de um restaurador de pintura do inicio do século XX.
Conservar Património. Lisboa: ARP. nº5 (Dezembro - 2007).
FONSECA, Maria Constança Pinheiro da; CORREIA, Pedro; GORDO, João. Relatório de
intervenção na pintura Pentecostes de Vasco Fernandes (Guia 40/91, Proc. Secretaria P.O.
356, Restauro 34/91, Arquivo 1992). Lisboa: Instituto José de Figueiredo. 1991.
FREIRE, Luciano. Elementos para um relatório acerca do tratamento da pintura antiga em
Portugal segundo notas tomadas no período da execução desses trabalhos. In Conservar
Património. Lisboa: ARP. nº5 (Dezembro - 2007).
INSTITUTO. Português de Museus (1994). Nuno Gonçalves, novos documentos: estudo da
pintura portuguesa do séc. XV. Lisboa: I.P.M..
LEANDRO, Sandra (2007). Invisíveis e Intangíveis nos Estudos de Arte: João Couto e
o Laboratório Cientíico. In 40 Anos do Instituto José de Figueiredo. Lisboa: Instituto
Português de Conservação e Restauro.
MARTINEZ JUSTICIA, M.ª José (2001). Historia y Teoria de la Conservación y Restauración
Artística. Madrid: Editorial Tecnos.
REIS-SANTOS, Luís (1946). Vasco Fernandes e os Pintores de Viseu do Século XVI. Lisboa:
L. R. Santos.
RODRIGUES, Dalila (2007). Grão Vasco. Lisboa: Alêtheia Editores.
estudos de conservação e restauro | nº 1
126
Radiografia in situ do Pentecostes do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra:
estudo técnico do suporte e sua relevância na história da conservação e restauro
da pintura sobre madeira em Portugal
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho
RODRIGUES, Dalila, coord. (1992). Grão Vasco e a Pintura Europeia do Renascimento.
Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses.
RODRIGUES, Dalila (2002) – Grão Vasco e a Pintura Portuguesa do Renascimento (c. 1500
– 1540). Salamanca: Consorcio Salamanca 2002; Museus Grão Vasco.
VIANA, Conceição; SALGADO, António. Relatório de intervenção na pintura Pentecostes de
Vasco Fernandes no âmbito da exposição de Salamanca 2002. Lisboa: ArteRestauro, 2002.
VIEIRA, Padre Dr. José Bento (2001). Santa Cruz de Coimbra: Arte e História. Coimbra:
Igreja de Santa Cruz.
Agradecimentos
Artigo elaborado com o apoio do Programa Operacional Ciência e Inovação 2010 (POCI
2010), co-inanciado pelo Governo Português e pela União Europeia, através do Fundo
Europeu para o Desenvolvimento Regional (FEDER), e da Fundação para a Ciência e
Tecnologia, da qual as autoras são bolseiras de investigação.
Pela participação neste projecto agradece-se a D. Albino Cleto Bispo de Coimbra, a Padre
Anselmo Gaspar Dias e Sr. António José Martins do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. A
Jorgelina Carballo e ao Arq. Eduardo Henrique Machado, membros da equipa deste projecto.
À coordenação Professora Doutora Ana Calvo e Professora Doutora Dalila Rodrigues.
Créditos fotográicos: Luís Bravo (Radiograia); Joana Salgueiro; Salomé de Carvalho.
Notas biográicas
Joana Salgueiro – Em doutoramento em Conservação de Pintura na Escola das Artes da
UCP. Licenciada em Arte, Conservação e Restauro com especialização em Escultura e Talha
pela Escola das Artes da UCP. Docente Escola das Artes UCP (2006-2007).
Tema de dissertação: A pintura portuguesa quinhentista de Vasco Fernandes: Estudo
técnico e conservativo do suporte.
jsalgueiro@porto.ucp.pt
Salomé de Carvalho – Em doutoramento em Conservação de Pintura na Escola das Artes
da UCP. Licenciada em Arte, Conservação e Restauro com especialização em Pintura de
Cavalete pela Escola das Artes da UCP. Docente Escola das Artes UCP.
Tema da dissertação: História, teoria e deontologia da Conservação e Restauro aplicadas à
pintura sobre madeira em Portugal.
sscarvalho@porto.ucp.pt
estudos de conservação e restauro | nº 1
127
O gestaltismo aplicado à reintegração cromática de
pintura de cavalete
Ana Bailão
Resumo
A psicologia da Gestalt foi utilizada por Cesare Brandi na conservação e restauro,
nomeadamente na interpretação e tratamento das lacunas. Este artigo dá a conhecer
a psicologia da forma usada por Brandi e explora a inluência das Leis da Organização
da Percepção na interpretação da lacuna, a sua importância na selecção das técnicas
de reintegração cromática e consequentemente no reconhecimento das mesmas. Como
caso de estudo, foi escolhida a obra “Ressurreição de Lázaro”, uma pintura quinhentista
pertencente à Charola do Convento de Cristo, em Tomar.
Palavras-chave
Gestalt, percepção, lacunas, reintegração cromática.
Abstract
The Gestalt psychology was use by Cesare Brandi in the conservation and restoration,
especially in the interpretation and treatment of the losses. This article let know the form
psychology used by Brandi and explore the inluence and the importance of the Perceptual
Organization Laws in the interpretation of the losses, the selection of the chromatic
techniques and therefore in the recognition of the same ones. As study case, was chosen
the work “Resurrection of Lazarus”, a 16th painting of the Charola of the Convento de
Cristo, in Tomar.
Keywords
Gestalt, perception, losses, chromatic reintegration.
Resumen
La psicología de la Gestalt fue utilizada por Cesare Brandi en la conservación y restauración,
en particular para la interpretación y tratamiento de las lagunas. Este artículo analiza
la psicología de la forma utilizada por Brandi y explora la inluencia de las Leyes de la
Organización de la Percepción en la interpretación de la laguna, su importancia en la
selección de las técnicas y en el reconocimiento de las mismas. Como caso de estudio, se
eligió la obra "Resurrección de Lázaro", una pintura perteneciente a la girola del Convento
de Cristo en Tomar.
estudos de conservação e restauro | nº 1
128
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
Palabras clave
Gestalt, percepción, lagunas, reintegración cromática.
Introdução
Apesar de existir actualmente algum consenso acerca do problema das lacunas e sobre a
validade das acções de reintegração cromática, alcançado com a atitude crítica de Cesare
Brandi para com o restauro e com a sua interpretação da obra de arte em função da instância
estética e histórica, surgem normalmente controvérsias no momento que antecede a
execução da tarefa: como diminuir o protagonismo da lacuna, vista pelo observador como
igura, e como obter o absoluto e fácil reconhecimento das reintegrações.
Sabe-se que Cesare Brandi utilizou a psicologia da Gestalt na conservação e restauro,
nomeadamente na interpretação e tratamento das lacunas. Com base numa das oito
Leis da Organização da Percepção, “igura e fundo”, Brandi explica a lacuna como uma
interrupção no tecido igurativo. Esta assume a função de “igura” enquanto a pintura é
observada como “fundo”. Brandi, através do gestaltismo, propõe meios para neutralizar o
valor negativo da lacuna.
O presente artigo utiliza as oito Leis da Organização da Percepção para interpretar a lacuna
e ensaiar algumas possibilidades de reintegração cromática.
Contexto histórico
O termo alemão gestalt não tem tradução exacta para a língua portuguesa. Signiica forma,
estrutura ou coniguração e é usado para designar a corrente psicológica que surgiu no
inal do séc. XIX, que se fundamenta na ideia de que o todo é mais do que a simples soma
das suas partes. Christian Von Ehrenfels, precursor do movimento gestaltista, publicou em
1890 um trabalho sobre as qualidades da forma, destacando duas propriedades básicas: a
totalidade e a transponibilidade. Com a primeira, percebemos estruturas organizadas e não
elementos isolados; com a segunda, se todas as partes que compõem uma forma forem
modiicadas, sendo mantidas constantes as relações entre as partes, percebemos a mesma
forma (Macedo, 1933: 13-19; Smith, 1996: 243-250).
Embora o austríaco Christian Von Ehrenfels esteja na vanguarda da teoria, a psicologia forma
icou conhecida com os estudos experimentais sobre a percepção humana do psicólogo
Max Wertheimer (1880 – 1943), e mais tarde, com os trabalhos dos alemães Wolfgang
Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1941), os três fundadores do gestaltismo (Smith,
1996: 243).
A psicologia da Gestalt surgiu como uma forma de protesto contra o atomismo psicológico
e o behaviorismo norte-americano. Os primeiros acreditavam que a consciência humana se
decompunha em sensações; os segundos defendiam o determinismo do comportamento e
estudos de conservação e restauro | nº 1
129
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
acentuavam o papel da aprendizagem, do meio e da experiência. Os gestaltistas defendem
que algo tão complexo como a consciência não pode ser estudado a partir da análise dos
seus elementos. Só a partir da totalidade é que se podem compreender verdadeiramente
os fenómenos. Deste modo, para os gestaltistas, a organização perceptiva e as leis
que presidem a essa organização estão relacionadas com capacidades inatas ligadas
ao funcionamento do cérebro, não sendo susceptíveis de sofrer alterações por meio da
aprendizagem. O ponto de partida do gestaltismo é a percepção. Esta não é redutível
a uma soma de elementos sensoriais simples, sendo antes a apreensão de uma forma,
que é inata e que implica uma distinção e relação forma/fundo (Macedo, 1933:1-14,26;
Goodwin, 2005:296).
A psicologia da Gestalt ganhou protagonismo como ciência com o artigo de 1912 de Max
Wertheimer sobre o movimento aparente, também designado por fenómeno Phi, e com o
uso da concepção fenomenológica de Edgar Rubin “igura e fundo” (Smith, 1996: 262,263;
Arnheim, 2004: 216-223; Goodwin, 2005:300).
O estudo do fenómeno Phi deu origem à primeira publicação gestaltista em 1912 por
Wertheimer intitulada “Experimentelle Studien iiber das Sehen von Bewegung”. Denominado
pela Física como movimento aparente, trata-se de um movimento percebido a partir da
apresentação de uma sequência de estímulos estacionários a uma determinada velocidade
(Macedo, 1933: 42-46).
A noção de “igura e fundo”, tão utilizada na Gestalt, é de base puramente fenomenológica
e com génese numa concepção do psicólogo dinamarquês Edgar Rubin, autor do primeiro
livro sobre o fenómeno. Não vinculado à Escola Gestaltista, organiza a percepção visual
em dois elementos: a igura e o fundo. Para Rubin, só a igura possui forma, sendo o fundo
desprovido dela. Do mesmo modo, considera que as linhas de contorno que delimitam
a igura do restante campo visual são percebidas como pertencentes à igura e não ao
fundo. O fundo parece continuar por trás da igura, sem perder a sua unidade, enquanto
a igura é percebida em primeiro plano e ganha preponderância em relação ao fundo, pois
atrai o olhar (Macedo, 1933: 56, 77, 78; Koffka, 1999: 177; Arnheim, 2004: 216). A lei do
contraste do gestaltismo baseia-se nesta concepção de Edgar Rubin. Para os gestaltistas,
um objecto só é percebido em relação a um certo fundo quando este lhe concede contraste
e por sua vez relevo. Quanto maior o contraste entre os dois, melhor percebido ele será. O
contraste é complementar das leis da proximidade, da semelhança e da boa continuidade:
ele guia a nossa percepção no sentido de diferenciar elementos de conjuntos distintos.
A aplicação das ferramentas da psicologia da forma podem, por um lado, ajudar a minimizar
o protagonismo da lacuna, e por outro, explicar o modo como as técnicas de reintegração
discerníveis funcionam e se adequam à obra de arte.
estudos de conservação e restauro | nº 1
130
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
Cesare Brandi e o conceito Figura-Fundo
Partindo da análise de um dos conceitos gestaltistas, “igura-fundo”, Brandi interpreta a
lacuna, no contexto de uma imagem pictórica, como uma interrupção formal indevida,
que quando observada com a espontaneidade da percepção é interpretada como uma
“igura” enquanto a imagem pictórica é vista como “fundo”. Segundo o autor, as análises e
as experiências do gestaltismo ajudam a interpretar e a procurar meios para neutraliza-la
(Brandi, 1961:149,150; Brandi, 2006: 19).
De facto a ausência de matéria é visualizada pelo observador como um corpo estranho,
ainda que assuma uma forma física aleatória. A reintegração cromática é um dos meios
para evitar que a percepção a assuma como igura. Mas muitas vezes, a reintegração
hipotética é apenas uma solução parcial para certos casos, como a reconstrução total de
um elemento pictórico. Numa situação destas, Brandi propõe a psicologia Gestalt como
uma solução, com o objectivo de contornar a reintegração fantasiosa (Brandi, 1961:150;
Brandi, 2006:21, 25, 88).
Intuitivamente Brandi reparou que nos casos em que a lacuna está situada numa zona da
pintura em que a tonalidade da camada cromática se assemelha à cor natural do suporte,
o nosso olhar não incide sobre essa lacuna, podendo o suporte icar à vista sem causar
interrupções. Esta solução é explicada pelo gestaltismo, com o facto de ser criado um
mecanismo espontâneo de percepção (Brandi, 2006: 23-25). Todavia, estas são situações
excepcionais, pelo que, na maioria das vezes, é necessária uma intervenção de reintegração
cromática.
Para neutralizar o seu valor negativo, Brandi propôs como primeira solução empírica a
aplicação de tinta neutra. Tratava-se de uma das primeiras tentativas para estabelecer
uma metodologia de restauro que evitasse as reintegrações fantasiosas. Pretendia-se que
a lacuna retrocedesse para segundo plano através de uma tinta o mais possível desprovida
de tonalidade e saturação de cor. O método, segundo Brandi, era honesto mas insuiciente.
Veriicou que a “tinta neutra” inluenciava a distribuição cromática da pintura, icando
mais evidente a lacuna. Era necessário fazer a lacuna recuar em relação ao plano da
pintura, isto é, deixar de ser “igura” e passar a ser “fundo”. Assim, sugeriu uma coloração
em baixo tom ou sub-tom que deixava perceber a continuação da componente formal. A
lacuna funcionava agora como fundo sobre o qual a pintura era a igura, não retrocedendo
integralmente, mas também não incidindo violentamente sobre o tecido igurativo (Brandi,
1961: 150,151; Brandi, 2006: 21-23).
Além destas duas técnicas de reintegração, Brandi propôs uma terceira, o tratteggio,
desenvolvido no Instituto Central de Restauro, em Roma. O tratteggio tinha como objectivo
respeitar a técnica pictórica da obra de arte, evitar reintegrações fantasiosas e tornar
discernível a área de intervenção (Philippot e Philippot, 1959:5; Brandi, 1961:150; Mora,
Mora e Philippot, 1984: 307-311; Emile-Mâle, 1986: 100; Brandi, 2006: 88; Althofer,
2002: 45).
estudos de conservação e restauro | nº 1
131
O gestalismo aplicado à reintegração cromá tica de pintura de cavalete
Ana Bailão
As Leis Gestalt da Organização da Percepção
São oito as leis formuladas pelos gestaltistas para a organização da percepção. Passamos
a descreve-las, correlacionando os conceitos com as lacunas pictóricas (Koffka, 1999: 177210; Ellis, 1999: 71-89).
A “Boa Forma ou Prägnanz” é a propensão natural do ser humano para a concepção de
agrupamentos ou estruturas simples, regulares e equilibradas. Por este motivo, as formas
geométricas simples impõem-se mais facilmente à percepção. O círculo é a forma mais
simples de acordo com as leis da organização perceptiva [Ilustração 1a)]. Tendo em conta
que as lacunas assumem por vezes formas simples, são facilmente distinguidas pelo
observador.
O “Fecho” é a aptidão da nossa mente, em busca da estabilidade e regularidade, em
adicionar elementos em falta para completar a igura [Ilustração 1b)]. Esta capacidade
possibilita-nos a reconstrução de elementos igurativos em falta quando temos referências
formais e cromáticas em torno da lacuna.
A)
Ilustração 1 - A) Boa forma (Koffka, p. 172); B) Fecho (esquema da autora).
B)
Outra lei é a “Boa Continuidade”, segundo a qual, a nossa mente tem tendência para
continuar a ver um padrão comum onde o estímulo visual já terminou [Ilustração 2a)]. Isto
veriica-se tanto em formas e em linhas como no movimento. Este factor, na maioria das
vezes associado à lei do fecho, auxilia-nos na reconstrução de linhas e formas interrompidas
pelas lacunas.
Segundo a lei denominada “Destino comum” a unidade pode ser vista quando os elementos,
as lacunas no nosso caso, se movem na mesma direcção ou sentido da obra [Ilustração
2b)], o que para nós, consoante o número de lacunas, pode resultar numa mancha. Esta
noção de mancha acentua-se tanto mais quanto menor for a distância entre duas lacunas –
lei da “Proximidade” [Ilustração 3], e quanto maior for a semelhança das suas propriedades
físicas (tamanho, cor, formato) – lei da “Semelhança” [Ilustração 4].
estudos de conservação e restauro | nº 1
132
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
A)
Ilustração 2 - A) Continuidade (Koffka, p. 164); B) Destino Comum. (Koffka, p. 143).
Ilustração 3
Ilustração 4
Proximidade. (Arnheim, p. 72).
Semelhança. (Ellis, p.74)
B)
Quando objectos em alinhamento simétrico são compreendidos como pertencentes ao
mesmo objecto diz-se que existe “Simetria”. Este fenómeno ocorre mesmo quando os
objectos não têm proximidade entre eles [Ilustração 5]. Porém, dada a diversidade de
destacamentos e, consequentemente, a aleatoriedade das lacunas, esta lei veriica-se
ocasionalmente.
A última lei ou factor é o “Movimento ou contraste”. De acordo com esta lei, de relação
estrita com o conceito igura-fundo, a presença de um estímulo em movimento num campo
de elementos ou estímulos inertes, criando uma condição de contraste, faz com que esse
estímulo se destaque como igura [Ilustração 6]. É possível constatar este fenómeno em
fundos pictóricos muito homogéneos, como pinturas monocromáticas contemporâneas,
sobre os quais qualquer lacuna se apresenta evidente.
Ilustração 5
Ilustração 6
Simetria (esquema da autora).
Movimento ou contraste (Arnheim, p. 94).
estudos de conservação e restauro | nº 1
133
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
Aplicação das Leis Gestalt da Organização da Percepção na interpretação da
lacuna
A aplicação das oito leis da Psicologia da forma terá em conta as investigações mais recentes
na área, onde se demonstra a importância da subjectividade humana na percepção das
imagens (Yantis, 1992: 295-340; Scholl, 2001: 1-46).
Como caso de estudo foi seleccionada a obra “Ressurreição de Lázaro”, uma pintura
quinhentista pertencente à Charola do Convento de Cristo, em Tomar, na fase da aplicação
de massas [Ilustração 7].
ilustração 7 - Vista geral da pintura “Ressurreição de Lázaro”, após a aplicação das massas de
preenchimento (Fotograia: A. Bailão; F. Henriques).
estudos de conservação e restauro | nº 1
134
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
Quando observamos a obra “no seu todo”, a nossa percepção retém de forma imediata
as lacunas. Estas, não sendo muito extensas na totalidade da área da pintura, captam
o nosso olhar devido às formas geométricas simples que apresentam. Detectamos por
isso linhas, rectângulos, quadrados, círculos e redesenhamos mentalmente as tábuas que
constituem o painel. Estamos perante a lei da Boa Forma ou Prägnanz, segundo a qual o
ser humano tem propensão para agrupar elementos simples, regulares e equilibrados, a lei
que fundamenta e alicerça o pensamento gestaltista.
Quando observamos um pormenor da pintura [Ilustração 8], localizamos duas interrupções
no tecido igurativo. A primeira liderada por três lacunas em forma de elipse (Lei da Boa
Forma), próximas umas das outras (Lei da proximidade). Tratam-se de elementos com
tamanho, cor e formato semelhantes (Lei da semelhança) e que produzem um estímulo de
movimento, em curva sobre a mão inerte da personagem, estímulo esse que se destaca
como igura (Lei do contraste). A lei do contraste permite perceber ainda que quanto maior
o contraste entre os dois elementos, neste caso, três lacunas brancas sobre um fundo
castanho, melhor ele será percepcionado. A segunda perturbação é produzida pela junta,
visualizada como uma linha branca com uma forma rectangular perto da extremidade
inferior. Mais uma vez, são as leis do “contraste” e da “boa forma” que justiicam a percepção
desta descontinuidade na camada cromática.
ilustração 8 - Pormenor. Observação das três lacunas na mão.
(Fotograia: A. Bailão; F. Henriques)
Vejamos ainda o exemplo da Ilustração 9. No lado direito da imagem são evidentes os
topos das respigas da assemblagem e a junta dos painéis. Os primeiros estão deinidos por
dois círculos e a junta por uma linha. Quer os círculos quer a linha ganham protagonismo
estudos de conservação e restauro | nº 1
135
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
em relação à imagem. Assumem formas simples, regulares, acentuadas pela simetria e
semelhança entre as formas (lei da simetria e da semelhança). Os círculos, pelo facto de
se moverem na mesma direcção diagonal ascendente (lei do destino comum), a que se
somam os efeitos dos factores proximidade e simetria, são entendidos como uma unidade.
Ilustração 9 – Pormenor. Visualização das respigas e junta.
(Fotograia: A. Bailão; F. Henriques)
A interpretação da lacuna na Ilustração 10a) depende, em parte, da subjectividade e
atenção de cada observador, como também de duas leis de organização da percepção, a
lei Prägnanz e a lei do contraste. Consoante a experiência pessoal de cada observador, a
mesma lacuna pode adoptar diferentes formas, como por exemplo o formato de um prego,
de um martelo, ou simplesmente de uma linha. Esta interpretação dependerá das diferentes
variáveis da subjectividade do observador. Todavia, quando estamos perante uma fruição
estética do rosto da igura feminina, somos interrompidos por uma forma simples, que o
nosso cérebro tenta descodiicar, relegando a composição pictórica para segundo plano. A
reintegração cromática desta lacuna é o único modo de a remeter para segundo plano. É
possível faze-lo mediante duas colorações, o tom neutro ou sub-tom, ou com uma técnica
discernível, como o tratteggio romano ou ainda com a selecção cromática.
Aplicando o pensamento Brandiano, iremos simular através de tratamento informático da
imagem o uso das duas primeiras técnicas supracitadas.
Como é possível constatar pela Ilustração 10b) o uso do tom neutro na totalidade da
lacuna apenas consegue retroceder metade da lacuna para segundo plano. A permanência
da interrupção do contorno da boca que a nossa mente tende a completar (lei do fecho),
volta a conferir protagonismo à lacuna.
Uma solução para este problema, em particular, pode ser a aplicação de uma coloração
estudos de conservação e restauro | nº 1
136
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
em sub-tom. Como podemos ver pela Ilustração 10c), esta técnica, que se diferencia das
cores originais, quer no matiz quer na saturação de cor, permite deinir os contornos da
boca e deste modo remeter a lacuna para a função de fundo. Todavia, aplicando as leis
da organização da percepção, percebemos que os mesmos critérios que deinem a técnica
do sub-tom perturbam a interpretação da boca como uma forma totalitária. Pelo facto da
cor original ser mais saturada que a cor reintegrada, mais clara e fria, esta é realçada (lei
do contraste). Quanto maior for o contraste entre as duas tonalidades, melhor percebido
ele será. Assim, para solucionar esta questão basta saturar a cor de forma a diminuir o
contraste [Ilustração 10d)]
No nosso caso de estudo, esta mesma imagem foi reintegrada com pigmentos em pó e
aglutinante com a técnica de selecção cromática, por ter sustentação formal e cromática,
não colocando em causa a veracidade formal da obra. Com base na lei da semelhança,
os traços são vistos como elementos com propriedades físicas semelhantes entre si, quer
em tamanho quer em cor. São por isso observados como partes integrantes do mesmo
objecto. A aliança desta característica à mistura aditiva das cores puras pelo olho humano,
torna difícil para o observador distinguir os traços a certa distância.
A)
B)
C)
D)
Ilustração 10 – A lacuna com vários ensaios de tratamento informático da imagem:
A) a lacuna (Fotograia: A. Bailão; F. Henriques); B a lacuna reintegrada com uma coloração “neutra”;
C) deinição da boca com um tom aproximado ao original; D) lacuna reintegrada com uma coloração
harmonizada com as cores originais. Retrocesso total da lacuna para segundo plano.
estudos de conservação e restauro | nº 1
137
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
Conclusão
As Leis da Gestalt da Organização da Percepção são utilizadas em várias áreas da
comunicação, como a informática, o design ou o marketing. Com base nos trabalhos
de Brandi e da Psicologia da Forma demonstrou-se a utilidade das leis na interpretação
da lacuna e fundamentação dos processos de reintegração cromática, tais como o tom
“neutro”, o sub-tom, o tratteggio e a selecção cromática.
Referências
ALTHOFER, Heinz (2002) - La questione del ritocco nel restauro pittorico. Padova: Il
Prato.p.45.
ARNHEIM, Rudolf (2004) – Arte e Percepção Visual: Uma psicologia da visão criadora. São
Paulo: Thompson Learning, pp. 216-223; 365; 379-383.
BRANDI, Cesare (1961) – “Il Trattamento delle lacune della gestalt psychologie In XX
International Congress of History of Art. (Nova Iorque). pp. 149-151.
BRANDI, Cesare (2006), Teoria do Restauro. Edições Orion, Amadora. pp.19; 85-90.
ELLIS, Willis D. (1999) – A Source Book of Gestalt Psychology. London: Routledge. pp.
71-89.
EMILE-MÂLE, Gilberte (1986). Restauration dês Peinturs de Chevalet, Découvrir, Restaurer,
Conserver. Suisse : Ofice du Livre S.A.
GOODWIN, C. James (2005) – História da Psicologia Moderna. São Paulo: Editora Cultrix.
pp. 296,300.
Grande enciclopédia portuguesa e brasileira (1989). Vol. XII. Lisboa; Rio de Janeiro:
Editorial Enciclopédia, Limitada. pp.360,361.
KOFFKA, Kurt (1999) – Principles of gestalt psychology. Nova Iorque: Edição de Routledge,
pp. 177-210.
MACEDO, Newton de (1933) – As novas tendências da psicologia experimental: a teoria da
forma. Coimbra: Imprensa da Universidade.
MORA, Paolo; MORA, Laura; PHILIPPOT, Paul (1984). “Problems of Presentation”. In
Conservation of wall paintings. London/Boston: Butterworths. pp. 309-310.
PHILIPPOT, Albert e PHILIPPOT, Paul (1959). “Le problème de l´intégration des lacunes
dans la restauration des peintures“. In Bulletin de l´Institut Royal du Patrimoine Artistique.
Vol II. Bruxelas: IRPA. pp.5-19.
SMITH, Barry (1996) – Austrian Philosophy: The Legacy of Franz Brentano. Chicago and
LaSalle, Illinois: Open Court Publishing Company. pp.2443- 269.
SCHOLL, Brian J. (2001). - “Objects and attention: the state of the art”. Cognition, Volume
80, Issues 1-2, pp. 1-46.
estudos de conservação e restauro | nº 1
138
O gestalismo aplicado à reintegração cromática de pintura de cavalete
Ana Bailão
YANTIS, Steven. (1992) – “Multielement visual tracking: attention and perceptual
organization”. Cognitive Psychology. 24(3). pp.295-340.
Agradecimentos
A autora agradece a colaboração de Ana Calvo e Rocio Bruquetas como também o apoio
de Frederico Henriques.
Nota biográica
Pós-graduação no curso Conservação e Técnicas de Pintura, na Escola das Artes da
Universidade Católica Portuguesa (UCP); Licenciatura de cinco anos em Conservação e
Restauro pelo Instituto Politécnico de Tomar (IPT); E-mail: ana.bailao@gmail.com
estudos de conservação e restauro | nº 1
139
High Dynamic Range (HDR) images of
radiographies: modern digital replacement of
negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Abstract
With this paper we are presenting a new promising approach to digitalization of radiographic
image in ilm, using common photographic cameras as device to digitalize with different
levels of exposure (allowing, in some cases, to read information from the darker/denser
areas of the image) and combining those images with the new technique of High Dynamic
Range (HDR) imaging, increasing this way the exposure latitude of the inal image. This
new approach is possible today because the most recent generations of image treatment
software present this new feature. Examples of software presenting this tool are the market
leader Adobe Photoshop (presenting this HDR capacity since CS2 version) or the most
HDR specialized Photomatix, among others. The resulting images seem to show in some
cases more interesting results than the single pass digitalization of images, with or without
post-processing improvement, and can in some cases be a good alternative to the use of
negatoscopes on the exam of radiographies.
Keywords
Radiography, HDR, negatoscope, Photoshop, Photomatix.
Resumo
Neste artigo apresentamos uma aproximação promissora à digitalização de imagem
radiográica em ilme, através da utilização de máquinas fotográicas comuns enquanto
mecanismos que permitem a digitalização com diferentes níveis de exposição (permitindo,
em alguns casos, ler informação a partir das áreas mais escuras e densas da imagem)
e combinando estas imagens com novas técnicas de High Dynamic Range (HDR),
aumentando desta forma a latitude de exposição do resultado inal. Esta nova abordagem
é actualmente possível devido às mais recentes gerações de software para tratamento de
imagem que presentemente utilizamos. Como exemplos de software que possuem esta
ferramenta podemos apontar o líder de mercado Adobe Photoshop (que apresenta esta
capacidade em HDR desde a versão CS2) ou o mais especializado em termos de HDR,
Photomatix, entre outros. As imagens inais apresentam em alguns casos resultados mais
interessantes do que a simples digitalização de imagem, com ou sem processamento
posterior e pode, em alguns casos, ser uma boa alternativa ao uso de negatoscópios no
exame de radiograias.
estudos de conservação e restauro | nº 1
140
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Palavras-chave
Radiograia, HDR, negatoscópios, Photoshop, Photomatix.
Resumen
Con este estudio presentamos una nueva aproximación a la digitalización de las imágenes
radiográicas en película, usando cámaras fotográicas comunes como mecanismos para
digitalizar con diferentes niveles de exposición (permitiendo, en algunos casos, leer
la información de las áreas oscuras/más densas de la imagen) y combinando aquellas
imágenes con las nuevas técnicas de High Dynamic Range (HDR), incrementando de este
modo la latitud de la exposición de la imagen inal. Esta nueva aproximación es posible
hoy en día debido a las más recientes generaciones de software para el tratamiento de
imágenes. Como ejemplos de software que ofrecen esta herramienta está el líder del
mercado Adobe Photoshop (presentando esta capacidad de HDR desde la versión CS2) o el
más especializado HDR Photomatix, entre otros. Las imágenes obtenidas parecen mostrar
en algunos casos resultados más interesantes que las del simple paso de digitalización de
imágenes, con o sin implementar el posterior procesamiento, y pueden, en algunos casos,
ser una buena alternativa al uso de negatoscopios en el examen de radiografías.
Palabras clave
Radiografía, HDR, negatoscopio, Photoshop, Photomatix.
Introduction
One problem with traditional ilm radiography of works of art is the large difference in density
of the images between areas of different radiopacity, principally with three dimensional
works, like wood sculptures. To be possible to scientists, historians and conservators
analyze radiography with all their differences in density, usually it is necessary to use
negatoscopes, a special type of light-box that have included a special illumination system
that allows the user to control the power of background light. But those systems are rare
to ind, they are size limited and usually expensive. Even like that none of them gives a
good reading of denser (darker) areas simultaneously with less denser (lighter) areas of a
radiography!
Besides being commonly smaller than the total area of the X-rayed image, negatoscopes
do not allow a general perception of the entire work of art with is entire tonal range.
In the eighties this technological limit was turnaround with the use of special equipment
like the Logetronic radiography (Schoute et al., 1986) and, more recently, with “digital
enhancement” with computers.
estudos de conservação e restauro | nº 1
141
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Digital enhancement with computers: advantages and risks
Recently, with the advent of computers and scanner devices, it was possible to digitalize a
radiography and improve the contrast/brightness of the image, improving the readability
of the information but usually the darker areas (corresponding to more dense areas) or the
lighter ones do not show their full information simultaneously.
Sometimes the digital enhancement can also “destroy” the readability of some areas of the
image or create artefacts, as shown when comparing the following Figures 1 and 2 of a
radiography made by the author (followed by a digital treatment of the image, on Figure 2).
Figure 2 - the same image from Fig. 1 but
digitally enhanced with Photoshop, showing
the inal result overall better details reading.
However, some information was lost, on the
thinner parts of the sculpture (compare with
ig.1).
Figure 1 - Example of an well exposed
radiography of an wooden sculpture, (“St.ª Ana e
N.ª Sr.ª”, possibly from XVIII century) digitalized
with a DSLR camera (Nikon D70), without digital
treatment (only converted from RAW to JPG ile).
Radiography data - Portable YXLON X-ray ampoule,
model SMART 160E/ 0,4. with additional Al ilter
removed. Radiographic ilm Agfa ref. 3JSLY D, D7.
Exposure made with the ilm at 2 meters from the
X-ray source, during 90 seconds at 65 kV, 6 mA.
Digitalization data - Radiography mounted on a
lightbox and photographed with a Nikon D70 camera
with Micro Nikkor 60mm/f2.8 lens, image captured at
1/15 sec., f/8, iso 200, NEF Raw ile.
estudos de conservação e restauro | nº 1
Image treatment data - Image treated with Photoshop:
•
Converted from RAW ile
•
Colour desaturated
•
•
Curves applied (to improve overall contrast;
“levels” could be used instead)
Unsharp mask applied
142
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Exposure latitude, Dynamic Range and bit depth
To better understand the technique of making High Dynamic Range (HDR) images when
photographing radiographies and how this allows overcoming the limits of one single
exposure photograph, we will explain briely three concepts necessary to understand HDR:
Exposure latitude, Dynamic Range and Bit depth.
Exposure latitude:
This is a concept that comes from ilm photography; it tell us how many Exposure Values
(EVs or photographic “stops”) can be registered showing detail on a type of ilm. For
example, the traditional slide or transparency ilm usually presents an exposure latitude of
3 EVs, usually 1½ each side of “correct exposure”; on the other hand Negative ilm usually
present 5 stops of exposure latitude, 2½ each side of “correct exposure”.
If the necessary exposure range is wider than the latitude of the ilm, the information on
dark areas stay black, or white on brighter areas, but in both cases without distinguishable
information (no visible details) on it.
With digital photography, the term “exposure latitude” is less used to describe the sensor
characteristics than other two related parameters: “Dynamic Range” and “Bit Depth”,
explained bellow:
Dynamic Range:
The capacity of a scanner or digital camera to digitalize different densities of an image
usually is mentioned by the respective device maker on the speciications of the equipment.
The density is measured with a logarithmic scale:
D=0: minimum value (Dmin), corresponding to pure white tone a device can represent;
D=4: maximum value (Dmax) ), corresponding to pure black tone a device can represent.
The difference between Dmax and Dmin is what is known as “Dynamic Range”; so in
practical terms Dynamic Range is the range of tones a device can represent. Example: a
scanner with Dmax=3.2 and Dmin=0.1, gives a inal Dynamic Range of 3.1 (3.2 - 0.1 =
3.1)
Bit Depth:
The quantity of information (measured in Bit) stored in all channels of colour to represent
the tones is known as “Bit Depth”; Example: if a RGB camera or scanner presents Bit Depth
of 42 bit, that means they have 14 bit of information for each colour channel (Red channel,
Green channel or Blue channel): 14 bit x 3 = 42 bit
42 bit is the maximum Bit Depth of currently commercialized DSLR cameras.
Dynamic Range and Bit Depth are interrelated: an higher Bit Depth on a device usually
means that it can have an wider Dynamic Range too.
So how Dynamic Range and Bit Depth relation works?
estudos de conservação e restauro | nº 1
143
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
There is a very good metaphor that helps to better explain how this interrelation works
(Blatner et al., 1998), explained on the next Figure (Fig. 3).
Figure 3 - The Blatner et al. “Real World Scanning and Half Tones Book”
metaphor for digital devices: the stairs!
Dynamic Range - the “range” of the stairs (maximum length, for ex.: 3 meters):
Bit Depth - the quantity of steps of the stairs (for example, 12 steps)
In a stairs it is important not only the length or how high the stairs can reach but also the
number of steps. Both characteristics are important and usually interrelated: frequently
the stairs with a bigger number of steps can also reach a higher height, but this is not
mandatory and some stairs can have a long height with a small number of steps or vice
versa.
If Dynamic Range is the “height” or range of tones a device can reach, it is also important
the Bit Depth or the number of intermediate tones this device can represent. As we have
already said before, both characteristics are interrelated and both are important.
HDR images
One way to surpass the physical limit of the Dynamic Range of a device is to join the
information of different images (taken with different exposures), extending that way the
inal Dynamic Range and Bit Depth: this is what is called High Dynamic Range (HDR)
imaging. On the following igures (Fig. 4 and 5) we show an example of maybe the most
common use of an HDR image: applied to a landscape (taken by the author at Ordesa
National Park, in the Spanish Pyrenees):
estudos de conservação e restauro | nº 1
144
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Figure 4 - Normal camera exposure: we can appreciate the lost of details on highlights and deep
shadows.
On the histogram it is visible the strong clipped areas representing the lost of detail on highlight (right side of
the graphic) and shadows (left side of the graphic).
Figure 5 - HDR composite resulting from 9 photos with different exposures (1 stop bracket),
produced with Photoshop: now we have details on shadows, middle tones and highlights!
Shooting data - Nikon D200 camera, Nikkor 18-200mm lens, aperture priority auto-exposure, 1 EV step 9
frames autobracketing, fast continuous shooting at 5 frames per second to avoid clouds and trees movement.
Camera mounted on tripod and triggered with remote cable release.
estudos de conservação e restauro | nº 1
145
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
This technique it is only possible to apply to static objects; fortunately this is the case of
Works of Art and radiographies!
With HDR (at least with current state of the Art), we lose colour representation accuracy;
this can be a problem to represent works of art, but with monochromatic radiographic
representation colour is not a problem!
Softwares for HDR
Adobe Photoshop (CS2 version or greater): in our opinion, the best for use with
radiographies; it is widely used by the serious photographers, so usually they already
have it and are familiar with his interface;
HDRSoft Photomatix Pro, maybe easier and more useful for landscape photography, but
on our experience not so satisfying for X-ray HDR images; but it is a question of user
preference, not a “technical conclusion”.
In the present paper we have used the Photoshop CS2 “Merge to HDR” function to
present our HDR results.
HDR on a radiography: a practical case
For this experience we have used the side radiography of an wooden sculpture (S.
Estêvão, polycrom. Wood, possibly from XVIII century). On this radiography it was
dificult to have a good reading of thinner details of the sculpture (using a lightbox, not
a true negatoscope). We have done the digitalization of this radiography with a DSLR
(Nikon D70), 8 exposures with 1 stop bracket steps varying the shutter time, captured on
Nikon’s NEF Raw iles.
The HDR was built using the resulting images and combining them with the Adobe
Photoshop CS2 “Merge to HDR” automation.
On the igures we can appreciate the side radiography of the mentioned wooden
sculpture, were is dificult to have a good reading of thinner details of the sculpture
(ex.: nose, air,…) on the most common “average exposure” single photography (Fig.6).
Overexposed digitalization of the same radiography it is shown on the Fig. 7.
In that case, the thinner parts of the sculpture are now visible, revealing that those
details were registered on ilm. Unfortunately, now we lose the highlight details
(corresponding to thicker sculpture parts) at the same time!
estudos de conservação e restauro | nº 1
146
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Figure 6 - digital photography of a ilm radiography
Radiography data - Portable YXLON X-ray ampoule, model SMART 160E/ 0,4. with additional Al ilter removed.
Radiographic ilm Agfa ref. 3JSLY D, D7. Exposure made with the ilm at 3 meters from the X-ray source, during
60 seconds at 75 kV, 6 mA.
Digitalization data - Radiography mounted on a lightbox and photographed with a Nikon D70 camera with Micro
Nikkor 60mm/f2.8 lens, image captured at 1/20 sec., f/8, iso 200, NEF Raw ile.
Figure 7: over-exposed digital photography of a ilm radiography
Radiography data - It is the same radiography that was described on Fig.6. (75 kV - 6 mA - 3 m - 1 min.).
Digitalization data - Radiography mounted on a lightbox and photographed with a Nikon D70 camera with Micro
Nikkor 60mm/f2.8 lens, image captured at 0,77 sec., f/8, iso 200, NEF Raw ile.
estudos de conservação e restauro | nº 1
147
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
We have taken a sequence of eight photos of the radiography, with a difference of 1 EV
exposure between them.
The attributes for these photos are:
In common:
•
•
•
•
Radiography mounted on a lightbox;
Radiography photographed with a Nikon D70 camera
Micro Nikkor 60mm/f2.8 lens
Image captured at f/8, iso 200, NEF Raw ile.
Varying only the exposure with the shutter:
•
•
•
•
•
•
•
•
1/80 sec.
1/40 sec.
1/20 sec.
1/10 sec.
1/5 sec.
1/2 sec.
1.6 sec.
3 sec.
Combining the resulting eight photos with the “merge to HDR” automation on the
Photoshop, interface window of this Photoshop tool is shown on the igure 8:
Figure 8: screen capture showing the appearance of “Merge to HDR” automation on Photoshop,
during the process of combining the selected 8 photos.
estudos de conservação e restauro | nº 1
148
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
The resulting HDR composite image, made from eight different photos, presents 32 bit
per channel Bit Depth (total 96 bit RGB!). The dynamic Range it is now so wide that it is
impossible to represent on a common computer screen. It shows a bizzar look and at a
irst appreciation disappointing, as shown on igure 9.
Figure 9: screen capture of the resulting 96 bit HDR composite, impossible to show all his Dynamic
Range in tonalities on a 24 bit limited computer screen.
So to be useful we need to convert the resulting 96 bit image to a more frequent (and
screen compatible) 24 bit RGB image (8 bit per channel image).
With the image opened on Photoshop, we can perform a conversion from 32 bit per
channel to 8 bit per channel on the following menu/options: “Image>Mode>8 bit/
channel”.
Another interface window appears asking to choose the conversion method to reduce
from 32 to 8 bit; we have used the “Local Adaptation” method, working with curves on
the histogram, searching for the best overall visualization of detail.
Figure 10: screen capture of the “Local adaptation” conversion window, were it is possible to
perform a visual enhancing using the histogram and curves.
estudos de conservação e restauro | nº 1
149
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Completing the conversion, now we can save the inal resulting image ile as a 24 bit
TIFF or other convenient image ile.
On the following image inally we can compare a detail of the radiography before (igure
6) and after HDR conversion (igure 11). The red arrows are showing areas were we can
observe detail when it was almost invisible in a single shot photography (igure 6).
Figure 11 - detail of an HDR composite of a radiography
Radiography data - Portable YXLON X-ray ampoule, model SMART 160E/ 0,4. with additional Al ilter removed.
Radiographic ilm Agfa ref. 3JSLY D, D7. Exposure made with the ilm at 3 meters from the X-ray source, during
60 seconds at 75 kV, 6 mA.
HDR data - Radiography mounted on a lightbox and photographed with a Nikon D70 camera with Micro Nikkor
60mm/f2.8 lens, image captured at f/8, iso 200, NEF Raw ile;
HDR image made with Photoshop CS2, merging these 8 photos taken with 1 stop exposure step (1/80 sec.,
1/40 sec., 1/20 sec., 1/10 sec., 1/5 sec., 1/2 sec., 1.6 sec., 3 sec sec.); the inal result was converted to 8 bit/
channel (24 bit) and desaturated to monochromatic result.
Conclusion
With this experience we believe we have proved that, at least in some cases, we can
replace with advantages the traditional negatoscope by a virtual “lightbox” using High
Dynamic Range imaging technologies. It is possible to have a inal image representing on
the same single image all the available details in high contrast radiographic images, such
is the case in sculptures side radiographies. This technique presents also the advantage
of being more affordable to the majority of potential users and usually any photo studio
already has the necessary tools: a lightbox, a digital camera and postproduction software
with HDR function, like the Adobe Photoshop (CS2 version or greater).
estudos de conservação e restauro | nº 1
150
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
Figure 12.a) - Complete radiography image without HDR (normal single shot exposure photo);
Figure 12.b) - HDR inal composite resulting of 8 pictures (with 1 stop of difference for exposure)
merged. Read the text and previous igures for technical details.
References
[1] ALDROVANDI, Alfredo; PICOLLO, Marcello. (2001) Metodi di documentazione e
indagini non invasive sui dipinti. Padova: Il Prato.
[2] CASTELLANO, Alfredo; QUARTA, Stefano. «Le Tecniche radiograiche per
l’archeometria.», In CASTELLANO, Alfredo; MARTINI, Marco; SIBILIA, Emanuela, (2002)
coord.– Elementi de Archaeometria. Metodi isici per i beni culturali. Milano: ESEA, pp.
131-153.
[3] SCHOUTE, Rogier Van; VEROUGSTAETE, Hélène. «Radiography», In VAN SCHOUTTE,
Roger; VEROUGSTRAETE-MARCQ, Hélène, (1986) coord. - Scientiic Examination of Ease
Paintings. Strasbourg: Council of Europe:, PACT 13, pp. 131-153.
[4] BLATNER, David; FLEISHMAN, Glenn; ROTH, Steve (1998). Real World Scanning and
Halftones. 2nd Ed. Berkeley: Peachpit Press, pp. 13-16.
Acknowledgements
- To the Universidade Católica Portuguesa (Centro de Cons. e Restauro and CITAR) , for
the permission to use the images and radiographies presented here.
estudos de conservação e restauro | nº 1
151
High Dynamic Range (HDR) images of radiographies:
modern digital replacement of negatoscopes?
Luís Bravo Pereira
- To the ownwers of the works of art showed on the examples presented here: the
“Museu de Santa Maria de Lamas”, owner of “S. Estêvão” sculpture; “Igreja de Santa
Maria de Airães”, owner of “Stª Ana e N. Srª” sculpture.
- This research was also supported in part by “Fundação para a Ciência e Tecnologia”
training grant SFRH / BD / 39192 / 2007.
Biographical notes
Luís Bravo Pereira is an Assistant at Universidade Católica Portuguesa (U.C.P.) – Escola
das Artes – since 2003, technical responsible for the photographic and radiographic
studio at the U.C.P. Restoration Center; presently it is developing his PhD research and
thesis on Multispectral imaging applied to works of Art.
estudos de conservação e restauro | nº 1
152
recensões críticas
estudos de conservação e restauro | nº 1
153
Conservación del Patrimonio Cultural
Criterios y normativas
Ana Macarrón
Colección Patrimonio Cultural
Editorial Síntesis
Madrid, 2008
284 págs., ilustrações a preto e branco, 23 x 17cm
ISBN: 978-84-975655-8-5
Este libro de Ana Macarrón se encuadra dentro de la colección que la Editorial Síntesis
viene publicando, sobre Patrimonio cultural, desde 2003. Todos los títulos de esta serie
ya impresos (véase www.sintesis.com) resultan de especial interés en el ámbito de la
conservación-restauración y el patrimonio artístico. En su mayor parte han sido realizados
por profesores universitarios. El primero de la colección, Teoría contemporánea de la
Restauración, de Salvador Muñoz, abordaba también cuestiones de criterios, pero escrito
desde una perspectiva más orientada hacia la relexión teórica. Después se editaron otros
textos más técnicos y especializados, como Fundamentos de química y física para la
conservación y restauración, de Margarita San Andrés y Sonsoles De la Viña; Transporte,
depósito y manipulación de obras de arte, de Mikel Rotaeche; y, el último, Biología aplicada
a la conservación y restauración, de Violeta Valgañón.
A sus ya conocidas publicaciones anteriores, Historia de la conservación y la restauración y
La conservación y la restauración en el siglo XX -ambas editadas en Tecnos-, Ana Macarrón
añade un nuevo título. En este, como en los otros casos, se percibe su labor y experiencia
como profesora en la Facultad de Bellas Artes de la Universidad Complutense de Madrid.
Son libros con un marcado carácter didáctico y, como consecuencia, suponen una gran
aportación para el mundo docente.
Conservación del Patrimonio Cultural. Criterios y normativas se divide en dos grandes
bloques. El primero está dedicado a conceptos básicos, deiniciones y clasiicaciones
fundamentales Asimismo introduce breves descripciones de las competencias y cometidos
de los organismos dedicados a la protección del Patrimonio y de los Bienes Culturales. La
segunda parte de la obra se centra en las medidas de salvaguardia y normativas aplicables
a los distintos tipos de Patrimonio.
Comienza, por tanto, clariicando términos y funciones y diferenciando las distintas clases
de bienes culturales. Así, por ejemplo, en el primer capítulo delimita los conceptos de
“criterio”, “teoría” y “normativa”; y hace referencia a las tres legislaciones fundamentales,
las de la UNESCO (convenios, recomendaciones y declaraciones), las del Consejo de Europa
y la UE (convenios, recomendaciones, resoluciones y declaraciones, cartas, reglamentos y
directivas), y las españolas (constitución, leyes y decretos).
estudos de conservação e restauro | nº 1
154
Conservación del Patrimonio Cultural
Criterios y normativas
Ana Macarrón
Tras dedicar unas páginas a debatir y especiicar las deiniciones de conservación y
de restauración -apoyándose en los documentos más autorizados, como la Carta de
Copenhague y el Código de Ecco-, hace un breve recorrido por los antecedentes históricos
de estas materias. Pasa, después, a describir sucintamente los otros textos de proyección
internacional que se han convertido en fuentes reguladoras de criterios, empezando por la
Carta de Atenas de 1931, continuando con los españoles, desde la Constitución de 1978.
Posteriormente, Ana Macarrón aborda los conceptos de Bien Cultural y de Patrimonio,
matizando sus límites y conexiones. Vincula también en este apartado las normativas
nacionales e internacionales. Al referirse a los organismos dedicados a la defensa del
Patrimonio cita y describe las competencias de la UNESCO, ICOMOS, ICOM, ICCROM, GCI,
IFLA, ICA, IIC, INTERPOL, el Comité Intergubernamental de la UNESCO, el Consejo de
Europa y la Unión Europea. En el ámbito español son mencionados distintos Ministerios,
desde el de Cultura hasta Economía y Hacienda, Fomento o Medio Ambiente, así como las
Comunidades Autónomas, Ayuntamientos, Comisión Mixta Iglesia-Estado, Policía y Guardia
Civil, Tribunales de Justicia y, inalmente, fundaciones y asociaciones. Cabe destacar, por
tanto, que, aunque la autora haga especial referencia a la normativa española, también
iguran los organismos internacionales que se dedican a la protección del patrimonio
cultural. Por ello esta publicación tiene interés también en Portugal y en otros países.
La información documental acumulada en las páginas anteriores rinde un gran servicio al
especialista, al proporcionarle, reunido y asequible, un material generalmente disperso.
Gracias a estos datos, la obra tiene un uso tanto de lectura como de consulta. Pero a esta
rica aportación, se añade la gran utilidad de una serie de ejemplos prácticos, con los que
ilustra las distintos cuestiones planteadas, como la plaza de Santa Teresa en Ávila, los
templos de Abu Simbel, la ampliación del Museo del Prado, las agujas de Notre Dame, la
reconstrucción de Dubrovnik, los teatros romanos de Mérida y Sagunto, la destrucción de
la Biblioteca Nacional de Bagdad, el Parque Nacional de Doñana y el de Everglades. Todos
estos casos, muy bien elegidos, aclaran las nociones de Patrimonio y su tratamiento:
arquitectónico, arqueológico, bibliográico y documental, cultural inmaterial, patrimonio
mueble y patrimonio natural.
Para completar aún más el carácter pedagógico del libro, en todos los capítulos existe al
inal un resumen o cuadro sinóptico, así como una bibliografía complementaria especíica,
incluyendo recursos en Internet.
Afortunadamente las cuestiones relacionadas con los criterios de intervención en el
Patrimonio artístico y cultural constituyen una preocupación social cada vez mayor. Los
bienes culturales se valoran bajo nuevas premisas, que atañen a sus cualidades materiales,
documentales, históricas o funcionales, además de las estéticas. El deseo de conservar
las construcciones del pasado merece la mayor atención, ya que debemos sentirnos
responsables de su transmisión a generaciones futuras, sin renunciar por ello a las novedades
estudos de conservação e restauro | nº 1
155
Conservación del Patrimonio Cultural
Criterios y normativas
Ana Macarrón
que ofrece el mundo moderno, el arte y la arquitectura contemporáneas. Con objeto de
hacer compatibles estos dilemas y hacer frente a la arbitrariedad de las intervenciones del
pasado, desde principios del siglo XX, se realizaron reuniones de expertos, emitiéndose
documentos que relejaban estas preocupaciones. Sin embargo, el debate sigue abierto
porque nuestros criterios se alteran y cambian con el tiempo. Por lo tanto, publicaciones
como ésta, que recoge y sintetiza las más signiicativas propuestas en materia de ética y
de criterios son fundamentales para saber como ha evolucionado el pensamiento, es decir
de dónde venimos y hacia dónde vamos en conservación y restauración del Patrimonio.
Ana Calvo
estudos de conservação e restauro | nº 1
156
Conservação Preventiva e Preservação
das Obras de Arte – condiçõesambiente e espaços museológicos em
Portugal
Luís Efrem Elias Casanovas
Edição: Inapa | Santa Casa da Misericórdia de Lisboa
Lisboa, 2008
231 págs., ilustrações a cores e a preto e branco, 16,2 x 23,2cm
ISBN: 978-972-797-181-1
A publicação da dissertação de Doutoramento de Luís Efrem Elias Casanovas representa
um importantíssimo contributo para o estudo da Conservação Preventiva em Portugal,
resultante do estudo intitulado Conservação Preventiva e Preservação das Obras de Arte
– condições-ambiente e espaços museológicos em Portugal. Apresentada à Faculdade de
Letras da Universidade de Lisboa, no ano de 2006, encontra-se publicada desde Dezembro
de 2008, por iniciativa da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Este trabalho é iniciado por uma revisão do conceito de Conservação Preventiva, um
dos principais objectivos do autor, elaborada mediante uma perspectiva histórica; aqui
encontramos sobretudo a referência e respectiva exaltação da igura de Garry Thomson no
surgimento do estudo sistemático das condições-ambiente. Salienta-se a importância da
História e de outras áreas do conhecimento (Ciências, História da Arte, História das Ideias,
entre outras) para uma profunda compreensão do conceito desta prática que antecede
e transcende os limites do século XX. Após esta análise histórica do conceito, Luís Elias
Casanovas estabelece um ponto de ligação entre a “preservação tradicional”, existente
sob várias formas desde a génese da criação artística, e a Conservação Preventiva, termo
amplamente utilizado actualmente. Para a criação deste termo e respectivo conceito o
autor salienta o contributo do Instituto Canadiano de Conservação e o ICCROM para a
consolidação da disciplina tal como a conhecemos hoje em dia.
Elaborada esta análise crítica sobre o próprio conceito de Conservação Preventiva, o
segundo capítulo deste trabalho concentra-se na interacção entre os materiais que
constituem os objectos culturais e as condições-ambiente. Esta análise dirige-se sobretudo
para o meio ambiente museológico, abrangendo o ciclo de vida da maioria dos bens
culturais e sua relação com a conservação: igreja/mosteiro para habitação, da oicina ao
museu. As condições no interior do espaço museológico são abordadas de acordo com
factores basilares para a Conservação Preventiva: poluição, luz, humidade, temperatura
e comportamento dos materiais. Aqui analisam-se questões de extrema relevância, tais
como a evolução do conceito de exposição e de museu enquanto objecto, bem como a
relação entre objecto cultural e público.
No encadeamento deste raciocínio segue-se uma análise da inluência do clima exterior
estudos de conservação e restauro | nº 1
157
Conservação Preventiva e Preservação das Obras de Arte
condições-ambiente e espaços museológicos em Portugal
Luís Efrem Elias Casanovas
para a conservação e para a deinição das condições-ambiente. Enfatiza-se novamente
o papel da História para o conhecimento da importância dos componentes do edifício na
conservação, bem como para a revisão dos valores tradicionais de temperatura e humidade
relativa (valores estes de referência actual e global) – nomeadamente a História do Clima.
Este ponto faz o elo de ligação à realidade portuguesa, ou seja, à caracterização do seu
clima e da construção tradicional dos seus edifícios e de que forma isto inluencia a visão
da Conservação Preventiva nos espaços museológicos em Portugal. Deste estudo fazem
parte as análises particulares e comparativas de sete museus portugueses: Museu do
Azulejo, Museu da Fundação Arpad Szenes / Vieira da Silva, Museu da Fundação Medeiros
e Almeida, Museu Arqueológico Infante D. Henrique de Faro, Museu Municipal de Portalegre
e Casa-Museu José Régio de Portalegre, Museu da Quintas das Cruzes, no Funchal.
Luís Elias Casanovas apresenta uma abordagem que contempla e privilegia a “realidade
física e cultural de cada museu” em prol de conceitos pré-deinidos que frequentemente
não se adequam à realidade e necessidades de muitas colecções. Como variáveis a
considerar encontram-se então a história da colecção, o edifício, seus constituintes e
respectivos comportamentos mecânicos e a inluência do clima exterior, numa equação
única e integrante de todos estes valores.
De leitura obrigatória para todos os intervenientes nos espaços museológicos, esta obra
coloca questões pertinentes sobre os princípios basilares da Conservação Preventiva, num
esforço de constante avaliação e crítica que a preservação dos objectos culturais requer.
Salomé de Carvalho
estudos de conservação e restauro | nº 1
158
Conservação Urbana e territorial
Integrada. Reflexões sobre salvaguarda,
reabilitação e gestão de Centros
Históricos em Portugal
Francisco Queiroz e Ana Margarida Portela
Edição: Livros Horizonte
Lisboa, 2008
204 págs., ilustrações a perto e branco, 17 x 24cm
ISBN: 978-972-24-1597-2
Os autores de “Conservação Urbana e Territorial Integrada” pretendem alertar o público
para um tema de grande actualidade, sobre o qual existe escassa produção bibliográica
no nosso país. Ao basearem o seu trabalho nas relexões decorrentes da sua prática
proissional enquanto consultores de diversas entidades na área da gestão e reabilitação
de centros históricos e formadores na Escola Superior Artística do Porto, fazem-no em tom
irreverente e perfeitamente conscientes da polémica que podem suscitar muitas das suas
críticas e conclusões. Aliás, o facto de se tratar de uma obra que pretende a “ruptura de
procedimentos manifestamente inadequados” (p. 8), face aos consensos prevalecentes
neste domínio, é desde o início assumido sem quaisquer complexos.
O livro articula-se em redor de três partes estruturantes: a primeira, dedicada à conservação
urbana territorial integrada, inclui uma análise crítica sobre o caso do centro histórico
do Porto; a segunda, na qual os autores expõem um caso de estudo relacionado com o
possível impacto da Escola Superior Artística do Porto na revitalização comercial na sua
área de implantação; e por último, uma terceira, onde são abordadas as singularidades
do centro histórico de Vila Nova de Gaia, as problemáticas decorrentes da presença de
elementos rurais em núcleos históricos que hoje se encontram em áreas suburbanas,
terminando com uma discussão sobre a legitimidade da permanência da habitação social
em centros históricos.
Numa tentativa de clariicação da noção de restauro urbano integrado, os autores fazem
um esforço por explicitar, logo no primeiro capítulo, as suas deinições de reabilitação
e de requaliicação, calibrando a sua análise com referência às deinições emanadas de
entidades internacionais, como o ICCROM.
Partindo do conceito alargado de conservação urbana integrada como actividade
direccionada para a conservação do ediicado histórico consolidado - mas que não se
esgota aí - e que se deve constituir, antes de mais, como acção que tenha em conta valores
do território ambiental/paisagístico, social e económico onde se insere o seu objecto
de estudo (a preservação de todos estes valores transcende o âmbito restrito do mero
restauro arquitectónico), os autores debruçam-se sobre diversos dilemas relacionados com
a formação académica nesta área, com os peris proissionais dos principais intervenientes,
estudos de conservação e restauro | nº 1
159
Conservação Urbana e territorial Integrada.
Reflexões sobre salvaguarda, reabilitação e gestão de Centros Históricos em Portugal
Francisco Queiroz e Ana Margarida Portela
sobre a falta de qualiicação de equipas que deveriam ser pluridisciplinares e que na realidade
não o são (por continuarem dominadas pelo arquitecto sem especialização), avançando
algumas soluções no sentido de tentar colmatar lacunas que consideram graves. Assim,
e como resposta ao problema da formação, bem como ao dos peris necessários a uma
acção mais assertiva neste campo, os autores defendem a criação de um curso superior de
restauro urbano integrado, cuja estrutura se poderá articular com os tradicionais peris da
formação em arquitectura, podendo originar dois novos peris: o de arquitecto restaurador
e o de arquitecto conservador urbano. As suas propostas nesta direcção estribam-se em
experiências levadas a cabo noutros países europeus e no Brasil (pp. 23-26).
No que concerne ao centro histórico do Porto, são dissecadas as razões históricas (séc.
XIX) que explicam o surgimento de certas feridas no tecido urbano. Se a opção pelo
caminho-de-ferro determinou a construção de infra-estruturas de grande impacto, como
a Ponte D. Maria Pia ou, mais tarde, a própria estação de S. Bento, a nova centralidade
cristalizada pelo rasgar da Praça da Liberdade e da Avenida dos Aliados terão sido, no
dizer dos autores, o catalisador de toda uma série de profundas alterações, com forte
repercussão na orgânica funcional do velho centro histórico, de origem medieval. A este
cenário viria somar-se a gradual conquista da cidade pelo motor de combustão interna, das
cargas e descargas ao transporte colectivo (autocarros), passando pelo automóvel familiar.
Destacam-se neste contexto a construção da Avenida da Ponte e do túnel da Ribeira, que
no seu conjunto originaram a secundarização de alguns espaços públicos, a alteração
funcional de outros e, sobretudo, um corte no primitivo tecido do núcleo histórico.
Considerando que a actual situação do centro histórico do Porto é uma das mais graves
do país, são analisadas com pormenor algumas das intervenções de reabilitação do tecido
urbano enquadradas em programas recentes (por exemplo, aquando do Porto 2001) ou
decorrentes na actividade normal do CRUARBE. Os autores são particularmente cáusticos
neste ponto, entregando-se à tarefa de enumerar sucessivos falhanços, consubstanciados
em obras como o Clérigos Shopping, hoje convertido em verdadeiro cadáver urbano, a
Viela do Anjo ou o Jardim da Cordoaria. Questões como a incompatibilidade provocada pelo
uso de novos materiais na recuperação da arquitectura tradicional, a escolha de material
inadequados para o espaço público, a subjugação do construído à vontade dos projectistas
(Casa dos 24), ou as contradições do masterplan da Sociedade de Reabilitação Urbana
face ao Plano Director Municipal, são igualmente alvo do escalpelo implacável de Francisco
Queiroz e Margarida Portela.
De um modo geral, torna-se claro que há poucos bons exemplos a registar, na opinião dos
dois autores, que no entanto mantém grandes expectativas quanto à futura actuação da
SRU. Nesta linha de pensamento insere-se o estudo de caso que integra a segunda parte da
obra, e com o qual pretenderam levantar alguns dos principiais problemas de habitabilidade
e ixação no centro histórico, para concluir da necessidade de aproveitamento dos recursos
pré-existentes (percursos pedonais/actividades) no planeamento da reabilitação.
estudos de conservação e restauro | nº 1
160
Conservação Urbana e territorial Integrada.
Reflexões sobre salvaguarda, reabilitação e gestão de Centros Históricos em Portugal
Francisco Queiroz e Ana Margarida Portela
O livro é encerrado com uma relexão sobre as vicissitudes históricas inerentes à
formação do núcleo urbano de Gaia e as singularidades que o passaram a marcar, desde o
estabelecimento dos armazéns do Vinho do Porto, autêntico “cimento urbano” justiicativo
da actual noção de centro histórico. A atenção do leitor é aqui dirigida para a evolução
das práticas de valorização e recuperação em Vila Nova de Gaia, ao mesmo tempo que
são expostas algumas contradições evidentes nas políticas de intervenção seguidas por
sucessivos executivos camarários. Isto não obsta, contudo, a que sejam indicadas algumas
soluções para enfrentar os desaios decorrentes da candidatura a património mundial.
Tentando generalizar com base na realidade do concelho de Gaia, é também abordada
a problemática da conservação de núcleos essencialmente rurais em áreas suburbanas,
apontando maus exemplos e fornecendo algumas estratégias de actuação.
Representando uma relexão bem fundamentada orientada pelos parâmetros de uma
crítica interveniente, esta obra é de leitura recomendada para todos os proissionais da
conservação urbana, gestores e decisores, muito embora o carácter regional dos estudos
apresentados sirva mais adequadamente os objectivos de quem trabalha na área geográica
escolhida pelos autores como objecto primordial de análise.
Eduarda Moreira da Silva
estudos de conservação e restauro | nº 1
161
notícias
estudos de conservação e restauro | nº 1
162
Estudo técnico da pintura
The Calvary panels – study and
Pentecostes
conservation
Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra
Apresentação e publicação de trabalho de
investigação
Na semana de 7 a 11 de Outubro de 2008
foi elaborado um estudo técnico da pintura
No âmbito da 6th International Conference
sobre madeira Pentecostes, da autoria de
on Science and Technology in Archaeology
Grão Vasco. Esta pintura encontra-se no
and Conservation, realizada em Roma
Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, sendo
entre 8 a 14 de Dezembro de 2008 com o
tutelado pela Diocese de Coimbra, e foi
apoio do ICCROM, a investigadora Salomé
alvo do estudo in situ que os investigadores
de
do
(coordenadora),
elaborado em co-autoria com Luís Elias
Joana Salgueiro, Salomé de Carvalho,
Casanovas e Jorgelina Carballo, também
Jorgelina Carballo e Luís Bravo levaram
investigadores do CITAR, intitulado The
a cabo. Tendo como principal objectivo
Calvary panels – study and conservation.
CITAR
Ana
Calvo
a realização de um exame radiográico,
Carvalho
apresentou
este estudo foi ainda complementado por
registos fotográicos de amplo espectro
um
estudo
---
(luz visível, UV e IV) e por EDXRF.
Proceso de intervención en una
pintura de Bengt Lindström
---
realizada con aglutinante de PVA
Apresentação e publicação de trabalho de
Estudio Cientíico-técnico de los
investigação
Paneles del Calvario
Apresentação e publicação de trabalho de
investigação
Apresentação oral feita por Ana Cudell
na 10ª Jornada de Conservación de Arte
Contemporaneo, organizada pelo Museo
No âmbito da 17th International Meeting
Nacional Centro de Arte Reina Soia e GEIIC
in Heritage Conservation, realizada em
–Grupo Español del Internacional Institute
Castellón-Vila Real entre 20 e 22 de
of Conservation, Madrid, 12-13.02.2009.
Novembro de 2008 e organizada pela
Exposição dos resultados das análises
Universidade
a
Politécnica
investigadora
de
Valência,
Jorgelina
Carballo
apresentou um trabalho intitulado Estudio
Cientíico-técnico
de
los
Paneles
cientíicas realizadas através das técnicas
EDXRF, FTIR e estratigraia, bem como do
del
processo de intervenção realizado numa
Calvario. Este estudo foi elaborado em
Bengt Lindström. A pintura realizada com
colaboração com as investigadoras Ana
aglutinante de PVA, de natureza mate e
Calvo e Salomé de Carvalho.
sem camada de protecção, encontrava-
pintura expressionista do artista sueco
se
---
degradada
ao
nível
da
superfície
cromática, apresentando levantamentos e
destacamentos pontuais, principalmente
na cor preta.
estudos de conservação e restauro | nº 1
163
Gilding materials and techniques
---
used in erudite
and popular portuguese polichrome
The way to sustainability:
baroque wooden sculptures
the balance between outdoor climate
Technart 2009
and natural indoor climate
Apresentação e publicação de trabalho de
investigação
De 27 a 30 de Abril teve lugar em Atenas
o encontro internacional TECHNART 2009
No âmbito da conferência Going Green:
towards sustainability in conservation,
realizado em Londres no Museu Britânico
no dia 24 de Abril de 2009, o investigador
do
CITAR
Luís
Elias
Casanovas,
em
colaboração com o Prof. Doutor Vasco
Freitas, apresentou um paper intitulado
The way to sustainability: the balance
between
outdoor
climate
and
natural
indoor climate.
-
Non-destructive
and
Microanalytical
Techniques in Art and Cultural Heritage,
onde foi apresentado o trabalho Gilding
materials and techniques used in erudite
and
popular
portuguese
polichrome
baroque wooden sculptures da autoria
de
Carolina
Barata
(Universidade
Católica), António João Cruz (Instituto
Politécnico de Tomar), Jorgelina Carballo
(Universidade
Católica),
João
Coroado
(Instituto Politécnico de Tomar) e Maria
Este trabalho veio ao encontro do tema
Eduarda Araújo (Faculdade de Ciências da
“Reduzir o impacto no ambiente das
Universidade de Lisboa).
actividades
ligadas
à
conservação”,
proposto para o evento. Procurou-se um
case study que permitisse proceder à
recolha de informação sistemática sobre
as condições-ambiente que acolhem uma
colecção, e o papel do edifício, bem como
do clima. Os objectos de estudo escolhidos
foram e o Museu de S. Roque, recentemente
remodelado e instalado na Casa Professa
Os resultados do estudo foram apresentados
sob a forma de poster e constituem parte
da investigação desenvolvida pela primeira
autora no âmbito do mestrado em Química
Aplicada ao Património da Faculdade de
Ciências da Universidade de Lisboa, com
dissertação defendida em Julho de 2008.
Click aqui para ver poster.
da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa
desde 1905 e o Arquivo Histórico, a partir
---
da sua instalação no Palácio de Nisa,
em 2007. Mediante análise de registos
de
medições
termo-higroscópicas
e
Technical and conservative study
of the wooden support of Vasco
sua relação com o edifício envolvente,
analisam-se as questões energéticas face
ao clima e às necessidades das colecções.
Fernandes’ painting The Pentecost
from the Santa Cruz Monastery
(Coimbra, Portugal)
Apresentação e publicação de trabalho de
---
investigação
No
estudos de conservação e restauro | nº 1
âmbito
do
Simpósio
Facing
the
164
Challenges of Panel Painting Conservation:
várias instituições de ensino superior que
trends, treatments and training, realizado
ministram curso na área.
em Los Angeles, no Getty Institute, nos
As comunicações dividiram-se em quatro
dias 17 e 18 de Maio do presente ano, as
investigadoras do CITAR Joana Salgueiro
e
um
Salomé
de
poster
Carvalho
intitulado
conservative
study
apresentaram
Technical
of
the
and
wooden
painéis principais: Fotograia, Papel e
Documentos e Livro; Escultura, Azulejo,
Cerâmica e Vidro (dia 29); Pintura e
Pintura Mural e Têxteis (dia30). Foram
apresentados
diversos
trabalhos
de
support of Vasco Fernandes’ painting The
intervenção de conservação e restauro
Pentecost from the Santa Cruz Monastery
executados
(Coimbra, Portugal). Este poster teve
dividiam entre associados da ARP e não
origem
associados.
num
estudo
multidisciplinar
da pintura Pentecostes, da autoria do
pintor quinhentista Vasco Fernandes e
pertencente ao Mosteiro de Santa Cruz
de Coimbra. O trabalho apresentado tem
como ponto focal a análise da radiograia
executada in situ e o aprofundamento do
conhecimento da pintura sobre madeira em
Portugal, ao nível técnico e interventivo.
O estudo será publicado em breve pelo
Getty Conservation Institute.
Click aqui para ver poster.
pelos
oradores,
que
se
Um das grandes novidades destas Jornadas
consistiu na inclusão de novas áreas de
trabalho, cabendo realçar as comunicações
que incidiram sobre a Fotograia e a Arte
em Papel, áreas em expansão no contexto
português.
Durante o evento foram ainda referidos os
preparativos do 16º Encontro Trienal do
ICOM-CC, a ter lugar em Lisboa em 2011,
cuja candidatura Portugal ganhou e onde
estão envolvidos o ICOM Portugal, o I.M.C.,
a A.R.P e a empresa privada Archeofactu.
---
O departamento de Arte e Restauro
da Escola das Artes da Universidade
A Prática da Teoria.
Tratamentos de Conservação e
Restauro
Católica, Centro Regional do Porto esteve
representado
pela
docente
Eduarda
Moreira da Silva.
Jornadas ARP
---
Nos dias 29 e 30 de Maio do corrente ano,
tiveram lugar em Lisboa, no auditório
do Museu Nacional de Arte Antiga as II
Jornadas da Associação dos ConservadoresRestauradores de Portugal.
Tendo por objectivos divulgar e discutir
Conservation of a contemporary
painting – scientiic analysis and
intervention on a neorealist painting
by Júlio pomar
Apresentação de poster
teorias, metodologias e tratamentos de
conservação e restauro, bem como debater
Apresentação de um poster por Ana Cudell
o papel do conservador-restaurador, o
no congresso organizado pelo SFIIC –
evento contou com a participação de
Section Française de l’Institut International
muitos proissionais, alunos e docentes de
estudos de conservação e restauro | nº 1
165
de Conservation,
subordinado ao tema
“Art today – cultural property of tomorrow.
uma vez ingressados no mercado de
The
Este
conservation
contemporary
29.06.2009
Exposição
processo
restoration
artworks”,
das
de
and
análises
intervenção
Paris,
of
24-
cientíicas
e
realizado
à
trabalho.
ano,
e
pela
primeira
vez,
as
campanhas foram coordenadas no local
por duas ex-alunas da licenciatura.
pintura neo-realista, “O Cabouqueiro” de
Júlio Pomar. Foram identiicados pigmentos
e aglutinantes através da técnicas de
EDXRF, SEM e FTIR, que em complemento
com entrevistas ao artista permitiram não
só perceber os materiais aplicados e modo
de execução da pintura, como também
compreender os processos de degradação
e detecção de antigas intervenções de
restauro.
Os trabalhos tiveram lugar nas instalações
da Associação de Defesa do Património
Click aqui para ver poster.
Terras Quentes, em Macedo de Cavaleiros,
e ainda no Museu de Santa Maria de
Lamas. Em Macedo de Cavaleiros, onde
---
foram
intervencionadas
pinturas
e
esculturas provenientes do concelho de
Campanhas de verão
Vimioso, a coordenação esteve a cargo de
Julho 2009
Bárbara Campos Maia. No Museu de Santa
Maria de Lamas deu-se continuidade ao
processo de conservação da colecção de
escultura sobre madeira policromada, que
tem contado com participação de diversos
alunos da Escola das Artes, desta vez
coordenado por Joana Preza Andrade.
Participaram nesta iniciativa os alunos Alba
Domingues, Ana Ferreira, Ana Queiroz,
Ana Ricardo, Andreia Maldonado, Beatriz
Pires, Carla Matos, Catarina Rocha, Edgar
No mês de Julho realizou-se mais uma
Gomes, Joana Martins, Maria Quinta, Paula
edição das Campanhas de Verão da área
Trindade, Ricardo Lourenço, Rita Medina e
de Conservação e Restauro, organizadas
Tiago Ferreira.
pela docente Carolina Barata. Pelo quinto
ano consecutivo, procurou-se proporcionar
aos
alunos
da
licenciatura
em
---
Arte,
Conservação e Restauro a possibilidade
de integrar equipas de intervenção num
contexto semelhante ao que encontrarão
estudos de conservação e restauro | nº 1
166
Forma e matéria: a escultura barroca
pintura sobre madeira em Portugal e
de Santo Estêvão, do Museu de Santa
baseia-se em três aspectos: a importância
Maria de Lamas
do culto do Espírito Santo em Portugal,
Publicação de artigo na revista do CEIB
a
comparação
entre
três
estruturas
retabulares e entre pinturas oriundas de
De 15 A 19 de Setembro teve lugar no
mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro
o VI encontro do Centro de Estudos de
Imaginária Brasileira (CEIB) durante o
qual foi lançado o número 4 da revista
Imagem Brasileira, editada pelo mesmo
organismo. Neste número foi publicado o
artigo Forma e matéria: a escultura barroca
de Santo Estêvão, do Museu de Santa
Maria de Lamas, da autoria de Carolina
Barata (Universidade Católica), António
João Cruz (Instituto Politécnico de Tomar),
Jorgelina Carballo (Universidade Católica)
e Vítor Teixeira (Universidade Católica), e
apresentado por Carolina Barata durante
pontos geográicos distintos. Para esta
análise foram seleccionadas três pinturas
de características técnicas demarcadas,
partilhando
uma
mesma
iconograia:
Tríptico de Miragaia da Igreja Paroquial de
S. Pedro de Miragaia (autor desconhecido,
Escola Flamenga, produção século XV),
a pala Pentecostes do Mosteiro de Santa
Cruz de Coimbra (Vasco Fernandes, Escola
Portuguesa, produção século XVI oriunda
de pólo urbano) e o painel Pentecostes da
pale da Igreja Matriz de Freixo-de-Espadaà-Cinta (autor incerto, Escola Portuguesa,
produção século XVI oriunda de pólo
periférico).
O
trabalho
realizou-se
sobretudo
organizados em Vitória, no Estado do
mediante análise radiográica executada
Espírito Santo.
in situ às pinturas referidas, abrangendo
a edição anterior dos encontros do CEIB,
considerações
técnicas
importantes
e
relevant es para a conservação da pintura
---
sobre madeira em Portugal.
Click aqui para ver poster.
The wooden supports in Portugal:
the Pentecost in different altarpiece
---
structures
Apresentação e publicação de trabalho de
investigação
Artes Decorativas na arquitectura:
problemáticas de conservação e de
reabilitação
No âmbito da conferência Wood Cult Her
for conservation of Cultural Heritage,
Apresentação e publicação de trabalho de
realizado em Hamburgo, de 7 a 10 de
investigação
Outubro do presente ano, as investigadoras
do CITAR Ana Calvo, Joana Salgueiro e
Organizadas
Salomé de Carvalho apresentaram um
Ciências e Técnicas do Património da
poster intitulado The wooden supports
Faculdade de Letras da Universidade do
in Portugal: the Pentecost in different
Porto, decorreu no Porto, entre os dias
altarpiece structures.
12 e 14 de Outubro do ano em curso, o
Este trabalho dedica-se ao estudo da
Seminário de Investigação em Museologia
estudos de conservação e restauro | nº 1
pelo
Departamento
de
167
dos
Países
de
Língua
Portuguesa
e
articulação com as questões relacionadas
Espanhola.
com o restauro.
O Seminário contou com uma grande
adesão de muitos proissionais dos vários
O departamento de Arte e Restauro da
campos
Eduarda Moreira da Silva com comunicação
da
Museologia,
nacionais
e
U.C.P. esteve representado pela docente
estrangeiros, particularmente de Espanha,
“Artes
Decorativas
República Checa e América do Sul (Chile,
problemáticas
Colômbia e Brasil).
reabilitação”, com a qual a autora abordou
Tendo por principal objectivo reunir os
o estado de conservação das fachadas
investigadores e os estudantes de formação
azulejadas do centro histórico do Porto e
de
na
arquitectura:
conservação
e
de
pós-graduada em nível de mestrado e
diversas questões inerentes às estratégias
doutoramento, o Seminário estruturou-se
de intervenção.
em cinco linhas fundamentais: Museus,
Património
e
Conservação
Preventiva;
---
Museus Colecções e Património; Museus,
Espaço e Comunicação; Museus, Gestão e
Aspectos Históricos, Artísticos,
Técnicos y Problemas de
Empreendedorismo e Museus e Curadoria.
Na
secção
de
e
Conservação
Museus,
Património
Preventiva
Conservación de la Pintura Mural
foram
apresentadas várias comunicações por
oradores
provenientes
de
“Nuestra Senora de la Rosa”
instituições
en la Iglesia de S. Francisco de
Oporto
como o Museu Gugenheim - Bilbao, o
Apresentação e publicação de trabalho de
Museu do Douro, a Universidade Federal
investigação
de Minas Gerais, o Departamento de
Conservação e Restauro da Faculdade
de Ciências e Tecnologia da U.N.L., a
No
Faculdade de Arquitectura e Urbanismo
de Arqueometría, realizado em Teruel,
da Universidade Federal do Rio de Janeiro
entre 19 e 21 de Outubro do presente
e o Departamento de Arte e Restauro da
ano, a investigadora Jorgelina Carballo
Universidade Católica Portuguesa, Centro
apresentou, em co-autoria com Ana Calvo
Regional do Porto.
e Conceição Lobo e Silva, um estudo
No âmbito da conservação preventiva foi
dada especial atenção à problemática da
avaliação e gestão de risco aplicada a
edifícios e aos bens móveis, cabendo realçar
âmbito
do
VIII
Congreso
Ibérico
intitulado Aspectos Históricos, Artísticos,
Técnicos y Problemas de Conservación de la
Pintura Mural “Nuestra Senora de la Rosa”
en la Iglesia de S. Francisco de Oporto.
os contributos dos colegas brasileiros
que
trouxeram
algumas
experiências
em curso. De grande interesse revelouse, também, a comunicação da equipa
do Museu Gugenheim – Bilbao, que deu
a conhecer o trabalho de investigação
---
Seminário qualiicação e prática na
reabilitação do património
em conservação preventiva no campo da
arte contemporânea, mormente na sua
estudos de conservação e restauro | nº 1
No âmbito da CONCRETA 2009, teve lugar
168
no passado dia 24 de Outubro do corrente
ano um seminário dedicado às questões
Os oradores representantes do GECORPA
da reabilitação do património histórico
GECORPA
de preparação do sector da construção
(Grémio das Empresas de Conservação e
Restauro), nas instalações da EXPONOR.
com a necessidade de revisão legislativa e
O seminário teve por objectivos principais
existentes e/ou a criar.
fazer o ponto da situação sobre o sector da
Ao enquadrar este seminário na CONCRETA
reabilitação em Portugal, e lançar o debate
2009, o GECORPA pretendeu reforçar
sobre as metodologias de intervenção
neste campo, face às tendências mais
do
recentes
simultaneamente, apontar estratégias a
ediicado,
promovido
de
construção.
pelo
mudança
Destinado
engenheiros,
no
a
sector
da
arquitectos,
face à mudança de paradigma inanceiro,
com a adequação dos peris proissionais
o
carácter
especíico
ediicado
da
reabilitação
histórico,
tentando,
seguir no curto e médio prazo.
gestores,
O departamento de Arte e Restauro da
formadores
Universidade Católica Portuguesa, Centro
e estudantes de várias especialidades,
Regional do Porto, esteve representado
o evento registou grande adesão destes
pela docente Eduarda Moreira da Silva.
empreiteiros,
promotores,
manifestaram preocupação com a falta
professores,
grupos proissionais, que aluíram com
grande interesse.
---
O seminário teve como pontos altos no
que respeita a comunicações, algumas
das
mais
recentes
intervenções
Materiais e técnicas de pintores do
de
norte de Portugal
conservação e restauro arquitectónicas.
Entre elas, salientamos as intervenções de
Projecto de investigação (QREN)
conservação na fachada da Sé do Porto,
no coro e capelas do Convento Corpus
Encontra-se em desenvolvimento o projecto
Christi, em Vila Nova de Gaia, na fachada
de 24 meses “Materiais e Técnicas de
do edifício da câmara municipal do Porto,
Pintores do Norte de Portugal”, apresentado
bem como o trabalho de conservação
pela área temática da “Conservação dos
da pedra da fachada da Igreja da Lapa.
Bens Culturais”, inserida na linha de
na temática das intervenções, destacaram-
investigação de Estudo, Conservação e
se, igualmente, as que versaram temas
de Investigação em Ciências e Tecnologias
de grande actualidade como o estado
das Artes (CITAR) e aprovado no âmbito
Paralelamente às comunicações centradas
de conservação do ediicado do centro
histórico do Porto, o papel das Sociedades
de
Reabilitação
Urbana,
os
modelos
de formação a implementar na área
da reabilitação para alcançar níveis de
excelência compatíveis com as exigências
Gestão do Património Cultural do Centro
do Programa QREN - Eixo Prioritário III
- Valorização e Qualiicação Ambiental e
Territorial (Património Cultural).
O
projecto
tem
como
objectivo
a
investigação e divulgação do património
do mercado, e as especiicidades da
artístico do Norte de Portugal, na vertente
investigação no diagnóstico em edifícios
e cientíico dos materiais empregues e
históricos.
estudos de conservação e restauro | nº 1
da pintura, através do estudo técnico
das técnicas de execução utilizadas por
169
artistas entre os séculos XVI e XXI (inclui
A colecção transitou do Centro Cultural
obras de pintores como Grão Vasco,
Copta
Francisco Correia, Domingos Lourenço
anteriormente no Consulado da África do
Ortodoxo
do
Porto,
localizado
Pardo, Glama Strobel, Pedro Alexandrino,
Sul, para as instalações da Universidade
Francisco José de Resende, Marques de
Católica, por vontade expressa do seu
Oliveira, Aurélia de Sousa, Abel Salazar,
doador, o falecido Abba Marcos, antigo
Júlio Pomar, Susana Bravo, entre outros).
arcebispo da Igreja Copta em França,
O estudo do aparecimento de novas cores
o qual manifestou sempre o desejo de
(pigmentos e corantes) durante o séc. XIX
que a colecção se mantivesse no Porto,
e a sua utilização na paleta de pintores
devidamente conservada e divulgada.
portugueses, é também uma das linhas
A colecção está de momento em regime
temáticas em curso.
de transição para a tutela futura da
O projecto envolve treze investigadores e
Universidade Católica, pelo que decorre
irá contar com a colaboração de Museus,
nesta
fase,
o
estudo
do
modelo
de
Câmaras Municipais, Igreja e privados.
protocolo a deinir entre partes, com vista
Prevê a divulgação dos resultados junto
à concretização deste projecto, estando
publicação de artigos e apresentações em
este processo sob a responsabilidade do
conferências (nacionais e internacionais)
Está
assim como do público em geral, através
permanência de parte da colecção, sendo a
da criação de uma Web, a publicação
restante colocada em reserva. A exposição
de
de
permanente deverá enquadrar-se no espaço
a montagem de exposições itinerantes e
da Biblioteca do Paraíso, actualmente em
da
comunidade
um
cientíica,
livro-síntese,
a
através
realização
de
workshops sobre reconstituições técnicas,
a edição de um DVD, a nível nacional. O
projecto decorrerá entre Fevereiro de 2009
e Janeiro de 2011.
Website: http://citar.artes.ucp.pt/mtpnp
docente Prof. Doutor Vítor Teixeira.
prevista
a
musealização
em
obras de remodelação.
A primeira fase deste projecto implica
o estudo prévio de caracterização de
materiais,
que
incidirá
especialmente
sobre os objectos metálicos, tendo por im
o diagnóstico que apoiará a intervenção
de conservação e restauro. Paralelamente,
---
serão
desenvolvidos
os
procedimentos
necessários à conservação das restantes
Colecção Copta
peças para exposição.
Este trabalho será efectuado no âmbito do
Encontra-se
depositada
Centro
curso de licenciatura de Arte, Conservação
Regional do Porto da Universidade Católica
e Restauro, contando com a participação
Portuguesa, uma colecção de arte copta
de alunos e das docentes de Química e de
proveniente
Materiais Inorgânicos.
do
Centro
no
Cultural
Copta
Ortodoxo do Porto. A colecção integra
vários conjuntos de peças em diversos
suportes (metais, madeira, marim e pedra)
com funções litúrgicas, bem como diversos
ícones pintados, pergaminhos e têxteis.
estudos de conservação e restauro | nº 1
Em paralelo, estudar-se-ão o percurso
museológico, as condições de exposição, o
local de reserva bem como os materiais de
acondicionamento.
170